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Saber Viver E D I Ç Ã O E S P E C I A L P A R A P R O F I S S I O N A I S D E S A Ú D E ADOLESCÊNCIA E AIDS Experiências e reflexões sobre o tema EDIÇÃO ESPECIAL SABER VIVER PROFISSIONAIS DE SAÚDE JANEIRO 2004 Coordenação, organização e edição: Adriana Gomez e Silvia Chalub Saber Viver Comunicação - saberviver@uol.com.br Projeto Gráfico e Arte Final: A 4Mãos Comunicação e Design Impressão: Minister Programa Nacional DST Aids: Alexandre Grangeiro, Diretor PNDST Aids Raldo Bonifácio, Diretor Adjunto Ricardo Pio Marins, Diretor Adjunto Denise Doneda, Unidade de Prevenção Vera Lopes, Unidade de Prevenção Eliane Izolan, Ascom Mauro Siqueira, Ascom Rogério Scapini, UDAT Cledy Eliana, UDAT Ilustrações: Jovens vivendo com HIV/aids que participaram das oficinas realizadas pelo Programa Nacional de DST/aids em diversas cidades do país em maio de 2003. Tiragem: 100.000 exemplares É permitida a reprodução total ou parcial dos artigos desta publicação, desde que citados a fonte e o respectivo autor. As opiniões aqui representadas são de exclusiva responsabilidade dos autores. Agradecimentos especiais a todos os profissionais de saúde que participaram desta publicação, divulgando suas experiências. SV Saber Viver Comunicação Material financiado pelo Programa Nacional de DST e AIDS / SVS-Ministério da Saúde Uma atenção especial ao adolescente soropositivo por Vera Lopes, Cledy Eliana e Suely Andrade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .6 Adolescência como oportunidade por Mario Volpi . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .8 Os adolescentes nos serviços de saúde por Viviane Castello Branco . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .10 A consulta do adolescente e jovem por Luiza Cromack, Maria Helena Ruzany, Eloísa Grossman e Stella Taquette . . . . . .12 Como atender o adolescente soropositivo por Maria Letícia Santos Cruz . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .15 Adolescentes e o tratamento anti-retroviral por Jorge Pinto . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .17 A diferença entre quem se infectou pelo HIV por transmissão vertical e horizontal por Marinella Della Negra . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .18 Revelação do diagnóstico e aconselhamento em HIV/aids por Débora Fontenelle, Denise Serafim e Sandra Filgueiras . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .19 Gestante HIV+: o atendimento em sala de espera por Iraína F de Abreu Farias, Maria de Fátima L Garcia, Regina T C Mercadante, Verônica M da Costa e Virgínia de A Ximenes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .22 Sexualidade, uso do preservativo e direito reprodutivo por Valdi Craveiro Bezerra . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .24 O espaço ideal para o adolescente soropositivo por Sidnei Pimentel . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .27 Serviço de saúde e sociedade civil: a importância das parcerias por Alaíde Elias da Silva e Edvaldo Souza . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .29 Tributo a um guerreiro por Juliana Mattos e Maria Helena Leite de Castro Mendonça . . . . . . . . . . . . . . . . . .31 Crianças e adolescentes no Fórum ONG/Aids de São Paulo por Elizabeth Franco Cruz . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .34 A experiência da Brinquedoteca do Gapa/Ba por Gladys Almeida e Isadora Oliveira . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .36 Adolescer em casa de apoio por Júlio Lancelotte . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .38 Trabalhar com adolescentes soropositivos: alegrias e problemas por Maria Lúcia Araújo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .39 O outro lado da moeda por Terezinha C R Pinto . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .40 A inclusão do adolescente na escola por Nájla Veloso . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .42 Lições de um programa de redução de danos por Tarcísio de Andrade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .45 Jovens em situação de rua: desafios para a prevenção por Verônica de Marchi . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .47 Adolescentes em conflito com a lei por André de Souza . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .49 Oficinas com adolescentes soropositivos por Luiza Cromack . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .50 Livros, sites, telefones e endereços – Dicas úteis . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .54 Sumário 4 Saber Viver >> [Profissionais de Saúde] [Profissionais de Saúde] << Saber Viver 5 Trabalhar com jovens soropositivos: Uma experiência enriquecedora aids no Brasil já completou 20 anos.As previsões pessimistas que tomavam conta da sociedade no início da epidemia, felizmente, não se concre- tizaram.Apesar de muitas perdas,hoje temos o que celebrar. A chegada à adolescência de meninos e meninas que, ao nascer na década de 80 ou início de 90, infectados pelo HIV, tinham pouca ou nenhuma chance de tratamento, sem dúvida, é um bom indício de que a aids está se tornando uma doença crônica. Cada aniversário desses jovens guerreiros foi e será motivo de comemoração para eles e para todas pessoas à sua volta,sejam familiares,funcionários de casas de apoio,voluntários de ONGs ou profissionais de saúde.Todos, sempre, com a emoção à flor da pele e também com a certeza de que terão muitos desafios pela frente. Foi pensando nesses desafios que a Saber Viver elaborou esta publicação destinada aos profissionais de saúde que, em seu cotidiano profissional, convivem com esses jovens. Nós nos aliamos ao esforço do Programa Nacional de DST/aids em aperfeiçoar o atendimento aos adolescentes vivendo com HIV/aids e promover a integração social deste grupo. Por diversas vezes,este ano,o PNDST/aids reuniu profissionais que já trabalham com jovens vivendo com HIV/aids em eventos realizados pelo Brasil. Na maioria deles,a Saber Viver esteve presente,colhendo dados e entrevistando pessoas. Ao organizar a presente revista,construída a partir dos temas discutidos durantes os encontros,nosso objetivo é tornar acessível aos profissionais de saúde,experiências e reflexões que possam colaborar para o aperfeiçoamento de ações voltadas aos adolescentes vivendo com HIV/aids e tornar a convivência de profissionais e jovens uma experiência enriquecedora para ambos. Além desta publicação,está sendo lançada,concomitamente,uma edição especial da Saber Viver destinada ao jovem soropositivo,voltada ao universo desse grupo. A partir do que aprendemos com estes trabalhos, temos a certeza de que não há regras pré-estabelecidas para o atendimento ideal. Pelo contrário, as especificidades individuais,culturais e sociais de cada jovem devem ser respeitadas e preservadas. Um grande abraço. Adriana Gomez e Silvia Chalub Saber Viver Comunicação A Uma atenção especial ao adolescente soropositivo Programa Nacional de DST/aids desenvolveu, em 2003, uma ampladiscussão sobre a situação dos adolescentes vivendo com HIV no país e sua rede de apoio social. A partir de um grupo de pro- fissionais de saúde e representantes de ONGs que, com sua larga experiência de trabalho junto a ado- lescentes,expressou diferentes preocupações no sentido de ampliar este trabalho,foi desencadeada uma série de encontros envolvendo adolescentes de algumas cidades e profissionais de todos os estados,com o objetivo de juntos elaborarmos diretrizes e propostas dirigidas ao trabalho com os adolescentes vivendo com HIV. Mais da metade das novas infecções por HIV que ocorre na atualidade afeta jovens de 15 a 24 anos de idade.No Brasil,estima-se que,a cada ano,quatro milhões de jovens tornam-se ativos sexualmente. Segundo a BEMFAM (DHS 1996), a idade mediana da primeira relação sexual para homens é de 14 anos, e para as mulheres, 15 anos. O início precoce da vida sexual pode ser considerado um agravante para o com- portamento de risco frente ao HIV/ aids. Em alguns países da América Latina e Caribe, pesquisas revelam um baixo índice do uso freqüente do preservativo entre os jovens de baixa escolaridade e um alto índice de gravidez e abortos realizados em condições de alto risco,entre pré-adolescentes e adolescentes. Na população brasileira,desde 2000,estão ocorrendo mais casos de aids em meninas do que em meninos,com idade entre 13 a 19 anos. No período de 2000 a 2002,foram notificados 531 novos casos de aids em meninas de 13 a 19 anos,contra 372 casos em rapazes da mesma idade,mostrando uma proporção de dois novos casos em mulheres para um caso em homens,logo no início da atividade sexual.Na faixa etária subseqüente (de 20 a 24 anos), a relação praticamente se igualou, com 2.346 casos em homens e 2.299 casos em mulheres nos últimos dois anos. O número elevado de ocorrências de gravidez na adolescência em jovens entre 10 e 19 anos (210.946 partos e 219.834 casos de abortos atendidos no Sistema Único de Saúde - SUS, no período de 1999 até abril deste ano), o aumento da ocorrência de doenças sexualmente transmissíveis e a intensificação do consumo de drogas lícitas (álcool, cigarro e tranqüilizantes) e ilícitas (maconha, cocaína e crack) – com a agravante do uso de drogas injetáveis com compartilhamento de agulhas e seringas – ajudam-nos a entender melhor porque os jovens brasileiros são,em cada vez maior número,vulneráveis à infecção pelo HIV/aids. 6 Saber