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02_-_Marco_de_2018

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A violência que nos limita
02
M a r – 2 0 1 8
02
Edição
Diante do medo e da insegurança, ampliar a discussão e refletir 
sobre as reais origens da violência crescente no país pode ser 
o caminho para combatê-la de maneira efetiva
O direito de ir e vir
Se não nos sentimos seguros, somos mesmo livres para nos 
deslocar por onde queremos e quando precisamos?
O crime no Brasil 
O que a origem e a atuação das facções criminosas evidenciam 
sobre o sistema carcerário e as políticas públicas do país
“Onde você aprendeu a sentir tanto medo?” 
A importância de dar voz às mulheres para combater a 
violência que deixa marcas em sua história
Editorial
Nesta edição
E x p e d i e n t e
A violência que nos limita
Restringir”, “reprimir”, “não ir além de”. Essas são algumas das definições e sinônimos do verbo “limitar”. Ao que nos parece, o sentido da palavra se aplica bem à realidade que enfrentamos no Brasil quando o assunto 
é violência. Reprimidos pelo medo de uma situação enraizada, muitas vezes 
nos restringimos a pensar superficialmente sobre a questão, sem perceber que 
podemos ir além dos fatos aparentes para identificar a causa desse problema 
e, só assim, encontrar soluções seguras e efetivas. 
Mas é claro que a violência não é uma questão simples de ser resolvida, 
ainda mais quando se trata de uma sociedade tão complexa e desigual quanto 
a brasileira. A Organização Mundial de Saúde (OMS) considera, inclusive, a 
violência como um problema global de saúde pública. No documento “Relatório 
mundial sobre violência e saúde”, a OMS declara: 
Talvez a violência sempre tenha participado da experiência humana. Seu 
impacto pode ser visto de várias formas, em diversas partes do mundo. Todo 
ano, mais de um milhão de pessoas perdem suas vidas e muitas outras sofrem 
lesões não fatais, resultantes da violência auto-infligida, interpessoal ou coletiva. 
[...] Assim como ocorre com seus impactos, algumas causas da violência 
podem ser facilmente percebidas. Outras estão profundamente enraizadas no 
arcabouço cultural e econômico da vida humana.
Diante desse assunto profundo e que tanto influencia a vida dos brasileiros, 
as seções desta edição do Leia Agora buscam trazer uma reflexão sobre os 
desdobramentos da realidade que enfrentamos (como medo, insegurança, 
individualismo), bem como sobre o que está além do que vemos nos noticiários, 
procurando estabelecer conexões com outros aspectos da sociedade, como as 
liberdades individuais, o sistema prisional, a eficácia das políticas públicas e a 
tão notória desigualdade que caracteriza o país.
Seja ponderando a respeito da desigualdade que acompanha a história da 
sociedade brasileira, em “Parêntese”, seja conhecendo as marcas que a violência 
deixa na vida das mulheres, na crônica do “Extra!”, esperamos que, a cada texto, 
você reflita além do que se mostra superficial e imediatista, tomando consciência 
acerca da complexidade do problema da violência e considerando soluções reais 
e duradouras para resolvê-lo. Boa leitura! 
Equipe Leia Agora
Direção geral
Nicolau Arbex Sarkis
Gerente editorial
Emilia Noriko Ohno
Coord. de projetos editoriais
Diego da Mata
Marília L. dos Santos G. Ribeiro
Viviane Rodrigues Nepomuceno
Edição / Texto
Anaiza Castellani Selingardi
Bruno Freitas
Cláudio Leyria
Edilene Faria
Érica M. Bettoni Hayashibara
Thaís Inocêncio
Projeto gráfico
Willyam Gonçalves
Revisão
Kemi Tanisho
Marcia de Paiva Fernandes
Diagramação
Willyam Gonçalves
Licenciamento
Jade Cristina Bernardino
7 O DIREITO DE IR E VIR
ENTRELINHAS
Se não nos sentimos seguros, somos mesmo livres para nos 
deslocar por onde queremos e quando precisamos? 
9 FACÇÕES CRIMINOSAS NO BRASIL: ORIGEM E ATUAÇÃOCONTEXTO
O surgimento de grupos que sustentam o crime no país evidencia o 
precário sistema carcerário e a falta de políticas públicas efetivas 
13 CARREIRA: POLÍTICAS PÚBLICAS
ENTREVISTA
O profissional que atua visando implementar ações que atendam 
o maior número de pessoas, visando ao bem coletivo 
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Brasil
Ciência
Economia
Cultura
Internacional
Tecnologia
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Maior fornecedor de fuzis para o 
Brasil é preso nos Estados Unidos 
O brasileiro radicado nos Estados Unidos Frederik 
Barbieri foi preso na madrugada deste sábado (24) 
em sua casa, na Flórida. Além da prisão, a polícia 
americana conseguiu barrar o envio de 40 fuzis para 
o Brasil. Barbieri é acusado de ter enviado ao país, em 
maio do ano passado, uma carga de aquecedores 
de piscina recheada de fuzis. Foi a maior apreensão 
de armas feita no Brasil em 10 anos, o que levou 
investigadores a considerarem Barbieri o maior 
traficante de armamentos do país.
24 fev. 2018 – G1
Oscar vê na ternura de A Forma 
da Água a receita para as dores do 
presente
A Forma da Água [que levou a estatueta de Melhor 
Filme], uma produção tenra sobre tolerância e 
inclusão, foi a resposta da Academia de Artes e 
Ciências Cinematográficas de Hollywood às 
demandas de um turbulento presente. Diversidade e 
representatividade foram as palavras-chave da noite. 
O filme Corra!, por exemplo, premiado em Roteiro 
Original, é uma sátira social aguda sobre o racismo. 
5 mar. 2018 – IG
Cientistas dos EUA avançam no 
uso de células-tronco para doenças 
incuráveis
Cientistas da Universidade do Colorado obtiveram 
resultados positivos com células-tronco que têm 
“o potencial” de tratar com sucesso doenças até 
agora incuráveis. Os testes permitiram resolver a 
ineficácia registrada até o momento na hora de criar 
células-tronco a partir de células adultas.
25 fev. 2018 – Agência BrasilTemer assina decreto de intervenção 
federal na segurança do Rio
O presidente Michel Temer assinou, nesta sexta-
-feira (16), o decreto de intervenção federal na 
segurança pública no estado do Rio de Janeiro. 
A medida prevê que o general do Exército Walter 
Souza Braga Netto será o interventor no estado. 
Ele assume, até o dia 31 de dezembro de 2018, 
a responsabilidade do comando da Secretaria 
de Segurança, das polícias Civil e Militar, do Corpo de 
Bombeiros e do sistema carcerário no estado do Rio. 
A intervenção já está em vigor; na prática, o Governo 
Federal assume o comando da segurança pública 
do estado, com a prerrogativa inclusive de reestruturar 
as instituições e demitir e contratar pessoas para 
atuarem na segurança.
