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POLÍCIA MILITAR DE ALAGOAS DIRETORIA DE ENSINO ACADEMIA DE POLÍCIA MILITAR SENADOR ARNON DE MELLO CURSO DE FORMAÇÃO DE OFICIAIS PAULO FERNANDO DE MELO BRASIL DA PROPOSTA DE IMPLANTAÇÃO DO NÚCLEO DE GERENCIAMENTO DE CRISES NA REGIÃO DO COMANDO DE POLICIAMENTO DE ÁREA DO INTERIOR II (CPAI-II) DA POLÍCIA MILITAR DE ALAGOAS MACEIÓ-AL 2018 PAULO FERNANDO DE MELO BRASIL DA PROPOSTA DE IMPLANTAÇÃO DO NÚCLEO DE GERENCIAMENTO DE CRISES NA REGIÃO DO COMANDO DE POLICIAMENTO DE ÁREA DO INTERIOR II (CPAI-II) DA POLÍCIA MILITAR DE ALAGOAS Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Academia de Polícia Militar Senador Arnon de Mello, como requisito parcial para obtenção do grau de bacharel em Segurança Pública. Orientador: Cap. QOC PM Thiago Almeida Ferreira da Silva Maceió - AL 2018 PAULO FERNANDO DE MELO BRASIL DA PROPOSTA DE IMPLANTAÇÃO DO NÚCLEO DE GERENCIAMENTO DE CRISES NA REGIÃO DO COMANDO DE POLICIAMENTO DE ÁREA DO INTERIOR II (CPAI-II) DA POLÍCIA MILITAR DE ALAGOAS Trabalho de Conclusão de Curso aprovado como requisito parcial para obtenção do título de bacharel em Segurança Pública, Curso de Formação de Oficiais da Academia de Polícia Militar Senador Arnon de Mello. Aprovada em ___ de___de______ Orientador: _____________________________________________________ Cap. QOC PM Thiago Almeida Ferreira da Silva Examinadores: _____________________________________________________ Examinador Militar ______________________________________________________ Examinador Civil MACEIÓ-AL 2018 A Deus por ser o responsável por todas as bênçãos alcançadas, aos meus pais, a minha noiva e ao meu irmão, por serem a minha fortaleza todos os dias. AGRADECIMENTOS Primeiramente agradeço a Deus, por ter me concedido o dom da vida e fornecido a força necessária durante estes 3 (três) anos de formação, possibilitando a superação de todos os obstáculos encontrados durante esta longa jornada. A maior prova dessa superação consiste neste trabalho. Aos meus pais, Paulo Correia Brasil e Márcia Fernanda Freitas de Melo Brasil, pela educação me concedida e investimento dispensado ao longo da minha formação, desde a mais básica até a atual, sendo sempre meu porto seguro e minha fortaleza em todos os dias da minha vida. Obrigado por terem sempre sido fonte de amor, carinho, paciência e dedicação. À minha noiva por ter me dado apoio incondicional, sobretudo nos momentos mais difíceis, sendo minha ouvinte nos momentos de angústia e também de felicidade. Agradeço por ter sido essa mulher companheira e por ter me dado o suporte que precisei. Ao meu irmão pelo companheirismo e por mostrar que sempre poderei contar com ele. Ao meu orientador pela orientação dedicada em todas as fases da realização deste trabalho. A todos os familiares e amigos por entenderem a ausência em momentos especiais. A todos os instrutores do Curso de Formação de Oficiais que contribuíram para o meu crescimento pessoal e profissional. Bendito seja o Senhor, a minha rocha, que treina as minhas mãos para a guerra e os meus dedos para a batalha. (Salmos 144:1) RESUMO A presente monografia apresenta uma análise a respeito da necessidade e viabilidade da descentralização das atividades desenvolvidas atualmente por parte do Centro de Gerenciamento de Crises, Direitos Humanos e Polícia Comunitária (CGCDHPC) da Polícia Militar de Alagoas, tendo em vista a existência de apenas um único Centro, localizado na capital alagoana, Maceió, o qual possui responsabilidade sobre todo o território estadual. Desta forma, a presente pesquisa tem por objetivo demonstrar o prejuízo causado ao atendimento de ocorrências policiais envolvendo crises em decorrência da ausência de núcleos especializados espalhados por Alagoas. Sendo assim, a presente monografia busca demonstrar a importância desta descentralização, tomando como base a criação de um Núcleo de Gerenciamento de Crises na região do Comando de Policiamento de Área de Interior II. Este núcleo possibilitaria que profissionais capacitados e treinados especificamente no atendimento de ocorrências críticas, pudessem com maior agilidade dar o suporte necessário ao policiamento ordinário já desenvolvido naquela região, gerando consequentemente uma maior qualidade do serviço policial militar ofertado. Este enfoque é dado adotando-se metodologia com a abordagem de pesquisa bibliográfica. Fica evidente ainda, que para tal medida ser adotada, é necessário um estudo acerca dos contextos histórico e geográfico desta região, de forma que o trabalho não seja desenvolvido de maneira empírica. Por fim, cabe salientar que a região do CPAI-II contém 5 (cinco) unidades da PMAL e abrange cerca de 44 (quarenta e quatro) municípios alagoanos, deixando claro a relevância de um Núcleo de Gerenciamento de Crises nesta área para que se consigam intervenções e soluções mais rápidas em eventos críticos nesta região. Palavras-chave: Gerenciamento de Crises – Descentralização – Polícia Militar de Alagoas. ABSTRACT This monograph presents an analysis of the necessity and feasibility of the decentralization of the activities currently developed by the Center for Crisis management, human rights and community Police (CGCDHPC) of the military police of Alagoas, in view of the existence of only a single Center, located in the capital Alagoas, Maceió, which has responsibility over the entire state territory. Thus, the present research aims to demonstrate the damage caused to the attendance of police occurrences involving crises due to the absence of specialized nuclei scattered around Alagoas. Thus, the present monograph seeks to demonstrate the importance of this decentralization, based on the creation of a crisis management nucleus in the region of the internal area Policing Command II. This nucleus would make it possible for professionals qualified and trained specifically in the attendance of critical occurrences, to be able to provide the necessary support to the ordinary policing already developed in that region, generating Consequently a higher quality of the military Police service offered. This approach is given by adopting a methodology with the bibliographic research approach. It is also evident that, for such a measure to be adopted, it is necessary to study the historical and geographic contexts of this region, so that the work is not empirically developed. Finally, it is worth noting that the region of the Cpai-II contains five (5) units of the Pmal and covers about 44 (44) municipalities in Alagoas, making clear the relevance of a crisis management nucleus in this area to achieve interventions and solutions Critical events in this region. Keywords: Crisis Management – Decentralisation – Military Police of Alagoas. LISTA DE GRÁFICOS Gráfico 1 – Quantidade de conflitos no campo – Brasil – 2015/2016..................... 30 Gráfico 2 – Motivos dos conflitos agrários – Brasil – 2016..................................... 31 Gráfico 3 – Assassinatos no campo – Brasil – 2015/2016..................................... 31 Gráfico 4 – Prisões e ameaças de prisão em conflitos agrários – Brasil – 2015/2016...............................................................................................................32 Gráfico 5 – Quantidade de homicídios – Alagoas – 2001/2011.............................. 49 Gráfico 6 – Quantidade de CVLI’s por meses – Alagoas – 2017........................... 49 Gráfico 7 – Quantidade de CVP’s por tipo – Alagoas – 2017................................. 50 LISTA DE ILUSTRAÇÕES Ilustração 1 – Mapa de assentamentos rurais – Alagoas – 2017........................... 33 Ilustração 2 – Mapa de assentamentos rurais – CPAI-II – 2017............................ 34 Ilustração 3 – Mapa de área de policiamento – CPAI-II – 2018............................. 34 Ilustração 4 – Mapa de Alagoas dividido em mesorregiões – Alagoas – 2010...... 52 LISTA DE TABELAS Tabela 1 – Quantidade de CVLI e CVP por municípios – CPAI-II – 2017.............. 51 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS APMSAM Academia de Polícia Militar Senador Arnon de Mello BOPE Batalhão de Operações Policiais Especiais CCDH Comissão Central de Direitos Humanos CF Constituição Federal CGCDHPC Centro de Gerenciamento de Crises Direitos Humanos e Polícia Comunitária CGDHPC Centro de Gerenciamento de Direitos Humanos e Polícia Comunitária CPAI-II Comando de Policiamento de Área do Interior – II CPC Comando de Policiamento da Capital CVLIs Crimes Violentos Letais Intencionais CVPs Crimes Violentos Patrimoniais DUDH Declaração Universal dos Direitos Humanos EPI’s Equipamentos de Proteção Individual FBI Federal Bureau of Investigation FHC Fernando Henrique Cardoso IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística NEAC Núcleo de Estatística e Análise Criminal ONU Organização das Nações Unidas PNDH Programa Nacional de Direitos Humanos PMAL Polícia Militar de Alagoas SENASP Secretária Nacional de Segurança Pública SSP Secretária de Segurança Pública SUMÁRIO INTRODUÇÃO....................................................................................................... 14 1.GERENCIAMENTO DE CRISES E SEUS CONCEITOS.................................... 18 1.1 CRISE............................................................................................................... 18 1.2 GERENCIAMENTO DE CRISES..................................................................... 19 1.3 CARACTERÍSTICAS DO GERENCIAMENTO DE CRISES............................ 