Viver >> [Profissionais de Saúde] O VERA LOPES1, CLEDY ELIANA2 E SUELY ANDRADE3 1. ANTROPÓLOGA, ASSESSORA TÉCNICA DA UNIDADE DE PREVENÇÃO/PN DST AIDS 2. MÉDICA, ASSESSORA TÉCNICA DA UNIDADE DA UDAT/PN DST AIDS 3. PSICÓLOGA, ASSESSORA TÉCNICA DA SCDH/PN DST AIDS Caracteriza-se, ainda, como fator de vulnerabilidade dos jovens frente ao HIV/aids, a violência sexual praticada contra adolescentes, incluindo o abuso sexual e a exploração sexual comercial. A Rede Feminista de Saúde identificou que 48% dos atendimentos nos serviços de abortos previstos por lei são de jovens entre 10 e 19 anos. Educar os jovens sobre os riscos de transmissão do HIV, apoiá-los na cons- trução de habilidades para negociar, resolver conflitos e ter opiniões críticas melhora a confiança em si mesmos e aumenta a capacidade de tomar decisões responsáveis para se proteger e motivar seus parceiros e colegas para que tomem decisões seguras. Não é diferente para os adolescentes vivendo com HIV. Como conseqüência do uso da terapia anti-retroviral no Brasil,atualmente,chega- mos à primeira geração de adolescentes vivendo com HIV que se enquadram na categoria de transmissão vertical.São 1675 pessoas entre 10 e 19 anos fazendo uso da terapia anti-retroviral no país. No entanto, ainda nos deparamos com muitas barreiras que contribuem para uma baixa adesão ao tratamento em diferentes regiões do país. Daí a importância da abordagem integral do adolescente, para além do tratamento e administração da terapia anti-retroviral. O PN DST/Aids tomou a iniciativa de ouvir os adolescentes sobre o atendi- mento nos serviços de saúde e na rede de apoio social para orientar a formu- lação de diretrizes do Ministério da Saúde, considerando as demandas dos adolescentes.Para tanto,foram realizadas 8 oficinas de trabalho com os adolescen- tes em 8 cidades,além de três encontros macro regionais, nos quais estiveram presentes representantes de todas as unidades federadas: profissionais que atuam em serviços de saúde,profissionais da área da saúde do adolescente,ONGs, adolescentes vivendo com HIV/aids e adolescentes em situação de risco social. Finalmente,um fórum nacional alinhavou propostas para serem discutidas com outros programas governamentais,já que a atenção integral ao adolescente depende de políticas intersetoriais. As falas dos adolescentes vivendo com HIV nos mostraram avanços alcan- çados e,ao mesmo tempo,muitas neces- sidades e lacunas, tal como consta no documento preliminar do Fórum Na- cional: � Os adolescentes com vida sexual ativa têm tido acesso ao preservativo nos serviços de saúde; � Os adolescentes não têm espaços coletivos de interlocução para tratar de temáticas como a sexualidade, saúde reprodutiva, acesso e per- manência na escola, troca de vivências e suas percepções sobre as instituições de apoio social; � Os cuidadores/ familiares destes ado- lescentes têm pouca ou nenhuma oportunidade de discutirem, em espaços coletivos, suas dúvidas e alternativas para apoiarem adequadamente os adolescentes; � A maioria dos adolescentes que vivem em instituições de apoio, embora reconheçam e mantenham vínculo afetivo com estes cuidadores, têm expectativa de viverem com maior autonomia para tomada de decisões e em ambiente familiar – com madrinha, padrinho, avós, tios, etc; � A revelação do diagnóstico é uma grande dificuldade para profissionais de saúde e familiares – sendo que muitos adolescentes, embora "desconfiem" que são portadores do HIV, não tiveram ainda seu diagnóstico explicitado. A maioria destas situações foi constatada entre os adolescentes da categoria de transmissão vertical; � Muitos adolescentes têm tomado conhe- cimento do diagnóstico durante internação, na transmissão vertical ou no pré-natal, quando da transmissão sexual; � Estrutura dos serviços inadequada para atendimento dos adolescentes – espaços pouco humanizados e pensados para os adolescentes – ou são de pediatria ou são de adultos; � Falta de articulação dos serviços es- pecializados de aids e serviços de saúde do adolescente; � Reconhecem nos profissionais de saúde um bom acolhimento individual e apontam para a necessidade de serem atendidos por diferentes profissionais, como psicólogos e assistentes sociais; � Discriminação – receio de revelar seu estado sorológico a amigos, receio do isolamento, referência a situações de discriminação pre- conceito na escola. Enfim, propor atenção especial para o adolescente soropositivo nos remete à necessidade de avaliar o quanto temos dedicado de atenção ao aolescente de um modo geral… Como os profissionais da saúde têm convivido com as especifici- dades expressas neste período da vida? [Profissionais de Saúde] << Saber Viver 7 O PN DST Aids tomou a iniciativa de ouvir os adolescentes sobre o atendimento nos serviços de saúde e na rede de apoio social para orientar a formulação de diretrizes do Ministério da Saúde, considerando as demandas dos adolescentes visão predominante e estereotipada de nossa sociedade sobre adolescência pode ser resumida na expressão "aborrecência". Mais do que uma simples brincadeira com a palavra, trata-se de uma visão fundada noolhar do adulto sobre esta fase da vida. Um olhar preconceituoso que vê o adolescente por aquilo que ele não é: não é maduro, não é responsável, não é paciente, não é obediente ... Diversas explicações sobre esta fase da vida foram construídas a partir da observação de aspectos do desenvolvimento físico e psicológico do adolescente, resultando numa visão reducionista da adolescência como fase da explosão de hormônios, das tensões e conflitos por afirmação da identidade,da inquietude e da contestação dos valores dos adultos. Ao observarmos a participação dos adolescentes nos diferentes campos da vida social,percebemos que os aspectos citados fazem parte da adolescência,mas não são toda a adolescência. Fase da vida,com características específicas de desenvolvimento, a adolescência está longe de ser um problema como pode parecer a adultos e teóricos do tema.Antes de tudo,a adolescência é uma grande oportunidade. Oportunidade para o próprio adolescente, pois, em função do seu desen- volvimento,sua capacidade de aprendizagem é mais veloz e sua abertura para novas relações possibilita-lhe transcender ao universo familiar. Como sujeito que vai ampliando sua autonomia diante do mundo, o adolescente abre-se para novas experiências,enfrentando desafios e propondo-se a participar como parte da solução dos seus próprios problemas e dificuldades. Oportunidade para a família, que passa a ter um sujeito que, além de demandar atenção e cuidados, pode contribuir na tomada de decisões; ajuda na solução de problemas; insere a família em novos contextos culturais, artísticos e de lazer; e interage de forma mais crítica, levando os pais e adultos a reverem suas atitudes, posturas e valores.Toda a família cresce e evolui quando o adolescente encontra nela um espaço de realização. O mito de que a adolescência é uma fase de ruptura com a família não se sustenta quando observamos o resultado da pesquisa “A voz dos adolescentes” (Unicef, 2002), que demonstrou que, entre diferentes formas de 8 Saber Viver >> [Profissionais de Saúde] Adolescência como oportunidade A MÁRIO VOLPI OFICIAL DE PROJETOS DO UNICEF NO BRASIL E COORDENADOR DO PROGRAMA CIDADANIA DOS ADOLESCENTES expressão, 95% dos adolescentes afirmaram ser a família o seu principal espaço de realização e de prazer, onde se sentem bem, onde buscam apoio e onde se sentem valorizados. A adolescência é também uma grande oportunidade para a comunidade. Grupos de adolescentes fazendo teatro, música, esportes, defendendo o meio ambiente, debatendo as questões relativas à sexualidade, produzindo seus próprios meios de comunicação,organizando ações de voluntariado e assumindo responsabilidades nos grupos e associações comunitárias dão vida às comunidades e constituem-se em verdadeiros atores sociais capazes de modificar para melhor o lugar onde vivem. São adolescentes comunicadores que,na rádio comunitária,no jornalzinho que circula na escola e no grupo de teatro que debate questões como a violência, movimentam toda a comunidade com idéias novas e abordagens diferenciadas para velhos temas, gerando uma dinâmica de descobertas dos valores,da cultura,da história e das pessoas da comunidade que, em geral, são esquecidas pela supervalorização dos produtos culturais da sociedade de consumo. A adolescência é também uma grande oportunidade para as políticas públicas.A escola,os programas de saúde,de assistências social,de trabalho,de cultura,esporte e lazer,dentre outros,podem se transformar em espaços de experiências profundas de cidadania, desde que sejam capazes de favorecer o diálogo, a participação e a presença dos adolescentes com seus saberes,desejos, sonhos e vivências. As experiências de participação de adolescentes na gestão das políticas públicas como, por exemplo, nos Conselhos de Direitos da Criança e do Adolescente, demonstram que a simples presença de adolescentes nas plenárias do conselho modifica a agenda,obriga a um debate mais objetivo e pragmático e traz a discussão das políticas públicas para o cotidiano de suas necessidades e direitos. Portanto, os mais de 21 milhões de adolescentes brasileiros representam uma grande oportunidade de desenvolvimento e mudanças positivas para o país.Tratá-los como problema implica reprimir todas as forças criativas e construtivas presentes nesta fase da