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Artigo-Química Verde-Revista Ciência Hoje

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2 0 • C I Ê N C I A H O J E • vo l . 3 1 • n º 1 8 5
Q U Í M I C A
20 • C I Ê N C I A H O J E • v o l . 3 1 • n º 1 85
A química tem hoje
uma grande presença
em nossas vidas,
pois é responsável
por inúmeros produtos
importantes
para a humanidade,
desde diversos
medicamentos
até combustíveis
que movimentam carros
e aviões. No entanto,
as atividades ligadas
à química muitas vezes
trazem graves prejuízos
à natureza e ao próprio
homem. Nos últimos anos,
porém, uma nova filosofia
para a química vem
tomando grande força:
a chamada ‘química verde’
ou ‘química sustentável’,
que tem como alguns
de seus princípios evitar
ao máximo a geração
de rejeitos e utilizar
processos mais seguros
para o meio ambiente.
Antonio M. Sanseverino
Escola de Ciências Biológicas,
Universidade do Rio de Janeiro
(UniRio)
Q U Í M I C A
a g o s t o d e 2 0 0 2 • C I Ê N C I A H O J E • 2 1
Q U Í M I C A
A química está muito presente em nossas vidas: nas roupas, nos ali-
mentos, em medicamentos, nos combustíveis de
carros e aviões, em inúmeros materiais sintéticos
e em diversos outros produtos. Em 2000, as ven-
das da indústria química, em todo o mundo, alcan-
çaram mais de US$ 1,59 trilhão. O Japão, os países
da Europa ocidental e os Estados Unidos respon-
deram por 2/3 desse total. No Brasil, no mesmo
ano, a indústria química obteve um faturamento de
US$ 42,6 bilhões.
O impacto da química sobre o meio ambiente é
enorme, em função dos rejeitos dos processos indus-
triais, que muitas vezes trazem sérios e irreversíveis
prejuízos ao homem e à natureza. A questão
ambiental, que abrange os problemas gerados pelo
setor químico, vem sendo intensamente debatida
no mundo e no Brasil nos últimos 20 anos. São fatos
marcantes desse período a conscientização da so-
ciedade quanto às agressões à natureza e sua parti-
cipação em iniciativas que visam reduzir o processo,
como a reciclagem (de papel, vidro, alumínio etc.),
além de programas como ‘Produção Limpa’ (da Or-
ganização das Nações Unidas) e ‘Atuação Responsá-
vel’ (da Associação Brasileira da Indústria Quími-
ca), e a atitude de muitos setores produtivos no
sentido de reduzir a liberação no ambiente de subs-
tâncias poluentes.
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Q U Í M I C A
ILU
S
TR
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Ç
Õ
ES
 M
Á
R
IO
 B
A
G
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Q U Í M I C A
Um dos resultados relevantes dessa nova atitude
é a diminuição nas emissões de certos produtos
químicos (figura 1). A indústria química ainda é
uma das principais fontes de materiais poluentes do
planeta, mas cientistas dessa área, em todo o mun-
do, vêm procurando modificar essa situação. Recen-
temente, a palavra ‘verde’ passou a ter um novo
significado para a química.
O QUE É A ‘QUÍMICA VERDE’?
Atualmente, a indústria química tem procurado
adotar uma postura de redução, prevenção ou elimi-
nação dos resíduos de processo. A reutilização des-
ses resíduos e a substituição de um produto tóxico
por outro que tenha a mesma finalidade, mas não
cause qualquer impacto ambiental, também fazem
parte dessa filosofia ‘verde’.
Tradicionalmente, ao final de um processo quí-
mico o rejeito era encaminhado a uma unidade de
tratamento, encarregada de adaptar as substâncias
nele contidas aos parâmetros estabelecidos pelas
leis de proteção à saúde e ao meio ambiente. Agora,
a ‘química verde’ (ou ‘química limpa’) procura resol-
ver esse problema através da adoção de alternativas
que reduzam a própria geração de rejeitos, mas sem
desconsiderar a importância do tratamento dos
efluentes e da destinação adequada para os resíduos
químicos ainda perigosos (incineração, depósito em
aterro sanitário etc.).