19 1.4 O GERENTE DA CRISE.................................................................................. 20 1.5 CRITÉRIOS DE AÇÃO..................................................................................... 21 1.6 ALTERNATIVAS TÁTICAS.............................................................................. 21 1.6.1 Negociação.................................................................................................... 22 1.6.2 Emprego de técnicas não letais.................................................................... 23 1.6.3 Tiro de comprometimento.............................................................................. 23 1.6.4 Invasão tática................................................................................................ 24 1.7 PRIMEIRO INTERVENTOR............................................................................. 25 1.8 SÍNDROME DE ESTOCOLMO........................................................................ 25 1.9 A MEDIAÇÃO DE CONFLITOS NA ATIVIDADE POLICIAL............................ 26 2.REFORMA AGRÁRIA, MOVIMENTOS SOCIAIS, CRIAÇÃO DA COMISSÃO DOS DIREITOS HUMANOS E SURGIMENTO DO CENTRO DE GERENCIAMENTO DE CRISES DIREITOS HUMANOS E POLÍCIA COMUNITÁRIA...................................................................................................... 28 2.1 REFORMA AGRÁRIA: CONCEITO, HISTÓRICO E CATEGORIAS............... 28 2.2 CONFLITOS AGRÁRIOS................................................................................. 30 2.3 MOVIMENTOS SOCIAIS EM ALAGOAS......................................................... 32 2.4 DIREITOS HUMANOS..................................................................................... 35 2.4.1 Evolução histórica......................................................................................... 35 2.4.2 Direito Internacional dos Direitos Humanos.................................................. 37 2.4.3 Criação da ONU............................................................................................ 38 2.4.4 A Declaração Universal dos Direitos Humanos............................................. 38 2.4.5 Conferência Mundial de Direitos Humanos de Viena.................................... 39 2.4.6 Direitos Humanos no Brasil........................................................................... 40 2.4.7 Programa Nacional de Direitos Humanos..................................................... 41 2.4.8 Direitos Humanos na PMAL.......................................................................... 42 2.5 CRIAÇÃO DO CENTRO DE GERENCIAMENTO DE CRISES DIREITOS HUMANOS E POLÍCIA COMUNITÁRIA NA POLÍCIA MILITAR DE ALAGOAS.... 43 2.6 PROCEDIMENTOS ADOTADOS PARA O CUMPRIMENTO DE MANDADOS JUDICIAIS E REINTEGRAÇÃO DE POSSE.................................... 45 3.PERFIL DA VIOLÊNCIA E DA SOCIOECONOMIA DE ALAGOAS, PROCESSO DE OCUPAÇÃO E DISPUTA DE TERRAS E CARACTERÍSTICAS DA REGIÃO DO CPAI-II..................................................... 47 3.1 O PANORAMA DA VIOLÊNCIA....................................................................... 47 3.1.1 Violência no Brasil......................................................................................... 47 3.1.2 Violência em Alagoas.................................................................................... 48 3.1.3 Violência na região do Comando de Policiamento de Área do Interior II...... 50 3.2 PERFIL SOCIOECONÔMICO DE ALAGOAS.................................................. 51 3.3 PROCESSO DE OCUPAÇÃO DO AGRESTE E LESTE ALAGOANO E A CONCENTRAÇÃO FUNDIÁRIA............................................................................. 53 3.4 A REGIÃO DO COMANDO DE POLICIAMENTO DE ÁREA DO INTERIOR II.............................................................................................................................. 54 3.5 OCORRÊNCIA DE SEQUESTRO E CÁRCERE PRIVADO EM PALMEIRA DOS ÍNDIOS.......................................................................................................... 56 3.6 PROPOSTA DE IMPLANTAÇÃO DO NÚCLEO DE GERENCIAMENTO DE CRISES.................................................................................................................. 58 CONCLUSÃO........................................................................................................ 59 REFERÊNCIAS...................................................................................................... 61 ANEXOS.............................................................................................................. 64 14 INTRODUÇÃO No Brasil, a violência tem a cada dia se mostrado um problema entranhado na sociedade. Em Alagoas, nos últimos anos, observou-se que esta violência vem crescendo de forma que, conforme índices apresentados por órgãos de pesquisa e pela imprensa do estado de Alagoas o qual tem se tornado um dos mais violentos do país. Diante desta realidade, as instituições policiais têm se deparado com diversos desafios, dentre os quais podemos destacar o combate à criminalidade, o cumprimento da lei, a promoção da segurança pública, preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio. Estas que são atribuições impostas pela Constituição Federal (1988): Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservaçãoda ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos: [...] V - polícias militares e corpos de bombeiros militares. (BRASIL, 1988). O policiamento, no entanto, não deve ocorrer de forma empírica, de maneira que cada vez mais é perceptível a necessidade de uma maior formação dos integrantes das instituições policiais, a fim de que o serviço ora realizado ocorra da maneira mais qualificada possível. Mesmo porque, conforme ensina Balestreri (1998), o agente de Segurança Pública trata-se de um cidadão com qualificação, representando o Estado em contato imediato com a população e tendo como missão ser ‘’porta voz’’ das diversas autoridades públicas, sendo possuidor de autoridade para a construção social ou sua devastação, haja vista ter permissão para utilizar a força e/ou armas de acordo com a lei. A Polícia Militar de Alagoas, assim como outras instituições co-irmãs existentes no país, se depara diariamente com diversas dificuldades para o cumprimento das missões que lhe são impostas pela legislação existente no ordenamento jurídico pátrio, a exemplo da falta de quadro de pessoal, recursos materiais, EPI’s (Equipamentos de Proteção Individual) adequados, viaturas em condições para o policiamento, dentre outros. Entretanto, ainda que os problemas supramencionados sejam solucionados, de nada adiantará se os profissionais de segurança pública não receberem a 15 capacitação técnica e profissional adequada, para que cumpram seu papel valendo- se do respaldo e autoconfiança necessários para que se alcance uma solução aceitável, diante das mais diversas situações com as quais irá se deparar durante o serviço. Dentre as diversas ocorrências que podem ser enfrentadas pelo policial militar encontram-se os eventos críticos, os quais consistem em situações delicadas e que demandam do profissional de segurança pública um preparo específico e voltado para a solução mais tranquila possível. Pode-se definir crise como “um evento ou situação crucial que exige uma resposta especial da polícia, a fim de assegurar uma solução aceitável’’ (MONTTEIRO, 1994, p.5). Desta forma, é perceptível que quando há um evento crítico se faz necessária uma intervenção que tenha por fito alcançar, sobretudo, dois principais objetivos, quais sejam: preservar vidas e aplicar a lei. Ademais, é importante citar o que segue: Nas situações em que a intervenção do aparato policial se faz essencialmente necessário, o surgimento de uma crise é bastante provável, principalmente se ele surpreende um crime em andamento, tendo como reflexos imediatos, situações onde pessoas são tomadas como reféns, criando um verdadeiro impasse e colocando em risco o mais valioso bem que um ser humano pode ter a vida. (SENASP, 2008, p.5). É notório ao analisarmos as matrizes curriculares dos cursos de formação e aperfeiçoamento existentes nos centros de ensino da briosa Polícia Militar de Alagoas (PMAL), que vêm sendo incluídas disciplinas como Gerenciamento de Crises, Direitos Humanos e Polícia Comunitária, estas que são de fundamental importância para a segurança pública em geral, haja vista a necessidade de em muitos casos as ocorrências serem resolvidas de maneira pacífica, pautando-se sobretudo na utilização do diálogo como forma de mediação e resolução destes eventos. [...] exigem, da Policia Militar, um constante aprimoramento de seus métodos de resolver problemas, o que passa pela sedimentação da filosofia de Polícia Comunitária, cuja estratégia é a aproximação com a população, que neste contexto passa a ser vista como uma grande parceira e co-participante na solução pacífica dos conflitos e na prevenção da violência. (REIS, 2010, p. 13). O que fica claro é que os policiais recém-formados nos centros de ensino têm em sua bagagem curricular disciplinas desta natureza, diferentemente dos profissionais formados nas décadas passadas, onde este tipo de conhecimento não 16 era priorizado e propagado, restando clara a deficiência destes profissionais na capacidade de lidar com situações críticas. No interior do estado de Alagoas é comum a Polícia Militar se deparar com diversos problemas em que a utilização do conhecimento da doutrina de gerenciamento de crises se