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Aula 1: Didática, fundamentos e práticas Conceito de didática É muito comum ouvirmos de alunos de que nem todo professor tem didática. Será que essa afirmativa é verdadeira? O que está se entendendo por didática? O fato é que o conceito de Didática vem se modificando ao longo dos tempos. Normalmente, os alunos, independentemente do nível de escolaridade, associam o conceito de Didática à capacidade do professor de transmitir um conhecimento com clareza, de modo que ele se faça entender, que o professor faça o aluno assimilar o conteúdo, ou seja, compreender a matéria. Nesse sentido, as pessoas que compreendem a Didática como transmissão e assimilação de conteúdos tendem a concluir, sobre aqueles professores que não alcançam o objetivo de fazer com que o aluno compreenda os assuntos referentes às disciplinas, que eles não possuem didática. Talvez, essa conclusão seja um pouco precipitada, pois o conceito de Didática não se resume apenas à mera transmissão e assimilação do saber. Há muito mais a ser compreendido sobre esse conceito e é o que desejamos para você, aluno do curso de formação docente; que amplie os seus olhares acerca da Didática, rompendo com um pensamento reducionista que poderá comprometer o processo de aprendizagem, na medida em que não se reconhece outras ações e competências inerentes ao papel do professor. Diante disso, esperamos despertar em você o sentido da Didática, o desejo de buscar novas respostas sobre ela, não se fechando em um único conceito, sob o risco de empobrecermos a relação pedagógica entre alunos e professores. Conversa com os alunos: realidades e compreensões A partir de um diálogo e questionamento sobre o conceito de Didática, com os alunos do curso de formação docente, nas modalidades presencial e a distância, nas salas de aula da Universidade Estácio de Sá, é comum escutarmos, lermos nos fóruns algumas compreensões. Selecionamos algumas falas de alunos que poderão representar você, na medida em que poderá apresentar ideias semelhantes. Bem, vamos às “deles”, “delas”, “nossas”, “suas” falas? São os procedimentos de ensino adotados pelo professor. É a capacidade do professor de transmitir um assunto, fazer com que o aluno compreenda as explicações. A Didática é um conjunto de técnicas e estratégias ou normas de ensino; é a teoria do ensino. É a forma como o professor transmite o conhecimento, visando à assimilação do mesmo pelo aluno; é passar conhecimento. É o caminho que o professor traça para trabalhar o conteúdo, quando um professor domina um assunto e explica de forma fácil para que o aluno entenda e apresente bons resultados. Responsabilidade do aluno no processo de aprendizagem Pensando nas falas que acabamos de ver, podemos dizer que tratam-se de definições clássicas, na medida em que a responsabilidade pelo ensino recai, predominantemente, sobre o professor. Mas podemos também questionar: E por que não falar também sobre a responsabilidade de aprendizagem do aluno? Vejamos a charge a seguir: Comentário Diante do que acabamos de ver na charge, você concorda que a responsabilidade pelo aprendizado do aluno é apenas do professor? E quanto ao ensino? Apenas o professor ensina ou ele também pode aprender com os seus alunos e, aí, nesse caso, os alunos também ensinam? Podemos nos questionar também sobre o pensamento a respeito dessa relação pedagógica entre alunos e professores. Os alunos, por sua vez, será que também podem aprender com os próprios colegas de turma? Então, nesse caso, não é mais o professor apenas que ensina, certo? A relação entre aluno e professor deve ser verticalizada, como uma via de mão única ou pode ser uma via de mão dupla? A seguir, aprofundaremos nossos conhecimentos para que possamos nos posicionar com mais fundamento quanto a isso. Reflexões a partir das falas significativas de nossos alunos, professores em formação A partir das falas, podemos dizer que o professor é considerado o centro do processo de ensino-aprendizagem e o aluno é aquele que tem a função de assimilar, de receber passivamente a informação; isto é, de reter o máximo de conteúdos em sua mente. Esse é um modelo linear de ensino em que o conhecimento é transmitido de alguém para outra pessoa, do professor para o aluno, hierarquicamente e como verdade absoluta, em via de mão única. A ênfase é no conhecimento que o professor apresenta, em sua prática de tornar compreensivo, explícito o que está ensinando. Nessa perspectiva, o professor é o único detentor do saber e o aluno é considerado “sem luz” até que ele aprenda o que o professor tem para lhe ensinar. Construindo conhecimento sobre o conceito de didática, problematizando-o Podemos afirmar que Didática vai muito além do que essa definição clássica mencionada anteriormente, pois, talvez, os alunos também possam aprender com os seus próprios colegas e não apenas com o professor em sala de aula. A propósito, talvez, possamos afirmar que o próprio professor também pode aprender com seus alunos. Como se pode perceber, o assunto é polêmico; e construir um conceito de Didática dependerá de aprofundamento teórico, de estudarmos os fundamentos da Educação, o que faz pensar que não existe um único conceito, padrão, correto, pois, afinal, correto pra que e pra quem; não é mesmo? Compreensão acerca do conceito de Didática à luz de alguns autores Diante disso, que tal partirmos de algumas referências, de estudiosos que se dedicaram a essa área do conhecimento? Vamos ver o que dizem os especialistas nesse assunto: Libâneo Didática: É um dos ramos de estudo da Pedagogia [...] É uma disciplina que estuda os objetivos, os conteúdos, os meios e as condições do processo de ensino tendo em vista finalidades educacionais, que são sempre sociais [...] se caracteriza como mediação entre as bases teórico-científicas da educação escolar e a prática docente [...] pode constituir-se em teoria do ensino [...] a Didática se baseia numa concepção de homem e sociedade (LIBANEO, 2013). Haidt Curso De Didática Geral: A Didática é uma seção ou ramo específico da Pedagogia e se refere aos conteúdos do ensino e aos processos próprios para a construção do conhecimento [...] é definida como a ciência e a arte do ensino (HAIDT, 2006) Candau A Didática Em Questão: “Uma reflexão sistemática e busca