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MÉTODOS DE PESQUISA APLICADOS À GESTÃO PÚBLICA Professor Dr. Éder Rodrigo Gimenes GRADUAÇÃO Unicesumar Acesse o seu livro também disponível na versão digital. C397 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE MARINGÁ. Núcleo de Educação a Distância; GIMENES, Éder Rodrigo. Métodos de Pesquisa Aplicados à Gestão Pública. Éder Rodrigo Gimenes. Maringá-Pr.: Unicesumar, 2019. 224 p. “Graduação - EaD”. 1. Métodos. 2. Pesquisa Aplicada. 3. Gestão Pública 4. EaD. I. Título. ISBN 978-85-459-1776-2 CDD - 22 ed. 001.42 CIP - NBR 12899 - AACR/2 Ficha catalográfica elaborada pelo bibliotecário João Vivaldo de Souza - CRB-8 - 6828 Impresso por: Reitor Wilson de Matos Silva Vice-Reitor Wilson de Matos Silva Filho Pró-Reitor Executivo de EAD William Victor Kendrick de Matos Silva Pró-Reitor de Ensino de EAD Janes Fidélis Tomelin Presidente da Mantenedora Cláudio Ferdinandi NEAD - Núcleo de Educação a Distância Diretoria Executiva Chrystiano Minco� James Prestes Tiago Stachon Diretoria de Graduação e Pós-graduação Kátia Coelho Diretoria de Permanência Leonardo Spaine Diretoria de Design Educacional Débora Leite Head de Produção de Conteúdos Celso Luiz Braga de Souza Filho Head de Curadoria e Inovação Tania Cristiane Yoshie Fukushima Gerência de Produção de Conteúdo Diogo Ribeiro Garcia Gerência de Projetos Especiais Daniel Fuverki Hey Gerência de Processos Acadêmicos Taessa Penha Shiraishi Vieira Gerência de Curadoria Giovana Costa Alfredo Supervisão do Núcleo de Produção de Materiais Nádila Toledo Supervisão Operacional de Ensino Luiz Arthur Sanglard Coordenador de Conteúdo Marcia de Souza Designer Educacional Patrícia Ramos Peteck Projeto Gráfico Jaime de Marchi Junior José Jhonny Coelho Arte Capa Arthur Cantareli Silva Ilustração Capa Bruno Pardinho Editoração Arthur Murilo Heicheberg Qualidade Textual Jaqueline Mayumi Ikeda Loureiro Ilustração Bruno Pardinho Em um mundo global e dinâmico, nós trabalhamos com princípios éticos e profissionalismo, não so- mente para oferecer uma educação de qualidade, mas, acima de tudo, para gerar uma conversão in- tegral das pessoas ao conhecimento. Baseamo-nos em 4 pilares: intelectual, profissional, emocional e espiritual. Iniciamos a Unicesumar em 1990, com dois cursos de graduação e 180 alunos. Hoje, temos mais de 100 mil estudantes espalhados em todo o Brasil: nos quatro campi presenciais (Maringá, Curitiba, Ponta Grossa e Londrina) e em mais de 300 polos EAD no país, com dezenas de cursos de graduação e pós-graduação. Produzimos e revisamos 500 livros e distribuímos mais de 500 mil exemplares por ano. Somos reconhecidos pelo MEC como uma instituição de excelência, com IGC 4 em 7 anos consecutivos. Estamos entre os 10 maiores grupos educacionais do Brasil. A rapidez do mundo moderno exige dos educa- dores soluções inteligentes para as necessidades de todos. Para continuar relevante, a instituição de educação precisa ter pelo menos três virtudes: inovação, coragem e compromisso com a quali- dade. Por isso, desenvolvemos, para os cursos de Engenharia, metodologias ativas, as quais visam reunir o melhor do ensino presencial e a distância. Tudo isso para honrarmos a nossa missão que é promover a educação de qualidade nas diferentes áreas do conhecimento, formando profissionais cidadãos que contribuam para o desenvolvimento de uma sociedade justa e solidária. Vamos juntos! Seja bem-vindo(a), caro(a) acadêmico(a)! Você está iniciando um processo de transformação, pois quan- do investimos em nossa formação, seja ela pessoal ou profissional, nos transformamos e, consequente- mente, transformamos também a sociedade na qual estamos inseridos. De que forma o fazemos? Crian- do oportunidades e/ou estabelecendo mudanças capazes de alcançar um nível de desenvolvimento compatível com os desafios que surgem no mundo contemporâneo. O Centro Universitário Cesumar mediante o Núcleo de Educação a Distância, o(a) acompanhará durante todo este processo, pois conforme Freire (1996): “Os homens se educam juntos, na transformação do mundo”. Os materiais produzidos oferecem linguagem dialógi- ca e encontram-se integrados à proposta pedagógica, contribuindo no processo educacional, complemen- tando sua formação profissional, desenvolvendo com- petências e habilidades, e aplicando conceitos teóricos em situação de realidade, de maneira a inseri-lo no mercado de trabalho. Ou seja, estes materiais têm como principal objetivo “provocar uma aproximação entre você e o conteúdo”, desta forma possibilita o desenvolvimento da autonomia em busca dos conhe- cimentos necessários para a sua formação pessoal e profissional. Portanto, nossa distância nesse processo de cresci- mento e construção do conhecimento deve ser apenas geográfica. Utilize os diversos recursos pedagógicos que o Centro Universitário Cesumar lhe possibilita. Ou seja, acesse regularmente o Studeo, que é o seu Ambiente Virtual de Aprendizagem, interaja nos fó- runs e enquetes, assista às aulas ao vivo e participe das discussões. Além disso, lembre-se que existe uma equipe de professores e tutores que se encontra dis- ponível para sanar suas dúvidas e auxiliá-lo(a) em seu processo de aprendizagem, possibilitando-lhe trilhar com tranquilidade e segurança sua trajetória acadêmica. A U TO R Professor Dr. Éder Rodrigo Gimenes Doutor em Sociologia Política pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), com Mestrado em Ciências Sociais pela Universidade Estadual de Maringá (UEM). Segundo Líder do grupo de pesquisa “Cultura Política, Comportamento e Democracia” (UEM/CNPq), pesquisador do “Núcleo de Pesquisas em Participação Política” (NUPPOL - UEM). Professor permanente do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais e colaborador do Programa de Pós-Graduação em Políticas Públicas da UEM, docente dos cursos de Gestão Pública e de Gestão das Organizações do Terceiro Setor no Centro Universitário de Maringá (UniCesumar), com experiência no ensino presencial e à distancia para cursos de graduação e de pós-graduação e ministração de disciplinas sobre métodos e técnicas de pesquisa no curso de graduação em Gestão Pública e nos Programas de Pós-Graduação em Ciências Sociais e em Políticas Públicas. É autor de capítulos, de artigos publicados em periódicos nacionais e internacionais, do livro “Eleitores e partidos políticos na América Latina” e organizador das coletâneas “Participação política e democracia no Brasil contemporâneo”, “Comportamento político e opinião pública: estudos sobre Brasil e América Latina” e “Poder legislativo e cultura política: valores, atitudes, trajetória e comportamento político dos vereadores e vereadoras do Estado de Santa Catarina”. Atua também como parecerista junto a periódicos nacionais e internacionais, tem experiência na organização e análise de dados quantitativos e desenvolve pesquisas relacionadas a comportamento político e opinião pública, principalmente nos seguintes temas: atitudes e valores políticos, comportamento político, participação política e partidarismo. Desenvolve, ainda, cursos e atividades de extensão relacionados à metodologia quantitativa de análise de dados e atualmente cursa a Especialização em Docência no Ensino Superior: Tecnologias Educacionais e Inovação no UniCesumar. Currículo Lattes disponível em: <http://lattes.cnpq.br/1358973527170925>. SEJA BEM-VINDO(A)! O campo da Gestão Pública é caracterizado por normas, leis, processos, sistemas de ges- tão e um amplo conjunto de aspectos que remetem à burocracia. É também um campo que tem cada vez mais se pautado pela necessidade e pela recorrência de inovação. Nesse contexto, aos profissionais que atuam na área cabe mais do que o desempenho defunções e atividades relacionadas à gestão pública, mas também o desenvolvimento de habilidades e conhecimentos que lhes permitam se tornarem analistas e pesquisa- dores, uma vez que a realidade social se revela multifacetada, de modo que cabe aos gestores públicos o cuidado com recursos, demandas e políticas que atendam à popu- lação e ao bem público. Este material didático tem o objetivo de contribuir ao aprimoramento de tais habilida- des, competências e conhecimentos, por meio da exposição de temáticas relacionadas aos métodos de pesquisa que podem ser utilizados no campo da Gestão Pública. A obra em questão apresenta os diferentes métodos de pesquisa existentes, bem como técnicas que conformam aos métodos e, ainda, a perspectiva de estabelecimento de diálogos entre as diferentes maneiras de como as pesquisas podem ser estruturadas. Para tanto, a primeira unidade de estudos trata do campo de atuação e de pesquisa em gestão pública e reúne elementos referentes ao conceito e à estrutura de pesquisa e às definições de população, de censo e de amostragem. As unidades seguintes se referem à apresentação de métodos e à discussão sobre téc- nicas de pesquisa distintas, sendo que a segunda unidade do livro trata de aspectos qualitativos e a terceira unidade reúne elementos quantitativos de pesquisa. Para cada tema, há análises de exemplos e são oferecidas possibilidades de pesquisa. A quarta unidade de estudo versa sobre a complexidade referente à realização de pesquisas, para que sejam apresentadas considerações a fim de que futuros gestores públicos compreendam que métodos e técnicas de pesquisa podem ser utilizadas de maneira