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Revista Superinteressante nº 354 2015_11 - CEREBRO MANUAL DO PROPRIETARIO

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~ r~NVEST 008 
• 
DA SUA 
----------------------------·· ----------------+ 
DEIXE O EDITAL SENAI SESI DE 
INOVAÇÃO SER O SEGUNDO. 
• PRIMEIRA PAGINA -.DA MESA DO EDITOR 
Apicanha 
e o Universo 
A FERRAMENTA mais potente 
do mundo é essa massa 
gosmenta que fica entre 
as suas orelhas. Ela pesa 
o mesmo que uma picanha 
bovina, pode ser erguida com 
uma só mão, e ainda assim 
cabe um universo inteiro 
dentro dela. São 86 bilhões 
de neurônios, conectados entre 
si por 100 trilhões de sinapses, 
o que resulta num número 
infinito de caminhos diferen-
tes para um impulso nervoso 
percorrer. Dessa infinitude 
emerge toda a espetacular 
diversidade humana. 
As pinturas rupestres de 
Lascaux,ostextos sagrados 
das religiões antigas, os 
afrescos da Capela Sistina, 
as leis de Newton, as sinfonias 
de Beethoven, as canções dos 
Beatles, os toques de bola de 
Pelé, o design do iPhone, o 
roteiro de Breaking Bad - cada 
Foto Ou lia 
uma dessas maravilhas surgiu 
na escuridão de algum cérebro 
humano. Inteligência, memó-
ria, percepção, humor, amor, 
consciência, emoção, intuição. 
Cada uma das mais profundas 
capacidades que nos definem 
se origina ali. 
Ao longo da história, 
o cérebro humano desvendou 
os mais íntimos segredos da 
matéria, a lógica da vida, os 
confins do Universo, a bilhões 
de anos-luz daqui. É impres-
sionante que um órgão de pou-
co mais de 1 quilo na cabeça 
de um primata sem pelos de 
um planeta da periferia de uma 
galáxia qualquer tenha 
compreendido tanto. Mas é 
impressionante também que 
falte tanto para o cérebro 
humano compreender do 
próprio cérebro humano. 
Nossa complexa máquina 
de entender coisas é complexa 
demais até para 
ela própria. 
Aqui na SUPER, 
nosso trabalho 
é alimentar o seu 
cérebro. Natural que, 
ao longo dos anos, 
tenhamos produzido 
dezenas de grandes 
reportagens sobre 
o próprio cérebro 
e suas capacidades. 
As mais marcantes 
entre elas estão nesta 
edição. Espero que 
o seu cérebro goste. 
Denis Russo Burgierman 
DIRETOR DE RE DAÇÃO 
DENIS. BURGIERMAN@ABRIL.COM. BR 
EDITORA~ Abril 
Fundada t m 1950 
VICTOR CIVITA ROBER'TO Cl\lTA 
11901·19901 (19;6.2013) 
Conselho Editorial: Victor Ci\,ita Neto (Presidente/. 
Thomaz Sou1o Corrêa (Vicc·Presidenlc). Euripcdcs A cãn1ara. 
Giancarlo Civi la e José Rober1o Guzzo 
Pre1lde.nt e. Abril Míd~: Giancarlo Ci\'il3 
Presidente Editora Abríl: Alexandre Caldini 
OirtlorCommial: Rogério Gabriel Comprido 
Dire.torade.Vt ndtls de Publicidade: Virginla Any 
Diretor de Vendas para Audlf nda: Dimas ~'l i cito 
Diretor de Marktt ing: Tiago Afonso 
DiretorõlOigital e Mobilt: Sandra Can·alho 
Diretor dtApoloEditorla l: Ed\\'ard Pimenta 
Diretor~·Suptrintendenl e:Aiccsandra Zapp:uoli 
Diretor dt Relb (.\o: Otnis Russo Bu~imtan Diretor de Ar1e: f abricio \liund~ 
R.tda:Ot-dMtfe: Ak:undrt \'tr'S~;n.mt Editores: Bruno GaranonL K.1rln llutck. Tbgo Jokur3 
Editor de Arte: JorgtOll\'tiro. l>flJgnt:rs: Brurut Lor.t,FU\ tll Pes.soat lnat:l Kep;lll Rfpórte:r. 
úsmíb AlmtidJ Rl!dn SO<Wit.: luca.4i P415Cjual ~11uts Zlrruner Mmnin' Est.tgUrios: 
AM luísa Ftrnandts.l.ton.1tdo Ramlres SaniOSe lutai Muniz Rapli\IJI Prodt.rtor Grí lko: 
Andcr$on C. S.dC' Fam Col.lbora(.lo: Ale.undre Cal'\~lho (mi~) Altndimtnlo .o Leitor. 
Carolln.J C.uob~ 5.1ndt:~ l f3d!ch. Sonb Santos. W.tlkirb G10r;mo Poot Adrnini:nratrvo: 
Crisli.lt.e Ptrtir.a (cootdtrrudor.J). Dtbor:lh Sib'a (auxiliar admlnbtu1n'1). Grie'C' Kt!l) 
Al\"!:5 (aprtadlz) Gmn!t de "cg6dos Oigiuis: M:tmnnt t\~híhlta ~tntts eM Produto: 
Prdro \formo t Renata Comes de Agu1.1r ANfrtt.u de Produto; Ebuu~ Cnsll11.1 dos 
s.n,.. < l<o1>1m lkm.lnlo D<slgotn: O:mllo Bnp. 11:'-" M<mr>. SUnon< lllrWnOIO 
~ Fdi;>< Tbirou< O......ol...,.n10: Aoo!"""' R<mto Poll Cah Fdu. llrnls \" 
Russo. Eduardo Bo~ Ftrr~n. Elton Prado bt~gUrios::: O;an1tl lto f \'inlou~ ArrvdJ 
www.Juptrin1eressan1e..com.br 
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~www.olbrikonteudo.(om.br oultguep.1nt(11)m0·1l81 . 
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CMod.>. -~ • ~~ Cruuno ""- ll'o""""'~ lml.rb Sm.'b CTtmOiop 
' Ttkoxn~ joa;u<s ~ I_.IL Raqod lo>;> CS.Ud<. E>porl< < f.t"'"<'c>L Sd.,. 
Soc.'111 (6rM de Conwmo). \\lWm I~ (l'raru.por.t t Mobi.i!d.WrJ VOIOAS PARA AU· 
Olb<CIA - M>l)oo G<>r..odo Cl'!oasioiL Cbõi> ObctdlltO.-N>çlo Ew><i'ft=.c.lSL 
Dl<.Cb \'>da CSACl. l<a. .. f:<!.., iCirnolaçlo \ ep,IX<SI)-1<1. U<l Si.'u C\"...W ~~ 
0;1$). Mm» Tullo ArJ.bt tEszudío dt C~~ Ml t)' \ms (\ft1it.H Corpo:l:r\""11). RoCt110 
0...4J> !Nus.""'~ " ".boa l"""' i\"Cid» ~~ MAJU(ffiliG - Aodr<• Abc:lon 
(\ 'fi). Alld:a Cosa (~r~ dt \!nado~ Ciw Al:Ddd.l!Ea'Df1,. Cuol1na Bt:r1t!lt (fftn· 
ln!Ju:i\. t\tib Ardpmt (U!OI)It~ ~Urda AQno (Abnl B!J 0~"). Ro:do P.d.n~ t\f.u\tt 
1q t E\-mtos}. OIGifAL E MOIILE - Adria» Bonolooo ~!ttnc:u). Al.no:t l..o;lc1 (Tt"''\Jm. 
áü). \t&.-m Franmcdni llmrlrmmtaçio dt Tmdmc::m). Rodn,:u Muun\ (Rtdrs Soda") 
APOIO - ASRIL BRAHCEO COtlTENT - 0Jgmtr StTp;t. Ni\11 ~llllttllo, \lallhN Sh!n~ 
Patricia 1-llrgre.i\tS, Thitago Araújo PLAtU.JAMEIHO CONTROLE E OPERAÇ0ES -
&hl)()ll Soarrs (Rt'Cti14S), José PauSo Rando (Marktting f Contrudo) DEOOC e ABRIL 
PWS- Ekrlltt Ftmri A!CUIISOS HUMANOS - Al<swxirll d< Cas!to ill<•tmokim<rl'> 
Orpnludonal}. \Urtto Nl.Sdmtnlo (Rt.muntração t Btnefinos), Milnzttc Ambr:m. 
Mkbdle Cosb t Rtpr\.3 Cordrito lCon.st~J:on.a lr.ltt'N). An.1 Kob.l (~udt t Stn"I\011 
~ e CormpondMcil: A\. d.u t\"I(Ots Cnida.s. m 1. 2tr ar.d.u, Plnhnto\, Slo 
P>ulo. SP. CEP05•25·90l. ld. (li) J03i·2000. PI.COdcladr SOo....., • ..,.,_ uobrt 
rtptt:S«~twtsdt~nolm.il eno E.cltrior.ll"'.-publbbrilrombc 
SUPERIU TERESSAIRE cdfçto n•lH (ISS!\ 01~· 17S9). ~o 29. n• 11. ê uma publicaçlo 
da Editora Abril1937 G+l Eip.ma S.A ~.\IU)' Inlctt:S3ntt~ r.\ tuilo lntMSSanle1. Espa· 
nha. Edi(6H antetiocn: Vmda etdu$1\'1.1. m bancu. pelo pctÇO da ühlma Ntç:\o tm bane~ 
Soli<il<ao"" """lriro. Dl>inbuld.J"" IOdo o p.úsprb DinopS.A. O.>lnbuldor:ll'odorul d< 
PllbUCI(Ilts. 5.lo 1\lulo. SUPERINT!JIESSAIITE não odml~ publiddadr otdaâon:!l 
Se...Aço .oAUNtltt: Gr~ Sio Pau5o:(11} S017·Z11l 
Dtmais kK,t,licbdts: OID0-77S·Z11Z-.• Ílw(.com 
,,.n ,.Si.!Nr. Grow!t Uo hu~(11) J J.1 7·2121 
DtrNk kK.IIicbdn: OI00-77S·Z&21 ~ninubril.com.br 
IWRU U I~ GIÚ.flCAASRIL 
A\'. Ot.a,iano Al\t:S dt Uma. .uoo. frt;utsia do Ó, CEP02909·900. Slo l~ulo. SP 
11/(. 
!?fJ Abril MloiA s.A. 
Pmidrn1o: Giancarlo Ci\ila 
Din:to r·Suptrlntendtntt da Gro\fiu: Eduardo Costa 
Direlor d• Fin.~"'•s: Fábio PCirossi Gallo 
Dirt tora Jurldicil : Mariana ~lacia 
Diretora de Rtc.unos Humanos: Claudia Ribeiro 
Diretor de TI e Serviços Compartilhados: Claudio Prado 
www.abril.com.br 
... 
CARDÁPIO I -+NO VEM BR O DE 2015 
PERGUNTAS E RESPOSTAS 
6 7 8 
U M LA DO C UIDA DA 
RAZÃO , E OUTRO, 
DA EMOÇÃO ? 
SÓ USAMOS 10% O CÉREBRO COMEÇA 
A MORRER DEPOI S 
DOS 17 AN O S? 
ÚLTIMA PÁGINA 
66 NA CABEÇA DOS BICHOS 
O ser humano está longe de 
ter o maior cérebro. 
o 
N ÚMERO 
INCRÍVEL 
1_00 
trilhões 
Número de 
conexões 
entre os 
neurônios no 
cérebro. 