Figura 2. Quantidade
de rejeitos gerados por quilo
de produto final, em diferentes
setores da indústria química
(a coluna central mostra a variação
de produção em diferentes
empresas de cada setor)
Setor Toneladas kg de rejeito/
industrial de produto kg de produto
Refino do petróleo De 1 a 100 milhões Cerca de 0,1
Indústria química de base De 10 mil a 1 milhão De menos de 1 a 5
Química fina De 100 a 10 mil De 5 a 50
Farmacêutica De 10 a milhares De 25 a mais de 100
em materiais úteis para a sociedade. Um exemplo
simples é o aproveitamento do lixo e do esgoto para
produzir gás natural (o chamado biogás), como acon-
tece em países como China e Índia, onde esse gás é
empregado como fonte de energia para cozinhar,
iluminar e aquecer residências.
Para se ter uma idéia do potencial de produção de
biogás e de reciclagem em um país como o nosso,
basta lembrar que são geradas a cada dia, no Brasil,
125 mil toneladas de rejeitos orgânicos e materiais
recicláveis. Do volume total do lixo coletado no país,
apenas 32% são despejados de forma adequada em
aterros sanitários nos municípios, segundo dados do
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.
Na indústria farmacêutica e agroquímica, a pre-
paração de complexas moléculas biologicamente
ativas envolve, geralmente, diversas etapas, com um
rendimento muito baixo. Em alguns casos o volume
do produto final equivale a apenas 10% do volume
das matérias-primas iniciais da reação, o que impli-
ca a geração de grande quantidade de re-
jeitos. Estudos sobre o volume de rejeitos gerados
para cada quilo de produto final obtido no proces-
so – como os realizados pelo químico Roger A. Shel-
don, da Universidade de Tecnologia de Delft (Ho-
landa), em 1994 – mostram que essa relação varia
muito em cada setor da indústria química (figura 2).
O uso de matérias-primas renováveis também faz
parte dessa postura. O lixo orgânico, resíduos de
agricultura e produtos agrícolas como açúcar, soja e
milho estão sendo estudados para a produção de
Figura 1. Emissões
(em mil toneladas)
de produtos químicos tóxicos
nos Estados Unidos,
evidenciando a drástica
redução em alguns deles
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Substância 1988 1999 Usos (A) e desvantagens (B)
1,1,1-tricloroetano 84,87 0,22 (A) Limpeza de metais
 e produtos têxteis a frio
(B) Ataca a camada de ozônio
Freon 113 32,84 0,34 (A) Gás refrigerante, limpeza a
 seco, propelente em aerossóis
(B) Ataca a camada de ozônio
Benzeno 9,47 16,24 (A) Matéria-prima para a indústria
 química, solvente industrial
(B) Muito tóxico ao homem
Na realidade, o que hoje é tra-
tado como poluição (os resíduos
dos diferentes processos quími-
cos) pode ser visto como um ma-
terial potencialmente valioso,
que não deveria ser jogado fora.
O grande desafio é encontrar for-
mas econômicas de transformar
as atuais substâncias poluentes
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insumos básicos para a indús-
tria química, como nylon, ma-
teriais têxteis e outros. O petró-
leo é a principal fonte de maté-
ria-prima para produtos orgâ-
nicos, mas não é um recurso
renovável. O uso de fontes al-
ternativas teria um impacto
bem menor para o meio ambi-
mo esterilizante e fumigante) pode exemplificar a
economia atômica. O processo atual para essa sín-
tese consiste na reação do hidrocarboneto etileno
(C2H4) com oxigênio (O2), catalisada pela prata, com
incorporação direta do átomo de oxigênio (figura 3).
No processo antigo, eram usados outros átomos, além
do oxigênio, para obter o produto, gerando rejeitos
como o ácido clorídrico (HCl) e o cloreto de cálcio
(CaCl2).
