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A O L E IT O R Inovação é a meta No dicionário Aurélio, há dois significados para a palavra inovar: 1) renovar e 2) introduzir novidade. Foi exatamente com base no significado de inovação, tão familiar às atividades da FAPEMIG, que a equipe da MINAs FAz CIêNCIA decidiu rechear as páginas da revista de novidades. A partir desta edição, o leitor tem uma publicação mais leve, moderna e cheia de boas novas. Você vai conhecer a seção “Cinco perguntas para”, que apresenta entrevis- tas curtas e diretas com personalidades do meio científico. A última página trará uma novidade a cada edição, revelando que a Ciência pode ser vista sob diversos ângulos, como a arte e a literatura, por exemplo. Neste número, uma foto mostra a harpia, a ave de rapina mais forte do mundo, encontrada nas florestas brasileiras. A página de notas ganha o nome de “Curtas da Ciência”, com novo visual e textos mais breves e diretos, e o leitor passa a acompanhar dicas de livros e filmes rela- cionados ao mundo científico, na seção “Leituras”. No conteúdo, o leitor continua conferindo o que tem sido produzido de melhor na Ciência, Tecnologia e Inovação em Minas Gerais, que é destaque no âmbito nacional e importante representante do Brasil no cenário internacional. Você poderá conferir, por exemplo, os avanços na pesquisa paleontológica, em Uberaba, com sua mais recente descoberta: o Campinasuchus dinizi, um croco- dilo pré-histórico, cujos fósseis foram descobertos por um fazendeiro da região. Na entrevista com o renomado pesquisador e colunista da Folha de S. Paulo, Marcelo Gleiser, o leitor vai acompanhar, entre outros assuntos, o debate sobre a divulgação científica no País, o papel das novas tecnologias na atualidade e a relação entre razão e mito, um dos temas do mais novo livro de Gleiser, lançado em parceria com Frei Betto. A Ciência no cinema, bem como a rica e forte relação entre os dois elemen- tos ao longo da história, são discutidos em uma das reportagens, sob a ótica de profissionais e especialistas da área. O leitor também vai conhecer um projeto multidisciplinar que levantou os hábitos e a cultura de comunidades quilombolas do Norte de Minas e se informar sobre trabalhos desenvolvidos em áreas como segurança pública, mobilidade urbana, recursos hídricos e educação. As novidades também ultrapassam as páginas da revista e chegam ao blog (http://fapemig.wordpress.com) que acaba de ser lançado para ampliar o Progra- ma de Divulgação Científica da FAPEMIG, que tem o mesmo nome da revista: MINAs FAz CIêNCIA. A partir de agora, o público poderá conferir na internet, informações diversas e dicas do universo científico, além de assistir reportagens do programa CIêNCIA NO Ar e ouvir as pílulas de rádio do ONDAs DA CIêNCIA. Tudo isso, com uma identidade visual moderna e desenvolvida especialmente para despertar no leitor a percepção da ciência como elemento do cotidiano. Confira nas próximas páginas todas as novidades que preparamos. Você, leitor, também é fundamental nesta mudança. Diga-nos o que achou, escreva seus comentários no blog, envie suas sugestões. Queremos, mais que fazer ciência, mostrar o quanto ela está próxima de todos e pode ser uma agradável companhia. Ela te espera nas páginas seguintes! E X P E D IE N T E MINAs FAz CIêNCIA Assessora de Comunicação Social e Editora Geral: Ariadne Lima (MG09211/JP) Editor Executivo: Fabrício Marques Assessora Editorial: Vanessa Fagundes Redação: Ariadne Lima, Fabrício Marques, Vanessa Fagundes, Juliana saragá, Maurício Guilherme silva Jr., Ana Flávia de Oliveira, Hely Costa Jr., Kátia Brito (Bolsista de Iniciação Científica). Ilustrações: Beto Paixão Revisão: Glísia rejane Projeto gráfico: Hely Costa Jr. Editoração: Fazenda Comunicação & Marketing Montagem e impressão: Lastro Editora Tiragem: 20.000 exemplares Fotos: Marcelo Focado/Gláucia rodrigues Capa: Hely Costa Jr., sobre ilustração de rodolfo Nogueira redação - rua raul Pompéia, 101 - 12.º andar, são Pedro - CEP 30330-080 Belo Horizonte - MG - Brasil Telefone: +55 (31) 3280-2105 Fax: +55 (31) 3227-3864 E-mail: revista@fapemig.br site: http://revista.fapemig.br Blog: http://fapemig.wordpress.com/ Facebook: http://www.facebook.com/FAPEMIG Twitter: @fapemig GOVErNO DO EsTADO DE MINAs GErAIs Governador: Antonio Augusto Junho Anastasia sECrETArIA DE EsTADO DE CIêNCIA, TECNOLOGIA E ENsINO sUPErIOr Secretário: Narcio rodrigues Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais Presidente: Mario Neto Borges Diretor de Ciência, Tecnologia e Inovação: José Policarpo G. de Abreu Diretor de Planejamento, Gestão e Finanças: Paulo Kleber Duarte Pereira Conselho Curador Presidente: João Francisco de Abreu Membros: Afonso Henriques Borges, Anna Bárbara de Freitas C. Proietti, Evaldo Ferreira Vilela, Francisco sales Dias Horta, Giana Marcellini, José Cláudio Junqueira ribeiro, José Luiz resende Pereira, Magno Antônio Patto ramalho, Paulo César Gonçalves de Almeida, Paulo sérgio Lacerda Beirão, rodrigo Corrêa de Oliveira ENgENhARIA DE TRâNsITO Núcleo de Transportes da UFMG busca alternativas viáveis para melhoria da mobilidade urbana em BH. 12 TEcNOLOgIAs fLOREsTAIs Estudos para a preservação das florestas brasileiras rendem prêmio ao cientista José roberto scolforo. 16 EDucAçãO Projeto desenvolvido com estudantes mineiros mostra que os saberes científicos cabem no salão de beleza. 35 LEmbRA DEssA? radiação eletromagnética consegue prever o escurecimento de batatas e auxiliar na reprodução de animais. 39VIOLêNcIAmONITORADA Polícia mineira trabalha em conjunto para diminuir os índices de violência no Estado. 23 hIsTóRIA solenidades no Centro Administrativo e Assembléia Legislativa do Estado marcam as comemorações dos 25 anos da FAPEMIG. 26 ENTREVIsTA O físico Marcelo Gleiser discute as dimensões da Ciência e sua capacidade de aproximar o homem do universo. 28 cINEmA E cIêNcIA A intensa relação entre os dois campos ilumina a vida para muito além do aconchegante escurinho das salas de projeção. 40 sAúDE Produto que higieniza jaleco usado por profissionais da saúde evita contaminações fora dos hospitais. 32 EsPEcIAL Paleontólogos descobrem no Triângulo Mineiro fósseis do crocodilo pré-histórico Campinasuchus dinizi. 06 QuILOmbOLAs retrato de comunidade quilombola do Norte de Minas revela traços importantes da cultura negra. 46 LEITuRAs Minas Faz Ciência indica os livros “superstições” e “Quântica para iniciantes”. 48 5 PERguNTAs PARA... Carlos Nobre, do Ministério da Ciência e Tecnologia, que fala sobre o clima e os desastres naturais 49 ÍN D Ic E ENgENhARIA DE ALImENTOs sistema de gestão desenvolvido na UFV permite redução de resíduos na indústria de laticínios 20 MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/MAI 2011 5 c A R TA s MINAS FAZ CIÊNCIA tem por finalidade divulgar a produção científica e tecnológica do Estado para a sociedade. A reprodução do seu conteúdo é permitida, desde que citada a fonte. sou aluno de um curso preparatório para vestiulares. Por meio dos professores da escola conheci a revista MINAs FAz CIêNCIA e me interessei muito pelos te- mas abordados. Também considero esta publicação uma fonte confiável. Hailton da Cruz Rocha Estudante Ibirité/MG MINAs FAz CIêNCIA é importante, pois traz os avanços científicos de Minas Ge- rais, o que é de fundamental importância para o Centro Mineiro de referência em resíduos (CMrr) e principalmente por nos deixar em contato direto com as pes- quisas que têm sido feitas no Estado. Joicely Centro Mineiro de Referência em Resíduos Belo Horizonte/MG Como mineiro graduado em Engenharia Química na UFMG em 1982, posso dizer com propriedadeo “antes tarde do que nunca”, pois só agora descobri a revis- ta MINAs FAz CIêNCIA, já na edição 43, junto à outras publicações na sala de café aqui da Faculdade de Engenharia Química da Unicamp onde sou docente desde 1995. Parabéns pela publicação e gostaria de saber como faço para recebê-la aqui em Campinas-sP. Everson Alves Miranda Professor Campinas/SP Olá, me chamo Ednei e sou aluno do cur- so de Biologia e Meio Ambiente na Esco- la superior de Biologia e Meio Ambiente (Esma) e tive a oportunidade de conhecer a revista Minas faz Ciência que possui um ótimo conteúdo. Ednei Lopes Camargos Estudante Iguatama/MG sou professora de Biologia da rede Esta- dual de Ensino de Minas Gerais e gostaria muito de receber a MINAs FAz CIêNCIA. Conheci um exemplar através de um amigo e achei muito interessante, as minhas aulas podem ficar muito mais ricas e atualizadas. Priscilla Siqueira Paes Professora Porto Firme/MG sou aluna do segundo período do curso de Enfermagem da UFVJM. A minha profes- sora de Metodologia Científica falou muito bem a respeito da MINAs FAz CIêNCIA com a nossa turma, e eu gostaria de saber se seria possível eu receber os exempla- res em minha residência. Muito obrigada desde já. Daiana Aparecida Ribeiro Vieira Estudante Diamantina/MG Para receber gratuitamente a revista MINAs FAz CIêN- CIA, preencha o cadastro no site http://revista.fapemig. br ou envie seus dados (nome, profissão, instituição/ empresa, endereço completo, telefone, fax e e-mail) para o e-mail: revista@fapemig.br ou para o seguinte endereço: FAPEMIG / revista MINAs FAz CIêNCIA - rua raul Pompéia, 101 - 12.