P. 51 
10 Inteligência 
O que é? Existe mais de um tipo? Será que os 
testes de Ql dizem mesmo quem tem mais? 
16 Eu: quem é esse cara? 
Cientistas e fi lósofos afirmam: não existe 
consciência. Ou ela está em todo lugar. 
24 As mentiras que o seu 
cérebro conta para você 
O que nós vemos não é real. E o que 
pensamos já foi decidido antes. 
30 Minha vida sem foco 
Um relato pessoal do transtorno de 
déficit de atenção e hiperatividade. 
44 A pílula da inteligência 
Repórter da SUPER tomou o modafinil 
por uma semana e conta como foi. 
46 A cura pela palavra 
Veja quais são os tipos de psicoterapia 
e o que a ciência tem a dizer sobre eles. 
56 Os maiores 
cérebros do mundo 
Os savants juntam problemas mentais 
sérios com superpoderes cerebrais. 
62 Papo cabeça 
Será que a neurociência explica tudo? 
Alguns pesquisadores dizem que não. 
Capa Carlo Glovani 
, 
E VERDADE 
QUE UM LADO 
, 
DO CEREBRO 
CUIDA DA 
.._, 
RAZAO, E QUTRO, 
DA EMOCAO? 
M A IS OU M E NOS. M A I S P ARA M E NOS . Tradicio-
nalmente, o lado esquerdo era relacionado a funções 
precisas; o direito, à criatividade. Mas, na prática, a 
coisa não é bem assim. 
Considere, por exemplo, o caso de dois rapazes acom-
panhados pela neurocientista Mary Helen Immordi-
no-Yang, da Universidade do Sul da Califórnia. Eles 
perderam metade de seus respectivos cérebros: um teve o 
hemisfério direito cirurgicamente retirado para controlar 
a epilepsia e o outro tirou o esquerdo, como prevenção a 
uma doença autoimune. Eles continuaram sendo capazes 
de andar, falar, raciocinar e interagir socialmente - o que 
seria impossível se houvesse uma divisão absoluta de 
tarefas entre os hemisférios cerebrais. 
"O que nós estamos vendo é que a atividade dos 
neurônios é sempre probabilística", diz Miguel Nico-
lelis, neurocientista brasileiro da Universidade Duke 
(EUA) - e criador do exoesqueleto da Copa. "Não são 
sempre os mesmos neurônios que produzem a mesma 
ação." Ele acredita que a divisão tradicional deve cair, se 
mais pesquisas confirmarem a versatilidade do cérebro. 
6 SUPER NOVEM BRO 2015 
0 
MITOS 
O cérebro é um órgão 
ainda misterioso, 
sobre o qual circulam 
concepções erradas e 
até lendas urbanas. 
Veja a seguir o que é 
mito ou realidade. 
o 
Ilustrações Guilherm e Oareuo 
P&R 
Nós só usamos 10% do cérebro? 
OLHA, VOCÊ PODE TER MUITOS DEFEITOS, mas está 
livre dessa culpa: os tais 10% são pura lenda. "Sabemos 
que grande parte do cérebro é utilizada. Isso explica por 
que até microlesões cerebrais podem causar danos graves 
e irreversíveis", diz o neurocientista e pesquisador do Hos-
pital Sírio-Libanês, Erich Fonoff. Quantos por cento então? 
"Atribuir um percentual é leviano. Para isso, teríamos que 
saber o que são os 100%. Ainda não chegamos a esse nível". 
Especialistas dizem que o "mito dos 10%" surgiu entre 
os defensores da para normalidade. Para eles, utilizar 100% 
é exclusividade de quem levita, lê mentes e entorta garfos 
a distância, enquanto atividades do dia a dia limitam o 
resto de nós a apenas um décimo da "força do pensamen-
to". Bom, não apenas o suposto cálculo foi puro chute, 
como a ciência nunca provou a existência de telepatia, 
telecinese e fenômenos afins. 
Mas e aqueles exercícios de aumentar a potência do 
cérebro? São mentira também? Nem todos. "O sistema ner-
voso é plástico. Se for estimulado, aumenta o seu potencial 
colossalmente", diz o chefe do laboratório de Neurociências 
do Instituto de Biociências da USP, Gilberto Xavier. 
O CÉREBRO É CINZA? 
QUANDO SE FALA EM CÉREBRO, todo mundo logo 
pensa em "massa cinzenta". Tudo bem. pode conti-
nuar se referindo ao cérebro assim. Afinal, o termo já 
entrou para o vocabulário popular. Além do mais, ele 
não está inteiramente incorreto. Existe uma parte do 
cérebro que até os neurologistas chamam de massa 
-ou substância- cinzenta. O nome veio de como ela 
foi descoberta: por anatomistas, em autópsias. Um 
cérebro morto é cinzento. 
Enquanto vivemos, no entanto, nosso cérebro não 
é cinza Se pudéssemos observar o órgão em pleno 
funcionamento, o que veríamos seria uma massa de 
coloração apenas esbranquiçada, bem clarinha e bri-
lhante. "Essa aparência se deve aos fluidos e ao mate-
rial gorduroso que envolve o cérebro humano", diz a 
médica Márcia Lorena Chaves, do Departamento de 
Neurologia Cognitiva da Academia Brasileira de Neu-
rologia (Abneuro). Ainda que o órgão fosse partido ao 
meio e visto do lado de dentro, a cor cinza não daria as 
caras. No máximo, você observaria um tom levemente 
rosado, por causa da incrível vascularização sanguínea 
que irriga cada milímetro de nosso "disco rígido". 
Rigidez, por sinal, é outro mito sobre o cérebro 
humano. Muita gente acredita que ele seja mole e gos-
mento, mas na verdade é bem firme- uma consistência 
semelhante à do tofu. 
)UNHO 2015 SUPER 7 
P&R 
, 
E VERDADE 
, 
QUE O CEREBRO 
COMEÇA 
A MORRER 
AOS 27 ANOS? 
A DUR A RESPOSTA É S IM. Sob O aspecto neuroló-
gico, a morte começa aos 27 anos. Quem descobriu foi 
o pesquisador Timothy Salthouse, da Universidade da 
Virginia, nos EUA. Em 2009, ele divulgou os resultados 
de um estudo que mediu as habilidades cognitivas de 
2 mil pessoas. Segundo Salthouse, o cérebro humano 
atinge o auge aos 22 anos, fica estável até os 27 e, a partir 
daí, começa a declinar. Aos 30 anos, várias funções do 
cérebro já estão bem mais fracas. Isso acontece porque, 
do ponto de vista evolutivo, ao virar "trintão" você já 
deveria ter se reproduzido e completado seu ciclo de vida. 
Lembre-se, por exemplo, de que os homens das cavernas 
não viviam muito mais do que 30 anos - e que, pelo 
menos anatomicamente, nosso cérebro é igual ao deles. 
Mas não precisa entrar em pânico. Esse mesmo estudo 
revelou também que algumas habilidades, como a verbal, 
continuam se desenvolvendo até os 6o anos de idade. 
Para tudo aquilo que exige conhecimento cumulativo, 
seguimos ampliando nossa capacidade. E tem mais: a 
ciência tem cada dia mais controle sobre o envelheci-
mento. Alguns cientistas afirmam até que, em 50 anos, 
nem vai haver mais definição para expectativa de vida, 
de tanto que as pessoas passarão a viver. 
8 SUPER N OV EM BR O 201 5 
LADEIRA ABAIXO 
Quando você completa 30 anos, 
seu cérebro já apresenta uma 
sensível queda de desempenho. 
MEMÓRIA 
-17% 
VELOCIDADE MENTAL 
-27,3% 
RACIOCÍNIO LÓGICO 
-37,5% 
o 
l lustr~ ç~o Gullharme O~rezzo 
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.Abril 
assinaturas 
A 
O que faz uma pessoa ser mais inteligente que outra? Quais são os 
limites do cérebro? Dá para aumentar o poder da sua mente? Você vai ver 
as respostas para essas e outras questões nas próximas páginas. 
E a viagem começa com a pergunta fundamental: o que é a inteligência? 
Texto Rodriqo Rezende Ilustrocõo Mariana Sal i mena 
GANHAR UMA PARtiDA de xadrez, escrever um ro-
mance, compor uma sinfonia, convencer uma mul-
tidão, contar a piada perfeita. São coisas que vêm tão 
rápido à mente quando se fala de inteligência quanto a 
imagem de um relógio se movendo ao pensarmos no 
tempo. Mas experimente gastar um ou dois minutos 
refletindo sobre o que há de comum entre essas ha-
bilidades. De uma hora para outra, a ide ia clara que se 
tem da inteligência começa a se dissipar. Quanto mais 
se pensa, mais parece não haver ligação direta entre 
raciocínio matemático, criação de personagens e melo-
dias ou talento para persuasão e comédia. Refletir sobre 
a inteligência desse ponto de vista gera uma sensação 
semelhante à que temos ao ouvir a pergunta "O que é 
o tempo?" Antes da pergunta, sabemos exatamente o 
que é. Depois dela, não sabemos mais. Se quisermos 
entender o que é a inteligência, é preciso contornar esse 
tipo de dificuldade. E uma boa estratégia para isso é ir 
direto à fonte: entender o cérebro. 
Agora mesmo uma tempestade elé trica se alastra 
pelo 1,4 quilo de massa gelatinosa aí atrás da sua testa. 
É esse movimento caótico de sinais por uma rede de 86 
bilhões de neurônios que produz seus pensamentos. 
Das profundezas desse órgão, surge o que chamamos 
de inteligência. Mas, se você pensa que o processador 
de informações mais avançado do Universo foi pro-
jetado de um jeito elegante, está enganado. O cérebro 
humano é uma obra feita nas coxas.-t 
NOVEMBRO 2015 SUPER~~ 
Uma obra que começou em vermes 
microscópicos, quando um punhado de 
células especializadas em enxergar se 
juntou numa das extremidades do bicho. 
Foi assim que surgiu o ancestral daquilo 
a que chamamos cabeça: um mero recep-
táculo de células nervosas responsáveis 
por captar luz e mover o animal. Com 
o tempo, essa massa de neurônios, e a 
complexidade com a qual eles se conec-
tam, cresceu. E aconteceu um milagre. 
Animais que reagiam automaticamen-
te a estímulos exteriores passaram a se 
comportar de um jeito mais complexo e 
imprevisível. Em vez de responder cega-
mente a qualquer estímulo, começaram 
a repetir apenas os movimentos mais 
eficazes na luta pela sobrevivência- por 
exemplo: em vez de caçar qualquer coisa 
que se mexesse, passaram a selecionar 
suas presas entre as mais nutritivas e 
fáceis de abater. Esse talento para iden-
tificar acertos é a origem daquilo que 
chamamos aprendizagem. 