faz importante para que haja uma solução viável e aceitável. Podemos citar: conflitos agrários; invasão e ocupação de terras; obstruções de vias por diversos motivos como falta de água ou luz; assaltos a banco com reféns; etc. A região do Comando de Policiamento de Área do Interior II (CPAI-II) não é diferente e conta com um problema adicional, qual seja, a distância da capital, onde está localizado o Centro de Gerenciamento de Crises Direitos Humanos e Polícia Comunitária da PMAL, de modo que o município mais próximo de Maceió e especificamente do CGCDHPC é o de Atalaia que fica a aproximadamente 43 km da capital alagoana, sendo o deslocamento neste percurso de aproximadamente 1 (uma) hora, demonstrando assim a necessidade de um policiamento treinado e capacitado para viabilizar em tempo hábil a solução de determinadas ocorrências que envolvam crises ou conflitos nesta localidade. Perante esta situação é que foi proposto o presente tema, qual seja: A implantação do Núcleo de Gerenciamento de Crises na região do Comando de Policiamento de Área do Interior II (CPAI-II) da Polícia Militar de Alagoas. Há o intuito de que diante das informações apresentadas haja interesse por parte da corporação na descentralização do gerenciamento de crises da PMAL para outras áreas de Alagoas, haja vista os benefícios que seriam trazidos, dentre os quais podemos citar: a diminuição de sobrecarga dos profissionais que já pertencem ao CGCDHPC; a atuação mais rápida por parte do setor especializado nesse tipo de ocorrência; etc. O trabalho tem o objetivo de demonstrar a importância da implantação de um Núcleo de Gerenciamento de Crises na região do Comando de Policiamento de Área do Interior II (CPAI-II) da Polícia Militar de Alagoas, para que ocorram intervenções e soluções mais rápidas de eventos críticos naquela região, sendo um incentivador para que existam equipes capacitadas e treinadas para lidar com situações de crises que venham a ocorrer nesta região do CPAI-II, que contém 5 (cinco) unidades da PMAL e abrange cerca de 44 (quarenta e quatro) municípios alagoanos, os quais se 17 encontram localizados nas mesorregiões do Agreste Alagoano (Ex.: Arapiraca, Palmeira dos Índios e Taquarana) e do Leste Alagoano (Ex.: São Miguel dos Campos, Teotônio Vilela e Coruripe). Esse objetivo poderá ser alcançado através da exposição de conceitos básicos sobre o gerenciamento de crises; evidenciando aspectos históricos dos Direitos Humanos e do surgimento do Centro de Gerenciamento de Crises da PMAL; identificando os principais aspectos e características dos movimentos sociais em Alagoas; expondo as características da região do CPAI-II; analisando dados sobre a violência nesta região; bem como demonstrando a aplicabilidade de um Núcleo de Gerenciamento de Crises no CPAI-II. Assim, o trabalho tem por fito trazer resposta à seguinte problemática: a implantação de um Núcleo de Gerenciamento de Crises na área do CPAI-II resultará em intervenções e soluções mais rápidas de eventos críticos ocorridos naquela região? Para a confecção do presente Trabalho de Conclusão de Curso foi utilizada a metodologia de pesquisa qualitativa em fontes bibliográficas relacionadas ao tema, dividindo-se o trabalho em 3 capítulos. O primeiro diz respeito à conceituação das principais expressões relacionadas ao gerenciamento de crises. O segundo trata de aspectos como a violência em Alagoas, reforma agrária, movimentos sociais, bem como o histórico do surgimento dos Direitos Humanos e do Centro deGerenciamento de Crises, Direitos Humanos e Polícia Comunitária. Já no terceiro e último capítulo expõe-se o perfil da violência e da socioeconomia em Alagoas, o processo de ocupação e disputa de terras, bem como as características da região onde atua o policiamento do CPAI-II, trazendo-se ao final um caso concreto que elucida bem a necessidade de um Núcleo de Gerenciamento de Crises na localidade, bem como a proposta propriamente dita de implantação do Núcleo. 18 1. GERENCIAMENTO DE CRISES E SEUS CONCEITOS Este capítulo trata de conceitos que envolvem o universo do Gerenciamento de Crises, estes que são de fundamental importância para o conhecimento do profissional de segurança pública, para que ao se deparar com uma situação de crise possa entender o contexto do fato, as funções a serem desempenhadas, bem como ações e posturas a serem adotadas e/ou desempenhadas. 1.1 Crise Conforme ensina Monteiro (1994) e De Souza (1995), utilizando-se do conceito de crise adotado pela Academia Nacional do FBI (Federal Bureau of Investigation) dos Estados Unidos da América, pode-se definir essa expressão como: “um evento ou situação crucial que exige uma resposta especial da Polícia, a fim de assegurar uma solução aceitável.” No contexto policial, pode-se entender, portanto, o termo crise como sendo um evento violento e inesperado, o qual possui potencial de causar prejuízos a instituições ou pessoas, necessitando assim uma resposta especializada por parte da polícia. Desta forma verificamos que para um evento ser considerado crítico deve haver um rompimento de equilíbrio ou quebra da normalidade. Ademais, diante da imprevisibilidade deste acontecimento é reforçada a necessidade das instituições policiais estarem preparadas para atuarem neste tipo de situação, sobretudo de maneira ágil e técnica, gerando uma solução aceitável para o fato. Solução esta que deve respeitar os ditames legais, éticos e morais em vigência. Dentre os eventos críticos com os quais as instituições de segurança pública podem se deparar podemos citar: atos terroristas; assaltos com tomada de reféns; sequestros de pessoas; rebeliões em estabelecimentos prisionais; invasões de terras; etc. 19 1.2 Gerenciamento de Crises De acordo com a doutrina apresentada pelo FBI, o gerenciamento de crises pode ser definido como: “o processo de identificar, obter e aplicar os recursos necessários à antecipação, prevenção e resolução de uma crise”. (Monteiro 2000,p8). Consiste, portanto, na utilização de um conjunto de técnicas e princípios doutrinários que vão permitir que o profissional de segurança pública possa gerenciar situações críticas geradas por problemas de natureza política, psicológica, social, econômico, dentre outros. Cada evento demandará um tratamento individualizado, ou seja, a utilização de técnicas e comportamentos próprios e de acordo com o evento em questão. O gerenciamento de crise não se trata de uma ciência exata, haja vista cada crise ter características próprias, o que exigirá uma análise cautelosa e reflexiva acerca do evento e como este poderá ser solucionado. É de bom alvitre ressaltar que conforme é trazido pela doutrina do Curso de Gerenciamento de Crises (2008), oferecido pela Secretária Nacional de Segurança Pública do Ministério da Justiça, o gerenciamento de crises tem como principal missão alcançar dois objetivos, quais sejam: preservar vidas e aplicar a lei. Quanto à preservação da vida esta inclui a dos reféns, a do público em geral, a dos policiais e a dos criminosos. Já no tocante à aplicação da lei, por esta podemos entender a prisão dos infratores protagonistas da crise, a proteção do patrimônio público e privado e a garantia do estado democrático de direito. Importa frisar ainda que dentre estes objetivos a doutrina considera a preservação da vida mais relevante do que a própria aplicação da lei, sendo que dentre as vidas a serem preservadas a prioridade é em relação a vida de pessoas inocentes. 1.3 Características do Gerenciamento de Crises Ensina Monteiro (1994) que o gerenciamento de crises possui diversas características, sendo as principais: 20 Imprevisibilidade: o evento crítico pode surgir e se desenvolver de maneira inesperada, ou seja, pode ocorrer em qualquer lugar, a qualquer tempo e atingir qualquer pessoa ou instituição. Compressão de tempo: uma vez que a crise gera a quebra de uma normalidade o que acaba por exigir que as providências a serem adotadas sejam feitas urgentemente. Logo, exige-se que as ações sejam desenvolvidas de forma mais célere possível, de forma a providenciar recursos humanos e materiais necessários para o gerenciamento do evento crítico. Ameaça à vida: trata-se de elemento inerente à crise, pois em qualquer situação desta natureza existe ameaça a pelo menos uma vida, ainda que seja a do próprio perpetrador. Ademais, conforme dito anteriormente a preservação da vida consiste no principal objetivo do gerenciamento de uma crise. 1.4 O Gerente da Crise Interpretando-se ainda a doutrina adotada pelo FBI entende-se o gerente da crise como sendo o responsável pela administração e tomada de decisões no teatro de operações. Ou seja, é o comandante do cenário de ação, sendo escolhido geralmente o oficial de polícia mais antigo presente na localidade. É indispensável que este profissional seja dotado de conhecimento essencial à sua atuação como administrador do evento crítico, para que assim suas decisões sejam pautadas e embasadas de maneira técnica. Será o gerente da crise o responsável por administrar a mobilização de todos os recursos humanos e materiais indispensáveis a resolução do evento crítico, sendo ele ainda o encarregado de coordenar as ações a serem desenvolvidas pela equipe de negociação e pelo time tático. Ademais, é de suma importância que o gerente não seja confundido com o negociador, este último que possui a atribuição de estabelecer o contato direto com o perpetrador/causador da crise, para que assim, diante das demandas e possibilidades apresentadas o gerente possa realizar uma análise minuciosa e diante disso tomar a decisão adequada a cada situação. 