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Sumário 1 DIVERSIDADE RELIGIOSA NO BRASIL E A EDUCAÇÃO .......................... 4 1.1 Abordagens conceituais acerca de religião .................................................. 4 1.2 Concepções históricas de Ensino Religioso no Brasil .................................. 8 1.3 O ensino religioso na formação de valores ................................................. 12 2 OS ASPECTOS JURÍDICO-LEGAIS ATINENTES A RELIGIÃO NO BRASIL E SUA PERTINÊNCIA COM O ENSINO RELIGIOSO NAS ESCOLAS .......... 17 2.1 O panorama constitucional ......................................................................... 17 2.2 A religião e o Estado laico .......................................................................... 20 3 A QUESTÃO EDUCACIONAL: O CARÁTER DO ENSINO RELIGIOSO NAS ESCOLAS BRASILEIRAS ............................................................................... 22 4 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................. 29 INTRODUÇÃO Prezado aluno, O Grupo Educacional FAVENI, esclarece que o material virtual é semelhante ao da sala de aula presencial. Em uma sala de aula, é raro – quase improvável - um aluno se levantar, interromper a exposição, dirigir-se ao professor e fazer uma pergunta, para que seja esclarecida uma dúvida sobre o tema tratado. O comum é que esse aluno faça a pergunta em voz alta para todos ouvirem e todos ouvirão a resposta. No espaço virtual, é a mesma coisa. Não hesite em perguntar, as perguntas poderão ser direcionadas ao protocolo de atendimento que serão respondidas em tempo hábil. Os cursos à distância exigem do aluno tempo e organização. No caso da nossa disciplina é preciso ter um horário destinado à leitura do texto base e à execução das avaliações propostas. A vantagem é que poderá reservar o dia da semana e a hora que lhe convier para isso. A organização é o quesito indispensável, porque há uma sequência a ser seguida e prazos definidos para as atividades. Bons estudos! 4 1 DIVERSIDADE RELIGIOSA NO BRASIL E A EDUCAÇÃO 1.1 Abordagens conceituais acerca de religião Desde o início, o ser humano busca respostas sobre como se deu sua existência no mundo, tentando entender o mistério que cerca essa questão. É algo que transcende o concreto, pois a vida é um segredo, assim como a morte, por isso a religião é muito importante nesse processo de compreensão, para encontrar o sentido da vida, como afirma (MOSCONI, 2011, p. 18). A busca do sentido levanta perguntas existenciais: que estou fazendo? Por que faço isso? Que rumo dar a minha vida? Com quais atitudes quero vivê-la? São perguntas fundamentais que vão à raiz da vida. Elas colocam a vida em primeiro lugar, acima das leis, das doutrinas, das religiões. Vivemos hoje em um valor esquecido, pois a sociedade é repleta de tantos distúrbios, comportamentos inadequados e violências nos mais diversos campos deixando de lado a religiosidade que proporciona ao ser humano o resgaste de valores sociais, e com isso se desconhece o que é a religião, qual seu valor e qual sua importância para a formação de um indivíduo capaz de se integrar a sociedade com sucesso. Segundo Nentwig (2013, p. 27) se a religião não tem mais a mesma influência, então outras forças têm um papel decisivo na determinação dos valores de uma pessoa. Existem muitos valores estabelecidos em torno de todos. O mundo social detém o poder institucional e formulou as regras do certo e do errado, do verdadeiro e do falso. Existem muitos valores estabelecidos em torno de todos. O mundo social detém o poder institucional e formulou as regras do certo e do errado, do verdadeiro e do falso, com tantas regras a serem cumpridas, que se fazem necessária para uma vida melhor, e com isso facilita esquecer dos valores que levarão o indivíduo a uma vida plena. De acordo com Silva (2004, p. 03), A maioria das pessoas entende o que é "religião". Esta definição é geralmente considerada como a crença em Deus, espírito, seres sobrenaturais ou vida após a morte. É possível pensar, ainda, esse conceito 5 como o nome de algumas das grandes religiões mundiais: Cristianismo, Hinduísmo, Budismo ou Islamismo. No contexto das reflexões acima, pode-se observar que a religião faz parte de todos, ela sempre existe no dia a dia. Em todas as situações que vivemos, sempre temos algo relacionado à religião, seja qual for-lhe, uma parte importante do desenvolvimento cultural e social. Na mesma linha de pensamento, Junqueira (2002) apud Kadlubitski (2012 p.184) salienta que a religião pode ser considerada um comportamento instintivo, próprio do ser humano, ao longo do tempo. Diferentes culturas podem observar suas manifestações a partir da busca de compreensão de si e do mundo, considerando fatos inconsoláveis e desconhecidos. Portanto, a religião faz parte do comportamento humano e é exclusiva do ser humano. As pessoas podem julgar que tipo de pessoa se tornarão no futuro com base nas situações e tempos vividos por diferentes culturas. Entendemos que, desde os primeiros anos, a criança deve ser educada para reconhecer que haver outras ideias além das suas, que existem diferentes etnias e religiões, todas igualmente válidas e merecedoras de respeito. Assim estaremos colocando bases para a construção de uma convivência humana respeitosa e solidária, de uma vida cidadã, de um mundo de paz. (SENA, 2013, p. 07). Nesse método, é importante enfatizar que a religião é a base para a compreensão do mundo, pois desde o primeiro entendimento da religião, é possível que a criança se torne um adulto com responsabilidade, capaz de perceber as mudanças que acontecem no seu cotidiano, e assim viver uma vida em que haja respeito, dignidade, solidariedade e tantos outros valores que farão com que se tornem adultos com uma mente capaz de transformar o mundo. Nesse sentido, é preciso aprender sobre as diferentes religiões nas escolas, estabelecer um conceito de respeito entre todas as pessoas e prevenir a intolerância religiosa e a violência entre os humanos. O ser humano tem diferentes pensamentos, estilos de vida e ideias, portanto, precisa respeitar e compreender essas diferenças de forma positiva e saber lidar com elas para atuar com igualdade na sociedade. Algumas definições globalizam ou restringem o conceito, como a definição que conta ser a religião “uma visão de mundo”, quando nem todas as visões de mundo são religiosas ou que a definem como “sagrado”, o que requer imediatamente a que se diga o que é sagrado e o que é profano, e as que dizem que religião é “acreditar em Deus”, e/ou que está relacionada ao 6 sobrenatural ou transcendental, sendo essa a definição mais abrangente por não ser comum a todas as culturas religiosas. (SOUZA, 2012, p. 14). Na opinião da autora, existem várias definições de religião, contudo a mais adequada é definir como acreditar em algo além do ser humano, uma resposta que explica o verdadeiro sentido da existência humana, seja qual for a religião. É importante ressaltar que para dar sentido à vida, o ser humano é obcecado por coisas sobrenaturais, o que explica por que faz parte de uma sociedade rodeada de tantas coisas, de tantas distrações, de tantas inovações. Corrêa (2008, p. 149) expressa que, a religião, como expressão cultural intangível, é considerada patrimônio cultural. Envolve a identidade dos grupos que compõem a sociedade brasileira, objetivada através de diferentes formas de expressão. Portanto, também pode-se dizer que a existência de crenças religiosas em nossa sociedade permite que sujeitos que tomam as crenças religiosas como princípio de vida a cultivem por meio de diferentes criações, comportamentos e estilos de vida. Nesse sentido, o autor destaca