Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
enfrentamento à violência sexual contra crianças e adolescentes NOSSA VOZ. NOSSA FORTALEZA. enfrentamento à violência sexual contra crianças e adolescentes NOOSSSSA VOOZ. NOOSSSSA FOORTALEZA. AS EXPRESSÕES DE VIOLÊNCIA CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTES Marcos Conceituais Fernando Luz 3 SUMÁRIO 1. Contextualização ...................................................................35 2. Os conceitos presentes na Lei nº 13.431/2017 .....................36 3. Expressões da violência contra crianças e adolescentes ....39 4. Outras faces da violência ......................................................46 Referências ..........................................................................................47 Perfis do autor e do ilustrador .........................................................48 1. Contextualização O presente curso tem por objeto aprofun- dar o debate sobre um grave problema social, ainda muito marcante no Brasil: a violência sexual contra crianças e ado- lescentes. Esse é um problema de grande complexidade, sobretudo porque está as- sociado a muitos fatores. Um destes é o fato de que muitas ve- zes a violência sexual é acompanhada de várias outras violências que acarretam em diversas violações do direito à sobrevi- vência e ao desenvolvimento saudável de crianças e adolescentes, premissa funda- mental da Doutrina da Proteção Integral. A Convenção sobre os Direitos da Criança (CDC) estabelece que Estados de- vem enviar todos os esforços para evitar que crianças e adolescentes1 sejam víti- mas de qualquer tipo de violência. Mais que isso, encarrega a família ou qualquer pessoa com responsabilidade sobre a criança de pô-la a salvo da violência. É o que se verifi ca em seu art. 19: 1 Quando a CDC se refere à Criança, abrange toda pessoa menor de 18 anos, ou seja, crianças e adolescentes, conforme normas brasileiras. 1. Os Estados Partes adotarão to- das as medidas legislativas, admi- nistrativas, sociais e educacionais apropriadas para proteger a criança contra todas as formas de violência física ou mental, abuso ou trata- mento negligente, maus tratos ou exploração, inclusive abuso sexual, enquanto a criança estiver sob a custódia dos pais, do representante legal ou de qualquer outra pessoa responsável por ela. enfrentamento à violência sexual contra crianças e adolescentes 35 2. Os conceitos presentes NA LEI Nº 13.431/2017 A Lei nº 13.431/ 2017 representa um refor- ço dos mecanismos para enfrentar a vio- lência contra crianças e adolescentes, fi - xando um conjunto de conceitos, regras e procedimentos atinentes ao atendimento de vítimas de violência. Muito embora a referida lei disponha sobre um conjunto de ações e atri- buições em relação a vítimas de vio- lência e à atuação dos serviços em tais casos, ela representa um passo importante, pois é a primeira vez que uma norma brasileira concei- tua o que vem a ser violência contra crianças e adolescentes. É importante fazer uma ressalva de que conceitos são aprimorados enquanto categorias no meio acadêmico por estu- diosos que se debruçam sobre determi- NA LEI Nº 13.431/2017 A Lei nº 13.431/ 2017 representa um refor- ço dos mecanismos para enfrentar a vio- lência contra crianças e adolescentes, fi - xando um conjunto de conceitos, regras e procedimentos atinentes ao atendimento Muito embora a referida lei disponha sobre um conjunto de ações e atri- buições em relação a vítimas de vio- que uma norma brasileira concei- tua o que vem a ser violência contra É importante fazer uma ressalva de que conceitos são aprimorados enquanto categorias no meio acadêmico por estu- diosos que se debruçam sobre determi- Do mesmo modo, a Constituição Fe- deral (CF/88) e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) convocam todos – fa- mília, sociedade e estado – a serem vigi- lantes e protegerem crianças e adolescen- tes de qualquer tipo de violência: CF/ 88: Art. 227. É dever da família, da socie- dade e do Estado assegurar à crian- ça, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educa- ção, ao lazer, à profi ssionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violên- cia, crueldade e opressão. ECA: Art. 5º Nenhuma criança ou adoles- cente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, explo- ração, violência, crueldade e opres- são, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais. Desse modo, antes de aprofundar as- pectos relacionados à violência sexual pro- priamente dita, é oportuno que se domine melhor conceitos relacionados às diversas expressões de violência contra crianças e adolescentes, pois tais violências poderão confi gurar distintos delitos e demandar me- didas protetivas específi cas, bem como inter- venções especializadas por parte de diversos órgãos de promoção ou defesa de direitos. 