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Universidade de São Paulo 
Escola de Educação Física e Esporte 
 
 
 
 
 
 
Capoeira versus Mercadorização, qual o fim desse jogo? 
Um estudo sobre as antigas e atuais formalidades da manifestação 
cultural capoeiragem. 
 
 
 
 
Carolina Ramos Heleno 
 
 
 
 
 
 
 
São Paulo 
2010 
 
Carolina Ramos Heleno 
 
 
 
 
Capoeira versus Mercadorização, qual o fim desse jogo? Um 
estudo sobre as antigas e atuais formalidades da manifestação 
cultural capoeiragem. 
 
 
 
 
 
Monografia apresentada à Escola de Educação Física e 
Esporte da Universidade de São Paulo como requisito parcial à obtenção do 
título de bacharel em Educação Física. 
 
 
 Orientador: Prof. Dr. Luiz Eduardo Pinto Bastos Tourinho Dantas 
 
 
 
 
São Paulo 
2010 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Heleno, Carolina Ramos 
Capoeira versus Mercadorização, qual o fim desse jogo? Um estudo sobre 
as antigas e atuais formalidades da manifestação cultural 
capoeiragem./Carolina Ramos Heleno. 2010. 
viii, 48f. 
 
 Monografia (Bacharelado em Educação Física) - Escola de Educação 
Física e Esporte da Universidade de São Paulo. 
 Orientador: Profº: Dr°. Luiz Eduardo Pinto Bastos Tourinho Dantas 
 
 
 
 
 
 1. Capoeira. 2.Cultura Corporal. 3.Capitalismo. 4. Titulo 
 
DEDICATÓRIA 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
A minha enorme família de amigos e familiares, 
pela compreensão e risadas 
em todos os momentos.
AGRADECIMENTOS 
 
Mais difícil que a própria tarefa de se escrever uma monografia é agradecer as pessoas 
que se fizeram importantes nesse e em outros processos da minha vida. A memória certamente 
não é algo em que devemos confiar, por isso peço desde já compreensão dos/as possíveis 
esquecidos/as por eu não fazer uso da gincobiloba diariamente! 
Gostaria primeiramente de agradecer as pessoas que mais me toleram no dia-a-dia, à 
minha mãe que toda vez que me encontra no computador pensa que eu estou no orkut, e assim 
não para de falar sobre arrumar a cama, lavar louça; ao meu pai que ao me ver logo oferece uma 
taça de vinho bagunçando assim todas as minhas idéias; à minha irmã que mais perto do que 
nunca tem me ajudando a “perder todas as minhas amizades”. Brincadeiras a parte, obrigada 
pelo carinho, amor e compreensão no percurso em que sem vocês não teria graça. 
À minha grande família Ramos & Heleno espalhados/as pelo Brasil gerando uma grande 
saudade que ao menos me faz exaltar minhas raízes. 
Agradeço também às pessoas que não nasceram com o maravilhoso direito de usar o 
sobrenome Heleno mas que fazem parte também de minha família: À Geh, Marília, Flávio, 
Natalia, Bruno, Ian, Pombo, Davi, Pequeno, Zé, Osama, Belão, Mari, Dricão, Daia, Dani, Gru-
Pau, meus “namorados”, Marcão, Japonês, Camila, Julia, Flávia, Célis, Dri, Cris, Turola, Kowa, 
Anna Grzmil, Érika Nilsson, Dale Simpson, the Kenning’s; por toda força, festas, bagunças, 
pseudo consultas psicanalíticas, enfim pela infinita amizade e carinho. 
Aos meus orientadores Luiz, que está em um grande trabalho em busca de seu pós 
doutorado e por isso não foi tão presente, pelo menos não ouvi tantas broncas do tipo :”Você 
não tem tempo, escreve logo!!” e novamente ao Pequeno e ao Osama, que além de lerem minhas 
confusas idéias, me ajudaram trilhar os caminhos tortuosos da monografia como também me 
orientaram a rumos de uma pessoa consciente de suas capacidades e limitações. 
Por fim e não menos importante, aos estudantes que dão vida ao movimento estudantil e 
principalmente aos de minha áreas concentrados na ExNEEF, por me apresentarem um novo 
mundo, onde não me sinto um E.T. pois foram nesses espaços que percebi que a Cultura Popular 
é sim parte integrante da Educação Física e que é possível estuda - lá com o apoio de grupos e 
até de universidades. Às pessoas trabalhadoras do Espaço Cachuêra! que mesmo não 
respondendo a meus emails foi importante nesse processo, tanto pessoal quanto acadêmico, no 
fornecimento de ricos materiais utilizados na compreensão de meu tema e de minha vida. Às 
pessoas e a biblioteca da FFLCH, mesmo tendo que passar por um processo burocrático chato, é 
tão rica e fácil de encontrar material. Às pessoas e a biblioteca da EEFE, que em muito 
momentos foi um ponto de encontro não apenas de fofoca mas também construtivos, formadores 
de personalidade. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
“Eu não é doutô, eu não é infermerô 
E como vô tomar conta de botica na Piedade? 
Ai papai Ai mamãe 
E como vô tomar conta de botica na Piedade? 
Eu não sabe ler e eu não sabe escrever 
E como vô tomar conta de botica na Piedade?” 
 
Ponto de Jongo, manifestação cultural afro 
– descendente. Domínio público. 
 
 
 
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RESUMO 
 
 
 Partindo de uma critica a prática da capoeira com fins exclusivamente voltados para a 
melhoria de aspectos físico e/ou aprendizado da técnica de golpes da capoeira, este trabalho 
pretende “descobrir” as diferentes formalidades (sentidos) que foram surgindo e se modificando 
ao longo de sua formação no Brasil. Inicialmente, através de uma revisão histórica da 
manifestação cultural – Capoeira, foram identificados esses sentidos esquecidos dessa 
manifestação. Em seguida, foi identificado aspectos do atual discurso acerca da importância da 
prática da capoeira que são veiculados por as instituições que oferecem experiências/treinamento 
dessa manifestação. Investigou-se nove (9) que representam diferentes imaginários na 
sociedade: Academias (2), Grupos de capoeira (2), Centros Culturais (2), Associação Culturais 
(3). Com base nessas análises conclui-se que a Capoeira se encontra em um acelerado processo 
de mercadorização. 
 
Palavras - chave: Capoeira, Cultura Corporal, Indústria Cultural, Mercadoria, Capitalismo. 
 
 
 
 
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SUMÁRIO 
 
 
 
 
INTRODUÇÃO ..................................................................................................... 10 
 
METODOLOGIA .................................................................................................. 11 
 
1. REVISÃO CONCEITUAL. ................................................................................ 12 
1.1. Indústria Cultural e Mercadorização. ......................................................... 12 
 
2. ETIMOLOGIA DO TERMO CAPOEIRA. ........................................................ 13 
 
3. “MAIS UM DIA AMANHECEU E EU FIQUEI A PERGUNTAR COMO FOI QUE 
COMEÇOU ESSA ARTE SECULAR” – CAPOEIRA E SUAS RAÍZES. .............. 15 
 
4. A POPULAÇÃO ESCRAVA E “SUA” CAPOEIRA ......................................... 16 
 
5. “RIO DE JANEIRO/ NESSA TERRA TEM CAPOEIRA/ TEM RODA O ANO INTEIRO” - 
CAPOEIRAGEM CARIOCA ................................................................................. 17 
 
6. CRIMINALIZAÇÃO DA CAPOEIRA ................................................................ 19 
 
7. POLÍTICAS DE EUGENIZAÇÃO NO BRASIL ................................................ 21 
7.1 Eugenização (embranquecimento) da Capoeira .......................................... 22 
7.1.2. A conjuntura da busca por uma luta “branca”, ops... brasileira .............. 23 
 
8. CAPOEIRA BAIANA PÓS 1930. ...................................................................... 25 
 
9. A ATUAL FORMALIDADE DA CAPOEIRA - OS DIFERNTES OBJETIVOS DE UMA 
“MESMA” MANIFESTAÇÃO CULTURAL. ........................................................ 28 
9.1 Capoeira Mercadoria ................................................................................... 29 
9.2 Capoeira como fenômeno social ................................................................. 37 
 
10. CONSIDERAÇÕES FINAIS ...........................................................................39 
 
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................................... 42 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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INTRODUÇÃO 
 
 
Antes de iniciarmos peço licença aos meus ancestrais e orixás para entrar nessa roda 
mista de Jongo e Capoeira, pois serão assuntos que iremos tratar ao longo do trabalho. Como 
mensagem nos apropriamos de um ponto de abertura do Jongo, por ser parte integrante da 
Cultura Popular e também ser uma manifestação afro-brasileira, a qual pessoalmente me traz 
ótimas sensações, sendo essa a justificativa para sua breve citação na monografia. 
A primeira etapa do longo processo de se escrever um trabalho que abordasse uma 
manifestação da cultura popular, começou com exercícios para nos encaixarmos nos preceitos da 
ciência positivista, a qual todos os argumentos, dados, fatos devem estar balizados por estudos 
prévios, para assim serem validados. Porém, quando tratamos de processos que foram 
qualificados através da transmissão oral de conhecimentos, essa tarefa se dificulta. Para que o 
tema central desse trabalho fosse melhor abordado iremos nos apropriar de um diferente objeto 
da Educação Física – a Cultura Corporal – diferente somente quando comparamos com o objeto 
tratado na Escola de Educação Física e Esporte - EEFE. 
A principal motivação desse estudo é pautada na hipótese de que a Cultura Corporal, 
mais precisamente a Capoeira sofre uma apropriação mercadorizada pelo atual modelo 
econômico, o Capitalismo, especificamente a Indústria Cultural. Acreditamos nessa hipótese a 
partir dos argumentos de Paula Silva (2002) de que além de se mercadorizar alguns setores da 
Capoeira criam uma série de apelos, como roupas para melhora da performance, e 
principalmente o argumento da prática em academias da moda em detrimento de sua 
manifestação nas ruas e praças. 
A fim de consubstanciar nossa hipótese iremos analisar a história dos sentidos da 
Capoeira, desde o seu controverso surgimento até chegarmos em um momento histórico em que 
a prática não se caracteriza majoritariamente como fenômeno social mas sim por uma prática 
individualista e reduzida a certas capacidades humanas por conseqüência desse modelo 
econômico em que atualmente estamos vivendo. 
 