16 fev. 2018 – G1
Ataque a tiros em escola na Flórida 
deixa 17 mortos 
Um atirador abriu fogo em uma escola de Ensino 
Médio na Flórida na tarde desta quarta-feira (14), 
matando 17 pessoas, entre estudantes e adultos. 
O atirador, um ex-aluno de 19 anos identificado pelo 
nome de Nikolas Cruz, foi detido. Ele havia sido 
expulso da escola por razões disciplinares.
14 fev. 2018 – UOL
Cientistas detectam sinais da 
origem das estrelas 
Um estudo revela que as primeiras estrelas surgiram 
cerca de 180 milhões de anos depois do Big Bang, 
um período que coincide com as primeiras evidências 
da existência de hidrogênio no Universo. Astrônomos 
do Instituto Tecnológico de Massachusetts (MIT) e da 
Universidade do Arizona, nos EUA, captaram, com 
uma antena de rádio, no oeste da Austrália, sinais 
tênues de gás hidrogênio procedentes da origem do 
Universo. 
1 mar. 2018 – UOL
Supergrão africano sem glúten 
pode ser solução para fome e seca 
Sem glúten, com quatro vezes mais proteína, três 
vezes mais fibra e quase o dobro do ferro do arroz 
integral, além de um baixo índice glicêmico, o fonio 
é, muitas vezes, chamado de supergrão. Precisa 
de pouca água para crescer, pode ter três colheitas 
por ano, e seu extenso sistema de raízes ajuda a 
combater a erosão do solo.
1 mar. 2018 – UOL
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*Todas as notícias foram adaptadas e todos os sites foram acessados em 5 mar. 2018.*Todas as notícias foram adaptadas e todos os sites foram acessados em 5 mar. 2018.
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Em 3 horas, Receita Federal recebe 
125,6 mil declarações 
A Receita Federal informou que recebeu 125.628 
declaraçõesde Imposto de Renda até as 11h desta 
quinta-feira (1). O prazo foi aberto às 8h de hoje e 
termina em 30 de abril. De acordo com o supervisor 
nacional do IR, o auditor-fiscal Joaquim Adir, a 
expectativa é de que 28,8 milhões de contribuintes 
entreguem a declaração, 340 mil a mais do que o 
registrado no ano passado (28,5 milhões). Deve 
declarar o IR neste ano quem recebeu rendimentos 
tributáveis acima de R$ 28.559,70 em 2017.
1 mar. 2018 – G1
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App dá recompensas para estu-
dantes ficarem longe do celular 
Um aplicativo que recompensa estudantes pelo tempo 
que eles ficam longe do celular está sendo lançado 
no Reino Unido. O Hold ajuda a combater o problema 
da distração provocada pelo celular. Os estudantes 
acumulam 10 pontos para cada 20 minutos sem 
usar o telefone. Os pontos podem ser trocados por 
produtos e serviços.
1 mar. 2018 – BBC
PRF apreende 12 fuzis e 33 pistolas 
que seriam levadas à Maré 
A Polícia Rodoviária Federal apreendeu, na manhã 
de hoje (26), 12 fuzis, 33 pistolas, uma granada, 
106 carregadores e 40 mil munições, em um veículo 
que trafegava na BR-116. Os policiais fizeram a blitz 
na altura de Seropédica, na Baixada Fluminense. Com 
auxílio de cães farejadores, foi possível descobrir o 
carregamento de cilindros que estava na caçamba do 
veículo. O motorista confessou que trouxe o material 
de Foz do Iguaçu, no Paraná, e tinha como destino a 
comunidade de Nova Holanda, no Complexo da Maré.
26 fev. 2018 – Agência Brasil
Campanha da Fraternidade 2018 traz 
superação da violência como tema 
A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) 
lançou, nesta quarta-feira de cinzas (14), a Campanha 
da Fraternidade 2018, com o tema “Fraternidade e 
Superação da Violência”. Os números crescentes 
revelados pelas pesquisas sobre a violência, além da 
sensação de insegurança vivida pela população em 
várias regiões brasileiras, mostram a necessidade de 
reflexão sobre o tema. O presidente da CNBB, Dom 
Sérgio da Rocha, diz que a campanha combate todo 
tipo de violência, inclusive a corrupção.
1 mar. 2018 – EBC
Brasil
Ciência
Economia
Cultura
Internacional
Tecnologia
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Rio fechou quase 20 mil postos de 
trabalho no turismo em 2017
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Queda livre
No ano passado, o Rio de Janeiro fechou 19.628 postos de trabalho no setor 
turístico, que, em 2016, já tinha perdido 18.591 vagas. 
Violência
Para a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), que 
divulgou a pesquisa, a violência e a crise financeira no estado afetaram o setor.
Enquanto isso...
Em 2017, estados como São Paulo, Goiás e Paraná criaram vagas no setor de turismo.
Brasil
Em todo o país, o turismo emprega 2.921.314 pessoas. O setor perdeu 12.690 postos 
de trabalho no ano passado no Brasil, mas a queda foi bem menos intensa que nos anos 
anteriores. Em 2015, o setor perdeu 51 mil funcionários e, em 2016, 87 mil.
Outras baixas
Além do Rio de Janeiro, perderam mais de mil postos de trabalho no turismo 
os estados Pará (–1.916), Bahia (–1.644) e Rio Grande do Sul (–1.541).
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Russia’s Putin unveils “invincible” 
nuclear weapons
Russia has developed a new array of nuclear weapons that are invincible, according to President Vladimir Putin. 
Mr. Putin made the claims as he laid out his key policies for a fourth presidential term, ahead of an election he is 
expected to win in 17 days’ time. The weapons he boasted of included a cruise missile that he said could “reach 
anywhere in the world”. He said of the West: “They need to take account of a new reality and understand ... [this]... 
is not a bluff.” Mr. Putin used video presentations to showcase the development of two new nuclear delivery 
systems that he said could evade detection.
1 mar. 2018 – BBC
La UE insta a May a que aporte “una idea 
mejor” para evitar una frontera en Irlanda
En un momento de altísima tensión en las negociaciones del Brexit, Theresa May ha recibido este jueves al 
mediodía en Londres a Donald Tusk, presidente del Consejo Europeo, que ha instado a la primera ministra 
británica a presentar “una idea mejor” a la propuesta por Bruselas, y rechazada por Londres, para evitar una 
frontera física entre la república de Irlanda e Irlanda del Norte.
1 mar. 2018 – El País
MADRI
El País
LONDRES
BBC
Todas as notícias foram adaptadas e todos os sites foram acessados em 1 mar. 2018.