O volume da produção mundial de óxido de
etileno, que atingiu 11 milhões de toneladas em
1995, mostra que, antes do desenvolvimento do no-
vo processo, a quantidade de resíduos era muito
grande. Atualmente, não existem mais fábricas
Figura 3. A síntese do óxido
de etileno pelo processo
catalítico, usando a prata (Ag),
tem custo menor e gera
um volume mínimo de rejeitos
ente, e os materiais poderiam ainda ser menos tóxicos
do que muitos derivados do petróleo.
A economia de energia é outro item dessa mu-
dança de atitude. A tendência atual procura ‘de-
senhar’ os processos paraque ocorram em condi-
ções mais suaves do que as observadas hoje em
muitas reações, realizadas sob elevadas temperatu-
ras e pressões, ou exigem resfriamento. No Brasil,
a indústria química é a segunda maior consumido-
ra de eletricidade, dentro do setor industrial, con-
sumindo cerca de 14,5 milhões de megawatts/hora
(MW/h). Para conseguir uma redução no consumo,
estão sendo intensamente pesquisadas, em todo o
mundo, novas formas de transferir energia
a uma reação química, como o aquecimento por
microondas.
A ECONOMIA DE ÁTOMOS
Uma síntese química eficiente deve, em linhas ge-
rais, obter um produto de alta pureza e com alto
rendimento, ser catalítica, ter poucas etapas e ga-
rantir segurança para o meio ambiente e para os
trabalhadores.
Em 1991, em artigo pioneiro para a revista Natu-
re, o químico Barry M. Trost, da Universidade de
Stanford (Estados Unidos), inventou o conceito de
‘economia de átomos’. Quando se analisa a efi-
ciência de uma reação química, uma característica
importante é em geral negligenciada: quanto dos
reagentes utilizados termina incorporado aos pro-
dutos finais? Trost definiu essa questão como eco-
nomia atômica. Assim, a reação ideal seria aquela
onde toda a massa atômica dos reagentes é incor-
porada ao produto desejado. As vantagens dessa
reação seriam a menor geração de resíduos e uma
utilização mais efetiva de matérias-primas limitadas
e às vezes de custo elevado.
A síntese industrial do óxido de etileno (usado
na fabricação de outros produtos químicos ou co-
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usando o processo indireto, no qual o cloro era to-
talmente perdido. A rota catalítica atual levou a uma
redução de custo e a um menor impacto ambiental.
No entanto, vários produtos ainda são obtidos, na
indústria química, através de processos indiretos,
formando muitos rejeitos. O desafio é criar reações
catalíticas com máxima economia atômica para subs-
tituir tais processos.
Um exemplo desse aperfeiçoamento é a síntese
do analgésico ibuprofeno (figura 4) através do pro-
cesso desenvolvido pelo consórcio empresarial
Hoechst-Celanese, que envolve apenas três etapas,
sendo duas catalíticas e sem solvente, e mostra alta
economia atômica. Esse processo representa consi-
derável avanço em relação à rota clássica de produ-
ção do composto, que tinha seis etapas, uma pobre
utilização atômica e uma grande geração de subpro-
dutos orgânicos e sais. A venda anual desse medi-
camento chega a cerca de US$ 1,400 bilhão, com
uma produção de 8 mil toneladas – metade desse
volume já é obtido pela nova rota química.
CATALISADORES ALTERNATIVOS
Os catalisadores são substâncias que aumentam a
velocidade de uma reação sem sofrer qualquer
alteração química – as enzimas, por exemplo. As
enzimas são essenciais a todos os organismos
vivos, acelerando reações químicas que sem elas
Figura 5. Limites de exposição a solventes (em partes
por milhão) do National Institute for Occupational
Safety and Health (NIOSH) e da Occupational Safety
and Health Administration (OSHA), ambos dos Estados
Unidos, e da Norma Regulamentadora nº 15, do
Ministério do Trabalho do Brasil (NR15)
Solvente NIOSH OSHA NR15
Benzeno 0,1a 1a 1b
Ciclo-hexano 300c 300a 235b
Clorofórmio 2d 50e 20b
a. jornada de trabalho diária de oito horas; b. jornada
semanal de 48 horas; c. jornada diária de 10 h; d. 60 minutos;
e. valor limite, que nunca deve ser superado
Figura 4. O ibuprofeno, substância
analgésica e antiinflamatória, também
já está sendo produzido por um processo
com menos rejeitos
só ocorreriam em temperaturas elevadas, o
que destruiria a matéria viva.