 
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METODOLOGIA 
 
 
Para o desenvolvimento desse trabalho realizamos uma pesquisa bibliográfica, 
enfocando os sentidos que a Capoeira foi adquirindo ao longo de sua história no Brasil. Também 
apresentaremos relatos orais e entrevistas com antigos praticantes da manifestação cultural, pois 
entendemos que por estarmos trabalhando com o universo da cultura popular esse método 
consegue também abranger as “vozes populares” que nem sempre são ouvidas em trabalhos de 
orientação acadêmica. 
Esclarecemos alguns conceitos pertinentes para a análise de conjuntura, como a Indústria 
Cultural, e conceitos balizadores de todo o trabalho como termos referentes a Capoeira e sua 
própria classificação segundo a perspectiva utilizada nesse trabalho. 
Por fim, investigamos as instituições que trabalham com a Capoeira a fim de identificar 
em seus discursos a atual formalidade da manifestação cultural e o quanto está influenciada pelo 
modelo econômico capitalista. Utilizamos o sitio do Portal da Capoeira1 como instrumento de 
busca, onde éramos redirecionados aos sítios das instituições procuradas. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
1 www.portalcapoeira.com 
 
 
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1. REVISÃO CONCEITUAL. 
 
 
1.1. Indústria Cultural e Mercadorização. 
 
A mercadorização de culturas é, como tanto outros fenômenos, intrínseco ao contexto 
histórico e espaço em que ocorrem. Para melhor localizar o/a leitor/a, explicitaremos o conceito 
de indústria cultural e mercadorização, pois ao abordamos a Capoeira contemporânea tais 
conceitos serão discutidos. 
A idéia de indústria cultural foi primeiramente elaborada por Horkheimer e Adorno 
(1947), no trabalho intitulado “Dialética do Iluminismo”, a qual qualifica a exploração de bens 
considerados culturais pelos meios de comunicação apenas com fins comerciais. O termo foi 
empregado para substituir o antigo “cultura de massa”, que estava sendo erroneamente utilizado. 
Tentava-se entender, através desse primeiro termo, o significado de uma cultura que surgia 
espontaneamente das próprias massas. Porém, Adorno que divergia dessa interpretação, 
acreditava sim em uma adaptação dos produtos ao consumo das massas como também uma 
determinação dos gostos através dessa manipulada inclusão da cultura popular pelas mídias. A 
indústria cultural em relação aos homens tem interesse apenas como consumidores ou 
empregados, reduzindo a cultura a seus interesses puramente econômicos, destituindo os 
homens/mulheres da autoridade da transformação/criação da sua cultura, ou em outras palavras, 
da transformação/criação de sim mesmo. 
O conceito de mercadorização está intrinsecamente ligado à indústria cultural, pois 
entende-se que os meios de comunicação se apropriam e ditam os gostos e costumes de uma 
sociedade, ou seja, eles passam a ser o critério último de qual cultura tem valor (valor sempre 
associado ao sentido de valor de mercado). É exatamente através da criação de mercadorias que 
esse controle é gerido (ADORNO,1947). As culturas antes manifestadas por excelência nas 
diversas camadas sociais, são apropriadas pela mídia tornando-se mercadorias dentro de um 
comércio fraudulento, no qual os consumidores são enganados em relação ao que lhes é 
prometido, mas nunca cumprido. Para além, Karl Marx, em sua obra “O Capital”, teoriza a partir 
da idéia de que esse enganar promovido pela mercadoria, pode gerar um caráter fetichista no 
individuo, venera-se a coisa auto-promovida, elevando-a a tal ponto de que o trabalho é retirado 
do processo de construção tornado-a animada e com vida própria. A mercadoria adquire uma 
 
 
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super valoração elevando o seu valor de troca. 
A mercadorização não ocorre somente com cultura populares, mas também com outras 
vertentes da Cultura Corporal, como os esportes por exemplo. Montagner & Rodrigues em seu 
artigo publicado em 2005 na Revista da Faculdade de Educação Física da Unicamp intitulado 
“Esporte-Espetáculo e Sociedade: Estudos Preliminares sobre sua Influência no Âmbito 
Escolar” utiliza uma citação que aborda o processo de mercadorização do esporte: 
 
 
enquanto fenômeno da cultura, é expressão da ludicidade, socialização e comunicação 
que, uma vez na forma esportiva, permitem ao homem efetivação e aferição da auto-
superação de suas capacidades humanas. A partir do momento que em assume a forma 
de espetáculos, praticado para uma assistência pagante e legado a um capital comercial, 
com vistas à reprodução deste mesmo capital, o esporte passa a ter características de uma 
mercadoria e a possuir um valor-de-troca que será determinante para sua história. Esse 
fenômeno de mercadorização já foi observado também em outras áreas relacionadas à 
cultura. (MONTAGNER; RODRIGUES, 2005, p. 20). 
 
 
Tendo esclarecido, mesmo que superficialmente, o conceito de mercadoria 
mercadorização podemos seguir com o caminhar dessa monografia aprofundando no tema em si, 
a manifestação cultural Capoeira. 
 
 
2. ETIMOLOGIA DO TERMO CAPOEIRA. 
 
 
O estudo da história das palavras - Etimologia - se faz importante neste estudo seguindo 
a perspectiva teórica do professor Munanga (2005) de que a maioria dos conceitos tem seu 
campo semântico e uma dimensão temporal e espacial. Ou seja, o significado que certos 
conceitos trazem consigo vão mudando ao longo do tempo e de lugares para lugares. 
O termo amplamente usado para a descrição da manifestação cultural que abordarei - 
capoeiragem, Capoeira – também traduzia diversos significados dependendo da época em que 
eram utilizados. Munanga (2005) reforça que os termos sãoconvencionais e arbitrários, por isso 
iremos brevemente apresentar alguns significantes do termo Capoeira. 
A Capoeira enquanto manifestação corporal tem suas origens continuamente debatidas, 
 
 
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entretanto, não se alcançou consenso até o presente momento. Alguns estudos apontam 
diferentes raízes sendo elas africanas, indígenas, afro-brasileiras ou uma miscigenação de várias 
culturas. Apresentando o mesmo teor contraditório que a discussão das origens da manifestação, 
o termo capoeira contém vários significados e derivações.2 
Diferentes definições para o termo foram encontradas, entre elas podemos citar 
designação a objetos, aves, pessoas, tipo de vegetação; e alguns termos já caídos no desuso, os 
quais iremos apresentar. Segundo o dicionário Houaiss o termo Capoeira em sentidos obsoletos 
poderia definir: 1. negro que vivia na capoeira (mato) e assaltava viajantes. 5. malandro típico 
do sXIX, esp. No RJ, BA e Recife, lutador de rua que usava a capoeira, armado de navalha ou 
faca, para combater bandos rivais ou provocar desordens públicas (grifos meus). 
A construção de significados e imaginários segue uma linha de organização da sociedade 
que coaduna com o controle social pretendido. Os grifos realizados na definição anteriormente 
apresentada denotam características pejorativas aos capoeiras, e é a partir da naturalização 
desses atributos que a construção dos significados se conformam em um instrumento de controle 
social. 
Uma outra questão de cunho conceitual, importante de ser discutida, é a diferença entre 
os termos “capoeira” e “capoeirista”: 
 
“Para designar os (as) agentes da capoeira (praticantes, mestres (as), professores 
(as), militantes etc.), utilizaremos o termo capoeira em detrimento do termo capoeirista, 
por entendermos que o primeiro tem, na cultura, o seu campo privilegiado de ação, 
enquanto que o termo capoeirista nos sugere uma intervenção mais específica, mais 
especializada, típica do (a) especialista..” (FALCÃO,2006). 
 
 
Apropriando-me das explicações apresentadas, utilizarei “Capoeira” e “capoeiragem” 
para referir ao fenômeno social; “capoeira” ao agente dessa prática antes do período de 1930 e 
“capoeirista” também para o agente, mas após as mudanças e criações das vertentes Angola e 
Regional. 
É importante salientar nossa abordagem e visão sobre Capoeira pois não conseguimos 
classifica - lá apenas em uma categoria da Cultura Corporal, seja como luta, dança, jogos ou 
esporte pois a manifestação cultural é mais rica e complexa do que qualquer rotulação, porém 
sua dúbia classificação dentro de uma mesma instituição não se torna valido quando o método 
 
2 Para mais informações sobre a etimologia do termo Capoeira consulte REGO(1968). 
 
 
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de ensino é o mesmo para tratar de abordagens diferentes. Temos clareza que o trabalho quando 
focado no esporte apresenta uma diferente metodologia quando trabalhado como dança, 
portanto, dentro das instituições a tentativa de se rotular a prática seria uma estratégia para fugir 
da feitichização da mercadoria, não enganando assim um possível consumidor/aluno. 
As idéias de Marx e Adorno podem ajudar para a compreender as influências que 
culturas hegemônicas realizaram/realizam na elaboração do imaginário e de significados da 
cultura popular. Entretanto, por não se tratar do objeto principal desse trabalho, não teremos o 
tempo necessário para um detalhado aprofundamento, sugestivo para um futuro trabalho. 
 
 
3. “MAIS UM DIA AMANHECEU E EU FIQUEI A PERGUNTAR COMO FOI QUE 
COMEÇOU ESSA ARTE SECULAR3” – CAPOEIRA E SUAS RAÍZES. 
 