de alternativas para os problemas da prática pedagógica” (CANDAU, 2004). Cordeiro A Didática: A palavra didática tem sua origem na expressão grega techné didaktiké que significa ensino, instrução [...] de maneira mais abreviada é a arte de transmitir conhecimentos, trazendo o sentido da orientação, condução, guia [...] definição essa que data do século XIX, considerada tradicional, portanto, sendo ultrapassada por outras abordagens mais modernas e avançadas (CORDEIRO, 2007) Piletti Didática Geral: É comum a associação da Didática com o como ensinar, ou seja, com métodos e técnicas, mas, ressalta sobre a importância da reflexão sobre os seus fundamentos, sobre as razões de seu emprego, pois, caso contrário, corre-se o risco de nos convertermos em escravos dos instrumentos (PILETTI, 2010) Atenção De fato, o conceito é amplo e os autores citados aprofundam em suas obras. Vale à pena conferir e aprofundar o conhecimento sobre didática, pois, essa é uma ação formal, do professor: buscar os fundamentos da didática, visando posteriormente organizar a sua própria ação, que deverá ser pensada e consciente sobre o que se está fazendo e por que. Bem, isso é o que esperamos de um professor, mas quando ele apenas reproduz a prática de outro professor ou o conhecimento que consta nos livros didáticos, talvez, a sua prática não seja tão consciente, pois faltou a ele ser autor do que faz. Parte inferior do formulário Leitura Leia sobre as Formas de compreensão da Didática. Competências, saberes, características esperadas no professor no mundo atual Além da apropriação crítica esperada no professor, bem como da autonomia nas ações pedagógicas, acrescentamos que a criatividade é uma característica fundamental ao professor para que ele crie, elabore sua práticacom “mãos próprias” e não reproduza modelos pedagógicos/teóricos de outras pessoas. Comentário Percebeu o impacto causado pelo professor reflexivo em sua classe? Logo, se faz necessário que o professor esteja comprometido com um projeto de educação transformador, pois, dessa forma, ele poderá contribuir para a formação, igualmente, crítica e emancipada das novas gerações. Entretanto, ser reprodutor ou transformador é uma questão de concepção acerca da educação. Trata-se do olhar, da visão de educação que o professor desenvolveu ao longo de sua carreira, o que se refletirá na forma como ele vai atuar e trabalhar o conhecimento, bem como se relacionar com alunos, colegas e superiores. Leia sobre O que é esperado do professor no mundo atual. Aula 2: Breve retrospectiva histórica da didática Antiguidade Nesse período, podemos destacar Sócrates1, Platão e Aristóteles, considerados os primeiros educadores, representando algumas expressões filosóficas. Esses pensadores, no interior de seus tempos históricos, desenvolveram e difundiram concepções de educação do homem que ligam o desenvolvimento humano a finalidades colocadas em um modelo ideal de humanidade: de formação de caráter, de moral, de hábitos, do domínio das paixões, da justiça, do desenvolvimento religioso-intelectual, físico e artístico. Idade Média Na idade média, a partir de influências religiosas da Igreja Católica, a educação enfatizou a formação do homem como ser incompleto em busca da perfeição. O homem deveria merecer a vida sobrenatural, desenvolver princípios cristãos a partir da salvação de sua alma e respeitar o dogma da Igreja como representante terrena da autoridade divina. A Bíblia era o livro consagrado na pedagogia da escolástica, e os princípios fundamentais desse modelo de educação podem ser encontrados na obra de Santo Tomás de Aquino e na Ratio Studiorum dos jesuítas que foram os principais educadores de quase todo o período colonial. Você deve estar se questionando: como era o processo de aprendizado? Veremos, a seguir. Salão de 1874; pintura. - Aulas de desenho na escola cochin, por truphème.. - O desenho hernault, vintage ilustração gravada. magasin pittoresque 1875. O estudo era privado, em que o mestre prescrevia o método de estudo, a matéria e o horário; as aulas eram ministradas de forma expositiva, os exames eram orais e o discípulo deveria memorizar, repetir o que decorou. O enfoque era centrado em seu caráter meramente formal, tendo por base o intelecto, o domínio do conhecimento. Nessa época, a educação era restrita à elite, aos filhos de brancos e colonos, padres, monges que enquanto estudavam, estavam isentos do trabalho; e enquanto os pobres trabalhavam, estavam excluídos da escola, cujo significado do termo se refere ao “lugar do ócio”. Comentário Diante disso, surgem os questionamentos: · Até que ponto evoluímos? · Será que, nos dias atuais, ainda encontramos essa prática de ensino nas escolas públicas e privadas? · Será que, atualmente, apenas, os ricos têm acesso à escola? · E a qualidade das escolas? · Há diferenças entre escolas públicas e privadas? Idade Moderna Você sabia que Comenius (1592-1670) é considerado o Pai da Didática Magna? Comenius criticou o dogmatismo da Igreja, a pedagogia da escolástica, afirmando que todos os jovens, independente do sexo, deveriam ter acesso à escola e propôs a reformulação do ensino e da cristandade. O Tratado Universal da Didática Magna se referia à arte de ensinar tudo a todos, sem se desvincular totalmente das ideias religiosas, Comenius propõe que o aluno deveria ser instruído para os bons costumes, desenvolver virtudes para viver em sociedade, visando o progresso da nação. Tal proposta pedagógica tinha como objetivo instrumentalizar o homem para o trabalho produtivo dirigido às finalidades de uma sociedade capitalista. Assim, questiona-se: até que ponto é possível ensinar tudo a todos através de um método universal que, talvez, se aplique a todos e a ninguém ao mesmo tempo? Comenius, devido as suas propostas de ensinar tudo a todos, de sistematizar o ensino, com ênfase na economia do tempo e da energia, bem como no individualismo, passou a ser reconhecido, mais tarde, por educadores, estudiosos contemporâneos como um dos representantes da pedagogia tradicional. Martins (2012), ao se referir a Comenius, em sua obra, ressalta que para viabilizar o método único de ensinar tudo a todos proposto por Comenius no século XII, era preciso centralizar o ensino em um único professor e que atendesse a um grande número de alunos. O