º andar - Bairro são Pedro - Belo Horizonte/MG - Brasil - CEP 30330-080 Es P Ec IA L A incrível aventura do crocodilo pré-histórico Conheça a história do Campinasuchus dinizi, cujos fósseis foram localizados no Triângulo Mineiro, tornando-se a mais nova descoberta da paleontologia no Brasil No Triângulo Mineiro, em um dia do ano de 2009, Amarildo Martins Queiroz andava pela fazenda Três Antas, de sua propriedade, observando o movimento do gado, quando decidiu olhar para o chão onde as vacas pastavam. Percebeu ali al- guns ossos diferentes, algo que nunca ti- nha visto, distinto dos restos mortais dos animais que conhecia. Lembrou-se que, a 300 quilômetros de Campina Verde, no distrito de Honorópolis, onde se localizava a fazenda, havia Peirópolis, um bairro de Uberaba, e, lá, o Museu dos Dinossauros. Amarildo resolveu levar sua nova desco- berta a alguém que pudesse auxiliá-lo a desvendar o sentido daqueles ossos. Foi então que procurou pelo geólogo Luiz Car- los ribeiro, pesquisador da Universidade Federal do Triângulo Mineiro (UFTM) e responsável pelo museu em Peirópolis. Fabrício Marques 6 MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/MAI 2011 Cr éd ito d a ilu st ra çã o: R od ol fo N og ue ira MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/MAI 2011 7 Ao se ver diante de um pedaço do crânio de um animal até então desconhe- cido, Luiz Carlos exultou. Ele sabia que não é raro que leigos encontrem fósseis, e o fazendeiro Amarildo acabara de encon- trar, na superfície do solo de sua fazen- da, diversos fósseis que, inocentemente, eram pisados pelo gado. Logo viu tratar- -se de um crocodilo, que vivera naquela região há milhões de anos. De acordo com ribeiro, o sítio pale- ontológico Três Antas pode ser considera- do o mais novo “Lagerstatten” continental brasileiro. Em outras palavras, Três Antas apresenta alta concentração de fósseis em bom estado de preservação, materiais completos, articulados e que nos contam detalhes da história biológica da vida du- rante o Cretáceo superior nas áreas conti- nentais do Brasil. A descoberta desse sítio aponta para ambientes denotando uma mortandade em massa provavelmente ad- vinda de momentos de estresse térmico e diminuição extrema ou escassez de água em períodos de extrema aridez da bacia. Quando ocorre uma descoberta como essa, os pesquisadores comparam esses fósseis com todas as espécies do mundo, para ver se já existe alguma clas- sificação do indivíduo pré-histórico. Feito esse trabalho, partem para classificá-lo, batizando-o em gênero e espécie. Foi o que aconteceu em Campina Verde: o indivíduo ali descoberto recebeu o nome científico de Campinasuchus dinizi – o sobrenome teve o intuito de homenagear um filho de Amarildo que morreu ainda criança, Izonel Queiroz Diniz Neto. Em seguida, um artigo é publicado em uma revista que seja referência na área, sendo que a publicação é avalizada por três pareceristas independentes. A desco- berta de Campina Verde foi publicada na Zootaxa, em maio de 2011, quase um ano e meio depois que partes do Campinasuchus dinizi foram identificadas. Às vésperas do Natal de 2009, em uma primeira expedição de reconhecimen- to, uma equipe de pesquisadores da UFTM dirigiu-se à Campina Verde em busca de melhor conhecer as ocorrências da Fazenda Três Antas. Acompanhados pelo proprietá- rio Amarildo Queiroz, os cientistas ficaram O trabalho geológico mostra-se fundamental para a contextualização das ocorrências dos fósseis, possibilitando assim a reconstituição dos cenários de vida e o entendimento da temporalidade representada pelos registros paleobiológicos”. Ismar de Souza Carvalho, paleontólogo da Universidade Federal do rio de Janeiro (UFrJ) surpresos face à riqueza e significância des- se novo sítio Paleontológico. Mais tarde, o proprietário construiria uma cerca para pro- teger a área do pisoteio do gado, evitando assim a destruição dos fósseis. Mas somente em maio de 2010 é que se realizou a primeira escavação sistemática para efetivamente se conhecer o potencial fossilífero daquela localidade. O paleontó- logo Ismar de souza Carvalho, da Univer- sidade Federal do rio de Janeiro (UFrJ), integrou esta equipe de campo, se mostran- do muito impressionado com o novo jazigo fossilífero datado de 90 milhões de anos, do qual provém alguns dos mais impressio- nantes fósseis terrestres do Brasil. Desde então, Ismar Carvalho e o geólogo Luiz Carlos iniciaram os estudos destes materiais. Não é por acaso que geólogo e paleontólogo trabalham juntos nessas expedições. “Mais do que um di- álogo, eles são complementares”, explica Ismar. E completa: “Muitos de nossos paleontólogos têm uma formação inicial como graduados em geologia, o que pos- sibilita uma plena integração no processo de estudo dos fósseis. O trabalho geoló- gico mostra-se fundamental para a con- textualização das ocorrências dos fósseis, possibilitando assim a reconstituição dos cenários de vida e o entendimento da temporalidade representada pelos regis- tros paleobiológicos”. Amarildo Queiroz, na fazenda Três Antas, local da descoberta do fóssil Foto: Arquivo Museu dos Dinossauros/UFTM 8 MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/MAI 2011 Para Ismar Carvalho, a descoberta de Campinasuchus encontra-se no contex- to de uma “assembleia de morte”, na qual muitos crocodilos foram preservados com o esqueleto articulado e praticamente com- pletos, possibilitando assim o entendimen- to detalhado de aspectos fisiológicos e da dinâmica de vida dos crocodilos terrestres que habitaram o interior de Minas Gerais no passado geológico de nosso planeta. É possivelmente o mais importante jazigo fos- silífero encontrado no Brasil nos últimos 10 anos, e que representa uma verdadeira ja- nela para o entendimento dos ecossistemas terrestres há 90 milhões de anos. “Os fósseis que têm sido descobertos em Minas Gerais demonstram uma fauna peculiar e distinta da encontrada no hemis- fério norte, reforçando a concepção de uma territorialidade da vida no decurso do tempo e uma identidade para a Paleontologia bra- sileira”, observa o cientistada UFrJ. Muito embora os fósseis de Cam- pina Verde tenham sido descobertos pelo fazendeiro, não se pode dizer que a maioria das descobertas de fósseis se dá por popu- lares, como alerta Ismar: “Muitos fósseis resultam de um trabalho sistemático de pesquisa, que geralmente se inicia com o trabalho de mapeamento geológico. Deve- mos ressaltar que a paleontologia também tem um vertente de estudo voltada para a atividade industrial, como é o caso de sua aplicação na prospecção de hidrocarbone- tos. Neste caso muitos novos fósseis são descobertos - os microfósseis - e o mérito é exclusivo dos geocientistas envolvidos em tais estudos”. Em novembro de 2010 novas esca- vações foram realizadas. Esqueletos arti- culados foram recuperados e engessados, a fim de serem transportados até Peiró- polis para se dar início à próxima etapa que compõe a pesquisa paleontológica, a preparação dos fósseis. Esse trabalho acontece no laboratório, e em síntese constitui-se da retirada do fóssil da rocha matriz que o contém. A técnicas e os cui- dados necessários para essa tarefa estão a cargo do técnico João Ismael da silva, com 20 anos de experiência. João Ismael observou o bloco susten- tado pela fôrma de gesso e viu, em sua su- perfície, tal qual um iceberg, pedaços de um fóssil. Até aquele momento, nem ele, nem nenhum dos pesquisadores ainda sabia que a descoberta remetia ao Campinasuchus dinizi, da família Baurusuchidae, família esta reconhecida pelo renomado Llewellyn Ivor Price em 1945, o patriarca dos pale- ontólogos de Uberaba. Os baurusuquídeos são Crocodyliformes terrestres predadores, situados geologicamente na Bacia Bauru (Grupo Bauru - Formação Adamantina), com idade de 90 milhões de anos. Também até aquele momento, só se conheciam os seguintes baurusuquídeos do Brasil: Bau- rusuchus (B. pachecoi; B. salgadoensis; B. albertoi) e Stratiotosuchus maxhechti, sen- do que todos provêm do Grupo Bauru, For- mação Adamantina, Cretáceo superior de são Paulo. Na Argentina, merecem registro os baurusuquídeos Cynodontosuchus rothi e Wargosuchus australis. João Ismael divide Peirópolis em A.M. e D.M., ou seja, Antes do Museu e Depois do Museu do Dinossauro. O mar- co que colocou o bairro de 250 morado- res no mapa da paleontologia nacional é hoje conhecido como Complexo Cultural e Científico de Peirópolis da Universida- de Federal do Triângulo Mineiro (UFTM), instituição que encampou os esforços do professor Luiz Carlos à fim de dar visibi- lidade ao patrimônio da região e incluir os moradores da comunidade nos traba- lhos do Complexo. Luiz Carlos atribui a dois eventos o fato de ter sua história pessoal ligada a Pei- rópolis: é que o primeiro dinossauro foi en- contrado na Fazenda Mangabeira, de seu bi- savô, em 1945. E, em segundo lugar, sendo filho de fazendeiros dedicados ao agronegó- cio, preferiu seguir a sugestão de seu tio, um dos mais importantes jornalistas brasileiros, José Hamilton ribeiro, que abriu os olhos do sobrinho para a geologia. Luiz Carlos fez o curso na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e voltou para sua terra natal, em 1988. são, portanto, mais de duas dé- cadas dedicadas a pesquisas e descobertas de fósseis. Tanta dedicação foi recompensa- da: o maior dinossauro brasileiro leva seu sobrenome, o Uberabatitan ribeiroi. Ele foi um dos últimos do planeta, viveu até cerca de 65 milhões de anos atrás, momento em que uma grande extinção em massa dizimou 70% de toda vida existente na Terra. Na sequência de fotos: primeiro, equipe do Complexo de Peirópolis escava em buca de fóssil; fóssil é examinado; equipe transporta esqueleto articulado protegido pelo gesso Fo to s: A rq ui vo M us eu d os D in os sa ur os /U FT M MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/MAI 2011 9 “Neste caso em especial, o fóssil transcende sua própria importância cien- tífica”, diz ribeiro, numa manhã de 