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O interventor federal na segurança pública do Rio de Janeiro, general Walter 
Braga Netto, disse que não está nos planos de seu gabinete a realização 
de ocupações permanentes em favelas da região metropolitana. Segundo 
o general, as operações serão pontuais e com tempo determinado para 
terminar. Além disso, as Forças Armadas continuarão a participar de 
operações integradas fazendo o cerco no entorno de comunidades, e 
as polícias estaduais se mantêm responsáveis pelas ações no interior 
dessas áreas.
27 fev. 2018 – Agência Brasil
// IMAGEM EM FOCO
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ENTRELINHAS
O direito de ir e vir
Os números crescentes dos casos de violência em diversas cidades brasileiras interferem diretamente 
nos direitos fundamentais dos cidadãos e aumentam a sensação de insegurança.
O dia a dia da população carioca é constantemente 
impactado por episódios de violência. Segundo 
informações do Instituto de Segurança Pública (ISP), no 
ano de 2016, mais de 6 mil pessoas morreram de forma 
violenta no estado, uma média de uma morte violenta a 
cada 90 minutos.
Essa dinâmica de violência também pode ser 
percebida no município do Rio. Até o mês de maio 
[de 2017], já foram contabilizadas mais de 500 mortes 
violentas, segundo o ISP. Contudo, é importante situar 
esses óbitos e salientar o impacto dessa violência na vida 
dos estudantes do estado. No mês de fevereiro, mais 
de 20 escolas localizadas no Complexo da Maré tiveram 
suas aulas interrompidas. Esse episódio também se 
repetiu em março, levando 14 escolas desta localidade 
a suspenderem as aulas. Como saldo final, mais de 
10 mil alunos tiveram suas aulas paralisadas nesses dois 
meses.
Somam-se a isso os graves episódios de violência 
que resultaram na morte de crianças e adolescentes 
dentro de instituições de educação, ou mesmo próximo 
a elas. O caso de Maria Eduarda, baleada dentro de 
seu colégio em Acari e morta aos 13 anos, ilustra com 
precisão o atual cenário de insegurança no Rio.
Nesse panorama, não restam dúvidas sobre a 
necessidade de políticas estruturais capazes de reverter 
a situação de insegurança e violência no Rio de Janeiro.
“Educação em alvo: os efeitos da violência armada nas salas de aula”. 
FGV DAPP. Disponível em: <http://dapp.fgv.br/educacao-em-alvo-os-
efeitos-da-violencia-armada-nas-salas-de-aula/>. 
Acesso em: 5 mar. 2018.
Não é preciso ter sido vítima da violência para sentir 
medo dela. [...] O medo da violência independe de a 
pessoa ser sua vítima. Tornou-se uma questão que 
preocupa tanto quanto a violência propriamente dita. 
[...]
Segundo uma pesquisa britânica, o British Crime 
Survey, realizada em 2002 e 2003, o medo da violência 
pode gerar perda de confiança, insônia, depressão e 
ansiedade ou pânico. “As fobias atingem não só quem 
vivencia o estresse, mas quem vê também”, diz a 
psiquiatra Analice Gigliotti, do Rio.
Isabel Clemente, José Fucs, Solange Azevedo e Suzane Frutuoso. 
Época. “A violência na vida dos brasileiros”. Disponível em: 
<http://revistaepoca.globo.com/Revista/Epoca/0,,EDG76141-6009-
451-1,00-COMO+A+VIOLENCIA+AFETA+A+MENTE+E+A+VIDA+DE
+TODOS+NOS.html>. Acesso em: 5 mar. 2018.
TÍTULO II
Dos Direitos e Garantias Fundamentais
CAPÍTULO I
Dos Direitos e Deveres Individuais e Coletivos
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção 
de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e 
aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do 
direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à 
propriedade, nos termos seguintes: (EC nº 45/2004)
[...]XV – é livre a locomoção no território nacional em 
tempo de paz, podendo qualquer pessoa, nos termos da 
lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens.
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa 
do Brasil. Brasília, DF: Senado, 1988.
Não é preciso ter sido vítima da violência para sentir Não é preciso ter sido vítima da violência para sentir 
TEXTO02
O dia a dia da população carioca é constantemente O dia a dia da população carioca é constantemente 
TEXTO03TEXTO01
8
ENTRELINHAS
A N Á L I S E
A questão da segurança pública é um dos principais desafios a serem enfrentados pelo Brasil, e, nos últimos anos, o tema vem ganhan-
do amplo destaque na mídia, entre os especialistas no 
assunto e entre o público em geral. O aumento das taxas 
de criminalidade em todo o território nacional, sobretudo 
nos centros urbanos, a precariedade do sistema 
carcerário brasileiro, os casos de violência policial, a falta 
de ações protetivas aos cidadãos e outros tantos fatores 
contribuem para que a sensação de insegurança esteja 
cada vez mais presente no dia a dia dos brasileiros. 
Pensando em ampliar a discussão acerca do assunto, o 
Leia Agora deste mês propõe uma reflexão sobre o tema.
Dando início à nossa análise, o texto 1 traz um trecho 
da Constituição Federal de 1988 e diz respeito à garantia 
da liberdade, ou seja, ao direto das pessoas de ir e vir 
com autonomia e segurança. Na Carta Magna, podemos 
encontrar também outros trechos ligados à temática, 
como o Art. 6º, que se refere aos direitos sociais, entre 
eles a segurança, e o Art. 144, que diz que a segurança 
pública, “dever do Estado, direito e responsabilidade de 
todos, é exercida para a preservação da ordem pública 
e da incolumidade das pessoas e do patrimônio” através 
dos órgãos militares. 
O texto 2 fala sobre como a violência impacta no 
cotidiano das pessoas, independentemente de elas 
serem ou terem sido vítimas diretas. A matéria na íntegra 
apresenta a influência que a sensação de insegurança 
causa nos cidadãos, uma vez que eles são afetados 
psicologicamente e, como consequência, mudam as 
suas rotinas e adotam diferentes medidas protetivas. 
Por fim, a reportagem enfatiza que o medo da violência, 
gerado pelo clima de insegurança, é tão grave quanto a 
própria violência.
Já o texto 3 é um excerto do estudo “Educação em 
alvo: os efeitos da violência armada nas salas de aula”, 
realizado pela Diretoria de Análise de Políticas Públicas 
da Fundação Getúlio Vargas. No recorte apresentado, 
podemos observar números surpreendentes sobre os 
casos de violência no estado do Rio de Janeiro, um dos 
mais afetados por essa situação no Brasil, e perceber 
como milhares de alunos que frequentam as escolas 
cariocas foram prejudicados nos últimos anos. Também 
é preciso mensurar o triste fato de uma jovem estudante 
que foi atingida por uma bala perdida na escola em 
que estudava. Por fim, o trecho reforça a importância 
de se pensar em maneiras de reverter essa realidade. 