 
O debate, que ainda não se exauriu, apresenta-se em torno do questionamento de onde a 
Capoeira surgiu.4 Diversos estudos apontam que as raízes podem ser africanas, brasileiras ou 
uma miscigenação delas, a afro-brasileira. Para não se prolongar no debate “incerto” das origens 
da prática, uma visão baseada em Sodré (2002) será adotada, a qual entende a Capoeira como 
oriunda não somente de um único pólo de criação, mas sim formada a partir de um conjunto de 
práticas advindas de diversos lugares como, por exemplo, a Tombo da Iúna, Punga, Pernada e as 
práticas ocorridas ao redor de portos5 como elementos formadores. Para os autores - entre eles 
Pedro Abib e Muniz Sodré - o nome é um genérico já que entre os próprios praticantes os nomes 
variavam segundo o momento. 
A Capoeira no tempo da escravidão não era manifestada somente nas senzalas, mas 
também era jogada em festejos, praças públicas, portos. Entretanto, a prática dentro dos 
engenhos sempre carregou uma forte e folclórica característica de resistência aos maus tratos e a 
desumana carga de trabalho que eram aplicadas aos escravos. Portanto, começaremos a abordar 
 
3 “Arte Secular” por Abadá Capoeira. 
4Ver, por exemplo, Silva (1993), Araujo (2008); discutem mais profundamente a “problemática” das origens da 
capoeira. 
5 Araújo (2008) discute mais profundamente como os portos influenciaram multiculturalmente a Capoeira. 
Sintetizando: “ entre os capoeiras existia um razoável número de estrangeiros. Diante dessa descoberta, 
consideramos três hipóteses: a primeira de que a capoeira era uma atividade urbana e portuária, que retrata a vida 
desse lugar; a segunda de que a capoeira, contrariando o senso comum, não era praticada apenas por escravos; e a 
terceira de que os registros formais, ligados às instituições de controle social, atribuíam a qualquer confronto 
corporal o significado ‘capoeira’.” 
 
 
 
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o tema do presente estudo, o qual está resumido na limitação dos sentidos da Capoeira, 
analisando a manifestação cultural quando realizada nas fazendas e principalmente nas senzalas. 
 
 
4. A POPULAÇÃO ESCRAVA E “SUA” CAPOEIRA 
 
 
O início da representação da Capoeira no Brasil foi marcado, mais fortemente em seu 
contexto dentro dos engenhos, pela sua utilização e vivência como meio de resistência ao 
sistema colonial, personificados nos senhores e capatazes. Resistência também contra as más 
condições de vida e trabalho, contrariando a falta de liberdade para expressar e vivenciar seus 
costumes e cultura. 
Abib (2004) afirma em sua tese essa característica formativa nos tempos da escravidão. 
 
 
A capoeira surge nesse contexto, enquanto mais um elemento agregador entre 
as diversas etnias africanas em interação, bem como, enquanto possibilidade 
concreta de utilização desse “repertório cultural”, como um instrumento de luta 
contra a situação de extrema violência a qual estavam os negros escravos 
submetidos, e no qual o saber corporal inscrito em cada perna, braço, tronco, 
cabeça e pé, podia ser transformado numa arma eficaz a serviço da sua 
libertação. Coube ao corpo, único lugar seguro, a herança do que ficou perdido. 
 
Eram aplicadas sanções proibitivas a tal prática principalmente por parte dos senhores, 
pois acreditava-se que a Capoeira poderia tornar-se um instrumento forte contra a própria 
condição de escravidão. Capoeira (1986) cita alguns outros motivos dessas sanções como por 
exemplo “o sentido de nacionalidade que a prática incitava nos africanos; formação de grupos 
coesos e lutadores ágeis, perigosos; e às vezes, no jogo, os escravos se machucavam – o que era 
economicamente indesejável.” 
A capoeiragem nos engenhos se expressava ora por uma representação de dança, ora por 
luta. Sua prática ocorria normalmente em momentos de descanso, longe dos senhores, o que 
tornava propício vivências em situações as quais eles fossem os protagonistas e não mais os 
subordinados. Capoeira (1986) tenta esclarecer a diferença entre “luta” e “dança”, ele descreve 
que nos locais onde era permitida, a capoeiragem acontecia com grande violência e onde era 
reprimida disfarçavam-na utilizando os acompanhamentos de palmas e canto.A partir do argumento do autor podemos inferir que esse caráter de camuflagem da 
 
 
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manifestação é um modo que os praticantes desenvolveram para fugirem da segregação imposta, 
para serem aceitos, ou mais provável, para que não sofressem mais as sansões impostas pela 
sociedade escravista. Essa afirmação se baseia no fato que para não serem totalmente proibidos 
da prática, alguns elementos como a violência de alguns golpes tiveram que ser disfarçados de 
um modo que a cultura hegemônica aceitasse e não se importassem mais com a prática dessa 
manifestação. 
Uma outra formalidade da manifestação cultural nos tempos da escravidão era que sua 
prática foi baseada, não somente, na expressão máxima dos corpos e de uma cultura que foi 
renegada dentro da sociedade oligárquica; se o papel da docência se fundamentava apenas no 
elemento afinidade e amizade para que a transmissão do conhecimento acontecesse. Entre 
meados do XVIII, essa docência não era baseada pelas trocas de bens ou pagamentos de 
mensalidades. Segundo relatos do professor Jorge Heleno, conhecido como Jorge Caborge, 
natural de Itabuna-BA, a Capoeira nesse contexto era “ensinada em terreiros, ruas e caso seu 
vizinho fosse capoeira ele logo iria te ensinar os golpes e ginga. O importante era passar a 
cultura para os amigos e se divertir.”. 
Já no século XIX a Capoeira começa a alcançar uma maior visibilidade principalmente 
nas cidades do Rio de Janeiro, Recife e Salvador; por conta dos ataques de revolta dirigidos a 
sociedade escravista e opressora que punia com marginalizações e violência uma grande parcela 
da população, focado principalmente na população escrava. 
Para estudarmos a visibilidade alcançada pela manifestação cultural fora dos engenhos, 
nos balizaremos na dissertação de 2002 da então mestranda Paula Silva que analisou a Capoeira 
do século XIX no Rio de Janeiro, com o argumento que foi nesta cidade onde aconteceu a 
expressão máxima e originária dessa prática, contrariando o senso comum que atribui à Bahia o 
mérito de criadora da manifestação. 
 
 
5. “RIO DE JANEIRO/ NESSA TERRA TEM CAPOEIRA/ TEM RODA O ANO 
INTEIRO6” - CAPOEIRAGEM CARIOCA 
 
Foi na segunda metade do século XIX que a Capoeira começava a abranger diferentes 
ambientes que não somente a senzala, e também a essa época atribui-se o surgimento das maltas, 
as quais apresentavam – se com maior expressividade na cidade do Rio de Janeiro. 
 
6 “Rio de Janeiro”Abadá Capoeira. 
 
 
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 Segundo Abib (2004), as maltas eram grupos formados por diferentes aglomerações de 
afinidades como por exemplo, negros fugidos, população de brancos e mulatos, e imigrantes não 
menos marginalizados. O autor ainda explica que a visibilidade da Capoeira em outros 
ambientes, como nos largos e festejos, aumentou, pois nesse período os escravos urbanos 
dispunham de uma maior autonomia para circularem livremente mesmo até em períodos 
noturnos quando comparados aos escravos das propriedades rurais. 
Foi atribuído a essa maior socialização dos escravos com a sociedade que um caráter 
mais violento, relacionado as maltas, surgiu como prática cultural que municiava os 
marginalizados contra os agentes opressores da época. 
A ocorrência de conflitos era em sua maioria entre os soldados da polícia, escravos, 
desempregados, estrangeiros como também entre diferentes maltas. Fora atribuído as maltas 
todo e qualquer tipo de arruaça principalmente as que ocorriam durante “festas de largo” 
religiosas ou pseudo - religiosas, desfiles cívicos e os comícios partidários. 
Foi nesse contexto de “descontrole social” que ameaçava a hegemonia da classe 
dominante que os governantes sugeriram nomes para assumir importantes cargos na polícia, o 
interessante foi que esses novos nomes eram também conhecidos como exímios capoeiras – 
conhecidos apenas nas entrelinhas da história. Essa estratégia de combate contra a capoeiragem 
não foi somente para a contenção das arruaças ou do dito descontrole social, mas também usada 
como um meio de proteção do poder da sociedade colonial-escravista, estruturado a partir do 
latifúndio, monocultor escravista no formato conhecido por plantation. Abib (2004) relata com 
melhores palavras o tamanho da preocupação que a revolta dos capoeiras estava fomentando nas 
classes sociais dominantes: 
 
 
começavam suscitar no imaginário do poder escravista, o caráter iminente de 
uma rebelião escrava, prestes a ser desencadeada, tendo em vista o forte poder 
de organização desses “desordeiros” que, a cada dia, mostravam com maior 
evidência, serem sim, capazes de desfazer a ordem estabelecida pela sociedade 
colonial-escravista. 
 
Conforme Soares (2002), foi raro na história do Brasil que uma prática corporal tenha 
chamado tanta atenção - como fora a Capoeira – causando preocupação aos dirigentes do Estado 
no Brasil. Não foi por menos que no final século XIX a prática é legalmente criminalizada. 
Podemos perceber a influência que essa manifestação cultural tinha na sociedade, o que 
contraria todo o imaginário de que a Capoeira foi uma prática somente dos negros escravizados 
contra os senhores feudais, esses estudos comprovam um caráter mais abrangente no campo da 
 
 
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contestação. Conformou-se resistência de uma ampla camada desprivilegiada da sociedade para 
a apropriação de lugares na cidade e possibilidade de expressão de sua renegada cultura. 
Surge nesse contexto histórico de preocupação com a manutenção do status quo – 
sustentada no poder dos escravistas - algumas leis formalizando o perfil ilegal de práticas que 
incluíam a então Capoeira. 
 