36 Fundação Demócrito Rocha | Universidade Aberta do Nordeste enfrentamento à violência sexual contra crianças e adolescentes 37 nado tema, assim como podem vir a ser adotados através de uma defi - nição legal. O fato de determinada lei conceituar uma categoria, não signifi ca que aquela é a defi nição mais precisa ou correta, porém é a que vincula as organi- zações operadoras do direito e, por isso mesmo, não podem ser desconsideradas. A lei em questão considera como for- mas de violência: 1. violência física; 2. violência psicológica (condutas depreciativas e preconceituosas, alienação parental e exposição a crime violento); 3. violência sexual (abuso sexual, exploração sexual comercial e tráfi co para fi ns de exploração sexual); e 4. violência institucional. Desse modo, adiante serão abor- dados os marcos conceituais sobre a violência historicamente amadurecidos do ponto de vista acadêmico e institucional, fazendo-se um paralelo sobre como esses conceitos são legalmente compreendidos no Brasil a partir da Lei nº 13.431/2017. nado tema, assim como podem vir a ser adotados através de uma defi - nição legal. O fato de determinada lei conceituar uma categoria, não signifi ca que aquela é a defi nição mais precisa ou correta, porém é a que vincula as organi- zações operadoras do direito e, por isso mesmo, não podem ser desconsideradas. A lei em questão considera como for- mas de violência: 1. violência física; 2. violência psicológica (condutas depreciativas e preconceituosas, alienação parental e exposição a crime violento); 3. violência sexual (abuso sexual, exploração sexual comercial e tráfi co para fi ns de exploração sexual); e 4. violência institucional. Desse modo, adiante serão abor- dados os violência historicamente amadurecidos do ponto de vista acadêmico e institucional, fazendo-se um paralelo sobre como esses conceitos são legalmente compreendidos no Brasil a partir da Lei nº 13.431/2017. enfrentamento à violência sexual contra crianças e adolescentes 37 38 Fundação Demócrito Rocha | Universidade Aberta do Nordeste TÁ NA Lei LEI Nº 13.431/2017 Art. 4º Para os efeitos desta Lei, sem prejuízo da tipifi cação das condutas criminosas, são formas de violência: I - violência física, entendida como a ação infl igida à criança ou ao adolescente que ofenda sua integridade ou saúde corporal ou que lhe cause sofrimento físico; II - violência psicológica: a) qualquer conduta de discriminação, depreciação ou desrespeito em relação à criança ou ao adolescente mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, agressão verbal e xingamento, ridicularização,indiferença, exploração ou intimidação sistemática (bullying) que possa comprometer seu desenvolvimento psíquico ou emocional; b) o ato de alienação parental, assim entendido como a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente, promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou por quem os tenha sob sua autoridade, guarda ou vigilância, que leve ao repúdio de genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculo com este; c) qualquer conduta que exponha a criança ou o adolescente, direta ou indiretamente, a crime violento contra membro de sua família ou de sua rede de apoio, independentemente do ambiente em que cometido, particularmente quando isto a torna testemunha; III - violência sexual, entendida como qualquer conduta que constranja a criança ou o adolescente a praticar ou presenciar conjunção carnal ou qualquer outro ato libidinoso, inclusive exposição do corpo em foto ou vídeo por meio eletrônico ou não, que compreenda: a) abuso sexual, entendido como toda ação que se utiliza da criança ou do adolescente para fi ns sexuais, seja conjunção carnal ou outro ato