A indústria química emprega catalisa-
dores em uma enormidade de processos. O
ácido sulfúrico, o ácido fluorídrico e outros
ácidos são catalisadores tradicionais, mas
também são tóxicos e corrosivos. A utilização desses
ácidos para a catálise exige sua neutralização
em etapas posteriores do processo, gerando sais
inorgânicos. Tais sais, bastante tóxicos, represen-
tam um dos mais importantes problemas para o
tratamento e descarte de resíduos industriais. Co-
mo muitos desses sais são solúveis, precisam ser
extraídos da água utilizada no processo industrial
para que esta possa ser descartada sem risco de
envenenamento dos corpos d’água naturais.
As alternativas a esses ácidos tradicionais são os
chamados ácidos sólidos, como zeólitas, resinas de
troca iônica e argilas. Zeólitas são aluminossilica-
tos com uma estrutura tridimensional cristalina
que apresenta poros de dimensões moleculares, po-
dendo ter metais ou outros elementos em sua com-
posição. Existem zeólitas com diferentes tamanhos
de poro e geometria, que permitem uma absorção
seletiva de reagentes em processos catalíticos. Já
as resinas de troca iônica são polímeros orgânicos
com grupos ácidos em sua estrutura, enquanto as
argilas minerais são hidratos de silício com alu-
mínio, magnésio ou ferro, e que apresentam estru-
tura em camadas.
Os ácidos sólidos são facilmente separados da
mistura reacional, por serem insolúveis, o que dimi-
nui custos. Além disso, são prontamente reapro-
veitáveis, mais duráveis, geram muito menos re-
jeitos e são consideravelmente menos corrosivos
– portanto, mais seguros para o trabalhador. Os
ácidos sólidos estão gradualmente substituindo os
ácidos tradicionais em vários processos catalíticos.
Também têm sido feitas pesquisas sobre outros
processos catalíticos benignos para o ambiente, em
especial os que visam substituir agentes oxidantes
como cromo e manganês, que geram efluentes metá-
licos de alta toxicidade.
A BUSCA POR NOVOS SOLVENTES
Os solventes têm um papel importantíssimo na
indústria química. Cerca de 50 ou mais solventes
estão disponíveis, em grande escala, no mercado, e
apresentam uma enorme variedade de aplicações.
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São usados em processos de extração (em que uma
substância é retirada de uma mistura) e na limpeza
de materiais eletrônicos, constituem matéria-prima
para a fabricação de produtos químicos, servem
como propelentes em aerossóis e têm grande impor-
tância nas indústrias de tintas e cosméticos, entre
outras utilidades.
Nas reações químicas, o emprego de solventes
também é muito importante, para, entre outros efei-
tos, permitir ou facilitar o contato entre os reagentes,
ou destes com o catalisador, e evitar rea-
ções indesejáveis.
A recuperação e o descarte de solventes são as-
pectos fundamentais dentro da química verde, por-
que apresentam importantes efeitos econômicos e
ambientais. A não recuperação de solventes ge-
ralmente acarreta o aumento do custo do tratamen-
to de efluentes e o desperdício de um material que
poderia ser reaproveitado. Outras questões relevan-
tes são a toxicidade e a inflamabilidade dos sol-
ventes e os limites permitidos para a exposição de
um trabalhador a cada um deles. Essas questões
estão sujeitas a grande pressão dos órgãos regula-
dores das atividades químicas e da própria socie-
dade. A estocagem e o transporte de solventes são
problemas adicionais, pelos riscos que oferecem.
Os limites de tolerância para exposição dos traba-
lhadores a solventes variam de uma substância para
outra e são definidos por órgãos ou institutos gover-
namentais (figura 5). As pesquisas sobre solventes
menos perigosos para o ambiente e para o homem
vêm movimentando um número surpreendente de
pesquisadores e recursos.