 
6. CRIMINALIZAÇÃO DA CAPOEIRA 
 
 
Foi em 1830 que surgiu o primeiro Código Criminal do Império do Brasil. Não havia 
referências diretas a Capoeira mas sim aos “vadios e sem profissão definida”. É interessante 
descobrir que os capoeiras foram assim taxados, não porque realmente o eram, pois a maioria 
dos capoeira exerciam uma profissão – carregadores, garis, empregados domésticos – mas sim 
porque essa profissões eram tidas como inferiores segundo a lógica do positivismo onde o 
trabalho braçal é cargo para as classes subalternas e o trabalho intelectual fonte de renda dos 
dominantes. A rotulação aconteceu por conseqüência da falta de empregos com as características 
já supra- citadas7 
Ao final do século XIX a Capoeira começou a ocupar espaços no mercado de trabalho, a 
absorção dos capoeiras em posto de trabalhos – que utilizavam a Capoeira ou não como força 
principal – auxiliavam aos praticantes almejar uma “melhor” qualidade de vida mantendo 
também o status quo. 
Segundo Soares(2002) as autoridades necessitavam de braços para completar a guarnição 
de navio de guerras, e para tal todos aqueles que as forças policiais conseguissem colocar as 
mãos eram jogados em depósitos, caso não houvessem o protesto de seus senhores ou prova de 
suas isenções, eram recrutados pela Marinha, porém uma predileção ao recrutamento de negros 
ou escravos era corrente, sendo eles posteriormente alforriados. Sodré(2002), exemplifica como 
essa população – negra e em sua maioria capoeiras - começava a ser absorvida pelos 
governantes Em 1864 e 1870, os capoeiras foram recrutados a força para lutar na Guerra do 
Paraguai, e lá segundo Vieira(2004) foram mandados para as frente de batalhão. 
Ao estudarmos a História do Brasil, e principalmente a já citada guerra, nos foi ensinado 
a partir do viés hegemônico a “vitória” em que esse confronto terminou. Porém, não 
 
7 Ver mais em Paula Silva na pag. 47 
 
 
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20 
conhecíamos até então a maioria dos participantes – negros e capoeiras – pois seu papel na 
sociedade era passar por “baderneiros e subjugados”, sendo assim desprezados de qualquer feito 
heróico. Apenas na cultura popular essesfeitos são retratados assumindo um viés favorável a 
população criminalizada, um canto do grupo Abadá Capoeira enaltece a população que lutou no 
front dessa guerra. 
 
 
Na guerra do Paraguai / Uma raça se destacou na destreza e na 
coragem muitas glórias conquistou / E o seu sangue não era preto, 
nem escravo nem azul, nem de outra cor/ Era vermelho que se 
espalhou como vento/trazendo um forte alento para o povo 
brasileiro” (ABADA CAPOEIRA, “Guerra do Paraguai”) 
 
 
Um último argumento que exemplifica uma formalidade contraditória atribuída pela 
cultura hegemônica foi: 
 
 
Nesse caso acontecido em 1828, Dom Pedro I não tinha mais 
soldados suficientes por perda na guerra do Rio Prata, e pra tal 
recuperação chamou estrangeiros ingleses, alemães e irlandeses. 
Esses últimos se revoltaram e rebelaram contra o governo. Saíram 
as ruas, assaltando e matando. Os negros com pedras, paus e 
capoeiras nos pés acabaram com a revolta dando por mortos quase 
todos os estrangeiros. (SODRE,2002) 
 
 
Observando esses relatos de como a sociedade da época tentou se apropriar de elementos 
“úteis” da Capoeira - como a beligerância favorável para guerras e postos policiais - e 
renegando outros considerados como uma violação aos bons costumes, barbárie; podemos 
sugerir um outro ponto de caracterização da Capoeira. Ou seja, uma qualificação que habilitava 
seus praticantes a ingressarem no mercado de trabalho. 
Araújo (2008) confirma essa transição social dos capoeiras quando começaram a ocupar 
postos de trabalho como seguranças, leões de chácaras e outras funções que utilizavam as 
características beligerantes dos capoeiras. Em 1890 entra em vigor o Código Penal da República 
dos Estados Unidos do Brasil, esse o primeiro que trata especificamente da Capoeira como 
crime. Sendo legalmente criminalizada a Capoeira vai se modificando para conseguir maior 
 
 
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representatividade em diferentes meios sociais. 
 
 
7. POLÍTICAS DE EUGENIZAÇÃO NO BRASIL 
 
 
A Capoeira que foi camuflada sob alguns postos de trabalho – seguranças, faxineiros, etc 
- alcançou esferas da sociedade antes nunca vivenciadas por esses sujeitos. A troca de cultura 
acontecia em bares, teatros em plena época do belle époque no Rio de Janeiro, e não se 
restringia a esses ambientes, os atores socialmente segregados levavam “as novidades” aos seus 
pares que foram deslocados para os subúrbios após a adoção da política de higienização da então 
capital do país. 
Umas das possíveis causas do aumento da repressão e sua longa perdura foi a penetração 
da Capoeira em diferentes classes sociais. O que pode ser classificado como um círculo vicioso, 
pois a repressão aumentava na mesma intensidade em que a manifestação era apropriada por 
outras camadas sociais. Ou seja, a apropriação que acontecia para burlar as leis, a fazia aumentar 
também o cerco ao redor de sua pública aparição. 
Durante o Estado Novo, governo de Getúlio Vargas vivia uma busca por elementos 
essencialmente brasileiros. Uma raça, uma cultura, um esporte, uma ginástica, uma coesão 
nacional eram procuradas com bases em “elementos tupiniquins”. Paula Silva (2002), argumenta 
que essa procura encontrou obstáculos quando a essência desse povo brasileiro do início do 
século XX foi analisada, éramos basicamente descendentes de negros e índios, proporcionando 
assim a criação de uma política de embranquecimento da população, através das políticas 
higienistas, eugenistas e com o favorecimento da entrada de imigrantes europeus no país, que 
visava primeiramente a substituição da mão de obra. 
Foi nesse contexto de tentativa de fortalecimento do Estado Nacional através de suas 
políticas, que a Educação Física brasileira assumiu o papel de disciplinador de corpos. O 
primeiro local para a implementação desse projeto foi dentro das Forças Militares para 
posteriormente se expandir e assumir o controle das camadas subalternas ditando as regras de 
uma ideal composição do corpo.8 
 
 
 
8 Ver mais sobre a história da Educação Física no Brasil em Lino Castellani Filho (1991). 
 
 
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7.1 Eugenização (embranquecimento) da Capoeira 
 
 
Para que a Capoeira fosse aceita como ginástica ou luta nacional a manifestação cultural 
teve que se eugenizar, assim como aconteceu também com a população brasileira. Pois não 
poderia ser a mesma Capoeira praticada pelas maltas ou os trabalhadores em busca de lazer 
como acontecia na Bahia, não poderia conter elementos diretamente relacionados a 
manifestações ligadas as camadas subalternas da sociedade. 
A elaboração de uma “nova” e branca Capoeira foi abordada por livros como o do autor 
escondido sob as iniciais O.D.C lançado em 1907. Nesse exemplar a manifestação cultural foi 
exaltada como uma luta para defesa pessoal. Silva (2002) argumenta que a escolha pelas 
possíveis iniciais para o nome do autor foi decorrência do medo das conseqüências que um 
suposto militar sofreria caso fosse ligado a práticas criminalizadas como a Capoeira. A 
manifestação cultural diante da camada dominante da sociedade tinha uma ligação forte com 
atividades degradantes, malvistas e para desvencilhar essa má imagem da prática, relacionada às 
maltas, o autor suprimiu os tradicionais nomes de alguns golpes para utilizar-se de termos mais 
gerais como rasteira, pernada. 
Em busca de elementos para a formação da ginástica nacional outros autores também 
argumentaram que as aspirações a “elevação” da categoria da Capoeira à de luta ou esporte 
nacional somente seria alcançado caso a manifestação cultural mudasse vários elementos para 
assim sair da “má” imagem que práticas advindas das camadas subalternas carregavam. 
Silva(2002) conclui que a manifestação cultural não se encaixava em tais aspirações pois não 
apresentava a beleza plástica9 das ginásticas de origem européia. 
Após um longo período de mudanças conjunturais o ensino da Capoeira também foi 
diversificado. Como anteriormente abordado, o ensino e a prática foram pautados em relações de 
afinidades – vizinhança, por exemplo, onde os elementos tanto da luta, ginga, dança eram 
ensinados dentro de um contexto longe de uma prática focada no individualismo. 
Em 1930 depois de um longo processo de assimilação e transformações – brevemente já 
relatado – a Capoeira começa a adquirir um caráter mais parecido ao que vemos atualmente. 
Araújo (2004) argumenta que não podemos atribuir à criação da Capoeira Regional um caráter 
de mercadorização da prática, ou seja, o início de uma relação entre Capoeira e mercadoria. 
Entretanto, pode-se inferir que dentre desse contexto, em que o ensino começou a ser baseado a 
 
9 A partir de estudos mais elaborados poderiam sugerir que a mudança realizada em 1930 para uma 
manifestação cultural mais acrobática pode ter raízes nas afirmações acima descritas.. 
 
 
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partir de trocas materiais, mesmo sendo comida, bebidas ou o que a pessoa poderia retribuir em 
favor da capoeira aprendida, que a relação de mercadoria se fortaleceu.10 
Manoel dos Reis Machado (1900-1974), famosamente conhecido por Mestre Bimba, 
aprendeu e militou por muito tempo na Capoeira Angola, depois então foi que introduziu 
elementos outros, resultando no que chamou de Capoeira Regional. (REGO,1968). A criação de 
Mestre Bimba, é um exemplo claro da assimilação da Capoeira por outras camadas sociais, um 
sucesso do “embranquecimento” da manifestação cultural pautado nas políticas de higienização 
e eugenização. A elaboração da metodologia, dos cadernos explicativos e a futura inserção da 
Capoeira no Palácio do Governo foi auxiliada e sustentada por amigos influentes de Mestre 
Bimba, como por exemplo José Cisnando Lima11, tido como mentor intelectual do mestre. 
 