trabalho seria organizado na escola, de modo que o aluno obedecesse a uma hierarquia, sendo o professor considerado um “inspetor supremo”, o qual deveria com uma “habilidosa vigilância” controlar o desempenho da turma por meio de atuação direta dos seus auxiliares, “os chefes de turma”. Comenius, citado por Martins afirmava: Não é necessário que o professor ouça sempre todos os alunos, nem que examine sempre os cadernos e os livros de todos, pois tendo como ajudantes os chefes de turma, estes estarão atentos a que os alunos, colocados sob sua responsabilidade, procedam como devem. Comenius Como se pode constatar, o processo de ensino aprendizagem é controlado pelo professor, esperando-se que o aluno se comporte, apresentando uma resposta ou uma conduta previamente determinada. Idade Contemporânea Herbart (1766-1841), foi considerado o Pai da Pedagogia Tradicional. Podemos dizer que Herbart e Comenius são os principais representantes do modelo tradicional de ensino. Herbart propôs o método da transmissão-assimilação, tomando por base os estudos da Filosofia e da Psicologia. Com o foco no desenvolvimento moral e intelectual da criança, formulou um esquema a ser seguido pelo professor na instrução que Martins (2012) apresenta em sua obra. Mas em quê consistiu esse esquema? O esquema consiste em cinco passos. São eles: 01 Preparação do aluno: que pode se dar com a recordação da lição anterior, o despertar do interesse, a proposição de linhas gerais dentro das quais se situa a matéria que vai ser apresentada; recordar os conhecimentos aprendidos; apresentar o novo conhecimento; 02 Apresentação pelo professor do conteúdo a ser assimilado pelo aluno pela técnica da exposição (aulas expositivas); 03 Assimilação pelo aluno do novo conteúdo por meio da comparação do conhecimento novo com o conhecimento ao velho, partindo sempre do mais simples para o mais complexo; 04 Sistematizar o conhecimento visando à generalização; 05 Aplicação através de exercícios. No modelo tradicional de ensino, o professor tende a repassar o conteúdo como verdade absoluta, não se abre espaço para o questionamento na sala de aula; e o professor é o detentor do saber. O aluno, por sua vez, é aquele que não tem luz, apenas deve receber passivamente, absorvendo a massa de conteúdos que o professor lhe deposita em sua mente. O ensino é centrado no professor que transmite o conhecimento verticalmente para o aluno, ficando claro o formato de um modelo linear de ensino, via de mão única. Atenção E qual é a finalidade desse modelo de ensino? A finalidade educacional é que o aluno se ajuste à sociedade, se desenvolvendo moral e intelectualmente. Segundo Herbart, o fim da educação é a moralidade, atingida através da instrução educativa [...] A principal tarefa da instrução é introduzir ideias corretas na mente dos alunos. O professor é um arquiteto da mente. Ele deve trazer à atenção dos alunos aquelas ideias que deseja que dominem em suas mentes (LIBANEO, 2013). Normalmente, o professor que respalda a sua prática nessa concepção de ensino, tende a controlar o processo de aprendizagem, determinando as respostas que o aluno deverá apresentar nas avaliações, geralmente, testes e provas, através da memorização, da repetição, com ênfase no resultado, na quantificação e não no processo de aprendizagem. Predomina a cultura do silêncio, a autoridade do mestre e a disciplina baseada no medo da punição. Podemos dizer que a docência, quando é respaldada nessa perspectiva, a ênfase se dá maisna informação e menos na formação integral, mais na reprodução e menos na transformação, mais no aluno como objeto e menos no aluno como sujeito, mais na linearidade e menos na dialética. Diante desse quadro, questiona-se se: É possível, com essa prática tradicional, contribuir para que as novas gerações apresentem competências, tais como autonomia, visão crítica de mundo, capacidade de argumentação, de modo que correspondam às demandas do mundo atual? O sistema educacional brasileiro De 1700 a 1900, aproximadamente, pensadores europeus e norte-americanos, também podem ser citados como referências de modelos teóricos que contribuíram e continuam contribuindo para o sistema educacional brasileiro, na medida em que se preocuparam com o desenvolvimento da criança e com a necessidade de um método de ensino em que o aluno fosse sujeito ativo e interativo. Dentre os pensadores da época, podemos destacar: Rousseau Jean-Jacques Rousseau (1712-1778) — “O homem é bom no seu estado natural”. O papel do educador: afastar a criança dos vícios da sociedade, permitindo-lhe desabrochar espontaneamente suas potencialidades inatas; não impor e sim desenvolver a curiosidade, a sabedoria. Pestalozzi Johann Heinrich Pestalozzi (1746-1827) — Defendia a doutrina naturalista: que o homem nasce bom e que o seu caráter era formado pelo ambiente que o rodeia. Aplicou as ideias de Rousseau. “Para sua época, esta ideia era um tanto inovadora porque, na segunda metade do século XVIII, a concepção corrente era de que as transformações revolucionárias seriam o remédio que curaria todos os males sociais. Por isso, ao advogar a ideia de que a educação era um meio de regenerar a sociedade, ele estava introduzindo um elemento novo no ideário pedagógico de seu tempo” (HAIDT, 2000, p. 18). Froebel Friedrich Wilhelm August Froebel (1782-1852) — Criador do Jardim de Infância, em 1837, dizia que “as crianças são como as plantas, cujo desenvolvimento futuro é uma consequência do tratamento que recebem nos primeiros anos de vida. Por isso, elas devem crescer à luz da natureza, lançando raízes sobre a sua terra, alimentando-se do seu próprio ambiente”. Decroly Jean-Ovide Decroly (1871-1932) — A escola ideal: ambiente onde a criança pudesse observar, diariamente, os fenômenos da natureza e a manifestação de todos os seres humanos; além de conhecer o meio social em que vive. Maria Montessori Maria Montessori (1870-1952) — Em 1912, elaborou o método montessoriano (escola primária de sucesso internacional). Montessori dava importância à educação sensorial e recusava as técnicas didáticas fixas. Opunha-se à Pedagogia tradicional, católica. O método montessoriano é centrado na autoeducação por meio de brinquedos educativos (corrente vitalista). “A principal ideia que sustenta as ideias de Maria Montessori é a de