As vantagens que ela trouxe lançaram 
os seres vivos numa corrida em busca 
do maior e mais versátil cérebro. Mas 
os organismos que entraram na disputa 
enfrentaram um sério problema. Na evo-
lução biológica, é impossível traçar um 
plano novo de construção de órgão do 
zero, pois herdamos as instw ções bási-
cas para a obra, que estão nos genes dos 
nossos pais. O resultado disso é que o 
cérebro foi crescendo meio no improviso, 
com "puxadinhos" se amontoando a par-
tir de uma estrutura básica. Essa é a ver-
dadeira história do cérebro: uma sucessão 
de gambiarras bem feitas. E nem preci-
samos ir longe para entender isso. Quem 
tenta se concentrar em fazer uma prova, 
mas ao mesmo tempo não consegue tirar 
os olhos da(o) mocinha( o) ao lado, expe-
rimenta sentimentos e pensamentos tão 
pouco relacionados que aparentam ter 
sido juntados aleatoriamente uns com 
os outros. Foram mesmo. "Existe uma 
série imperfeita de conexões entre os 
sistemas cognitivos e emocionais", afirma 
o neurocientista Joseph Le Doux, da New 
York University. ''Essa situação é parte do 
preço que pagamos por termos capaci-
dades que ainda não foram plenamente 
integradas ao nosso cérebro." 
Quantas são essas capacidades e como 
elas se relacionam são questões centrais 
para definir o que é a inteligência, mas 
ninguém ainda tem uma resposta exata 
para elas. Se você está em busca de um 
meio objetivo de medir a inteligência, 
TIPOS DE INTELIGÊNCIA 
A Teoria das 
Inteligências 
Múltiplas é um 
desafio à ideia de 
que o QI representa 
uma medida direta 
da inteligência. 
Segundo o psicólogo 
Howard Gardner, LÓG ICO- LINGUÍSTICA 
será obrigado a deixar o cérebro de lado e 
estudar uma área com mais de um século 
de tradição: a psicometria. 
O tamanho da inteligência 
Paris, começo do século 20. O psicólogo 
Alfred Binet recebe uma tarefa do mi-
nistro da Educação da França: encon-
trar um meio de prever quais crianças 
vindas do interior do país teriam mais 
possibilidade de enfrentar dificuldades 
na escola - o governo queria oferecer 
educação especial a elas. Em 1905, ele 
publica um teste de raciocínio verbal e 
matemático, com questões que testam a 
memória e o potencial de resolver pro-
blemas de lógica. O objetivo de Binet era 
medir a capacidade de compreensão pura 
e simples, não o conhecimento prévio, 
colocando em pé de igualdade crianças 
que só sabiam capinar mato com as que 
recitavam Shakespeare. Pouco depois, o 
alemão Wilhelm Stem criou um sistema 
de pontuação-padrão para o teste e lhe 
deu o nome de Intelligenz-Quotient. 
Nascia o método mais bem-sucedido 
da história para medir a inteligência: o 
famoso teste de QI. E ele revoluciona-
ria o que entendemos como inteligência. 
Até então a maior parte dos estudiosos 
MUSICAL ESPACIAL a nossa inteligência 
é o resultado de 
oito processadores 
mentais diferentes 
dentro do cérebro, 
cada um deles 
responsável por 
uma habilidade. 
-MATEMÁTICA Sensibilidade para Semelhante à inteligência Habilidade de reconhecer língua falada e escrita, lingu ística, só que e manipular padrões 
É a habilidade de resolver capacidade para relacionada a sons. no espaço. É útil para 
problemas a partir da aprender línguas e de É a habilidade de compor quem trabalha com 
lógica, realizar operações usar a lábia para e apreciar padrões a coordenação m otora 
matemáticas e investigar alcançar os próprios musicais. Bastante e tem de compreender 
questões científicas. objetivos. Encontrada rica em compositores, o mundo visual. 
Bastante desenvolvida em escritores, locutores cantores, dançarinos Bem desenvolvida 
em cientistas. e advogados. e maestros. em arquitetos. 
~2 SUPER NOVEMBRO 2015 
entendia o nosso intelecto a partir do 
conceito da tabula rasa- a ideia do filó-
sofo John Locke de que a mente humana 
é uma folha em branco que vai sendo 
preenchida durante a vida. Com a ado-
ção dos testes de QI, esse ponto de vista 
perdeu terreno - afinal, se uma criança 
semianalfabeta podia apresentar um QI 
maior que uma instruída, essa história 
de folha em branco era uma furada. E a 
inteligência passou a ser considerada cada 
vez mais como algo inato, como um mero 
produto do que está escrito nos genes. 
Uma pesquisa de 2015, feita pelo 
King's College, de Londres, revelou que 
nem mesmo a matéria estudada impor-
ta. Avaliando 12.500 pares de gêmeos, 
eles descobriram que o desempenho em 
matemática, ciências humanas, línguas 
estrangeiras, negócios, informática e 
artes era afetado pelos mesmos genes, 
que respondiam por entre 54% e 65% na 
diferença dos resultados. "Descobrimos 
que mais da metade das diferenças no 
desempenho educacional das crianças, 
para todas essas disciplinas, era explicada 
por diferenças em seu DNA e não pela 
escola, família ou outras influências do 
ambiente", afirma a neurocientista Kaili 
Rimfeld, coordenadora do estudo. 
Esse tipo de experimento mostra que 
os genes responsáveis pela inteligência 
podem ser vistos como uma espécie de 
balde, e o aprendizado durante a vida, 
como a água que enche o balde. Ter mais 
educação vai levar você mais rápido a 
encher o balde de água. Mas, caso ele seja 
muito raso, não vai adiantar jogar muita 
água lá. Ou seja: nem toda a educação do 
mundo poderá tomar realmente brilhan-
te alguém que nasceu com a inteligência 
apagada. Só que esse efeito tem um lado 
positivo: se você tiver vocação genética 
para ser um físico quântico ou coisa que 
o valha, tem como conseguir isso mesmo 
sem ter tido uma instrução excepcional 
na infância. Mas será mesmo que o QI 
é a melhor medida para a capacidade da 
mente humana? 
Mil e uma habilidades 
Alguns psicólogos acham que não, os 
testes de QI não dizem grande coisa. Uma 
importante ruptura veio na década de 
1990, com o livro Inteligência Emocio-
nal, do psicólogo Daniel Goleman. Ele 
ressaltou que habilidades como regular 
os próprios sentimentos, compreender 
emoções alheias, ser capaz de trabalhar 
em grupo e sentir empatia pelos outros 
Testes de QI são 
usados amplamente 
por cientistas . 
Mas será que são 
mesmo a medida 
universal da 
inteligência? 
Boa parte dos 
psicólogos diz 
que não . 
eram completamente ignoradas nos tes-
tes de QI. O que não fazia sentido, já que 
essas habilidades deveriam fazer parte 
daquilo que chamamos de inteligência. 
Outra ofensiva veio do psicólogo Ho-
ward Gardner, autor da Teoria das Inte-
ligências Múltiplas. Ele se inspirou no 
modo como a neurociência vê o cérebro 
hoje: um conjunto de vários módulos dis-
tintos, ou "puxadinhos", que evoluíram 
separadamente e hoje funcionam como 
processadores para funções específicas. 
Com isso em mente, Gardner concluiu 
que a inteligência não é um conceito -+ 
FÍSICO-
SINESTÉSICA INTER PESSOAL INTRAPESSOAL NATURALISTA 
É o tipo de inteligência 
usada para resolver problemas 
e executar movimentos 
complexoscom o próprio 
corpo. Você a encontra 
em dançarinos, 
mímicos e esportistas. 
É a capacidade de 
entender as intenções 
dos outros. Bastante 
necessária a quem coordena 
e executa trabalhos 
em grupo. É encontrada 
em vendedores, 
políticos, professores, 
clínicos e atores. 
É a habilidade de olhar 
para dentro de si mesmo 
e entender as próprias 
intenções, objetivos 
e emoções. Necessária 
para encontrar erros 
no próprio raciocínio. 
Presente em psicólogos, 
filósofos e cientistas. 
É a sensibilidade para 
perceber e organizar 
fenômenos e padrões 
da natureza, como 
a diferença entre plantas 
quase idênticas. 
Costuma ser encontrada 
em biólogos e membros 
de tribos indígenas. 
N OVEMBRO 2015 SUPER 1.:J 
único, ind ivis ível, mas uma soma de 
várias habilidades - como raciocínio 
lógico-matemático, linguistico, espacial, 
musical, intrapessoal, interpessoal, mo-
tor e naturalista (está na página anterior). 
Assim, a ide ia de colocar um Stephen 
Hawking, um Neymar e uma Cláudia 
Leitte em pé de igualdade no quesito 
inteligência deixou de soar estranha. Pela 
teoria de Gardner, cada um deles pode 
ser considerado especialista em um tipo 
de habilidade (respectivamente, a lógico-
-matemática, a motora e a interpessoal). E 
por isso não daria para considerar qual-
quer um deles menos genial que o outro. 
Talvez por parecer mais democrática 
que os testes de QI, a ideia de Gardner 
se tornou extremamente popular des-
de que foi publicada, em 1983. Tanto 
que hoje é senso comum achar que ela 
está certa, e que o quociente de inteli-
gência tradicional ficou ultrapassado. 
Mas no meio acadêmico é diferente: 
a Teoria das Inteligências Múltiplas 
ainda é vista como um patinho feio e 
enfrenta muitas críticas. Principalmen-
te porque nem Gardner nem ninguém 
sabe ao certo como medir cada uma 
dessas habi lidades que formariam a 
inteligência. "Não fica claro se o con-
ceito de inteligência de Gardner mede 
mais traços de personalidade e habili-
dades motoras que faculdades mentais 
de fato", afirma Linda S. Gottfredson, 
professora de estudos educacionais da 
Universidade de Delaware. 
Ela é um dos muitos entusiastas do 
fator "g" (de "inteligência geral"). Segun-
do essa teoria, baseada em estatísticas, 
a ideia de que várias habilidades cogni-
tivas estejam disseminadas uniforme-
mente pela população é falsa. Ou seja, 
não existem muitas pessoas excelentes 
em cálculo e ao mesmo tempo péssi-
mas em redigir textos, ou com bom 
ouvido musical e pouca inteligência 
interpessoal. Se uma pessoa for boa 
em qualquer dessas habilidades, tende 
a ser boa também nas outras (como 
atestou a pesquisa genética do King's 
College, citada anteriormente.) 
Essa essência da teoria do fator g, 
porém, não é nova. Ela está por trás da 
14 SUPER NOVEMBRO 2015 
própria ideia do QI. Tudo bem que os 
testes não medem coisas como coorde-
nação motora, mas é verdade que eles 
avaliam tipos diferentes de raciocínio. 
E a pontuação final vai levar em conta 
o seu desempenho em todos eles. Além 
disso, dá para comparar milhares de re-
sultados de épocas e lugares diferentes, 
o que cria uma bela base estatística, se 
o ponto é saber qual é o tamanho da 
sua inteligência em relação à dos outros. 
Então, mesmo com suas limitações, os 
testes tradicionais continuam sendo ex-
tremamente comuns no meio cientifico. 
"Ninguém duvida de que eles não ava-
liam todos os aspectos importantes das 
funções mentais - não medem a cria-
tividade ou a sabedoria, por exemplo. 
Mas o ponto é que isso não é o mesmo 
que afirmar que eles não servem para 
nada", afirma o psicólogo lan ). Deary, da 
Universidade de Edimburgo (Escócia). 
Mesmo assim, a necessidade de ex-
pandir o conceito de inteligência para 
além das fronteiras dos testes de QI 
continua. Afinal, pouca gente duvida 
de que a criatividade, algo muito difícil 
de medir objetivamente, é um inegável 
sinal de inteligência. Diante dessa es-
pécie de tilt dos testes mentais, o que 
dá para fazer? Com a palavra, Howard 
Gardner: "Nós, psicólogos, não somos 
mais os donos da inteligência, se é que 
algum dia já fomos. O que significa 
ser inteligente é uma questão filosófica 
profunda, que exige base em biologia, 
física e matemática". Ou seja, exige que 
voltemos ao lugar onde começamos 
essa história: para dentro do cérebro. 