libidinoso, realizado de modo presencial ou por meio eletrônico, para estimulação sexual do agente ou de terceiro; b) exploração sexual comercial, entendida como o uso da criança ou do adolescente em atividade se- xual em troca de remuneração ou qualquer outra forma de compen- sação, de forma independente ou sob patrocínio, apoio ou incentivo de terceiro, seja de modo presen- cial ou por meio eletrônico; c) tráfi co de pessoas, entendido como o recrutamento, o transporte, a transferência, o alojamento ou o acolhimento da criança ou do adolescente, dentro do território nacional ou estrangeiro, com o fi m de exploração sexual, mediante ameaça, uso de força ou outra forma de coação, rapto, fraude, engano, abuso de autoridade, aproveitamento de situação de vulnerabilidade ou entrega ou aceitação de pagamento, entre os casos previstos na legislação; IV - violência institucional, entendida como a praticada por instituição pública ou conveniada, inclusive quando gerar revitimização. eletrônico, para estimulação sexual exploração sexual comercial, ou do adolescente em atividade se- tráfi co de pessoas, entendido como o recrutamento, o transporte, nacional ou estrangeiro, com o fi m inclusive quando gerar revitimização. 38 Fundação Demócrito Rocha | Universidade Aberta do Nordeste 3. Expressões da violência CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTES Segundo Faleiros (2000), a literatura sobre o tema assinala uma preocupa- ção em dividir (classifi car) a violência em três modalidades: física, psicoló- gica e sexual. Essa divisão por si só e de forma estanque é imprecisa. Daí porque a isso se acrescem referên- cias à violência estrutural, à violência institucional e à violência simbólica. Trata-se de uma tentativa de com- preender o fenômeno em suas diferen- tes manifestações. Porém, quando da análise de situações concretas de violên- cia, verifi ca-se que as suas variadas for- mas se misturam. A violência física, por exemplo, pode ser também psicológica, institucional e estrutural; não se trata de conceitos fe- chados e isolados uns dos outros, mas de entendimentos que são importantes para dar pista sobre como a família, a socieda- de e o Estado devem enfrentar as expres- 3. Expressões da violência CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTES Segundo Faleiros (2000), a literatura sobre o tema assinala uma preocupa- ção em dividir (classifi car) a violência em três modalidades: física, psicoló- gica e sexual. Essa divisão por si só e de forma estanque é imprecisa. Daí porque a isso se acrescem referên- cias à violência estrutural, à violência institucional e à violência simbólica. Trata-se de uma tentativa de com- preender o fenômeno em suas diferen- tes manifestações. Porém, quando da análise de situações concretas de violên- cia, verifi ca-se que as suas variadas for- mas se misturam. A violência física, por exemplo, pode ser também psicológica, institucional e estrutural; não se trata de conceitos fe- chados e isolados uns dos outros, mas de entendimentos que são importantes para dar pista sobre como a família, a socieda- de e o Estado devem enfrentar as expres- enfrentamento à violência sexual contra crianças e adolescentes 39 sões de violência. Afi nal, um dos primeiros passos para se superar determinado pro- blema é conhecê-lo. Tal esforço é funda- mental também para melhor delimitação dos responsáveis em cada espectro de ex- pressão de violência. Os conceitos adiante expostos partem da síntese utilizada pelo Disque 100, na publicação Sistematização da Metodolo- gia do Disque Denúncia Nacional – DDN 100 (2009), serviço de denúncias de vio- lações de direitos humanos, do Governo Federal, bem como dos conceitos presen- tes na publicação Escola que Protege, do Ministério da Educação. De forma geral, a violência contra crianças e adolescentes pode ser compre- endida como todo ato, de qualquer na- tureza, atentatório à dignidade humana da criança ou adolescente, praticado por agente em situação de poder e de desen- volvimento desigual em relação a esta (CARVALHO, PAIVA, ROSENO, 2007). 