que a criança tem que ser posta em primeiro lugar e considerada nas suas especificidades. Na sua concepção, a infância é uma idade própria, com características particulares, o que não permite reduzir a criança a um adulto em miniatura” (CORDEIRO, 2007, p. 175). Dewey John Dewey (1859-1952) — “Agir como uma meta é agir inteligentemente. Aprender fazendo”. Ação precede o conhecimento e o pensamento. “Antes de existir como um ser pensante, o homem é um ser que age”. “Sua pedagogia baseia-se nas noções de experiência e atividade. Pondo-se contra as proposições de Herbart, Dewey insiste em que só se pode realmente aprender aquilo que corresponde a um interesse verdadeiro e espontâneo, que conecta o indivíduo ao objeto do conhecimento” (CORDEIRO, 2007, p. 172-173). Kilpatrick William Heard Kilpatrick (1871–1965) — Organismo intervém em toda a atividade: o pensar, o sentir, os impulsos (o objetivo, a necessidade é que impulsiona o indivíduo), ação corporal, secreções glandulares. Claparède Édouard Claparède (1873-1940) — É a favor de uma educação funcional, de uma escola sob medida: pedagogia adaptada ao caráter individual do aluno. Em 1912, criou o Instituto Jean Jacques Rousseau, voltado para Psicologia Infantil. A educação ideal é aquela que cria, na criança, um comportamento que satisfaça as suas necessidades orgânicas e intelectuais. Freinet Célestin Freinet (1896-1966) — É a favor da não ruptura entre escola e meio social (vida e escola). O educador precisa tornar a escola uma continuidade da vida. O professor deve considerar os interesses de seus alunos, permitindo a livre expressão deles: conversas livres, composição de pequenos textos e desenhos livres. Exemplo: pedir ao aluno que desenhe ou narre oralmente acontecimentos de sua vida, assim como observações e experiências; encorajar o aluno a produzir textos e desenhos livres; levar o aluno a falar e a escrever melhor. Piaget Jean William Fritz Piaget (1896-1980) — Foi convidado por Claparède para assumir a direção dos estudos do Instituto Jean Jacques Rousseau em 1923. Em 1929, assumiu a diretoria do centro internacional de educação, órgão que passou a ser filiado à UNESCO. Escola: oferecer ensinamentos sobre a educação moral, social, cívica. É considerado interacionista e conhecido pelos seus estudos sobre os estágios cognitivos/estágios de desenvolvimento intelectual da criança. Esse pensadores foram considerados desenvolvimentistas na medida em que concentraram seus estudos no desenvolvimento natural e espontâneo da criança, com ênfase nos fatores internos (biológicos/maturação orgânica) e fatores externos (o meio imediato, tal como a família e a escola). De alguma forma, apresentam pontos convergentes, apesar de suas respectivas particularidades. Acrescenta-se a isso, a influência que o modelo escolanovista, no Brasil, década de 1930, recebeu de tais pensadores, ressaltando-se que esse foi um movimento que veio para superar a Pedagogia tradicional, tendo como representantes, aqui, em nosso país, Anísio Teixeira, Fernando Azevedo, Lourenço Filho, Cecília Meireles e outros, considerados os pioneiros no manifesto da educação renovada. Saiba mais Conheça um pouco mais sobre a Trajetória histórica da Didática. Surgimento da Educação a Distância Nesse contexto, ressalta-se também o surgimento do ensino a distância que, com o advento das novas tecnologias (leia-se Informática), surge um potencial de mensagem. Nada mais é fixo, estático, tratando-se das multimídias, do hipertexto (conjunto de textos, imagens, sons, enfim, estímulos) como se fosse um caleidoscópio, conforme nos ensina Pierre Levy (1994). Dessa forma, o espaço cibernético está se tornando um lugar essencial para construção do saber, uma vez que abre infinitas possibilidades. Surge, então, uma nova cultura de aprendizagem com a emergência de uma nova inteligência, a inteligência coletiva (LEVY, 1994) — tudo isso graças a essa nova forma de cooperação e coordenação em tempo real. Segundo Pinto e Pinto (2011) apesar de um desafio instigante, tendo em vista os recursos tecnológicos atuais, cada vez mais sofisticados, há que se cuidar, sobretudo, para que não represente um instrumento de opressão, mas sim de libertação, pois, apesar da redução de tempo e custo no ensino a distância, é preciso que se questione, de fato, o nível de formação que se pretende oferecer. O discurso ideológico para que as pessoas continuem acreditando que sua posição social se deve à falta de escolarização, falta de capacidade, habilidade, aptidão, e não às injustiças intrínsecas à própria sociedade capitalista, deveria fazer parte das discussões sobre a EAD. Mas, quais dificuldades a EAD poderá enfrentar? Saiba mais Entre o discurso teórico e as ações pedagógicas poderá existir, segundo Silva (2003), de fato, forte discrepância. Ainda que os defensores da EAD garantam que a qualidade de ensino será mantida, é preciso ter olhar crítico, não fechar os olhos para interesses mercadológicos, colonizadores, próprios do processo de globalização que vivenciamos. Assim, não há como deixar de pensar nas possíveis precariedades próprias da EAD apontadas por Marco Silva (2003), ou seja, o risco de se banalizar a educação, fazer desse espaço virtualpor excelência, na construção de conhecimento e competências, “algo” que vá na contramão da proposta inovadora, consistente e de qualidade da EAD, conseguindo, com isso, resultados exatamente antagônicos aos esperados, como, por exemplo, a boa colocação dos formandos no mundo do trabalho. Sobre essa modalidade de ensino, iremos aprofundá-la em aulas posteriores. Aula 3: Correntes pedagógicas liberais Correntes pedagógicas liberais: tradicional, escola nova e tecnicismo Para início de conversa, é importante mencionar o porquê do termo liberal e, aí, nos reportamos a Dermeval Saviani que oferece a seguinte explicação: O termo liberal veio para justificar a nossa sociedade capitalista que é caracterizada pelo individualismo, pelo imediatismo, competitividade e o consumo. E é sob essas bases que as tendências pedagógicas em questão se alicerçam. Saviani, 2008. Sobre as tendências pedagógicas que poderão respaldar a nossa prática, vale dizer que elas não se excluem, se complementam e se nos perguntarem em que ou quem fundamentamos a nossa prática, talvez tenhamos dificuldades para