vida.Tratá-los como cidadãos, sujeitos de direitos e atores sociais com uma contribuição específica para a sociedade, contribuirá para fazer um mundo melhor para todos. [Profissionais de Saúde] << Saber Viver 9 Grupos de adolescentes dão vida às comunidades e constituem-se em verdadeiros atores sociais capazes de modificar para melhor o lugar onde vivem VIVIANE MANSO CASTELLO BRANCO PEDIATRA – MESTRE EM SAÚDE PÚBLICA COLETIVA – GERENTE DO PROGRAMA DE SAÚDE DO ADOLESCENTE DA SECRETARIA MUNICIPAL DE SAÚDE-RJ u,que era apenas uma menina de cabeça baixa,perce- bi que conseguia fazer tudo o que queria: consegui dar apoio às meninas grávidas, dei informações, con- segui dar amor e,melhor,consegui me sentir útil.Ago- ra, vejo a vida com outro olhar.Aprendi que devemos lutar pelos nossos objetivos" (Branco et al. 2003). O depoimento de C., jovem de 18 anos, mãe de dois filhos e promotora de saúde do Adolescentro da Maré, no Rio de Janeiro, ilustra porque diferentes trabalhos (Costa, 1999;Brasil,1999) têm apontado o protagonismo juvenil como estratégia privilegiada para promover a saúde e o desenvolvimento do adolescente e da comunidade na qual está inserido. O envolvimento direto do adolescente no planejamento,implementação e avaliação das ações aumenta sua auto-estima, favorece sua autonomia, amplia suas oportunidades de desenvolvimento pessoal e profissional,melhora sua qualidade de vida e contribui para dar legitimidade e relevância ao trabalho do setor saúde junto a outros jovens. Embora a experiência venha mostrando a relevância da atuação dos adolescentes como promotores de saúde nas unidades de saúde e na comunidade, a implantação dessa proposta não é simples. Para que os profissionais incentivem a participação do adolescente,é preciso que aceitem a sua autonomia e percebam o que é ser jovem na sociedade atual e as contribuições que os adolescentes podem dar. Exige, portanto, uma nova relação dos profissionais de saúde com eles mesmos,com os adolescentes e com os demais setores da sociedade.A avaliação do Programa de Saúde do Adoles- cente da Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro,realizada em parceria com o NESC/UFRJ (Branco,2002), identificou alguns dos elementos que dificultam a par- ticipação dos adolescentes nos serviços de saúde.Ao estudar os sentidos que os pro- fissionais de saúde atribuem à saúde do adolescente, percebe-se uma ênfase muito grande na informação. Dessa forma,os profissionais valorizam o seu próprio trabalho, e a crença na sua capacidade de mudar comportamentos,deixando em segundo pla- no o papel da sociedade,da família e dos próprios adolescentes em promover a saú- de.Além disso, ao descreverem o adolescente que sua unidade atende, destacam as 10 Saber Viver >> [Profissionais de Saúde] Os adolescentes nos serviços de saúde E“ carências em detrimento de suas poten- cialidades. Essas posturas dificultam uma relação mais horizontal com os adoles- centes. Por outro lado,o mesmo estudo mostrou importantes avanços como a valorização do trabalho em equipe e a ênfase na disponibilidade do profissio- nal,na escuta e na adequação da unidade às necessidades dos adolescentes como elementos importantes na captação, adesão e qualidade na atenção. Para que se possa avançar na promo- ção da autonomia,da saúde e do bem es- tar dos adolescentes e ampliar suas opor- tunidadesde participação é fundamental que os serviços de saúde: � garantam espaços democráticos de planejamento, avaliação e troca de experiências entre os trabalhadores da unidade. Se os profissionais não opinam sobre o seu próprio trabalho, como podem abrir espaço para a participação dos adolescentes ou de qualquer outro usuário? As atividades devem favorecer uma reflexão sobre o papel dos profis- sionais frente ao adolescente,à família e à comunidade, de forma a promover mudanças; � propiciem a seus trabalhadores oportunidades de reflexão e auto-conhe- cimento, abrindo para os profissionais de saúde novas possibilidades de trans- formação e crescimento pessoal em ou- tras áreas que estão além do intelecto (Branco e Robin, 2002). É importante que eles possam repensar valores, dese- jos,sentimentos,surpreender-se consigo mesmos e descobrir suas próprias poten- cialidades,sua criatividade e capacidade de transformação. Só dessa forma pode- rão valorizar as potencialidades dos ado- lescentes e estar disponíveis para im- plantar as inovações propostas por eles; � percebam que o adolescente não é "propriedade" de nenhum serviço em especial.Toda a unidade deve se respon- sabilizar pelos adolescentes,capacitando- se para lidar com suas especificidades individuais, culturais e sociais, mesmo que haja profissionais mais interessados e preparados para lidar com esse grupo. O intercâmbio entre os programas, os serviços e os usuários de diferentes gerações é essencial para uma aborda- gem mais holística.Um adolescente soro- positivo,por exemplo,além de ser acom- panhado pelo serviço específico, deve poder participar dos grupos de adoles- centes e das demais atividades culturais, esportivas e lúdicas desenvolvidas pelos parceiros. Pouco adianta organizar um serviço de qualidade, se as diferentes portas de entrada da unidade (como o balcão,o guarda,o setor de Imunizações, o teste de gravidez,entre outros) afastam os adolescentes por desrespeitarem os princípios básicos do atendimento; � resguardem o sigilo e a confiden- cialidade como elementos fundamentais para a captação e adesão dos adolescen- tes ao serviço; � consigam dar visibilidade aos ado- lescentes que já freqüentam a unidade de saúde,como clientes ou como acom- panhantes, aproveitando ao máximo todas as oportunidades para divulgar e facilitar o acesso às atividades que o serviço oferece; � respeitem as singularidades relati- vas à idade,gênero,raça/etnia,condição sócio-econômica, vínculos familiares, domicílio, incapacidades,escolaridade e trabalho,entre outras; � utilizem metodologias participati- vas que promovam o desenvolvimento de habilidades e favoreçam a reflexão e a troca de experiências; � estabeleçam parcerias e projetos integrados com outros setores de forma a ampliar sua atuação junto aos adoles- centes, criar retaguardas e oferecer acesso a atividades profissionalizantes, esportivas, artísticas e de convivência comunitária; � ampliem gradativamente os espa- ços de participação dos adolescentes nos serviços,ouvindo e implementando suas propostas e criando parcerias com grupos organizados de jovens. Só o esforço integrado dos diferentes atores poderá tornar os serviços de saúde mais aptos a interagir com os adolescentes, incentivando a sua participação nas atividades de aconse- lhamento e promoção de saúde desen- volvidas na unidade e na comunidade. Dessa maneira, estarão criando oportu- nidades para que outros jovens de cabe- ça baixa possam erguê-la e encarar a vida de forma mais construtiva e otimista. Referências Bibliográficas: COSTA, A.C.G. O Adolescente como Protagonista. In: SCHOR,N; MOTA, M.S.T; BRANCO, V.C (org). Cadernos de Juventude, Saúde e Desenvolvimento. Brasília: Ministério da Saúde, 1999. BRASIL. Saúde e desenvolvimento da juventude brasileira: construindo a agenda nacional. Brasília: Ministério da Saúde, Secretaria de Políticas de Saúde, 1999. BRANCO, V.M.C., ROBIN, M. Contribuindo para o desenvolvimento pessoal do profissional de saúde. Saúde em foco. Rio de Janeiro, n.23, julho/2002. BRANCO, V.M.C. Emoção e razão: os sentidos atribuídos por profissionais de saúde à atenção ao adolescente. Dissertação de Mestrado em Saúde Coletiva. Rio de Janeiro: Núcleo de Estudos em Saúde Coletiva, Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2002. BRANCO, V.M.C; COUTINHO, M.F.G.C; MEDEIROS, d.C.; PEREIRA,A.R. Fomentando a participação dos adolescentes. Anais do VII Congresso Brasileiro de Saúde Coletiva. ABRASCO, 2003. [Profissionais de Saúde] << Saber Viver 11 s adolescentes atravessam um processo dinâmico e complexo de mudanças.As transformações do cor- po, o surgimento de novas habilidades cognitivas e seu novo papel na sociedade são determinantes do questionamento dos valores que os cercam. Muitas vezes se predispõem a novas experiências, que po- dem ameaçar sua saúde,como por exemplo,exposição a risco de acidentes,relações sexuais desprotegidas e uso de drogas. A assistência aos adolescentes e jovens nos serviços de saúde não deve ser desvinculada do contexto em que vivem.Houve mudanças significativas no perfil de morbi-mortalidade neste grupo populacional, com aumento de agravos que poderiam ser evitados por medidas de promoção de saúde e prevenção, como a aids. Cabe aos profissionais de saúde incluir medidas preventivas como componente fundamental de sua prática clínica. A equipe de saúde A atenção integral à saúde de adolescentes e jovens requer a abordagem de profissionais de diversas disciplinas que devem interagir através de um enfoque multi ou interdisciplinar. O trabalho multidisciplinar tem como principal característica a prestação do serviço a uma mesma população através da interconsulta ou referência. Essa atuação, mesmo com uma boa interação entre os componentes da equipe, é realizada de forma independente, às vezes em diferentes locais e na maioria das situações com a visão apenas de sua própria especialidade e/ou disciplina. O trabalho interdisciplinar é centrado no sujeito,não havendo limites disciplinares. Define-se a equipe interdisciplinar como um conjunto de