combinada ou conjunta. Nesse sentido, na referida unidade, são abordados as- pectos sobre estudos de casos e sobre a triangulação de métodos e técnicas aplicadas ao âmbito da gestão pública. Por fim, a quinta unidade de estudos diz respeito a aspectos que tangenciam as pes- quisas em gestão pública de modo geral, independentemente de métodos ou técnicas utilizadas, individualmente ou em conjunto. Nesse sentido, os tópicos apresentados di- zem respeito a aspectos éticos gerais relacionados à gestão pública e específicos com relação à realização de pesquisas e referentes à apresentação de resultados de pesquisa, com foco na construção de relatórios. De modo geral, a expectativa deste material de estudos não é de formar especialistas em métodos e técnicas de pesquisas, mas de contribuir para que os gestores públicos em formação se tornem profissionais com perfil que possibilite a investigação, uma vez que o conhecimento acerca de métodos e técnicas pode contribuir para a melhor per- cepção dos profissionais quanto aos caminhos necessários e/ou adequados para a reso- lução de questões ou problemas. APRESENTAÇÃO MÉTODOS DE PESQUISA APLICADOS À GESTÃO PÚBLICA Assim, a própria disciplina é, se pensarmos no curso de Gestão Pública como um todo, parte de um caminho maior que conduzirá cada um à realidade social e profis- sional futura. Que seja um caminho de desafios, mas também de construção cons- tante de conhecimento! APRESENTAÇÃO SUMÁRIO 09 UNIDADE I A PESQUISA 14 Introdução 15 O Campo de Atuação e de Pesquisa em Gestão Pública 20 Conceito e Estrutura de Pesquisa 29 População, Censo e Amostragem 42 Considerações Finais 49 Referências 51 Gabarito UNIDADE II O MÉTODO DE PESQUISA QUALITATIVA 54 Introdução 55 Conceito de Pesquisa Qualitativa 64 Técnicas e Instrumentos de Coleta de Dados Qualitativos 78 Técnicas de Análise de Dados Qualitativos 85 Considerações Finais 92 Referências 95 Gabarito SUMÁRIO 10 UNIDADE III O MÉTODO DE PESQUISA QUANTITATIVA 98 Introdução 99 Conceito de Pesquisa Quantitativa 106 Técnicas e Instrumento de Coleta de Dados Quantitativos 124 Técnicas de Análise de Dados Quantitativos 151 Considerações Finais 158 Referências 161 Gabarito UNIDADE IV TRIANGULAÇÃO DE DADOS 164 Introdução 165 A Complexidade da Pesquisa 169 Estudo de Caso 174 Triangulação de Métodos na Gestão Pública 184 Considerações Finais 191 Referências 193 Gabarito SUMÁRIO 11 UNIDADE V TÓPICOS ESPECIAIS SOBRE A PESQUISA EM GESTÃO PÚBLICA 196 Introdução 197 Ética Profissional e na Pesquisa em Gestão Pública 202 Relatórios de Pesquisas em Gestão Pública: Contexto e Referencial 207 Relatórios de Pesquisas em Gestão Pública: Resultados e Conclusões 216 Considerações Finais 222 Referências 223 Gabarito 224 CONCLUSÃO U N ID A D E I Professor Dr. Éder Rodrigo Gimenes A PESQUISA Objetivos de Aprendizagem ■ Conhecer os campos em que os gestores públicos atuam e nos quais podem desenvolver pesquisas. ■ Compreender o que é e quais aspectos compõem uma pesquisa. ■ Desenvolver a percepção sobre tamanhos e potencialidades de investigação a partir da definição dos objetos de análise. Plano de Estudo A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade: ■ O campo de atuação e de pesquisa em gestão pública ■ Conceito e estrutura de pesquisa ■ População, censo e amostragem INTRODUÇÃO Por que a pesquisa é importante na gestão pública? Como realizá-la? Tais perguntas são centrais à primeira unidade de estudos desta disciplina. Nossa expectativa é de que possamos percorrer juntos o caminho que nos levará ao conhecimento necessário para responder essas questões e outras que serão destacadas nas próximas unidades de estudos. Para tanto, nosso primeiro contato com a temática parte de uma aproxima- ção entre os métodos de pesquisa e o campo de formação em que dialogamos. Nesse sentido, iniciamos esta unidade de estudos com esboços de possibilida- des de campos em que os gestores públicos podem desenvolver pesquisas, com a finalidade de otimizar sua atuação profissional e de contribuir para a melhor uti- lização de recursos públicos de ordem financeira, humana, material e de tempo. Na sequência, avançamos no sentido de dialogar de maneira mais efetiva sobre o universo da pesquisa, com vistas à compreensão do conceito, da estru- tura e dos aspectos mais relevantes à sua realização, tendo sempre como objetivo aliar a explanação teórica com exemplos que ilustrem o debate. Seguindo a mesma perspectiva, a terceira seção desta unidade de estudos se debruça sobre um dos aspectos mais relevantes à realização de pesquisas, de modo geral, que tem consequências relevantes quanto à sua observação no âmbito da gestão pública: o conjunto de casos que será considerado como objeto de análise da pesquisa. Tendo em vista que tal definição influencia não apenas a maneira como investigamos um problema ou situação, mas também o alcance e as possibilida- des de melhorias de processos e/ou de resultados de políticas públicas, o gestor público precisa ter clareza sobre o que compõe uma população e uma amostra, a fim de definir a abordagem mais adequada a cada pesquisa. Bons estudos! Introdução Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 14 A PESQUISA Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IU N I D A D E15 O CAMPO DE ATUAÇÃO E DE PESQUISA EM GESTÃO PÚBLICA A gestão pública compõe o campo de atuação, de conhecimento e de produ- ção de pesquisas, cujos resultados têm capacidade de efetivação direta sobre a realidade social, uma vez que se trata do âmbito em que o Estado atua no desen- volvimento de ações que podem contribuir para alterações positivas nas vidas dos indivíduos e na coletividade. De acordo com Teixeira, Zamberlan e Rasia (2008), um bom gestorpúblico precisa ter conhecimento sobre sua área de atuação, bem como habilidades e competências que lhe permitam tomar decisões de maneira rápida e precisa. Para tanto, conhecer o ambiente em que desenvolve suas atividades e os esco- pos e as temáticas a ele relacionados é essencial. A pesquisa em gestão pública encontra-se nesse contexto. A realização de pesquisas no âmbito da gestão pública pode contemplar dis- tintos objetivos e temas, assim como pode atender a diferentes públicos. Nesse sentido, faz-se importante destacar as potencialidades da pesquisa na área antes de avançarmos, neste livro, na discussão acerca de métodos e técnicas de coleta e de análise de dados e informações. O Campo de Atuação e de Pesquisa em Gestão Pública Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 16 É relevante que os gestores públicos busquem o conhecimento daquilo que diz respeito ao seu campo de atuação. Para tanto, é preciso saber lidar com ques- tões econômicas, jurídicas e administrativas ou organizacionais. Sobre aspectos econômicos, a realização de análises de conjuntura e de prospecção são centrais aos gestores públicos, os quais precisam ter em mãos, para a melhor tomada de decisões, dados e informações de ordem macro e microeconômica, como taxas e indicadores de desemprego, desempenho da economia, dívida pública e vul- nerabilidade social, por exemplo. No que tange ao campo da legislação, os fundamentos constitucionais das políticas públicas, da administração pública, da responsabilidade civil dos entes estatais e das relações estabelecidas no âmbito intergovernamental são relevan- tes, assim como aspectos de ordem administrativa, organizacional e burocrática, como o conhecimento sobre debilidades e necessidades com relação ao conjunto de servidores, de serviços e de infraestrutura do ente público. Outro foco de preocupação dos gestores públicos deve ser a consecução de sua atuação para além dos aspectos burocráticos, para que o conhecimento sobre o planejamento de ações que busquem uma gestão social e o desenvolvimento local sejam prementes. Compreender o que são e quais são os métodos de pla- nejamento estratégico, seus instrumentos legais — Plano Plurianual (PPA), Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), Lei do Orçamento Anual (LOA) e a Lei de Responsabilidade Fiscal — que permitem avançar na qualificação do trabalho dos gestores e nas competências dos órgãos públicos em que exercem suas atividades. Todos os fatos, registros, estatísticas, fenômenos, processos ou percepções são considerados dados. As informações são dados organizados com vistas a responder especificamente às questões de pesquisa. Ambos podem ser apurados em função da própria pesquisa (dados e informações primárias) ou ser coletados junto a publicações, dados oficiais ou outras fontes que coletaram-nos com outras finalidades (dados e informações secundárias) Fonte: Antonio Carlos Gil . A PESQUISA Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IU N I D A D E17 Pesquisar sobre como realizar o planejamento e a execução das ações, con- tudo, supera o conhecimento acerca da legislação e deve ser construído sob a perspectiva do desenvolvimento territorial, uma vez que não são raros no Brasil os consórcios intermunicipais e entre esferas de governo para a consecução da gestão social. Em tal contexto, tem se destacado o debate sobre o empoderamento de comunidades e a expansão da visibilidade de pautas relacionadas a temas ambientais e de direitos de grupos específicos, como mulheres, negros, indíge- nas, homossexuais, deficientes e idosos, por exemplo. As relações entre Estado e formas de ação coletiva — associativismo, movimentos sociais e organizações da sociedade civil — também competem às pesquisas pelos gestores públicos. Ademais, em sendo as políticas públicas os mecanismos por meio dos quais os direitos sociais previstos no texto constitucional se efetivam (GIMENES, 2018), a gestão pública deve atentar-se ao seu desenvolvimento e desempenho, uma vez que tais políticas contribuem para a realização do objeto do Estado em buscar o atendimento de coletividades no regime democrático. Assim, a avaliação das políticas públicas implementadas e a disseminação de informações são essen- ciais ao mesmo propósito democrático. O Campo de Atuação e de Pesquisa em Gestão Pública Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 18 Nesses termos, estudos sobre a formação da agenda pública, os processos de tomadas de decisões e suas consequentes implementações e monitoramento também são objetos de pesquisa ao gestor público. Em outras palavras, significa afirmar que acompanhar os ciclos de políticas públicas e investigar necessidades e debilidades nas áreas dessas políticas demandam atuação ativa dos gestores. Além da estrutura e das perspectivas de funcionamento do poder público, os gestores precisam, ainda, atentar-se aos desafios que se colocam ao seu tra- balho, para o que a realização de pesquisas também contribui, uma vez que o conjunto de envolvidos nos processos oscila, em alguma medida, por conta da circulação de indivíduos que não pertencem à carreira pública, mas são nomea- dos para cargos ou funções de acordo com o grupo político que ocupa os postos eletivos do Executivo e do Legislativo. Para além do fluxo de indivíduos, é preciso considerar também a fluidez com que informações, técnicas e legislações são alteradas ou reformuladas, bem como ter em mente que a população tem se revelado cada vez mais ativa em termos de engajamento social, tendo em vista a expansão das instituições participati- vas, como conselhos de políticas públicas, audiências públicas, conferências de políticas públicas, planos diretores e orçamentos participativos, por exemplo. A internet e a disseminação de valores democráticos, ao longo dos anos, têm reforçado a necessidade, à gestão pública, de atuação em redes com outros entes estatais, de estabelecimento de parcerias com empresas e com organiza- ções da sociedade social e de utilização do ciberespaço para uma gestão social responsável e transparente. Por fim, uma última temática para a realização de pesquisas no âmbito da gestão pública tem relação com o campo do ensino superior. Estudar, pesqui- sar, discutir e apresentar propostas de otimização e adequação da gestão social à gestão pública é alvo de debates, para além do espaço burocrático tradicional em que se realiza a temática, de modo que muitos pesquisadores têm contribu- ído ao avanço do conhecimento sobre a gestão pública a partir de pesquisas nas universidades e centros universitários. Nesse sentido, destacam-se os cursos de graduação em gestão pública, admi- nistração pública e políticas públicas, bem como programas de pós-graduação nessas mesmas áreas, tanto em modalidades acadêmicas quanto profissionais. As A PESQUISA Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IU N I D A D E19 pesquisas decorrentes de tais espaços investigam programas e políticas públicas, tanto com relação à sua composição quanto aos seus efeitos sobre a realidade social e seu papel e influência na conformação da rede pública de atendimento às demandas da população. Um exemplo que ilustra as pesquisas acadêmicas que tratam de gestão pública é a relação entre a ampliação do número de vagas ao ensino superior e as políti- cas públicas que permitem o maior ingresso da população com condições sociais de menor privilégio. De um lado, tem-se programase projetos, como o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM), o Sistema de Seleção Unificada (SiSU) e as cotas sociais e raciais, que ampliam o acesso de estudantes à educação supe- rior, assim como o Fundo de Financiamento Estudantil (FIES) e o Programa Universidade para Todos (PROUNI) para que estudantes com baixa renda pos- sam financiar ou mesmo cursar gratuitamente um curso de graduação. Por outro lado, há pesquisas realizadas no âmbito das instituições de ensino que recebem tais alunos, as quais investigam a qualidade da educação, os meca- nismos que constrangem ou contribuem para a permanência dos estudantes beneficiados pelas mencionadas políticas públicas na universidade e a necessi- dade de maior democratização da educação e de ampliação da capacitação da população (GIMENES, 2018). É nesse contexto que este curso de graduação em Gestão Pública se insere. Nas próximas seções e unidades de estudo deste material didático, trataremos de aspectos relacionados à consecução de pesquisas, coleta e análises de dados, com vistas a atender as necessidades e temáticas aqui destacadas. Que motivações os movem, enquanto gestor público em processo de for- mação, a pesquisar soluções para determinadas demandas ou problemas que se colocam a sua atuação no âmbito do Estado? Conceito e Estrutura de Pesquisa Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 20 CONCEITO E ESTRUTURA DE PESQUISA Tendo em vista a relevância e a diversidade de possibilidades e perspectivas à rea- lização de pesquisas no campo da gestão pública, é preciso compreender quais são os elementos que permeiam sua elaboração. Nesse sentido, a presente seção trata de tipos de conhecimento, da definição de pesquisa, da relação estabele- cida entre problema e objetivo, da definição de dados e de informações e dos elementos que nos permitem construir cenários para planejar e executar ações de gestão social e de políticas públicas. Em se tratando dos tipos de conhecimento, há duas classificações recorren- tes. A primeira diz respeito ao conhecimento de modo geral, enquanto a segunda refere-se especificamente à classificação do conhecimento no âmbito da gestão. Com relação à primeira classificação, Teixeira, Zamberlan e Rasia (2008, p. 19) afirmam que as principais formas específicas de conhecimento atualmente reconhe- cidas são reflexos das várias fases da evolução da vida em sociedade e da própria humanidade, das formas de concepção da realidade e de entendimento na busca da verdade. Nesse sentido, os referidos autores se filiam a Lakatos e Marconi (1991) em sua classificação de tipos de conhecimento, quais sejam: popular, religioso, filosófico A PESQUISA Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IU N I D A D E21 e científico. O tipo que podemos denominar como mais simples ou menos com- plexo seria o conhecimento popular, também denominado empírico, vulgar ou o senso comum, que consistiria no conjunto de crenças e informações que acu- mulamos ao longo da vida, sem preocupação direta com atos reflexivos ou com investigações. O conhecimento religioso ou teológico tem como premissa a busca por ver- dades absolutas, que seriam aquelas que somente a fé seria capaz de explicar. Tal conhecimento não seria passível de verificação, uma vez que a religião seria sua explicação, de modo que, levado ao limite, haveria o argumento de que os valo- res religiosos são incontestáveis. O conhecimento filosófico tem como premissa a relação do homem com seu cotidiano, analisada sob a perspectiva crítica e reflexiva, porém sem preocupação com a efetivação dessa relação, o que significa que é um tipo de conhecimento que considera especulações da relação entre o homem e seu cotidiano, sem pre- ocupação com verificar como essa relação, de fato, ocorre. Por fim, o conhecimento científico destoa dos demais tipos por conta de sua caracterização como falível, real e verificável. É um tipo de conhecimento que emerge a partir de dúvidas e que pode ser comprovado concretamente, já que é passível de investigação, verificação e replicação por meio de métodos e técni- cas de coleta de dados, de análise e de interpretação de resultados. Na prática, esses tipos de conhecimento não necessariamente são verificáveis de maneira completamente desconexa, o que significa que em vários momentos podemos nos deparar com situações em que aspectos do senso comum, religio- sos ou filosóficos e científicos são mobilizados para explicar algum fenômeno ou processo político, social ou cultural. A discussão, contudo, que propomos nesta disciplina, se insere no contexto da formação educacional de nível superior, a qual está circunscrita no campo de estudos científicos e nos conduz a discutir a gestão pública e as potencialidades de otimização da atuação de seus agentes sob a perspectiva científica. Para tanto, nosso foco recai sobre a pesquisa e sobre como sua realização pode contribuir para alterar a realidade social em que os gestores sociais desen- volvem sua atividade profissional, uma vez que autores como Demo (1993), Minayo (1994), Cervo e Bervian (2002) e Gil (2008) definem pesquisa como Conceito e Estrutura de Pesquisa Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 22 atividade básica da ciência, que se desenvolve pela indagação e pela descoberta da realidade. De acordo com Demo (1993, p. 128), “pesquisa significa o diálogo crítico e criativo com a realidade, culminando na elaboração própria e na capacidade de intervenção [...]”, ou seja, a pesquisa diz respeito às atividades que são realizadas com o objetivo de solucionar problemas, sejam