 
 
7.1.2. A conjuntura da busca por uma luta “branca”, ops...brasileira 
 
 
Mestre Bimba criou uma vertente da Capoeira utilizando alguns elementos de outras 
artes marciais como o jiu-jitsu, para assim retirar “perigosos” golpes e modificar outros, 
obedecendo as políticas e as abordagens da então Educação Física. Não é intuito deste trabalho 
retratar o Mestre Bimba e outros mestres como mercenários, argumentando que as mudanças 
fomentadas por eles foram com o intuito de aumentar sua clientela e consequentemente o lucro. 
Não existe fundamento nesta hipótese, pois é a partir dos relatos históricos que concluímos 
como os mestres, entre eles Bimba, Pastinha morreram com fama e prestigio, porém sem contar 
com nenhum auxilio ou lucro advindos de suas criações. Portanto, o contexto em que esses 
personagens estavam inseridos foi o maior facilitador para as mudanças propostas à 
manifestação cultural. Contexto esse que segundo Falcão (2006) foi transformando os 
praticantes da Capoeira, anteriormente à década de criação das diferentes vertentes a 
manifestação cultural apresentava diversas finalidades dependendo do lugar de sua prática. No 
Rio de Janeiro, como já vimos, a prática era fortemente vinculada à violência das maltas, brigas 
de rua e política durante o Segundo Reinado; em Salvador, eles tinham uma estreita ligação com 
 
10 Araújo(2004) continua: “ a relação mercantil da capoeira se estabelecia sem a mediação da moeda que 
permitiria a troca (duzentos réis, preço da quantidade exigida de vinho tinto), o que confirma nossas suspeitas de 
que a capoeira, na sociedade capitalista, encontrava-se, nesse período, em sua forma embrionária.” 
11 Estudante de medicina, aluno de Mestre Bimba o qual atribuem ser o ajudante na sistematização da 
metodologia. 
 
 
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as quitandas e bares e que através de suas manobras e a plasticidade dos movimentos atraíram 
mais fregueses a esses lugares. 
Antigamente eram os carroceiros, trapicheiros, carregadores, estivadores, desempregados 
que se reuniam em lugares públicos sempre bebendo, brincando e se apropriando do jogo como 
lazer, disputa de espaço, expressão de sua renegada cultura, etc. 
Falcão (2006) afirma que hoje vemos ex-bancário, ex-metalúrgicos que são demitidos e 
se utilizam da Capoeira como modo de sobrevivência, ou seja, por uma demanda do sistema 
econômico imposto precisaram apropriar-se de diversas manifestações humanas, transformando-
as em mercadorias para que fosse assim possível sobreviver em uma sociedade onde o emprego 
fixo e de razoável remuneração está virando folclore também. 
Após o esclarecimento sobre a influência do contexto nas atitudes dos mestres 
voltaremos a abordar os caminhos percorridos por mestre Bimba e sua nova invenção. 
Com o auxílio da influência de seu mentor em ambientes tidos como alto escalão que em 
1932, Mestre Bimba inaugura a primeira escola de Luta Regional Baiana, conhecida como 
Centro de Cultura Física Regional (CCFR). É interessante notar que a capoeiragem ainda 
constava no Código Penal, segundo Abib (2004) deixa de ser crime em 1934 após a assinatura 
do decreto por Getulio Vargas. 
As referências consultadas atribuem a ligação do mentor de Bimba ao alto escalão 
político, uma das mais importantes causas para a permissão oficial da prática da Capoeira 
Regional (1932) e o posterior título de professor de Educação Física a Mestre Bimba (1937). 
Podemos também citar um favorecimento por conseqüência de seus amigos, quando seus 
familiares receberam finalmente em 1996, em seu nome, o titulo de Doutor Honoris Causa (post 
–mortem) pela UFBA. 
Cisnando Lima, mentor do mestre, tinha próxima ligação a Juracy Magalhães, que 
assumiu o cargo de interventor do Estado da Bahia em 1931. Conforme Araújo (2004), sua 
política tentou desarticular a lógica econômica a qual a elite nordestina estava pautada, o 
coronelismo, fazendo parte integrante de seus planos, o auxilio a uma manifestação cultural 
subjugada. 
O evento de maior visibilidade para a Capoeira Regional foi sua primeira demonstração 
no Palácio Governamental12, em 1937. A apresentação que aconteceu durante o governo de 
Getúlio Vargas e foi de encontro com a necessidade do Estado Novo, exemplificadas também 
 
12 A demonstração da Capoeira de Mestre Bimba trouxe a primeira pessoa negra a entrar nos ambiente 
do palácio não sendo um serviçal ou com o raro título de doutor. 
 
 
 
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nas palavras do então presidente “A capoeira é o único esporte verdadeiramente nacional”. Após 
a apresentação Vargas extingue o decreto que proibia a prática da Capoeira. 
 
 
8. CAPOEIRA BAIANA PÓS 1930. 
 
 
Para analisar o sentido da manifestação cultural pós 1930, utilizaremos estudos 
realizados na cidade de Salvador/BA. 
A década de 1930 é tida como um marco na história da Capoeira, não somente pela 
“criação” das diferentes vertentes, mas como também uma radical mudança na formalidade 
dessa prática. 
A manifestação cultural saiu dos centros das cidades, praças, largos, portos para entrar 
em lugares fechados, particulares, as chamadas Academias. O caráter de resistência e 
contestação antigamente presentes na prática acontecia em lugares distantes desses centros e não 
por acaso, pois longe dos centros a influência hegemônica era menor. 
Rego (1968) explicita como a mudança do local da prática condizia com os novos 
objetivos desenvolvidos pós 1930: 
 
 
 o jôgo da capoeira se fazia nos engenhos, no local de trabalho, 
nas horas vagas e nas ruas e praças públicas, nos dias de festas, 
sempre em recinto aberto. Em nossos dias, não há mais engenho; 
no local de trabalho, como o Cais do Pôrto, não se joga mais e 
nas ruas e praças públicas do centro só em dias de festa. Joga-se 
capoeira em recinto fechado em Palácio do Govêrno, nas 
academias, nos salões oficiais, nos clubes particulares e nas ruas 
e praças públicas, onde se realizam festas populares. 
Espontâneamente, independente de qualquer circunstância, joga-
se capoeira em ambiente aberto, na Estrada da Liberdade, 
Pernambués, Cosme de Farias, Itapuã e outros bairros bem 
afastados do centro da cidade. (REGO, 1968, p. 47). 
 
 
Para além da mudança do local de prática, conformou-se também uma transformação na 
prática educativa dos mestres, como uma nova característica do fenômeno social – Capoeira – 
nos anos de 1930 e 1940. 
Segundo Araújo (2004) foi a partir da década de 1940 que a produção do saber foi 
 
 
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ensejada para a troca, caracterizando, década em que ocorrem mudanças críticas na 
manifestação cultural que a tornam em uma prática com foco individualista e em busca do lucro, 
condicionamento físico, etc. Podemos inferir que o acúmulo de conhecimentos que antes era 
principal fonte de prestigio, riqueza cultural, defesa pessoal, lazer, festa foi reduzido a apenas 
elementos objetivos (por exemplo, melhora do condicionamento físico), uma mercadoria pronta 
e rentável visada para facilitar a sobrevivência dos capoeiristas na nova conjuntura. 
As academias, que se abrigaram em locais fechados e posteriormente particulares, 
começaram a agregar em suas “aulas” um status social superior aos que antigamente praticavam 
a Capoeira, afugentando os antigos capoeiras. Aos que resistiram a essas mudanças restou os 
lugares menos nobre, aglomerados nas periferias de Salvador. 
Rêgo (1968) ilustra as divergências entre a prática realizada em locais públicos e as 
novas relações de espaço e docência das academias: 
 
 
Como já tive oportunidade de salientar, em virtude de 
nenhuma academia querer exibir-se nas festas populares, o 
órgão oficial de turismo municipal da Bahia convidou várias 
academias para comparecerem às referidas festas, pagando-
lhes as exigências. Então houve um cafuso, mestre de uma 
academia, que, ao saber da finalidade do convite, declinou, 
alegando sersua academia freqüentada por uma casta já 
referida, não podendo misturar-se com o povo de festa de 
largo. 
 
Diante do aumento da procura, efeito direto da assimilação por outras camadas sociais 
brasileiras, as academias de Capoeira necessitaram ampliar sua estrutura física como também o 
corpo de mestres. A partir dessa necessidade mercadológica os mestres se viram obrigados a 
solicitar a seus alunos mais antigos que os auxiliassem nas aulas, o que divergia com a idéia de 
hierarquia sugerida pelas metodologias da década de 1930. Como conseqüência do aumento da 
demanda, tentou-se aumentar a oferta de aulas de Capoeira com o auxilio de professores 
estagiários subordinados ainda aos mestres. 
Para fortalecer a hierarquia proposta por Mestre Bimba os professores estagiários eram 
diferenciados com ritos de passagem simbolizados pelo o uso de cordas, lenços, cor de sapato, 
etc. O símbolo da hierarquia mais adotado foram as faixas, uma apropriação advinda das artes 
marciais e para fugir de acusações de que estariam se apropriando de culturas internacionais 
para promover a prática por camadas brasileiras mais favorecidas, em 1972 dentro da Federação 
Brasileira de Pugilismo, onde a Capoeira estava incluída, foi adotado as cores da bandeira do 
Brasil para diferenciar as graduações. 
Foi a partir da nova etapa dos sentidos da Capoeira, caracterizado não mais por políticas 
 