profissionais de diferentes disciplinas que interatuam para prestar o atendimento ao cliente. Ele permite uma discussão conjunta.As decisões são compartilhadas e tomadas dentro das diferentes perspectivas,resultando em uma proposta de intervenção mais eficaz. A recepção nos serviços de saúde A acolhida aos adolescentes e jovens nos serviços deve ser cordial e compreensiva, para que se sintam valorizados e à vontade,buscando garantir sua adesão ao serviço, 12 Saber Viver >> [Profissionais de Saúde] A consulta do adolescente e jovem O LUIZA CROMACK1, MARIA HELENA RUZANY2, ELOÍSA GROSSMAN3, STELLA TAQUETTE4 1 GINECOLOGISTA E OBSTETRA. MESTRADO EM SAÚDE COLETIVA PELO NESC/UFRJ 2.DIRETORA DO NÚCLEO DE ESTUDOS DA SAÚDE DO ADOLESCENTE (NESA) 3 E 4. PEDIATRAS DO NESA que deve ser permanentemente acessível. Muitas vezes, eles têm dificuldades em respeitar os horários de agendamento, determinando que o serviço construa mecanismos de organização mais flexíveis. Vale lembrar que toda a equipe está envolvida neste acolhimento e deve estar capacitada para o mesmo: segurança, porteiro, recepcionista, auxiliar de enfermagem A adequação do espaço físico Em geral, os adolescentes preferem uma sala de espera exclusiva para sua utilização nos horários de atendimento. Esse espaço deve ser, acima de tudo, acolhedor e confortável para os clientes e seus acompanhantes. Isto pressupõe locais amplos, bem ventilados e limpos, adequados para o desenvolvimento de atividades de grupo que podem ter múltiplos objetivos,tais como a apresentaçãodo serviço, integração com a equipe e educação para a saúde. O acesso a materiais educativos (livros, revistas, vídeos, programas de informática) é de grande valor porque, além de facilitar a troca de informações, ajuda a aproveitar o tempo livre e permite o desenvolvimento de autonomia nas escolhas. Divulgação dos serviços existentes e local para distribuição de preservativos,bem como materiais específicos sobre DST/aids e práticas sexuais mais seguras devem estar disponíveis. A entrevista – características do profissional de saúde Independentemente da razão que faz com que o adolescente/jovem procure o serviço de saúde, cada visita oferece ao profissional a oportunidade de explorar outros aspectos de sua vida,contribuindo para a detecção,reflexão e resolução de ou- tras questões distintas do motivo principal da consulta.A entrevista deste usuário e sua família ou acompanhante é um exercício de comunicação interpessoal, que engloba a comunicação verbal e a não-verbal.Além das palavras,deve-se estar atento às emoções, gestos, tom de voz e expressão facial do cliente. É importante formular perguntas que auxiliem a conversação, buscando compreender sua perspectiva, afastar preconceitos, evitando fazer julgamentos, especialmente no que diz respeito à abordagem de determinadas temáticas como sexualidade e uso de drogas. O profissional de saúde não deve ficar restrito a obter informações sobre o motivo focal que levou o adolescente ao serviço de saúde,mas oferecer um espaço de escuta, para que o adolescente se sinta à vontade para trazer dúvidas e anseios, que muitas vezes escondem-se em uma dor física. As ações preventivas como componentes da consulta É importante trocar informações com os adolescentes a respeito de seu crescimento físico e desenvolvimento psicossocial e sexual. Deve ser discutida a importância de se tornarem ativamente envolvidos em decisões pertinentes aos cuidados de sua saúde, como uso de preservativos e outros métodos para evitar gravidez, adesão a tratamentos etc.As consultas são momentos privilegiados para o aconselhamento de práticas sexuais responsáveis e mais seguras.Também se tornam um espaço de esclarecimento de dúvidas,de conversa sobre a importância do afeto, do cuidado e do prazer nas relações e de aconselhamento sobre situações de risco para abuso sexual. O consumo de cigarros,álcool ou drogas ilícitas e anabolizantes deve ser abordado nas consultas para reflexão e encaminhamento. Outros assuntos importantes são as dificuldades na escola e no trabalho. Essa abordagem deverá ser desenvolvida de [Profissionais de Saúde] << Saber Viver 13 forma criativa,não se revestindo de um caráter inquisitivo. Não há obrigatoriedade de esgotar todos os tópicos em uma única ocasião. A familia É importante estar disponível para atender o paciente e sua família sem autoritarismos, promovendo uma relação profissional horizontal. De forma ideal, devem existir dois momentos na consulta: o adolescente sozinho e com os fami- liares/acompanhantes. Entrevistar o adolescente sozinho cria a oportunidade de es- timulá-lo ao diálogo,buscando que se torne,de forma progressiva,responsável por sua própria saúde e pela condução de sua vida.A entrevista com a família é fundamental para o entendimento da dinâmica e estrutura familiar e para a elucidação de dados da história pregressa e atual. Bem como inserir a família/cuidadores no acompanhamen- to e apoio do adolescente,construindo um vínculo de parceria entre equipe de saúde – familiares e adolescente. É fundamental que o adolescente e a família tenham cla- ro o papel confidencial e sigiloso da consulta do adolescente, que é o foco da equi- pe, sem o que ficaria comprometida toda a assistência. Trabalho de grupo/dinâmicas É bastante interessante que todo o serviço voltado para adolescentes possa desenvolver práticas educativas de grupo. Estas práticas visam proporcionar um espaço de troca de vivências, no qual o adolescente possa sentir-se à vontade para trazer suas dúvidas e compartilhá-las com o grupo. Neste espaço, trabalha-se com o conhecimento trazido pelos participantes buscando a construção do conhecimento daquele grupo. Para isso, são utilizadas técnicas lúdicas, tais como desenho, corte e colagem, dramatização, exposição de vídeo entre outras.A coordenação idealmente é realizada por dois profissionais de saúde capacitados, de qualquer categoria profissional. O adolescente sugere os temas a serem discutidos e estabelece con- juntamente com a coordenação as normas de funcionamento do grupo. São temas que sempre surgem:conhecimento do corpo,gênero,sexualidade,namoro,masturbação, virgindade,contraceptivos e DST/aids. O grupo deve ter duração máxima de duas horas para não perturbar a rotina de adolescentes e cuidadores,e a confidencialidade é um ponto a ser marcado. É uma ati- vidade de que os adolescentes gostam muito e que complementa o trabalho da consulta individual. O mesmo trabalho pode também ser realizado com familiares e cuidadores. Conclusão O momento da consulta dos adolescentes e jovens,bem como das atividades de grupo, deve ser aproveitado pela equipe de saúde para a troca de informações. A equipe deve ter em mente que,tratando-se de uma população em constante mudança, é necessário que,para aumentar a efetividade dos serviços,exista uma preocupação de conhecer o que está em transição e os novos costumes adotados. Outra questão,que muitas vezes os serviços evitam adotar,é a maior participação do usuário na gestão e na atenção prestada. Com esse grupo etário,o distanciamento poderá significar a pouca compreensão das normas e condutas, diminuindo a aderência ao serviço e às atividades planejadas. É muito importante que o adolescente sinta que faz parte daquele serviço e ajude a construí-lo. 14 Saber Viver >> [Profissionais de Saúde] A atenção integral à saúde de adolescentes e jovens requer a abordagem de profissionais de diversas disciplinas que devem interagir através de um enfoque multi ou interdisciplinar oucas são as unidades que possuem serviço ou setor voltado para a assistência ao adolescente. Normalmente,os serviços de Medicina do Adolescente estão em hospitais universi- tários e a maioria dos programas de aids não conta com es- sa opção de assistência. Para muitos profissionais de saúde,os adolescentes são pessoas desagradáveis, mal educadas e intratáveis. A intolerância e o despreparo de muitos profissionais dificultam e podem inviabilizar o acesso do jovem aos cuidados necessários. O serviço que recebe pessoas soropositivas entre 10 e 20 anos deve contar com profissionais que gostem de trabalhar com adolescentes e que estejam preparados especificamente para acompanhar portadores de HIV.A identificação de profissionais com essas características é o ponto de partida para o trabalho.A complexidade da demanda faz com que seja indispensável o trabalho em equipe. Não queremos aqui propor nenhuma fórmula ou composição formal de equipe, mas pelo menos duas pessoas precisam estar envolvidas e disponíveis para a assistência a adolescentes HIV +. Podem ser dois médicos, um médico e um enfermeiro, um médico e um psicólogo ou assistente social. O ideal é que essas pessoas estejam articuladas às diferentes formas de assistência que podem ser necessárias (SAE, Hospital Dia, internação e atendimento domiciliar) e que mantenham o contato com os pacientes mesmo quando eles forem transferidos temporária ou definitivamente para esses serviços. O objetivo deve ser prestar assistência integral ao adolescente HIV+ desde o momento do diagnóstico até o fim da adolescência (idade variável) quando ele poderá ser transferido para um programa de aids geral, dentro da mesma unidade e às vezes com a mesma equipe.A experiência do Hospital dos Servidores do Estado do Rio de Janeiro O atendimento a adolescentes soropositivos no Hospital dos Servidores do Estado ocorre no serviço de Doenças Infecciosas e