de ordem teórica ou prática, com o emprego de métodos científicos. Para realizar tal intento, Teixeira, Zamberlan e Rasia (2008) afirmam que são utilizados métodos de pesquisa — dedutivo, indutivo, hipotético-dedutivo, fenomenológico e dialético —, os quais descre- vem de maneira sucinta. Proposto por autores racionalistas, como René Descartes, Baruch Spinoza e Gottfried Wilhelm Leibniz, o método dedutivo parte do pressuposto de que somente a razão seria capaz de nos conduzir ao conhecimento verdadeiro e busca explicar o que constituiria a verdade a partir de raciocínios organizados em uma cadeia (ou seja, com relações) lógica e descendente, tendo como início um aspecto geral e avanços no sentido de aspectos mais específicos ou particu- lares, até que seja atingida uma conclusão. Por sua vez, o método indutivo tem estrutura de composição inversa, pois parte- -se de elementos específicos ou particulares para a interpretação daquilo que seria geral. Nesse sentido, autores empiristas como Francis Bacon, Thomas Hobbes, John Locke e David Hume defenderam que o conhecimento seria fundamentado nas experiências, sem considerar princípios pré-estabelecidos, o que significa que, para tais pensadores, a generalização seria resultado de constatações parti- culares e derivaria da observação de casos da realidade concreta. O silogismo remete a uma construção lógica na qual, a partir de duas pre- missas com grau de generalidade ou especificidade distinta, é possível che- gar a uma conclusão, por meio do estabelecimento de uma relação lógica entre as premissas anteriores. Fonte: o autor. A PESQUISA Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IU N I D A D E23 O método hipotético-dedutivo, também conhecido como positivista, tem em Karl Popper seu principal autor, que defendia uma perspectiva de realiza- ção de pesquisasa partir de testes de hipóteses. Segundo tal método, diante de determinado problema ou questão, são formuladas hipóteses sobre como supe- rar a situação, a partir das quais testa-se suas eventuais consequências a fim de confirmá-las ou refutá-las. Segundo Figueiredo Filho et al. (2013), o positivismo pode ser definido por sua busca pela generalização ou pelo estabelecimento de explicações que res- pondam à complexidade da realidade social de maneira objetiva. Nesse sentido, Della Porta e Keating (2008, p. 23) expõem que, para o método positivista, “[...] o mundo existe de forma objetiva, de forma independente do pesquisador, sendo possível conhecer integralmente a realidade. O objetivo do pesquisador é des- crever e analisar essa realidade [...]”. Assim, o método hipotético-dedutivo busca, ao mesmo tempo, a refutação de hipóteses ou soluções possíveis para um problema e também a produção de explicações generalizáveis ou completas sobre os problemas, de modo que é pau- tado pela ideia de falseabilidade de hipóteses, ou seja, de testar se determinada consequência possível é falsa para os casos analisados e, a partir deles, tratar tal hipótese como falsa para os demais. Pautada por uma construção de raciocínio totalmente distinta dos demais métodos apresentados anteriormente, a fenomenologia — que tem em Edmund Husserl seu principal expoente — tem preocupação com a descrição da experiên- cia, situação ou fenômeno tal como se apresenta. A premissa do método é de que a realidade não é única, mas, ao contrário, tão múltipla ou multifacetada quanto forem as interpretações, as compreensões, as comunicações e as relações huma- nas, já que o conhecimento é conformado pelos indivíduos e suas interações. Por fim, o último método destacado é o dialético, fundamentado na teoria de Georg Wilhelm Friedrich Hegel, que se apresenta como método de interpre- tação dinâmica da realidade, que consistiria em uma sequência de contradições (nas palavras de Hegel, mas que podemos pensar como situações-problema), que geram novos pensamentos e outras contradições, as quais passam a reque- rer soluções. Tendo em vista que tais contradições não ocorreriam em um vácuo, teriam que ser considerados sempre os aspectos que influenciam uma situação, Conceito e Estrutura de Pesquisa Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 24 ou seja, aspectos que podem ser de natureza social, política, econômica, cultu- ral, ambiental, tecnológica etc. De acordo com Teixeira, Zamberlan e Rasia (2008, p. 29), na sua função de desvendar, os métodos não estão sozinhos, eles têm sido apoiados em seus principais passos por técnicas ou procedimen- tos científicos reconhecidos como instrumentos, ou seja, os meios ou táticas para assegurar que a investigação (descoberta, aprendizado, so- luções, invenção) seja bem realizada e seus resultados reconhecidos. Assim, conhecidos os distintos métodos que podem ser considerados para a reali- zação de uma pesquisa, é possível avançar ao entendimento de que, à medida que se desenvolvem o conhecimento e os problemas, faz-se necessário utilizar técnicas específicas para superar as inquietações e promover melhorias na gestão pública. De acordo com Gil (2008), a consecução de uma pesquisa implica em atender a determinados aspectos. Neste material didático, optou-se tratar tal abordagem de maneira metafórica, considerando a pesquisa como um caminho a ser percorrido. O início do caminho seria a identificação de um problema, de uma neces- sidade a ser atendida ou de um aspecto a ser melhor investigado. No campo da gestão pública, essa identificação seria a constatação de que um procedimento ou técnica não tem gerado resultados adequados, que um setor tem sido alvo de reclamações recorrentes ou que uma política pública ou ação social é defici- tária em termos de atendimento à população, por exemplo. A partir da identificação do problema, o passo seguinte é refletir sobre como superá-lo. Para tanto, cabe aos pesquisadores (os gestores públicos, neste caso) buscarem informações que permitam estabelecer hipóteses ou mesmo delinear com maior exatidão qual o objetivo a ser atingido. Em outras palavras, o segundo A dialética hegeliana parte da ideia de ciência como tríade tese — antítese — síntese, na qual a tese é uma posição inicial, a antítese diz respeito às con- tradições e a síntese seria a reflexão acerca da relação entre tese e antítese. A PESQUISA Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IU N I D A D E25 passo seria delimitar com maior clareza qual é o problema, o que se faz tendo em consideração que, a depender da especificidade da questão e do conhecimento anteriormente produzido sobre o tema, há três diferentes níveis a estabelecer: a exploração, a descrição ou a causalidade (KOTLER, 2007). O primeiro nível para a projeção e realização de uma pesquisa é a exploração. Como o próprio termo indica, tal nível de pesquisa é permeado pela aproxima- ção mais básica de um pesquisador com relação ao objeto, o que significa que a pesquisa exploratória é recomendada aos gestores públicos quando se encon- tram em face de uma questão ou problema sobre a qual nada sabem. É preciso que o gestor público, contudo tenha em mente que uma abordagem explorató- ria é básica no sentido de que se trata de uma busca inicial por caminhos para a ação, hipóteses a ser testadas ou mesmo pela identificação de alternativas para solução de situações, mas é extremamente rica em termos de resultados, já que pode estabelecer prioridades para pesquisas posteriores. De acordo com Gil (2008), para a realização de pesquisas exploratórias são empregadas mais comumente técnicas, como levantamento bibliográfico, entre- vistas e coleta de dados junto a órgãos oficiais (relatórios técnicos, legislação e outros documentos) ou específicos e, ainda, a websites. Especialmente com rela- ção à última técnica, cabe destacar como exemplos as páginas de organizações da sociedade civil (OSCs), redes sociais (como Facebook e Twitter), blogs e pági- nas, nas quais usuários de serviços podem se manifestar com relação à qualidade do que lhes é oferecido. Um exemplo de pesquisa exploratória relacionada à gestão pública é a inves- tigação científica promovida pela socióloga Walquíria Leão Rêgo e pelo filósofo Alessandro Pinzani em regiões consideradas bolsões de pobreza no Brasil, entre os anos de 2006 e 2011, quando entrevistaram e realizaram observação partici- pante entre populações beneficiárias do Programa Bolsa Família. Diferentemente de outras pesquisas que revelaram resultados mensurados por meio de dados oficiais, Rêgo e Pinzani (2013) constataram resultados que pesquisas desenvolvi- das apenas com base em dados e estatísticas não foram capazes de captar, como os rendimentos do referido programa, para além de contribuir financeiramente com o desenvolvimento da família e dos efeitos positivos decorrentes da trans- versalidade do programa, revelaram também a construção do sentimento de Conceito e Estrutura de Pesquisa Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 26 cidadania e de autonomia pelas beneficiárias, ainda que de maneira frágil com relação ao conteúdo de tais conceitos. Assim, a pesquisa que originou a premiada obra “Vozes do Bolsa Família” foi exploratória por conta da inédita iniciativa de acompanhar o cotidiano de beneficiárias de um programa social ao longo do tempo e dos resultados que gerou. Quando se conhece ao menos minimamente uma situação, fenômeno ou problemaé possível a consecução de uma pesquisa