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Palavras de Agradecimento, Eelogios DESEMABRGADOR ATHOS GUSMÃO (aqui ele escreve bonito)

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Palavras de agradecimento do 
Exmo. Sr. Desembargador Athos Gusmão Canleiro. 
Exmo. Sr. Desembargador Athos Gusmão Carneiro: --São transcorridos 
25 anos. 
O compromisso de bem e fielmente servir ao Rio Grande, como um de 
seus juízes, eu o prestara dias antes, perante o varão impoluto, de ilustre 
progênie, o Presidente do Tribunal de Justiça do Estado, Desembargador Sa-
muel Silva. Comigo, cinco outros concursados. De um deles, Milton Calvet 
Fagundes, reverenciamos a memória; jubilados encontram-se Gabriel Pereira 
Borges Fortes e Humberto Prates Piccolli; aqui presentes, envergam com aI-
tanaria a toga, como integrantes deste Alto Pretório, os Desembargadores 
Paulo Boeckel Velloso e Rubens Rebelo Magalhães. 
O compromisso prestado, cumpria assumir o cargo. Seja-me lícito 
volver ao passado, e lembrar a tarde estival, 14 de março de 1952, em que 
com minha esposa, casados de pouco, chegamos à São Francisco de Assis, 
nossa primeira comarca. Moravam os juízes no próprio edificio de Fórum, 
prédio antigo, de amplas peças, que em tempos idos servira ao Banco 
Pelotense. Na frente, as salas do júri e das audiências. Nos fundos, em com-
prida varanda, emergia o bocal do poço. À frente do prédio, na calçada, o 
frade-de-pedra, de serventia para as montarias dos postulantes. Larga e 
arenosa a rua. Silêncio e solidão, o silêncio interrompido às vezes pelo 
martelar ritmado de uma bigorna, na ferraria defronte. Um que outro pas-
sante perdido, na cidadezinha às margens do Arroio lnhacundá, cenário das 
melhores vivências da alma gaúcha, repositório de lembranças ainda bem 
vívidas de glórias e misérias de nossas antigas lutas fratricidas. São Fran-
cisco de Assis. Enorme município, que percorri em todos os quadrantes, em 
inspeções jUdiciais e em tempos de eleição. Vindo embora da cidade do Rio 
de Janeiro, onde havia advogado durante dois anos em grande escritório, 
gostamos de São Chico. Lá, durante um quadriênio, aprendi a ser juiz, na 
dura prática, errando e me corrigindo, que na época não existiam quaisquer 
cursos de preparação à judicatura. Muitos júris. Muitas possessórias. Exe-
cução nenhuma. Fiéis serventuários de justiça, entre os quis relembro o 
saudoso escrivão, e grande amigo, João Azambttia Vieira, padrão de digni-
dade e honradez; em sua pessoa permito-me homenagear a nobre classe 
dos servidores forenses. Alguns episódios de recordar. A alegria do nas-
cimento da primeira filha. 
De nobre estirpe o vizindário. Na velha São Vicente, comarca desde 
1888, envolta em pacatez e no bucolismo de tradições longevas, Humberto 
Prates Piccolli, fraterno amigo, coração de nazarena bondade, fazia seu novi-
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ciado na judicatura. Para o rumo do poente, Pedro Soares Munoz cumpria 
austero sua fulgurante carreira, na terceira entrância e como juiz do A1& 
grete. Mais longínquo, Paulo Boeckel Venoso, diligente e metódico, na co-
marca de Cacequi iniciava a palmilhar a reta estrada que o iria conduzir às 
eminências da Corregedoria-Geral da Justiça. Para o leste, Bonorino Buttelli 
iria assumir a comarca de Jaguari, e em sua moradia acolhedora e hospi-
taleira muitas vezes interrompemos viagem, para a palestra e o mate sob a 
latada de parreiras. Do outro lado do Itú, a comarca de Santiago, onde ainda 
advogado fui conduzido, a fim de assessorar a municipalidade, pela mão 
amiga do saudoso Prefeito Tito Beccon; no Fórum, lá encontrei jovem con-
tadora judicial, nomeada fazia pouco por indicação do inolvidável amigo, 
juiz de imorredoura memória, Cesar Dias Filho, ·inconformado plasmador de 
orientações novas·, no dizer do eminente Desembargador Paulo Barbosa 
Lessa; então perdeu a Justiça a novel servidora, e ganhei eu a esposa e 
companheira de minha vida, em cujo amor tenho haurido lenitivo e alento 
todos estes anos. 