 
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de segregação e criminalização mas sim pelas políticas de assimilação, e também a partir da 
conjuntura em que a manifestação foi sendo apropriada pela cultura hegemônica que as 
academias se modificaram até chegar na estrutura de mega-grupos que conhecemos hoje. 
O início dos futuros mega-grupos13 surgiu no Rio de Janeiro em meados da década de 
1960, segundo Araújo (2004), os interessados pela manifestação cultural iam individualmente 
praticar nas famosas academias baianas e voltavam ao Rio de Janeiro incorporando a nova 
metodologia aprendida com elementos da pedagogia e saúde que já eram trabalhados. Essa 
busca individual pelo saber era decorrente da falta de instituições, como as academias 
soteropolitanas, tendo como possível causa a violência promovida pelas maltas. 
Por apresentar essa diferente organização, a prática Capoeira na cidade do Rio de Janeiro 
acontecia sem a presença de um mestre, gerando grupos menos sólidos o que facilitou para a 
futura ruptura e formação de diversos outros menores grupos, os quais também apresentavam o 
requerido prestígio de professores formados no comando das aulas. 
Para Falcão (2006) os atuais grupos de Capoeira por todo Brasil estão organizados e 
estruturados na lógica empresarial, ou seja, o investimento principal é na formação e atualização 
de novos mestres para o aumento significativo e contínuo da resposta a demanda pela Capoeira. 
O autor ainda continua argumentando que essas franquias (os atuais grupos) se transformaram 
em grandes corporações com um expressivo número de integrantes, além de um outro fenômeno 
decorrente dessa lógica foi surgimento na década de 1990 de entidades corporativas como as 
federações e ligas de Capoeira. 
Temos abaixo uma cronologia das fundações de tais entidades: 
1992 - Fundação da Confederação Brasileira de Capoeira. 
1995 – Reconhecimento da Capoeira e vinculação da Confederação Brasileira de 
Capoeira ao Comitê Olímpico Brasileiro. 
1999 – Fundação da Federação Internacional de Capoeira - FICA, em São Paulo. 
1999 – Fundação da Associação Brasileira de Árbitros de Capoeira, em São Paulo. 
2003 – A Federação Internacional de Capoeira funda a Universidade Livre de Capoeira e 
Artes Marciais. 
(Fonte: http://www.capoeira-fica.org/) 
 
As novas empresas de Capoeira são o exemplo mais claro da mercadorização da cultura 
corporal, ocorre um desligamento de inúmeros elementos objetivos (estilo, técnica, tática) e 
subjetivos (emoção, imaginação, sensações) para que a produção de lucro fundada na 
 
13 Denominação segundo Capoeira (2002) 
 
 
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reprodução técnica e na produção seriada seja efetiva. 
Adotando que a formalidade mais atual da Capoeira esteja balizada por preceitos 
capitalistas que enxergam a manifestação como uma rentável mercadoria, iremos agora analisar 
os discursos das instituições que trabalham com a Capoeira para assim tentar elaborar de forma 
mais sólida os objetivos e a nova formalidade. 
 
 
9. A ATUAL FORMALIDADE DA CAPOEIRA - OS DIFERENTES OBJETIVOS DE 
UMA “MESMA” MANIFESTAÇÃO CULTURAL. 
 
 
Partindo da hipótese inicial de que a Capoeira perdeu seu teor contestador e virou uma 
prática esvaziada, pensada apenas para o benefício pessoal expressos no conjunto 
condicionamento físico e saúde, foi comparado as diferentes visões que três tipo de instituições 
apresentava em seus sítios. Com o intuito de se analisar a atual formalidade da Capoeira e para o 
subsídio da hipótese realizaremos uma comparação entre os discursos analisados 
Serão abordados as visões e os objetivos descritos pelas academias de ginástica, grupos14 
de Capoeira e, por fim, pelos Centro e Associações Culturais. 
A apresentação de diversos locais foi fundamentada na diferença de imaginários que a 
sociedade apresenta para cada instituição. Por se tratar de uma monografia que aborda a cultural 
popular não hesitaremos em adotar o seu saber para compreender a diferença desses 
imaginários. 
Os Centro e Associações Culturais são entendidos como locais onde a Cultura Popular 
encontrou um possível refúgio, lugares onde a camada da população desfavorecida é foco de um 
trabalho, ora com caráter profissionalizante e assistencialista ora atividades com cunho 
contestador e não mercadorizadas.15 As Academias de ginásticas, diante o imaginário lançando 
no tecido social, trabalham questões majoritariamente ligadas a estética, disfarçadas no eixo 
temático da saúde. Por fim, os grupos específicos de Capoeira se incubem de “continuar” a 
tradição da manifestação cultural, exportando-a para outros países para que se faça conhecer e 
dar valor ao que eles mais prezam: os rituais dessa prática. 
Dividiremos a pesquisa em somente dois grupos classificados em: a Capoeira 
Mercadoria – Prática Individualista onde encontramos o foco em elementos apenas individuais e 
 
14 Como também apresentado mega-grupos 
15 Lembrando que a mercadorização abrange o não enganamento dos clientes. 
 
 
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físicos; Capoeira Fenômeno Social onde componentes essenciais a manifestação cultural ainda é 
afirmados pelos mestres. 
 
 
9.1 Capoeira Mercadoria 
 
 
Academia Runner 
 
Ao visitar o sitio da grande academia procuramos a Capoeira como um componente 
separado de qualquer prática corporal, porém foi através da pasta Modalidades que encontramos 
um link redirecionando para Lutas onde entre inúmeras “lutas” enfim estava a Capoeira. 
A descrição da aula continha desde a duração, intensidade, indicação e até contra-
indicações à prática. O interessante foi encontrar as características que traduzem a formalidade 
dessa prática na Runner. “Criada como uma luta por escravos para se defenderem, com o passar 
do tempo foi se modificando e sendo vista como um jogo, uma arte brasileira e que agora é 
ensinada com a finalidade de desenvolvimento motor.” (grifo meus) (RUNNER, 2010) 
A Capoeira, dentro dessa instituição, não apresenta características de uma manifestação 
cultural contestadora ou como meio de entrada ao mercado de trabalho (sentido do início do 
século XIX); sua formalidade é baseada em aspectos individuais explícitos no foco ao 
desenvolvimento físico e motor, para além a academia explica alguns benefícios que a prática 
proporciona, reforçando um caráter fragmentando empregado à manifestação cultural. “Melhora 
da resistência cardiorrespiratória, força e resistência muscular localizada,velocidade, agilidade, 
equilíbrio, consciência corporal e coordenação motora.” (RUNNER,2010). 
A Academia Runner se encaixa nesse grupo por apresentar um trabalho pautado no 
desenvolvimento pessoal com um foco apenas nos componentes físico e estético, ignorando 
assim qualquer aspecto cultural, social, contestador, e de uma formação crítica do cidadão 
perante a sociedade, o que demonstra a adoção de um caráter mercadológico à manifestação 
cultural. 
 
 
Academia Pamplona de Artes Marciais 
 
 
 
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Ao procurar quais objetivos a Capoeira apresenta nessa instituição encontrei apenas uma 
breve descrição da História da manifestação cultural, e a descendência dos professores. O que 
demonstra como a “linhagem”, a formação de tais professores e mestre é tão importante quanto 
a metodologia aplicada em si, fato que veremos em outras instituições. 
Para promover as artes marciais, a qual a Capoeira esta incluída, o sitio apresenta uma 
comparação às chamadas “outras atividades”, exaltando que os aspectos físico (flexibilidade, 
forca) são aprimorados em qualquer atividade física disciplinada e constante, porém para uma 
melhora também do aspecto psicológico (concentração, autocontrole e autoconhecimento) 
segundo a academia, apenas as artes marciais são capazes de melhorar ambos aspectos. 
Cabe aqui refletir qual o conceito de Arte Marcial é contemplado pela academia, pois no 
imaginário lançado no tecido social espera-se que lutas advindas dessas filosofias sejam 
oriundas do Oriente o que acarreta uma maior aceitação às culturas estrangeiras em contra 
posição às afro-brasileiras. Outro ponto relevante é se a comparação de diferentes manifestações 
como os esportes, lutas, danças é coerente. Pois as comparações entre diferentes manifestações 
culturais com o curioso intuito de exaltar as lutas, produto desta academia, não pode ser 
aceitável nem mesmo quando se tenta comparar melhoras de capacidades físicas e individuais. A 
incoerência decorre de diferenças de contexto de criação e prática que cada manifestação 
cultural apresenta, influenciando diretamente o desenvolvimento de tais capacidades como 
também no fenômeno social. Portanto, além de uma abordagem individualista expressos na rasa 
explicação dos benefícios das artes marciais, a Academia Pamplona compara com efeito de 
propaganda seu produto a outros tentando exaltar e atrair uma clientela maior, o que certamente 
encaixa essa academia no grupo da Capoeira trabalhada como mercadoria. 
 