descritiva, que consiste na realização de uma análise sobre as características de determinada população, de um fenômeno e/ou de possíveis caminhos explicativos acerca de eventuais deli- neamentos ou relações entre aspectos. Segundo Teixeira, Zamberlan e Rasia (2008), a pesquisa descritiva pode ser realizada em diferentes situações, como: Descrever as características de grupos especí�cos, como benefíciários de políticas públicas ou programas sociais ou ainda de servidores de determinada área de atuação. Estimar a parcela de uma população que está sujeita a determinado problema ou em condição de vulnerabilidade com relação a certa especi�cidade de atuação do Estado. Conhecer as percepções da população, dos bene�ciários, dos servidores ou dos gestores públicos sobre a caracterização e os resultados de certa política ou programa social. Figura 1 - Aplicabilidade da pesquisa descritiva em diferentes situações Fonte: Teixeira, Zamberlan e Rasia (2008). A PESQUISA Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IU N I D A D E27 Em se tratando de técnicas para coleta de dados, pesquisas descritivas permitem considerar diversas possibilidades, como a realização de entrevistas, observação participante, grupos focais, surveys e painéis. Uma análise descritiva que se apresenta como ilustrativa desse nível de pes- quisa é o artigo de Tavares e Alves (2015), que realizaram uma análise sobre indicadores de gastos públicos com a educação básica em municípios de uma região da Paraíba, para a qual se basearam em amplo conjunto de dados oficiais e de análise documental. Após detida a investigação sobre tais informações e a comparação com dados e documentos referentes ao restante do estado, os autores constataram que a região dos municípios do Cariri Ocidental tem desempenho mais elevado com relação aos gastos públicos destinados à educação básica do que as demais regiões paraibanas. O terceiro nível de pesquisa é a explicativa, também conhecida como causal. Tal tipo de investigação é pautada pela identificação de fatores que condicionam, são determinantes ou contribuem para que determinada situação ou problema se mani- feste ou, em contrapartida, para que certo efeito positivo ou favorável seja estabelecido. Nesse sentido, conforme destacam Machado e Silva (2007), pesquisas explicativas permitem o aprofundamento do conhecimento a respeito da realidade social. De modo geral, esse nível de pesquisa é pautado pela busca de identificação de causalidade a partir de três condições (FIGUEIREDO FILHO etal., 2013): 3 condições para a pesquisa explicativa 1ª Existência de relações entre variáveis, de modo que a ocorrência de um fenômeno não seja independente da ocorrência de outro, ou seja, é necessário que um determinado problema, situação ou questão tenha relação com outro aspecto, para que se possa investigar em que medida tal relação ocorre e como um aspecto in�uencia outro. 2ª Precedência ou antecedência temporal, o que signi�ca que o fato/problema que explica outro deve ter ocorrência anterior – uma condição lógica e até mesmo intuitiva. 3ª Não espuriedade da relação, o que seria indicativo de que há relação entre as variáveis e esta possui explicação temporal, de modo que a terceira condição seria consequência da existência combinada das condições anteriores. Conceito e Estrutura de Pesquisa Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 28 3 condições para a pesquisa explicativa 1ª Existência de relações entre variáveis, de modo que a ocorrência de um fenômeno não seja independente da ocorrência de outro, ou seja, é necessário que um determinado problema, situação ou questão tenha relação com outro aspecto, para que se possa investigar em que medida tal relação ocorre e como um aspecto in�uencia outro. 2ª Precedência ou antecedência temporal, o que signi�ca que o fato/problema que explica outro deve ter ocorrência anterior – uma condição lógica e até mesmo intuitiva. 3ª Não espuriedade da relação, o que seria indicativo de que há relação entre as variáveis e esta possui explicação temporal, de modo que a terceira condição seria consequência da existência combinada das condições anteriores. Figura 2 - As três condições para a pesquisa explicativa Fonte: Figueiredo Filho et al. (2013). Pesquisas que buscam estabelecer relações causais são pautadas majoritariamente por análises quantitativas, mas também é possível buscá-la por meio de técnicas qualitativas de pesquisa, como será detalhado em unidades de estudos posterio- res. Como exemplo de análises de causalidade, destaco a tese de Nóbrega Junior (2010), que identificou quais fatores são causas ou se encontram fatores associa- dos aos homicídios na região Nordeste e, ainda, o relevante papel das políticas públicas de segurança, sendo que, quando tais políticas são eficientes e eficazes há redução, ou ao menos o controle dos homicídios. A despeito da classificação em três níveis de pesquisa, é preciso destacar que as investigações, tanto no âmbito científico quanto da gestão pública e demais áreas, não necessariamente se pautam por apenas um nível, sendo que ao longo do tempo e conforme são obtidos mais dados e informações, consequentemente, mais se conhece o problema, situação ou política que carece de análises, mais aprofundadas podem se tornar as investigações, análises, resultados e seus efei- tos sobre a realidade pública. O terceiro passo da pesquisa seria seu delineamento, o que perpassaria enten- dermos o que compõe o conjunto de variáveis a ser analisada. Nesse momento, os gestores públicos podem se deparar com múltiplas possibilidades de objetos a serem investigados, como relatórios e documentos, outros gestores e servidores, processos e procedimentos burocráticos ou de políticas públicas, a percepção da população ou ainda combinações entre esses distintos aspectos. Após conhecer, ainda que minimamente, um problema, refletir sobre o tipo de análise possível — se exploratória, descritiva ou causal — e delinear o objeto a ser analisado, é possível avançar para a definição da população-objeto da investi- gação, elaborar os instrumentos para coleta de dados, realizar tal coleta, analisar e interpretar os resultados e produzir relatórios. A PESQUISA Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IU N I D A D E29 Nesta unidade de estudos, nos deteremos ao passo de delimitação do objeto da análise, de modo que serão abordados tópicos acerca dos conceitos de popu- lação, censo e amostragem na próxima seção. A elaboração dos instrumentos por meio dos quais a coleta de dados pode ocorrer e as possibilidades de análise e interpretação dos resultados serão contemplados nas unidades de estudos 2, 3 e 4, de maneira detalhada e minuciosa, ao passo que a produção de relatórios é foco de nossa quinta e última unidade de estudos. POPULAÇÃO, CENSO E AMOSTRAGEM A realização de uma pesquisa tem, na defi- nição da população a ser analisada, um de seus mais decisivos passos, uma vez que a maneira como a coleta de dados será con- duzida, as análises serão realizadas, os resultados finais e as consequentes altera- ções que podem ser propostas a determinada realidade social, no caso da gestão pública, decorrem dessa escolha. Pensar a relevância de definir como a população será abordada por meio de cri- térios de seleção implica, por outro lado, também em determinar o impacto financeiro, a necessidade de treinamento e a disponibilidade de recursos humanos, o tempo disponível para a pesquisa e a clareza acerca dos resultadosesperados e de como apresentá-los, especialmente no caso de políticas públicas. Isto posto, cabe esclarecer que o objeto de investigação de uma pesquisa diz respeito ao conjunto de casos a ser analisados. Casos são as unidades de men- suração daquilo que pretendemos analisar, o que significa que a determinação da natureza dos casos dependerá, invariavelmente, da finalidade da pesquisa ou do problema que o gestor público busca responder. População, Censo e Amostragem Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 30 Alguns exemplos de situações-problemas que necessitam de distintas deter- minações de casos a ser investigados são apresentados a seguir: ■ A necessidade de avaliação dos usuários acerca de adequações em uma ação, programa ou política pública como etapa de monitoramento e/ou avaliação da política pública, precisa ser considerado como unidade de análise os indivíduos que são beneficiários daquilo que se procura inves- tigar, de modo que cada caso corresponderia a um cidadão entrevistado. ■ A elaboração de diretrizes para o funcionamento de uma política pública no âmbito municipal e as possibilidades de diálogo entre os Poderes Executivo e Legislativo com o conselho municipal de uma área especí- fica de intervenção pode ser perpassada pela análise das atas de reuniões dos conselhos e conferências em outras instâncias (estadual ou distrital e federal), a fim de subsidiar a identificação de parâmetros de ação a ser adotada de maneira semelhante também na esfera local, o que significa que cada caso a ser analisado seria uma ata. ■ Diante de questionamento do Ministério Público sobre o atendimento das solicitações dos cidadãos, uma prefeitura pode ser instada a apresentar informações sobre a resolução de problemas, os quais comunicados por meio da Ouvidoria pública, uma possibilidade seria a solicitação a cada secretaria de governo que