3.1 VIOLÊNCIA FÍSICA Representa o uso da força física de forma intencional, não acidental, por um autor que a provoca. Por vezes esses agentes são os próprios pais ou responsáveis, ou pessoas que possuem algum vínculo fa- miliar ou de confi ança, que muitas vezes machucam a criança ou adolescente, mes- mo sem a intenção de fazê-lo. A violência física pode deixar marcas evidentes e, em casos extremos, até causar a morte. A violência física se manifesta por meio de: (i) disciplina física abusiva de caráter supostamente corretivo (tapa, sur- ra, beliscão, cascudo etc.); torturas; con- fi namento; trabalho forçado ou mesmo pelo uso do corpo para prática de ato de cunho sexual (violência sexual). É muitas vezes acompanhada de so- frimento psíquico (violência psicológi- ca), gerando medo, trauma, ansiedade etc. Ao chegar aos serviços de proteção, é comum que essa violência seja negada e suas marcas justifi cadas como decorren- tes de acidentes. Profi ssionais dos servi- ços de saúde que atendem situações de violência ou de escolas que constatam ter o dever legal de notifi car tais casos. Nos termos da Lei nº 13.431/2017, considera-se violência física “a ação in- fl igida à criança ou ao adolescente que ofenda sua integridade ou saúde corpo- ral ou que lhe cause sofrimento físico”. No caso, o conceito legal está em sinto- nia com o entendimento doutrinário e acadêmico de tal expressão. 3.2 VIOLÊNCIA PSICOLÓGICA A violência psicológica constitui um con- junto de atitudes, palavras e ações que podem envergonhar, censurar e pressio- nar a criança ou o adolescente de modo temporário ou permanente. Ela ocorre quando se xinga, rejeita, isola, aterroriza, constrange, se exige demais das crianças e dos adolescentes, ou mesmo se utiliza delas para atender às necessidades dos adultos. Decorre de uma relação de poder de- sigual entre adultos dotados de autorida- de e crianças e adolescentes dominados. caráter supostamente corretivo (tapa, sur- ra, beliscão, cascudo etc.); torturas; con- fi namento; trabalho forçado ou mesmo pelo uso do corpo para prática de ato de É muitas vezes acompanhada de so- frimento psíquico (violência psicológi- ca), gerando medo, trauma, ansiedade etc. Ao chegar aos serviços de proteção, é comum que essa violência seja negada e suas marcas justifi cadas como decorren- tes de acidentes. Profi ssionais dos servi- ços de saúde que atendem situações de violência ou de escolas que constatam ter Nos termos daLei nº 13.431/2017, considera-se violência física “a ação in- fl igida à criança ou ao adolescente que ofenda sua integridade ou saúde corpo- ral ou que lhe cause sofrimento físico”. No caso, o conceito legal está em sinto- nia com o entendimento doutrinário e VIOLÊNCIA PSICOLÓGICA constitui um con- junto de atitudes, palavras e ações que podem envergonhar, censurar e pressio- nar a criança ou o adolescente de modo temporário ou permanente. Ela ocorre quando se xinga, rejeita, isola, aterroriza, constrange, se exige demais das crianças e dos adolescentes, ou mesmo se utiliza delas para atender às necessidades dos adultos. Decorre de uma relação de poder de- sigual entre adultos dotados de autorida- de e crianças e adolescentes dominados. 40 Fundação Demócrito Rocha | Universidade Aberta do Nordeste enfrentamento à violência sexual contra crianças e adolescentes 41 Muitas vezes se percebe um grau excessivo de tolerância diante de sua prática, em ra- zão de aspectos culturais que normalizam ou justifi cam tais condutas. Além disso, não deixa marcas aparen- tes, como no caso da violência física, de- mandando olhar atento para percebê-la. Nesse sentido, a intervenção profi ssional deve enxergá-la como uma questão de saúde mental. Uma das formas dessa violência que ganhou maior notoriedade é a intimida- ção sistemática (bullying), quando quem a pratica é as vezes outra pessoa – criança ou adolescente – do mesmo recorte ge- racional e inserido num mesmo contexto que a vítima (na escola, por exemplo). Suas formas extremas também podem confi gurar delitos, de acordo com o Códi- go Penal, tais como Constrangimento Ile- gal, Difamação, Injúria etc. Para a Lei nº 13.431/2017, há três tipos de violência psicológica: (a) a decorrente de discriminação, depreciação, intimi- dação, constrangimento que possa com- prometer o desenvolvimento psíquico ou emocional da vítima; (b) a alienação paren- tal, quando um dos genitores ou alguém com poder familiar fomenta na criança ou adolescente repúdio ou depreciação em relação ao outro genitor; (c) a exposição de criança ou adolescente a crime violento contra membro de sua família ou rede de apoio. Tais conceitos são amplos e guar- dam sintonia com o que já se compreende acerca deste tipo de violência. 