responder, pois, ora podemos respaldar a prática em uma teoria, ora, em outra. Atenção Talvez possamos constatar o que está predominando nas ações dos profissionais da educação. Em outras palavras, queremos dizer que, ao observarmos uma aula de um determinado professor, podemos constatar como ele está trabalhando o conhecimento, assim como podemos verificar como esse professor se relaciona com seus alunos e os avalia; a propósito, como ele constrói suas questões de prova, por exemplo, e, a partir daí, ensaiar algumas considerações a respeito de sua prática docente. Para facilitarmos a aprendizagem sobre as tendências pedagógicas, optamos por sistematizá-las, apontando suas características, discutindo sobre os reflexos no espaço de sala de aula, lembrando, mais uma vez, que são apenas referências da prática e nunca solução definitiva sobre como ser professor. Você já imaginou se deparando com um “problema” no cotidiano escolar tal como a apatia dos alunos na sala de aula e, aí, procura no manual, na letra A de apatia, para saber como lidar com essa situação? Pois é, as teorias oferecem um norte, iluminam a nossa prática, porém, não são redentoras, cabendo ao professor comparar dialeticamente a sua realidade, a sua prática às teorias estudadas e apresentar sua própria prática que não será uma prática qualquer, mas fundamentada porque estudada, consciente e refletida. Vamos, então, às tendências pedagógicas liberais que poderão respaldar as nossas ações? Modelo Tradicional Esse modelo tem como representantes principais Comenius (Pai da Didática Magna) e Herbart (Pai da Pedagogia Tradicional) e, conforme já deve ter sido mencionado em aulas anteriores, nesse caso, o professor é o centro do processo de aprendizagem; ele detém o poder do conhecimento. Antes de aprofundarmos nossos estudos nesse modelo de abordagem, vejamos o vídeoclipe da música Another Brick in the Wall (Parte II), do grupo Pink Floyd:). De acordo com o que acabamos de ver, no modelo tradicional, o aluno é considerado “sem luz”. O conhecimento é transmitido vertical e hierarquicamente do professor para o aluno que recebe, passivamente, uma massa de informações para arquivar em sua mente. Para Libâneo (2013), na Pedagogia tradicional, prepondera a ação de agentes externos na formação do aluno. A transmissão do saber é constituída na tradição e nas grandes verdades acumuladas pela humanidade. O ensino é compreendido como um repasse de ideias do professor para a cabeça do aluno; os alunos devem compreender o que o professor transmite, mas apenas com a finalidade de reproduzir a matéria transmitida. Com isso, a aprendizagem se torna mecânica, automática, não mobilizando a atividade mental, a reflexão e o pensamento independente e criativo dos alunos. Comentário Talvez, aqui, possamos identificar um dos porquês dessa abordagem ser incluída nas pedagogias liberais de ensino, pois, como o aluno não pode questionar seu professor, ele não exercita a cidadania crítica; a ciência não é desvelada, desmistificada e o aluno, por sua vez, tem que aceitar o que está posto e se adaptar ao sistema, se desenvolvendo intelectual e moralmente. Diante disso, quando o conhecimento é determinado como verdade absoluta, não se abre espaço para a discussão, para o debate, para a participação dos alunos. Como então formar esse aluno participativo na sociedade? Vejamos a charge a seguir: Diante da charge, podemos perceber que a escola tradicional está contribuindo, apenas, para reproduzir o sistema, a estrutura social vigente, pois esse aluno cidadão é condicionado a acreditar que os fatos são inexoráveis, imutáveis. Paulo Freire criticou a Pedagogia tradicional, denominou de educação bancária, enciclopedista, conteudista. Ao aluno não é possível despertá-lo sobre o sentido do aprendizado. Quando há questionamento sobre o porquê de aprender tal conteúdo, muitas vezes, o professor tradicional responde que é porque cairá na prova ou porque está no programa, mas, o porquê mesmo, o sentido da matéria, esse professor, talvez, nem saiba responder, pois, igualmente, foi educado pelo método reprodutor, assumindo a condição de mero repassador de informações. Normalmente, se prendem aos livros didáticos, repassando o conteúdo, o conhecimento como se fosse seu e com essa prática, não estimula a dúvida, a busca de novas respostas. O professor, nesse caso, sabe o que é certo e errado e impõe que os alunos copiem, memorizem e apresentem mais tarde, nas provas, as respostas determinadas por ele. Quem nunca sentou nas primeiras fileiras para não perder o que o professor fala, escrevendo em seu caderno o conteúdo? Quem nunca desejou gravar a aula do professor para reproduzi-la posteriormente? A propósito, seu professor permite que grave sua aula? Sim, Não? Qual o motivo? Que tal investigar? Na verdade, são muitos questionamentos, muitas respostas que podemos buscar e identificar se o professor respalda a prática predominantemente na Pedagogia tradicional. Quer ver? Como o professor trabalha o conhecimento? Ele escreve no quadro? Como é o quadro do professor? “Ele constrói o quadro ou traz o quadro pronto?” Ele permite que você faça perguntas? Como ele reage quando o aluno faz uma pergunta sobre um determinado assunto que, aparentemente, não está relacionado ao conteúdo pensado pelo professor para trabalhar na aula naquele dia? Ele dá atenção ao aluno ou responde que o assunto não está previsto em seu roteiro? Exemplo de prática respaldada na Pedagogia tradicional A professora Carolina ensina a seus alunos do sexto ano sobre o continente europeu, os países e suas capitais. Mariana, aluna da professora Carolina, tinha recebido um cartão-postal enviado de Paris por sua madrinha. Como estava estudando sobre aquela e outras cidades da Europa, Mariana leva o cartão para mostrá-lo à professora e a seus colegas. Logo no início da aula, Mariana tenta mostrar o cartão, mas a professora não permite a interrupção. A professora Carolina avisa: “Nosso assunto hoje não é sobre pontos turísticos, Mariana. Por favor, guarde e pegue seu material para copiar o conteúdo da aula.” Mariana fica muito constrangida, guarda seu cartão dentro de um livro, e não consegue prestar atenção à aula. A professora tinha um roteiro previamente planejado que dizia: “no dia X fale sobre as capitais dos países da