21 Por fim, salienta-se que essas decisões não deverão ser tomadas de maneira empírica, mas sim, baseada em critérios de ação a serem observados. 1.5 Critérios de Ação Ao desempenhar a árdua missão de controlar a crise, o comandante do teatro de operações, assim como os demais envolvidos neste cenário, se vê diante de situações que exigem um posicionamento, ou seja, uma tomada de decisão. Para que estas decisões sejam tomadas se faz necessária a observância de alguns critérios, denominados critérios de ação. A doutrina de Gerenciamento de Crises do FBI estabelece três critérios de ação, estes que nada mais são do que referenciais que irão nortear a tomada de decisões, das mais simples as mais complexas, em qualquer evento crítico. São eles: Necessidade: significa que qualquer ação a ser desenvolvida só deve ser executada quando for indispensável. Ou seja, caso não haja a necessidade de sua realização não se justificará o ato praticado. Validade do risco: este critério preconiza que para que qualquer ação seja desenvolvida deve-se levar em conta se os riscos advindos da prática da mesma são compensados pelo resultado que se almeja. Este critério é de difícil análise, haja vista envolver fatores objetivos e subjetivos. Aceitabilidade: a aceitabilidade implica dizer que qualquer decisão a ser tomada deve ser embasada em princípios legais, morais e éticos. Ou seja, ações desenvolvidas devem embasa-se no que prevê a lei, a moral, os bons costumes, bem como deve evitar que seja causado qualquer tipo de constrangimentopor violação a valores sociais. 1.6 Alternativas Táticas Durante a crise o gerente terá que determinar a adoção de uma ou mais alternativas táticas de resolução do evento crítico. Salienta-se que estas alternativas podem ser empregadas isolada ou conjuntamente. São elas: 22 1.6.1 Negociação As medidas iniciais a serem adotadas pelo primeiro profissional de segurança pública ao chegar no ponto crítico são: conter, isolar e negociar. Desta forma, percebe-se que a negociação se inicia ainda nos primeiros momentos da instauração da crise, ou seja, deve ocorrer a partir do contato entre o perpetrador e o primeiro interventor. Segundo Monteiro (1994), a negociação é quase tudo no gerenciamento de crises. Sendo assim, deve ser considerada a alternativa mais importante, haja vista ser a menos traumática dentre todas, bem como ser responsável pela solução de aproximadamente 90% dos casos e ainda estar presente durante todo o gerenciamento da crise. O papel do negociador é de fundamental importância no teatro de operações, sendo sua atribuição mais específica a de ser o intermediário entre o(s) causador(es) da crise e o gerente da cena de ação. É através deste que se realiza a conversação entre as autoridades e os perpetradores, visando sobretudo, uma solução aceitável e menos prejudicial possível para todos os envolvidos, direta ou indiretamente. O negociador deve ser voluntário, preferencialmente um profissional com alto preparo técnico e experiência, devendo possuir ainda perfeitas condições físicas e mentais. Será este o responsável por buscar que se ganhe tempo visando que seja diminuída a ansiedade e o estresse do perpetrador, bem como que se aumente a sua racionalidade, cansaço, reduzindo ainda suas expectativas e tentando estabelecer a Síndrome de Estolcomo. São ainda características essenciais de um bom negociador: maturidade emocional, serenidade, ser bom ouvinte e ter boa capacidade persuasiva. Entretanto, cabe salientar que o papel de negociação não se dá por intermédio de uma única pessoa, deve haver uma equipe de negociação a qual deve ser composta por um conjunto de profissionais devidamente preparados para atuar. A negociação pode ser classificada ainda em: negociação real, cujo objetivo principal é convencer os causadores do evento crítico, através do vínculo e da confiança, a se renderem e libertarem os reféns, geralmente sendo a mais aceita por 23 todos; e negociação tática a qual é desenvolvida com fito de preparar o teatro de operações para que venha a ser aplicada outra técnica de resolução de conflitos. 1.6.2 Emprego de Técnicas Não Letais Consiste no emprego de equipamentos de baixa letalidade ou mesmo de técnicas de defesa pessoal, visando a imobilização, incapacitação ou contenção do indivíduo perpetrador. Estas técnicas de emprego operacional consistem na utilização de munições químicas (lacrimogênea, por exemplo), de impacto controlado (elastômero), aparelhos de eletrochoque, até técnicas de imobilização por meio de contato físico entre o agente de segurança pública e o causador da ameaça. É o que ensina De Souza e Riani (2007): As armas não-letais atuam através de ruído, irritação da pele, mucosas e sistema respiratório, privação visual por ação de fumaça e luz, limitação de movimentos através de choque elétrico, e impacto controlado. Essas armas objetivam inibir ou neutralizar temporariamente a agressividade do indivíduo através de debilitação ou incapacitação. (DE SOUZA E RIANI, 2007, p. 7). Cabe salientar, que o emprego desse tipo de tecnologia visa, sobretudo, a não eliminação do criminoso, e sim sua mera incapacitação temporária, com fim de respeitar o principal fundamento do gerenciamento da crise, qual seja: a preservação da vida. Entretanto, de nada adiantará se estes equipamentos de baixa letalidade forem utilizados de maneira irregular, de forma que se faz essencial o respeito às regras de segurança correspondentes. 1.6.3 Tiro de Comprometimento Consiste em uma importante alternativa tática, entretanto sua utilização demanda uma análise minuciosa de todo o contexto da crise, bem como de elementos fundamentais para o alcance de um bom resultado, a exemplo: treinamento, armamento, munição e equipamento. Para Lucca (2002): [...] a aplicação dessa alternativa tática necessita de uma avaliação minuciosa de todo o contexto, sobretudo, do polígono formado pelo treinamento, armamento, munição e equipamento, que são os elementos fundamentais para que o objetivo idealizado seja alcançado. Ser um sniper (atirador de elite) transcende ter uma arma 24 qualquer e uma luneta de pontaria, para acertar um tiro na cabeça. (2002, p. 4). Importante frisar que este tiro de comprometimento ocorre a partir da ação de um atirador de elite (Sniper), o qual deve possuir amplo conhecimento do armamento, bem como de outros fatores determinantes para um disparo satisfatório, devendo para tanto este profissional estar dotado de habilidades e conhecimentos essenciais à sua atuação no teatro de operações. Destaca-se que a ação do atirador de elite só deve ocorrer a partir da autorização do gerente da crise, o qual determinará que o atirador efetue o disparo, visando preservar ou não a vida do criminoso. É o que ensina Lucca (2002, p.109) “O atirador de elite só atua mediante autorização. [...] quando de ordens expressas que lhe autorizem o emprego de armamento, quer preservando a vida do criminoso quer atuando para a eliminação total do risco.” Desta forma, entende-se que a decisão quanto à utilização do tiro de comprometimento é de grande responsabilidade e deve ser efetuada quando o cenário assim a favorecer. 1.6.4 Invasão Tática A invasão tática representa a última alternativa a ser empregada em situações de crises envolvendo reféns localizados, haja vista trazer sérios riscos à integridade física dos envolvidos, sejam eles os reféns, os perpetradores ou os profissionais de segurança pública. Além disso, geralmente essa alternativa só é utilizada quando há a existência de um risco ameaçador para a vida dos reféns, devendo para tanto, antes de sua execução, ser realizado um detalhado estudo de situação e um planejamento exaustivo, no intuito de se obter o sucesso esperado. O time tático, composto por profissionais com alto preparo técnico, deve, durante o desenvolvimento do evento crítico, permanecer em local específico treinando para o caso de ser necessário o seu emprego. 25 1.7 Primeiro Interventor Pode-se definir o primeiro interventor como sendo o primeiro profissional de segurança pública a chegar ao local onde está eclodindo uma situação de crise. Este tem grande importância no processo de solução de um evento crítico, pois possui a delicada missão de estabelecer os primeiros contatos com os causadores do fato, bem como acionar as autoridades competentes. Ademais, dentre as medidas a serem tomadas pelo primeiro interventor encontra-se realizar o isolamento da área, haja vista a imprescindibilidade dessa medida para que se tenha um maior controle sobre o ponto crítico. E ainda realizar a contenção, que consiste em evitar que haja um alastramento da crise. Geralmente, o primeiro interventor na situação crítica é o policial militar que realiza o policiamento ostensivo naquela determinada área, ressaltando assim a importância do treinamento e da disseminação de conhecimento para esse profissional a respeito das medidas a serem adotadas durante este tipo de ocorrência. Pois uma ação bem desenvolvida por parte deste policial pode ser determinante para o desfecho satisfatório da crise. Entretanto, não é o que se verifica na prática, sendo verificada a falta de preparo de grande parte dospoliciais para atender esse tipo de situação, fato este que parece estar sendo modificado com o passar dos anos, haja vista a inclusão de disciplinas voltadas para a disseminação desse conhecimento nos cursos de formação de profissionais de segurança pública. 