16 de junho deste ano. Enquanto dirige seu carro a caminho do Complexo de Peiró- polis, ele explica seu ponto de vista. “Em Peirópolis os fósseis têm-se mostrado como eficazes ferramentas de revitaliza- ção sócio-econômico-cultural. Através do geoturismo, os moradores transformaram suas realidades de vida. A Ciência deve servir à sociedade e dentro do possível ter a máxima aplicação para o bem estar das pessoas”. Por conta disso, há todo um empenho para que o potencial turís- tico seja cada vez mais potencializado a partir da divulgação de cada nova desco- berta. Uma busca no Google revela que a pequena Peirópolis tem mais citações no âmbito da paleontologia do que a cidade que a abriga, Uberaba. Em Peirópolis, juntou-se a nós o mé- dico patologista Vicente de Paula Antunes Teixeira, coordenador do Complexo desde 2009. Dali, nosso destino era a Caieira, tam- bém denominado Ponto 1 do Price, distante 2 km ao norte do bairro, localizado em uma fazenda particular, onde uma equipe de es- cavação, composta de cinco funcionários – todos da comunidade – se via às voltas com marretas, ponteiros, pincéis e um martelete com gerador (uma recente aquisição para acelerar a procura dos fósseis). Por volta de 11 horas da manhã, o guia turístico Plínio Lopes dos Anjos con- duzia 20 crianças de Patrocínio (município que dista 200 quilômetros de Uberaba), em excursão para conhecer as escavações. Ali, eles podiam perceber os cinco trabalha- dores na encosta, que há milhões de anos constitui paisagem muito distinta de hoje, o que os geólogos chamam de bacias se- dimentares. Em um contexto do passado representa ambientes geológicos formados por sucessões de depósitos de rios que drenavam a região e juntamente com os sedimentos também eram arrastados os restos dos animais pré-históricos que ali viviam. Agora, o que se vê são rochas sedi- mentares onde a areia dos rios está cimen- tada com carbonato de cálcio que por vezes constituem verdadeiros pacotes de calcário, sedimentos estes formados de substâncias químicas fundamentais para o processo de fossilização. Todo este pacote de rochas recebe o nome de Formação Marília, com fósseis de 65 a 72 milhões de anos. “Por que em Uberaba se acha mais fóssil?”. se algum desavisado pergun- ta, Luiz Carlos já tem a resposta pronta: “Porque se escava mais”. E aponta para a encosta, brilhando no céu claro de junho: “daqui saíram três dinossauros, três cro- codilos e em breve uma nova rã deverá ser descrita. Desses, um pequeno dinos- sauro carnívoro pertencente ao grupo dos Maniraptoriformes, dois dinossauros her- bívoros titanossauros: Baurutitan britoi, Trigonosaurus pricei, os crocodyliformes: Peirosaurus tormini, Itasuchus jesuinoi e Uberabasuchusus terrificus. Uma nova es- pécie de ovo de titanossauro também de- verá ser apresentada em breve, proveniente deste ponto: é muita relevância científica para uma única localidade”. “Em Peirópolis os fósseis têm-se mostrado como eficazes ferramentas de revitalização sócio- econômico-cultural. Através do geoturismo os moradores transformaram suas realidades de vida. A Ciência deve servir à sociedade e dentro do possível ter a máxima aplicação para o bem estar das pessoas”. Luiz Carlos Ribeiro, pesquisador da Universidade Federal do Triângulo Mineiro (UFTM) e responsável pelo museu em Peirópolis. 10 MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/MAI 2011 Além da FAPEMIG, também apoiam a pesquisa a Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do rio de Janeiro (Faperj), o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e a Henkel do Brasil. Reconstituição Em poucos meses, uma animação em 3D será apresentada no rio de Janeiro para divulgar como era e como vivia o Campina- suchus dinizi. Com os recursos dessa tec- nologia, os espectadores poderão conhecermelhor esse animal essencialmente terres- tre comprovado pelos membros longos e retos, olhos laterais, narinas frontais, cauda cilíndrica e poucos osteodermos, o que o tornava mais leve e ágil e cauda mais curta. O fóssil de Campinasuchus foi en- contrado com fragmentos de rochas em sua porção abdominal, ou seja, gastrólitos que ajudariam na trituração e digestão de alimentos. Os membros anteriores e pos- teriores eram muito compridos, possivel- mente adaptados para ter uma postura ere- ta, diferente aos jacarés atuais que apoiam o peito no chão durante seu deslocamento. Possivelmente foi muito ágil e sua principal fonte de alimento eram peixes, tartarugas, assim como também pequenos crocodyliformes e dinossauros herbívoros de pequeno tamanho. Quem trabalha nessa reconstituição é o paleoartista rodolfo Nogueira, de 24 anos, contratado pela multinacional Henkel do Bra- sil, que há 15 anos é parceira do Museu dos Dinossauros. Ele é formado em desenho in- dustrial pela Unesp, de Bauru, e tinha 6 anos quando o Museu em Peirópolis foi inaugu- rado. Com 12 anos, fez sua primeira paleo- arte, e não parou mais. Na reconstrução, ele trabalha com espuma floral, que é o material usado para construir a réplica. A exibição do minidocumentário em 3D é uma estratégia pensada também para atrair novas gerações ao poder da paleon- tologia – do grego palaios = antigo –, a ciência que estuda os fósseis. É a mesma motivação que reúne um grupo de bolsistas de iniciação científica em torno do Complexo de Peirópolis, todos – com exceção de Lívia – graduandos na UFTM: a estudante de Engenharia Ambiental Patrícia Fonseca Ferraz, 20 anos e a estudante de Bio- logia Isabella Cardoso Cunha, 21 participam das pesquisas há quatro anos. O estudante de Geografia Gabriel Cardoso Cunha, 23, e a en- fermeira Lívia Ferreira Oliveira, 26, chegaram há um ano. A doutora em Patologia Mara Lúcia da Fonseca Ferraz, que chegou a Peirópolis na mesma época que o professor Vicente, reco- nhece neles um grupo curioso e empolgado, com muito trabalho pela frente: “Ainda há 80 mil anos de pesquisa”, comemora. Gabriel, Isabella e Patrícia também assinam o artigo na revista Zootaxa, e todos eles, de uma forma ou de outra, têm boas lembranças do dia da descoberta do Campi- nasuchus. Gabriel participou das escavações dos fosséis do crocodilo e da preparação para exposição. “Foi meu primeiro trabalho de campo, já resultando em uma grande des- coberta. Foram dias cansativos de trabalho braçal, porém tudo foi muito recompensador, pelo grupo em que estávamos, pelo local de escavação (cheio de fósseis) e pelo motivo de estarmos ali (uma nova espécie)”, afirma. Isabella conta que conheceu o campo de Campina Verde em 2010, na segunda expedição ao local. “Conosco estava o pro- fessor Ismar de souza Carvalho e alguns da Acima, reconstituição do Campinasuchus, feita por rodolfo Nogueira; abaixo, o pesquisador Luiz Carlos examina peça do crocodilo Fotos: Arquivo Museu dos Dinossauros/UFTM MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/MAI 2011 11 EQuOTERAPIA Em PEIRóPOLIs Com a estruturação do Polo de Pesquisas e Centro de Equoterapia do CCCP/UFTM de Peirópolis, a fisiote- rapeuta Ana Paula Espíndula preten- de beneficiar, através das pesquisas desenvolvidas, um número maior de crianças, além de adultos. Atualmente, o trabalho financiado pela FAPEMIG beneficia, de forma indireta, em média 200 crianças com paralisia cerebral, síndrome de Down e com atraso no de- senvolvimento intelectual, atendidas na Equoterapia da Apae de Uberaba. O trabalho teve início em novem- bro de 2009 e os dados coletados até junho deste ano, por meio do eletromi- ógrafo - um equipamento que mensura a contração muscular – permitiram ve- rificar se a prática da Equoterapia é efi- caz para o grupo de crianças estudadas e qual o melhor tipo de material de mon- taria para as sessões dessas crianças. nossa equipe de Peirópolis, juntamente com o argentino que nos auxilia na pesquisa, Agustín Martinelli. O local é de extrema be- leza, visto que, a cada passo encontrávamos fósseis em todos os lados. Frágeis, tomáva- mos bastante cuidado, utilizando apenas um pincel para separarmos a rocha do fóssil”. Ela se recorda que, enquanto isso, outros profissionais desbravavam um crocodilo encontrado. “A imprensa também estava presente e todos ficaram muito empolgados com tudo o que poderíamos estudar daquele local. Apesar da viagem ter sido cansativa, voltamos com muitos planos em mente para vários anos seguintes”. O contato com a paleontologia modi- ficou a visão de mundo de Isabella: “Hoje posso dizer que levo comigo outra visão sobre várias coisas no mundo. Uma rocha deixou de se tornar uma pedra e um osso se tornou uma expectativa para uma desco- berta muito maior, o nosso passado. Uma tartaruga simboliza pra mim, hoje, algo de extrema beleza e de fundamental importân- cia para compreendermos a nossa frágil Cambaremys langertoni, dentre outros”. Para a estudante, a paleontologia não é sim- plesmente uma cultura de sua cidade, ela complementa a história perdida na Terra. Ela diz que tem muito orgulho de fazer parte de um estudo tão importante e de estar em uma equipe tão preparada e amiga como a de Peirópolis. “Espero não só continuar com a minha bolsa de iniciação científica sobre pa- leontologia, como também me preparar para meu campo de trabalho que tanto admiro”. Tudo somado, o contato com a pa- leontologia parece criar um laço invisível com a Infância da Terra. Talvez por isso, PROJETOs DA fAPEmIg PRoJETo: Museu dos dinossauros: Popularização e divulgação da Paleontologia na se- mana Nacional de Ciência e Tecnologia CooRDEnADoR: Vicente de Paula Antunes Teixeira MoDALIDADE: Popularização da Ciência e Tecnologia VALoR: r$ 43.890 PRoJETo: Museu dos dinossauros – Ampliação e revitalização do