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Neoliberalismo e globalização da economia- a crise do Estado de Bem Estar social nas economias centrais Docente: Denis Barreto Ao se referenciar em Mandel (1982) Behring e Boschette (2011), apontam a contradição daquilo que ficou conhecido como a fase “madura” ou “tardia” do capitalismo. Tal contradição remete por um lado ao pleno desenvolvimento das possibilidades do capital, ao passo que de forma concomitante observa-se o esgotamento do seu papel civilizatório. Tendo como base a crítica marxiana da economia política aponta para uma configuração tendencial de não equilibrio do capitalismo (crises cíclicas) Processo de acumulação que se configurou a partir da economia da guerra e da ascensão dos facismo Em decorrência da crise de 1929-1932, observou-se a necessidade de um contraponto civilizado ao Estado socialista em meio ao contexto de guerra fria (Plano Marshall) As estratégias anticíclicas Keynesiana apresentaram as seguintes possibilidades: Maior integração dos trabalhadores no circuito de consumo (fordismo) Captulação de segmentos do movimento operário. Conquistas no campo da seguridade (acumulação&equidade) Navarro (in Laurell, 1997) detalha os acontecimentos no mundo da produção, no bojo das reformas de Estado que resultaram nos WS/EBES. Nos anos 60, o movimento operário europeu teria se vinculado aos processos de racionalização técnica, experiências sóciologicas (pertencentes as escolas de relações humanas), interresses psicológicos e sócio- psicológicos. Já no final dessa década e início dos anos 70 do século XX, os sindicatos interessaram-se crescentemente pela análise das relações de poder no local de trabalho, uma vez que foram favorecidos por um contexto de escassez de mão-de-obra. Navarro lembra que, em decorrência desses movimentos, a legislação fabril sofreu um processo de reformas restritivas do poder dos empresários, exemplificando: Grã-Bretanha (1974 a 76): lei limitou as demissões e permitiu aos trabalhadores limitar o direito dos empresários em áreas como a saúde, a previdência e o controle do ambiente de trabalho. França (1973 a 77): regulamentações ampliaram o direito dos trabalhadores quanto ao acesso à informação, assistência médica, proteção e previdência, que fortaleciam o poder dos sindicatos. Alemanha (1969 a 76): legislação ampliando os direitos dos trabalhadores no local de trabalho e outorgando aos conselhos de trabalhadores o direito de participar da tomada de decisões (quanto à produção). Itália (1969 a 79): idem, com fortalecimento dos sindicatos operários, permitindo-lhes impor condições e influenciar nas decisões empresariais a respeito de novos investimentos e na introdução de novas tecnologias. EUA (1970 a 73): legislação consolidando direitos operários em questões de saúde e segurança no trabalho, reduzindo os direitos empresariais. Holanda (1977): legislação passou a permitir aos conselhos operários adiar por um mês decisões economicamente importantes nas empresas. Suécia (1976): legislação passou a obrigar os empresários a negociar com os trabalhadores cada decisão empresarial de peso. Todos os países da Europa ocidental, com exceção da Suíça, aprovaram legislação relativa a direitos dos trabalhadores e dos sindicatos no local de trabalho, e criaram marcos legais que regulamentaram as reivindicações dos sindicatos diante das prerrogativas da empresa, e inclusive, em alguns países, sua participação na tomada de decisões com respeito a futuros investimentos. O partido governamental da Suécia pediu a coletivização dos meios de produção através da compra de ações em poder do capital (plano Meidner). Os partidos socialistas da oposição incluíram reivindicações de autogestão, participação dos trabalhadores e novas políticas industriais. Na França, a