Integralmente, o mapeamento traz informações detalha-
das de como os tiroteios e disparos de armas de fogo 
atrapalham a vida de muitas crianças, impedindo o aces-
so delas a outro direito fundamental que está previsto na 
Constituição: a educação.
Vale destacar que a questão da insegurança e da 
violência pública é um problema que afeta não apenas 
os municípios do Rio de Janeiro, mas grande parte das 
cidades brasileiras, trazendo prejuízos para a educação 
e lesando também outros direitos individuais e coletivos, 
como saúde e lazer. Nesse contexto, podemos refletir 
sobre como a violência, cada vez mais recorrente, afeta 
o próprio direito que temos à liberdade. Afinal, se temos 
direito de ir e vir, mas temos medo ou somos impedidos 
de exercê-lo; se não conseguimos nos deslocar para 
onde queremos e quando precisamos, até que ponto 
somos livres? 
Recomendamos que você leia atentamente os 
textos apresentados, que os procure na íntegra e que 
busque outras fontes de informação para ficar ainda 
mais por dentro do assunto. Além disso, para que você 
demonstre seus conhecimentos e exercite a constru-
ção de argumentos consistentes, que tal elaborar 
um texto dissertativo a partir do tema: “Ir e vir: como 
a violência interfere no direito à liberdade?”. Que você 
tenha uma boa prática textual! 
Editorial
Incolumidade: isenção de perigo, de dano; segurança.
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riado no dia 31 de agosto de 1993, o Primeiro 
Comando da Capital (PCC), a princípio, 
designava apenas mais um time de futebol 
entre tantos outros que participavam de um 
campeonato no Anexo da Casa de Custódia de Taubaté, 
conhecido como Piranhão. O presídio de segurança 
máxima, no interior de São Paulo, já se tornara célebre 
pelas péssimas condições impostas aos presos. Vinte e 
cinco anos depois, o PCC assumiria o posto de maior 
organização criminosa brasileira, distribuindo drogas em 
quase todos os estados do Brasil e no exterior. 
O massacre da Casa de Detenção do Carandiru, 
ocorrido quase um ano antes da fundação do PCC, em 
outubro de 1992 – quando 111 presos foram mortos 
por policiais militares chamados para acabar com uma 
rebelião no Pavilhão 9 –, seria constantemente lembrado 
pelo grupo e ajudaria a dar força à ideia de união dos 
detentos contra “o sistema”. 
“Temos que permanecer unidos e organizados 
para evitar que ocorra novamente um massacre, 
semelhante ou pior ao ocorrido na Casa de Detenção 
em 2 de outubro de 1992, onde 111 presos foram 
covardemente assassinados, massacre este que jamais 
será esquecido na consciência da sociedade brasileira. 
Porque nós do Comando vamos sacudir o sistema e 
fazer essas autoridades mudarem a prática carcerária 
desumana, cheia de injustiça, opressão, tortura e 
massacres nas prisões”, afirmava o 13º artigo do 
estatuto de fundação do PCC.
Aos poucos, a facção se impôs como garantidora 
de um regime de autogestão da população carcerária, 
uma massa humana submetida à rotina de um sistema 
penitenciário que amontoava – e continua a amontoar – 
presos em espaços exíguos. Sem regras, organização e 
controles criados pelos próprios detentos, o convívio não 
seria possível nas celas. Muito sangue foi derramado até 
que uma nova ordem fosse imposta. A conquista dessa 
hegemonia nas prisões fez parte da primeira fase de 
crescimento do PCC. À medida que os presídios paulistas 
foram sendo dominados e as regras estabelecidas, a 
população carcerária passou a seguir uma espécie de 
pacto de não agressão, imposto pelo grupo. 
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POR BRUNO PAES MANSO
Facções 
criminosas no 
Brasil: origem 
e atuação
O surgimento do Primeiro Comando da Capital, conhecido como PCC, 
e de outros grupos que sustentam o crime no Brasil evidencia o precário 
sistema carcerário brasileiro e a falta de políticas públicas efetivas.
9
Até 1993, havia em São Paulo 36 unidades 
penitenciárias, concentradas sobretudo na capital e em 
municípios próximos. Nas décadas seguintes, ocorreria 
um processo de descentralização. Em 2017, eram 166 
unidades, em geral de tamanho menor do que aquelas do 
passado, boa parte espalhada pelo interior do estado, em 
cidades que ficam a até oito horas de ônibus da capital. 
O problema é que, simultaneamente a esse investimento 
na construção de novas cadeias, o número de presos 
também aumentou, em uma taxa explosiva. Em 1993, 
havia 32 mil detentos em São Paulo; em 2017, eram 
230 mil.
As prisões – chamadas pelos presos ironicamente 
de “faculdades” – se tornaram, cada vez mais, 
escritórios do crime, responsáveis por um crescente 
controle da atividade não só dos prisioneiros, mas 
também dos criminosos que atuavam fora da cadeia. 
Como o controle que o PCC exercia sobre as atividades 
dos criminosos livres aumentava, também cresciam os 
recursos repassados ao grupo e, consequentemente, o 
seu poder financeiro. 
No começo do novo século,o PPC se consolidou 
como o grande “sindicato” dos presos e criminosos 
em São Paulo. A partir daí, passou também a 
se lançar para o lado de fora das cadeias, 
tornando-se o principal empreendedor criminal brasileiro. 
Em algumas comunidades, passou a agir como 
mediador de conflitos e vendedor de drogas. Muitos 
bailes funks e “pancadões” são promovidos por 
seus integrantes para aumentar a venda de drogas. 
Em compensação, a capacidade de gerir e regular 
esse mercado – que sempre foi violento – criou uma 
situação aparentemente paradoxal: as vendas de droga 
aumentaram, mas os conflitos e os homicídios em São 
Paulo nunca alcançaram taxas tão baixas. 
Essa transformação na cena criminal e o avanço 
do PCC dependeram de uma mudança tecnológica 
crucial, ocorrida no final dos anos 1990 – a populariza-
ção do telefone celular. A organização feita a partir 
de São Paulo permitiu que a facção alcançasse as 
fronteiras e passasse a ganhar mais dinheiro no atacado 
das drogas, ampliando seus canais de distribuição para 
o resto do Brasil.
O resultado desse avanço foi sentido nas ruas 
das cidades. Nos últimos anos, o mercado da cocaína 
no Brasil se tornou um ponto fora da curva em relação 
ao que se passa no restante do mundo. Enquanto 
o consumo vem registrando quedas sucessivas em 
nações da Europa, nos Estados Unidos e no Canadá 
– fenômeno que é acompanhado pela tendência de 
queda na produção da droga na Colômbia –, o mercado 
consumidor na América do Sul, puxado pelo Brasil, teve 
aumento de mais de 50% entre 2010 e 2012, segundo 
as pesquisas feitas pelo Escritório das Nações Unidas 
sobre Drogas e Crime (UNODC). O crack também se 
espalhou por quase todos os municípios do Brasil.