1.8 Síndrome de Estocolmo A doutrina de Gerenciamento de Crises da SENASP (2008) ensina que se tratar de uma alteração psicológica que se desenvolve em pessoas submetidas à situações de vulnerabilidade, a exemplo de pessoas feitas reféns ou vítimas de sequestro, as quais passam a se identificar de maneira inconsciente com os causadores desse tipo de situação. A situação de sensibilidade e fragilidade leva estas pessoas a desenvolverem sentimento de simpatia, apreço e até mesmo amor pelos algozes das situações as quais estão sendo colocadas. Isso talvez se explique pelo fato de que uma vez as 26 vítimas sendo submetidas a momentos difíceis e de forte tensão emocional, visualizando que suas vidas estão em risco, se apegam a qualquer possibilidade que se apresente como salvação. A referida nomenclatura se dá em razão de um fato ocorrido na cidade de Estocolmo, na Suécia, em 1973, onde durante um assalto a banco funcionários e clientes foram feitos reféns por vários dias. Entretanto, curiosamente, durante o desenvolvimento das negociações, percebeu-se que os reféns passaram a sensibilizar-se com os criminosos, chegando ao ponto de protegê-los das ações da polícia. Além disso, no momento em que os reféns eram liberados um fotógrafo flagrou o momento em que um dos reféns e um dos perpetradores se beijaram e se comprometeram em matrimônio, antes dele ser preso. Tal síndrome pode ser benéfica ao gerenciamento da crise, sobretudo no caso de vir a ocorrer naturalmente, pois dessa forma ficará mais fácil para a equipe de negociação no local desenvolver de uma melhor forma a conversação com os perpetradores, evitando que os mesmos venham a pôr em risco a integridade física ou a vida das vítimas. Ainda que não ocorra naturalmente existem técnicas que estimulam o desenvolvimento da Síndrome de Estocolmo. 1.9 A Mediação de Conflitos na Atividade Policial A mediação de conflitos consiste em um dos métodos alternativos de resolução de conflitos, a exemplo da negociação, da conciliação e da arbitragem. Pode ser definida como um método em que um terceiro, independente e imparcial, coordena reuniões com as partes conflitantes, de forma separada ou conjunta, visando promover o diálogo harmonioso entre elas, possibilitando a reflexão por ambas as partes e a construção conjunta de soluções para a situação cerne do choque de interesses. É o que ensina Vasconcelos (2008, p.36): Mediação é um meio geralmente não hierarquizado de solução de conflitos em que duas ou mais pessoas, com a colaboração de um terceiro, o mediador, expõem o problema, são escutadas e questionadas, dialogam construtivamente e procuram identificar os interesses comuns, opções e, eventualmente, firmar um acordo. [...] Os mediandos não são adversários, mas corresponsáveis pela resolução da disputa. Para o autor os conflitos que melhor se prestam à mediação são os familiares, comunitários, escolares e 27 corporativos, entre pessoas que habitam, estudam ou convivem nas mesmas dependências. Nessa modalidade de resolução pacífica de conflitos busca-se a satisfação das necessidades dos envolvidos, visando que essa se dê através da construção de uma solução pelas partes envolvidas. É uma técnica que vem ganhando espaço dentro das instituições de segurança pública, especialmente na Polícia Militar, uma vez que dentre os tantos papéis exercidos por essa instituição encontra-se a resolução de conflitos, de forma que as instituições de ensino em segurança pública no país têm dado ênfase à construção de conhecimentos que possibilitem que esses profissionais tentem resolver de forma pacífica as ocorrências com as quais se deparem. Tal prática decorre da implantação da filosofia de polícia comunitária e visa que através de um diálogo bem construído e harmonioso quaisquer problemas que surjam possam ser solucionados de forma a minimizar ou mesmo evitar qualquer efeito danoso a quaisquer dos envolvidos. 28 2. REFORMA AGRÁRIA, MOVIMENTOS SOCIAIS, CRIAÇÃO DA COMISSÃO DOS DIREITOS HUMANOS E SURGIMENTO DO CENTRO DE GERENCIAMENTO DE CRISES DIREITOS HUMANOS E POLÍCIA COMUNITÁRIA Neste capítulo iremos conhecer como funcionam e do que se tratam os movimentos sociais e em prol da reforma agrária, a exemplo do Movimento Sem Terra (MST) e o Movimento Terra Trabalho e Liberdade (MTL), estes que frente às invasões de terras promovidas, fizeram surgir um alerta à Polícia Militar no tocante a necessidade de ser repensada sua forma de atuação diante deste tipo de ocorrência, fazendo surgir assim a Comissão Central de Direitos Humanos, que posteriormente passaria a ser chamada de Centro de Gerenciamento de Crises Direitos Humanos e Polícia Comunitária. Será ainda demonstrado o histórico dos Direitos Humanos no mundo, no Brasil, em Alagoas, bem como as estratégias e o trabalho que vem sendo desenvolvido pela PMAL para que o serviço possa ser sempre pautado nesses direitos. Por fim, será trabalhado neste capítulo o procedimento a ser adotado diante de reintegrações de posse de imóveis rurais. 2.1 Reforma Agrária: Conceito, Histórico e Categorias A partir de 1530, no Brasil, com a criação das capitanias hereditárias e da implantação do sistema das sesmarias pela coroa portuguesa, iniciou-se um processo de má distribuição de terras em todo o território nacional, o qual até hoje traz fortes consequências, a exemplo da formação de grandes latifúndios. É diante desse cenário de desigualdade no que se refere à propriedade de terras em nosso país que surgiu a idealização de se promover uma reforma agrária, cuja finalidade é promover a redistribuição das propriedades rurais, para que assim essas terras possam realizar a sua função social. (FRANCISCO, 2015). A tentativa de promover a distribuição igualitária de terras no território brasileiro ganhou força com a criação do Estatuto da Terra em 1964, o qual preceitua que o Estado possui a obrigação de garantir os direitos das pessoas que vivem e trabalham na terra. Vejamos como dispõe a lei nº 4.504/64 (Estatuto da Terra): 29 Art. 2° É assegurada a todos a oportunidade de acesso à propriedade da terra, condicionada pela sua função social, na forma prevista nesta Lei. § 1° A propriedade da terra desempenha integralmente a sua função social quando, simultaneamente: a)favorece o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores que nela labutam, assim como de suas famílias; § 2° É dever do Poder Público: a) promover e criar as condições de acesso do trabalhador rural à propriedade da terra economicamente útil, de preferência nas regiões onde habita, ou, quando as circunstâncias regionais, o aconselhem em zonas previamente ajustadas na forma do disposto na regulamentação desta Lei. (BRASIL, 1964). Entretanto, na prática o que se vislumbra é o não cumprimento deste estatuto, haja vista, por exemplo, a grande quantidade de famílias camponesas expulsas de suas terras diante da aquisição das mesmas por grandes latifundiários. O que se percebe é que a reforma agrária no Brasil caminha a passos lentos, encontrando diversas dificuldades para sua implantação de forma mais efetiva, a exemplo da resistência dos latifundiários, elevado custo de manutenção das famílias assentadas, bem como dificuldades jurídicas. Legalmente as propriedades rurais destinadas à reforma agrária podem ser obtidas mediante o que estabelece a lei nº 8.629/93 (expropriação), no caso de não cumprimento de sua função social, ou ainda através da compra do imóvelrural por parte da União. Conforme ensina Rocha (2013), a Reforma Agrária pode ser classificada em 3 grandes categorias. A primeira delas é a Estrutural, baseada em mudanças estruturais e nas relações de poder decorrente de processos reformistas e revolucionários ocorridos naquela determinada sociedade. A segunda categoria é a Convencional, na qual a reforma ocorre por meio de negociação entre antigas e novas forças sociais, modificando o funcionamento da estrutura agrária, sem no entanto causar grandes modificações nas normas institucionais da sociedade tradicional. Por fim, a terceira categoria é a Marginal que tem por objetivo principal a manutenção do monopólio sobre as estruturas fundiárias e as terras, desenvolvendo assim tão somente uma reparação superficial das desigualdades. Sendo assim, percebe-se que a questão da Reforma Agrária no Brasil é um assunto bastante complexo e muito a ser debatido. De forma que sem sombra de dúvidas acarreta uma série de consequências para diversos ramos da sociedade, dentre eles a segurança pública, conforme poderá ser observado mais adiante. 30 2.2 Conflitos Agrários O conflito está presente em todos os meios sociais. Essa palavra deriva do latim conflictus e é sinônima às palavras choque, embate, luta. No meio agrário não é diferente. É o que expõe Santos (2001): Os conflitos pela posse e propriedade da terra, presentes em todas as regiões brasileiras, são marcados por inúmeros atos violentos, o que significa uma ação generalizada contra as formas de luta pela terra das populações rurais brasileiras. (SANTOS, 2001, p.1). A violência agrária tem se apresentado cada vez mais no dia a dia, tornando-se comum. Entretanto, esta advém desde tempos mais remotos, mais especificamente no período escravocrata brasileiro, a partir das relações de dominação classistas e/ou de grupos sociais, sendo considerado um artifício na tentativa de controle tanto de forma individual como coletivo. Conforme dados alarmantes apresentados no relatório anual da Comissão Pastoral da Terra (CPT) no dia 17 de abril 2017 em Brasília, os conflitos no campo cresceram 26% de 2015 a 2016, o maior aumento dos últimos 31 anos. Subiu de 1.217, em 2015, para 1.536, em 2016. Desse total 1.079 resultaram em algum tipo de violência. Vejamos representação gráfica. Importante frisar que dessa totalidade de conflitos apresentada em 2016, cerca de 1.295 relacionam-se à luta pela terra, 172 são referentes a disputas por água e 69 sobre questões trabalhistas (sendo 68 ocorrências de trabalho escravo). 