encaminhasse um relatório sobre as chamadas iniciadas via Ouvidoria e quais as providências tomadas, o que faria das secretarias municipais os casos a serem analisados. Considerando tais exemplos, percebemos situações-problemas em que os casos têm unidades de mensuração diferentes, ou seja, em que a constituição das popu- lações a serem consideradas é distinta, de modo que “população é o conjunto de elementos para os quais desejamos que as nossas conclusões sejam válidas — o universo de nosso estudo” (BARBETTA, 2011, p. 15). A população (também conhecida como universo) é, então, a totalidade do grupo de casos passíveis de investigação para que o gestor público possa solu- cionar uma questão, seja a identificação de um problema ou sua correção. A depender, contudo, de aspectos como método adotado e o nível de conheci- mento para a realização da pesquisa — anteriormente abordados nesta unidade de estudos — e, ainda, de domínio técnico e de aspectos relacionados a recur- sos humanos, financeiros, materiais e de tempo, faz-se necessário optar pela A PESQUISA Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IU N I D A D E31 maneira como tal população será abordada. A abordagem da população tam- bém é tratada como “cobertura” e pode ser realizada de duas formas: por meio de pesquisas censitárias ou amostrais. A realização de uma pesquisa censitária implica na cobertura da totalidade da população a ser investigada, de modo que o censo diz respeito à investiga- ção de todos os elementos de uma população. Assim, os resultados de um censo dizem respeito àquilo que se pretendeu captar com a pesquisa (salvo erros na definição dos objetivos de investigação, que serão abordados nas unidades pos- teriores deste livro), uma vez que a totalidade de resultados corresponderia à totalidade do universo sob investigação, ou seja, seriam resultados exatos, com margem de erro nula. O maior exemplo de pesquisa censitária no âmbito público brasileiro é a reali- zação do Censo pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), quando são coletados dados sobre a totalidade dos brasileiros por meio de coletas de dados nos domicílios. O Censo brasileiro foi realizado pela primeira vez em 1872, tem periodicidade decenal e teve sua última aplicação (até o momento) em 2010. Em termos de efeitos, os dados censitários permitem ao Governo Federal, a outros entes públicos estatais e não estatais (como as organizações da sociedade civil) e a agentes do mercado conhecer a realidade da população brasileira com relação a sua composição sociodemográfica, utilização, necessidade e acesso a políticas públicas e perspectiva de consumo. Assim, os resultados do Censo podem contribuir para a elaboração ou adequação de políticas públicas, por exemplo. Enquanto a grande qualidade da pesquisa censitária é a possibilidade de conhecer um universo de maneira geral, o principal empecilho ou característica negativa deste tipo de pesquisa é o fato de que pode oferecer muitos custos em se tratando de recursos humanos, financeiros, materiais e do tempo envolvido na pesquisa, cujas etapas são, no mínimo, de elaboração do instrumento de coleta de dados, treinamento de equipe, coleta de dados, monitoramento da coleta, tabulação e análise dos dados e produção de relatórios. Nesse sentido, o censo é mais recomendado entre universos pequenos ou em casos nos quais o desenho amostral se revela complexo e extenso, como discutido na sequência desta seção. Diante de universos grandes e complexos e/ou de dificuldades relaciona- das à estrutura ou tempo disponível, não raras vezes, as pesquisas são realizadas População, Censo e Amostragem Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 32 tendo como objeto apenas parcelas da população a ser investigada. Tais parcelas constituem recortes da população e são denominadas amostras, cuja composi- ção depende de critérios a ser considerados para tal seleção. De acordo com Barbetta (2011), uma amostra diz respeito à coleta de dados entre uma parte da população que compõe o objeto de pesquisa. O autor apre- senta de maneira didática tal conceito: A amostragem é naturalmente usada em nossa vida diária. Por exem- plo, para verificar o tempero de um alimento em preparação, podemos provar (observar) uma pequena porção. Estamos fazendo uma amos- tragem, ou seja, extraindo do todo (população) uma parte (amostra), com o propósito de termos uma ideia (inferirmos) sobre a qualidade de tempero de todo o alimento (BARBETTA, 2011, p. 41). Nesse sentido, em comparação com o censo, uma pesquisa amostral tem como vantagens a economia e rapidez, enquanto apresenta como principal ponto nega- tivo a redução da precisão dos resultados, uma vez que assume-se a existência de uma margem de erro em pesquisas amostrais. Parâmetros são medidas que descrevem as características dos casos em um universo. Estimativas são valores calculados com base na amostra para ava- liar parâmetros. Além do Censo, o IBGE realiza coletas anuais de dados entre amostras da população nacional por meio da Pesquisa Nacional por Amostras de Domi- cílios (PNAD) desde 1967, com as finalidades de gerar informações entre os períodos censitários e aprofundar a investigação sobre temas investigados de maneira insuficiente ou não abordados pelo Censo. Fonte: IBGE ([2018], on-line)¹. A PESQUISA Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IU N I D A D E33 Em se tratando de aspectos relacionados ao processo de planejamento amostral, Malhotra (2001) discorreu sobre os estágios pertinentesa este aspecto, dentre os quais são relevantes a esta exposição a escolha da técnica amostral e a deter- minação do tamanho da amostra. Com relação ao primeiro aspecto, Teixeira, Zamberlan e Rasia (2008, p. 93) afirmam que “a decisão mais importante sobre esta escolha diz respeito a utilizar amostragem probabilística ou não-probabilística”. Nesta apresentação, iniciemos pelo segundo tópico. As amostras não-probabilísticas são pautadas pelo julgamento do pesquisa- dor, que seleciona os casos que comporão a análise a partir de critérios arbitrários ou inconscientes, sendo que tal amostragem pode gerar resultados mais expres- sivos, caso já sejam conhecidos, em alguma medida, a população e o problema a ser investigado. Dentre as técnicas de amostragem não-probabilística, três são destacadas neste estudo: AMOSTRAGEM POR CONVENIÊNCIA É o tipo de amostragem mais simples, uma vez que decorre das escolhas do pesquisador a partir da conveniência com que tem acesso a indivíduos, locais, documentos ou outro objeto de pesquisa. Nesse sentido, tem como pontos positi- vos o fato de consumir menos tempo e menos recursos por conta da seleção rápida. Por outro lado, Teixeira, Zamberlan e Rasia (2008, p. 94) atentam para a limi- tação da utilização de tal critério: “estão presentes muitas fontes potenciais de tendenciosidade da seleção, inclusive a auto-seleção dos entrevistados. As amos- tras por conveniência não são representativas de qualquer população”. Isto posto, é salutar reforçar que os resultados decorrentes de uma pesquisa realizada com amostragem por conveniência não podem ser generalizados para a população, especialmente por conta dessa possibilidade de enviesamento da composição amostral. População, Censo e Amostragem Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 34 AMOSTRAGEM POR COTAS Diferentemente da amostragem por conveniência, a amostragem por cotas parte de critérios específicos para sua composição, de modo que o desenho amostral é construído em dois momentos: o primeiro momento é de identificação de carac- terísticas relevantes a ser consideradas como critérios para seleção dos casos; o segundo momento diz respeito à seleção dos casos para análise, tendo em vista a observação dos critérios. São múltiplas as dimensões que podem constituir critérios para determina- ção desse tipo de amostra, sendo que a definição de quais dimensões, categorias ou características que devem ser consideradas decorre dos passos anteriores da elaboração da pesquisa, os quais foram abordados nas seções preliminares a esta. Isso significa que os “filtros”, pelos quais a população de casos será ava- liada para definição da amostra, depende das informações que os pesquisadores (os gestores públicos, neste caso) foram capazes de reunir de maneira explora- tória, descritiva ou causal. De acordo com Teixeira, Zamberlan e Rasia (2008, p. 96), “sob certas condi- ções, a amostragem por cotas proporciona resultados próximos aos da amostragem probabilística convencional”, já que pode ser utilizada de modo a conferir maior semelhança entre os perfis da população e da amostra com relação às categorias definidas como centrais para a avaliação. AMOSTRAGEM TIPO BOLA-DE-NEVE Essa modalidade de amostragem é realizada em pesquisas nas quais há dificul- dade para encontrar a população que precisa ser investigada e se caracteriza pela solicitação, àqueles que forem identificados, de que indiquem novos casos para a investigação. Isso significa que o ponto inicial da pesquisa pode ser um único caso e as coletas de dados subsequentes dependem de indicações (seja de pes- soas ou por meio de documentos) sobre novos componentes do universo que possam ser entrevistados. A PESQUISA Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IU N I D A D E35 Teixeira, Zamberlan e Rasia (2008, p. 96) afirmam que este processo