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Em 2002, após 46 anos de funcionamento, o complexo do 
Carandiru foi demolido. 
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Em 2013, estudantes de Direito da Universidade de São 
Paulo (USP) colocaram 111 cruzes em frente ao prédio da 
faculdade para lembrar o número de presos mortos por 
policiais militares no Carandiru, em 1992.
 “A facção se impôs como garantidora 
 de um regime de autogestão da 
 população carcerária, uma 
 massa humana submetida 
 à rotina de um sistema 
 penitenciário que amontoava – e 
 continua a amontoar – presos em 
 espaços exíguos.” 
10
O impacto nas taxas de violência variou. Foi 
pequeno no caso de São Paulo, terra do PCC, 
onde a concorrência foi eliminada nos anos 1990 
e começo dos anos 2000, e também no Rio 
de Janeiro, onde até recentemente a disputa entre 
as grandes facções havia se tornado mais difícil 
e custosa, com a ocupação de muitos territórios 
pelas Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs). 
Entre 2004 e 2014, São Paulo e Rio apresentaram as 
duas maiores reduções nas taxas de homicídio entre 
as 27 unidades da Federação. No Rio de Janeiro, a 
situação voltou a degringolar depois da crise fiscal 
e da prisão do ex-governador. Funcionários públicos 
tiveram seus salários atrasados, e as facções voltaram a 
disputar o mercado de drogas, assim como aumentou a 
violência policial. 
Em muitos outros lugares do Brasil, principalmente 
nas regiões Norte e Nordeste, as taxas de homicídio 
se multiplicaram nesse mesmo período. Os aumentos 
foram liderados por estados como Rio Grande do Norte 
(308%), Maranhão (209%), Ceará (166%), Sergipe 
(107%), Pará (93%) e Amazonas (92%). Nos anos 1980 
e 1990, essas mesmas unidades da Federação estavam 
entre as menos violentas do país. O salto dos conflitos 
nesses locais fez com que o Brasil passasse a registrar 
quase 60 mil mortes por ano. Somos hoje o lugar no 
mundo onde mais se morre por homicídio.
Assim, surgiram grupos como o Bonde dos 40, 
no Maranhão, que protagonizou o conflito que 
culminou na decapitação de dois presos no Presídio 
de Pedrinhas, em 2013; a Firma, em Alagoas; o 
Comando da Paz, na Bahia; os Guardiões do Estado, 
no Ceará; o Bala na Cara, no Rio Grande do Sul. É 
também esse o caso da Família do Norte, facção do 
Amazonas que se beneficia do acesso privilegiado à 
cocaína, vinda por rios e florestas das divisas com 
o Peru e a Colômbia. Os conflitos se multiplicaram 
nos bairros mais pobres das cidades brasileiras, que 
testemunham a expansão do mercado de crack e a 
explosão das taxas de homicídio. Atualmente, são 
mais de 61 mil homicídios no Brasil, a marca mais 
elevada da história. 
 “As prisões – chamadas pelos 
 presos ironicamente de 
 ‘faculdades’ – se tornaram, 
 cada vez mais, escritórios do 
 crime, responsáveis por um 
 crescente controle da atividade 
 dos criminosos que atuam dentro 
 e fora da cadeia.” 
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Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) 
no Complexo do Alemão, 
Rio de Janeiro. 
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As facções surgiram como um efeito colateral 
inesperado de anos e anos de erros em políticas 
públicas. Apostou-se na política de guerra ao 
crime, com incursões policiais nos bairros mais 
pobres, prendendo jovens em grande quantidade. 
Nas prisões, as lideranças criminosas se 
fortaleceram e passaram a organizar esse grupo 
inimigo, abastecido pela raiva dos garotos contra 
o sistema violento e pelo dinheiro do tráfico de 
drogas. O tráfico continua a seduzir muitos 
jovens para esse caminho. A luta é para mostrar 
a eles que a vida do crime é uma ilusão. A vida 
com escola, emprego, diversão, arte, esporte, 
amor e conhecimento pode ser muito mais 
benéfica. Contudo, o Estado não pode fazer esse 
convencimento pelo uso da violência, porque o 
efeito colateral é o que vemos hoje.
Arquivo pessoal/ 
Bruno Paes Manso
Bruno Paes Manso é graduado em 
Jornalismo pela Pontifícia Universidade 
Católica de São Paulo e doutor e 
mestre em Ciência Política pela 
Universidade de São Paulo. Atualmente, 
realiza pesquisas sobre homicídios, 
confi ança institucional e legitimidade pelo 
Núcleo de Estudos da Violência da USP.
A 
intervenção federal no estado do Rio de Janeiro é um tema 
que tem causado muita polêmica nas últimas semanas, 
especialmente porque é a primeira vez que essa medida 
é empregada desde 1988, quando foi promulgada a nossa atual 
Constituição, a chamada Constituição Cidadã. A intervenção federal 
em um estado da União está prevista nesse documento, porém é uma 
medida extrema, excepcional. 
Em outros momentos, como na segurança da Copa do Mundo e das 
Olimpíadas e na ocupação das favelas cariocas pelas Unidades de Polícia 
Pacificadoras (UPPs), foi aplicada a chamada Garantia da Lei e da Ordem 
(GLO), que autoriza as Forças Armadas a atuar na segurança interna do 
país. No entanto, nessas ocasiões, a atuação do Exército, requisitada pelo 
governador do estado, deu-se em parceria com as polícias; a intervenção, 
por outro lado, ocorre quando o Governo Federal assume a segurança 
pública. Assim, o secretário de Segurança Pública e o governador não 
mais respondem pelo efetivo policial (Polícia Militar, Civil e Corpo de 
Bombeiros). No Rio de Janeiro, esse comando ficará a cargo de um 
interventor, o general do Exército Walter Souza Braga Netto. 
Não se pode negar que o Rio de Janeiro vive uma situação complicada 
em relação à violência, problema que não é de hoje, nem apenas nesse 
estado. Para citar apenas um exemplo, a cidade de Fortaleza, em 2017, 
registrou mais de cinco mil assassinatos, e, em janeiro de 2018, houve 
uma chacina em que 14 pessoas foram mortas. 
O Brasil assiste a um desmonte acintoso das instituições e a um ata-
que a diversos direitos da população, que ainda enfrenta um alto nível de 
desemprego. Não podemos, portanto, desvincular o aumento da violência 
no país – nesse caso, no Rio – do contexto geral de crise econômica e 
institucional. Outro ponto que deve ser analisado se refere ao momen-
to político em que essa intervenção está acontecendo. No final do mês 
de fevereiro, seria votada no Congresso a reforma da previdência, que é 
bastante impopular. Com a intervenção, nenhuma medidaque estabeleça 
uma mudança na Constituição, como seria o caso, pode ser votada. Des-
sa forma, o governo pode ganhar tempo para fazer novas articulações.