Parasitárias (DIP). O hospital não conta com serviço específico para adolescentes. Definimos,no ambulatório geral do DIP,um horário específico para atendê-los. [Profissionais de Saúde] << Saber Viver 15 Como atender o adolescente soropositivo Maria Letícia Santos Cruz MÉDICA PEDIATRA E INFECTOLOGISTA DO SERVIÇO DE DOENÇAS INFECCIOSAS DO HOSPITAL DOS SERVIDORES DO ESTADO DO RJ P O serviço devecontar com profissionais quegostem de trabalhar com adolescentes e que estejam preparados especificamente para acompanhar portadores de HIV A equipe é composta por uma médica infectologista e uma pediatra, uma psicóloga e duas enfermeiras. O serviço de DIP conta com uma assistente social e com setores de SAE,internação, Hospital Dia e atendimento domiciliar. Os adolescentes têm consultas mensais no DIP, geralmente no dia em que é desenvolvida uma atividade em grupo. O início dos anti-retrovirais é adiado enquanto o estado clínico e imu- nológico (contagem de células CD4) permitirem. Sempre que possível, optamos por usar esquemas simplifica- dos, com drogas que possam ser usadas uma ou duas vezes ao dia. Todos são tratados de acordo com o Guia de Trata- mento Clínico da Infecção pelo HIV em adultos e adolescentes do Programa Nacional de DST/aids do Ministério da Saúde. No serviço de DIP do Hospital dos Servidores do Estado, são atendidos adolescentes provenientes de dois pro- gramas:aids pediátrico e ambulatório de prevenção de transmissão vertical do HIV.Apesar de terem em comum o vírus, são populações com características bem distintas. Da Imunopediatria para o DIP Os pacientes da Imunopediatria normalmente já são acompanhados naquele setor há alguns anos e estão habituados ao ambulatório e enfermaria de Pediatria. Os pediatras,muitas vezes, adiam ao máximo a transferência desses pacientes para o programa de adolescen- tes. São jovens que, em alguns casos, apresentam atraso no desenvolvimento somático e emocional decorrentes da in- fecção e de situações de perdas asso- ciadas ao HIV. A transferência geralmen- te só se concretiza quando se torna inevitável,como na necessidade de uma internação hospitalar que não pode mais ocorrer na enfermaria de pediatria. Nes- sas situações, a internação tem sido tra- balhada pela equipe como uma opor- tunidade de aproximação do jovem com o serviço do DIP,devido à possibilidade de contatos diários entre o paciente e diferentes profissionais. Esses pacientes geralmente já estão em uso de anti-re- trovirais e nessa ocasião a administração das drogas deve ser revista pela equipe, que identifica quem é o responsável por "se lembrar" dos remédios.Normalmente um adulto ou irmão mais velho tem essa responsabilidade e o adolescente pode ou não estar comprometido com seu tratamento. Durante esses primeiros contatos, o comprometimento com o próprio tratamento é estimulado. Outro problema com os adolescen- tes provenientes do programa de aids pediátrico é que eles,por vezes,chegam ao nosso ambulatório ainda sem conhe- cer sua condição de portador de HIV. A revelação do diagnóstico pode levar bastante tempo ou se completar em poucas consultas.Tudo depende da resposta do adolescente, à medida que damos as informações. Logo nas primei- ras consultas, conversamos na presença dos pais sobre o que o novo paciente sabe a respeito do problema que o traz tão freqüentemente às consultas. Deixa- mos claro para os pais que vamos preci- sar informar o adolescente sobre sua condição de HIV + . Nem sempre os pais aceitam bem a idéia neste momento. Às vezes, a família precisa de um tempo antes da revelação. Gravidez precoce e HIV As meninas provenientes do ambulatório de prevenção de trans- missão vertical do HIV (onde a cada ano cresce o número de gestantes infectadas entre 13 e 18 anos) chegam ao serviço precisando lidar com dois fatos novos em suas vidas: a maternidade precoce (apesar de algumas vezes desejada e até planejada) e a infecção pelo HIV. O serviço oferece testagem para os parceiros das gestantes e aqueles com diagnóstico positivo para o HIV que estão na mesma faixa etária das parceiras também são admitidos para acom- panhamento. Grupos de discussão Desde o início,tivemos a proposta de formar um grupo de adolescentes que favorecesse a discussão e a troca de experiências entre jovens com o mesmo "desafio". Mas o grupo demorou mais de oito meses para se formar.Durante os pri- meiros meses, o encontro dos jovens ocorreu apenas na sala de espera do ambulatório,pois a freqüência era muito irregular e a resistência ao acompanha- mento era patente. Apesar de conversa- rem muito pouco entre si, eles percebe- ram que aquele espaço/horário era destinado a eles e que o serviço os estava acolhendo. Nesses primeiros meses,eles tiveram acesso a atendimentos indivi- duais com a médica,a psicóloga e a enfer- meira. Com o tempo,esses encontros in- formais facilitaram a formação do grupo. Desde que tiveram início, em 2002, os encontros em grupo têm acontecido regularmente e são agendados uma vez 16 Saber Viver >> [Profissionais de Saúde] Procuramos afinar o conhecimento dos profissionais sobre adolescência e discutir os casos regularmente O adolescente infectado pelo HIV através de transmissão sexual ou uso de drogas injetáveis,após a puberdade,pare- ce ter curso clínico semelhante ao do adulto. Entretanto,um número crescente de crianças infectadas perinatalmente pelo HIV está atingindo a adolescência e apresenta curso clínico diferente dos adolescentes infectados mais tardiamente. A prescrição de medicação anti-retro- viral deve ser adaptada de acordo com o estadiamento da puberdade. Para isto, utiliza-se a escala de Tanner. O adoles- cente nas fases iniciais da puberdade (Tanner I e II) deve ser tratado segundo as recomendações pediátricas,enquanto aquele em fase adiantada de maturação sexual (Tanner V) deve seguir as reco- mendações estabelecidas para os adultos. Nas fases intermediárias (Tanner III e IV), o tratamento deve ser individualizado a critério médico. As rápidas transfor- mações biológicas observadas nos adoles- centes requerem adequações posológicas freqüentes, monitorando toxicidade e eficácia do regime anti-retroviral em uso. Os adolescentes precisam conhecer sua condição de infectados pelo HIV e ser totalmente informados sobre os diferentes aspectos e implicações da infecção,a fim de cumprirem adequadamente as orientações médicas. Além disso, necessitam ser orientados sobre os aspectos de sua sexualidade e os riscos de transmissão sexual aos seus parceiros. Finalmente, devem ser encorajados a envolver seus pais ou responsáveis em seu atendimento. A adesão do adolescente à terapia anti- retroviral sofre a influência de algumas peculiariedades observadas nessa faixa etária, tais como: a negação e o medo de sua condição de infectado pelo HIV;a de- sinformação; o comprometimento da auto-estima; o questionamento sobre o sistema de saúde e a eficácia da tera- pêutica e as dificuldades em obter apoio familiar e social. Com a finalidade de melhorar o acom- panhamento clínico e a adesão ao trata- mento,sugerem-se as seguintes estratégias: � Preparar adequadamente o adoles- cente para a revelação do diagnóstico,de preferência com suporte psicológico; � Negociar um plano de tratamento em que haja envolvimento e com-promisso do adolescente, informando-o adequadamente sobre questões ligadas ao prognóstico; � Buscar a participação da família, amigos e, eventualmente, de instituições para apoiá-lo durante seu tratamento; � Estimular a criação de grupos de discussão entre a clientela de adoles- centes atendida pelo serviço; � Na escolha do regime anti- retroviral, considerar não somente a po- tência, mas também a viabilidade do esquema, levando em conta a como- didade posológica; � Esclarecer sobre a possibilidade de efeitos colaterais e conduta frente a eles. por mês. Para ser convidado a participar do grupo, o adolescente precisa co- nhecer seu estado de portador do HIV. Os assuntos tratados no grupo são sugeridos pelos adolescentes. O termo HIV surgiu desde o primeiro encontro e raramente deixa de ser o centro das discussões. Os principais temas abor- dados em grupo têm sido:preconceitos, medo de contar o diagnóstico a familiares e amigos, contar ou não contar para os namorados,o impacto do diagnóstico em suas vidas, o que significam os exames que fazem periodicamente (CD4 e carga viral) e a possibilidade do vírus se tornar resistente aos medicamentos. O entrosamento da equipe de profis- sionais é fundamental para o bom anda- mento deste trabalho. Procuramos afinar o conhecimento dos profissionais sobre adolescência e discutir os casos regular- mente. Algumas noções sobre aspectos práticos ao longo da adolescência po- dem ser úteis. [Profissionais de Saúde] << Saber Viver 17 Adolescentes e o tratamento antiretroviral (modificado do Guia de Tratamento Clínico da Infecção pelo HIV em Crianças 2002/2003) Jorge Andrade Pinto PROF. ADJUNTO DO DEPARTAMENTO DE PEDIATRIA E COORDENADOR DO GRUPO DE AIDS MATERNO INFANTIL DA FACULDADE DE MEDICINA DA UFMG uando traba- lhamos com adolescentes soropositivos, notamos que há, tanto na parte clínica como na psi- cossocial,uma grande dife- rença entre os adolescentes de trans- missão vertical e adolescentes de transmissão horizontal. Os adolescentes do primeiro grupo, ou seja,infectados através da transmissão mãe / filho,são adolescentes que durante sua vida já foram submetidos a segui- mento e tratamento,deles próprios