Complexo Científico- -Cultural de Peirópolis CooRDEnADoR: Vicente de Paula Antunes Teixeira MoDALIDADE: Popularização da Ciência e Tecnologia VALoR: r$ 169.404 PRoJETo: Museu dos dinossauros: Paleontologia ao alcance de todos CooRDEnADoR: Mara Lúcia da Fonseca Ferraz MoDALIDADE: Popularização da Ciência e Tecnologia VALoR: r$ 178.710 PRoJETo: Efeitos da Equoterapia em pessoas com paralisia cerebral espástica CooRDEnADoR: Vicente de Paula Antunes Teixeira MoDALIDADE: Edital Universal VALoR: r$ 31.083 O paleoartista rodolfo Nogueira examina o crânio do crocodilo pré-histórico Foto: Arquivo Museu dos Dinossauros/UFTM o paleoartista rodolfo Nogueira diga, enquanto trabalha na reconstrução do crocodilo pré-histórico: “ainda não saí da fase de gostar de dinossauros”. Um pensamento que o coordenador do Com- plexo de Peirópolis, o professor Vicente, reconheceria, observando a equipe de escavação procurando fósseis na Caeira, e as crianças de Patrocínio se delician- do com suas descobertas, numa manhã de junho - ao lembrar de uma frase do romancista Tom robbins: “Nunca é tarde para ter uma infância feliz”. EN g EN h A R IA D E TR â N sI TO Em Socráticas, seu livro póstumo, o escritor, pensador e crítico literário José Paulo Paes (1926-1998) publicou um po- ema que, à luz dos atuais acontecimentos, poderia ser chamado de “premonitório”. Para explicar o (novo) fim dos tempos, o autor paulista vaticina, de modo irônico, nos breves – mas profundos – versos de Apocalipse: “O dia em que cada habitan- te da China tiver o seu Volkswagen”. Para além de sua intensidade estética, o chiste contra as buzinas do apocalipse Estudos do Núcleo de Transportes da Escola de Engenharia da UFMG buscam discutir a mobilidade urbana e, consequentemente, melhorar a qualidade de vida dos cidadãos Maurício Guilherme Silva Jr. predição realizada já na aberturadesta reportagem parece estar, com ênfase, no investimento em pesquisas científicas e tecnológicas. Trata-se, em suma, de estudos capazes de não só diagnosticar os problemas viários das gigantescas cidades, como de apresentar criativas e solidárias soluções para melhoria dos fluxos de veículos e pedestres, o que, de diversos modos, resultará em melhoria da qualidade de vida dos cidadãos. “O poético de Paes acaba por “fotografar” o cenário que, dia a dia, parece estar mais próximo das megalópoles e suas vas- tas populações: caso não se invista na redução do número de veículos em vias públicas, assim como na instauração de produtos, princípios e projetos inovado- res de mobilidade urbana, o crepúsculo dos tempos parece não demorar. Afora necessárias mudanças com- portamentais, o antídoto à tenebrosa 12 MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/MAI 2011 MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/MAI 2011 13 que se busca é a gerência de mobilidade, por meio da redução da necessidade do uso do automóvel. Para tal, é imprescin- dível que se invista em veículos como a bicicleta e em melhoria do transporte pú- blico”, ressalta Heloisa Maria Barbosa, professora do Departamento de Enge- nharia de Transporte e Geotecnia (ETG) da Escola de Engenharia da Universida- de Federal de Minas Gerais (UFMG). O comentário da pesquisadora vai ao encontro dos princípios e metas dos muitos projetos desenvolvidos há décadas no ETG, por meio de seu Núcleo de Trans- portes (Nucletrans), com vistas à melhoria das condições de mobilidade urbana em diversas cidades brasileiras. Criado em 1995, o órgão é responsável por estudos em torno de temáticas como acessibilida- de, segurança e logística. Trata-se de in- vestigações concebidas, muitas vezes, por meio de convênios de cooperação técnica, firmados com organismos governamentais e empresas privadas, ou a partir de recur- sos provenientes do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e da FAPEMIG. Ao longo dos anos, os pesquisado- res do Nucletrans investiram em pesquisas para execução de importantes projetos relacionados ao transporte público e ao tráfego da região Metropolitana de Belo Horizonte, a exemplo do estudo de viabi- lidade da extensão do trem metropolitano até a região de Venda Nova. Outra proposta do Núcleo resultou na inovadora iniciativa Pesquisa BH, que busca identificar a opi- nião de moradores acerca da qualidade de vida urbana nas diversas regiões da capital mineira, além de realizar o raio-X das con- dições de acesso a locais de interesse. Bicicletas e bicicletários Tais projetos ressaltam, aliás, um dos focos mais importantes das pesquisas, na UFMG e outras instituições do País, que pretendem diagnosticar e apresentar solu- ções aos atuais problemas de mobilidade urbana: compreender os modos e razões de uso do espaço público para, então, agir de modo eficiente. Como exemplo da impor- tância de cumprir tais etapas para implan- tação de propostas eficazes, pense o leitor numa das mais discutidas alternativas ao uso do carro nos grandes centros: a lúdica e polêmica bicicleta. Para que tal veículo – barato e nada poluente – torne-se realidade no dia a dia das metrópoles, seria neces- sária apenas, a construção, por exemplo, de ciclovias e bicicletários? Não há, clara- mente, como responder de forma simples a tão complexa questão. Afinal, bem antes de se concretizarem os “produtos”, há que se investir, em primeiro lugar, na compreensão das reais demandas da população. Indícios interessantes sobre o quê pensar acerca da questão foram apresen- tados em pesquisa desenvolvida no ETG como Trabalho de Conclusão de Curso de autoria da aluna Catarina Miranda sampaio e Castro – sob orientação da professora Heloisa Maria Barbosa. O estudo revelou números e análises qualitativas bastante promissoras com relação ao uso de bici- cletas por frequentadores da Estação BH- Bus de Integração Metrô-Ônibus Vilarinho, em Belo Horizonte. “Buscava-se compre- ender os porquês de as pessoas usarem, ou não, as bicicletas no cotidiano. Neste sentido, o que faltaria para que passassem a usufruir do veículo? Vias apropriadas? Bicicletários?”, questiona a professora. A partir de entrevistas realizadas com os passageiros da Estação – feitas com base em questionários de metodologia es- pecial –, percebeu-se que a temática da se- gurança, em diversos sentidos, revelava-se como elemento fundamental à discussão: 31% dos cidadãos abordados pelo estudo não usariam bicicletas, de suas casas à unidade do BHBus, em função, justamente, dos problemas de insegurança pública e – outro lado da mesma moeda – por conta dos perigos inerentes ao circular no trânsi- to da capital mineira: “Foi possível perce- ber, a partir daí, que ações aparentemente paralelas, como a melhoria do policiamen- to nas ruas ou a instalação de bicicletários controlados, na Estação, seriam capazes de estimular as pessoas ao uso da bicicleta”, comenta a professora. Os outros números da pesquisa, no que tange às possíveis ações necessárias à efetivação das bicicletas como meio de transporte diário das pessoas, disseram respeito a exigências como instalação de “Foi possível perceber, a partir daí, que ações aparentemente paralelas, como a melhoria do policiamento nas ruas ou a instalação de bicicletários controlados, na Estação, seriam capazes de estimular as pessoas ao uso da bicicleta” Heloisa Maria Barbosa, professora do Departamento de Engenharia de Transporte e Geotecnia (ETG) da Escola de Engenharia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) 14 MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/MAI 2011 ciclovias (28%) ou de bicicletários (26%) e, por último, à possibilidade de os pas- sageiros carregarem suas bikes no inte- rior dos ônibus ou trens (15%). Por mais que pareçam satisfatórias, contudo, tais conclusões revelam apenas parte do que buscam os pesquisadores, centrados no objetivo de oferecer soluções de mobilida- de urbana aos cidadãos. Nesta mesma investigação do Nu- cletrans, descobriu-se, por exemplo, que questões inocentemente óbvias precisam ser levadas em conta, como fatores semi- nais aos fenômenos observados no tráfego diário das cidades: no caso específico da Estação Vilarinho, 30% dos entrevistados disseram não ter bicicleta, enquanto 29% revelaram morar longe demais do BHBus. Por fim, 19% dos entrevistados pela pes- quisa confessaram não ter preparo físico necessário à atividade, pois que, na atuali- dade, definem-se como “sedentários”. Barreiras são múltiplos os desafios em busca de soluções para problemas de mobilida- de urbana. Tal complexidade, inerente ao tema, faz com os pesquisadores da área diversifiquem suas vertentes de estudo – da experimentação de dispositivos físicos para moderação do tráfego (redutores de velocidade, semáforos, radares etc.) a in- vestigações sobre “origem e destino” dos transeuntes e cidadãos motorizados. “Pre- cisamos lidar com inúmeras variáveis, que, no cotidiano, afetam o comportamento de pedestres e motoristas”, explica a profes- sora Heloisa Maria Barbosa. Imagine, por exemplo, a proposta de reestruturação de uma grande aveni- da de Belo Horizonte, com o intuito de estimular os automóveis a diminuir a velocidade e, consequentemente, redu- zir os riscos de acidentes. Tal tarefa de moderação do tráfego acaba por exigir diversas ações de investigação compor- tamental. Neste exemplo fictício, há de se considerar tanto os detalhes, quanto o que aqui será chamado de “macro-inter- venções”. Em outras palavras, é preciso estar atento, por exemplo, ao formato das calçadas e ao modo como as pes- soas caminham por elas: “É necessário compreender o quê, exatamente, os pe- destres acham importante nas calçadas públicas”, ressaltaHeloísa, ao comentar