Inteligência = demência? 
Para muitos neurologistas, a inteligên-
cia é só um sinal de que você tem um 
cérebro com a "fiação" bem conectada. 
Quanto mais saudável ele for, mais coisas 
extraordinárias vai fazer. Mas espere ai. 
Às vezes o que acontece é justamente o 
contrário. É o que mostra um experi-
mento sem paralelo feito na Austrália: 
pesquisadores lançaram pulsos eletro-
magnéticos no crânio de pessoas para 
desligar partes do cérebro e observar o 
que acontecia com as capacidades cog-
nitivas. E o resultado foi espantoso: as 
cobaias humanas começam a desenhar 
melhor, ter memória mais rápida, mais 
habilidade musical ou um raciocínio 
numérico mais apurado. A questão é: 
se partes do cérebro estavam sendo 
desligadas, por que a mente parecia 
funcionar melhor, e não pior? 
Não para por aí. Um estudo de 2015, 
da Universidade de Edimburgo (Escó-
cia), revelou que há um maior risco 
de desenvolvimento de doenças rela-
cionadas ao espectro do autismo em 
pessoas com os mesmíssimos genes 
ligados à inteligência. 
Na página 6o, essa ligação fica ainda 
mais clara. Lá você pode conhecer os cé-
rebros mais fascinantes do planeta, ver-
dadeiros telescópios para decifrar o que 
é a inteligência. E descobrir que, talvez, 
você tenha algo em comum com eles. 0 
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A ciência 
desvendou de 
átomos a buracos 
negros, mas o ma1or 
mistério de todos 
continua onde sempre 
esteve: na sua 
cabeça. Afinal, o que 
é a consciência? 
mos bancos de dados sobre 
tudo o que você vê e sente, cer-
to? Lá estão informações sobre 
todo mundo que você conhece. 
Então não seria nem um pouco 
surpreendente ela ter formado 
uma ficha sobre você mesmo, 
uma que você compila na me-
mória desde os primeiros anos 
de vida Nesse sentido, a cons-
ciência é um modelo inte.mo 
do mundo com um "eu" inseri-
do. "O acesso a informações so-
Texto Rodrigo R(!z_ende_ e Alexandre Versignossi 
Oesign Joono Amador 
Ilustrações de Thois Beltr:ome_ 
SABE AQUELA PESSOA que sempre mo-
rou na sua cabeça e que você apelidou de 
"eu"? Então, imagine que um dia exista 
uma máquina que faça cópias perfeitas 
de você, com a sua cara, seu cérebro, 
suas memórias. Tudo. Será que a sua 
consciência vai parar lá também? Ou 
sua cópia ganha outro "eu"? Se você não 
conseguiu responder, fique tranquilo: 
nada é mais misterioso que esse cidadão 
aí dentro. Uma prova disso é o grande 
número de teorias que tentam explicar 
o que é a consciência. Muitas delas vão 
bem fundo no problema, mas batem de 
cabeça umas com as outras. Uns acham 
que ela nem existe. Outros, que está em 
todo lugar. Muitas perguntas continu-
am sem resposta - e, como você pode 
ver nas colunas ao lado, nunca vão ter. 
Mas não faltam argumentos que nos 
deixem pelo menos mais perto de escla-
recer o mistério. Prepare-se para conhe-
cer esse "eu" que mora em você. 
Você, por você mesmo 
Afinal, o que é a consciência? Foi esse 
o problema enfrentado pelo linguista 
Ray )ackendoff, da Tufts University, e 
pelo fi lósofo Ned Block, da Universida-
de de Nova York. Eles chegaram a dois 
significados fundamentais. 
Em primeiro lugar, consciênciaé o co-
nhecimento que você tem de você mes-
mo. Nossa cabeça consegue formar óti-
bre esse 'eu' é fácil de reproduzir. 
Um robô que possa se reconhecer 
num espelho não seria mais difícil 
de construir do que um capaz de re-
conhecer qualquer outra coisa", diz o 
neurocientista Steven Pinker, da Univer-
sidade de Harvard, EUA, em seu já clás-
sico livro Como a Mente Funciona. 
Outra parte é a forma com que o cére-
bro acessa a infinidade de informações 
que tem lá dentro. Numa conversa, por 
exemplo, você pode falar do filme de on-
tem, de alguém que está passando na sua 
frente, da chuva. Mas não tem como dis-
correr sobre a velocidade com que seu 
sangue está correndo agora ou o jeito 
como enzimas estão sendo secretadas 
pelo seu estômago. Tudo o que você vê e 
boa parte do conteúdo da sua memória 
são o que sua cabeça pode acessar. O res-
to fica "esconclido" no seu cérebro. Isso 
mostra que o sistema nervoso divide cla-
ramente o que vai e o que não vai para a 
consciência. Então a gente fica com um 
outro jeito de definir o "eu": ele é tudo a 
que você pode ter acesso pela sua cabeça 
na hora. Ou, mais exatamente, tudo o que 
você precisa pensar para falar e fazer. 
Nesse processo, informações da parte 
consciente às vezes são escondidas. 
Quando você está aprendendo a dirigir, 
por exemplo, precisa pensar para trocar 
as marchas do carro. Operar o câmbio é 
uma preocupação que faz parte da cons-
ciência do motorista de primeira via-
gem. Depois de alguma experiência, a 
troca de marchas vira uma coisa auto-
mática, tão inconsciente quanto a respi-
ração e o trabalho das enzimas do estô-
mago. E o "eu" fica liberado para matutar 
sobre o filme, os passantes, a chuva. 
Esevocêforum 
cérebro em um vidro? 
Por mais que os cientistas 
se esforcem para estudar 
a consciência, existem 
algumas perguntas rela· 
cionadas ao assunto que 
ainda não têm resposta. 
Como saber, por exemplo, 
que você não é um mero 
cérebro em um vidro de 
laboratório, e que essa 
revista, as suas mãos e o 
lugar em que você está 
sentado agora não passam 
de ilusões criadas por 
cientistas? Não é uma ideia 
absurda, por um simples 
motivo: não existem 
meios de responder a essa 
pergunta com um sim ou 
não. E é possível que nunca 
venham a existir. Demais 
perguntas desse tipo 
aparecerão nas colunas do 
resto da reportagem. 
Essas definições explicam alguma 
coisa, mas deixam muita coisa de fora. 
Não explicam questões que parecem 
simples, mas que são impossíveis de 
responder, do tipo: como é ser um be-
souro, como seria estar morto, ou qual 
o sentido do "eu". E ai entram as teorias 
que mergulham fundo para resolver 
esses problemões. Bem fundo, até a 
parte irracional da nossa mente. 
Você, pela sua emoção 
Lembra o que acontece quando você 
toma um susto? Primeiro vem uma es-
pécie de chacoalhão no seu corpo, de-
pois um salto meio inconsciente e aí a 
sensação de medo. E não há nada que 
você possa fazer para evitar essa reação 
em cadeia. Aliás, para ser bem sincero, 
não existe nem um "você" presente nes-
se processo todo. A consciência de que 
o susto aconteceu só vem depois dele. 
E talvez não seja à toa. Segundo um dos 
neurologistas mais respeitados do 
mundo, o português António Damásio, 
da University o f Southern California, o 
processo que te levou a perceber o sus-
to reproduz a história evolutiva da 
mente, na qual a consciência é o último 
passo de todo o processo. -+ 
NOVEMBRO 2015 SUPER ~7 
A primeira forma de pensamento na 
natureza não vinha com o "eu..- no pa-
cote. Era só emoção. Para Damásio, a 
emoção é uma imagem mental forma-
da por várias coisas ao mesmo tempo, 
tipo a dilatação da pupila, a descarga de 
adrenalina e a tensão muscular que 
acontecem na hora do susto. Quando a 
mente processa tudo isso junto e vê 
que tem algum perigo por perto, faz 
você dar um salto, por exemplo. Isso foi 
essencial para os animais primitivos na 
luta pela sobrevivência, já que permitiu 
reagir automaticamente a ameaças. 
Com o tempo, o cérebro aprendeu a 
lidar melhor com a tal emoção dos se-
res vivos, criando um "eu" para admi-
nistrá-la. Que vantagem isso dá? Sim-
ples: imagine que você sempre tome 
um baita susto toda vez que vê uma 
barata. E que comece a trabalhar num 
lugar infestado delas. Em vez de passar 
a dia inteiro cheio de adrenalina e com 
a musculatura tensa, gastando um 
monte de energia à toa, você usa a 
consciência e se pergunta: "Por que eu 
tenho medo de barata?" E tenta arranjar 
um jeito de se livrar desse medo. 
Mas por que não é fácil controlar o 
medo e outros sentimentos que só 
atrapalham a sua vida? Exatamente 
porque a consciência é só a ponta do 
iceberg desse conjunto de reações ir-
racionais e automáticas que deu ori-
gem à mente. Para Damásio, a emoção 
e o sentimento compõem o grosso da 
mente, e não o pensamento, a razão. 
Essa teoria dá urna boa ideia da ori-
gem da consciência. Afinal, ela é útil 
para o controle das emoções, e acaba aju-
dando na sobrevivência. Mas por que 
tem de existir um "alguém" aí dentro de 
você? Não daria para a mente trabalhar 
no piloto automático? Alguns acham 
que é isso mesmo que ela faz, que não 
mora ninguém dentro da sua cabeça. 
Você, robô 
Você já leu esta linha. E esta também. 
Faz meio segundo que o seu cérebro 
processou cada uma dessas letras que 
você está lendo agora. Ele faz todo o 
trabalho antes que você tenha consci-
ência do que está acontecendo, sem 
1.8 SUPER NOVEMBRO 2015 
perguntar nada. Sempre foi assim: 
todas as decisões da sua vida foram to-
madas sem que você fosse consultado. 
Todas. Se neste momento você resolver 
jogar esta revista pela janela, saiba que 
seu cérebro já ordenou que você fizesse 
isso sem que a parte consciente da sua 
cabeça se desse conta. 
Essa é uma possibilidade aberta por 
pesquisas sobre o funcionamento do 
cérebro feitas pelo falecido neurocien-
tista norte-americano Benjamin Libet, 
pioneiro dos estudos sobre a consci-
ência. Entender o raciocínio dele é fá-
ci l: levante seu braço agora mesmo. 
Levantou? Pois Libet concluiu que o 
impulso que seu cérebro acabou de 
enviar para erguer o seu braço partiu 
um pouco antes de você ter decidido 
levantá-lo. Você, o legítimo dono do 
membro, pode não passar de um figu-
rante nesse processo. 
Mas espera um pouco. Se realmen-
te não temos domtnio sobre nossas 
ações, somos o quê, então? Sinto lhe 
dizer, mas, segundo Richard Dawkins, 
professor emérito da Universidade de 
Oxford - que hoje pode ser famoso 
pela militância antirreligiosa, mas é 
(ironia) um dos "papas" da biologia 
moderna - você não passa de um robô, 
"ainda que um bem complexo". 