e de seus pais. Estão convivendo com pais doentes ou já são órfãos. São cuidados por familiares ou estão institucionaliza- dos. Esta população é tratada com muito cuidado e poupada,na maioria das vezes, do seu diagnóstico,crescendo e chegan- do à adolescência sem ter o conhecimen- to do porquê do constante acompanha- mento médico e da medicação utilizada. Esses adolescentes, devido às con- dições em que são cercados durante o crescimento,apresentam,na maioria das vezes, um retardo em seu desenvolvi- mento psicossocial. Há uma resistência por parte de familiares e cuidadores da revelação diagnóstica,apesar da tentativa dos profissionais de saúde (médicos, psicólogos) de convencer os cuidadores do quanto é importante que o adoles- cente saiba da sua condição sorológica para que possa tomar as rédeas de seu próprio tratamento,de seu cuidado e do próximo. Os adolescentes de transmissão hori- zontal,ou seja, infectados por via sexual, usuários de drogas endovenosas e infectados por sangue e hemoderivados, com exceção desses últimos, que têm por parte da família e do serviço de saúde um tratamento e cuidados semelhantes ao de transmissão vertical, apresentam um comportamento de sua parte e do serviço de saúde, totalmente diferente. Os adolescentes infectados por via sexual e uso de drogas endovenosas não têm, via de regra, um atraso no desen- volvimento psicossocial.São,em sua maio- ria,originários de famílias desestruturadas e das quais não recebem apoio. Quando esses adolescentes, por alguma razão,procuram o serviço de saúde e é pedido um teste para HIV (muitos são adolescentes grávidas que fazem o teste no pré-natal),o resultado lhe é passado sem nenhum preparo prévio, mesmo tendo este adolescente a mesma idade do ado- lescente de transmissão vertical,como se o fato de praticar sexo ou usar droga, os preparassem para receber um resultado deste porte. Acredito que,devido ao aumento do número de adolescentes vivendo com HIV/AIDS, é a hora propícia para que, juntos,os profissionais de saúde e esses adolescentes discutam uma melhor abor- dagem e o melhor momento, por parte da equipe profissional e dos familiares em revelar o diagnóstico, para que pos- samos ter um resultado mais promissor no tratamento, na socialização e na qualidade de vida. 18 Saber Viver >> [Profissionais de Saúde] A diferença entre quem se infectou pelo HIV por transmissão vertical ou horizontal Marinella Della Negra SUPERVISORA DA 2ª UNIDADE DE INTERNAÇÃO DO INSTITUTO DE INFECTOLOGIA EMÍLIO RIBAS Q prática do aconselhamento desempenha um pa- pel fundamental no contexto da epidemia da aids e se reafirma como uma tecnologia de cuidado estratégico para o momento da revelação do diag- nóstico do HIV e na promoção da integralidade na atenção à saúde. O trabalho no campo da aids tem,por um lado,demonstrado a falência do modelo técnico-científico-normativo,prescritivo e coercitivo – que é insuficiente para atender as necessidades das pessoas que vivem e convivem com a aids. E,por outro lado,tem revelado o quanto faltam respostas no cotidiano dos profissionais de saúde, em especial no atendimento ao adolescente com HIV/aids. Com certeza, não teremos respostas para tudo, mas é importante entendermos o aconselhamento como uma tecnologia estratégica, que favorece o emergir de respostas indispensáveis para o processo de cuidado à saúde, à medida que o profissional estimula a autonomia e liberdade do adolescente para expressar suas questões,utilizando seu conhecimento para escutá-lo melhor e pensar com ele em como podem resolver o seu problema. O aconselhamento é uma ação em saúde que implica a construção de uma relação de confiança mútua e o estabelecimento do diálogo "profissional – adolescente" e "profissional – família – adolescente".Prima pela utilização de linguagem acessível,pela confidencialidade e o respeito às diferenças e à cidadania. Desta forma, contribui para que temas relacionados à aids,difíceis e necessários de serem abordados,como sexualidade, morte, uso de drogas, tabus, estigma e preconceitos, fluam mais naturalmente. As principais características do processo de aconselhamento são a ESCUTA e a TROCA. Escutando os anseios e medos do adolescente, reconhecendo suas crenças e valores,podemos conhecê-lo melhor. Do mesmo modo, trocando saberes, afetos e experiências, podemos perceber os limites e também as possibilidades que o [Profissionais de Saúde] << Saber Viver 19 Revelação do diagnóstico e aconselhamento em HIV/aids A O aconselhamentoé uma ação em saúde que implica a construção de uma relação de confiança mútua e o estabelecimento do diálogo “profissional – adolescente” e “profissional – família – adolescente” Débora Fontenelle1, Denise Serafim2 e Sandra Filgueiras3 1MÉDICA CLÍNICA GERAL DO HUPE-UERJ (NÚCLEO DE EPIDEMIOLOGIA ) E GERÊNCIA DE DST/AIDS DA SECRETARIA MUNICIPAL DE SAÚDE DO RIO DE JANEIRO (SMS), 2 ASSESSORA TÉCNICA DA UNIDADE DE PREVENÇÃO DO PNDST/AIDS, 3 PSICÓLOGA SANITARISTA DA ASSESSORIA ESTADUAL DE DST/AIDS - SES/RJ adolescente tem para lidar com as adversidades do viver com o vírus da aids. O aconselhamento implica uma reflexão conjunta,na qual o adolescente é estimulado a participar ativamente e, junto com o profissional, encontrar recursos para o alívio do sofrimento físico e psíquico. Pressupõe o acolhimento do sofrimento que o adolescentetraz e o entendimento de seu contexto de vida. O momento da revelação do diagnóstico pelo HIV é uma situação crucial para o adolescente e pode gerar ansiedade e estresse para o profissional de saúde.A postura acolhedora do profissional no processo de aconselhamento contribui para uma melhor condução deste momento. Este processo implica CONHECER. Quem é o adolescente com HIV/aids que estamos atendendo? � aquele que adquiriu o HIV por transmissão mãe-filho; pelo uso de drogas injetáveis;por transfusão sanguínea;por transmissão sexual;que descobriu ter o vírus durante a gravidez; ou que ainda desconhece seu diagnóstico porque a família não quer / não consegue contar; � aquele que reage a esta situação com raiva,revolta,desespero,tristeza,negação, passividade,ou que consegue lidar com sua condição de soropositivo; � aquele que não tem com quem contar ou o que tem o apoio da família e/ou de uma rede social; � aquele que faz parte de algum grupo social (escola, igreja, rua ...) ou não faz parte de nenhum grupo; � que se culpa ou culpa o outro; � que gosta de usar drogas; � que tem namorado(a),companheiro(a) e tem vida sexual Qual é a maior preocupação deste adolescente? � fazer parte de um grupo, ter amigos,namorado(a); � a revelação do diagnóstico para os outros; � ser discriminado; � ser abandonado; � o medo da morte; � o exercício da sexualidade; � como viver uma relação afetiva,constituir família. Conhecendo o adolescente,podemos contextualizar melhor nossas mensagens à sua vivência e torná-las mais eficazes. Na continuidade do processo de aconselhamento,aspectos como as dúvidas,o saber,crenças,valores,anseios e medos deste adolescente potencializam o diálogo, contribuindo para que a orientação de medidas preventivas seja mais compatível a sua realidade. É importante realizar uma avaliação de risco com o adolescente,ajudando-o a identificar as situações que vivencia em relação ao HIV/aids e outras DST,para evitar ou,pelo menos,minimizar os riscos, de acordo com as suas possibilidades e limites. Cada adolescente é capaz de despertar diferentes sentimentos em nós, profissionais. Muitas vezes,nos sentimos impotentes quando os pais não permitem a revelação do diagnóstico ao adolescente, quando o adolescente não quer revelar o diagnóstico à parceria sexual. Ficamos ansiosos em abordar aspectos da sexualidade, nos sentimos culpados pela não adesão do adolescente a medidas de prevenção e ao 20 Saber Viver >> [Profissionais de Saúde] O momento da revelação do diagnóstico pelo HIV é uma situação crucial para o adolescente e pode gerar ansiedade e estresse para o profissional de saúde tratamento e podemos até identificar o adolescente com nossos próprios filhos etc. Para o aconselhamento fluir, é importante que possamos, além de conhecer o adolescente, identificar nossos sentimentos e dificuldades durante o atendimento, evitando ruídos na comunicação e até iatrogenia. Compartilhar com a equipe nossas dúvidas e sentimentos pode nos ajudar na condução do atendimento. Neste sentido, entendemos que a construção de uma prática interdisciplinar é de suma importância para o aprimoramento da atenção. Contar com uma equipe interdisciplinar facilita a abordagem de questões complexas e, muitas vezes, difíceis de serem tratadas por um único profissional. Também a participação da família, de pessoas mais próximas e dos parceiros/as sexuais do adolescente é fundamental para garantir a integralidade e a resolutividade da ação.Todos precisam de atenção e apoio emocional para se integrar ao processo de assistência do adolescente. Por fim, cabe ressaltar o quanto é comum na assistência ao adolescente com HIV/aids, principalmente nos infectados por transmissão vertical, uma tendência a adiar a comunicação de sua condição sorológica. Muitos deles chegam a passar anos tomando anti-retrovirais sem saber explicitamente o seu diagnóstico. Com o argumento de "proteger" o adolescente,a família e os profissionais de saúde se tornam cúmplices no "silêncio" da questão, o que pode implicar a infantilização deste adolescente. Observamos aí uma enorme dificuldade dos pais e profissionais,adiando o enfrentamento desta situação e a abordagem de temas como sexualidade, reprodução,consumo de drogas,doença e morte, supostamente mais "reservados" à vida adulta. É importante lembrar que, como qualquer pessoa, o adolescente tem direito de saber seu diagnóstico. O aconselhamento pressupõe uma postura de acolhimento e respeito por parte do profissional,para estabelecer o diálogo,apesar das diferenças. Trata-se de procurar uma comunicação clara e objetiva, dando instrumentos ao adolescente para cuidar da sua saúde com autonomia e liberdade. Referências bibliográficas: CN DST/AIDS. COORDENAÇÃO NACIONAL DE DST E AIDS, 1997. Aconselhamento em DST, HIV e Aids: Diretrizes e Procedimentos Básicos. ABIA. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA INTERDISCIPLINAR DE AIDS, 2003. Reflexões sobre Assistência à Aids – Relação Médico- Paciente, Interdisciplinaridade, Integralidade. PAULO FREIRE. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. Editora Paz e Terra: 1996. p. 127-137. [Profissionais de Saúde] << Saber Viver 21 As dúvidas, o saber, crenças, valores, anseios e medos deste adolescente potencializam o diálogo, contribuindo para que a orientação de medidas preventivas seja mais compatível a sua realidade O atendimento em sala de espera ASSISTÊNCIA INTEGRAL À GESTANTE HIV+ atendimento à gestante com HIV+ iniciou-se em 1996 no Instituto de Puericultura e Pediatria Marta- gão Gesteira (IPPMG),uma unidade da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) que passou a ser uma das referências para o Programa de Assistência Integral à Gestante HIV+ no Estado do Rio de Janeiro. No programa atuam dois infectologistas,um obstetra,duas enfermeiras,uma assistente social,uma nutricionista e uma psicóloga. À exceção dos médicos,os demais profissionais realizam também o atendimento de sala de espera. Em relação à estratégia proposta como sala de espera,é importante destacar que a mesma ocorre em um espaço físico restrito no Setor Materno Infantil,onde as ges- tantes aguardam o atendimento. Os encontros têm como objetivo trabalhar as informações e vivências, pois consideramos que, a partir dos sentimentos mais clarificados, há possibilidade de melhor absorção das informações e conseqüentemente uma perspectiva de adesão ao acompanhamento,visando evitar a transmissão vertical. No tocante à adolescência,cabe ressaltar que esta é uma fase de mudanças e desco- bertas.Na busca de sua identidade individual e grupal,os adolescentes vivenciam cada vez mais cedo novos valores comportamentais relacionados à afetividade e vida sexual que, associados à pouca valorização para percepção de risco e o limitado acesso efetivo às in- formações sobre sexualidade,DSTs,aids e drogas,acabam tornando-os mais vulneráveis. O despreparo dos serviços de pré-natal em oportunizar um atendimento específico à gestante adolescente, por diferentes justificativas, acaba retardando o início do acompanhamento e conseqüentemente observa-se demora na realização dos exames, dentre eles a testagem para o HIV. Como unidade de referência,recebemos em média seis adolescentes por mês na faixa de 14 a 18 anos para a confirmação de diagnóstico de HIV.Não raro,no segundo ou terceiro trimestre de uma gestação não planejada,não desejada ou rejeitada pela família,isso quando há referência desta e com agravante de 22 Saber Viver >> [Profissionais de Saúde] O Representação da adolescente no grupo, sobre a expectativa do filho ser HIV negativo EQUIPE DA SALA DE ESPERA DO INSTITUTO DE PUERICULTURA (IPPMG) DA UFRJ: IRAÍNAFERNANDES DE ABREU FARIAS (ENFERMEIRA) MARIA DE FATIMA LAGO GARCIA (PSICÓLOGA) REGINA TIRRE CARNEVALE MERCADANTE (ENFERMEIRA) VERÔNICA MEDEIROS DA COSTA (NUTRICIONISTA) VIRGINIA HELANE DE ALMEIDA XIMENES (ASSISTENTE SOCIAL) não terem recebido adequado aconse- lhamento pré e pós-teste HIV, como recomendado pelo Ministério da Saúde. Diante da confirmação do diagnós- tico, é oferecido à gestante o espaço do grupo como parte do seu acompanha- mento.Em nossos encontros,observamos várias situações conflituosas a partir de colocações feitas pelas adolescentes ou por seus responsáveis, que estão relacio- nadas à: descoberta e aceitação do dia- gnóstico;revelação do resultado ao com- panheiro e/ou familiares; início do tratamento; uso do preservativo; sigilo; preconceito;direitos e benefícios sociais; mudança dos hábitos alimentares; lazer, drogas lícitas e ilícitas; os horários da medicação;a impossibilidade de amamen- tar; cuidados no pós-parto com o corpo; adesão ao acompanhamento do recém nato; fortalecimento da cidadania e pers- pectiva de futuro. Constatamos, ao longo desses anos, a necessidade de atendermos as adolescen- tes de forma diferenciada, considerando as particularidades da fase vivenciada. Sendo assim, destacamos a importância em priorizar cada vez mais o acon- selhamento pré e pós-teste HIV como marco inicial na trajetória do diagnóstico e manutenção do acompanhamento em relação à condição de ser adolescente, estar grávida e com diagnóstico de HIV, como garantia da qualidade de vida atual e futura. Porém,tal não ocorre conforme preconizado. Cabe ressaltar a importância da cons- trução em equipe, de uma abordagem específica, levando em conta, entre outros,os seguintes aspectos: � Assegurar a abordagem multipro- fissional; � Acolher desde o atendimento inicial; � Estimular o comparecimento de um responsável no atendimento; � Considerar as informações prévias quanto à infecção do HIV/aids,mé- todos contraceptivos, uso do pre- servativo etc; � Esclarecer dúvidas mencionadas e veladas; � Sensibilizar o responsável para o acompanhamento à adolescente na gestação e pós-parto; � Estimular o resgate do vínculo familiar; � Garantir sigilo; � Orientar quanto aos cuidados necessários ao recém-nato; � Incentivar a continuidade do acompanhamento da adolescente e da criança; � Interagir com as coordenações de áreas visando assegurar os fluxos de encaminhamentos precoces; � Estimular a inclusão em programas específicos à adolescência. Devemos destacar que as reações e sentimentos, mesmo estando a adoles- cente "assistida", poderão estar fragmen- tados e suscetíveis às interferências alheias, e suas expressões podem nos levar à reflexão... "O profissional me tratou como uma tábua ao me falar do resultado do exame de HIV" "Estou me sentindo um ET" "Meu pai disse que estou bichada" "Estou preocupada com o que eu vou falar quando me perguntarem por que não estou dando o peito" "Eu não sabia que estava fazendo esse exame" "Você tem aids. Procure este hospital, aqui está o endereço" "Pensei que ia morrer no dia seguinte" "Aqui é o único lugar que posso conversar, só tenho vocês pra falar sobre isso..." Acreditamos que o trabalho em equipe que valoriza as atividades em grupo nas discussões sobre a infecção pelo o HIV junto às adolescentes propor- ciona novas reflexões sobre a prevenção, para uma qualidade de vida melhor. O grupo de sala de espera revela-se um espaço promissor como estratégia educa- tiva e terapêutica, pois possibilita o tra- balho em equipe e a caminhada para a atuação interdisciplinar. [Profissionais de Saúde] << Saber Viver 23 "Se trago as mãos distantes do meu peito, é que há distância entre intenção e gesto." (Fado Tropical – Chico Buarque & Ruy Guerra) pesar dos três temas do título possuírem uma estreita correlação óbvia no discurso,a maneira como nós, governo, profissionais e sociedade, agimos em relação a cada um deles é de forma totalmente dissociada e perigosa. Entendemos a sexualidade como o exercí- cio da vida com prazer. Exercemos nossa sexua- lidade quando intencionalmente colocamos prazer em nossas relações com o mundo e com nós mesmos. O prazer é um ato intencional da subjetividade humana, o qual consiste em dar um sentido e um significado específico a uma sensação, que pode ser agradável, desagradável ou neutra. No entanto,o prazer não se reduz a esta sensação. Enquanto para alguns a sensação de queimação intensa de uma pimenta malagueta pode ser uma experiência extremamente desagradável, para outros a mesma sensação se constitui num imenso prazer. O que diferencia as duas experiências é o significado dado pelo sujeito da experiência a esta sensação. Do mesmo modo, apesar do estupro ser uma relação sexual,a vítima não exerce sua sexualidade nesse momento.O prazer produzido em um relacionamento sexual consensual parece até o momento não ter precedentes comparativos,mesmo levando em conta seus efeitos colaterais.A gravidez não planejada e as DSTs, tendo a aids como a mais recente e mais temida,são seus efeitos colaterais mais comuns e perseguem a humanidade até os dias de hoje. Enquanto o homem paga o preço das DSTs,a mulher sofre com os dois.A gravidez não planejada sempre foi o preço que a mulher, casada ou não, teve que pagar pelo exercício de sua sexualidade, ou, quando pior, por sofrer o exercício da sexualidade do homem pela violência ou por seus "deveres matrimoniais",o que de fato é a mesma coisa. As tentativas para se evitar uma gravidez na história da humanidade vão desde o coito interrompido,provavelmente a maneira mais antiga,que mesmo interrompido era e continua sendo pecado, passando por vários métodos de barreira, como as primeiras camisinhas utilizando intestinos de animais,até os métodos mais eficientes atualmente,como a camisinha de látex,os contraceptivos orais e o DIU. 24 Saber Viver >> [Profissionais de