que as diversas formas de expressão na sociedade são muito importantes, fazem parte da cultura brasileira porque contribuem para a verdadeira formação do ser humano, para buscarem o sentido da vida, porque vivemos numa sociedade cheia de negatividade, objetivando que o ser humano perca o verdadeiro sentido da vida. Assim sendo, as pessoas devem buscar uma compreensão do que não é compreendido na religião, e a religião de alguma forma explica tudo ao seu redor, ela ajuda a reviver os valores existentes na sociedade, de modo a buscar uma vida melhor e fazer com que as pessoas ao seu redor se sintam bem. A conceituação de religião é um sentimento que transcende a realidade ou humanidade, e é um dos significados sagrados. Como sistema, tem sua própria estrutura de participação, crenças, práticas, símbolos, valores e experiências. De fato, a essência da religião, partindo da etimologia da palavra que deriva do latim, pode significa religar, reler ou reeleger. Em todas estas está presente a ligação da humanidade com a divindade. Conforme se nota, a religião está ligada a humanidade, ela faz parte da natureza humana, é está representada em vários símbolos que dão o significado a religião. O homem está sempre procurando a resposta para sua existência, e a religião 7 permite que a humanidade entenda a transcendência e como aconteceu sua existência na terra. Os primeiros a realizarem a catequese foram os Jesuítas, que procuraram, através do catecismo, integrar os indígenas à sociedade para que pudessem contribuir com o seu trabalho. Portanto, pode-se perceber que a religião é uma forma de mudar as pessoas, de mostrar que a religião, apesar de todas as dificuldades que o cotidiano traz, é um meio importante para termos acesso ao mundo em que vivemos, marcado por fortes violências, onde se faz necessário buscar, seguir algo que transforme o ser humano dignos de viver em sociedade. Nessa abordagem, Kadlubitski (2010, p.185) defende os povos primitivos que viveram em solo brasileiro e possuíram sua cultura e religião há milhões de anos. Em 1500 com a chegada dos portugueses, milhões desses povos foram dizimados. A cultura e a religião indígena foram afetadas imperativamente, visto que os colonizadores viam isso como uma manifestação de selvageria. Conquanto, é importante lembrar que os índios que vivem em solo brasileiro sempre viveram uma cultura e uma religião, e que com a chegada dos portugueses, a sua cultura e religião foram afetadas, pois se iniciou um processo de modificações, visando o mercado de trabalho, eles eram considerados como selvagens. O mundo de hoje está em uma fase de transformação social, a história da vida se atualiza a cada nova era, e novas mudanças aparecem e se espalham por todo o universo. Mudanças causadas por pessoas que buscam novos aprendizados, novas descobertas a cada dia, e essas mudanças irão alterar seus julgamentos e desejos individuais e coletivos, os seus modos de pensar e agir, tanto em relação às coisas, como as pessoas. Considerando esses aspectos, é preciso enfatizar que a partir dessas mudanças sociais e culturais, é importante refletir sobre o verdadeiro sentido da vida para que os valores não se percam em tantas inovações. Fleury (2013, p.184) fala que as religiões fazem parte da cultura humana, presentes na maioria dos povos, em diferentes contextos históricos. Em sociedades antigas que careciam da tradição oral de conhecimentos e tecnologias mais complexos, a religião era uma força muito poderosa para organizar a vida social: os elementos naturais eram divinizados, a exemplo do vento, água, terra, fogo, animais e dos astros, e as divindades eram simbolizadas por totens e fetiches. O autor defende a visão de que a religião faz parte da humanidade, desde o nascimento dos povos, 8 mas em um contexto diferente, mas é de grande importância para o crescimento da humanidade. A religião é uma poderosa aliada na vida social e explica o que não pode ser decifrada pela ciência. Na visão de Cavalcanti (2011, p. 178), a religião é uma das mais complexas manifestações culturais. Ao mesmo tempo que constitui um fenômeno universal, também se constitui concretamente de uma forma específica, corporificando uma modalidade de diversidade cultural. Segundo o autor, a religião apresenta diferentes expressões culturais e é um aspecto de todas as áreas da vida humana, e de forma particular ela se apresenta como algo prescindível, capaz de transformar o ser humano em um ser crítico, capaz de ver o mundo de forma a ter atitudes positivas perante a sociedade. A partir dessa compreensão, a religião não parece ser algo único, uma ideia só, mas engloba amplos aspectos da sociedade, a religião vai além do que pensamos. Nos leva a buscar uma compreensão do ser, da identidade, do sobrenatural. Portanto, existem muitas definições de religião, mas estão relacionadas à diversidade cultural, ou seja, a grande atuação que ocorre dentro da sociedade está relacionada à compreensão do mundo. 1.2 Concepções históricas de Ensino Religioso no Brasil A história do Ensino Religioso nas escolas públicas brasileiras sempre teve como objetivo a confissão, que é uma religião típica, ministrada por denominações religiosas, definindo o conteúdo e escolhendo professores para lecionar no espaço disponibilizado pelo país. Atualmente, a diversidade cultural e religiosa tem vindo a surgir cada vez mais na sociedade. O espaço escolar é um local onde se reúnem pessoas de diferentes culturas tornando muito importante que se trabalhe questões religiosas, bem como a diversidade no âmbito escolar, visto que o ser humano é um ser que está em constantes relações com outros seres em diferentes espaços necessitando um apoio para uma vida melhor. Diante do exposto, é óbvio que a religião sempre existiu desde o período colonial e tem uma relação estreita com o país e com as doutrinas religiosas, naquela época o catolicismo era a religião oficial, tal contexto mudou quando o estado e a igreja foram separados, e então começou uma grande polêmica sobre o ensino 9 religioso nas escolas públicas, porque outros tipos de denominações religiosas já existiam. De acordo com Alves (2015, p. 02), a educação religiosa deve ser considerada algo muito necessário, para que possamos ajudar os alunos a se tornarem pessoas completas de alguma forma, ou seja, na sala de aula será um poderoso instrumento à disposição para formar mais os seres sociais com as diferenças, visto que este tipo de ensino é adequado como meio de promover um distanciamento de todo fundamentalismo religioso. Pelo exposto, pode-se perceber que a educação religiosa é de fundamental importância no ambiente escolar, pois contribui para a formação integral dos alunos, é uma referência para a sociedade, uma vez que promove uma qualidade de vida dentro do convívio social. O ensino religioso é uma disciplina que vai além do currículo escolar, precisa ser visto como algo que se reflete na sociedade e, quando não funciona bem, se reflete negativamente. Percebe-se por essa compressão que a educação religiosa não é apenas uma disciplina, mas também um contexto histórico, necessário para a formação do ser humano como um todo. E ela está além de um simples componente curricular em que os profissionais apenas o transmitam sem nenhuma preocupação de ir além, é uma disciplina capaz de transformar o ser humano. De acordo com Santos (2014, p.13), a história da educação religiosa no Brasil se confunde com a história do país, colonizado por Portugal, é um país com fortes tendências católicas romanas. Portanto, o ensino religioso dentro das escolas brasileiras faz parte da trajetória histórica da educação, primeiramente tratada pela relação que se