partir da oposição, os partidos socialista e comunista solicitaram o Programa Comum, que advogava nada menos que a eliminação do capitalismo!” (Navarro, in Laurell, 1977) “Em 18 dos 23 países capitalistas mais importantes, houve um crescimento substancial dos sindicatos nos anos 60 e 70” (idem). PAÍSES ELEIÇÕES ÁUSTRIA 1971, 1975, 1979 FRANÇA 1981 FINLÂNDIA 1966 GRÉCIA 1981 SUÉCIA 1968, 1970, 1982 NORUEGA 1969 ESPANHA 1982, 1986 PORTUGAL 1976 Fonte: Therborn, G. apud Navarro, in Laurell (1997) Para o autor, o “boom” das novas tecnologias industriais e técnicas de gerenciamento empresarial foi motivado pela necessidade de reagir à força do movimento operário nas economias centrais do sistema. A introdução dos computadores centralizou a direção e o controle, enquanto descentralizou (dispersou) a execução; A linha de montagem foi substituída por grupos de trabalhadores semi-autônomos; A atividade de indivíduos e grupos passou a ser coordenada via os sistemas eletrônicos centralizados; A competição entre esses grupos passou a ser estimulada com remuneração por produção; Grandes setores produtivos das empresas foram transferidos a outras localidades e/ou a outros países, com menores custos trabalhistas, cenários menos regulados e operariados mais despolitizados. A internacionalização das bases e das cadeias produtivas (“globalização”), e o seu corolário ideológico (“neoliberalismo”) foram as respostas do capital frente à força do movimento operário nas economias centrais. Segundo Mandel (1982) o monopólio do progresso técnico e suas contradições apontam os sinais de esgotamento da acumulação ampliada nos anos dourados. Ademais, a situação de « pleno emprego » e a ampliação do poder político dos trabalhadores, dentre outros fatores contribuíram para queda na taxa de lucro. Tais condições que configuram-se de certo modo como « ameaça » a acumulação, estimularam a desestruturação do Welfare State. Para os neoliberais a profunda recessão que atingiu grande parte dos países de capitalismo central , resultou de fatores, tais como: Poder excessivo e nefasto dos sindicatos e movimento operário (corroeram as bases de acumulação) Aumento dos gastos sociais do Estado (inflação, diminuição do investimento) Intervenção do Estado nas relações de trabalho (impede o crescimento econômico e a criação de emprego) Anderson (1995) conceitua o “neoliberalismo” como uma reação teórica e política veemente contra o WS/EBES, iniciada por Friedrich Hayek, em 1944. Segundo a renovada doutrina, o WS/EBES destrói a liberdade dos cidadãos, a vitalidade da concorrência e a desigualdade imprescindível ao ocidente. As causas desses males estariam no demasiado poder dos sindicatos e do operariado, cujo parasitismo os levava a pressionar pelas intervenções e gastos estatais. Cabia, pois, a partir do Estado, romper o poder dos sindicatos, restaurar a taxa “natural” de desemprego e reduzir as intervenções e regulações econômicas. Tudo que podemos dizer é que este é um movimento ideológico, em escala verdadeiramente mundial, como o capitalismo jamais havia produzido no passado. Trata-se de um corpo de doutrina coerente, autoconsciente, militante, lucidamente decidido a transformar todo o mundo à sua imagem, em sua ambição estrutural e sua extensão internacional. Eis aí algo muito mais parecido ao movimento comunista de ontem do que ao liberalismo eclético e distendido do século passado (XIX, Anderson, 1995). A hegemonia neoliberal ocorre no final da década de 1970 quando diversos países da Europa e os EUA, passam a assumir seus princípios em seus programas governamentais. Os pioneiros foram os governos de Thatcher (1979); Reagan (1980); Khol (1982), entre outros. O Estado não deve intervir na regulação do comércio exterior e de mercados financeiros. O Estado deve conter os gastos