 
Grupo Senzala 
 
Quando abordado o surgimento e sucesso dos mega-grupos, esse grupo foi uma das 
maiores expressões desse fenômeno. O Grupo Senzala foi fundado em 1960, na cidade do Rio 
de Janeiro. Pelas características regionais desses grupos - a falta da presença de um mestre, o 
presente grupo sofreu diversas rupturas entre os praticantes levando-os a procurarem abrir outras 
filiais, proporcionando um aumento expressivo de sua atividade a dimensões intencionais. 
Procuramos através do sitio possíveis escolas em São Paulo, porém a “marca” Senzala se 
mostrou presente apenas na Europa. 
Por não encontrar a descrição dos objetivos de forma especifica iremos analisar os 
 
 
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fundamentos e princípios os quais os mestres procuram praticar tentando descobrir a 
formalidade da Capoeira dentro desse grupo: 
 
 
. respeito às tradições e rituais da capoeira, com o ritmo do jogo 
comandado pelo berimbau gunga; 
. respeito aos capoeiristas e mestres mais velhos, construção e 
manutenção de um ambiente de camaradagem e receptivo aos 
capoeiristas de todas as origens; 
. disciplina, desenvolvimento do um nível técnico dos capoeiristas e 
estabelecimento de um padrão de condicionamento físico no nível 
de um atleta; 
. cultivar a humildade e o esforço de aprender com cada parceiro de 
jogo; 
. desenvolver a percepção do ritmo e do outro, buscando sempre uma 
situação favorável no jogo e não se deixando surpreender, mas 
aceitando de bom humor as pegadas e buscando com tranqüilidade sua 
revanche. (SENZALA,2010, grifos meus) 
 
Analisando o primeiro princípio, se faz necessário um questionamento de quais tradições 
e rituais o grupo assume e trabalha. Pois como abordamos anteriormente a Capoeira era ensinada 
sem pagamentos, em locais abertos, para proteção, e exaltação de uma cultura renegada; 
formalidades que a manifestação cultural apresentava apenas no passado. Portanto, podemos 
deduzir a presença de um outro tipo de camuflagem, a qual o trabalho pautado somente em 
aspectos físicos está disfarçado no discurso de protetores da manifestação, de detentores de um 
saber folclórico. Utiliza-se de elementos étnicos e de formalidades passadas, que são exaltadas 
no tecido social, com o fim de atrair mais praticantes e clientes. Retomando o conceito de 
mercadorização, podemos classificar essa característica de camuflagem ao que apresentamos no 
inicio do estudo, pois o cliente nessa instituição é instigado, enganado em relação ao produto em 
que se pensa em adquirir. 
No terceiro princípio encontramos características que apontam para uma formalidade 
individualista e esportivizada, exemplificadas na procura por um estabelecimento do padrão 
atlético, o que confere com os objetivos traçados pela maioria das academias em geral, 
apresentando um diferencial que é o pretenso resgate de tradições. 
Após feitas as considerações podemos concluir que a transformação da Capoeira ocorreu 
para a aceitação da mesma por outras camadas da sociedade, e que a camuflagem ainda hoje 
 
 
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acontece usando o elemento da diferença étnica para exaltar um componente não meramente 
físico e de saúde respondendo positivamente ao imaginário que os grupos de Capoeira tem na 
sociedade. 
 
 
Grupo Cordão de Ouro, Mestre Suassuna 
 
Infelizmente não foi encontrado informações explicitas dos objetivos desse grupo em 
relação a prática da Capoeira. Entretanto, há documentos disponíveis que caracterizam as 
normas e regimento interno do grupo e suas filiais, interessante de serem abordados nesse 
estudo. Por isso iremos analisar alguns pontos das normas para representantes onde foi 
explicitado um caráter comercial à manifestação cultural. 
 
 
1) Todo filiado deverá portar um certificado e carteirinha de autorização para 
uso do nome Cordão de Ouro. 2) O filiado pagará uma taxa anual. 3) O filiado 
não poderá realizar formaturas, batizados e cursos, sem a autorização do 
presidente do grupo-Mestre Suassuna.4) São vetados convites a capoeiristas e 
mestres para ministrar cursos sem a autorização ou conhecimento da 
matriz.”(CORDÃO DE OURO,2010) 
 
Foi denominado caráter mercadológico à abordagem em que a manifestação cultural está 
balizada nessa instituição pelo fato de que para se utilizar de uma possível marca de 
metodologia, o grupo/filial terá que se subordinar a uma matriz em diferentes aspectos. Os 
professores e mestres não terão liberdade de criação e autonomia para tratar até mesmo de 
problemas de condutas do grupo, criação de exercícios, programação dos conteúdos e avaliação 
dos capoeiristas. O que segundo a definição elaborada por Adorno é uma característica da 
mercadorização da cultura corporal pois teremos apenas consumidores de uma cultura e não 
mais pessoas que elaboraram e modificam a prática, o que nessa instituição estão sendo 
exemplificadas no controle total assumido por um possível detentor desse saber, o fundador e 
presidente – Mestre Suassuna. 
Para introduzir o regimento interno é realizado uma exposição dos motivos do mesmo. 
Como uma necessidade entendida pelo grupo o regimento foi elaborado para “preservar a 
Capoeira como manifestação que tem por objetivo contribuir para a educação da pessoa e a 
formação global do ser humano na prática desta atividade.” (grifos meus). (CORDÃO DE 
 
 
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OURO, 2010). 
É citado uma formação global do ser humano a partir da Capoeira,mas como pautar esse 
elemento aos capoeirista sendo que até mesmo os professores tem sua prática fragmentada e 
dissolvida? Os professores são subordinados não apenas na escala do poder de funcionamento 
desta instituição, mas toda sua prática é determinada e passível de aprovação de um presidente. 
Apresentando um caráter mais centralizador do que outros grupos, o papel do mestre no 
Cordão de Ouro vai além do domínio e saberes da técnica e prática. Funcionando como uma 
empresa, toda e qualquer decisão passa pelo mestre e presidente - presidência assumida pelo 
criador do grupo. As decisões caminham em inúmeros âmbitos como, por exemplo, a escolha de 
mestre e professores do grupo e de suas filiais, aplicações de sansões disciplinares, aceitação ou 
não de filiais, etc. 
Sem explicitar os objetivos e formalidades da Capoeira o grupo através de seu sitio 
transparece um caráter mercadológico que foi assumido à manifestação cultural. Não mais do 
que uma mercadoria a Capoeira é regulamentada para que sua oferta alcance mais lucros. 
 
 
Centro Cultural Erê Capoeira: 
 
A análise dos objetivos desse Centro Cultural localizado em São José dos Campos e 
Jacareí – SP; se torna interessante pela dúbia classificação da manifestação ora como esporte ora 
como cultura popular. O contraste de classificação ora esporte, luta, jogo não é um problema, 
porém a dualidade de concepções dentro de uma mesma instituição pode interferir na prática, 
pois não há como trabalhar com vários conceitos em um único método ou abordagem de aula. 
Vejamos agora como é entendido as origens da Capoeira segundo o centro: 
 
Difundir a capoeira como arte genuinamente brasileira; 
valorizar nossa cultura e a história de nosso país; contribuir com 
a formação de cidadãos caráter e boa conduta na sociedade; 
assumir um compromisso com a sociedade (especialmente aos 
herdeiros da exploração e escravidão, ou seja, as comunidades 
mais carentes) de reconquista do seu valor, espaço e auto-
estima,[...] (grifos meus) (ERÊ CAPOEIRA,2010) 
 
 
Como iremos analisar em outras instituições a adoção de raízes apenas brasileiras não é 
comum a esse Centro Cultural. Apenas uma instituição descreveu a Capoeira tendo origens afro-
 
 
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brasileiras. A reflexão dos porquês dessa supressão pode ser feita levando em consideração a 
diversidade de estudos que contestam as raízes da Capoeira, o Centro pode entender a 
manifestação, assim como alguns autores, sendo basicamente tupiniquim. Entretanto, podemos 
analisar mais criticamente essa escolha pelo termo “genuinamente brasileira”, entendendo que a 
sociedade brasileira ainda que não se denomine como racista, não consegue conceber a idéia de 
africanidade em sua cultura, camuflando assim o termo afro para maior aceitação “popular”, o 
que também pode ser usada para aumento do lucro das instituições. 
Quando o centro Erê Capoeira assume que a sociedade principalmente os mais carentes 
são herdeiros e que possivelmente usufruíram da manifestação cultural sem influências da 
indústria cultural nos faz pensar que a Capoeira nessa instituição é entendida como um 
instrumento de luta advinda de culturas subalternas. Porém, quando continuamos a analisar os 
objetivos temos: 
 
descobrindo potencialidades de cada cidadão; valorizar a saúde, a educação, 
desenvolver habilidades, valores e atitudes essenciais para aprendizagem e a integração 
do aluno na sociedade com alternativas de vida, afastando-os da violência e das drogas; 
contribuir com o reconhecimento da capoeira como esporte realizando competições e 
festivais. (grifos meus; ERÊ CAPOEIRA,2010) 
 
 
A manifestação cultural agora é entendida como esporte e eventos competitivos serão 
realizados. Em locais onde a técnica é fundamental para o sucesso, como é de característica de 
competições, a manifestação terá de adotar outros meios, ou seja, a prática será centrada 
necessariamente na melhoria de habilidades e capacidade físicas, demonstrando uma contradição 
ao que foi apresentado no início dos objetivos. 
Com uma mera análise do discurso encontrado no sitio podemos concluir que a 
manifestação cultural é tratada em meio a contradições e camuflagens, pois somos levados a crer 
que a Capoeira é trabalhada com resgate de seu antigo objetivo elaborado pelas culturas 
subalternas o que pode traduzir uma diferente metodologia quando entendida como esporte. 
O Erê Capoeira foi classificado como integrante do grupo que trata a manifestação 
cultural como mercadoria por entender um olhar não critico a prática quando se associa o 
simples aprendizados de golpes e rituais da Capoeira com a diminuição da violência e tirando as 
crianças da rua, como também a camuflagem de uma prática centrada em elementos individuais 
e de performance que o esporte atual prega com dizeres da manifestação enquanto elemento 
étnico exaltado. 
 
 
 
 
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Associação Cultural Capoeira Raízes dos Palmares 
 
Analisando o sitio da Associação Cultural situada na cidade de Valença no estado da 
Bahia, encontramos a descrição de um objetivo: “o intuito de fomentar a cultura popular (afro-
brasileira) e educação através de diversos projetos sócio-culturais.” (grifos meus). (RAÍZES 
DOS PALMARES,2010) 
A Associação foi a primeira dentre as pesquisadas a utilizar o termo afro-brasileira, o que 
nos fez pensar que elementos da antiga Capoeira seriam contrastados com a prática 
contemporânea. Entretanto, encontramos um post intitulado “Benefícios da Capoeira – Arte com 
Prazer” que ao meu ver explicita um objetivo contraditório ao descrito oficialmente no sítio. 
O artigo inicia citando alguns princípios fundamentais que são ensinados na Capoeira, 
como a improvisação, noções de espaço, ritmo, música. Porém a abordagem muda do campo 
conceitual de cultura popular para o tecnicismo. 
 