Essa posição tão simpática vem de 
uma ideia genial: a de que somos "má-
quinas de sobrevivência" dos nossos ge-
nes. "Máquinas" porque eles usam nos-
sos corpos para se reproduzir e depois 
vão embora. Por essa visão, quem já teve 
o trabalho de arrumar parceiros sexuais 
e criar filhos pode morrer tranquilo por 
ter cumprido sua missão: ajudar suas 
moléculas de DNA a continuar sobre a 
Terra. E mais nada. Bom, se os genes são 
os chefes dos nossos corpos, quem man-
da na nossa mente, nas nossas ideias? 
Para Dawkins, a diretoria aí não é forma-
da exatamente pelo genes, mas pelos 
memes - pelo menos esse é o nome que 
o inglês inventou. 
Isso tem pouco que ver com as piadi-
nhas de humor duvidoso na internet, 
que herdaram o nome por sua pretensão 
a se tomarem memes. Um meme, no 
sentido original, é basicamente uma 
Você vê o mesmo que eu? 
Como ter certeza de que 
as cores que você vê aí em 
cima são as mesmas que 
outra pessoa veria? E se a 
sensação que você tem do 
vermelho é idêntica à que 
eu tenho do verde? Para 
a física, o que chamamos 
de vermelho é apenas 
uma frequência de uma 
onda eletromagnética, 
mas nada garante quea representação mental 
dessa cor seja a mesma 
para nós dois. 
idéia, um conceito qualquer. Mas, note 
bem, eles têm vida própria. E estão na 
Terra com um objetivo único: se espa-
lhar, igual os genes fazem. Quer ver um 
meme agora mesmo? Então pense em 
alguma música das Spice Girls - ou em 
qualquer uma que você gostava quando 
era mais novo. Se ela começa a tocar so-
zinha na sua cabeça, é porque você está 
testemunhando um meme em ação. Se 
você resolver cantar a música e alguém 
que estiver do seu lado ficar com ela na 
cabeça, você está vendo um meme se re-
produzir, passar de um corpo para outro. 
Como se fosse um gene! Ou uma carinha 
mal desenhada na internet. 
Essa lógica serve para tudo no mundo. 
Um filósofo, do ponto de vista "meméti-
co", é o meio que uma biblioteca tem de 
produzir outras bibliotecas. E por aí vai. 
Vivemos numa "memosfera" carregada 
de ideias que lutam para se reproduzir. 
E em que lugar uma ideia tem me-
lhores condições de procriar? Num 
cérebro humano. É ele quem tem o 
trabalho de espalhar ideias por aí, não 
é? Cérebros são o paraíso dos memes. 
Um conceito que esteja em várias ca-
beças, entrando por muitas orelhas e 
saindo por muitas bocas, fica com 
chances melhores de crescer e de se 
reproduzir no "mundo das ideias". 
Para Dawkins, então, a mente é um 
emaranhado de memes em busca de 
um lugar ao Sol. E você, o dono do cé-
rebro, não tem nada a ver com isso. A 
briga para ver o que se passa na sua 
cabeça é entre eles, caro robô. -+ 
r 
Se você achou isso difícil de engolir, 
não é o único. O filósofo Daniel Dennett, 
do Centro de Cognição da Universidade 
Tufts, nos EUA, também achou. Mas é 
uma ideia que se encaixa tão bem em 
outras teorias da biologia que até ele aca-
bou engolindo. E criou uma explicação 
da consciência baseada nos memes. 
Para ele, o nosso cérebro é um ema-
ranhado quase infinito de memes que 
estão agora mesmo no seu inconscien-
te. O que eles fazem é ficar brigando 
uns com os outros lá no escuro até que 
um ganha vantagens sobre os outro se 
consegue "ver a luz". Quer dizer: ele 
emerge na sua cabeça em forma de uma 
ideia consciente, pronta para sair da sua 
boca e se reproduzir em outras cabeças. 
O modelo de Dennett é bastante 
complexo, mas tem uma essência sim-
ples. Para ele, o cérebro tem dificuldade 
em lidar com o turbilhão de ideias que 
moram lá. Então a consciência não seria 
exatamente um meme qualquer que 
pula para fora, mas uma "máquina vir-
tual" criada para controlar o jorro de 
ideias. uma espécie de "filtro" dos me-
mes que estão enterrados em sua cabe-
ça. E o nome que você dá para essa má-
quina, enfim, é "eu", amigo robô. 
A conclusão, mais uma vez pouco 
animadora, é que a sua consciência não 
passa de ilusão. O que você chama de 
"eu", na verdade, é uma estratégia dos 
milhões de memes para se regularem. 
Tudo certo então? Claro que não. Uma 
teoria da consciência, pelo menos tão 
instigante quanto essa, fala exatamen-
te o contrário. Vamos lá. 
Você, em todo lugar 
Se você está preocupado com a possibi-
lidade de ser apenas um robô sem con-
trole sobre si mesmo, chame o neuro-
cientista e filósofo David Chalmers, da 
Universidade Nacional da Austrália. 
Para ele, esse tipo de argumento é coisa 
de gente preguiçosa. "A maneira mais 
fácil de desenvolver uma teoria da 
consciência é negar que ela existe", afir-
ma ele em seu livro The Conscious Mind 
("A Mente Consciente", inédito em por-
tuguês). Chalmers, você vê, acredita que 
a consciência não seja só uma ilusão e 
bate de frente com Dennett, seu mais 
ferrenho rival acadêmico. 
Pense bem, a consciência é um fe-
nômeno bastante poderoso, mas que 
ninguém sabe muito bem onde está. 
Mesmo sendo o centro da existência de 
todo mundo, nenhum cientista conse-
guiu matar a charada e dizer de onde ela 
surge, ou sequer afirmar com certeza 
quais seres têm ou não consciência. 
Um jeito científico de tentar detec-
tá-la é colocar animais na frente de um 
espelho para ver se eles conseguem se 
reconhecer. Por esse critério, bebês 
humanos de um ano não têm consci-
ência. Os animais que passaram no 
teste até hoje são outros hominídeos 
(chimpanzés, bonobos e orangotangos, 
mas não gorilas), elefantes, golfinhos 
nariz-de-garrafa, orcas e, por incrível 
que pareça, a pega-rabuda (esse é o 
nome), um tipo de gralha europeia. 
Ainda assim, muitos cientistas contes-
tam os resultados. Mas por enquanto 
não dá para ir mais longe. 
Para Chalmers, ninguém conseguiu 
achar a resposta por um motivo bem 
simples: ela estava embaixo do nariz de 
todo mundo. A consciência para ele é 
uma propriedade das coisas. De qual-
quer coisa: de um ganhador do Nobel a 
um caixote, tudo tem consciência. 
Se, a essa altura, você já está seguran-
do o seu chapéu e achando isso tudo um 
absurdo, pense de novo na ide ia. Largue 
o seu chapéu e tente responder. por que 
essa benção, essa força tão poderosa, só 
apareceria no cérebro humano? Não pa-
rece muita pretensão nossa? É por isso 
que, para Chalmers, ela pode, sim, estar 
em tudo: seja numa pedra, num pedaço 
de papel ou numa estrela. O motivo pelo 
qual você nunca percebeu essa habilida-
de neles é que existem diferentes graus 
de consciência. Para ele, quanto mais 
complexa for a atividade de uma coisa, 
quanto maior for o número de diferentes 
"e>..'Periências" que ela vivenda- em ou-
tras palavras, quanto mais complexo for 
o objeto - maior sua "quantidade" de 
consciência. Um cérebro experimenta 
bilhões de impulsos elétricos por segun-
do. É a coisa mais frenética do Universo 
conhecido. Então ele tem um grau alto 
Máquinas podem 
ter consciência? 
Imagine se a gente pudes-
se tirar um dos neurônios 
do cara da foto aí ao 
lado e substituí-lo por 
um chip com as mesmas 
funções. O cérebro dele 
ia continuar funcionando, 
certo? Agora, imagine que 
continuamos trocando 
células por chips equiva-
lentes. O resultado seria 
uma máquina idêntica 
ao nosso cérebro, 
mas ... ela teria alguma 
consciência? E seria essa 
consciência a mesma 
do cérebro original? 
de consciência. Já uma pedra não passa 
por muitas emoções ao longo da vida. A 
única coisa que ela faz é esfarelar com o 
tempo, bem devagarinho. Então seu 
grau de consciência seria minúsculo. 
Uma estrela, digamos, é grande e agitada 
por dentro, mas não faz nada de comple-
xo: é só uma bolona que gera energia 
fundindo hidrogênio, uma rotina bas-
tante tediosa. Então seu grau de consci-
ência não seria lá essas coisas. 
Por esse ponto de vista, a consciên-
cia é nada mais que uma propriedade 
do mundo físico, como a massa e a ve-
locidade. Do mesmo jeito que uma coi-
sa pode ser mais rápida ou mais pesada, 
ela também pode ser mais consciente 
que outra. 
Mas a teoria não faz sentido para 
todo mundo. Na verdade, Daniel Den-
nett, o arqui-inimigo de Chalmers, acha 
tudo isso tão absurdo que se preocupa 
basicamente em tirar sarro da teoria. 
Dennett propõe a seguinte cena: um 
bebê brincando com um filhote de ca-
chorro. O que os dois têm em comum? 
São fofos. E muito. Assim como a cons-
ciência, a fofura é uma força poderosa, 
que pode estar em qualquer lugar e que 
é bem difícil de conceitualizar (tente, por 
exemplo, explicar o que é fofura sem usar -+ 
NOVEMBRO 201S SU PER 21 
Há como medir 
o consciência? 
Aparelhos de ressonância JW.77:1:tí:t: 
magnética, tomografia 
e encefalograma são 
instrumentos com 
os quais os cientistas 
estudam a mente. Só que 
nenhum deles possibilita 
leitura direta do conteúdo 
da consciência de uma 
pessoa. A única a que um 
cientista tem acesso 
é a dele mesmo. 
O problema é que a 
ciência precisa de 
evidências do mundo 
físico para comprovar 
teorias. Se pensar a 
consciência a partir da 
própria consciência 
contraria os valores 
científicos fundamentaise extrapola os limites 
da ciência, como é 
possível explicá-la 
cientificamente? 
os dedos. Difícil, não?) "Já que é assim, 
por que não considerar a fofura uma pro-
priedade fundamental da matéria?", disse 
o filósofo, em um artigo de 2004. 
O problema é que não existem meios 
de provar nem a teoria de um, nem a do 
outro. A biologia fica de mãos atadas na 
hora de debater a consciência. Mas a 
física talvez não. 
Você, atômico 
A gente pensa num cérebro como se fos-
se um grande computador. É até natural. 
Afinal, os dois têm memória, processam 
informações e travam de vez em quando. 
Além disso, a estrutura do cérebro, com 
bilhões de neurônios, axônios e sinapses, 
lembra o emaranhado de fios e micro-
chips que temos nas nossas máquinas. E 
existe um sinal elétrico correndo lá den-
tro, seja na máquina, seja na cabeça. 
Mas existe uma coisa que os cérebros 
manjam e que computador nenhum 
consegue fazer: abstrações. Uma partida 
de xadrez, por exemplo, tem um número 
absurdo de caminhos diferentes. O que 
um computador faz na hora de jogar? 