31 Outro dado de destaque foi em relação ao número de assassinatos no campo, tendo passado de 50 casos em 2015 para 61 em 2016, configurando um aumento de 22% no número de mortes. Além disso, observou-se que o número de pessoas presas decorrentes de conflitos ocorridos no campo saltou de 80 para 228, o que representa um aumento de 185%. Além das ameaças de prisão de passaram de 49 para 265, 441% a mais em relação ao ano anterior. 32 É diante deste cenário preocupante que não se pode negar a importância de se dar ênfase no combate a este tipo de violência exacerbada que vem ganhando força nos últimos anos. Fica exposto diante dos números apresentados que a luta pela terra tem causado o desenvolvimento acelerado do processo de dilaceramento da cidadania no campo, haja vista o vigor existente nas disputas agrárias, surgindo a necessidade, portanto, de ações por parte do Poder Público no sentido não só de prevenir, mas de combater esse tipo de criminalidade. 2.3 Movimentos Sociais em Alagoas Os movimentos sociais caracterizam-se por ser uma expressão da organização da sociedade civil, formada por indivíduos que possuem o objetivo comum de alcançar mudanças sociais através do debate político dentro de um determinado contexto da sociedade na qual estão incluídos. Estes movimentos são encontrados nos mais diversos segmentos sociais e com as mais variadas nomenclaturas. Em Alagoas não é diferente. O Estado possui uma série de movimentos sociais que buscam mudanças de ordem social, sobretudo os que tratam de lutas pela reforma agrária. Podemos citar a título de exemplo o mais influente deles, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), o qual teve seu surgimento em 1984. 33 Dentre as suas características destaca-se a disciplina e organização em suas lutas sociais, as quais têm a premissa de tornar a sociedade mais justa e igualitária através da participação dos trabalhadores e da divisão isonômica de terras. É movido principalmente por trabalhadores que supostamente perderam espaço territorial com a modernização do campo e a introdução de máquinas no plantio e colheita de produtos agrícolas. Vale salientar que os movimentos sociais que visam a reforma agrária em Alagoas afirmam que seu objetivo principal é modificar o panorama de grandes concentrações de terras em posse de poucos, bem como a perda do espaço do camponês para o maquinário agrícola moderno, principais causas do êxodo rural. Conforme dados atualizados de 31 de dezembro de 2017 do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – INCRA, existem atualmente em Alagoas cerca de 178 assentamentos rurais, totalizando 13.002 famílias assentadas em todas as meso e microrrerigões do estado. É o que poderemos verificar no mapa divulgado pelo Governo do Estado, o qual expõe a divisão dos assentamentos existentes no território alagoano. Vejamos: Ilustração 1 – Mapa de assentamentos rurais – Alagoas - 2017 Fonte: http://dados.al.gov.br/dataset/assentamentos-em-alagoas/resource/e7e44edf-5ca3-4276-a029- 95c398f5b99e?inner_span=True Se limitarmos o mapa à área de responsabilidade do Comando de Policiamento de Área do Interior II, poderemos verificar a presença de assentamentos de terra em diversos municípios dessa região, como por exemplo: Quebrangulo, Cacimbinhas, Girau do Ponciano, Traipu, Palmeira dos Índios, Penedo, Atalaia, e a maior delas em 34 Arapiraca. É o que poderemos observar diante do mapa de assentamentos da região e do mapa que expõe a área de policiamento sob responsabilidade do CPAI-II no estado. Senão vejamos: Ilustração 2 – Mapa de assentamentos rurais – CPAI-II – 2017 Fonte: http://dados.al.gov.br/dataset/assentamentos-em-alagoas/resource/e7e44edf-5ca3-4276-a029- 95c398f5b99e?inner_span=True Ilustração 3 – Mapa de área de policiamento – CPAI-II – 2018 Fonte: PMAL (2018). 35 Sendo assim, diante destes dados e ilustrações apresentados percebe-se a necessidade de que sejam adotadas providências no intuito de prevenir possíveis conflitos existentes nesta região decorrentes de disputas de terra e interesses conflitantes entre os movimentos sociais presentes nos municípios e os grandes proprietários de terra, ou, ainda que estas contendas venham a ocorrer, que sejam resolvidas da melhor maneira possível para ambas as partes possivelmente envolvidas. 2.4 Direitos Humanos 2.4.1 Evolução Histórica Ensina Bellinho (2013) que podemos definir, de forma clara e resumida, os Direitos Humanos como um conjunto mínimo de direitos que cada ser humano possui baseado na sua dignidade. São, portanto, uma gama de direitos indispensáveis para a sociedade e as pessoas que ela compõe. Esse tema veio a se desenvolver e ganhar maior relevância ao longo da história, tendo obtido ênfase em determinados momentos históricos, haja vista seus pressupostos e princípios terem por objetivo a proteção da dignidade humana de forma a abranger todos os seres humanos, sem distinção de qualquer natureza. Bellinho (2013) afirma ainda que é ao analisarmos a filosofia de Karl Jaspers que percebemosque ainda no período axial (800 a.C – 200 a.C) o ser humano passou a ser considerado um ser dotado de razão e liberdade, independente de suas particularidades, crenças, costumes, características, etc. Conforme ensina Melina Giradi Fachin (2009) teria sido São Tomás de Aquino, o criador da expressão dignitas humana, afirmando que “a dignidade é inerente ao homem, como espécie; e ela existe in actu só no homem enquanto indivíduo (...)”. Seguindo ainda o que se encontra registrado no texto de Bellinho (2013, p.7), no pensamento do filósofo prussiano Immanuel Kant, têm-se que: a dignidade da pessoa humana não consiste apenas no fato de ser ela, diferentemente das coisas, um ser considerado e tratado, em si mesmo, como um fim em si e nunca como um meio para a consecução de determinado resultado. Ela resulta também do fato de que, pela sua vontade racional, só a pessoa vive em condições de autonomia, isto é, como ser capaz de guiar-se pelas leis que ele próprio edita. 36 Teorias como esta foram de fundamental importância para a evolução dos direitos humanos e os direitos fundamentais, entendendo-se os primeiros como aqueles positivados no plano internacional e os subsequentes como aqueles positivados no âmbito da constituição de um determinado país. Ou seja, diferenciam- se basicamente pelo plano em que estão consagrados. No entanto, foi no final do século XVIII que John Locke, interessado em proteger os interesses individuais em face dos abusos existentes por parte do governo, no período de transição entre do Estado absoluto e o Estado liberal da modernidade, passou a ser considerado o precursor no reconhecimento de direitos naturais e inalienáveis do ser humano, passando a ser considerado indivíduo possuidor de direitos e valor em si mesmo, devendo estar em primeiro lugar face ao Estado. Segundo Bobbio (2004, p.30): os direitos humanos nascem como direitos naturais universais, desenvolvem-se como direitos positivos particulares (quando cada Constituição incorpora Declaração de Direitos) para finalmente encontrar a plena realização como direitos positivos universais. Os Direitos Humanos ganharam maior força quando da transição do Estado Liberal para o Estado Social, quando passaram do conjunto de direitos de primeira geração (civis e políticos), caracterizados por uma ação negativa do Estado, para os de segunda geração (econômicos, sociais e culturais), caracterizados pela necessidade de ações positivas por parte do Estado para se concretizarem. Entretanto, cabe salientar que para que os mencionados direitos viessem a obter consequência universal se fazia necessário uma discussão internacional acerca destes para que pudessem alcançar todos os seres humanos. Bellinho (2013) nos ensina que esta discussão surgiu diante das atrocidades ocorridas nos eventos históricos da 2ª Guerra Mundial, onde a comunidade internacional reconheceu a relevância desta temática, tratando-se, portanto, de questão de interesse e preocupação internacional, ou seja, transpondo fronteiras e envolvendo todo o mundo. Assim, pode-se perceber que os eventos ocorridos durante a Segunda Guerra Mundial representaram o total desrespeito aos direitos humanos e a dignidade humana, sendo o momento de pós-guerra essencial para que houvesse a 37 reconstrução de um sistema de proteção através do alicerce fático que subsidia a criação de um sistema normativo internacional de proteção dos direitos humanos. Foi com a assinatura da Carta das Nações Unidas que se iniciou uma nova ordem internacional que instaurou um novo modelo de condutas internacionais, incluindo preocupações como a proteção aos direitos humanos. Nesse contexto surgiu o pensamento conteporâneo, o qual resultou na inclusão do binômio liberdade-individualismo nas primeiras declarações de direitos da América do Norte e na Declaração Francesa dos Direitos do Homem e do Cidadão. A partir deste cenário passou a se desenhar o esforço na recontrução dos direitos humanos sob a ótica de ser um referencial ético e orientador da ordem jurídica internacional contemporânea, visando essa uma proteção enfática destes direitos. 