estabelece entre o Estado e a Igreja Católica. Logo após, o descobrimento do Brasil, foi implantado por parte de Portugal, o regime do Padroado; acordo celebrado entre o monarca e o Sumo Pontífice, no qual estavam confirmadas prerrogativas concedidas ao rei, tendo em vista a propagação da fé católica. Este regime perdurou durante os três primeiros séculos da história do Brasil. As origens históricas do padroado remontam ao século IV, quando o cristianismo não tinha permissão para realizar suas práticas religiosas livremente nos territórios do Império Romano. O padroado foi estabelecido através de um tratado entre a Igreja Católica e o Reino de Portugal e Espanha, a Igreja delegou a gestão e organização da Igreja Romana no seu território ao monarca do Reino Ibérico. O rei ordenou a 10 construção da igreja, nomeou padres e bispos, e posteriormente aprovada pelo papa. Para Padroado, muitas atividades características da igreja são, na verdade, funções de poder político. Além disso, foi por meio desse meio que surgiu a chamada primeira forma de ensino religioso no setor público brasileiro. No Brasil colonial, as doutrinas religiosas tornaram-se uma ferramenta para os colonos, cujo maior aliado era o padre jesuíta, que cooperava com a família real portuguesa na exploração das terras que permitissem a submissão de nativos e escravos ao mesmo tempo em que devastavam sua cultura e apagavam suas memórias históricas. O objetivo é a conquista da fé católica por meio da educação escolar, uma obra que alcançou grande proporção ao longo do tempo e tem uma clara representação na formação do povo brasileiro. No período Colonial, com o descobrimento do Brasil, a única religião existente era a Religião Católica que prevalecia e ditava as regras; os jesuítas criaram a primeira escola de letras. Com o passar do tempo, surgiu então a reforma protestante, que veio para rebater aquilo que a Igreja Católica colocava, isso aconteceu no século XVI, surgindo assim novas seitas. Antes do Marquês de Pombal no Brasil e de todo o Império Português chegar ao poder, as doutrinas religiosas eram dominantes, especialmente os jesuítas que controlavam o método de ensino, e a igreja começou a ser mantida pelo Estado. No ano de 1579, os jesuítas foram expulsos, rompendo-se o monopólio da educação, através de um ensino laico. Para Fleury (2013, p.193), na história da humanidade, sempre houve a diversidade religiosa derivada da elaboração cultural como forma de questionar o sentido da vida e a transcendência em relação a importantes questões humanas: de onde vim? Para onde vou? Nessa perspectiva, cada religião adota diferentes formas de crença, celebração, oração e conexão com as outras, e simboliza a experiência religiosa que as pessoas de cada cultura vivem de maneiras diferentes. Nessa linha de pensamento, Souza (2012, p. 20) relembra que, o artigo 5º da Constituição do Imperador determinava: "A religião católica apostólica romana continuará a ser a religião do Império. Todas as outras religiões serão permitidas com seu culto doméstico ou particular, em casas para isso destinadas, sem forma exterior de Templo”. O Ensino Religioso durante o império colonial não mudou muito. Tudo porque o catolicismo romano era a religião oficial do império. O ensino religioso começou a 11 ser encoberto e entregue à metrópole como uma máquina ideológica, já que nessa época a igreja era dona de um ensino religioso para formação de valores, vasto patrimônio econômico e cultural e não conflitava com a corte, isso sem falar que a mesma trabalhava com a educação, mesmo sendo papel do estado. É importante notar que embora a igreja daquele período tivesse seus próprios interesses, esse era pregar o evangelho ou impor as doutrinas da Igreja Católica Romana. Vale destacar que durante o período imperial, não ocorreram muitas mudanças relacionadas ao ensino religioso, pois a Igreja Católica procurou incorporar sua religião à formação educacional por meio das escolas, fazendo com que o ser humano entendesse que a religião católica era a única que deveria fazer parte da sociedade, utilizando a catequese como uma forma de transmitir a religião. No regime Republicano, a Igreja Católica buscou apoio junto à burguesia agrária, que tinha um poder social significativo, aproximação esta que convinha também à classe senhorial: seus filhos estudavam em escolas católicas, onde recebiam uma educação em estilo europeu, e suas mulheres frequentavam as igrejas e participavam de atividades caritativas e de associações piedosas. Durante este período, um grupo de padres apoiou a república e a separação entre Igreja e Estado, defendendo a ideia de que a Igreja pode unir-se ao povo desta forma, assumir as questões sociais e confiar-lhe missões. A crise entre a igreja e a nova ideologia popular é um aspecto importante que precisa ser verificado na análise histórica do ensino religioso na educação pública brasileira. Na Constituição de 1937, o Ensino Religioso figurava na lei, mas não garantia a sua oferta como disciplina obrigatória dos horários das escolas. O Artigo 133 estabelecia: “O ensino religioso poderá ser contemplado como matéria do curso ordinário das escolas primárias, normais e secundárias. Não poderá, porém, constituir objeto de obrigação dos mestres ou professores, nem de frequência compulsória por parte dos alunos” (SOUZA, 2012, p. 27). Segundo o autor, o ensino religioso já faz parte da legislação, mas não é uma disciplina obrigatória nas escolas, cabendo ao professor decidir se deseja incluí-la no currículo pedagógico, não sendo necessária a participação dos alunos na matéria da disciplina. De acordo com os Parâmetros Curriculares do Ensino Religioso, a reforma religiosa, como a reforma protestante, acelerou o processo reformador da Igreja Católica, a contrarreforma, com o relevante concílio de Trento, estabeleceu maior 12 subordinação dos povos em fase de colonização e contribuiu para influenciar com fortes convicções religiosas neste povo em construção. A atual LDB (9394/96) traz, no seu artigo 33, a seguinte redação: Art. 33. O ensino religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante da formação básica do cidadão e constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo. § 1º Os sistemas de ensino regulamentarão os procedimentos para a definição dos conteúdos do ensino religioso e estabelecerão as normas para a habilitação e admissão dos professores. § 2º Os sistemas de ensino ouvirão entidade civil, constituída pelas diferentes denominações religiosas, para a definição dos conteúdos do ensino religioso. (BRASIL, 1996) Nessa perspectiva, pode-se perceber que a disciplina da educação religiosa é imprescindível na formação do ser humano, pois envolve diversidade, não apenas questões religiosas, mas trata do indivíduo como um todo, formando cidadãos críticos e reflexivos que saibam respeitar cada um, sabendo conviver de maneira digna na sociedade. De acordo com Paiva e Medeiros (2013, p. 06), o Santo Padre Pio XI, em sua encíclica “Divini Illius Magistri”, reconhece e enaltece a importância do ensino religioso voltado para a excelência da educação cristã. Em suas palavras, o Papa ensinou que a arte da educação não consiste apenas em preparar estudantes e pessoas comuns para os ideais terrenos, mas realizar a vontade elevada de Deus para o seu destino. Dessa forma, o autor enfatiza a importância da educação religiosa no currículo, bem como a preparação e a formação necessárias para que os alunos possam obter uma vida digna e possam adotar atitudes adequadas a si e aos outros. 