A ÁGUA NAS REAÇÕES ORGÂNICAS
A água é um solvente barato, normalmente disponí-
vel, não inflamável, não tóxico e não poluidor do
meio ambiente. No entanto, é pouco usada como
solvente em reações orgânicas, apesar da variedade
Figura 6. Na produção
do butanal, é usado um catalisador
de ródio (Rh) solúvel na água
(graças aos ‘ligantes’)
e insolúvel no meio orgânico,
o que facilita a separação
do produto final (orgânico)
diferentes intermediários, reagentes e catalisadores
com a água, e ainda pela competição entre o proces-
so desejado e a reação com a água (a hidróli-
se, ou seja, a ‘quebra’das moléculas dos reagen-
tes mediada pela água).
Atualmente, usar a água como solvente em rea-
ções orgânicas é uma tendência industrial e acadê-
mica. Um exemplo comercial importante dessa
utilização é o processo bifásico criado pelas empre-
sas Rurchemie AG e Rhône-Poulenc – em operação
desde 1984 – para a obtenção do aldeído butanal,
matéria-prima para produtos químicos importan-
tes (álcoois, ácido butírico, ésteres). O butanal é
obtido pela reação do propileno com monóxido de
carbono e hidrogênio, usando-se um catalisador de
ródio (figura 6).
e da eficiência das reações em
meio aquoso existentes na natu-
reza. Essa pequena utilização de-
ve-se, em parte, à baixa solubi-
lidade de inúmeros compostos or-
gânicos e à incompatibilidade de
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O processo é dito bifásico porque o catalisador,
solúvel em água mas insolúvel em meio orgânico,
pode ser separado com facilidade do produto orgâ-
nico por decantação (figura 7). Além disso, esse
catalisador não é tóxico: sua toxicidade (DL50) é de
5 g/kg de peso corporal – isso significa que essa se-
ria a dose letal (DL) para 50% dos indivíduos que
ingerissem o composto (para um indivíduo com
70 kg, tal dose seria de 350 g). A comparação com o
processo tradicional mostra que a nova rota gera
70 vezes menos efluentes aquosos e apresenta
uma razão de quilo de rejeitos por quilo de produto
15 vezes menor, resultados que assumem maior
dimensão diante da produção anual do butanal,
que alcança 330 mil toneladas.
O processo convencional exige alta pressão e usa
um catalisador de cobalto tóxico, inflamável e so-
lúvel em meio orgânico (processo monofásico), o
que leva a maior número de operações, maior custo
de energia e maiores perdas do catalisador pela
dificuldade de separá-lo do produto orgânico. Ou-
tros processos já patenteados utilizam a catálise
bifásica comercialmente, e as pesquisas sobre essa
nova rota ainda prosseguem.
O USO DE SOLVENTES SUPERCRÍTICOS
O chamado ‘estado supercrítico’ é atingido quando
a temperatura e a pressão de uma substância ultra-
passam valores que, combinados, formam o chama-
Figura 7. Na catálise bifásica em água, a reação
acontece durante a agitação, e o produto
final pode ser obtido por decantação, que separa
a fase orgânica da aquosa
*Durante a agitação, dependendo da solubilidade dos reagentes e do catalisador, a mistura pode apresentar apenas uma fase
a g o s t o d e 2 0 0 2 • C I Ê N C I A H O J E • 2 7
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78,2
1
5,1
73
-56,6 31,1
Gás
LíquidoSólido
Temperatura (°C)
P
re
ss
ão
 (
at
m
)
Fluido
supercrítico
Ponto
crítico
Figura 8. O diagrama de fase para
o dióxido de carbono (CO
2
) mostra que,
se a temperatura superar 31,1°C e a pressão
ultrapassar 73 atmosferas (atm),
o composto atinge o estado supercrítico
Sugestões
para leitura
SANSEVERINO, A. M.
‘Síntese Orgânica
Limpa’, in Química
Nova (Revista da
Sociedade
Brasileira de
Química), v. 23(1),
p. 102, 2000.
TROST, B. M. ‘The
atom economy
— A search
for synthetic
efficient’,
in Science,
v. 254(5037),
p. 1471, 1991.
SHELDON, R. A.