Europa”. Carolina estava refém do planejamento, não admitindo novas possibilidades, tornando sua prática inflexível. Certamente, esse foi o modo que aprendeu -- reproduzir o modelo alheio. No livro didático usado pela turma, um dos capítulos era sobre a Europa, com o seguinte objetivo: “levar os alunos a identificar as capitais dos países da Europa”. Carolina seguiu o planejamento sem permitir interrupções. Leitura Veja, agora, o que conta Rachel de Queiroz: Memórias de menina. Escola Nova: denominada de ativa, progressiva ou progressivista, renovada Esse modelo pedagógico tem como um dos representantes brasileiros Anísio Teixeiraque foi aluno de J. Dewey e, por conta disso, Anísio teve uma formação respaldada na cultura americana, do aprender fazendo, do educar para a ação, do empreendedorismo, diríamos hoje. De fato, foi uma evolução em relação ao modelo tradicional, pois o aluno passaria a estudar, a aprender “colocando a mão na massa”, vendo no plano concreto o conceito abstrato, generalizado. Por esse motivo, também podemos dizer que J. Piaget representa esse modelo, uma vez que trata dos estágios cognitivos que vão desde o plano concreto – quando a criança precisa ter o objeto “ao vivo e a cores” em suas mãos – até que desenvolva a representação mental do mesmo. Na Escola Nova o professor passará a estreitar os vínculos com o aluno, se relacionando de forma mais amigável, centralizando o ensino no educando, permitindo, ao mesmo, mais espontaneidade e comportamento ativo. O aluno pode participar de aulas práticas, em laboratórios, experimentação, soluções de problemas, aulas passeio, na horta, aulas lúdicas, aprender fazendo, ou seja, constatando, na prática, o conceito estudado teoricamente. Em outras palavras, se debruçando sobre o objeto de estudos, em uma relação indivíduo-organismo/meio. Vejamos a charge a seguir: Você percebeu a ironia da charge ao afirmar que o processo de avaliação seria justo? Diante dessa necessidade de mudança no processo de avaliação, na Escola Nova, o professor, por sua vez, acompanha o ritmo cognitivo do aluno, volta-se para as potencialidades e as lacunas cognitivas. Observe que a ênfase ainda recai sobre o indivíduo e seu ritmo, mesmo que trabalhem em grupo e, quanto a isso, não houve alteração em relação ao modelo tradicional. No modelo escolanovista, a ênfase recaía, então, sobre o indivíduo, mesmo que o professor incentivasse o trabalho em grupo em sala de aula. Os alunos que conseguissem se enquadrar nesse sistema por apresentar domínio do conhecimento científico seriam aprovados. Os demais seriam alvo de reprovação. Exemplo de prática respaldada no modelo pedagógico escolanovista Ao estudar o conceito de fotossíntese, as partes de um vegetal, o professor Maurício orienta os alunos para que plantem um feijão no algodão. Quem de nós nunca plantou um feijãozinho no algodão para constatar o fenômeno da fotossíntese ou identificar as partes do vegetal? Veiga (2007) se pronuncia, quanto a organização geral da Escola Nova, assinalando que é um laboratório de Pedagogia prática. Procura desempenhar o papel de explorador ou iniciador das escolas oficiais. A Escola Nova está situada no campo, porque este constitui o meio natural das crianças que oferece possibilidades para empreendimentos simples. A Escola Nova organiza trabalhos manuais, rurais, de jardinagem, trabalhos livres; que tenham uma finalidade educativa e sejam de utilidade individual ou coletiva, que assegurem o espírito inventivo. 01 Em matéria de educação intelectual, a Escola Nova procura abrir o espírito por uma cultura geral da capacidade de julgar, mais que por acumulação de conhecimentos memorizados. O processo de aprendizagem se dá por meio da aplicação do método científico, da observação, hipótese, comprovação, lei; 02 O ensino será baseado na experiência. A aquisição dos conhecimentos resulta de observações pessoais, visitas a fábricas, prática de trabalho manual. A teoria vem sempre depois da prática, nunca a precede; 03 A Escola Nova está baseada na atividade pessoal da criança. A Escola Nova deve ser um ambiente belo, como desejava Ellen Key1. A ordem e a higiene são as primeiras condições, o ponto de partida. Esse é um modelo de ensino que mobiliza a motivação pessoal, desperta o interesse do aluno, pois ele não ficaria mais parado, sentado para aprender através da memorização; mas, por sua vez, é importante ressaltar, à luz de educadores progressistas, que essa prática da constatação de fenômenos não garante visão crítica de mundo, sobre o que se está estudando, não garante formação emancipada socialmente e transformadora. O aluno apenas constata, entretanto, não é instigado a relacionar o que aprende aos fatos, à realidade. Ele estuda as partes do vegetal, mas, não discute sobre a fome, a miséria, a desigualdade social e, por vezes, se não for despertado por alguém, professores ou outras pessoas de seu convívio, acreditará que os fatos são inexoráveis. Quer ver outro exemplo? Aulas de culinária, aprender a ser prendado para corresponder às necessidades da sociedade: o papel de filha, de mãe. A discussão sobre o papel da mulher na sociedade fica para os professores críticos e progressistas. Saiba mais A educação, nessa perspectiva escolanovista, pragmatista, da prática pela prática, imediatista, com um fim em si mesmo, não é desvelada, não funciona como instrumento de libertação da condição de opressão. Por mais que as intenções de Anísio Teixeira e companheiros tenham sido de democratizar a escola pública, oferecendo um ensino de qualidade aos pobres para que tivessem melhores condições de vida; há notícias de que seus projetos de educação foram engavetados enquanto assumia cargos públicos. Era um idealista, mas a história não aconteceu, conforme Anísio sonhava: uma escola pública, de qualidade em que o aluno pudesse ter acesso à alimentação saudável, orientação para os estudos, acesso a recursos didáticos, professores capacitados. Contudo, não podemos afirmar que os professores de escolas públicas não estejam aptos a exercer a profissão. Bons e maus profissionais existem em qualquer domínio. É preciso lembrar que são professores concursados e as razões do comprometimento ou não deles com a formação das novas gerações são diversas, difícil de julgá-las. O objetivo das escolas pautadas nessa