pode ser executado em ondas sucessivas, obtendo-se in- formações a partir de dados, o que nos leva a um efeito de ‘bola-de-ne- ve’. O objetivo principal da amostragem tipo bola-de-neve é estimar características raras na população. Nesse sentido, os autores apresentam um exemplo de situação e que tal técnica de amostragem pode ser aplicável na gestão pública, diante da perspectiva de ação pública para construção de um espaço específico destinado à prática de espor- tes radicais por “motoqueiros” ou “jipeiros”, é importante a prefeitura conhecer a opinião desse grupo sobre local e condições adequadas, mas, por outro lado, é difícil identificar tais indivíduos entre o conjunto dos cidadãos, de modo que a identificação e indicação de um indivíduo por outro contribui em muito para a realização da pesquisa. Avançando de um exemplo relacionado aos cidadãos para uma ilustração sob a perspectiva institucional, podemos nos colocar diante da demanda, enquanto gestores públicos, de propor a criação de um órgão específico para gestão dos conselhos municipais de políticas públicas. Em algumas cidades, há organismos conhecidos como “casa dos conselhos” ou “casa de conselhos”, responsáveis pelas atividades burocráticas relacionadas às referidas instituições participativas. As informações sobre os conselhos (como existência, documentos, composição etc.), contudo não são amplamente acessíveis no Brasil (LÜCHMANN; ALMEIDA; GIMENES, 2016), de modo que as “casas” possuem, ainda, menor visibilidade. Nesse contexto, uma estratégia para que o pesquisador/gestor público tome conhecimento sobre os procedimentos, legislação, estrutura e funcionamento das “casas de conselhos” seria, a partir do contato com a primeira, solicitar ajuda para estabelecer contato com outra ou outras. Apesar de configurar uma interessante estratégia amostral, a bola-de-neve pode conduzir a resultados tendenciosos, uma vez que os investigados sabem quais os objetivos e o conteúdo da pesquisa antes de indicarem outros à parti- cipação, de modo que existe a possibilidade de informarem apenas indivíduos ou instituições que coadunem com suas opiniões ou com seu desenho estrutu- ral, nos casos dos exemplos anteriores. População, Censo e Amostragem Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 36 Cabe, nestes casos, ao pesquisador lançar seu olhar atento às indicações, sendo que, diante de ausência de dissonâncias, pode incitar o respondente a indicações de casos discrepantes ou mesmo conflitantes com relação às suas características ou reiniciar o processo de bola-de-neve com a busca de um novo caso que “dis- pare” outro conjunto de coleta de dados a ser investigados. As amostras probabilísticas decorrem de seleções ao acaso, com chance de que todos os elementos pertencentes ao universo possam compor a amostra e, ainda que seja possível, estabelecer inferências ou projeções à totalidade da popu- lação. Três técnicas de amostragem probabilística se destacam: AMOSTRAGEM ALEATÓRIA SIMPLES Técnica que considera a possibilidade igual e conhecida de que todos os elemen- tos que compõem um universo possam fazer parte da amostra a ser selecionada. Nesse sentido, é mais indicada para populações homogêneas, ou seja, com dis- tribuição de características em proporções semelhantes. Para tanto, a amostra aleatória simples é extraída por meio de um sorteio, de modo que antes da seleção do primeiro caso, todas as unidades que formam o universo têm a mesma chance de ser sorteadas. Após o sorteio do primeiro elemento que irá compor a amostra, todos os demais elementos concorrem ao novo sorteio com igual chancede serem selecionados, e assim sucessivamente. De acordo com Teixeira, Zamberlan e Rasia (2008, p. 97), “este método equi- vale a um sistema de loteria em que todos os nomes (população) são colocados em uma urna, a urna é agitada e os nomes dos ganhadores (amostra) são extra- ídos de maneira não tendenciosa”. AMOSTRAGEM ESTRATIFICADA Um estrato corresponde a um segmento no interior de uma população, de modo que uma amostra estratificada é uma amostra cuja composição respeita deter- minada característica distintiva. A expectativa é de dividir uma população em A PESQUISA Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IU N I D A D E37 subgrupos homogêneos sob determinado aspecto (estrato) de maneira que entre os estratos seja verificada heterogeneidade (BARBETTA, 2011). A estratificação, não raras vezes, é o primeiro momento de definição de uma amostra, sendo acompanhada, em momento posterior, pela determinação dos casos a partir de seleção aleatória simples. Um exemplo desta combinação é o conjunto de dados de opinião pública produzido ao redor do mundo por insti- tutos de pesquisa, como o World Values Survey (WVS) e o Comparative Study of Electoral Systems (CSES), que realizam coletas de dados junto a amostras repre- sentativas de populações nacionais de maneira periódica, as quais permitem conhecermos o perfil, as opiniões e percepções dos indivíduos acerca de questões relacionadas a aspectos sociodemográficos, de participação política, confiança em instituições como aquelas do poder público, fontes e frequência com que se informam, avaliação e demandas por políticas públicas etc. Majoritariamente, pesquisas com amostras representativas nacionais uti- lizam como critérios definidores (estratos) os percentuais de distribuição dos indivíduos por sexo, faixa etária e área de residência — região geográfica, área rural ou urbana e ainda capital, região metropolitana ou município do interior. Nesse sentido, os resultados de pesquisas que combinam amostragem estra- tificada com amostragem aleatória simples permitem aos pesquisadores produzir inferências complexas, como: ■ Como homens e mulheres percebem a importância do cuidado com a saúde, uma vez que há resultados de pesquisas que apontam que as mulhe- res são mais cuidadosas e atenciosas com sua saúde do que os homens. ■ Em que medida jovens de diferentes etnias e faixas de renda se relacio- nam com a educação formal e com o mercado de trabalho nas diferentes regiões, tentando entender se a relação entre necessidade de geração de renda combinada com evasão escolar atinge negros e brancos e de dife- rentes classes sociais da mesma maneira em todo o país. ■ Quais os efeitos da disseminação de notícias sobre o combate à corrupção entre segmentos da população que dispõem de distintos níveis cognitivos (capacidade de interpretar informações) e de acesso aos meios de comu- nicação, com vistas a investigar se tal percepção tem estimulado a maior confiança nas instituições políticas por conta das investigações ou tor- nado os cidadãos mais descrentes com relação à ética na política. População, Censo e Amostragem Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 38 AMOSTRAGEM POR CONGLOMERADOS A amostragem por conglomerados é utilizada especialmente em situações em que há informações que revelem a existência de grupos homogêneos entre si, mas heterogêneos em sua composição interna. Nesses casos, mais relevante do que investigar o conjunto dos grupos seria selecionar alguns desses grupos para analisá-lo internamente (TEIXEIRA; ZAMBERLAN; RASIA, 2008). Assim, a amostragem por conglomerados é uma técnica muito utilizada por ser econômica e prática, já que a definição de grupos ou conglomerados especí- ficos a ser investigados torna mais ágil o processo de coleta de dados. Definido um conglomerado, o passo seguinte é determinar se a pesquisa será realizada em um ou dois estágios: caso haja um único estágio, todas as unidades do conglomerado devem ser investigadas; caso haja dois estágios, no interior do conglomerado, deve ser realizada nova amostragem, cuja técnica para determi- nação variará de acordo com os interesses do pesquisador/gestor público. No caso de amostragem por conglomerado em dois estágios, a seleção toma o con- junto dos casos alocados no grupo como universo para redefinição amostral. É importante perceber que são múltiplas as possibilidades de análises e de investigações, mas, mais do que ilustrar formas e combinações de técnicas amostrais, é preciso que os gestores públicos tenham em mente que qualquer fenômeno, problema, situação ou questão pode ser investigado. A definição da investigação passa por dois critérios: a seleção de técnicas para coletas de dados — se quantitativas ou qualitativas — e a determinação do tamanho da amostra. As técnicas, conforme anteriormente mencionado, serão abordadas nas próximas unidades de estudos, enquanto o tamanho da amostra varia de acordo com o tipo de amostragem e a técnica a ser utilizada. Por exemplo, a amostragem tipo bola-de-neve combinada com a técnica de entrevistas semi-estruturadas ou não-estruturadas podem ser utilizadas até a exaustão das informações, ou seja, até que os resultados da coleta de dados não mais apresentem novos elementos para a análise e tenham em seu conteúdo ape- nas repetições ou reformulações das mesmas informações. À exceção de especificidades que serão destacadas quando pertinentes, a exaustão é utilizada para pesquisas qualitativas e a definição de tamanhos de A PESQUISA Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IU N I D A D E39 amostras para pesquisas quantitativas, com destaque àquelas cujas amostras são probabilísticas. Uma questão que recorrentemente se coloca aos pesquisadores diz respeito ao número de casos