Assim, será que a intervenção é a solução, visto que ela não ataca a 
causa do problema? Do mesmo modo como aconteceu no período das 
ocupações das favelas pelas UPPs, os chefes do tráfico nos morros aca-
bam se espalhando para outros estados até que o Exército saia da cidade. 
Quem fica e acaba morto é o menor de idade que foi aliciado; quem sofre 
é a população pobre e negra da favela que tem sua vida invadida, sua 
casa revistada e seu nome fichado. Mas, afinal, é mais fácil fazer uma 
intervenção imediata ou a prevenção sistemática e contínua com políticas 
públicas? O ideal é investir em saúde, educação e também em segurança, 
uma vez que a situação da polícia nos estados é insustentável.
Violência no Rio de Janeiro: intervir ou prevenir? 
T O Q U E D O
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Ciências Humanas e suas Tecnologias
História
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O Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) 
estabelece competências e habilidades 
norteadoras do estudo dos conteúdos 
exigidos para o Ensino Médio. Por meio do 
texto “Facções criminosas no Brasil: origem 
e atuação”, foram trabalhadas as seguintes 
competências e habilidades da área de 
Ciências Humanas e suas Tecnologias.
Competência de área 3 – Compreender 
a produção e o papel histórico das 
instituições sociais, políticas e econômicas, 
associando-as aos diferentes grupos, 
conflitos e movimentos sociais.
H11 – Identificar registros de práticas de 
grupos sociais no tempo e no espaço.
H12 – Analisar o papel da justiça como institui-
ção na organização das sociedades.
H13 – Analisar a atuação dos movimentos 
sociais que contribuíram para mudanças ou 
rupturas em processos de disputa pelo poder.
H15 – Avaliar criticamente conflitos culturais, 
sociais, políticos, econômicos ou ambientais 
ao longo da história.
 
POR AMANDA CHAVES RAPOSO
12
CARREIRA:
Políticas Públicas
Gabriela possui graduação em Gestão 
de Políticas Públicas pela Universidade 
de São Paulo e especialização em 
Controladoria Governamental pela Escola 
Superior de Gestão e Contas Públicas 
Conselheiro Eurípedes Sales, instituição 
pertencente ao Tribunal de Contas 
do Município de São Paulo. Atuou na 
Secretaria Municipal de Planejamento, 
Orçamento e Gestão e, atualmente, 
trabalha como Assessora Especial 
no Núcleo Técnico de Contratações 
de Serviços de Saúde, na Secretaria 
Municipal da Saúde de São Paulo. 
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E N T R E V I S TA | Gabriela TavaresE N T R E V I S TAE N T R E V I S TA 
1313
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Equipe Leia Agora: Como é a grade curricular do 
curso superior de Políticas Públicas? Quais devem 
ser as habilidades e preferências do candidato a 
essa área?
A grade curricular é bastante diversa e interdisciplinar. 
É formada tanto por Filosofia e Sociologia, que ajudam 
a entender a arte da política, quanto pela parte de 
Ciências Humanas Aplicadas (Administração, Conta-
bilidade, Economia e um pouco de Estatística). Tudo 
isso para o aluno entender o que são políticas públicas 
e ter capacidade para avaliá-las. As habilidades 
necessárias são, além de paixão pela área pública, a 
vontade de fazer política pública e a consciência de que 
se trabalha pelo todo, que se trabalha pelo público.
Equipe LA: Um profissional de Políticas Públicas atua 
apenas no setor público ou seria possível ingressar 
no setor privado? Por quê?
Política pública é qualquer tipo de política que atenda 
o maior número possível de pessoas, visando ao bem 
maior. Então, diretamente, o Estado é o maior executor 
de políticas públicas; mas, em um segundo momento, 
existem empresas do terceiro setor – as ONGs e as 
OSCIPs – que também têm interesse público. Há 
ainda setores de grandes instituições, como alguns 
bancos, que tencionam fazer políticas públicas através 
de melhorias pontuais, mas que, sobretudo, revelam 
interesse público.
Equipe LA: Como fazer parte desse mercado de 
trabalho? O curso exige que o estudante faça 
estágios?
O mercado de trabalho para quem é formado em 
Políticas Públicas é muito amplo, você pode trabalhar 
tanto no setor público quanto no privado. O curso 
exige que se faça estágio para se formar e também há 
a possibilidade de ingressar em projetos de iniciação 
científica.
Equipe LA: Essa graduação é relativamente nova;
sendo assim, quais são os principais desafios da área?
O curso tem aproximadamente 11 anos, então existem 
muitos desafios. O primeiro deles é o próprio órgão 
público reconhecer quem é formado em Políticas 
Públicas como um especialista; isso tem sido feito 
através de alguns concursos. Vários professores da 
própria graduação lutam para que o curso seja visto 
como capaz de sanar brechas que existem nas áreas 
pública e privada hoje em dia. Por isso, em suma, o 
reconhecimento é o maior desafio.
Equipe LA: Além da graduação, de que forma o 
estudante poderá se especializar e dar continuidade 
à vida acadêmica?
Eu, por exemplo, após me formar, fiz uma especialização 
em Controladoria Governamental e agora começarei um 
mestrado em Políticas Públicas, mas existe quem vá 
para as áreas de Cultura, Assistência Social, Sociologia 
ou até invista em um MBA. Quem se forma em Políticas 
Públicas, que é uma área ampla, pode se formar em 
diversas áreas específicas, se assim desejar.
Equipe LA: Quando falamos em políticas públicas, 
logo vem à mente a área da política propriamente 
dita. O profissional desse setor, necessariamente, 
trabalhará com políticos?
Não necessariamente. Existem técnicos, como é o 
meu caso, que não trabalham diretamente com a área 
política. A partir de diretrizes amplas de uma secretaria, 
trabalhamos formulando, implementando e avaliando 
políticas públicas. Não existe uma relação direta com 
a persona política. Contudo, tem quem vá para a área 
da Assembleia Legislativa ou trabalhe diretamente 
com parlamentares. Existe a possibilidade, inclusive, 
de o profissional ser o próprio político, afinal, tem uma 
formação mais específica e mais elaborada do que 
qualquer político que esteja atuando hoje.
 “Política pública é qualquer tipo de política que 
 atenda o maior número possível de pessoas visando 
 ao bem maior. O graduado pode trabalhar tanto 
 no setor público quanto privado” 
14
Equipe LA: As políticas públicas envolvem muito 
mais áreas dentro de uma administração municipal, 
por exemplo. Quais são os subsetores dessa área?
É preciso tornar a política pública mais interdisciplinar, 
mais intersecretarial, e hoje isso não ocorre de fato, 
especialmente na política municipal de São Paulo [onde 
Grabriela atua]. Contudo, no programa Redenção, que 
é o novo programa de combate às drogas, existe uma 
necessidade de relação direta com o Governo do Estado. 