42 Fundação Demócrito Rocha | Universidade Aberta do Nordeste 3.3 NEGLIGÊNCIA A negligência é a expressão da omissão de quem tem o dever de cuidar de crianças e adolescentes; família, sociedade e Estado. É fruto do descaso, da indiferença, da ne- gação da existência. NÃO SEGUE O Fio Muitas vezes, a negligência é o “primeiro estágio” e também “o fi o da meada” das diferentes formas de violência praticadas contra crianças e adolescentes. A falta de cuidado vai se agravando e evolui para outras expressões de violência, como física, psicológica ou sexual. A naturalização da falta de cuidado e respeito pode ter consequências sérias para crianças e adolescentes. TÁ NA Lei CÓDIGO PENAL ABANDONO DE INCAPAZ Art. 133. Abandonar pessoa que está sob seu cuidado, guarda, vigilância ou autoridade, e, por qualquer motivo, incapaz de defender-se dos riscos resultantes do abandono: Pena: detenção, de seis meses a três anos. EXPOSIÇÃO OU ABANDONO DE RECÉM-NASCIDO Art. 134. Expor ou abandonar recém-nascido, para ocultar desonra própria: Pena: detenção, de seis meses a dois anos. OMISSÃO DE SOCORRO Art. 135. Deixar de prestar assistência, quando possível fazê- lo sem risco pessoal, à criança abandonada ou extraviada, ou à pessoa inválida ou ferida, ao desamparo ou em grave e iminente perigo� ou não pedir, nesses casos, o socorro da autoridade pública: Pena: detenção, de um a seis meses, ou multa. Em situações extremas, a negligência pode confi gurar crimes (ex.: abandono de incapaz, exposição ou abandono de re- cém-nascido, omissão de socorro). enfrentamento à violência sexual contra crianças e adolescentes 43 3.4 VIOLÊNCIA SEXUAL É a violação dos direitos sexuais de crian- ças e adolescentes, porque abusa do cor- po e da sexualidade, seja pela força ou outra forma de coerção, ao envolvê-las em atividades sexuais impróprias para a sua idade cronológica ou para seu desenvolvi- mento pessoal. Trata-se de toda ação na qual uma pes- soa, em situação de poder, obriga outra à realização de práticas sexuais, por meio da força física, da infl uência psicológica (intimidação, aliciamento, sedução) ou mesmo do uso de arma ou droga. A violência sexual é todo ato, de qual- quer natureza, atentatório ao direito humano ao desenvolvimento sexual da criança e do adolescente, praticado por agente em situação de poder e de desen- volvimento sexual desigual em relação a crianças e adolescentes vítimas. Esta abordagem nos permite entender que a violência sexual: • é uma violação aos direitos huma- nos de crianças e adolescentes e que crianças e adolescentes têm direito ao desenvolvimento harmonioso e protegido de sua sexualidade; • pode ser realizada por atos comple- xos e de distintas expressões (físicas e ou psicológicas); • é praticada por alguém numa situ- ação de poder e desenvolvimento sexual desigual em relação à criança ou adolescente, valendo-se o autor desta relação desigual para a reali- zação da violência, razão pela qual deve ser considerada como conduta ilegal, passível de responsabilização. Historicamente, as formas de violência sexual foram sistematizadas pelo Instituto Interamericano del Niño (IIN), vinculado à Organização dos Estados Americanos (OEA), posteriormente consolidado pelo III Congresso Mundial de Enfrentamento da Exploração Sexual de Crianças e Ado- lescentes, subdividindo-se em: • abuso sexual: o qual pode ser intra- familiar ou extrafamiliar; • exploração sexual: se subdivide, por sua vez, em: no contexto da prostituição, no contexto do turis- mo, pornografi a infantil e tráfi co para fi ns de exploração sexual. O detalhamento dessa expressão de violência será objeto de módulos subse- quentes, razão pela qual não serão abor- dados aqui tais conceitos. Cabe registrar que a Lei nº 13.431/2017 fez uma distinção no conceito de violência sexual ao suprimir das manifestações da ex- ploração sexual a ocorrida “no contexto do turismo”. Ademais, cuidou acer- tadamente de assinalar que tan- to o abuso quanto a explora- ção podem acontecer no meio físico ou no am- biente virtual (atra- vés das tecnologias de informação e co- municação – TICs). sexual ao suprimir das manifestações da ex- ploração sexual a ocorrida “no contexto do turismo”. Ademais, cuidou acer- tadamente de assinalar que tan- to o abuso quanto a explora- ção podem acontecer no meio físico ou no am- biente virtual (atra- vés das tecnologias de informação e co- municação – TICs). 