‘Consider the
environmental
quotient’,
in Chemtech,
v. 24(3), p. 38,
1994.
do ‘ponto crítico’ para ela. Nesse esta-
do da matéria, torna-se impossível
distinguir a fase líquida da fase gaso-
sa: a substância não condensa, nem
evapora, mas existe como um fluido,
apresentando propriedades interme-
diárias entre gases e líquidos que po-
dem ser controladas pela variação da
pressão e da temperatura.
Para cada elemento, ou compos-
to, é possível, variando a pressão e a
temperatura, definir um diagrama de
fase, que mostra em que estado este
se encontra em diferentes combina-
ções dessas variáveis (figura 8). Uma
grande vantagem da utilização de flui-
dos supercríticos na indústria quími-
ca está nos benefícios ambientais que muitos deles
podem trazer. Dois exemplos são o dióxido de carbo-
no (Tc = 31,1°C e pc = 73 atm) e a água (Tc = 374°C
e pc = 220 atm), plenamente disponíveis como
solventes e em geral inertes, além de baratos.
O primeiro e mais famoso exemplo de uso de flui-
do supercrítico na indústria é a descafeinização de
grãos de café por dióxido de carbono supercrítico.
A utilização de CO2 supercrítico em processos de
extração tem sido cada vez mais adotada nas in-
dústrias de alimentos e perfumes, que precisam
evitar qualquer resíduo tóxico no produto final, ou
na substituição de solventes que danificam a ca-
mada de ozônio, como muitos compostos clorados
de uso tradicional.
As pesquisas sobre reações químicas na região
supercrítica são intensas, e já existem alguns pro-
cessos comerciais. A facilidade de recuperação do
produto final da reação e de separação dos catalisa-
dores do fluido supercrítico são vantagens adicio-
nais (quando a água retorna a condições normais de
temperatura e pressão, a separação é feita por decan-
tação; já o CO2 evapora ao voltar à pressão e à tem-
peratura normais). A água no estado supercrítico é
muito estudada para a destruição de rejeitos orgâ-
nicos tóxicos. No processo, os rejeitos são transfor-
mados em substâncias bem menos danosas para o
ambiente (como H2O, CO2, sais inorgânicos e mo-
léculas pequenas). Essa tecnologia vem sendo co-
mercializada lentamente.
REAÇÕES SEM SOLVENTE
Uma recente proposta, dentro dessa estratégia ‘ver-
de’, é a ausência de solvente nas reações orgânicas.
Os estudos nesse sentido têm comprovado que,
muitas vezes, o rendimento obtido é maior e são
gerados menos rejeitos do que quando a mesma
reação é realizada com solventes, em geral tóxicos
ou inflamáveis. O solvente é substituído por dife-
rentes combinações de temperatura e pressão, que
muitas vezes podem facilitar o contato dos reagen-
tes. Essa é uma estratégia muito recente e ainda
pouco estudada.
Um exemplo importante de reação sem solvente
é o processo mais ameno para o ambiente desenvol-
vido pela Hoechst para obter o polipropileno, im-
portante polímero usado na fabricação de fibras
(como as de carpetes) e de artefatos plásticos va-
riados. No método clássico, em que a produção do
polipropileno é feita com o uso de um solvente
volátil (um hidrocarboneto leve, obtido do petró-
leo), a separação e a secagem do polímero torna-
vam difícil recuperar todo o solvente, ocorrendo
perdas para o ambiente. Já o novo processo usa um
catalisador diferente e exige pressão menor, redu-
zindo as perdas.
NOVA FILOSOFIA DA QUÍMICA
A filosofia de química verde está baseada no me-
lhor aproveitamento dos recursos naturais, pro-
porcionando menor poluição ambiental e menos
riscos para os trabalhadores e a sociedade. Essa
nova estratégia de ação vem sendo adotada, ca-
da vez mais, pelas indústrias químicas de todo o
mundo, contribuindo significativamente para a su-
peração de um dos grandes desafios da humani-
dade, nesse início de milênio: alcançar um equilí-
brio entre desenvolvimento e preservação do meio
ambiente.

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