São Francisco de Assis, Ijuí, Uruguaiana, Porto Alegre. 
Os anos se sucederam, em ininterrupta atividade judicante. Parece que 
se foi rápido o quartel de século, e hoje me surpreendo, confuso e emo-
cionado, tomando posse neste Pretório Augusto, na presença de minha 
esposa, minhas filhas e genro, meus familiares e Colegas, meus amigos e 
meus alunos, em momento supremo da vida e na culminação de minha car-
reira. 
E se alguém me fizer hoje a clássica pergunta, se ·valeu a pena·, ouvirá 
sem hesitação a mesma resposta que teria eu proferido há um, há cinco, ou 
há dez anos atrás. Valeu. 
Valeram a pena os dramas de consciência, as angústias, os labores, 
valeram a pena os desalentos, os erros e acertos, as sentenças que sabia 
justas e as prolatadas com temor de me estar equivocando. De tudo isso 
têm ciência pessoal os eminentes Colegas desta Corte, porque juízes de lon-
gos anos. 
Nossa profissão, que Rui Barbosa proclamou como ·a mais eminente 
das profissões, a que um homem se pode entregar neste mundo· (Oração 
aos Moços), é por isso mesmo um exigente ministério, que desdenha espíri-
tos frágeis. Mas vale a pena ser magistrado, quando se o é por vero chama-
mento vocacional, pois na judicatura encontramos, no plano temporal, um 
sentido para a vida, e a possibilidade de plena e fecunda realização pessoal. 
Como certa feita referiu o eminentíssimo Desembargador Balthazar 
Barbosa, em discurso proferido neste mesmo recinto, somos os magistrados 
·enamorados da serena beleza da Justiça·, e a ela consagramos nossa ca-
pacidade, o tempo e a vida. 
E se o tempo e os percalços da vida vincam a face do juiz, seu espírito 
e sua fé devem pennanecer intocados. Em magnífico discurso de posse, o 
eminente Desembargador Hermann H. de Carvalho Roenick bem lembrou 
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aquele tópico em que Calamandrei CElogio dei Giudici Scritto da un Awo--
cato") conclama os magistrados contra os males da administração rotineira 
da Justiça; adverte o grande processualista que ·0 juiz que se habitua a fazer 
justiça é como o sacerdote que se habitua a dizer missa·, e considera ·feliz o 
magistrado que, até o dia que precede o limite de idade, sente, ao julgar, 
aquela consternação quase religiosa que o fez tremer, muitos anos atrás, 
quando teve que dar a sua primeira sentença·. 
Posso afirmar-vos, Senhores Desembargadores, que ingresso neste 
Augusto Tribunal com espírito de humildade ante a honraria que me foi con-
cedida, ante a magnitude dos novos encargos e responsabilidades, e ante a 
confiança revelada pela inclusão de nosso nome na lista tríplice de acesso; 
de outra parte, tenho orgulho em afirmar, sem dano à verdade, que não es-
moreci durante a longa e árdua jornada e aqui chego, mercê de Deus, com a 
mesma singela e luminosa fé nos ideais de Justiça que portava quando in-
gressei na magistratura de minha terra nataI. 
Em magnífica e memorável aula inaugural proferida em 1975 sobre o 
tema ·0 Direito e os Juristas em Face do Mundo Atual·, o Prof. Elmo Pilla 
Ribeiro afirmou que ·0 juiz é, antes de tudo, um homem de fé, porque crê 
nos valores a cuja difusão consagrou a vida. A esse homem de fé, não é es-
tranhável que o mundo sem fé em que vivemos não dê o devido reconhe-
cimento· (Correio do Povo, ·Caderno de Sábado· de 19.4.75). O eminente 
mestre da Faculdade de Direito da U.F.R.G.S. lembra que as características 
culturais da sociedade industrial e tecnológica conduzem a um juízo de des-
valor ·que tem como primeiro alvo o direito como tal, como categoria cul-
tural, vale dizer, como conjunto de normas editadas para disciplinar e 
orientar a vida individual e comunitária·. Recorda que o Prof. Santiago Dan-
tas ·já havia assinalado há vinte anos atrás vir o direito perdendo terreno e 
prestígio para outras técnicas de controle da sociedade, menos dominadas 
pelo princípio ético e dotadas de grau mais elevado de eficiência; e que, no 
conflito entre um critério ético e um critério puramente pragnlático, assume 
o direito o papel de força reacionária, de elemento resistente. Chamava, 
ainda, a atenção para o fato de que essa perda de confiança no direito en-
volvia, em suas últimas conseqüências, a contestação, ainda que no terreno 
intelectual, da supremacia da ordemjurídica·. 