1.3 O ensino religioso na formação de valores Quando se trata de valores no ambiente escolar, esse problema é muito comum, pois envolve muitas famílias, e o processo de formação das pessoas deve partir de aspectos sociais, culturais e psicológicos. Diante disso, acredita-se que a escola pode dar uma grande contribuição na formação de valores, principalmente quando a sociedade se encontra cheia de violência, indisciplina e jovens sem sentido, muitas pessoas perderam a verdadeira busca por valores: 13 É comum surgirem dúvidas quando se aborda o trabalho com valores na escola. Comumente associado unicamente à família, o processo de formação dos valores é complexo e demanda o desenvolvimento de aspectos sociais, culturais, psíquicos, políticos, afetivos, entre outros. Por isso, acreditamos que a escola tem muito a ajudar no processo de formação em valores das futuras gerações. Em tempos difíceis, de violência, indisciplina e falta de perspectiva para a juventude, a noção de valores adquire proporções crescentes nos debates entre a escola e a sociedade em geral. Diante disso, consideramos que é necessário voltarmos nossos olhares para a educação em valores, tarefa que julgamos indispensável para a construção da personalidade dos futuros cidadãos e cidadãs, comprometidos com a justiça, igualdade e valorização dos direitos humanos. (PÁTARO; ALVES, 2011, p. 04). Porém, é necessário que as escolas voltem atenções para a educação baseada em valores, tarefa que pode parecer trivial, mas tem um peso muito importante na sociedade para os cidadãos que estão comprometidos com a justiça, a igualdade e os direitos humanos no futuro. Segundo Catão (1994) apud Silva (2014, p. 171), o ambiente educacional proporciona o processo de formação humana de uma forma mais potente. Nele, a criança adquire mais conteúdo e conceitos éticos, valores e princípios que vão reger sua vida. O ensino religioso se baseia na religiosidade, “um caminho para refletir sobre o sentido da vida e praticar a justiça, a unidade é condição suficiente para o ser humano exercer a liberdade; para a sociedade, é um ato de unidade de todos os homens. Nesse sentido, é importante destacar que o ambiente educacional é um espaço de formação de cidadãos para serem capazes de transformar o mundo, e um espaço de discussão de valores e princípios, fazendo com que haja uma grande necessidade de incluir nas disciplinas o ensino religioso, a fim de contribuir para que as crianças se tornem adultos responsáveis. Ter valores significa possuir um conjunto de hábitos de reflexão. Significa estar disposto a repetir comportamentos desejáveis, algo próximo das virtudes, mas, além disso, comportamentos desejáveis que o ser humano assume não apenas por tê-los aprendido, que seria apenas um hábito mecânico, mas porque necessita ter a convicção de que deve manifestá-los. Uma convicção de emoções que surge da consideração reflexiva de emoções e de razões que avalizam os hábitos de valor. (PÁTARO; ALVES, 2011 apud ARANTES, 2007, p. 110). Nessa perspectiva, é importante ressaltar que a escola é um espaço educacional onde se encontram pessoas de diferentes personalidades, onde cada uma traz consigo uma bagagem cultural diferente, valores que se mesclam e que 14 devem ser trabalhados no currículo escolar. A forma como as pessoas se tratam dentro do ambiente escolar deve ser facilitada, na falta dessa preocupação, o ser humano, adquirindo diferentes formas, atitudes que podem prejudicar o meio em que vive. Portanto, é muito importante que a escola opere com responsabilidade na disciplina de ensino religioso, e não em defesa de nenhuma das religiões, já que o Estado é laico. Mas no contexto histórico, para mostrar às pessoas a importância de aprender valores e poder adotar atitudes responsáveis na sociedade, infelizmente foram vistas cenas de violência doméstica, intolerâncias religiosas, suicídios, adolescentes que não estão preocupados com o futuro, gerando assim problemas graves para a sociedade. Hoje é preciso mostrar no campo da escola o quanto é importante respeitar o outro, ter atitudes simples, mas que façam a diferença na sociedade, uma vez que esses valores são esquecidos ocupando o lugar atitudes negativas. Nos Parâmetros, os temas transversais trazem um discurso que ressalta a pluralidade e o respeito às diferenças e desigualdades para se alcançar a igualdade. A proposição de respeito aos diversos costumes, origens e dogmas religiosos na valorização da alteridade, belas palavras que recheiam os Parâmetros, encobre o embate que restaura o que havia de mais autoritário e conservador na educação do período da ditadura militar. (VAIDERGORN, 2008, p. 408). É importante, portanto, enfatizar que a disciplina de educação religiosa se preocupa com a importância e o respeito às diferenças, as diferentes manifestações culturais, seus costumes, a busca pela igualdade e o respeito a todos. É por meio da disciplina do ensino religioso que os humanos podem amadurecer suas visões sobre diferentes culturas e diferentes temas sociais a partir do que adquiriram no ambiente familiar e a oportunidade de as escolas resgatarem os valores perdidos em meio a uma sociedade com tantos meios para se viver ao contrário de uma vida digna. Assim entende-se que a escola é uma instituição cultural construída para transmitir cultura e para socializar saberes produzidos e acumulados no tempo pelos diferentes povos. No entanto, ressalta-se que é na modernidade que a escola instaura-se, no período de afirmações universais, e, ainda, de políticas e práticas cunhadas no modelo europeu. É neste universo particular que a instituição escolar foi organizada para produzir a homogeneização cultural, difundindo e consolidando uma cultura comum de base ocidental e eurocêntrica. (FLEURY, 2011, p. 180). 15 É necessário trazer para educação um espírito de reverência às crenças alheias. Parte-se do pressuposto de que, na dinâmica da educação, os alunos desejam compreender a totalidade da vida e o mundo que os cerca, já que encontrarão de forma explícita nesta matriz curricular assuntos que tratarão das variadas formas de conhecimentos culturais advindas das várias religiões existentes no mundo. Nesse sentido, a educação religiosa tem dado uma grande contribuição para a compreensão da vida humana. A escola tem um papel fundamental na sociedade. A combinação das duas traz um bom aprendizado aos alunos uma vez que possibilita ao ser humano um entendimento da sociedade e tudo o que circunda na vida humana, facilitando a tomada de decisões mediante ao mundo em que se vive, pois é necessário fazer com que os mesmos cheguem ao reconhecimento da existência da diversidade religiosa. Portanto, a realização do ensino religioso nas escolas pode promover a reflexão individual e a integração dos conhecimentos básicos, bem como a formação integral dos alunos. Para que isso aconteça é mister superar o preconceito religioso, bem como respeitar a diversidade cultural e religiosa. Socialmente, as crianças participam de eventos familiares e escolares, os quais afirmam comportamentos e valores à personalidade. Estão envolvidas em um vasto campo de situações e de relações, no qual recebem forte influencia dos meios de comunicação. Assistem a diversos programas de TV, ouvem músicas, dançam, brincam, “ficam de mal e de bem”, choram, riem, são sinceras, tímidas e expansivas. Por outro lado, diante de uma dura e cruel realidade, muitos trabalham ajudando no sustento da família, e tantas outras presenciaram conflitos que marcam fortemente sua maturidade emocional. Gradativamente, as crianças realizam descobertas e, de modo peculiar, a religiosidade toma forma, manifesta tanto pelo seu imaginário quanto pelo que a família, a Igreja, a escola e os meios de comunicação têm a oferecer. (SOUZA, 2012, p.13). Em vista dessas premissas, a