Tenta um número enorme de jogadas até 
achar uma que tenha boas chances de 
sucesso. Já você, antes de cada lance, 
22 SUPER NOVEMBRO 2015 
pensa só nas três ou quatro jogadas mais 
sensatas. Mesmo sem perceber, você de 
alguma forma conseguiu tirar um senti-
do do jogo e agir de acordo com alguma 
lógica -algo que fios, chips e eletricidade 
não conseguem fazer sozinhos. 
Outro ponto em que somos bem 
diferentes das máquinas é que nós 
nunca pensamos em apenas uma in-
formaçãp por vez. Você pode até estar 
aqui processando as informações des-
se texto, mas ao mesmo tempo está 
ligando essas ideias ao cheiro que você 
está sentindo, às memórias do que 
você fez nos últimos tempos, à sensa-
ção do lugar em que você está e aos 
barulhos que está ouvindo. Cada mo-
mento que você vive é processado ao 
mesmo tempo por vários neurônios, 
em diferentes partes do cérebro. 
É como se o mesmo sinal passasse por 
vários processadores intimamente li-
gados, como se todos fossem um só. 
E é claro que um computador não 
consegue fazer uma reprodução exata 
disso. Mas por que não? Para responder 
essa pergunta, o matemático Roger Pen-
rose, da Universidade de Oxford, Ingla-
terra, buscou inspiração em um mundo 
quase tão estranho quanto nosso cére-
bro: o da física quântica, que descreve o 
comportamento das coisas ultramicros-
cópicas. Lembre-se do que acabamos de 
dizer sobre o cérebro: é uma máquina 
que processa informações como se elas 
estivessem em vários lugares ao mesmo 
tempo e que, de alguma forma, consegue 
extrair uma força maior, um sentido de 
tudo isso. É algo que poderia ser compa-
rado a um elétron, por exemplo. 
Ele nunca está em um lugar definido. 
É como se estivesse sempre indeciso 
sobre onde ficar e, enquanto não "resol-
ve", se mantém em vários lugares ao 
mesmo tempo. E, de alguma forma, é 
dessas interações que saem as leis da fí-
sica com as quais lidamos no dia a dia. 
As estranhezas da física quântica 
não param por aí. As partículas podem 
se comportar como pequenos bonecos 
de vodu. Exatamente: se você "espetar" 
uma aqui, outra "sente a dor" em outro 
lugar, não importa a distância que se-
pare as duas. Bizarro, não? 
O mesmo aconteceria no cérebro. 
Dentro da sua cabeça, tudo o que você 
sente e pensa está espalhado em áreas 
distantes. O que você vê agora é proces-
sado perto da sua nuca, e as coisas de que 
você lembra ficam no meio do cérebro. 
Para Penrose, então, os sinais que os 
neurônios transmitem poderiam ficar 
em vários lugares ao mesmo tempo, que 
nem os elétrons dos experimentos quân-
ticos, por uma fração de segundo. A jun-
ção dessas pequenas flutuações resulta-
ria no jeito como você e eu sentimos a 
cor azul e a sensação de segurar esse pa-
pel simultaneamente. Em suma, ela for-
maria a sensação do "eu". 
O problema é que nenhum desses 
argumentos fez a ideia de Sir Penrose 
ganhar crédito. Uns contestam a mate-
mática da teoria. Outros falam que os 
fenômenos quânticos não poderiam 
existir dentro de um cérebro, um am-
biente grande e quente que não dá con-
dições para que os átomos se compor-
tem de um jeito tão estranho. Tem 
ainda quem diga que Penrose só subs-
tituiu um mistério por outro e não tem 
nada que tentar explicar o inexplicável. 
"Mas estou aberto para qualquer um 
que venha e me mostre que eu estou 
errado. E ainda estou esperando!", desa-
fiou a matemático. Vai encarar? 
Com certeza, muita gente vai. Penro-
se continuou trabalhando em sua teoria 
e, em 2013, ele e o anestesiologista Stuart 
Hameroff afirmaram com todas as letras 
que o cérebro é um "computador quân-
tico". Uma máquina que mal existe ain-
da. Mas essa é uma daquelas questões 
centrais a qualquer área da ciência - e 
que nunca vai morrer. Enquanto existir 
essa voz aí na sua cabeça que você se 
acostumou a chamar de "eu", existirá 
quem tente descobrir de onde ela vem, 
do que ela é feita. Quem sabe o "eu" de 
algum deles ainda desvende o seu? O 
PA~A SA3fH MAIS 
MENTE, CÉREBRO E COGNIÇÃO, João de 
Fernandes Teixeira, Vozes. 
O MISTÉRIO DA CONSCitNCIA. Antônio Damás io, 
Cia das Letras. 
CONTENT ANO CONSCIOUSNESS, Daniel Dennett, 
Rout ledge Classics. 
• Colaboraram Bianca Carneiro c Cris tina Kist. 
VOCÊ NÃO TOMA AS PRÓPRIAS 
DECISÕES - E BOA PARTE 
DO QUE VÊ NÃO É REAL. É 
APENAS UMA ILUSÃO CRIADA 
PELO SEU CÉREBRO, QUE PASSA 
PELO MENOS 4 HORAS POR DIA 
ENGANANDO VOCÊ. CONHEÇA 
OS TRUQUES QUE ELE APLICA 
- E SAIBA O QUE REALMENTE 
ACONTECE DENTRO DA MENTE . 
Texto Alexandre de Santi" Design Rafael Quick 
VOCÊ FICA CEGO 4 horas por d ia. Já foi enganado 
por um rótulo nesta semana. Tem preconceitos sobre 
todos os assuntos (por mais que ache que não). Toma 
decisões irracionais, que vão contra os seus interesses. 
Você não está no controle da própria mente. Mas não 
se preocupe: você é normal. Não é maluco e possui um 
cérebro perfeito, como o de qualquer outra pessoa. Só 
que ele inventa coisas para iludir você. Não é por mal. 
E só uma maneira de economizar energia. 
O cérebro humano é o objeto mais complexo do 
Universo. Tem 86 bilhões de neurônios, que podem 
formar 100 trilhões de conexões. Se fosse possível criar 
um computador com o mesmo número de circuitos do 
cérebro, ele consumiria uma quantidade absurda de 
eletricidade: 6o milhões de watts por hora, segundo 
uma estimativa de cientistas da Universidade Stanford. 
É o equivalente a quatro usinas de Itaipu trabalhando 
simultaneamente. Mas o cérebro humano gasta pou-
quíssima energia - 20 watts, menos que uma lâmpada. 
E mesmo assim consegue fazer coisas extremamente 
sofisticadas, de que nenhum computador é capaz. 
Só que isso tem um preço. O seu cérebro não con-
segue anal isar as situações de forma completamente 
racional, avaliando todas as variáveis envolvidas em 
cada caso. Para fazer isso, ele precisaria de ainda mais 
circuitos - e muito mais energia. Mas, ao longo da 
evolução, a natureza encontrou uma solução: o cérebro 
pode mentir para seu dono. Sim, mentir. Descartar 
informações, manipular raciocínios e até inventar 
coisas que não existem. Dessa forma, é possível s im-
plificar a realidade- e reduzir drasticamente o nível 
de processamento exigido dos neurônios. "São efeitos 
colaterais do funcionamento normal do cérebro", diz 
Suzana Herculano-Houzel, neurocientista da Univer-
sidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). --+ 
NOVEMBRO 2015 SUPER 25 
Tudo começa pela visão. 
Você não percebe, mas o 
cérebro edita o que você vê. 
Das 16 horas por dia que 
uma pessoa passa acorda-
da, em média, 4 horas são 
preenchidas por imagens 
"artificiais"- que não foram 
captadas pelos olhos, e sim 
criadas pelo cérebro. 
O olho humano só cap-
ta imagens com clareza em 
uma pequena parte, a fóvea, 
que tem l. milimetrode di-
âmetro e fica no centro da 
retina. Então, para compor 
a linda imagem que você 
está vendo agora, os seus 
olhos estão constantemen-
VOCÊ NÃO 
ENXERGA 
O QUE ESTÁ 
ACONTECENDO 
AGORA, 
MAS VÊ O 
FUTURO. 
QUE SEU 
CÉREBRO 
INVENTA. 
te em movimento. Eles focam determinado ponto e 
depois pulam para o ponto seguinte. Cada um desses 
saltos tem duração de 0,2 segundo. Quer comprovar 
isso na prática? Na próxima vez em que você estiver 
conversando com uma pessoa, preste atenção nos olhos 
dela. Você irá perceber que eles se movimentam o 
tempo todo para escanear vários pontos do seu rosto. 
O problema é que a cada pulo desses, enquanto 
os olhos estão se movendo para a próxima posição, 
o cérebro deixa de receber informação visual por 0,1 
segundo. Durante esse tempo, você está cego. E, como 
nossos olhos fazem pelo menos 150 mil pulos todos 
os dias, o resultado são 4 horas diárias de cegueira 
involuntária. Você não percebe isso porque o cérebro 
preenche esses momentos com imagens artificiais, que 
dão a sensação de movimento contínuo. Mas que, na 
prática, você não viu. 
Tem mais: o que você enxerga não é o que está 
acontecendo - e sim o que vai acontecer no futuro. É 
sério. Isso acontece porque a informação captada pelos 
olhos não é processada imediatamente. Ela tem de 
passar pelo nervo óptico e só depois chega ao cérebro. 
O processo leva frações de segundo, e você não pode 
esperar- um atraso na visão pode fazer com que você 
seja atropelado ao atravessar a rua, por exemplo. Então, 
o que faz o cérebro? Inventa. Analisa os movimentos 
de todas as coisas e fabrica uma imagem que não é 
real, contendo a posição em que cada coisa deverá 
estar 0,2 segundo no futuro. Você não vê o que está 
acontecendo agora, e sim uma estimativa do que irá 
acontecer daqui a 0,2 segundo. 
As mentiras invadem a razão 
Com R$ 2,2o, você pode comprar um café e uma 
bala. O café custa R$ 2 a mais do que a bala. Quanto 
26 S UPER NOVEMBRO 2015 
custa a bala? Responda rápido. Vinte centavos, 
certo? Errado. Você acaba de ser enganado pelo 
próprio cérebro. Mas não está sozinho - m ais da 
metade dos estudantes de universidades prestigia-
das como Harvard, MIT e Princeton responderam 
a essa mesma pergunta e também erraram (entre 
alunos de instituições menos badaladas, o índice 
de erro é ainda maior, cerca de 8o%). Essa chara-
da é um dos exemplos citados no livro Thinking, 
Fast and Slow (Pensando, Rápido e Devagar, ainda 
sem versão em português), do psicólogo israelense 
Daniel Kahneman, que ganhou o Prêmio Nobel 
de Economia de 2002 por suas pesquisas sobre o 
comportamento humano. 
Para Kahneman, o cérebro tem dois tipos de pen-
samento. O primeiro é rápido e intuitivo e confia 
na experiência, na memória e nos sentimentos para 
tomar decisões. O segundo é lento e analítico - e 
serve como uma espécie de guardião do primeiro. 
Se estamos decidindo sobre o que comer, podemos 
ficar em dúvida entre um sanduíche e um prato de 
feijão. Mas por que essas duas opções, justo elas, 
surgiram como as alternativas válidas para o mo-
mento? Por que você não considerou um bacalhau 
com batatas? Por que não um sorvete de abacaxi? 
Porque o seu pensamento intuitivo já estava inclinado 
para optar pelo sanduba ou pelo feijão e restringiu 
previamente as escolhas, antes mesmo que você se 
desse conta de que estava chegando a hora de almoçar. 