perspectiva “renovadora” ainda era fazer com que o aluno se desenvolvesse intelectualmente, apresentasse domínios cognitivo, afetivo e psicomotor e se ajustasse, se adaptasse socialmente. Importante reforçar que esse modelo pedagógico foi influenciado pela Psicologia que, por sua vez, recebeu influência das Ciências Naturais, o que ficou evidente, a partir dos nossos estudos sobre os pensadores de 1700 a 1900, na medida em que enfatizavam os aspectos biológicos. Nesse sentido, recebeu críticas de educadores contemporâneos, a partir da década de 1960, considerados progressistas, pois, a Escola Nova continuou a reproduzir a estrutura social vigente, a acentuar a desigualdade social. Sabe por quê? Porque o aluno, o indivíduo, era o único responsável por seu sucesso ou fracasso escolar e na vida, por não possuir dons naturais, aptidão, capacidade intelectual que lhe permitisse dominar os conteúdos e obter a aprovação no final do período letivo. Vale destacar, aqui, para reforçar a presença da Psicologia na Pedagogia, as influências de Francis Galton, primo de Darwin, bem como de Binet, ambos da área médica, no sistema educacional brasileiro. Enquanto Galton, foi pioneiro na Psicometria — área da Psicologia que se vale da Estatística, da quantificação para identificar um modo de existência do sujeito, assim como o QI (Coeficiente Intelectual) e as aptidões (habilidades inatas) através de testes psicológicos; Binet foi criador da I Escala de Inteligência para Crianças. Seu objetivo era fazer uma previsão, a partir da aplicação de testes de raciocínio em uma amostra significativa de sujeitos, sobre o rendimento escolar. Uma faixa de normalidade seria traçada mediante a média apresentada pelos indivíduos testados. Aqueles que apresentassem resultados, abaixo da faixa de normalidade, a previsão era de que fracassaria na escola. Essa prática da testagem, no campo da Psicologia, veio a se refletir no sistema de ensino com a ampla disseminação de provas e testes, aproximadamente, após a década de 1940. Os alunos que não apresentassem resultados na média ou acima ficariam reprovados, sendo excluídos do sistema. Com esse discurso, não estamos afirmando que não se deve aplicar testes e provas, mas, que, talvez, possamos lançar mão de outros instrumentos e ter como expectativa que o aluno mobilize competências, saberes que ultrapassema questão dominar conhecimentos. Atenção Veja você quando participa dos fóruns. Eis, aí, um espaço para avaliação: se o aluno participa dos fóruns, se a participação é superficial, se o aluno mostra autonomia nas respostas, se ele faz cópia de sites, se escreve qualquer coisa no último dia do prazo. Avaliar é muito complexo, mas, estamos convidando você, professor em construção, para que pense na formação integral, ou seja, um aluno que apresente domínio cognitivo, afetivo e psicomotor, e, acima de tudo, atitude diante da vida, da sociedade, que seja um cidadão consciente e com desejo de contribuir para a construção de uma sociedade mais digna e feliz de se viver. Isso não significa que tenhamos que aprovar todos os alunos, que essa atitude é esperada do professor, mas, que, talvez, prestássemos atenção em outros saberes, igualmente, formativos, relevantes na formação do sujeito, que vão além do domínio cognitivo (domínio das ciências). O que adianta um aluno gabaritar uma prova de Biologia e não demonstrar consciência ecológica, nem o respeito pelos colegas? Vamos avaliar o conhecimento, mas, ir além, incentivando a formação de valores. Tecnicismo A Pedagogia Liberal Tecnicista surgiu nos Estados Unidos na segunda metade do século XX, chegando ao Brasil entre as décadas de 1960 e 1970. Nessa concepção de ensino, o homem é considerado produto do meio, sendo resultado das consequências das forças existentes em seu ambiente. O Tecnicismo acredita que a consciência do homem é formada pelas relações acidentais estabelecidas com o meio e devem ser controladas cientificamente através da Educação. Tendência inspirada na Teoria Behaviorista, comportamental de Skinner, essa abordagem acabou sendo imposta às escolas pelos organismos oficiais por ser compatível com a orientação econômica, política e ideológica do regime militar vigente. De acordo com a Pedagogia Liberal Tecnicista, a Educação deve atuar para o estabelecimento e a manutenção da ordem social vigente, se articulando diretamente com o sistema capitalista de produção. Diante disso, é possível compreender porque a Pedagogia Tecnicista emprega a ciência da mudança do comportamento, se apoiando então, na concepção comportamentalista (estímulo/resposta) que privilegia resultados rápidos e sem espaço para reflexões críticas. Atenção Segundo essa perspectiva educacional, o comportamento desejado é fixado pela recompensa. A instrução programada enfatiza a importância de uma definição precisa do que o aluno deverá aprender e a importância de estruturar cuidadosamente os materiais a serem utilizados (apostila) para o aluno aprender exatamente o que se quer que ele aprenda. A técnica da instrução programada foi responsável pela ênfase que o processo ensino-aprendizagem passou a dar aos seguintes elementos: Os princípios da técnica de instrução programada são os seguintes: Objetivos; A matéria é desdobrada em pequenas informações; Aprendizagem em ritmo próprio; Cada informação apresentada ao aluno exige uma resposta dele; Concentração da atenção do aluno em uma quantidade limitada de material (módulo); O acerto ou o erro da resposta do aluno é reconhecido por ele imediatamente; Respostas dos alunos a cada momento (feedback imediato); Cada informação deve estar perfeitamente ordenada, formando conjuntos ou programas com fins específicos. Oportunidade para saltar partes do programa que o aluno já sabe e para repetir partes do programa em que tem mais dificuldades. Com isso, ainda hoje, predomina nos cursos de formação docente, o uso de manuais didáticos de cunho tecnicista, de caráter meramente instrumental. A didática instrumental se caracteriza pela racionalização do ensino, o uso de meios e técnicas, a otimização do tempo. O professor é um administrador e executor do planejamento, o meio de previsão das ações a serem executadas e dos meios necessários para se atingir os objetivos. Boa parte dos livros didáticos, em uso nas escolas, são