educação religiosa desempenha um papel importante na vida das crianças, especialmente no mundo de hoje, onde as crianças já não respeitam seus pais desde pequenas, são rebeldes dentro de casa, resultado de uma sociedade moderna em que não há mais como educar os filhos da mesma forma em que se educava há tempos atrás. O tema do ensino religioso envolve questões como valores, respeito entre as pessoas, intolerância religiosa e compreensão do mundo. Dessa forma, vivenciamos uma sociedade em constante mudança, as crianças vivem diferentes tipos de personalidades e as escolas têm a 16 responsabilidade de ajudar a demonstrar a importância dos valores para um mundo melhor. No Brasil, desde a Lei de Diretrizes e Base na Educação nº 9.394/96, o ensino da rede pública de educação básica tem garantido que o Brasil respeite a diversidade religiosa e não se identifique com nenhuma religião. O ensino religioso teve um caráter não missionário, ou seja, não há interesse na fé, privilegiando o "valor" da religião, a cidadania, o conhecimento do bem e do mal e o conhecimento de Deus. Para essa consciência, é preciso questionar a importância dos valores nas escolas, a fim de buscar a transformação humana para vivenciar um mundo melhor visto que a sociedade está repleta de muitas distrações, de fatores que vão de encontro com os valores éticos e morais, cabendo a escola, proporcionar através do ensino religioso, a fundamentação dos valores nos indivíduos. “A proposta do Ensino Religioso é assegurar a formação de valores ao cidadão devendo ser concebido como atividade cientificamente neutra e ser interpretado como área de conhecimento, caracterizando, assim, a intencionalidade educativa”. (SILVA, 2014, p. 169) Segundo Silva (2014, p. 170), A finalidade do ensino religioso é proporcionar aos alunos as condições necessárias para o desenvolvimento da sua dimensão religiosa, porque se centra nos valores humanos básicos e proporciona "ciência, fé, cultura, maturidade da fé, na comunidade onde atua, respeito à crença dos outros, orientando-os para o bem comum e a se comprometerem na ação social e política”. A dimensão religiosa desempenha um papel importante na sociedade, seja qual for a religião, proporciona ao ser humano a exploração dos valores essenciais ao mundo e concorda com o compromisso de ação social, o que dará um contributo positivo para o mundo Porém, o ensino religioso é muito importante para a formação básica do ser humano, pois as características específicas de suas recomendações são: trabalho pedagógico sem inclinação a nenhuma religião, centrar na aprendizagem e não na religiosidade, buscando dentro do contexto educacional trabalhar o respeito, a diversidade, tornando o ser humano conhecedor de tantas religiões existentes no mundo, e assim proporcionando a todos uma opção respeitosa de sua escolha religiosa ou não. Nessa perspectiva, é importante enfatizar que cada religião tem sua particularidade, e expressa suas visões, realidades e crenças de diferentes formas 17 por meio de símbolos e fenômenos religiosos de acordo com a própria cultura. Portanto, não deve haver discriminação, nem imposição de religião ou cultura, mas uma forma de inserir verdadeiramente no ser humano as escolhas que lhes cabem, sendo importante que seja trabalhado a formação de cidadãos responsáveis. 2 OS ASPECTOS JURÍDICO-LEGAIS ATINENTES A RELIGIÃO NO BRASIL E SUA PERTINÊNCIA COM O ENSINO RELIGIOSO NAS ESCOLAS 2.1 O panorama constitucional Como já discutido, a religião representa a dependência humana e a ideia de coisas transcendentais que são indispensáveis na vida. Em outras palavras, a importância dos temas religiosos dentro da estrutura legal de nosso Estado Democrático de Direito tornou-se óbvia. Dada a sua importância o legislador percebe a necessidade de tratamento das questões religiosas em nosso país. A Constituição de 1988, presumida como marco de análise preliminar, reafirma, entre outras questões, a comunhão de seu propósito, que é o de estabelecer parâmetros favoráveis à defesa da não discriminação com base na fé; levando em consideração a importância individual e coletiva dos temas religiosos, para promover o livre desenvolvimento e disseminação das crenças religiosas em nosso território, bem como a diversidade de crenças vivenciadas no contexto pátrio. Portanto, vale a pena observar e analisar as disposições inaugurais da Constituição a respeito das crenças religiosas, vejamos: Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [...] VI - é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias; (BRASIL, 1988) 18 Com a premissa inaugural do art. 5º, VI da Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB/88), pode-se inferir claramente a intenção de proteção estatal ao livre desenvolvimento das crenças, tidas como invioláveis em um Estado Democrático de Direito. Ressalte-se que as considerações do referido dispositivo resultam na necessidade de uma concepção de termos que se faz surgir por consequência, qual seja, a liberdade religiosa, que em muito compreenderá as noções do livre exercício de crença e cultos religiosos preconizados pela constituição. Essa conceituação resulta em uma dupla natureza: ao mesmo tempo, o Estado deve basear suas ações na não ingerência em questões religiosas, ou seja, deve permitir a liberdade de expressão; por outro lado, possui também uma segunda natureza, que não contradiz a primeira, que se baseia em agir de forma a garantir o livre exercício da própria crença, seja garantindo essa liberdade no seio da família ou até mesmo no ensino, como o citado exemplo nos trouxe. Desta forma, o Estado comporta-se de forma negativa e positiva em relação à religião; em primeiro lugar, deve abster-se de interferir no conteúdo religioso veiculado, enquanto, em segundo lugar, para garantir a eficácia do ideal não discriminatório, deve atuar por meio de medidas que permitam o pleno desenvolvimento das diferentes crenças no País Embora o ideal não discriminatório do inciso VI do art. 5º da CRFB/88, vale ressaltar que a proibição está expressa no mesmo artigo em seu inciso VIII, a saber, “ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei”. Embora seja possível extrair isso interpretativamente, o Brasil descreve seu laicismo com ainda mais clareza ao dizer que o gozo dos direitos deve ser respeitado independentemente da opção religiosa. Cumpre-nos agora destacar ainda as premissas do inciso VII, ainda do artigo 5º da CRFBB/88 é assegurada, nos termos da lei, a prestação de assistência religiosa nas entidades civis e militares de internação coletiva”; pois reflete exemplificativamente o intuito de propiciar o pleno desenvolvimento das crenças ao permitir a assistência religiosa em ambientes civis e militares. 