Do contrário, passaríamos horas avaliando todas as 
possíveis opções de refeição - e morreríamos de fome. 
Se o pensamento intuitivo não existisse, seria extre-
mamente difícil escolher uma roupa ou responder a 
perguntas banais, do tipo "como você está?" ou "gostou 
do filme?". De certa forma, o pensamento intuitivo é 
o que nos diferencia dos robôs. E é ele que permite 
ao cérebro processar informações na velocidade ne-
cessária. "Ele é mais influente. É o autor secreto de 
muitas decisões e julgamentos que você faz", explica 
Kahneman no livro. Foi o pensamento intuitivo que 
apontou os R$ 0,20 como resposta para o enigma do 
café. Só que ele mentiu para você. A resposta certa 
é R$ 0,10. Se a bala custasse R$ 0,20, o café custaria 
R$ 2,20 - e o total daria R$ 2,40. 
Esse duelo entre os dois tipos de pensamento, o 
rápido-intuitivo e o lento-analítico, também tem uma 
explicação evolutiva. O córtex pré-frontal, região 
do cérebro responsável pelo processamento lógico, 
surgiu relativamente tarde na evolução da espécie 
humana -já as emoções e os instintos estavam com 
nossos ancestrais há muito mais tempo. Por isso elas 
são tão fortes e nos influenciam tanto. "A filosofia 
considera o ser humano um animal racional. Mas o 
que sabemos é que apenas em certas circunstâncias e __. 
à custa de muito esforço conseguimos ser racionais", 
afirma Vitor Haase, médico e professor de psicologia 
da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). 
O pensamento intuitivo está sempre presente, até 
nas situações em que a racionalidade é suprema-
menteimportante. Um estudo de pesquisadores das 
universidades de Ben Gurion, em Israel, e Columbia, 
nos EUA, analisou o comportamento de juízes que 
deveriam decidir sobre a liberdade condicional de 
presos (um processo rápido, que leva 6 minutos). 
Em média, somente 35% dos condenados ganhavam 
a condicional. Mas os cientistas perceberam que 
os juízes eram muito mais benevolentes depois 
de comer. Quando eles tinham acabado de fazer 
uma refeição, a taxa de aprovação subia para 65%. 
Com o passar do tempo, a fome vinha chegando, 
e a concessão de liberdade condicional ia cain-
do. Minutos antes do próximo lanche, o índice de 
aprovação era quase zero. 
Decidir sobre liberdade condicional e julgar a 
própria felicidade são tarefas complexas. Para avaliar 
todas as variáveis envolvidas, muitas delas subjetivas, 
o cérebro tenderia a ficar sobrecarregado. Por isso, ele 
usa atalhos. "Os nossos problemas são resolvidos no 
piloto automático, por meio de soluções que a cultura 
já embutiu no nosso cérebro", diz Haase. 
Estudos têm revelado outra distorção: toda pes-
soa sempre tende ao otimismo, mesmo quando não 
há motivos para isso. A pesquisadora Tali Sharot, 
da University College London, gravou a atividade 
cerebral de voluntários enquanto eles imaginavam 
situações banais - como tirar uma carteira de iden-
tidade. Ela também pediu que os voluntários pen-
sassem em coisas do passado. Os testes mostraram 
que as mesmas estruturas cerebrais são ativadas para 
recordar o passado e imaginar o futuro. Só que, ao 
imaginar o futuro, os voluntários criavam cenários 
magníficos - era o cérebro tentando colorir os eventos 
sem graça. "Cerca de 8o% das pessoas têm tendência 
ao otimismo, algumas mais do que outras", diz ela. 
Para Tal i, autora do livro Oplimism Bias (O Viés do 
Otimismo, ainda sem versão em português), o otimis-
mo é sempre mais comum que o pessimismo - seja 
qual for a faixa etária ou o grupo socioeconômico 
da pessoa. Assim, nunca acreditamos que algo vá 
dar errado - mesmo quando o mais racional seria 
pensar que sim. "As taxas de divórcio, por exemplo, 
chegam a 40%, so%. Mas as pessoas que estão para 
casar sempre estimam suas chances de separação 
em o%", exemplifica Tali. Segundo ela, a inclinação 
natural ao otimismo também é um dos fatores que 
levaram à crise econômica global de 2008. "As pessoas 
achavam que o mercado continuaria subindo cada vez 
mais e ignoraram as evidências contrárias", afirma. 
Ele está no controle 
As manipulações criadas 
pelo cérebro afetam até a 
capacidade mais essencial 
do ser humano: tomar as 
próprias decisões. Quando 
você decide alguma coisa, 
na verdade o cérebro já 
decidiu -com uma antece-
dência que pode chegar a 10 
segundos. Uma experiência 
feita no Centro Bernstein 
de Neurociência Computa-
cional, em Berlim, compro-
vou que as nossas escolhas 
são resolvidas pelocérebro 
antes mesmo de chegarem 
à consciência. Voluntários 
foram colocados em frente a 
O SEU 
CÉREBRO 
DECIDE 
AS COISAS 
SOZINHO. 
DEZ 
SEGUNDOS 
ANTES 
QUE VOCÊ 
SEQUER 
PENSE. 
uma tela na qual era exibida uma sequência aleatória 
de letras. O voluntário tinha que escolher uma das 
letras e apertar um botão sempre que ela apareces-
se. Os cientistas monitoraram o cérebro dos parti-
cipantes durante o experimento. E chegaram a uma 
descoberta impressionante: 10 segundos antes de os 
voluntários escolherem uma letra, sinais elétricos 
correspondentes a essa decisão já apareciam nos 
córtices frontopolar e mediai, as regiões do cérebro 
ligadas à tomada de decisões. Cinco segundos antes 
de o voluntário apertar o botão, o cérebro ativava os 
córtices motores, que controlam os movimentos do 
corpo. Isso significa que, 10 segundos antes de você 
fazer conscientemente uma escolha, o seu cérebro 
já tomou a decisão para você - e até já começou a 
mexer a sua mão. 
"O indivíduo não é livre para escolher", afirma Re-
nato Zamora Flores, professor de genética do com-
portamento da Universidade Federal do Rio Grande 
do Sul (UFRGS). O cérebro restringe previamente as 
suas possíveis opções e, pior ainda, escolhe uma delas 
antes mesmo que você se dê conta. 
É possível lutar contra isso. Lembra-se daquele outro 
tipo de pensamento, o lento-analitico? Basta colocá-lo 
em ação. E isso você consegue tendo calma, refletindo 
sobre as coisas e duvidando das suas escolhas e opi-
niões. Os truques do cérebro são poderosos, mas não 
invencíveis. Agora que você sabe como funcionam, está 
muito mais preparado para lidar com eles- e se tornar 
realmente livre para tomar as próprias decisões. e 
PARA SABfH MAIS 
COMO A MENTE FUNCIONA, Steven Pinker, 
Companhia das Letras. 
RÁPIDO E DEVAGAR, Daniel Kahneman, Objetiva. 
NOVEMBRO 2015 SU PER 29 
ATE NÇÃO 
M I N H A 
V I O A 
Esta reportagem demorou 
dois anos para ser escrita. 
E a culpa não é (só) da 
minha desorganização. 
Eu tenho Transtorno 
de Déficit de Atenção. 
Aqui você vai entender como 
meu cérebro funciona. 
Texto Rodrigo Rezende 
Fotos Somuel Esteves 
3 0 SUPER NOVEM BRO 2015 
BUZINA DE CARRo, latido de cachorro, choro de bebê, 
"Que horas são?", "Rola algo no Facebook?", "Que pro-
grama de TV é esse?", "O que tem para comer?", "Por que 
alguém vai ler esta matéria mesmo?". Apenas 5 minutos 
sentado em frente ao computador e tudo isso já pas-
sou pela minha cabeça. Tudo ao meu redor fala mais 
alto do que escrever este texto. Fecho a janela, checo o 
relógio, surfo na net, desligo a TV; como chocolate. Só 
então consigo voltar para explicar o que você ganha ao 
continuar lendo esta matéria: uma visão sobre como 
funciona uma mente inquieta. Nas próximas páginas, 
você vai enxergar o mundo pelos meus olhos. Bem-
-vindo ao cérebro TDAH. 
A redação da SUPER não é exatamente o melhor 
lugar para manter a atenção. Pilhas de livros, revistas 
importadas nas paredes, gente falando ao telefone. 
Enquanto rabisco no bloquinho, o diretor de redação 
me explica a pauta: "Quero que você escreva sobre 
TDAH. Mas em primeira pessoa. Sua experiência pode 
ser interessante para o leitor". Topo imediatamente. 
Marcamos o prazo de um mês para entregar o texto 
que você lê agora. Prazo real de entrega: dois anos. 
Se você tem TDAH, não é difícil se 
identificar com a história acima. Ela ex-
põe um dos traços mais característicos 
do Transtorno de Déficit de Atenção e 
Hiperatividade: dificuldade em gerenciar 
o tempo. O paciente TDAH também se 
reconhece facilmente na brincadeira de 
Douglas Adams, autor do Guia do Mo-
chileiro das Galáxias: "Amo prazos de en-
trega. Adoro o som que fazem quando 
passam voando pela minha janela". Somos 
tachados de avoados ou incapazes. Mas 
julgamentos como esses não explicam as 
nuances do TDAH. Eu perco as contas de 
quantas vezes chego atrasado a compro-
missos e esqueço datas de aniversário. Ao 
mesmo tempo, tenho a capacidade de ler 
textos que me inte ressam por horas a fio 
nos ambientes mais caóticos possíveis. 
É bem provável que você conheça mais 
pessoas com esse perfil. Estima-se que um 
em cada 20 adultos apresente sintomas -t 
O cérebro 
de alguém com 
TDAH não consegue 
· los· filtrar os est•mu . 
recebe tudo ao 
mesmo tempo. 
BRO 2015 SUPER J1 NOVEM 
suficientes para ser diagnosticado com 
TDAH. Um estudo de 2012 estimou que 
o impacto da doença na produtividade 
dos EUA era de até US$ 138 bilhões por 
ano, com mais 56 bilhões no tratamento. 
Somando também os custos em crianças, a 
cifra chega a astronômicos U$ 266 bihões. 
Isso supera a depressão, cujo prejuízo foi 
medido em U$ 210 bilhões este ano. Por 
isso, entender o TDAH é uma tarefa cada 
vez mais importante. E é isso que eu fiz, 
procurando alguém que conhece o assun-
to bem de dentro. Mais exatamente, de 
dentro de seu próprio cérebro. 
Uma pilha de exames com cérebros 
coloridos. É o que mais chama atenção 
na mesa da psiquiatra e autora de livros 
Ana Beatriz Barbosa. Mas não consigo 
tirar os olhos de um outro objeto: um 
bloco de anotações. Dentro dele, vejo a 
prova física do que já sabia antes: não sou 
o único com problemas de atenção na sala. 
Os rabiscos caóticos só podem ter vindo 
de um lugar: outro cérebro TDAH. 
Enquanto enche de riscos o seu blo-
quinho, Ana Beatriz explica o que há de 
errado em nossas cabeças: "O defeito es-
tá numa parte do cérebro chamada lobo 
frontal, que fica próxima à testa". O lobo 
frontal é uma espécie de gerente execu-
tivo do cérebro. A função dele é coletar 
informações e enviar ordens em forma de 
impulsos elétricos para as outras partes do 
órgão. Mas, como todo bom gerente, exige 
um pagamento adequado para trabalhar. 