Saúde] Sexualidade, uso do preservativo e direito reprodutivo Valdi Craveiro Bezerra CLÍNICO DE ADOLESCENTES (HEBIATRA), PSICOTERAPEUTA, TERAPEUTA DE FAMÍLIA. COORDENADOR DO ADOLESCENTRO CENTRO DE REFERÊNCIA, PESQUISA, CAPACITAÇÃO E ATENÇÃO À ADOLESCÊNCIA E FAMÍLIA - DF A A camisinha, quando usada corretamente, isto é, sem falha no uso e no acondicionamento, oferece uma proteção de 99% contra a aids e de 100% para gravidez não planejada. Considerando as possibilidades de ruptura e deslizamento intravaginal,o uso da camisinha durante um ano oferece uma proteção para a gravidez não planejada de 97% se usada de forma correta, e de 86% se for usada sem muitos cuidados (Trussel e col,2001). Este mesmo autor calculou que a economia feita com o uso de camisinha por ano por adolescente sairia em média de 946 dólares para o setor privado e de 525 dólares para o setor público. O custo anual calculado por adolescente para uma gravidez foi de 1.079 dólares e de 188 dólares com tratamento para DST,num total de 1.267 dólares para o setor privado e de 677 dólares (541 para gravidez e 137 com tratamento para DST) para o setor público. (Trussell e col,1997a e 1997b).A conclusão lógica é que o uso da camisinha é seguro, eficiente e muito econômico para qualquer governo que invista em seu uso,no entanto,tanto a gravidez quanto a aids estão aumentando na faixa etária da adolescência. Costumamos responsabilizar os adolescentes por estas taxas, sem nos perguntarmos por nossa participação neste fenômeno. Neste momento entramos no chamado direito reprodutivo, o que significa que temos o direito de escolher se queremos ou não ter filhos. Para garantir uma escolha ou outra, lançamos mão dos métodos contraceptivos,ea camisinha é um deles. Com isso fechamos o ciclo: sexualidade, uso do preservativo e direito reprodutivo. Até agora parece uma simples lógica matemática,mas a questão é que,em outras palavras, direito reprodutivo quer dizer que nós, inclusive "nós adolescentes", temos o direito de nos relacionarmos sexualmente sem termos que pagar com uma gravidez não planejada ou uma doença sexualmente transmissível pelo pecado de exercermos nossa sexualidade. A questão é que, na verdade, não concedemos esse direito aos nossos filhos adolescentes. Se nossa preocupação como pais, profissionais de saúde, educadores, governo e sociedade em geral fosse de fato evitar os danos causados por uma gravidez não planejada ou uma DST/aids, o uso da camisinha como solução para diminuir estes enormes problemas de saúde pública deveria ser estimulado e principalmente viabilizado.A camisinha deveria ser distribuída segundo a necessidade de cada um,em todos os locais de encontros, como as escolas, quartéis, locais de diversão, e principalmente nos serviços de saúde. Apesar das campanhas freqüentes para o uso da camisinha, nós, profissionais da saúde,educação e governo,sistematicamente desenvolvemos formas de distribuição que são verdadeiras maratonas cheias de constrangimentos,que parecem planos bem elaborados para afastarmos nossos adolescentes do exercício de uma sexualidade protegida. Para um adolescente obter 6 camisinhas,dependendo do serviço de saúde, deverá marcar uma consulta com um médico ou enfermeira e ser cadastrado,o que significa declarar que já está tendo relacionamento sexual. Toda esta dificuldade criada é justificada pela necessidade de fazer uma educação sexual e de obter uma estatística. Esta desculpa,no entanto,pode estar encobrindo a verdadeira razão dessa estratégia,que é o controle ao exercício da sexualidade do adolescente. Em agosto de 2003,o governo lançou um projeto dos Ministérios da Educação e da Saúde para disponibilizar camisinhas para colégios da rede pública de ensino,que comprovarem que seus alunos já recebem educação sexual. Imediatamente surgiram "profissionais" questionando a distribuição, afirmando que isso seria um estímulo à relação sexual desenfreada,ou que a distribuição por si só não resolveria o problema, [Profissionais de Saúde] << Saber Viver 25 Se nossa preocupação como pais, profissionais de saúde, educadores, governo e sociedade em geral fosse de fato evitar os danos causados por uma gravidez não planejada ou uma DST/aids, o uso da camisinha deveria ser estimulado e principalmente viabilizado e outras asneiras mais. Não duvidamos que a educação sexual seja a estratégia mais importante e eficiente. A questão é que a mesma não sai do papel há mais de 20 anos,pela mesma necessidade de controle da sexualidade do outro. Com isso,criaram- se dois problemas. O primeiro é que alguns de nossos filhos adolescentes, seguindo nossos passos iniciados com o advento do contraceptivo oral na década de 60, já saltaram do avião e já estão tendo relações,queiramos ou não. Em plena queda livre, nós ficamos discutindo sobre quem empurrou, se realmente era a hora de saltarem, ou concluímos que está tudo errado e que não deveriam ter feito isso,que deveriam ter tido aulas de pára-quedismo antes. Nessa situação,o mais sensato e honesto que temos de fazer é perguntar: "alguém sabe como abrir um pára-quedas?". — Nossa obrigação é garantir que nossos adolescentes cheguem são e salvos até embaixo, e com eles vivos, sem danos, discutirmos todas as outras opções. Em outras palavras, devemos proceder com a distribuição de camisinhas de forma livre e sem constrangimentos – o pára-quedas. O outro problema diz respeito à turma que ainda não subiu no avião. São os adolescentes que ainda não iniciaram sua atividade sexual e, se continuarmos a não fazer nada a respeito, como educação para um exercício saudável da sexualidade sem problemas,inexoravelmente,ficarão na mesma situação dos que já estão pulando. No Adolescentro, disponibilizamos a camisinha na sala de espera em uma caixa confeccionada para este fim, para quem quiser pegar seu preservativo. Além dos adolescentes,os pais,mães,tios,avós pegam camisinhas para outros filhos,sobrinhos, netos e amigos. A cada dia somos gratos a essas pessoas maravilhosas, nossos verdadeiros multiplicadores no combate contra a aids e a gravidez não planejada,por fazerem nossa tarefa. Em nenhum momento, nenhum pai ou mãe questionou nossa atitude. As únicas reações contrárias a esta forma de distribuição vieram dos profissionais. O mais interessante é que,com este fornecimento de livre demanda,as questões sobre métodos contraceptivos aumentaram em todas as consultas. Se um adolescente faz da camisinha um balão de festa,de duas uma:1) Este ato é um ótimo indicador de uma dificuldade na sua relação com ele mesmo e com o mundo,aí nós podemos ajudá-lo, ou 2) será pura gozação (merecida) sobre nossa maneira compulsiva de querer controlar a sexualidade dos outros. Referências bibliográficas: TRUSSELL J, KOENIG J, ELLERTSON C, STEWART F. (1997a) Preventing unintended pregnancy: the cost-effectiveness of three methods of emergency contraception. Am J Public Health, Jun; 87(6):932-7 TRUSSELL J, KOENIG J, STEWART F, DARROCH JE (1997b) Medical care cost savings from adolescent contra-ceptive use. Fam Plann Perspect, 1997 Nov-Dec;29(6):248-55, 295. TRUSSELL J, WIEBE E, SHOCHET T, GUILBER E. (2001) Cost savings from emergency contraception pill en Canada. Obstet Gynecol, May;97(5Pt1):789-93. 26 Saber Viver >> [Profissionais de Saúde] No Adolescentro, disponibilizamos a camisinha na sala de espera ... nenhum pai ou mãe questionou nossa atitude. As únicas reações contrárias vieram dos profissionais [Profissionais de Saúde] << Saber Viver 27 PEDIATRIA OU AMBULATÓRIO DE ADULTOS O espaço ideal para o adolescente soropositivo Sidnei Pimentel INFECTOPEDIATRA DO AMBULATÓRIO DE PEDIATRIA E HOSPITAL-DIA DO CENTRO DE REFERÊNCIA E TREINAMENTO EM DST/AIDS DE SÃO PAULO alvez um dos tópicos mais discutidos quando se aborda a ques- tão do atendimento ao adolescente soropositivo é o espaço ideal para isso. Nesse momento, duas correntes principais se distanciam: uma defende o seguimento em ambulatório de pediatria, principalmente motivada pela questão do vínculo como fator imprescindível para a aderência; a outra é a favor do seguimento no ambulatório de adultos,uma vez que os adolescentes não se sen- tiriam bem ao ser atendidos num ambiente voltado para a pediatria,com brinquedos espalhados e gravuras de bonequinhos nas paredes. Lembremos ainda que falamos de uma população heterogênea: de um lado, as crianças infectadas por transmissão vertical,acompanhadas desde a infância e que adolesceram;de outro,aqueles adoles- centes que adquiriram a doença já nesta fase da vida através de relações sexuais,uso de drogas ou por via sangüínea. Em verdade,o espaço ideal para o seu atendimento seria aquele especificamente criado para a clientela de adolescentes. Ou seja: uma equipe multidisciplinar e interdisciplinar treinada para as especificidades dos adolescentes, num espaço com características especiais e atividades voltadas para aquela faixa etária. Por "equipe multidisciplinar e interdisciplinar treinada" se entende aquela formada por profissionais de diversas áreas capazes de se inter-relacionar e abordar as questões específicas surgidas na adolescência, como as dificuldades de adesão, o sigilo do diagnóstico, o afloramento da sexualidade, a lipodistrofia, o medo do preconceito e da discriminação etc. O espaço físico ideal seria aquele que não lembrasse um ambiente infantil (uma vez que é comum no adolescente o conflito entre manter
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