19 Agora, para tratar da neutralidade exigida pelo Estado Laico como forma de garantir o livre desenvolvimento de crenças, propõe o disposto no artigo 19, inciso I da Constituição Federal: Art. 19. É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: I - estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público; (BRASIL, 1988) Na forma exposta percebe-se que é vedado o estabelecimento de alianças, entre o Estado e qualquer denominação religiosa, bem como também fica o País proibido de subvencionar ou causar embaraço ao funcionamento de qualquer forma de religião em nosso território. Contudo, existe a ressalva das possibilidades referidas em caso de interesse público. Precisamente nesta possibilidade, que é suportada pelo interesse público, abre-se agora parênteses para análise, uma vez que ainda não foi promulgada lei específica para disciplinar essa cooperação. Outro ponto digno de nota, é que Constituição Federal no intuito de incentivar o pleno desenvolvimento das religiões em seu território fixou a imunidade tributária dos templos religiosos, em seu artigo 150VI, “b”. Contudo, limitou sua extensão a compreender a vedação da cobrança dos tributos apenas ao patrimônio, renda e serviços, destinados ao fim próprio da entidade religiosa, inteligência do §4º do mesmo artigo. Atualmente, para manter-se, no momento, o viés exemplificativo, vale ressaltar que a Constituição Federal concede ao casamento religioso efeito civil na forma da lei, conforme o disposto em seu artigo 226, §2º. Agora retornando um pouco na cronologia dos dispositivos constitucionais abre-se espaço para comentar-se a respeito das disposições do artigo 210, §1º da CRFB/88, logo abaixo transcrito: Art. 210. Serão fixados conteúdos mínimos para o ensino fundamental, de maneira a assegurar formação básica comum e respeito aos valores culturais e artísticos, nacionais e regionais. § 1º O ensino religioso, de matrícula facultativa, constituirá disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental. (BRASIL, 1988) 20 Nesse ponto, o panorama constitucional nacional mostra a preocupação com a educação religiosa na formação básica da humanidade. Assume uma visão de que o Estado Laico não se encontra impedido de inserir o ensino religioso dentro das escolas. 2.2 A religião e o Estado laico Com o advento do Estado Secular, onde a questão da razão ganha espaço e as relações de governo não estão mais ligadas às religiões, O homem está começando a se desenvolver em um estágio sem precedentes, e a necessidade de proteger todas as crenças e garantir a não interferência religiosa nas questões de Estado é que faz eclodir o ideal de Estado Laico. Assim, a religião, como fenômeno inerente à natureza humana em um ambiente social, parece requerer tratamento pelos Estados Nações. A ideia de laico compreende a não discriminação religiosa, em outras palavras, a não diferenciação ou favorecimento de qualquer natureza por motivo de crença religiosa. Nesse tom, o Estado Laico se confirma em dois aspectos: primeiro, não discriminação com base na religião e, segundo, não ingerência do Estado no campo do conteúdo religioso. É necessário enfatizar que o conceito de Estado Laico não deve ser confundido com Estado ateu, pois o ateísmo também está incluído no direito à liberdade religiosa. Trata-se do direito de não acreditar na religião. A liberdade de crença inclui a liberdade de acreditar e a liberdade de não acreditar. Assim sendo, confundir Estado laico com Estado ateu é privilegiar esta crença (ou melhor, não crença) em detrimento das demais, o que afronta os princípios da igualdade e da liberdade. Portanto, em sentido estrito, é necessário observar que um Estado Laico, em suma, pode garantir a possibilidade de desenvolver qualquer religião em seu território sem qualquer discriminação ou fiscalização que afete sua existência. Assim, a ideia do sagrado legitimador é abandonada para reatribuir legitimidade no espaço democrático, para garantir a liberdade no contexto religioso e condições iguais para o seu desenvolvimento. No entanto, deve-se notar que a liberdade religiosa não está intimamente relacionada à não crença de um país em uma religião oficial. Em outras palavras, a 21 ausência de uma religião oficial em um determinado país não é um pré-requisito para garantir a liberdade religiosa. Neste sentido observem o que preleciona Maria Emília Corrêa: A ideia de laicidade ou separação entre Igreja e Estado, ainda que não seja pressuposto da liberdade religiosa, é elemento que fortalece a preservação desse direito fundamental. O próprio grau de liberdade religiosa em uma sociedade pode ser medido levando-se em conta, entre outras características, o tratamento dispensado pelo Estado às atividades religiosas e o grau de identificação entre as instituições governamentais e religiosas. (COSTA, 2008, p. 97) A declaração acima fornece uma ajuda preliminar valiosa porque claramente considera o secularismo como um pré-requisito para a liberdade religiosa, assim dizendo, mesmo que um país não seja laico, ele pode satisfazer plenamente todos os parâmetros da liberdade religiosa, que aqui lembra-se, em suma, compreendem uma atuação negativa do Estado, culminando na não interferência nos cultos e formas de representação religiosas, e uma atuação, positiva, no sentido de propiciar meios favoráveis a disseminação e proliferação das diversas crenças no território nacional. É verdade que com a ajuda do secularismo, a liberdade religiosa encontrou uma forma mais flexível de realizar suas premissas, mas como visto, esse fato não nega o efeito de separar a segunda da primeira premissa. Enriquecendo a temática e avançando nas análises, observem as considerações de Roberto Blancarte, a respeito de aspectos que circundam a discussão: O critério de separação entre os assuntos do Estado e os das Igrejas é confundido com o da laicidade, porque, na prática, os Estados laicos adotaram medidas de separação (...). Podem existir países formalmente laicos, mas que, no entanto, ainda estejam condicionados pelo apoio político proveniente de uma ou mais Igrejas majoritárias do país. E, de forma contrária, existem países que não são formalmente laicos, mas que, na prática, por razões relacionadas a um histórico de controle estatal sobre as Igrejas, não dependem da legitimidade proveniente das instituições religiosas. (BLANCARTE, 2008, p. 20) O trecho evidenciado, traz consigo a preocupação de dissociar a ideia de Estado Secular, aquele onde as esferas governamental/estatal e a religiosa não guardam interferência reciproca em seus assuntos peculiares, da ideia de Estado laico. Além disso, agrega uma riqueza de conteúdo analítico e, ao mesmo tempo, mostra claramente a possibilidade de um país que é laico na forma, mas mantém uma 22 relação de apoio político com instituições religiosas específicas. De mais a mais, no raciocínio inverso, mostra também que a não laicidade não é importante e que a legitimidade gerada pelas instituições religiosas é necessária para que o Estado promova suas ações. A interpretação da laicidade até agora e a síntese no parágrafo anterior ajudam a compreender melhor o verdadeiro significado dos termos analisados. Possibilitando no presente momento tecida uma reflexão, com maior propriedade, a respeito da problemática do caráter eleito para disciplina ensino religioso, ser ofensivo ou não a laicidade estatal. Para analisar as características educacionais do ensino religioso e os problemas enfrentados pelo laicismo nacional, pelo menos na fase inicial, a partir das características de confissão do ensino, por sofrer talvez as críticas mais ferrenhas, ao ser relacionado com uma doutrinação imposta em sala de aula pela esfera pública, em favor de uma vertente religiosa específica. Para uma melhor compreensão, é necessário estabelecer uma situação de reflexão justa, com base na estrutura de um país, pressupondo que se considere que esta se estabelece a seguir. Porém, na construção da estrutura, é necessário analisar os parâmetros antes do tema de ensino. 