necessários à composição amostral, ou seja, o tamanho da pesquisa. Teixeira, Zamberlan e Rasia (2008, p. 99) destacam alguns fatores que devem ser considerados pelos gestores públicos quanto a determinação do tama- nho da amostra: ■ A importância da decisão (quanto mais importante, menor deve ser a margem de erro). ■ A natureza da pesquisa. ■ Os tamanhos das amostras usadas em estudos semelhantes (o ideal é você procurar identificar outras pesquisas feitas no mesmo setor para verificar quantos, em média, foram pesquisados). ■ Taxas de preenchimento (muitas vezes, há pesquisas em que o grau de recusa é muito elevado). ■ Restrições de recursos (se há poucos recursos, a tendência é a amostra ser menor e a margem de erro maior). De acordo com Barbetta (2011), o tamanho da amostra varia também em con- formidade com o quanto o pesquisador admite que pode se equivocar em sua investigação, ou seja, o erro amostral tolerável. A menos que uma pesquisa seja censitária, sempre haverá possibilidade de existência de erro, uma vez que a infe- rência sobre resultados decorrentes de análises amostrais para um universo, não necessariamente (ou, para ser mais exato, provavelmente nunca), refletirá a tota- lidade do resultado que seria encontrado pelo censo. Com relação à intensidade do erro amostral tolerável, não há um parâmetro único estabelecido, uma vez que as especificidades com relação aos problemas e objetos de pesquisas demandam distintos níveis de exatidão, por conta dos efei- tos que podem provocar. Por exemplo, pesquisas relacionadas à produção de vacinas devem conside- rar possibilidades ínfimas de erros, pois o controle de doenças epidêmicas é uma das principais preocupações em saúde pública. Exames clínicos, por sua vez, não População, Censo e Amostragem Repr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 40 devem, em hipótese alguma, ser analisados de maneira amostral (independen- temente de tamanho de erro), pois se tratam de diagnósticos sobre a condição de saúde dos indivíduos. Em situação completamente distinta, mas com necessidade de erro amos- tral mínimo possível, temos também as obras públicas, cujas consequências de falhas estruturais podem culminar em desabamentos e prejuízos não apenas às finanças públicas, mas também resultar em perda de vidas. Por outro lado, a avaliação sobre o desempenho do serviço público ou de seus gestores não necessariamente carece de extremo rigor com relação ao erro amostral, uma vez que para sabermos qual a percepção da população com relação a determinado aspecto no âmbito do Estado podemos admitir que estimativas entre parcelas da população representem, em grande medida, a opinião geral. O exemplo mais recorrente sobre o tema nos remete às pesquisas de inten- ção de voto para eleições. É comum, ao apresentar os resultados de pesquisas que buscam estimar em quem os eleitores votariam nas próximas eleições, que o texto ou a fala do interlocutor contenham informações de que o percentual indicado pode variar “para mais ou para menos”. Essa indicação de variação, nas pesquisas de intenção de votos, costuma oscilar entre 2 a 3% correspon- dente ao erro amostral. Diante do exposto, o cálculo do tamanho da amostra depende, invariavel- mente, do estabelecimento do erro amostral tolerável. Neste livro, nos deteremos a informar como proceder o cálculo básico de tamanho de amostra tendo em vista um erro amostral determinado. É, contudo, imprescindível que o estabe- lecimento do tamanho e da técnica de amostragem sejam conduzidos por um profissional com conhecimento e competência específica para tanto, no caso, um conhecimento estatístico. Quando não se conhece o tamanho de uma população ou quando ela é con- siderada pequena, o cálculo amostral pode ser realizado tendo em vista apenas o erro amostral tolerável, conforme expresso na fórmula a seguir (BARBETTA, 2011, p. 58): A PESQUISA Reprodução proibida. A rt. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. IU N I D A D E41 No qual: = aproximação para o tamanho da amostra; e = erro amostral tolerável (em valor absoluto) Tal fórmula permite o estabelecimento do número de casos a ser analisados com a margem de erro defi nida. A realização de cálculos com essa fórmula permite constatar que o tamanho da amostra e da população não oscilam de maneira direta, mas são infl uenciados pelo quanto o pesquisador admite errar. Por exemplo, a aplicação da fórmula com margem de erro de 4% (inserido com a notação 0,04 para o cálculo) indicaria ao gestor público a necessidade de coletar dados de 625 casos, ao passo que a expansão do erro a 5% (0,05) reduzi- ria o tamanho da amostra para 400 observações. Quanto menor o erro amostral tolerável, maior o tamanho da amostra. Assim, cabe ao gestor avaliar o quanto admite errar, de acordo com as espe- cifi cidades do objetivo, objeto e o nível de detalhamento que espera atingir com a pesquisa. Teixeira, Zamberlan e Rasia (2008) destacam que universos compostos por mais de 100.000 casos têm amostras calculadas por outra fórmula, a qual con- sidera populações que tendem ao infi nito, ou seja, são elevadas e passíveis de expansão. Em tais casos, o cálculo para defi nição do tamanho da amostra é dis- tinto, conforme destacado por Barbetta (2011, p. 58): No qual: = tamanho da amostra; = aproximação para o tamanho da amostra; e = tamanho da população. Nessas situações, o cálculo decorre, então, de dois passos: o primeiro é a defi nição da aproximação da amostra com observação do erro amostral tolerá- vel, enquanto o segundo passo é a confrontação da amostra aproximada com a população total para defi nição real do número de casos a ser investigado. Considerações Finais Re pr od uç ão p ro ib id a. A rt . 1 84 d o Có di go P en al e L ei 9 .6 10 d e 19 d e fe ve re iro d e 19 98 . 42 CONSIDERAÇÕES FINAIS As temáticas abordadas, nesta primeira unidade, buscaram possibilitar a vocês compreenderem as justificativas, a relevância e as perspectivas a serem conside- radas na realização de pesquisas no âmbito da gestão pública. A proposta inicial de nossa discussão foi a apresentação dos itens que con- cernem à pesquisa. Tão importante quanto vislumbrarmos as áreas em que os gestores públicos podem se valer de investigações, é termos clareza sobre o que é uma pesquisa e como construí-la. Para tanto, nesta unidade, discorremos sobre os primeiros passos dessa trajetória. Partimos da tentativa de entender as distintas formas de conhecimento e a relevância do conhecimento científico ao debate na gestão pública e no processo de formação de gestores públicos. A partir dessa definição, avançamos no sen- tido de compreender com maior detalhamento os diferentes métodos possíveis à realização de pesquisas, a necessidade de que o gestor público tenha clareza com relação à delimitação do problema que busca sanar com a investigação e os diferentes níveis de realização de uma pesquisa, os quais dependem de quanto conhecimento anterior está disponível aos pesquisadores/gestores públicos que se encontram diante de uma questão a resolver. Ademais, os conceitos de população (ou universo), de censo e amostra — bem como suas características — e, com relação ao segundo conjunto de perspectivas, as diversas possibilidades de técnicas amostrais probabilísticas e não-probabi- lísticas, foram expostos com o intuito de contribuir para que os futuros gestores públicos sejam capazes de vislumbrar opções para compor as amostras, o que se complementa com as informações em torno de como estabelecer seu tamanho. Finalizamos a unidade tendo, então, o embasamento inicial necessário à rea- lização de pesquisas no campo da gestão pública, de modo que esse conjunto de temas abordados nos fornece subsídio para seguirmos o caminho, conhecendo métodos e técnicas para coleta e análise de dados e informações. 43 1. A realização de pesquisas pode ser impactada por distintos aspectos. Conside- rando de maneira específica o âmbito da gestão pública, abordado neste livro didático, analise as afirmações a seguir, coloque V para afirmativas verdadeiras e F para afirmativas falsas : I. São determinados e imutáveis os campos em que as pesquisas podem ser realizadas no âmbito da gestão pública. II. Universo, população, censo, amostra e casos dizem respeito a um conjunto de itens a ser considerados. III. Os objetivos que tornam necessárias as investigações no âmbito da gestão pública são sempre coletivos. Tendo em vista sua análise acerca das afirmações anteriores, as afirmativas I, II e III são, respectivamente: a) V, V e F. b) V, F e F. c) F, V e F. d) V, F e V. e) F, F e V. 2. Aos gestores públicos é facultada a possibilidade de realização de pesquisas e investigações sobre muitos temas, com diferentes objetivos, objetos e técnicas amostrais, de coleta, de análise e de apresentação de resultados por meio de relatórios. No que tange especificamente às políticas públicas, é possível o de- senvolvimento de pesquisas? Justifique. 3. A realização de uma pesquisa pode partir de distintas premissas, em se tratan- do de métodos para sua estruturação, uma vez que o método de pesquisa é anterior à composição da amostra e coleta de dados, dentre outras atividades. Nesse sentido, o método de pesquisa que se utiliza do silogismo é: a) Dedutivo. b) Indutivo. c) Hipotético-dedutivo. d) Fenomenológico.
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