2.4.2 Direito Internacional dos Direitos Humanos Este ramo do direito surgiu em 1948 após a promulgação da Declaração Universal dos Direitos Humanos. A partir deste fato, o mundo vem assistindo a um progressivo desenvolvimento de diversas ferramentas e uma ampla quantidade de tratados internacionais visando a composição de um forte sistema internacional de proteção dos Direitos Humanos. Ademais, conforme visto anteriormente, o surgimento de um movimento internacional em prol desses direitos e garantias e sua posterior materialização com a DUDH, os diversos tratados internacionais e o surgimento de instrumentos protetores, posteriormente implementados, decorrem da origem histórica de violação de direitos humanos e da dignidade humana, a exemplo dos casos ocorridos no período da Alemanha nazista. Assim, diante da repugnância pelos fatos ocorridos naquela época e com o fortalecimento de uma consciência mundial quanto à necessidade de um sistema para tutelar os direitos fundamentais do homem em nível global, percebeu-se a pertinência da criação de um ramo específico no Direito para tratar desta temática de relevância universal. 38 2.4.3 Criação da ONU A Organização das Nações Unidas (ONU), trata-se de uma organização internacional formada por diversos países que se reuniram voluntariamente em prol da paz, do desenvolvimento mundial e da segurança internacional. Foi fundada em 1945, através da Carta das Nações Unidas, seu documento constituinte, tendo dentre outros objetivos o alcance de uma cooperação internacional no plano econômico, social e cultural, bem como a proteção internacional dos direitos humanos. Com a criação da ONU o processo de universalização desses direitos consolidou-se ainda mais, haja vista as ações realizadas por essa organização intergovernamental buscarem a promoção da defesa dos direitos fundamentais do homem, reconhecendo a dignidade e o valor do ser humano, a promoção das liberdades fundamentais, a igualdade de direitos entre homens e mulheres, assim como entre nações grandes e pequenas, e ainda estabelecendo condições para o repeito às obrigações decorrentes de tratados e outras fontes de direito internacional, promovendo o progresso social e a melhoria das condições de vida das pessoas. 2.4.4 A Declaração Universal dos Direitos Humanos A Declaração Universal dos Direitos Humanos é um diploma legal que foi adotado e proclamado durante a Assembleia Geral das Nações Unidas, em 10 de dezembro de 1948. Foi a DUDH que acabou por inovar o conceito de direitos humanos, introduzindo-o em uma concepção contemporânea, sendo marco inicial do Direito Internacional dos Direitos Humanos, passando a considerar todo e qualquer ser humano como sujeito de direito internacional. Através desta declaração esses direitos passam a ser marcados pela universalidade e indivisibilidade. Cabe registrar o texto do ex-secretário geral das Nações Unidas Kolfi Annan, contido na página 70 do livro Fundamentos dos Diretios de Melina Girardi FACHIN (2009), o qual enfatiza a importância da Declaração Universal dos Direitos Humanos, senão vejamos: 39 [...] a Declaração Universal dos Direitos Humanos, reconhecida pela comunidade internacional e baseada na dignidade e na igualdade de todos os membros da família humana tem o grande mérito de ser o primeiro instrumento legal a reunir um conjunto de princípios que incorporam os direitos e a liberdade do ser humano. Desde sua adoção, a Declaração serve como modelo para instituições nacionais, leis, políticas e prática de governos que protegem os direitos humanos.Tem instrumentos para prover inúmeros pontos de referência a tribunais internacionais, parlamentos, governos, advogados e instituições não-governamentais. Muitos desses instrumentos tornaram-se parte do direito internacional comum, unindo assim todos os Estados, quer sejam signatários de convenções multilaterais de direitos humanos. Assim, o que começou como uma proclamação, não exatamente de união, de direitos humanos e liberdade tem, pelo menos em certos aspectos, adquirido, por meio de práticas do Estado, o status de lei universal. (FACHIN, 2009, P.70). Diante disto é notável a relevância da DUDH como instrumento legal norteador acerca dos direitos humanos e da necessidade de que estes sejam respeitados e elevados ao patamar de Direito Internacional, sendo estes dotados de universalidade e indivisibilidade. 2.4.5 Conferência Mundial de Direitos Humanos de Viena Inicialmente, antes de tratar da Conferência de Viena, cabe-nos pontuar acerca da primeira Conferência Mundial de Direitos Humanos, a qual ocorreu em 1968 em Teerã, no Irã. Teve sua importância haja vista a participação na época de 84 Estados, além da representatividade de organismos internacionais e não governamentais. Em 1993, quase 30 anos depois, veio a ocorrer a segunda Conferência Mundial de Direitos Humanos, esta que foi presidida pelo Brasil e sediada na cidade de Viena, na Áustria. Assim como a primeira, teve grande relevância em decorrência da discussão de importantes assuntos globais e de questões relacionadas a direitos humanos, buscando a reafirmação da universalidade desses direitos. Em Viena foi definitivamente legitimada a indivisibilidade dos direitos humanos, devendo estes serem aplicados nos direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais, além de enaltecer a necessidade de se disseminar os direitos de solidariedade, à paz, ao desenvolvimento e aos direitos ambientais. 40 Foi, portanto, um marco evolutivo em relação à Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, tendo a participação de mais de 180 Estados-membros da ONU. Assim, entende-se que a Declaração de Viena renovou e ampliou a universalidade e a indivisibilidade dos Direitos Humanos, iniciada em 1948, por meio da proclamação da interdependência existente entre os Direitos Humanos, a democracia e o desenvolvimento econômico, indicando assim a democracia como regime político mais compatível com a necessária proteção aos Direitos Humanos. 2.4.6 Direitos Humanos no Brasil Desde a colonização portuguesa por volta do ano de 1.500 o Brasil passou a sofrer diversas consequências no que se refere à desigualdade, tanto do ponto de vista econômico como social. Estas desigualdades perduraram ao longo da história e existem até os dias atuais. Ademais, outros eventos históricos evidenciam momentos de disparidade entre pessoas, a exemplo da dizimação da população indígena e a implantação do trabalho escravo em solo brasileiro. Momentos estes citados, que somados a tantos outros, se analisados atualmente, revelam uma série de violações de direitos humanos e de garantias fundamentais. Entretanto, apesar da historicidade das violações e desrespeito aos direitos humanos no país, foi somente em tempos recentes que as discussões acerca das necessidades de desenvolvimento de ações e legislações que busquem a promoção desses direitos ganharam força. Freire (2011) ensina que os debates acerca dos direitos humanos somente ganharam espaço nas agendas dos movimentos sociais e dos governos a partir do século XXI. Entende-se que foi somente no final do século XX que, através da promulgação da Constituição Federal de 1988, foi restabelecido o Estado Democrático de Direito, surgindo assim uma série de prerrogativas constitucionais no tocante a garantias individuais e coletivas. Foi através da Carta Magna que uma série de direitos humanos foram positivados, havendo assim um avanço. No entanto, este progresso não evitou a contínua violação desses direitos. 41 Entretanto, embora não seja possível medir com exatidão o nível de respeito aos direitos humanos que passou a se ter no Brasil, pode-se afirmar, através da análise dos debates sobre essa temática, que foi a partir do Programa Nacional de Direitos Humanos – PNDH que houve a redução da tolerância à impunidade e às violações desses direitos (PINHEIRO, 1998; MESQUITA, 1998). 2.4.7 Programa Nacional de Direitos Humanos Foi no governo do então Presidente da República Fernando Henrique Cardoso que se criou o Programa Nacional de Direitos Humanos, em maio de 1996. O surgimento deste programa veio a ser alavancado pelo ocorrido em El Dourado dos Carajás, episódio em que houve um confronto entre polícias e civis, resultando na morte de dezenove trabalhadores rurais. Este programa ao ser lançado tinha por objetivo inicial a proteção e promoção de direitos humanos na América Latina, através de uma parceria firmada junto à sociedade civil. Salienta-se que de fato o PNDH deu resultados satisfatórios, passando a ser considerado marco referencial durante o governo de FHC. Dentre os objetivos citados o PNDH tinha como propósito a limitação, o controle e a reversão das grandes violações ocorridas no Brasil, implementando-se assim as recomendações oriundas da Conferência Mundial de Direitos Humanos de Viena. O programa foi, portanto, uma importante medida adotada e que veio a fortalecer uma mudança acerca da concepção sobre direitos humanos, passando a sua implantação a ser momento marcante de defesa dos direitos humanos no Brasil. A partir do governo de FHC e por meio do PNDH o governo federal, assim como os estados-membros da federação, viram-se obrigados a proteger não somente os direitos humanos existentes nas constituições, federal e estaduais, mas também àqueles definidos em tratados internacionais reconhecidos e seguidos pelo Brasil. 