a necessidade de estudos sobre a qua- lidade da travessia dos transeuntes por uma via urbana. sob outro foco, também as pesquisas de “origem e destino” – já realizadas pelo Nucletrans em Belo Horizonte (1992) e Teresina (1997) – são importantes por revelar dados importantes a estudiosos e gestores públicos: o que, afinal, pretendem os cidadãos ao transitar pela cidade? De que modo o fazem? E com que expecta- tiva? As respostas a tais questões levam os pesquisadores a gerar subsídios para implantação, por exemplo, de modelos eficientes, mais baratos e menos poluentes de transporte público. Tais estudos de “origem e destino” são realizados com periodicidade de dez anos e se revelam importantes para o planejamento de transportes. As referidas pesquisas realizadas em Belo Horizonte e Teresina já tiveram seus desdobramentos. Neste primeiro semestre de 2011, inicia- ram-se os trabalhos da segunda investi- gação dessa natureza na capital mineira e em sua região Metropolitana. Foto: Marcelo Focado MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/MAI 2011 15 Ações e equipamentos O Nucletrans já realizou importan- tes projetos de moderação do tráfego e reestruturação da circulação viária e do transporte público em diversas cidades mineiras e de outros estados do País. Uma das investigações em andamento, atualmente, trata dos modelos de pre- visão de acidentes. A iniciativa reúne a UFMG e outras seis universidades públicas do País e uma instituição de ensino superior portuguesa. “Buscamos analisar os números e a natureza dos acidentes e correlacioná-los, por exem- plo, ao volume do tráfego. Tais modelos estatísticos são importantes para que avaliemos o que tem acontecido nas vias públicas e possamos direcionar ações de segurança viária”, explica Heloisa Maria Barbosa. Como forma de compreender os fatores que podem levar a acidentes, os pesquisadores estudam elementos di- versos, da sinalização ao formato da via, do posicionamento e estrutura dos can- teiros aos números de faixas de tráfego. “Neste projeto, cada universidade tem procurado compreender tais correlações nas ruas de sua cidade”, explica Heloísa, ao lembrar, contudo, que os principais desafios dos estudiosos têm sido os bancos de dados governamentais, que apresentam muitas falhas e nem sempre estão no formato adequado ao estudo. “Em Belo Horizonte, por exemplo, co- meçamos pela área central. Lá, os apa- relhos contadores de volume de tráfego, muitas vezes, param de funcionar. E nós precisamos das informações de todos os 365 dias do ano”, completa. Interessante ressaltar, por fim, a na- tureza dos equipamentos hoje disponíveis aos pesquisadores de mobilidade urbana e outras questões de tráfego. Há uma sé- rie de aparelhos capazes de auxiliá-los no dia a dia das investigações. Com fi- nanciamento de instituições como CNPq e FAPEMIG, os estudiosos da UFMG adquiriram, por exemplo, radares de mão aptos a medir, nas vias públicas, a velocidade dos carros que por ali passam. Outro “brinquedinho” bastante ágil e im- portante, uma espécie de “GPs rastreador ufmg sEDIARÁ cONgREssO sObRE TRANsPORTEs A professora Heloisa Maria Bar- bosa é presidente do comitê local res- ponsável por organizar, de 7 a 11 de novembro de 2011, o XXV Congresso de Pesquisa e Ensino em Transportes (www. xxvanpet.com.br) da Associação Nacio- nal de Pesquisa e Ensino em Transpor- tes (Anpet). Nesta edição comemorativa dos 25 anos de existência da entidade, a UFMG sediará o evento, realizado em parceria com o Departamento de Enge- nharia de Transportes e Geotecnia (ETG) da Escola de Engenharia da UFMG e a secretaria de Transportes e Obras Públi- cas do Estado de Minas Gerais. Ao longo do Congresso, serão discutidos temas de grande interesse para os profissionais do setor, de modo a possibilitar que todas as esferas li- gadas às atividades dos transportes – sejam acadêmicas, científicas, pro- fissionais, privadas ou governamentais – possam debater e apresentar proble- mas e soluções, além de refletir sobre possíveis linhas de ação em ambiente cooperativo e instrutivo. O Encontro deve reunir cerca de 400 participantes para apresentação e discussão de mais de 250 artigos técni- cos e científicos relativos a transportes. O evento abrigará também seminários, conferências e mini-cursos, assim como feira para empresas e instituições inte- ressadas em divulgar os avanços cien- tíficos e tecnológicos do setor. passivo” permite que dados diversos do carro – não só velocidade, mas também deslocamento e tempo de viagem – sejam registrados com eficiência. Ao analisar tais números e índices, é possível infe- rir uma série de prerrogativas acerca do comportamento dos motoristas. Atualmente, os pesquisadores do Nucletrans têm buscado compreender – com o auxílio de tais equipamentos e, obviamente, apoiados no vasto know how adquirido ao longo dos anos por professores e alunos – a rede de fluxos de carros e pedestres no próprio campus Pampulha da UFMG. “Afinal, podemos observá-lo como se estivéssemos numa mini-cidade. Percorremos as vias inter- nas e registramos, em softwares de si- mulação de tráfego, uma série de dados reais importantes”, explica a professora, ao lembrar que, a partir de tal “leitura de cenário”, decisões importantes podem ser tomadas para melhoria do tráfego na Ins- tituição. Assim como há de ser feito nas maiores cidades brasileiras. PRoJETo: Efeitos da moderação de tráfego para o transporte não motorizado e o desenvolvimento sustentável CooRDEnADoR: Heloisa Maria Barbosa MoDALIDADE: Programa de infra-estrutura para jovens pesquisadores VALoR: r$ 11.022 PRoJETo: Transporte urbano sustentável através da moderação de tráfego e desenvolvimento tecnológico CooRDEnADoR: Heloisa Maria Barbosa MoDALIDADE: Programa Pesquisador Mineiro - PPM III VALoR: r$ 48.000 “Em Belo Horizonte, por exemplo, começamos pela área central. Lá, os aparelhos contadores de volume de tráfego, muitas vezes, param de funcionar. E nós precisamos das informações de todos os 365 dias do ano” Heloisa Maria Barbosa m EI O A m b IE N T E O senhor das árvores Anos de pesquisa dedicados às tecnologias florestais rendem frutos ao professor José Roberto Scolforo, da Ufla, e sua equipe 16 MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/MAI 2011 Fo to : J os é Ro be rto S co lfo ro /A ce rv o pe ss oa l Fabrício Marques MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/MAI 2011 17 A Ciência Florestal ergueu cedo suas raízes na vida do vice-reitor e pesquisador da Universidade Federal de Lavras (Ufla), José roberto soares scolforo, o vencedor da edição 2001 do prêmio Frederico de Me- nezes Veiga, promovido pela Embrapa. Ele passou muito de sua infância na proprieda- de de seu avô paterno. Esse período, soma- do ao contato com pessoas de sua cidade natal, Castelo, no Espírito santo, que se graduaram em Engenharia Florestal, o ins- tigaram a conhecer mais a fundo esse curso. scolforo percebeu, desde essa épo- ca, que parecia bom aprender sobre sis- temas de produção, sobre a ecologia das espécies e dos fragmentos nativos, como regular a produção florestal de plantações, ou da vegetação nativa, como inventariar os recursos florestais, como desenvolver modelos matemáticos para prever o cres- cimento das florestas e das espécies nela contidas e também como fazer o processa- mento da madeira, como utilizá-la de for- ma sustentável, ora conservando-as, ora preservando-as. Assim, seguiu o mesmo caminho de seus conterrâneos. No entanto, o despertar de fato para a Ciência Florestal se deu à medida que ad- quiria mais conhecimentos, o que ocorreu durante a realização do curso de Engenha- ria e, posteriormente, com asoportunida- des profissionais que teve, nas Universi- dades Federais da Paraíba e de Lavras em especial, com empresas florestais e com as Agências de Amparo a Pesquisa. “Nes- se contexto, a FAPEMIG foi muito especial, uma vez que, além de ter sido membro da Câmara de Ciências Agrárias, tive também o prazer de ser seu coordenador, além de, ao longo da carreira, aprovar vários proje- tos nessa instituição”. O prêmio da Embrapa foi conferido pelo conjunto das pesquisas coordenadas pelo professor na área de Tecnologias Flo- restais para sustentabilidade dos Biomas. scolforo é um dos precursores, em florestas nativas, da pesquisa em manejo para usos múltiplos da vegetação do cerrado, nas pes- quisas com candeia, além de atuar fortemen- te no manejo e modelagem de plantações. Juntamente com a equipe de pesquisadores do Laboratório de Estudos e Projetos em Ma- nejo Florestal (Lemaf), e do zEE, da Ufla, ele desenvolveu, ao longo da carreira, diversos projetos na área de manejo florestal. Dessa experiência, scolforo pode transmitir algu- mas lições importantes para novos pesqui- sadores. De acordo com ele, é fundamental ter a mente aberta a novos conhecimentos. “Muito há que se aprender sobre o potencial para produção de madeira de várias espécies nativas, assim como para fins medicinais, para cosméticos, para licores, para doces, sorvetes e muitos outros usos”. Outro ponto importante, em sua opi- nião, é aprofundar os conhecimentos cien- tíficos, para que o “achismo” ou a intuição passem a ser componentes secundários na apropriação dessas espécies para fins co- merciais ou de preservação. “É necessária a realização de estudos objetivos a respeito de crescimento, produção, manejo, ecologia, melhoramento genético, nutrição, sistemas silviculturais, Química, Física, Engenharia de Alimentos, entre outros, que possibilitem que as muitas centenas de espécies nati- vas possam vir a ter seu papel e potencial compreendido, de maneira que a população