3 A QUESTÃO EDUCACIONAL: O CARÁTER DO ENSINO RELIGIOSO NAS ESCOLAS BRASILEIRAS A Constituição Federal em seu artigo 210, §1º, estabelece as bases primárias do ensino religioso no Brasil. Relativamente à vertente pública deste ensino: Art. 210. Serão fixados conteúdos mínimos para o ensino fundamental, de maneira a assegurar formação básica comum e respeito aos valores culturais e artísticos, nacionais e regionais. § 1º O ensino religioso, de matrícula facultativa, constituirá disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental. § 2º O ensino fundamental regular será ministrado em língua portuguesa, assegurada às comunidades indígenas também a utilização de suas línguas maternas e processos próprios de aprendizagem. (BRASIL, 1988). O artigo 33 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional também aduz: 23 Art. 33. O ensino religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante da formação básica do cidadão e constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo. (BRASIL, 1996). Podemos observar a preocupação do legislador em preservar o exercício da liberdade religiosa, porém, muito se discutia acerca da definição do conteúdo da disciplina, e a interpretação da norma em relação a vedação do caráter confessional de ministração da matéria. Quando nos referimos ao ensino religioso confessional, estamos tratando de uma prática didática voltada para uma específica crença religiosa cujo objetivo é o de arregimentar fiéis para aquela crença religiosa. A questão da constitucionalidade do ensino religioso confessional nas escolas foi intensamente discutida e decidida pelo STF na ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade) 4439, em acirrada votação, por 6 a 5 restou decidido pela improcedência da ação direta de inconstitucionalidade proposta pela Procuradoria- Geral da República, e, portanto, não configurando inconstitucional a prática dessa matéria nas escolas, veja o conteúdo da ementa: ENSINO RELIGIOSO NAS ESCOLAS PÚBLICAS. CONTEÚDO CONFESSIONAL E MATRÍCULA FACULTATIVA. RESPEITO AO BINÔMIO LAICIDADE DO ESTADO/LIBERDADE RELIGIOSA. IGUALDADE DE ACESSO E TRATAMENTO A TODAS AS CONFISSÕES RELIGIOSAS. CONFORMIDADE COM ART. 210, §1°, DO TEXTO CONSTITUCIONAL. CONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 33, CAPUT E §§ 1º E 2º, DA LEI DE DIRETRIZES E BASES DA EDUCAÇÃO NACIONAL E DO ESTATUTO JURÍDICO DA IGREJA CATÓLICA NO BRASIL PROMULGADO PELO DECRETO 7.107/2010. AÇÃO DIRETA JULGADA IMPROCEDENTE. 1. A relação entre o Estado e as religiões, histórica, jurídica e culturalmente, é um dos mais importantes temas estruturais do Estado. A interpretação da Carta Magna brasileira, que, mantendo a nossa tradição republicana de ampla liberdade religiosa, consagrou a inviolabilidade de crença e cultos religiosos, deve ser realizada em sua dupla acepção: (a) proteger o indivíduo e as diversas confissões religiosas de quaisquer intervenções ou mandamentos estatais; (b) assegurar a laicidade do Estado, prevendo total liberdade de atuação estatal em relação aos dogmas e princípios religiosos. 2. A interdependência e complementariedade das noções de Estado Laico e Liberdade de Crença e de Culto são premissas básicas para a interpretação do ensino religioso de matrícula facultativa previsto na Constituição Federal, pois a matéria alcança a própria liberdade de expressão de pensamento sob a luz da tolerância e diversidade de opiniões. 3. A liberdade de expressão constitui um dos fundamentos essenciais de uma sociedade democrática e compreende não somente as informações consideradas como inofensivas, indiferentes ou favoráveis, mas também as que possam causar transtornos, resistência, inquietar pessoas, pois a Democracia somente existe baseada na consagração do pluralismo de ideias e pensamentos políticos, filosóficos, religiosos e da tolerância de opiniões e do espírito aberto ao diálogo. 4. A 24 singularidade da previsão constitucional de ensino religioso, de matrícula facultativa, observado o binômio Laicidade do Estado (CF, art. 19, I) /Consagração da Liberdade religiosa (CF, art. 5º, VI), implica regulamentação integral do cumprimento do preceito constitucional previsto no artigo 210, §1º, autorizando à rede pública o oferecimento, em igualdade de condições (CF, art. 5º, caput), de ensino confessional das diversas crenças. 5. A Constituição Federal garante aos alunos, que expressa e voluntariamente se matriculem, o pleno exercício de seu direito subjetivo ao ensino religioso como disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, ministrada de acordo com os princípios de sua confissão religiosa e baseada nos dogmas da fé, inconfundível com outros ramos do conhecimento científico, como história, filosofia ou ciência das religiões. 6. O binômio Laicidade do Estado/Consagração da Liberdade religiosa está presente na medida em que o texto constitucional (a) expressamente garante a voluntariedade da matrícula para o ensino religioso, consagrando, inclusive o dever do Estado de absoluto respeito aos agnósticos e ateus; (b) implicitamente impede que o Poder Público crie de modo artificial seu próprio ensino religioso, com um determinado conteúdo estatal para a disciplina; bem como proíbe o favorecimento ou hierarquização de interpretações bíblicas e religiosas de um ou mais grupos em detrimento dos demais. 7. Ação direta julgada improcedente, declarando-se a constitucionalidade dos artigos 33, caput e §§ 1º e 2º, da Lei 9.394/1996, e do art. 11, § 1º, do Acordo entre o Governo da República Federativa do Brasil e a Santa Sé, relativo ao Estatuto Jurídico da Igreja Católica no Brasil, e afirmando-se a constitucionalidade do ensino religioso confessional como disciplina facultativa dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental. (BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ADI 4439; Relator (a): Min. ROBERTO BARROSO; Redator (a) do acórdão: Min. ALEXANDRE DE MORAES; Julgamento: 27/09/2017; Publicação: 21/06/2018.) Apesar da discussão já ter sido decidida, é importante observar alguns argumentos apresentados por ambas as partes acerca do tema questionado: Primeiramente a ADI foi interposta pela Procuradoria-Geral da República basicamente sobre o argumento de que a única forma de compatibilizar o caráter laico do Estado brasileiro (CF/1988, art. 19, I) com o ensino religioso nas escolas públicas (CF/1988, art. 210, § 1º) consiste na adoção de modelo não-confessional. Nesse modelo, a disciplina deve ter como conteúdo programático a exposição das doutrinas, práticas, história e dimensões sociais das diferentes religiões, incluindo posições não- religiosas, “sem qualquer tomada de partido por parte dos educadores”, e deve ser ministrada por professores regulares da rede pública de ensino, e não por “pessoas vinculadas às igrejas ou confissões religiosas”. Segundo a PGR, o princípio da laicidade é incompatível com os modelos: Confessional, que tem como objetivo a promoção de uma ou mais confissões religiosas e é, preferencialmente, ministrado por representante da confissão; e Interconfessional ou ecumênico, cujo objetivo é a promoção de valores e práticas religiosas, com base em um consenso entre as religiões dominantes na sociedade, 25 e pode ser ministrado tanto por representantes das comunidades religiosas, quanto por professores da rede pública, sem filiação religiosa declarada. Isso porque, de acordo com a PGR, ambos os modelos implicariam endosso ou subvenção estatal a crenças, não existindo a neutralidade estatal em matéria religiosa postulada pelo princípio da laicidade. Pelos mesmos motivos, a PGR defende que representantes das diferentes denominações religiosas não podem ser admitidos na condição de professores da disciplina. A Advocacia-Geral da União se manifestou sobre os seguintes argumentos: o art. 210, §1º, da Constituição evidencia que “o ensino religioso a ser ministrado nas escolas públicas não tem cunho aconfessional, pois, se possuísse essa natureza, não haveria razão para que fosse de matrícula facultativa aos alunos”. Assim, o caráter facultativo e a vedação ao proselitismo seriam suficientes para tornar o ensino religioso harmônico com os demais princípios constitucionais envolvidos. A AGU defende que a contratação de professores é regida pelas disposições gerais de admissão no serviço