No caso, o pagamento é em dopamina, 
uma substância que regula a interação 
entre neurônios. Sem ela, os neurônios 
do lobo frontal não conseguem conversar 
direito. Quando isso acontece, o cérebro 
começa a funcionar como uma empresa 
sem CEO: ganha o setor que grita mais 
alto. Com medo da falência, a empresa 
cerebral ainda pode tentar criar uma espé-
cie de caixa dois de dopamina. Aí começa 
uma busca desesperada por tudo que pro-
move a produção do neurotransmissor. 
açúcar, sexo, nicotina, jogo, álcool, drogas 
ilegais. Entre 17% e 45% dos adultos com 
IDAH apresentam problemas com álcool. 
O risco de se viciar em drogas é o dobro. 
Mas como diagnosticar alguém assim? 
"Primeiro, é preciso sorte", diz a psiquiatra. 
"Pessoas com TDAH muitas vezes não 
32 SUPER NOVEMBRO 2015 
OS PREJUÍZOS DO 
TDAH SÃO 
ENORMES: ATÉ US$ 
266 Bl AO ANO NOS 
ESTADOS UNIDOS. 
BEM MAIS DO QUE 
A DEPRESSÃO. 
têm ideia de que sofrem de uma doença". 
Sorte foi exatamente o que levou Ana Be-
atriz a ser diagnosticada. Atrasada para 
um curso na Universidade Berkeley (EUA) 
-"Começava às 8h. Cheguei 9h15"-, foi 
obrigada a assistir à única palestra dispo-
nível no horário. O palestrante era Russell 
Barldey, um dos pioneiros no estudo do 
TDAH. Ao ouvir os sintomas da doen-
ça, Ana Beatriz não teve dúvidas: "Sou 
eu!". Logo que a palestra acabou, foi atrás 
de Barldey e pediu para fazer um teste 
psicológico. Ele voltou com o resultado 
positivo. Assim que começou a se tratar, 
Ana Beatriz, que cursou ao mesmo tempo 
Medicina, Física e Odontologia, conse-
guiu pisar no freio da mente e seguir uma 
estrada só: especializou-se em TDAH e 
hoje é autora de best-sellers sobre o tema. 
Homo desatentus 
Savana africana, 30 mil a.C. Em um pe-
queno grupo de Homo sapiens, alguém se 
esforça para entender a conversa. Não é 
tarefa fácil. Folhas balançando ao vento, 
pilhas de ossos ao lado, trilhas de ani-
mais no chão. Tudo capta seu olhar. Mas 
o IDAH pode ter sido uma vantagem para 
nossos ancestrais. Na luta pela sobrevi-
vência entre caçadores-coletores,levava 
vantagem quem possuía uma misteriosa 
habilidade presente no cérebro TDAH: o 
hiperfoco. Hiperfoco é uma capacidade 
de superconcentração característica de 
muitas mentes desatentas. Você já deve 
ter topado com gente assim: o menino 
que não para quieto, mas joga dez horas 
de videogame, ou a pessoa que não vai 
à aula, mas passa a tarde tocando violão. 
Seriam todos descendentes diretos doca-
çador distraído, mas supereficaz. Para ele, 
um animal na savana é como um videoga-
me ou um violão: algo que monopoliza o 
cérebro. Essa capacidade de ver uma presa 
e apagar o resto do mundo conferiu vanta-
gens evolutivas. E possibilitou que os ge-
nes do caçador TDAH chegassem até nós. 
"Estima-se que 8o% dos casos de TDAH 
têm origens genéticas", diz o psiquiatra 
da New York University Lenard Adler. 
Mas voltemos ao presente. Faz quatro 
horas que escrevo sem parar. Não batu-
co na mesa, como de costume. Nenhuma 
janela aberta no navegador. Quem me 
conhece pode achar que estou possuído. 
E estou: por uma pílula. O mecanismo 
exato de funcionamento dos medicamen-
tos para TDAH é desconhecido. Mas os 
efeitos mentais são bem familiares. Em 
alguns minutos, o cérebro, que funcionava 
como um rádio fora de estação, entra em 
sintonia. E o impossível se toma possível: 
executar uma só tarefa por vez. 
Ritalin, Aderall, Concerta, Venvanse. 
Esses formam a primeira linha de com-
bate na guerra contra os problemas de 
atenção (e têm sido abusados por gente 
sem o transtorno, como "anabolizante" do 
cérebro). Mas essas armas não são exata-
mente precisas. É possível, por exemplo, 
ingerir um medicamento com um alvo 
em mente e acertar outro: engolir uma 
pílula com a intenção de escrever um 
texto e terminar arrumando a gaveta de 
meias. Muito menos existe uma espécie 
de bomba atômica contra o TDAH: um 
medicamento que funcione com 100% dos 
pacientes. Para tratar o TDAH, ainda é ne-
cessário alguém que entenda de estratégia 
de guerra: um psiquiatra capaz de testar 
os medicamentos adequados a cada caso. 
Mas agora a pergunta que realmente 
interessa: como saber se você tem TDAH? 
Se você chegou sem interrupções até aqui, 
a resposta mais provável é não. (Mas pode 
ser que sim. E você está em hiperfoco 
agora). A verdade é que só um profissional 
vai saber responder. Mas, se a resposta for 
sim, não se desespere. Afinal, um simples 
TDAH não impediu você de ler este tex= 
to até o final, não é mesmo? E nem me 
impedirá de escrever muitos outros. O 
PARA SABfR MAIS 
MENTES INQUIETAS 
Ana Beatriz Barbosa, Principium. 
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36 SU PER NOVEMBRO 2015 
MARIANA ALMEIDA É APENAS UM ANO 
mais nova que o irmão, Pedro. Na escola, 
ela não era brilhante, mas estudava um 
pouquinho todos os dias e conseguia 
manter as notas altas, enquanto ele ra-
ramente era aprovado em alguma ma-
téria sem fazer recuperação. Na família 
de gordinhos, Mariana lutava contra a 
balança, enquanto Pedro gastava a me-
sada em biscoitos recheados. Quando 
ela arrumou o primeiro emprego, como 
secretária numa multi nacional, indicou 
Pedro para um cargo de office-boy. Mas 
o trabalho era puxado, o chefe era nervo-
so, e ele não demorou a pedir demissão. 
Nos últimos dez anos, Pedro trabalhou 
numa padaria, foi garçom de um bar, alu-
gou um carrinho de cachorro-quente, e 
agora está desempregado, mas pensando 
em comprar um táxi. Mariana continua 
na mesma empresa, onde foi promovida 
a secretária executiva, e vive empres-
tando dinheiro para o irmão. Quando se 
encontram na casa da mãe aos domingos, 
ela fica na saladinha, enquanto ele se 
farta na macarronada, mas garante que 
naquela semana mesmo vai começar a 
jogar futebol com os amigos. 
Esta história talvez soe familiar para 
você: dois irmãos ou amigos que tiveram 
oportunidades muito parecidas na vida, 
mas seguiram caminhos completamente 
diferentes. O manual de uma vida bem-
-sucedida não é segredo para ninguém 
- devemos comer verduras, praticar es-
portes, man ter a calma no trabalh o, eco-
nomizar dinheiro. Se algum dia você já 
fez uma lista de resoluções de ano-novo, 
é possível que alguns desses itens esti-
vessem presentes nela. Mas é provável 
que muitos deles nunca tenham virado 
parte da sua rotina. Andar na linha não 
é tão simples quanto pode parecer à pri-
meira vista: por trás das tentações há 
um intricado sistema cerebral que tenta 
Sentir prazer é tão 
viciante para o cérebro 
quanto usar drogas. 
Por isso é tão perigoso. 
o tempo inteiro nos levar para o mau 
caminho. Se vamos ceder às vontades 
ou não, depende do nosso autocontrole, 
um dos fatores mais decisivos para o 
desempenho da nossa vida. 
Por que falar "não"? 
A clássica imagem dos desenhos a ni-
mados em que o personagem tem um 
anjo num ombro e um diabo no outro 
não é exagero. De acordo com as úl-
timas pesquisas, é assim mesmo que 
nos comportamos diante das tentações. 
É realmente uma batalha o que acon-
tece entre a vontade de sentir prazer 
imediato contra o esforço de adiá-lo. 
Algumas pessoas são naturalmente mais 
descontroladas do que outras, mas, de 
maneira geral, todos temos coisas que 
conseguimos manter nos trilhos e outras 
que descarrilam de vez em quando. Tem 
quem seja impecável no trabalho, por 
exemplo, mas não consiga levar uma 
dieta a sério. Ou quem pratique espor-
tes regularmente, mas não aguente ser 
contrariado sem partir para a briga. 
Mas qual é o problema de ceder às 
tentações? Bem, a existência do futuro. 
Se você soubesse que vai morrer ama-
nhã, não teria por que guardar dinheiro 
ou passar o sábado à noite estudando. 
Nem ficar comendo salada para não en-
tupir as veias de colesterol aos 50 anos. 
Essas preocupações só fazem sentido 
porque imaginamos que vamos viver 
muitos anos ainda. "Seguir nossos im-
pulsos seria adaptável biologicamente 
se nós fôssemos projetados para viver 
apenas por hoje. E sem preocupação 
com o bem-estar dos ou tros", defini-
ram os psicólogos alemães Wilhelm 
Hofmann, Malte Friese e Fritz Strack 
no artigo Impulso e Autocontrole a Partir 
de uma Perspectiva Dual de Sistemas, de 
2009. O homem não é o único animal 
que precisa lidar com a tentação 
do prazer imediato contra os pla-
nos de futuro. (O joão-de-barro 
passa dias montando uma casi-
nha no capricho, por exemplo, e 
as abelhas constroem colmeias 
complicadíssimas para armazenar 
alimento.) Mas nós somos os úni-
cos com interesses e necessidades --+ 
muito mais complexos do que simples-
mente comer e procriar. Queremos, por 
exemplo, ter uma vida em sociedade. 
Manter relações amigáveis seria pra-
ticamente impossível se todo mundo 
resolvesse levar o hedonismo às últi-
mas consequências. 
Fazer tudo o que dá na telha afasta as 
pessoas próximas. Por isso cada grupo 
na história da humanidade criou suas 
próprias leis e códigos morais parare-
gular sexo, drogas, comida e jogos. Na 
Grécia Antiga, alguns prazeres eram 
socialmente aceitos e cultuados na 
figura do deus Dionís io, aquele das 
orgias e bebedeiras. Na Idade Média, 
por outro lado, quase todas as formas 
de prazer eram proibidas: as tentações 
deveriam ser pun idas com penitências, 
e todos viviam sob a ameaça da Inqui-
sição (Está Já no fim do pai-nosso: "Não 
nos deixei cair em tentação, amém"). 
Mas o cerceamento do prazer está pre-
sente em todas as sociedades humanas, 
de maneira mais ou menos radical. (No 
nosso mundo, essas regras se aplicam 
na hora de pegar a última empadinha 
do prato, por exemplo -todo mundo se 
controla para não fazer a desfeita com 
os outros.) Esse cuidado para regular as 
tentações faz sentido: poucas coisas são 
biologicamente tão poderosas quanto 
a sensação de prazer. 
Já é tentação 
Nos anos 1950, os psicólogos Peter 
Mi lner e Ja mes Olds, da Universi-
dade McGill, no

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