possa vir se apropriar delas”, diz. E completa: “É também fundamental que se tenha compromisso com a con- tinuidade dos estudos, com a prática da multidisciplinaridade dentro da academia, o compromisso das equipes de pesquisado- res com a geração de produtos, que incluam desde novos conhecimentos até contribui- ções mais pragmáticas que promovam o bem estar e as expectativas da sociedade. Igualmente fundamental é o financiamento de longo prazo de pesquisas dessa natureza para que a continuidade dos estudos possa ser viabilizada financeiramente”. Ao refletir sobre a premiação da Em- brapa, scolforo faz questão de lembrar que, embora os prêmios sejam conferidos indivi- dualmente, mas de fato são mais da família, que se sacrifica, se doa e também lhe dá apoio em todos os sentidos. “Todavia não há como deixar de compartilhá-lo também com a equipe de trabalho, que tenho o pra- zer de liderar, em especial os professores, os técnicos e estudantes envolvidos nas pesquisas desenvolvidas Lemaf. É de fato um trabalho de grupo feito por muitas mãos, muitos cérebros e muita dedicação”. Dos diversos projetos conduzidos pelo pesquisador, três são mais especiais: o “zoneamento Ecológico Econômico do Estado de Minas Gerais (zEE)”, de 2005 a Informações completas no Portal do Inventário Florestal, de domínio pú- blico, contidas em aproximadamente 3.800 páginas de oito livros disponí- veis em PDF: http://inventarioflorestal. meioambiente.mg.gov.br/ 2008; o “Mapeamento e Inventário da Flo- ra Nativa e dos reflorestamentos de Minas Gerais”, de 2003 a 2010; e o “Projeto Can- deia”, de 2000 a 2010. sobre o Mapeamento e Inventário, scolforo observa: “Nesta pesquisa, tivemos a oportunidade de desenvolver uma série de ações integradas com o Estado de Minas Gerais que propiciaram a geração de novos conhecimentos e processos tecnológicos Foto: José Roberto Scolforo/Acervo pessoal 18 MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/MAI 2011 que credenciam o Estado a ter as mais mo- dernas ferramentas de gestão do ambiente, dentre todos estados da Federação”. O foco do programa de geração de conhecimentos ambientais em consonância com a produ- ção resultante dos reflorestamentos foi cen- trada na geração da informação com qua- lidade, precisão e prioridade, e se tornou, cada vez mais, uma importante ferramenta para a definição de políticas públicas e de estratégias para a aplicação dos instrumen- tos de comando e controle no que concerne aos remanescentes florestais. Por esse motivo, o Governo de Mi- nas Gerais, por meio da secretaria de Es- tado de Meio Ambiente e Desenvolvimento sustentável (semad), em conjunto com instituições de pesquisa e organizações da sociedade civil, vem, desde 2003, implan- tando um dos mais modernos sistemas de informações georeferenciadas do país. A elaboração do Inventário das Flores- tas de Minas, executado pela Ufla e publicado em 2005, em 2008, e com novas publicações sendo preparadas, propiciou uma série de informações em relação à qualidade dos re- manescentes florestais de Minas, inclusive relacionadas à determinação do estoque de carbono e ao acompanhamento contínuo do desenvolvimento das florestas, por meio de medições em mais de 4.400 parcelas perma- nentes de 1.000 metros quadrados de área nas quais são avaliadas 780 mil árvores. Dentre os oito volumes publicados até então, contidos em mais de 3.800 páginas, encontram-se informações taxonômicas e sobre o hábito, a distribuição e o estado de de Minas, hoje, inspira cuidados permanen- tes e a necessidade de aprimoramento das Políticas Públicas por parte do Estado. Na questão dos reflorestamentos, co- menta o pesquisador, é preciso ampliar a área com plantações florestais, diversificar o manejo a fim de que se possa produzir, por exemplo, de biomassa para atender as demandas integrais do parque siderúrgico, e as demandas por energia, até madeira grossa para fins de processamento mecâni- co com consequente uso na indústria move- leira, dentre outras. Também é preciso im- plantar povoamentos dentro do contexto do manejo da paisagem, acentuar o programa de extensão florestal para o pequeno pro- dutor e estimular o empreendedorismo no aproveitamento da madeira, através de sua industrialização que permita agregação de renda ao pequeno produtor. “Porém, não há como deixar de destacar a evolução fantás- tica na silvicultura, no manejo e no cuidado ambiental que as empresas consolidadas e organizadas implementam atualmente”. No caso da vegetação nativa, diz o pesquisador, há um contingente de área acima de 34% do território mineiro, o que, em sua opinião, é muito bom. Porém, a distribuição dessa vegetação nativa é desi- gual no Estado. “Há áreas com proporcio- nalmente menos cobertura da flora nativa, como o caso do Triângulo Mineiro, Leste de Minas e mesmo o sul do Estado. Há ainda uma certa heterogeneidade no está- gio de conservação dessa vegetação, bem como muitas áreas em ótimo estado de conservação, além de outras muito sujeitas à antropização, ou seja, à ação do homem. Contudo, Minas tem criado um gran- de número de unidades de conservação de proteção integral e no controle ao desmata- mento, há ações que nenhum outro Estado da Federação possui, como o monitoramen- to mensal de toda cobertura com vegetação nativa e também o mapa da cobertura a cada dois anos para fins de planejamento estra- tégico, com uma ação fantástica de campo onde monitora o desenvolvimento de mais de 780 mil árvores das diferentes fito-fisio- nomias existentes em Minas. Ainda nesse tema desenvolve um arrojado programa de revegetação da Mata Atlântica e de outros biomas através de diferentes opções de re- cuperação de área. conservação de aproximadamente 2.500 es- pécies florestais. O trabalhoainda referencia nomes regionais, aborda novas espécies que foram descobertas e considera mais de 60 espécies cuja ocorrência ainda não havia sido identificada pela comunidade científica, em Minas. “Com mais esse importante ins- trumento, está sendo possível identificar e determinar os principais atores e as princi- pais causas que levam a alteração do uso do solo mineiro e ao empobrecimento de sua di- versidade biológica”, ressalta. Permitiu ain- da a geração de informações ultra detalhadas sobre a estrutura dos Biomas Cerrado, Ca- atinga e Floresta Atlântica em Minas Gerais. A respeito do Projeto Candeia, scol- foro destaca o uso da candeia na indústria de cosméticos, dos desenvolvimentos feitos na academia, do benefício para os agricul- tores de áreas pouco férteis das áreas da Mantiqueira e do Espinhaço e do seu uso em programas de pagamento por serviços ambientais. “Poderia ainda citar os projetos com florestas plantadas, que incluem o de- senvolvimento de modelos biométricos e o seu manejo, sobre o desenvolvimento de um modelo fitogeográfico para a revitalização dos rios da Bacia do são Francisco, o pro- jeto Manejo da Paisagem, para estabelecer o equilíbrio entre as plantações florestais e os fragmentos nativos, promovendo, assim a busca do desenvolvimento sustentável. Situação atual das florestas Depois de todas as pesquisas até ago- ra, scolforo afirma que a situação florestal O professor scolforo e sua equipe do Lemaf, da Universidade Federal de Lavras Foto: José Roberto Scolforo/Acervo pessoal MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/MAI 2011 19 Zoneamento Ecológico Econômico O zoneamento Ecológico Econômico do Estado de Minas Gerais (zEE-MG) con- siste na elaboração de um diagnóstico dos meios geobiofísico e sócio-econômico- -jurídico-institucional. Esse diagnóstico gerou respectivamente dois documentos, a carta de Vulnerabilidade Ambiental e a Car- ta de Potencialidade social, que sobrepos- tas irão conceber áreas com características próprias, determinando o zoneamento Ecológico-Econômico do Estado. “O zEE é a busca de uma regra clara para que a sociedade civil e os empreen- dedores conheçam as vulnerabilidades e potencialidades de cada local ou região, as quais, ao serem fundidas, possibilitam o estabelecimento de zonas de desenvolvi- mento que tenham como base a homoge- neidades dos atributos naturais e sociais. Neste contexto é uma regra clara para que os empreendedores saibam de antemão as peculiaridades e as exigências ambientais para se instalarem num dado local. Por outro lado, o zEE possibili- ta que o Estado se aparelhe, utilizando critérios essencialmente técnicos ao estabelecer novos e impessoais pro- cedimentos para análise de projetos. O estabelecimento de novas e claras regras de como os processos serão avaliados permitirá aos empreendedores, pequeni- nos ou grandes, não serem surpreendi- dos por exigências de última hora, assim como lhes cobrará o estabelecimento de estratégias para instalação de seus em- preendimentos, comprometidas com o desenvolvimento sustentável. Portanto, o zEE, além de procurar fornecer bases para o desenvolvimento sustentável de cada local, município ou região, também é um estímulo para que os empreendedores busquem Minas para ampliar seus negócios, gerando renda, emprego e bem estar social, associados ao uso sensato dos recursos naturais. Na prática, o zEE funciona da seguin- te forma: todos os empreendimentos que necessitam de licenciamento ambiental para se instalar num dado local, precisam considerar o aspecto locacional para sua instalação. Desse modo, uma rodovia que se pretenda construir deve considerar as fragilidades do ambiente ali existente, ob- servadas no zEE. A partir disso, explica scolforo, o estudo de impacto ambiental e o relatório de impacto ambiental devem buscar entender como evitar que a área que é frágil ambientalmente