 
Os movimentos da capoeira mexem com todos os músculos, 
desenvolvendo uma série de qualidades físicas. Se você entrar 
na roda, em pouco tempo vai sentir uma grande mudança : 
menos tensão, reflexos mais rápidos e ainda vai ganhar força. 
Com um pouco de persistência, o seu fôlego vai ficar ótimo, 
porque a prática constante (pelo menos 3 vezes por semana) 
desenvolve o sistema cardiorespiratório. E, o melhor você 
trabalha os músculos abdominais, já que os músculos desta 
região são muito solicitados. 
 
 
O texto continua explicitando algumas mais capacidade física que são desenvolvidas 
com a prática da Capoeira. 
 
 
Resistência : É preciso manter o pique durante toda a luta. 
Agilidade : Os movimentos mudam de direção e sentindo a toda 
hora. Flexibilidade : Na capoeira dominam os gestos amplos. 
Velocidade : Para surpreender o adversário sempre que possível. 
 
 
Ao finalizar é abordado que o esporte16 não estimula a violência mesmo ajudando a 
“liberar a agressividade” também estimulando a criatividade e o auto-controle. Encontramos 
novamente uma análise acrítica do papel da Capoeira no controle dos níveis de violência na 
 
16 Novamente a dúbia classificação não pode ser completamente abordada dentro de uma única abordagem 
ou método de aula. 
 
 
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sociedade, não podemos atribuir que apenas o domínio das técnicas dos golpes e ginga da 
manifestação cultural possam suprimir tais níveis. 
Quando comparamos a descrição do grupo e seu objetivo com seus artigos publicados, 
fica claro como contraditório está sendo fomentada a dita cultura popular. Assume-se um caráter 
da manifestação (cultura popular) que nos remete a uma prática enraizada nos preceitos de 
contestação, liberdade de expressão, visão global e crítica, porém quando analisamos o corpo do 
blog entendemos que o caráter mais trabalhado na Associação não é diferente de academias e 
grupos de Capoeira, ou seja, a adoção da Capoeira apenas como meio para o desenvolvimento 
de capacidades físicas. 
Alémdo artigo apresentado no sitio podemos votar em uma enquete na qual a pergunta 
“Você é a Favor da Capoeira nas Escolas e nas Olimpíadas” apresenta 11 votos a favor e apenas 
2 contra, explicitando ainda mais o caráter esportivizado do viés adotado. 
Contando apenas com os objetivos traçados por essa instituição, explicitados nas fontes 
documentais, como o sitio podemos classificar a Capoeira Raízes dos Palmares junto ao grupo 
onde o foco seja apenas o desenvolvimento de capacidades físicas. Pois sua prática foi reduzida, 
fragmentada para apenas atender mais rapidamente as demandas do mercado contemporâneo, 
onde se busca de forma rápida e alienada algumas melhoras no corpo, dualizado na matéria e 
mente. Entendemos também que as características que tornam a manifestação cultural, como um 
fenômeno social que procura a satisfação global do individuo, sem dividi-lo em capacidades 
físicas, afetivo-sociais e cognitivas (as quais nem aparecem nos objetivos) não são minimamente 
garantidas. 
 
Associação Cultural de Capoeira Abolição 
 
Possivelmente localizada em diversas cidades do estado de Minas Gerais, pois o sitio da 
associação contém informações incompletas, traz também poucas menções aos objetivos e as 
maneiras que manifestação cultural é abordada, há informações biográficas sobre a formação do 
fundador, as raízes dos mestres e sua formação, ou seja, sua linhagem. Porém, da análise da 
missão dessa instituição conseguimos encontrar algumas definições pertinentes a serem 
analisadas.” 
 “Preservar e difundir a capoeira como forma de cultura, esporte e filosofia de vida, 
 
 
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contribuindo assim para a formação moral e cultural de seus atletas, independente de sua idade, 
nível social e cultural, raça e religião sociabilizando-os e integrando-os à sociedade como 
pessoas éticas e de bem". (grifos meus). (CAPOEIRA ABOLIÇÃO,2010) 
Diferentemente da Associação Capoeira Raízes dos Palmares que atribui a manifestação 
cultural um camuflado caráter cultural como debatemos anteriormente, essa associação não 
parece esconder os preceitos de uma mercadoria dentro da alçada de cultura popular afro-
brasileira. A associação parece assumir o caráter esportivo mais claramente quando utilizam o 
termo atleta para descrever seu público. 
Nessa missão caberiam claramente objetivos que foquem na melhoria de capacidades 
físicas não enganando assim pessoas que procurariam a prática com fins culturais e não somente 
esportivos. 
 
9.2 Capoeira como fenômeno social 
 
 
Centro Cultural Capoeira Água de Beber: 
 
O CECAB foi fundado em 2002 e está sediado em Fortaleza-CE, presente também no 
exterior. Através do sitio também não foi encontrado citações diretas a objetivos de cunho 
pessoal e individual. Sua atividade eixo é a Capoeira como também: 
 
 
outras manifestações culturais : samba de roda, maculelê, 
frevo, ciranda, dança do coco, dança afro, puxada de rede, 
oficinas artesanais de confecção e toques de instrumentos 
musicais, projeção de vídeos, filmes, palestras sobre assuntos 
pertinentes à cultura popular e de temas relacionados ao 
exercício da cidadania.” (CECAB,2010, grifos meus) 
 
Podemos perceber a diferença de formalidade da Capoeira e de outras manifestações 
culturais, até mesmo pelo emprego do primeiro termo grifado. Ao contrario de objetivos de 
desenvolvimento de capacidades físicas a cidadania é colocada como objetivo principal de 
atuação desse centro. 
As atividades realizadas são voltadas para a captação de recursos destinados a projetos 
sociais localizados em áreas carentes e/ou em “situação de risco social”. “O objetivo principal 
do projeto social é incentivar e recuperar valores culturais, sociais, educacionais e artísticos, 
 
 
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empregando-os no propósito de socialização, formação, inclusão e profissionalização dos jovens 
beneficiados pelo projeto.” (CECAB,2010) 
Partindo da análise do sitio podemos inferir uma abordagem diferenciada à Capoeira, 
mesmo adotando-a como cultura apenas brasileira, a manifestação cultural é trabalhada como 
meio de socialização. Porém, o conceito de cidadania pode ser contestado pois podemos 
fornecer formações relacionadas ao exercício da cidadania de cunho crítico, onde indivíduos 
transformadores de seu contexto e situação poderão ser formados para até a formação de uma 
alienada inclusão desses sujeitos pautada no executar eficientemente das tarefas delegadas às 
camadas desprivilegiadas. 
Mesmo com algumas ressalvas o Centro Cultural não poderia se encaixar em um grupo 
onde inúmeras instituições abordam a manifestação cultural com um caráter mercadológico, 
pautado apenas em melhorias de aptidão físicas. 
 
 
 
Associação Cultural Companhia Pernas pro Ar. 
 
Fundada em 2000 na cidade de Belo Horizonte- MG a Associação foi a primeira a se 
encaixar no grupo que entende a Capoeira como fenômeno social. Além de apresentarem os 
objetivos de “desenvolver, disseminar e jogar a capoeira.”, buscam através do encontro mensal 
de um grupo de estudos fomentar a pesquisa e o estudo sobre “a capoeira e todo seu universo 
cultural" 
O público alvo dessa associação são crianças e adolescentes carentes atendidos através 
de projetos sociais. Não fica claro se as crianças e jovens são incentivados a participarem não 
somente da prática, mas também dos estudos e pesquisas realizados o que democratizaria o 
acesso e a formulação de saberes, fugindo do conceito de mercadoria. 
Segundo a Companhia o trabalho desenvolvido segue aspectos que foram divididos em 
técnico, pedagógico, físico, psicológico, cultural e social. Respectivamente os aspectos tratam 
do desenvolvimento das técnicas a partir do processo ensino/aprendizagem; disciplina, educação 
e respeito; melhorar o preparo físico a partir do desenvolvimento do tônus muscular, 
flexibilidade; atenção, estimulação da criatividade e auto-estima; e a divulgação da capoeira 
como “manifestação cultural brasileira, contribuindo, dessa maneira, para a preservação do 
patrimônio cultural de nosso país”; e por fim, utilizando-se da Capoeira como instrumento de 
inclusão social, companheirismo e solidariedade. (grifos meus). 
 
 
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O trabalho da Companhia Pernas pro Ar é realizado em escolas, academias, comunidades 
carentes. 
A partir da análise dos objetivos podemos inferir uma abordagem diferente atribuída à 
manifestação cultural, não encontramos um culto exacerbado a elementos individuais e somente 
físicos, consideração que baseia a classificação dessa associação como tal. 
 
 
 
10. CONSIDERAÇÕES FINAIS 
 
 
“Adeus, povo bom adeus 
Adeus, que eu já vou embora 
Pelas ondas do mar eu vim 
Pelas ondas do mar, eu vou embora.” 
 
Ponto de Jongo (Domínio público) 
 
 
Respeitando as tradições do Jongo – manifestação cultural em que me também inspirei 
para a introdução da monografia – clamo um ponto de despedida para concluir o trabalho. 
Realizamos uma pesquisa bibliográfica procurando exaltar os sentidos que a Capoeira 
apresentou ao longo de sua história. Percorremos desde de sua manifestação nas senzalas, até a 
forma mais atual, apresentada nos grupos, academias e centro culturais. 
Conseguimos identificar alguns sentidos a capoeiragem, no seu período de identificação 
inicial em solos brasileiros – a partir do século XVIII – a prática era fortemente ligada aos 
escravos como forma de contestação, expressão de sua cultura brutalmente renegada, entretanto, 
a prática dos escravos não era a única forma em que a Capoeira se apresentava nesse período. A 
tentativa para se acabar com essa manifestação cultural ocorreria desde os primórdios de sua 
existência e para tal os capoeiras começaram a incluir elementos camuflando assim o caráter 
violento de que os senhores tanto proibiam. 
Ao final do século XVIII a Capoeira começa a ampliar sua influência, os escravos 
urbanos contavam com mais “liberdade” que os escravos rurais,