Rogo vênia para de novo reportar-me ao magistério de Balthazar Gama 
Barbosa, de que o juiz ·deve ter sensibilidade para a marcha da história e 
participar dos sofrimentos e da vida do seu povo, pois as normas do direito 
se destinam a curar as feridas da sociedade e acompanhar o caminhar dos 
homens para as esperanças do futuro·. 
Diga-se, aliás, que para o homem do povo o juiz apresenta-se como a 
própria voz do direito, pois só do juiz pode o homem esperar, com eficácia 
vinculativa plena, aquela proteção que de forma geral e abstrata a lei lhe 
promete. É, ainda, CaIamandrei: ·Se o juiz não tem cuidado, a voz do direito 
é evanescente e longínqua como a voz inatingível dos sonhos. Não me é 
possível encontrar na rua por onde passo, homem entre os homens na reali-
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dade social, esse direito abstrato, que vive apenas nas regiões astrais da 
quarta dimensão. Mas posso encontrar-te, ó juiz, testemunha corpórea da 
lei, de quem depende a sorte dos meus bens terrenos. Quando te encontro 
no meu caminho e me curvo com respeito, há no meu cumprimento o calor 
do meu fraternal reconhecimento. Sei que és o guarda e a garantia de tudo 
quanto de mais caro tenho no mundo. Em ti saúdo a paz do meu lar, a 
minha honra e a minha liberdade- (Elogio dei Giudici ... ). 
Devo encerrar. 
Neste momento que já proclamei supremo de minha vida, beüo com 
carinho minha esposa, e à Glória agradeço os anos de paz e felicidade que 
me proporciona: beijo com carinho minhas filhas, Dóris e Denise, rogando a 
Deus por sua felicidade; revejo com os olhos da alma e imensa saudade o 
vulto austero de meu pai, Cel. Manoel Alire Borges Carneiro, guia e exemplo, 
que com acendrado amor e dedicação serviu ao Brasil em suas Forças Arma-
das: beijo através da distância a doce velhinha minha mãe, a quem os males 
da idade não permitiram comparecer. 
Agradeço a presença, em desvanecedora demonstração de apreço, de 
tantos Colegas da magistratura, do M.P. e do magistério, excelentíssimas 
senhoras, nobres advogados, qvos servidores da Justiça, prezados amigos e 
alunos. 
Sou grato às eminentes autoridades que prestigiaram, com seu com-
parecimento para mim sumamente honroso, esta solenidade. 
Saúdo os estimados Colegas do egrégio Tribunal de Alçada, onde servi 
durante um biênio em ambiente pleno de cordialidade. É Tribunal modelar, 
que cumpre com empenho, rapidez, eficiência e exatidão seus encargos Ie--
gais. 
Apresento ao eminente Desembargador Wolney Santos, magisb'ado 
com larga folha de serviços prestados à Justiça, conduta exemplarmente 
modelada em sólida formação espiritual, meus melhores cumprimentos e a 
certeza de que, jubilado, encontrará igualmente novas perspectivas de 
atuação e de realização pessoal. 
Confesscrme extremamente sensibilizado pelas saudações, sobremodo 
generosas, que nos foram dirigidas pelos representantes da Ordem dos Ad-
vogados do Brasil, meu caríssimo amigo o Bacharel Wilson Ferretto, e do 
M.P., o meu prezadíssimo amigo Dr. Elias Rebelo Horta. 
Ao magistrado ilustríssimo, nosso Presidente e Chefe do Poder Ju-
diciário do Rio Grande do Sul, perante quem vim de renovar, como o fizera 
no limiar da carreira perante seu nobre progenitor, o compromisso de servir 
fielmente à Justiça, ao Desembargador José Faria Rosa da Silva dirüo as ex-
pressões mais sinceras de meu mais alto respeito, amizade e admiração. 
Aos eminentes integrantes desta Corte rogo a lição de sua experiência, 
o estímulo de seus conselhos, o prestigio de sua amizade: e a V. Exas. re--
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afirmo meu propósito de não desmerecer a centenária tradição de honra e 
labor do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. 
Disse.-
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