sofra qualquer tipo de degradação, por exemplo, com melho- res práticas de controle de erosão. O pesquisador dá outro exemplo: “O gestor de um município pode identificar, a partir do zEE, quais são as precariedades socioeconômicas do seu município, e então desenvolver ações para corrigi-las, ou mes- mo reivindicar ao poder público, no caso o governo estadual, ajuda para solucioná-las”. Outra situação de uso claro do zEE é estabelecer políticas públicas para uma zona situada em locais pouco frágeis e com aspectos sociais favoráveis, diferente daquela a ser estabelecida para zonas si- tuadas em locais frágeis ambientalmente e com muita precariedade social. scolforo afirma que o zEE-MG con- segue orientar a identificação temática das fragilidades ambientais em frações de área com 270 x 270 metros. salienta que na nova versão do zEE avanços na redução dessa área mínima para toma- das de decisão estão sendo buscados. são pelo menos 70 mapas temáticos para identificação dessas fragilidades. Para entender melhor: quando conside- ramos o tema fauna há uma carta síntese de vulnerabilidade. Entretanto, esse tema pode ser subdividido em vários outros, como carta síntese de vulnerabilidade para mamíferos, outra para aves, outra para peixes, outra para répteis e anfíbios e outra para insetos. “Veja que uma coisa é conhecer a vulnerabilidade da fauna. A outra é conhecer a vulnerabilidade dos temas que geram a vulnerabilidade da fauna. Assim, cada empreendimento, segundo suas peculiaridades, deverá observar todas as cartas, mas colocando o foco naquelas que mais afetam a sua atividade para efetuar os estudos de im- pactos ambientais”, ressalta. Na concepção do pesquisador da Ufla, muitas vezes serão tantos os temas que apresentarão fragilidade ambiental que a adoção de medidas que não gerem danos ao ambiente será tão dispendioso que inviabilizará a instalação do empreen- Com estudantes de graduação, mestrado e doutorado, em Baependi, dentro de uma candeal O zEE-MG tem a coordenação da se- cretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento sustentável, partici- pação de todas as secretarias de Es- tado de Minas, de outras entidades e da sociedade civil. saiba mais no site http://www.zee.mg.gov.br dimento naquele local. “O zEE não proíbe, porém indica as fragilidades do ambiente naquele local nos mais diferentes temas. A partir desse contexto, efetuados os estudos de impacto ambiental, as medidas propos- tas para corrigir os danos ambientais que poderão advir do empreendimento podem ficar tão caras, que talvez valha a pena mu- dar o local onde se deseja empreender. O mesmo ocorre com as questões sociais, onde são observadas 244 diferentes vari- áveis e indicadores. Fotos: José Roberto Scolforo/Acervo pessoal EN g EN h A R IA D E A LI m EN TO s sa lv an do o le it e de rr am ad o 20 MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/MAI 2011 Em todo o mundo, a preocupação com o consumo de água e a geração de efluentes tem sido cada vez mais constante. Grandes e pequenas empresas tentam se adaptar a esse cenário. Essas questões levaram o en- genheiro de alimentos Danilo José Pereira da silva, da Universidade Federal de Viçosa, a desenvolver uma pesquisa na área de Ciência e Tecnologia de Alimentos. recentemente, Danilo defendeu sua tese de doutorado inti- tulada “sistema de Gestão Ambiental para a Indústria de Laticínios”, sob a orientação do professor Frederico José Vieira Passos. De acordo com o engenheiro, um dos principais objetivos e desafios da pesquisa era mostrar para o empresário que o cami- nho mais viável e sustentável para fazer o controle ambiental é a prevenção da gera- ção dos resíduos. E para que isso ocorra com eficiência é necessário focar no pro- cesso produtivo. só uma gestão adequada do processopermite evitar a geração dos Sistema de gestão ambiental da UFV permite construção de indústria de laticínios mais competitiva e sustentável Fabrício Marques resíduos, e quando isso não for possível, é necessário buscar alternativas viáveis para reutilizar ou reciclar os resíduos gerados reduzindo os custos do tratamento e dis- posição final desses resíduos. “Dessa for- ma decidimos trabalhar com os princípios de um sistema de gestão ambiental que incluem a seguinte hierarquia: Prevenção, reciclagem, reuso, Tratamento e Disposi- ção Final e Ações Corretivas, sendo que os dois primeiros estão fundamentados na gestão do processo”. No entanto, o grande desafio que ainda existe é conscientizar o empresário e os colaboradores da indústria a aplicar os princípios da prevenção e da reciclagem e reuso. “Para isso, decidimos elaborar duas ferramentas: um sistema multimídia com cinco módulos instrucio- nais de treinamento e conscientização dire- cionado a dois públicos diferentes, o em- presário e os colaboradores; e um software de diagnóstico ambiental do processo e si- MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/MAI 2011 21 mulação de diferentes cenários de controle ambiental com análise de custo”, explica. Quando se fala em um sistema de ges- tão ambiental, Danilo considera que cinco expressões são capazes de resumir tudo: Conscientização, Mudança de Compor- tamento, responsabilidade Coletiva, Pre- venção e soluções sustentáveis. “O nosso desafio era desenvolver um sistema que le- vasse essa cultura para os micro, pequenos e médios laticínios, e é isso que o sistema desenvolvido propõe. Uma das maiores conquistas é que conseguimos desenvolver um software capaz de quantificar o custo da geração dos resíduos e os ganhos financei- ros que se pode obter com o controle pre- ventivo”, diz. Com o software o empresário pode quantificar o custo ambiental do seu processo e consegue identificar a soluções para redução desse custo. Isso sem consi- derar os benefícios indiretos que a empresa pode obter, como a abertura de novos mer- cados nacionais e até mesmo no exterior. Com a implantação do modelo de gestão ambiental proposto e orientado pelas duas ferramentas (o sistema multimídia e o software), Danilo considera que a indústria de laticínios irá obter ganhos de competitivi- dade que serão provenientes de três resulta- dos alcançados: aumento da eficiência dos processos pela redução de falhas, redução de perdas de matéria-prima, insumos, sub- produtos e produtos acabados, o que pro- move uma redução dos custos de produção; redução do consumo de água, produtos quí- micos e da geração de resíduos, com conse- quente redução dos custos de tratamento e disposição final dos resíduos; e preparação das empresas para certificação ambiental e conquista de novos mercados. As duas ferramentas (sistema multi- mídia e o software) foram avaliadas por dois grupos, um formado por profissionais e pro- fessores da UFV, que atuam na área ambien- tal ou no setor lácteo, e outro, representado o público-alvo, composto de proprietários, ge- rentes e colaboradores da indústria de laticí- nios. “A avaliação das duas ferramentas pelos dois públicos foi excelente, sendo identificado um grande potencial para aplicá-las como su- porte de apoio na implantação de um sistema de gestão ambiental na indústria de laticínios. A próxima etapa da pesquisa é escolher um grupo de empresas para aplicar as ferramen- tas e avaliar os resultados obtidos”, ressalta. A ideia de desenvolver um sistema de gestão ambiental para a indústria de laticínios nasceu há sete anos, quando foi feito um diagnóstico ambiental em alguns laticínios de pequeno porte. “Identificamos uma grande dificuldade dessas empresas para fazer o controle ambiental, agravado, principalmente, pela ausência de informa- ções sobre o assunto e uma mão de obra pouco qualificada. Mas ao mesmo tempo identificamos uma grande potencial, uma vez que procedimentos simples seriam suficientes para obter bons resultados e construir uma indústria mais sustentável”, afirma Danilo, que também é sócio diretor da empresa Gestão Láctea e atua como consultor na área de gestão ambiental. Durante seu mestrado, participou de um estudo detalhado dos processos de um pequeno laticínio, que identificou os princi- pais aspectos ambientais de sete linhas de processamento, chegando ao surpreendente resultado que conduzia a um cenário de re- dução de até 70% no consumo de água e na geração de águas residuárias, mais conhe- cidas como efluentes industriais. “Diante do desafio de contribuir para o desenvolvimen- to de uma indústria de laticínios mais sus- tentável, e considerando que só no Estado de Minas Gerais são cerca de mil laticínios formalmente constituídos e que 90% são micro, pequenas e médias empresas, não faltaram motivos para levar a ideia em fren- te”, observa o pesquisador. Sistema integrado Atualmente, as empresas têm buscado um sistema de gestão integrado. De acordo com Danilo, o princípio de um sistema dessa natureza é a gestão do processo com uma visão sistêmica, o que permite uma redução dos esforços comparada quando se faz uma gestão isolada por áreas. Ou seja, a gestão da qualidade, a gestão ambiental, a gestão da saúde e segurança ocupacional e a respon- sabilidade social compartilham os mesmos princípios. sendo assim, a integração des- ses sistemas produz resultados satisfatórios em menor tempo. “O grande diferencial do sistema proposto é a gestão integrada dos processos, com soluções que envolvem mudanças de tecnologias, aproveitamento de subprodutos e reuso de água. O controle ambiental deixa de ser tratado como um sis- tema isolado da indústria e passa a receber soluções integradas, construídas a partir de uma visão sistêmica dos processos”, afirma. Outra novidade que a pesquisa con- duzida por Danilo