sociais Deve haver a manutenção deuma “taxa natural” de desemprego. O Estado deve promover uma reforma fiscal com redução de impostos para os altos rendimentos. Das 23,5 milhões de declarações de ajuste de imposto de renda do ano-base de 2006, apenas 5.292 contribuintes apresentaram rendimentos tributáveis acima de R$ 1 milhão. Paradoxalmente, o número de milionários no país não para de crescer. Conforme revelou o levantamento da The Boston Consulting Group (BCG), o Brasil tinha, em 2008, 220 mil milionários, uma expansão de 15,7% em relação ao ano anterior (Wiziack, 2008). A fortuna desses milionários está estimada em aproximadamente US$ 1,2 trilhão, o que equivale a praticamente metade do PIB brasileiro. Com base nos dados da Pesquisa de Orçamento Familiar (POF) do IBGE de 2002-03, estima-se que as famílias com renda de até dois salários mínimos arcam como uma carga tributária indireta de 46% da renda familiar, enquanto aquelas com renda superior a 30 salários-mínimos gastam 16% da renda em tributos indiretos (Zockun,2005) O resultado é uma carga tributária regressiva, o que significa que o Estado brasileiro é financiado, em grade parte, pelas classes de menor poder aquisitivo e pelos trabalhadores, com a população de baixa renda suportando uma elevada tributação indireta. Na década de 1980 nos países de capitalismo central a hegemonia neoliberal não foi capaz de solucionar a crise do capital e tão pouco alterar os índices de recessão e baixo crescimento econômico. Em contrapartida, tais medidas tiveram efeitos destrutivos para classe trabalhadora, pois resultaram em aumento do desemprego, eliminação de postos de trabalho não-qualificados, diminuição dos salários e redução de gastos com políticas sociais. 1960-1973 1973-1979 1979-1982 1982-1990 1990-1993 EUA 4,0 2,4 -0,1 3,6 1,2 Europa 4,8 2,6 0,9 2,7 0,6 Japão 9,6 3,6 3,7 4,5 2,1 OCDE 4,9 2,7 0,8 3,5 1,1 Fonte: Navarro, in Laurell (1997) Fonte: Navarro, in Laurell (1997) Desemprego Criação de empregos por ano (% sobre a população) 1974-1979 1980-1990 1973-1979 1979-1988 OCDE 4,2 7,4 -0,1 -0,1 União Européia 4,4 7,9 -0,5 -0,6 EUA 6,7 7,2 0,9 0,7 Japão 1,9 2,5 0,1 0,2 Fonte: Murard, 1997, p. 97 apud Bering e Boschetti (2011) Gastos com proteção social em % do PIB Estrutura de financiamento em % dos recursos Período 1970 1980 1983 1989 Contribuição dos assalariados Contribuição empregadores Impostos fiscais 1980 1989 1980 1989 1980 1989 França 18,9 25,4 28,3 28,0 23,7 28,7 55,7 51,7 17,5 17,2 Alemanha 21,5 28,7 30,1 29,6 28,3 30,5 10,0 8,7 83,2 79,6 Dinamarca 14,4 19,4 22,9 23,2 13,8 14,7 58,7 52,6 23,8 29,8 Itália 19,6 30,4 33,8 30,2 31,5 34,9 37,1 31,2 20,8 16,6 Países Baixos 14,3 21,5 23,9 20,6 14,6 17,8 33,4 29,2 43,2 41,3 Reino Unido 18,9 25,4 28,3 28,0 23,7 28,7 55,7 51,7 17,5 17,2 Após o esgotamento do pacto e consensos estabelecidos pós-guerra (welfare state) observou-se uma hegemônia da agenda neoliberal a nível global, ainda que tenha resultado em inúmeros prejuízos a classe trabalhadora. A partir dessa constatação, proponho uma discussão em grupo como objetivo de refletir sobre os fatores determinantes que possibilitaram a conquista de tal hegemônia. LAURELL, Ana C (org.). Estado e Políticas Sociais no neoliberalismo. 3ª ed. São Paulo: Cortez/Cedec, 2002 (Textos de Navarro e Toledo). SADER, Emir e GENTILI, Pablo (orgs.). Pós neoliberalismo. As políticas sociais e o estado democrático. São Paulo : Paz e Terra, 1995 (Textos inicial e final de Perry Anderson). SANTOS, Wanderley G. Do. Cidadania e Justiça. A política social na ordem brasileira. Rio de Janeiro : Campus, 1987. SILVA E SILVA, M.O. Teorias Explicativas sobre a Emergência e o Desenvolvimento do Welfare State. In: Revista Política e Trabalho, 15. Setembro 1999, págs. 29-42.
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