44 Fundação Demócrito Rocha | Universidade Aberta do Nordeste TRADUZINDO A VIOLÊNCIA Interno Internacional Violência contra crianças e adolescentes Institucional Sexual Psicológica Física Negligência Abuso sexual Exploração sexual Intrafamiliar Extrafamiliar Pornografi a No contexto da prostituição No contexto do turismo Tráfi co Física Negligência enfrentamento à violência sexual contra crianças e adolescentes 45 4. Outras faces DA VIOLÊNCIA Alguns pontos ainda merecem desta- que ao se abordar o tema da violência. Adiante são elencados aspectos que não representam expressões de violência pro- priamente ditas, mas destacam questões relacionadas ao contexto em que se dão determinadas violações de direito 4.3 VIOLÊNCIA SIMBÓLICA O sociólogo Pierre Bourdieu criou essa ca- tegoria com o intuito de descrever o pro- cesso pelo qual a classe dominante impõe sua cultura aos dominados,partindo do princípio de que a cultura ou o sistema simbólico são arbitrários e nem sempre estão pautados na realidade, mas muitas vezes em falsas construções sociais. Exemplos dessa violência: supor que a mulher é mais fraca do que o homem; que o índio é preguiçoso; que o negro é menos in- teligente; que o adolescente é revoltado etc. Tais estigmas também atingem e podem causar graves consequências no desenvol- vimento da infância e da adolescência. 4.1 VIOLÊNCIA INSTITUCIONAL Segundo a Lei nº 13.431/2017, a violência institucional é aquela “praticada por ins- tituição pública ou conveniada, inclusive quando gerar revitimização”. Percebe-se, assim, que tal conceito diz respeito à violência cometida por quem tem o dever legal de cuidar de crianças e adolescentes; as instituições integran- tes do Sistema de Garantia de Direitos. É aquela violência física, psicológica, sexu- al ou negligência que ocorre em abrigos, escolas, unidades de saúde, conselhos tutelares, delegacias, fóruns, serviços de assistência social, dentre outros. É importante destacar ainda, nesse contexto, a negligência profi ssional, ocor- rida quando o profi ssional de determina- da instituição despreza sinais, riscos ou mesmo se nega a perceber evidências de violações de direitos, seja por motivação religiosa ou política, preconceito, desinte- resse, despreparo etc. 4.2 VIOLÊNCIA ESTRUTURAL Falar de violência estrutural no Brasil é importante, pois, segundo Faleiros (2007), o Brasil é um país “com enormes desigualdades econômicas e sociais e historicamente classista, adultocêntrico, machista e racista”, especialmente violen- to com crianças e adolescentes pobres. Exemplo claro disso é o alto índice de adolescentes negros e pobres víti- mas da letalidade do Estado ou do cri- me organizado. IMPORTANTE Para entender melhor o tema, vale a pena conferir a publicação e campanha Cada Vida Importa, realizada pelo Comitê Cearense pela Prevenção de Homicídios na Adolescência, da Assembleia Legislativa do Ceará. Disponível em: cadavidaimporta.com.br 46 Fundação Demócrito Rocha | Universidade Aberta do Nordeste #FICAADICA Alguns fi lmes que abordam diferentes expressões da violência: • Preciosa: Uma História de Esperança: Claireece “Preciosa” Jones sofre privações inimagináveis em sua juventude. Abusada pela mãe, violentada por seu pai, ela cresce pobre, irritada, analfabeta, gorda, sem amor e geralmente passa despercebida. Uma história intensa de adversidade e esperança (2009, Estados Unidos, Diretor: Lee Daniels). • Má Educação: Quando um velho amigo entrega ao cineasta Enrique Goded um roteiro baseado na adolescência dos dois, Enrique é obrigado a reviver sua juventude em um internato católico. Alternando passado e presente, o roteiro acompanha um travesti que se reconecta com a antiga namorada. O encontro faz a personagem refl etir sobre a vitimização sexual e o trauma de esconder sua orientação sexual (2004, Espanha, Diretor: Pedro Almodóvar). Referências BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Casa Civil, 1988. Disponível em: http://www4.planalto. gov.br/legislacao. Acesso em: 02 out. 2019. BRASIL. Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8069/1990). Disponível em: http://www4.planalto.gov.br/ legislacao. Acesso em: 02 out. 2019. CADERNO de Textos do PAIR nº 2: Conteúdos para Capacitação. Disponível em: http://pair.ledes.net/gestor/titan. php?target=openFile&fi leId=1108. Acesso em: 02 out. 2019. CARVALHO, F. L.; PAIVA, L.; ROSENO, R. Estudo Proteger e Responsabilizar. O desafi o da resposta da sociedade e do Estado quando a vítima da violência sexual é criança ou adolescente. Brasília: Comitê Nacional de Enfrentamento da Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes, 2007. FALEIROS, Vicente de Paula; FALEIROS, Eva Silveira. Escola que protege: enfrentando a violência contra crianças e adolescentes. Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade, 2007, edição eletrônica. PAIVA, Leila. Violência Sexual Contra Crianças e Adolescentes como Violação dos Direitos Humanos: Construções Históricas e Conceituais. Violência Sexual Contra Crianças e Adolescentes: cenários amazônicos, rede de proteção e responsabilidade empresarial. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2017. v. 1. pp. 77-106. FALEIROS, Vicente de Paula; FALEIROS, Eva Escola que protege: enfrentando a violência contra crianças e adolescentes. Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e 2007, edição eletrônica. Contra Crianças e Adolescentes responsabilidade empresarial. PLANO Nacional de Enfrentamento da Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes, 2015. Disponível em: https://www.facabonito.org.br/plano- nacional. Acesso em: 02 out. 2019. SISTEMATIZAÇÃO da Metodologia do Disque Denúncia Nacional – DDN 100. Brasília: Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República/ Subsecretaria de Promoção dos Direitos da Criança e do Adolescente/ Programa Nacional de Enfrentamento da Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes, 2009. enfrentamento à violência sexual contra crianças e adolescentes 47 FERNANDO LUZ (autor) Advogado, graduado em Direito pela Universidade Federal do Ceará (UFC), mestre em Gestão do Conhecimento pela Universidade Católica de Brasília e integrante do Grupo de Pesquisa Nú- cleo de Estudos e Pesquisas Avançadas no Terceiro Setor (NEPATS) da Universidade Católica de Brasília. É consultor do projeto Edulivre (Unesco e Sesi). Atuou como consultor jurídico do Conselho Nacional do Sesi, coordenador adjunto do PAIR Mercosul, coordenador das áreas de encaminhamento e monitoramento do Disque 100 e assessor técnico do Programa Nacional de Enfrentamento da Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República. RAFAEL LIMAVERDE (ilustrador) É ilustrador, chargista e cartunista (premiado internacionalmente) e xilogravurista. Formado em Artes Visuais pelo Instituto Federal de Educação, Ciências e Tecnologia do Ceará (IFCE). Escreve e possui livros ilustrados nas principais editoras do Ceará e em editoras paulistas. Realização NOSSA VOZ. NOSSA FORTALEZA. Apoio EXPEDIENTE: FUNDAÇÃO DEMÓCRITO ROCHA João Dummar Neto Presidente André Avelino de Azevedo Diretor Administrativo-Financeiro Raymundo Netto Gerente Editorial e de Projetos Emanuela Fernandes e Aurelino Freitas Analistas de Projetos UNIVERSIDADE ABERTA DO NORDESTE Viviane Pereira Gerente Pedagógica Marisa Ferreira Coordenadora de Cursos Joel Bruno Designer Instrucional CURSO ENFRENTAMENTO À VIOLÊNCIA CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTES Valéria Xavier Concepção e Coordenadora Geral Leila Paiva Coordenadora de Conteúdo Amaurício Cortez Editor de Design e Projeto Gráfi co Miqueias Mesquita Designer/Diagramador Rafael Limaverde Ilustrador Milena Bandeira Revisora ISBN: 978-85-7529-936-4 (Coleção) ISBN:978-85-7529-939-5 (Fascículo 3) Este fascículo é parte integrante do Programa de Combate à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes, em decorrência do Termo de Fomento celebrado entre a Fundação Demócrito Rocha e a Câmara Municipal de Fortaleza, sob o nº 001/2019. Todos os direitos desta edição reservados à: Fundação Demócrito Rocha Av. Aguanambi, 282/A - Joaquim Távora Cep 60.055-402 - Fortaleza-Ceará Tel.: (85) 3255.6037 - 3255.6148 - Fax (85) 3255.6271 fdr.org.br fundacao@fdr.org.br
Compartilhar