42 2.4.8 Direitos Humanos na PMAL O ensino sobre Direitos Humanos no país já é uma realidade a alguns anos. É o que pode ser vislumbrado nas faculdades e universidades brasileiras, assim como nos cursos de formação em segurança pública. Em Alagoas não é diferente, de forma que o ensino sobre essa temática tornou-se uma realidade nas bancas acadêmicas dos cursos promovidos pela Polícia Militar de Alagoas, sejam os de formação, ou ainda os de especialização, o que proporciona uma maior qualificação e preparo dos profissionais para atual realidade. Segundo Prado e Nascimento (2011) que foi em 1996 que surgiu o primeiro Curso de Direitos Humanos da corporação PMAL, onde foram criadas duas turmas, uma para oficiais e outra para subtenentes e sargentos. Inicialmente teve duração de um mês, passando no ano seguinte a ser de quatro meses o tempo para conclusão, além de exigir a elaboração de uma monografia como requisito para aprovação. Momento marcante se deu quando houve a participação dos então alunos do curso na II Conferência Nacional de Direitos Humanos, promovido pela Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados em Brasília/DF. Ensina ainda Prado e Nascimento (2011) que em 1997 foi criada a Comissão Central de Direitos Humanos - CCDH, através da Portaria Nº 015/97-CG de 30 de Abril de 1997, a qual tinha como principal missão assessorar o Comando Geral da PMAL em assuntos relacionados à direitos humanos. Cabe registrar ainda que em 2003 a Polícia Militar de Alagoas foi contemplada com o Prêmio Nacional de Direitos Humanos da Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República, na categoria Segurança Pública. Esse prêmio foi de grande valia para a corporação, tendo em vista ser uma forma de reconhecimento aos investimentos feitos pela instituição no tocante à capacitação e educação de seus profissionais no que se refereaos direitos humanos e à sua aplicabilidade no serviço desempenhado. Desde então, a corporação tem sido reconhecida como uma polícia cidadã, de forma que tem sido dada continuidade à promoção de cursos voltados para essa 43 doutrina, assim como busca-se o incentivo aos policiais militares para que realizarem cursos em instituições co-irmãs por todo o país, como forma de reforçar o preparo desses militares. 2.5 Criação do Centro de Gerenciamento de Crises Direitos Humanos e Polícia Comunitária na Polícia Militar de Alagoas Conforme visto anteriormente, em 1997 foi criada a Comissão Central de Direitos Humanos, com principal função de assessorar o Comando Geral da PMAL em assuntos relacionados à direitos humanos. Além disso, essa comissão possuia como missões precípuas a promoção de políticas internas de divulgação, conscientização e informação sobre direitos humanos, bem como o desenvolvimento de programas de aconselhamento e acompanhamento de policiais militares envolvidos em aspectos relacionados à violação de direitos humanos. Desde a sua criação trouxe notoriedade à Alagoas no âmbito nacional, tornando a Polícia Militar alagoana um sinônimo de polícia cidadã, tendo desenvolvido atuações consonantes com o PNDH. Ademais, foi esta comissão a responsável por uma série de trabalhos de grande importância no cenário estadual, como por exemplo a participação no Fórum de Defesa da Criança e do Adolescente, com o propósito de diminuir atos infracionais e situações de risco social de meninos e meninas das ruas de Maceió; propor formação de agentes sociais para atuar junto a este público; participar do processo de transferência de famílias moradoras da favela do Cibrazem, no bairro do Jaraguá, buscando que essa mudanças se desse com o mínimo de prejuízos possíveis; dentre tantas outras ações. Diante desse destaque, em 2001, quando da aprovação da Lei de Organização Básica da PMAL, no dia 19 de abril, a Comissão Central de Direitos Humanos passou a ser chamada de Centro de Gerenciamento de Direitos Humanos e Polícia Cominitária – CGDHPC, passando assim a se tornar de forma oficial órgão de assessoria do Comandante Geral. Com o advento da Lei nº 6.399 de 2003, o então CGDHPC passa a ser denominado de Centro de Gerenciamento de Crises Direitos Humanos e Polícia 44 Comunitária - CGCDHPC, sendo acrescentada a expressão “Crise” à nomenclatura, haja vista ser esse órgão da PMAL o responsável por lidar com os eventos críticos ocorridos no estado. Neste cenário, o CGCDHPC passou a possuir diversas atribuições, as quais estão devidamente destrinchadas no artigo 84 da lei nº 6.399/03. Vejamos: Art. 84 - O Centro de Gerenciamento de crises, Direitos e Humanos e Polícia Comunitária (CGDHPC) é o órgão responsável pelo assessoramento ao Comandante Geral no desenvolvimento da política institucional de direitos humanos, gerenciamento de crises e na polícia comunitária, cujos encargos estão distribuídos em cada campo de atuação nos seguintes termos: I - Direitos Humanos a) estabelecer doutrina nas questões de direitos humanos. b) desenvolver estudos e programas voltados para a conscientização dos direitos humanos nas relações internas e externas da Corporação; II - Gerenciamento de Crises: a)antecipar-se, preventivamente, ao emprego da tropa regular nos conflitos urbanos e rurais, sequestros, rebeliões, motins e outras formas de manifestações criminosas com presunção de desdobramento de violência; b)conduzir negociações, de modo a garantir a aplicação da Lei sem o emprego da força e sem deformação da dignidade humana. III - Polícia Comunitária - Coordenar e apoiar as ações do Comando voltadas para o desenvolvimento e aprimoramento da filosofia de polícia comunitária na Corporação. Quanto à sua composição, é no artigo 85 do referido diploma legal que encontramos a constituição deste importante órgão da PMAL. Art. 85 - O Centro de Gerenciamento de Crise, Direitos Humanos e Polícia Comunitária tem a seguinte composição: I - Diretor; II - Núcleo de Gerenciamento de Crise; III - Núcleo de Direitos Humanos; IV - Núcleo de Polícia Comunitária; V – Grupo de Apoio Administrativo. Ademais, conforme o artigo 86, são competências do Diretor do CGCDHPC, dentre outras: Art. 86 – [...] I - assessorar o Comandante Geral em todos as ações da Polícia Militar que tratem especificamente de direitos humanos, gerenciamento de crises e polícia comunitária; III - representar o Comandante Geral nas reuniões e assembléias do Conselho Estadual de Direitos Humanos; IV - promover e disseminar conhecimentos, instruções e informações sobre direitos humanos na Corporação, em perfeita sintonia com a 3.ª Seção do Estado Maior Geral e Diretoria de Ensino; 45 VII - desenvolver ações preventivas, em parceria com órgãos governamentais e não-governamentais, com a finalidade de gerenciar a atuação pacífica da Polícia Militar nos diversos tipos de conflitos; X - desenvolver programa de aconselhamento e acompanhamento de policiais militares envolvidos em aspectos relacionados aos direitos humanos, em parceria com o Centro de Assistência Social da Corporação; XI - propor exames psicológicos e profissiográficos, visando uma melhor alocação de policiais militares, inclusive sugerindo transferências e relocações; XV - buscar meios que permitam a participação da comunidade nos assuntos de segurança pública. Sendo assim, percebe-se diante do que foi apresentado, bem como da legislação citada, a grande importância deste órgão, face à sua atuação indispensável nas situações envolvendo a garantia e promoção dos direitos humanos, eventos críticos e nas ações que dizem respeito ao policiamento comunitário, de forma a se consagrar como essencial ao assessoramento do Comando Geral da corporação e como importante parceiro da segurança pública. 2.6 Procedimentos Adotados para o Cumprimento de Mandados Judiciais e Reintegração de Posse De acordo com Lima Neto (2011) as questões que envolvem reintegração e manutenção posse, assim como mandados judiciais, vêm ganhando aperfeiçoamento dentro da Polícia Militar de Alagoas. É o Núcleo de Gerenciamento de Crises do CGCDHPC, previso na Lei de Organização Básica da PMAL no artigo 85, II, o setor responsável por lidar com essas situações. A atuação da Polícia Militar em assuntos agrários busca a aproximação cada vez maior entre as pessoas que lutam em prol de uma Reforma Agrária dentro do estado de Alagoas e as instituições de segurança pública, ou seja, do próprio Estado. É, portanto, uma estratégia que tem, dentre outras finalidades, evitar que haja qualquer tipo de desentendimento que gere uma situação de violação dos direitos humanos, de forma a tentar solucionar qualquer tipo de problemática por meio do diálogo e das formas mais pacíficas possíveis. 46 No que diz respeito aos procedimentos a serem realizados durante o cumprimento de requisição judicial de reintegração de posse, foi criada uma doutrina que descreve as ações a serem desenvolvidas, desde o recebimento do mandado judicial até o seu efetivo cumprimento. Essa sequência de ações nos é ensinada por Prado e Nascimento (2011, p.70). Vejamos: a) Recebimento do mandado judicial pelo cmt geral; b) Contato com o oficial de justiça para agendamento; c) Contato com as autoridades envolvidas; d) Contato com os movimentos sociais citados; e) Reunião com os movimentos sociais, incra e proprietário; f) Visita à área em litígio com o of. De justiça; g) Negociação para cumprimento do mandado; h) Acompanhamento e segurança da desocupação; i) Conclusão atestado em certidão (of. De justiça); j) Confecção de relatório (cmt geral, juiz, incra). Sendo assim, observa-se que a partir
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