Dentro das próprias secretarias de saúde e educação, há 
muita conversa, porque, para garantir que a pessoa tenha 
uma melhor concepção de saúde, é necessário inserir, na 
área de educação, conceitos de como se cuidar. Existem 
pequenas interfaces entre as secretarias que poderiam ser 
mais bem exploradas caso elas conversassem mais de 
perto.
Equipe LA: Qual é a diferença entre os cursos de 
Políticas Públicas, Políticas Sociais e Administração 
Pública?
Eu entendo que quem é formado em Políticas Públicas 
está mais envolvido na parte da gerência, de formulação, 
implementação e avaliação de política pública, que é 
uma outra ênfase com relação à das Políticas Sociais, as 
quais têm mais a ver com os estudos e resultados dessas 
políticas. Já a Administração está ligada a “como fazer”, 
o que envolve os trâmites legais e processuais, e ao que 
precisa ser feito para atingir uma política pública. Isso 
torna Políticas Públicas uma área mais ampla do que asoutras duas, porque estas estão dentro daquela.
Equipe LA: O curso é da área de Humanas, mas é 
preciso ter domínio em outras áreas. Quais são elas?
Não é necessário ter um domínio vasto, mas é importante 
não ser avesso à área de Exatas, pois, para avaliar uma 
política pública, pode ser necessário fazer análises 
quantitativas, que dependem um pouco da capacidade 
estatística. Não que seja necessário fazer cálculos, 
mas é preciso analisar resultados. Contabilidade, por 
exemplo, que, apesar de não ser Exatas, pertence à área 
de Humanas Aplicadas, é uma disciplina em que se lida 
com números, com caixa etc. Então, eu diria que não 
se pode ser avesso a outras áreas para que isso não o 
impeça de realizar o trabalho.
Equipe LA: Por que você recomendaria essa carreira?
É uma área incrível, é apaixonante estar em um mundo 
cheio de problemas e buscar várias soluções. Essa 
carreira exige que você seja criativo e inteligente, 
tenha visão, seja estrategista, saiba lidar com a política 
e tenha jogo de cintura. Não é um curso muito fácil, 
principalmente no campo prático, mas é uma delícia 
ver uma política pública funcionando, com avaliação 
positiva. Ver seu trabalho dar frutos e cuidar das 
pessoas é gratificante e enriquecedor.
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Política pública é qualquer tipo de política que 
atenda o maior número possível de pessoas, 
visando ao bem coletivo.
1515
A violência que amedronta a população de tantas cidades brasileiras parece não ter limites, 
e, como consequência, a população pode ficar descrente de um futuro melhor. Em 2016, por 
exemplo, o Brasil bateu recorde de mortes violentas: 61.619 pessoas morreram vítimas de 
homicídios, latrocínios (roubos seguidos de morte) ou lesões corporais, um crescimento de 3,8% 
em comparação com 2015, sendo o maior índice de mortes violentas na história do país, de acordo 
com o Anuário Brasileiro da Segurança Pública.
Em contrapartida, os dados sobre emprego e escolaridade não seguem a mesma proporção. 
Em 2017, a economia fechou 20.832 postos de trabalho com carteira assinada, segundo o Ministério 
do Trabalho. A taxa média de desemprego chegou a 12,7% no Brasil, a maior em cinco anos, de acordo 
com a pesquisa Pnad Contínua, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). 
Entre os desempregados estão pais e mães de família que, muitas vezes, precisam da ajuda dos 
filhos na manutenção financeira de suas residências bem antes da hora. A exemplo disso, um outro 
número destaca-se: 1,5 milhão de jovens com idade entre 15 e 17 anos estão fora da escola, de 
acordo com o Ministério da Educação. Seriam adolescentes que precisaram abandonar os estudos 
para trabalhar? Jovens que migraram para o mundo do crime movidos por uma promessa enganosa 
de melhores condições de vida?
Com disparidades sociais tão evidentes, talvez não seja preciso ser especialista para afirmar que 
um país com oportunidades escassas tende a apresentar problemas sociais, entre eles a violência. 
A desigualdade reflete nas mais diversas áreas, e, com menos emprego e mais gente sem acesso à 
educação, muitas pessoas acabam procurando resultados duvidosos para fugir dessa equação. 
Outro reflexo da desigualdade é a distribuição desleal de renda. O Brasil tem, atualmente, 
cinco bilionários com patrimônio equivalente ao da metade mais pobre da população. Os mais ricos 
aumentam seus rendimentos de maneira fácil, principalmente por meio de heranças e monopólios. 
Já os mais pobres precisam se contentar com salários que, por vezes, não atingem o mínimo. 
Diante de tantas diferenças, até que ponto a violência pode ser considerada consequência 
apenas de uma segurança pública frágil? Quantas famílias acabam aliciadas pelo tráfico de drogas, 
pelo roubo e pelo estelionato, quando se veem sem alternativas financeiras e sem perspectivas 
de melhoria? Talvez, ao existirem oportunidades mais promissoras e menos dependência de 
caminhos escusos, a violência possa dar espaço à evolução social e à vida digna que todo 
cidadão merece. Parafraseando Renato Russo, na música Índios, “quem me dera ao menos 
uma vez que o mais simples fosse visto como o mais importante”.
Violência e desigualdade social 
caminham juntas?
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Po r Ed i l ene Fa r ia
Celso Diniz/Shutterstock.com
Favela de Paraisópolis, ao lado do 
bairro Morumbi, um dos mais nobres 
da cidade de São Paulo.
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Nana Queiroz. Presos que menstruam. 
Rio de Janeiro: Record, 2015.
O livro-reportagem conta a história de sete 
personagens reais: mulheres que acabaram 
na criminalidade, na maioria das vezes por 
falta de oportunidade, e vítimas de violência 
doméstica. A precariedade dos presídios 
femininos também é retratada e levanta 
uma questão: é possível se ressocializar em 
meio à violência que parte de quem deveria 
proteger a sociedade? 
POP STARS DA VIOLÊNCIA
No mundo do crime, especialmente em comunidades pobres 
e com poucas oportunidades, é comum nos depararmos com 
bandidos no poder. Eles comandam a rotina, o comércio 
e até mesmo a segurança das favelas. Enfrentam o governo 
e as autoridades e, inevitavelmente, assumem papel de 
pop stars. Sobre a realidade vivida no Rio de Janeiro, 
dois livros traduzem bem esse tema.