apresenta é mostrar que o foco do controle ambiental tem se desloca- do do controle final para o controle do pro- Parte da equipe que participou da elaboração das imagens e edição dos vídeos: da esquerda para a direita, jornalista José Timóteo Júnior e o responsável pelas imagens e edição, Márcio de souza Veríssimo (ambos da Cead/UFV), o idealizador do projeto, Danilo silva, e o graduando em Engenharia de Alimentos e estagiário Breno regis Foto: Arquivo pessoal/Danilo Silva 22 MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/MAI 2011 cesso. Isso acontece porque, durante algum tempo, as indústrias se concentraram no controle final de tubo, ou seja, após a gera- ção dos resíduos, com o objetivo único de tratar e fazer a disposição dos resíduos gera- dos de acordo com as normas da legislação vigente. No entanto, esse processo é muito oneroso. sendo assim, a solução mais vi- ável é a prevenção e o reuso e reciclagem dos resíduos gerados. Essa mudança deve iniciar com a definição de uma política de gestão ambiental onde se prioriza a gestão do processo. “É fundamental”, frisa o enge- nheiro da UFV, “que a alta gerência forneça os subsídios necessários para as mudanças que envolvem adequações no setor produ- tivo e capacitação dos recursos humanos”. A pesquisa também permite a seguin- te pergunta: de que forma pode ser útil para a agroindústria o software, proposto por Da- nilo e sua equipe, para diagnóstico ambien- tal e simulação de alterações no processo com avaliação dos impactos ambientais e financeiros? O engenheiro responde: o sof- tware tem como finalidade auxiliar os pro- prietários, técnicos e gerentes na avaliação dos aspectos ambientais e na identificação e aplicação das alternativas de melhoria, constituindo-se numa ferramenta de supor- te na tomada de decisão em relação à gestão ambiental da indústria de laticínios. Para a facilidade do usuário, o software apresenta quatro módulos:empresa, produto, relatório e dimensionamento, além da página inicial, onde o usuário deve fazer o cadastro para ter acesso aos demais módulos e do módulo tutorial, que auxilia no uso do programa. No módulo “empresa” o usuário deve cadastrar os dados característicos da empresa, que incluem razão social, vo- lume de leite processado, dias e horas de funcionamento, produtos processados, vo- lume de água consumido, volume e carga do efluente gerado. Após processar esses dados, o programa permite o acesso ao mó- dulo produto, em que o usuário pode fazer um diagnóstico ambiental da sua empresa, fornecendo as informações solicitadas so- bre cada linha de processamento. Para re- alização do diagnóstico são consideradas informações relacionadas ao volume de leite destinado a cada produto, tecnologia empregada no processo, alternativas adota- das para recuperação e aproveitamento dos subprodutos e aspectos de higienização. Ao processar essas informações o usuário pode acessar o módulo “relatório” e obter as informações sobre os aspectos am- bientais de cada linha. Esse módulo, além de fornecer o relatório completo de cada linha e uma avaliação global dos aspectos ambien- tais da indústria, fornece também sugestões de ações corretivas, que podem ser aplicadas em cada linha de processamento, visando à redução dos impactos ambientais. O módulo “dimensionamento” permi- te ao usuário simular as dimensões e o cus- to para implantação de diferentes sistemas de tratamento de efluentes, considerando a situação atual da indústria ou diferentes ce- nários. Nesse módulo o usuário pode adotar as sugestões de ações corretivas geradas no relatório, como alternativas de alterações no processo, e simular um novo cenário, com a avaliação dos impactos dessas mudanças nos aspectos ambientais relacionados à carga de poluição de cada linha de proces- samento. Além disso, com as simulações o usuário pode avaliar os impactos que as mudanças no processo irão proporcionar. O grande benefício do software para o empresário é a possibilidade de identificar as melhores práticas de gestão ambiental para o seu processo, e também a possibilidade de quantificar os ganhos ambientais e finan- ceiros que se pode obter com a implantação dessas práticas. É uma oportunidade inédita do empresário conhecer o custo ambiental do seu processo e aplicar soluções sustentáveis que irão reduzir o seu custo de produção. Conscientização da indústria Para o diagnóstico ambiental foram avaliados sete laticínios de Minas e um da Bahia. são laticínios de diferentes portes, desde micro empresas até empresas de mé- dio porte, que produzem leite pasteurizado, queijo mussarela, queijo Minas Frescal, queijo Minas Padrão, queijo Prato, requei- jão, ricota, manteiga, iogurte, bebida láctea e doce. segundo Danilo, essa escolha se ba- seou na necessidade de conhecer diferentes realidades em relação à escala de produção e tecnologias empregadas no processo. Os dados levantados em cada linha de proces- samento desses laticínios foram utilizados para definição dos coeficientes de geração de resíduo das 11 linhas avaliadas e com- põem o banco de dados do software. Danilo também afirma que é funda- mental que a indústria de equipamentos in- corpore as preocupações com os aspectos ambientais no layout dos equipamentos, de forma a facilitar a coleta e o aproveitamento dos subprodutos e os procedimentos de hi- gienização, reduzindo, assim, o consumo de água e energia e a geração de resíduos. “Essa conscientização pode ser efetivada a começar por uma mudança cultural, uma mudança de comportamento e, na minha opinião, deve partir dos dois lados, do empresário da in- dústria de laticínios e do empresário da in- dústria de equipamentos. No entanto, basta o proprietário da indústria de laticínios se conscientizar dessa importância que automa- ticamente a indústria de equipamentos terá que se adequar. Vejo isso como uma grande oportunidade de diferenciação para os dois elos da cadeia produtiva. É importante ressal- tar que para isso é necessário conhecer bem as reais necessidades da indústria”. PRoJETo: Desenvolvimento de sistema multimídia como suporte na tomada de decisão para gerenciamento de resíduos e redução do consumo de água na indústria de laticínios CooRDEnADoR: Frederico José Vieira Passos MoDALIDADE: Programa Pesquisador Mineiro VALoR: r$ 48.000 Procedimento de gestão ambiental adotado no laticí- nio Cocatrel, em Três Pontas (MG), em que 100% do soro é coletado e vendido para a indústria de secagem Fo to : A rq ui vo p es so al/ Da ni lo S ilv a sE g u R A N ç A P ú b LI c AViolência sob vigilância Integração das polícias e implantação de programas sociais ajudam a reduzir índices de criminalidade em Belo Horizonte Ana Flávia de oliveira Fo to : a rq ui vo A sc om S ed s MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/MAI 2011 23 24 MINAS FAZ CIÊNCIA • MAR/MAI 2011 Dados da Fundação João Pinheiro revelam que, em 2004, Belo Horizonte re- gistrou 42.134 crimes violentos. Em 2009, foram 25.000, uma redução de 45%. O mesmo aconteceu no Estado. Há sete anos, foram constatados 102.562 crimes violen- tos em Minas. Já em 2009, 59.478, uma queda de 58% nas ocorrências. segundo o coordenador do Centro de Estudos de Criminalidade e segurança Pública (Crisp) da Universidade Federal de Minas Gerais, Cláudio Beato, a melhora nos números se deve a dois fatores. “A integra- ção das polícias e a introdução de progra- mas sociais, como o Fica Vivo, contribuíram para a redução dessas ocorrências”, explica. Quanto aos crimes contra o patrimônio também houve diminuição. Em 2004, Belo Horizonte registrava 1.600 ocorrências anuais. Em 2010, no mesmo período, o índice passou para 650. Uma redução de mais de 50%. Para Beato, que desenvolveu um es- tudo sobre o tema, com o financiamento da FAPEMIG, a integração das polícias Civil e Militar, por exemplo, proporciona um incre- mento da qualidade do controle da violência na cidade, sobretudo em locais mais vulne- ráveis. De acordo com o pesquisador, para esse tipo de trabalho ser bem sucedido é importante que haja uma compreensão so- bre os tipos de ocorrências que predominam em cada localidade. “Por exemplo, crimes contra a pessoa demonstram uma deteriora- ção socioeconômica, a ausência institucio- nal da Justiça ou da polícia. Já os roubos a transeuntes querem dizer que é necessário melhorar os mecanismos de vigilância nas ruas, como o Fica Vivo”, esclarece. O sociólogo explica que em cidades pequenas, por exemplo, a quantidade de cri- mes é menor porque todos se conhecem e, se acontece alguma irregularidade, fica mais fácil identificar quem foi o autor, principalmente se o ato for cometido por alguém que não per- tence àquele grupo. Já nas sociedades mais complexas, há um enfraquecimento nos laços de vigilância. Um caminho para se conseguir a queda nos índices de criminalidade pode ser a adoção de projetos sociais com crianças e adolescentes de comunidades carentes. Fica Vivo Criado pelo Crisp em 2003, o Fica Vivo tem como objetivo fazer o controle de homicídios em regiões carentes. Dois anos depois, o projeto foi aprovado pelo Estado como Política Pública e, hoje, está instala- do nos locais considerados áreas de risco, tanto na capital quanto no interior. Desde que as atividades começaram, 13.379 jo- vens já participaram do Fica Vivo. Minas Gerais adotou o programa, que tem como público-alvo jovens de 12 a 24 anos em situação de risco social e residen- tes nas áreas com maior índice de crimina- lidade, reduzindo as taxas de homicídios. O primeiro local a receber o projeto, ainda na sua versão piloto, foi a região do Morro das
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