público, incluindo a realização de concurso público, de modo que não seria compatível com o princípio da igualdade vedar que professores vinculados a instituições religiosas ingressem nas instituições estatais de ensino. Finalmente, quanto ao Acordo Brasil-Santa Sé, afirma que a norma não contraria o texto constitucional, pois prevê expressamente o respeito à diversidade cultural e religiosa do país. Por sua vez, o Procurador-Geral da República manifestou-se pelo conhecimento e pela procedência do pedido, reportando-se às razões deduzidas na inicial desta ação direta. (BRASIL; STF, 2018). Em síntese foram apresentados três principais fundamentos no voto do senhor Ministro Luís Roberto Barroso, são os seguintes: 1. Não há nada mais violador da laicidade do Estado do que alguém poder perder seu cargo público por não ter mais o apoio de uma confissão religiosa. Logo, é um modelo absolutamente incompatível com o texto constitucional. Portanto, para dar cumprimento à instrução constitucional do ensino não confessional e facultativo, o MEC deve estabelecer parâmetros curriculares e conteúdos mínimos do ensino de religião, sob pena de, na prática real, violar-se gravemente o mandamento constitucional da laicidade. 2. Sobre o tema da concretização dos mandamentos constitucionais é que em nenhuma hipótese a investidura e permanência de um professor no cargo público 26 de professor da rede pública pode depender de ato de vontade de uma confissão religiosa. 3. Para assegurar a facultatividade do ensino religioso, como impõe a Constituição e a lei, impõe-se algumas salvaguardas, a saber: não se deve permitir a matrícula automática na disciplina de ensino religioso, é preciso que haja uma manifestação de vontade para se matricular nesta disciplina; segundo, os alunos que optarem por não ter ensino religioso devem ter assegurada uma atividade acadêmica correspondente no mesmo horário, já que o ensino religioso é no horário normal da escola, sob pena de ele ficar defasado no seu aprendizado e no número de horas mínimas que ele tem que preencher; terceiro, o ensino religioso deve ser ministrado em disciplina específica, e não transversalmente e muito menos confessionalmente ao longo de outras matérias, e os alunos devem poder se desligar da disciplina de ensino religioso quando lhes aprouver. Ao final de seu voto, o senhor Ministro propôs a seguinte tese: “O ensino religioso ministrado em escolas públicas deve ser de matrícula efetivamente facultativa e ter caráter não confessional, vedada a admissão de professores na qualidade de representantes das religiões para ministrá-lo.”. (BRASIL; STF, 2018, p. 21). A senhora Ministra Cármen Lúcia argumenta que há a proibição de o Estado estabelecer ou subvencionar cultos religiosos ou igrejas e impedir ou embaraçar o seu funcionamento, no art. 19, inciso I da Constituição. Há a possibilidade de alistamento no serviço militar daqueles que alegarem imperativo de consciência, convicção religiosa, crença ou convicção política; há prestação, então, de serviço alternativo diverso das atividades essencialmente militares, no art. 143, a afirmar, portanto, o respeito às opções religiosas. Há imunidade tributária de templos de qualquer culto, no art. 150. E, até mesmo, no § 2º do art. 226, tinha-se a atribuição de efeitos civis a casamentos religiosos, hoje alterado. Todos esses dispositivos constitucionais mencionados foram repetidos por vários julgadores e reforçam a afirmação sobre o Estado brasileiro laico e não impediu o reconhecimento de que a liberdade religiosa impôs deveres ao Estado, um dos quais a oferta de ensino religioso com a facultatividade a ele inerente. (BRASIL; STF, 2018). Parece que a pluralidade de crenças, essa liberdade de opção, de escolha e a tolerância, base da convivência democrática, que é princípio fundamental da 27 República brasileira, combinam-se com a laicidade estatal, nos termos estabelecidos nos dispositivos que foram aqui questionados - §§ 1º e 2º do art. 33. Há a afirmação de que o sistema de ensino a ser regulamentado pelo Estado admite procedimentos para a definição de conteúdos de ensino religioso, sem embaraço que se tenha até mesmo o conteúdo confessional, uma vez que a não confessionalidade foi posta a partir do voto do Ministro-Relator como sendo compatível com o Estado leigo. De acordo com o ponto de vista da Ministra, a laicidade do Estado como posta na Constituição brasileira, com as vênias do Ministro-Relator e dos que o seguiram, combina-se com as normas constitucionais, pela referência tanto de imposição de vedações, quanto da imposição de uma série de providências a serem adotadas. Carmén Lúcia complementa e afirma não vislumbrar nas normas, autorização para o proselitismo, para o catequismo, para a imposição de apenas uma religião, qualquer seja ela. Mas também não observa, nos preceitos questionados, proibição de que se permita oferecer facultativamente ensino religioso cujo conteúdo se oriente segundo determinados princípios sem imposição, porque é facultativo; se não tivesse esse conteúdo, não haveria porque se dar a facultatividade. Não há imposição nas normas de sujeitar-se a determinado ensino religioso quem quer que seja. Nesse sentido, a Ministra acolheu parte do argumento apresentado pelo Ministro Roberto Barroso de que como sendo a proibição de sujeitar- se alguém a ter de dizer que não aceita determinada religião ou que não vai frequentá- la. Até porque isso leva, especialmente quando mais jovem uma pessoa, a uma situação de constrangimento, no mínimo, quando não para estigmatizá-la. Por isso mesmo, a facultatividade impõe que se escolha, que se possa dar livremente opção e apenas isso. (BRASIL; STF, 2018). Carmén Lúcia (BRASIL; STF, 2018, p. 290-291) ainda expõe: Em minha compreensão, não fosse o conteúdo específico de alguma religião - ou de várias -, não vejo porque seria facultativa essa disciplina. Porque, se fosse História das Religiões ou Filosofia, isso se teria como matéria que poderia perfeitamente - e o é muitas vezes - ser oferecida no ensino público; não no ensino obrigatório, mas no ensino público. Por isso, não vejo como opor a laicidade à opção do legislador e não vejo contrariedade aqui que pudesse me levar a considerar inconstitucionais as normas questionadas. 28 Entretanto, não vejo como se impor a contratação ou nomeação de determinado servidor para ministrar determinada matéria religiosa como representante de uma determinada igreja ou religião. Esse foi, expressamente, um dos pedidos feitos: "com proibição de admissão de professores na qualidade de representantes das confissões religiosas". Não vejo submissão do Estado a qualquer religião nas normas questionadas, porque a oferta de ensino religioso está prevista no § 1º do art. 210 e a oferta é condicionada à sua facultatividade. Por isso, não vejo como declarar inconstitucionais as normas e, com as vênias de estilo, reiterando os meus pedidos de escusas por não acompanhar o voto do Relator e dos que o seguiram, voto pela improcedência da ação, acompanhando a divergência iniciada pelo Ministro Alexandre de Moraes. 29 4 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALVES, Alan Nickerson. A influência pedagógica do ensino religioso para a formação cidadã. Diversidade Religiosa, UFPB, v. 1, n. 2, 2015. BLANCARTE, Roberto. O porquê de um Estado laico. In: LOREA, Roberto Arruda (org.). Em defesa das liberdades laicas. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008. BRASIL. Ação direta de inconstitucionalidade 4.439. Distrito Federal. Inteiro Teor do Acórdão. Data de publicação dje 21/06/2018 - ATA Nº 94/2018. DJE nº 123, divulgado em 20/06/2018. 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