O livro-reportagem Abusado – o dono do morro 
Santa Marta, publicado em 2003, tem uma narrativa 
investigativa que mostra a rotina de Márcio Amaro de 
Oliveira, conhecido como Juliano VP – traficante que 
nasceu na favela Santa Marta. A obra, do jornalista 
Caco Barcellos, revela o emocional do criminoso em 
questões como o relacionamento com a comunidade, 
o tráfico de drogas, a infância sem oportunidades e a 
postura perante a polícia. O escritor narra a influência de 
Juliano VP no Comando Vermelho, uma das principais 
facções criminosas da capital carioca, e o retrata como um 
“mito”. A empatia com o personagem parece ser inevitável. 
Outra obra tem um nome parecido: O dono do morro, 
do jornalista britânico Misha Glenny. Ele narra a ascensão e a 
queda de Antônio Francisco Bonfim Lopes, o Nem, ao poder na 
favela da Rocinha, também no Rio. Foram dez entrevistas na prisão 
com o traficante, descrito pelo jornalista como alguém benevolente, 
que diminuiu as taxas de homicídio na favela e que levou o status da 
Rocinha ao de maior produtora de cocaína da capital carioca – além de 
destino turístico de artistas famosos e visitantes de várias partes do planeta.
Tropa de Elite 2: o inimigo agora é outro. 
Direção: José Padilha. Brasil, 2010.
Dez anos depois do primeiro enredo, o 
agora coronel Nascimento está fora do 
BOPE – Batalhão de Operações Policiais 
Especiais do Rio de Janeiro. Ele 
tornou-se subsecretário de Inteligência 
na Secretaria de Segurança Pública e se 
vê diante de uma nova missão, tão difícil 
quanto enfrentar as facções criminosas: 
combater a formação de milícias nas 
favelas e a corrupção entre os policiais. 
Silêncio das Inocentes. 
Direção: Ique Gazzola, 2010. 
O documentário explica como funciona a Lei 
Maria da Penha. Considerada uma das três 
legislações mais completas sobre violência 
contra mulheres no mundo, a lei carrega o 
nome da bioquímica e farmacêutica cearense 
que ficou paraplégica depois de ser baleada 
pelo marido. Vítimas de violência doméstica e 
especialistas na área intercalam depoimentos, 
para ampliar a discussão sobre o tema.
Acesse: <https://youtu.be/GZAOoVxTQus>.
Mosaico 
 Cultural
• A G E N D A •
SEGURANÇA 
Feira Internacional de Segurança Pública e 
Corporativa
 De 10 a 12 de abril
ONDE: Transamerica Expo Center – São Paulo. 
O encontro reunirá empresas e órgãos 
públicos de 12 países para apresentar as 
novidades do mercado e discutir o setor. 
Além dos estandes, haverá palestras sobre 
segurança e reuniões com conselhos e 
colégios de segurança pública. 
INFO: <www.laadsecurity.com.br>.
ARTE
Maria Auxiliadora: vida cotidiana, pintura e 
resistência
 Até 11 de junho
ONDE: MASP – São Paulo.
Maria Auxiliadoranasceu em Minas Gerais 
e cresceu em São Paulo, em uma família 
de artistas autodidatas que integravam o 
movimento negro. Em suas telas, ela exalta o 
protagonismo negro, por vezes deixado de lado 
na arte brasileira.
INFO: <https://masp.org.br>.
VÍDEO
“Sonho de preta conta”. Direção: Viviane Ferreira. 
Brasil, 2017.
 Permanente
ONDE: Internet.
Doze mulheres negras, doze sonhos. A websérie 
reúne vídeos de curta duração como resultado 
de uma ação coletiva entre organizações de 
mulheres negras que atuam no combate ao 
racismo e ao sexismo, em quatro capitais 
brasileiras: São Paulo, Recife, Brasília e Rio de 
Janeiro. 
INFO: <www.oxfam.org.br/sonho-de-preta-conta>.
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Serena só se deu conta de que estava acompanhada ao escutar a frase 
pronunciada pelo rapaz sentado à sua frente. Ele estampava uma tristeza 
profunda no olhar ainda fixo na mão de Serena, que recuava sobre a toalha 
impecavelmente limpa. 
A pergunta se repetia no pensamento da moça. Por impulso, culpou primeiro 
a avó por tê-la criado com tantas restrições, por não tê-la deixado sair sozinha, 
falar com estranhos, entrar em um elevador só com homens ou andar na rua 
à noite. “É para sua segurança, minha filha”. Mas ela era jovem, não queria 
sentir-se segura, queria viver.
Insatisfeita com o comportamento da neta, a avó passou a contar histórias 
terríveis sobre mulheres que “se descuidaram”, convencendo Serena a evitar tais 
sofrimentos a qualquer custo. “Você não quer acabar como a sua mãe, não é?”.
Não queria, mas, mesmo assim, foi impossível fugir do triste destino. Em um 
dia de distração, notou tarde demais que um homem estava grudado em seu 
corpo no vagão lotado do trem. Invadida pela culpa, manteve-se calada durante 
todo o expediente, vestindo a roupa impregnada pelo pecado daquele homem 
mau. Aliviada por não terem reparado nas manchas em sua calça, voltou para 
casa com pressa, despiu-se e lavou a roupa e o corpo em segredo. 
A avó nunca soube daquela nem de tantas outras violências sofridas pela 
moça – como no dia em que não foi promovida no trabalho porque o chefe 
queria mais do que uma mera secretária. Serena recusou os avanços do patrão 
em silêncio e também se calou quando o doutor a demitiu, dizendo: “mulher é 
bicho que sangra, com emoções complicadas demais”. 
Traumas como aquele formaram pequenas rachaduras em seu coração 
inocente, que só pensava em ser livre e viver em paz. Quanto mais fugia do medo, 
mais ele a perseguia, mais o perigo espreitava, com seus trajes masculinos e 
mãos brutas, sedento pelo corpo e pela alma de Serena. Era refém da sensação 
de que aconteceria de novo, de que um dia a tocariam sem o seu consentimento, 
de que, como sua mãe, seria levada dessa vida “em nome do amor”. 
Que amor é esse, que mata e sufoca? Serena concluiu que o amor também 
era culpado pelo medo que a paralisava e, como medida de proteção, decidiu 
vestir com orgulho uma carranca ameaçadora. Aposentou os sorrisos e parou 
de fazer jus ao seu nome, vivendo em constante estado de apreensão. O 
nervosismo passou a acompanhá-la como um carrapato a sugar suas energias. 
— Onde você aprendeu a sentir tanto medo? – perguntou a si mesma, já 
sabendo a resposta. Com os olhos baixos e o coração apertado, Serena teve 
a certeza de que aquele encontro jamais se transformaria em algo além de 
um simples jantar. Pediu licença, levantou-se e partiu, sem olhar para o rosto 
tristonho do rapaz incrédulo. 
Lembrou-se de uma citação de alguém cujo nome era uma incógnita: 
“A sombra do medo paira constante sobre a vida da mulher”. Quem quer que 
tenha escrito aquilo tinha razão. 
“Onde você aprendeu a 
sentir tanto medo?”
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