elaborados com base na tecnologia da instrução. O sistema de instrução se compõe das seguintes etapas: a) especificação de objetivos instrucionais operacionalizados; b) ensino ou organização das experiências de aprendizagem; c) avaliação dos alunos relativa ao que se propôs nos objetivos iniciais (LIBÂNEO, 2013). Comentário Orientados por uma concepção mecanicista de ensino, os professores brasileiros que cursaram o Magistério nas décadas de 1960 e 1970, aprenderam que os planejamentos e os planos de aula deveriam estar centrados nos objetivos operacionalizados, e a metodologia de ensino deveria utilizar estudos dirigidos, planejamentos bem estruturados e recursos tecnológicos e audiovisuais, que faziam transparecer a chegada da modernidade no ambiente escolar. Na verdade, visavam a escamotear a intenção primeira da escola: servir ao modelo socioeconômico vigente. Esse modelo foi considerado um retrocesso educacional, uma vez que, na década de 1960, já se cogitava a respeito de uma educação libertadora com Paulo Freire. Veio no bojo do Regime Militar a partir do acordo MEC/USAID — Agência Internacional de Desenvolvimento — em que o currículo escolar deveria se enquadrar aos princípios americanizados, visando à preparação do aluno para o mercado de trabalho. Por outro lado, é preciso pensar nos objetivos, no que pretendemos alcançar. Se queremos respostas imediatas, talvez, a proposta adequada seja essa. Exemplo: quando desejamos nos preparar para concursos públicos. Exemplo de prática respaldada no modelo pedagógico tecnicista Cursos de idiomas, Kumon, Senai, Sesc, Senac, escolas técnicas, politécnicos, cursos de curta duração, modalidade do ensino à distância quando os alunos realizam exercícios de fixação e o feedback é imediato, ou seja, de forma rápida o aluno sabe que errou ou acertou. Nesses casos, em geral, o conteúdo é controlado pelo professor que assume o papel de instrutor, tutor. A relação é de causa e efeito; o ensino é controlado pelo meio, esperando que o aluno apresente a resposta desejada. São cursos por módulos em que os alunos só passam para o segundo módulo até que sejam aprovados no primeiro, sendo o conteúdo fragmentado, não articulado e há a presença do condicionamento, visando exclusivamente à aprovação, à obtenção do título. Sérgio, professor de Ensino Médio profissionalizante, visando a “dinamizar” e a “garantir” a aprendizagem dos alunos, resolveu trabalhar os conhecimentos referentes às doenças sexualmente transmissíveis, projetando no data show os tipos existentes e a forma de prevenção e tratamento, mas sem discutir suas implicações sociais. No planejamento do professor, constavam apenas os objetivos específicos, comportamentais que os alunos deveriam apresentar, dentre eles: · Identificar as DSTs; · Comparar as formas de prevenção; · Diferenciar os tipos de tratamento. Em seguida, o professor fez um estudo dirigido, colocando o nome da doença e solicitando que os alunos apresentassem a forma de prevenção e tratamento, conforme sua instrução programada, uma técnica de ensino com base na teoria do reforço. Aqueles que acertaram tudo, ganharam o direito de manusear o computador da escola e aqueles que não acertaram, ficaram na sala de aula. Sistematizando informações sobre os modelos pedagógicos estudados Tradicional Escolanovista Tecnicista Papel da escola Preparação intelectual e moral dos alunos para assumir seu papel na sociedade. Porém, para assumir seu papel na sociedade como? Preparação intelectual e desenvolvimento mental dos alunos, atendendo-os em suas necessidades individuais, ajustando- os à sociedade. Escola proclamada para “todos”. Adaptação social. Modelar o comportamento humano através de técnicas específicas; manter a ordem social; preparar para o mercado de trabalho. Organização da escola Funções claramente definidas e hierarquizadas. Normas disciplinares rígidas. Funções se confundem (autoridade disfarçada); afrouxamento das normas disciplinares. Modelo empresarial aplicado à escola; divisão entre planejamento e execução. Currículo organizadobaseado em modelos americanos. Professor É o transmissor dos conteúdos aos alunos. É o facilitador da aprendizagem, o auxiliador no desenvolvimento “livre” da criança. É o técnico, tutor que aplica um conjunto de meios que garantem a eficiência do ensino, controlando o resultado. Aluno Um ser passivo que deve assimilar os conteúdos transmitidos pelo professor. Aluno educado que deverá dominar o conteúdo cultural universal transmitido pela escola. Um ser “ativo”, centro do processo ensino-aprendizagem. Um elemento para quem o material é preparado, devendo ser eficiente, produtivo, técnico. Relação aluno-professor Predomina a autoridade do professor que exige atitude receptiva dos alunos e impede qualquer comunicação entre eles. Relação “democrática”, autoritarismo diluído na fisionomia de camaradagem. Relação objetiva onde o professor transmite informações e o aluno vai fixá-las, seguir o comando externo. Pressupostos de aprendizagem Aprendizagem receptiva e mecânica, sem considerar particularidades, o contexto. Aprendizagem baseada na motivação e no esforço pessoal e no estímulo do meio. Aprendizagem baseada na eficiência, no desempenho, na administração, controle do tempo; aprendizagem individualizada. O ensino é um processo de condicionamento. Objetivos educacionais Obedecer a sequência lógica dos conteúdos, baseados em documentos legais. Ênfase nos objetivos específicos. Desenvolver a capacidade mental do aluno e a atividade prática. Específicos, operacionalizados a partir de classificações (verbos precisos). Conteúdos escolares/programáticos Selecionados a partir da cultura universal acumulada. Organizados em disciplina, quantidade de conhecimentos repassados como verdade absoluta. Conteúdos fragmentados e isolados do contexto. Trabalhados a partir da experiência concreta do aluno. Conteúdo isolado. Informações, princípios, leis estabelecidas, ordenados e estruturados em uma sequência lógica e psicológica por especialistas (conteudista/mentor, tutor da disciplina). Método Exposição verbal da matéria, centrado no professor, leituras, cópias, ditados, exercícios de fixação; uso excessivo do quadro que é previamente determinado, pronto e não construído conforme o andamento da aula e a participação dos alunos. Solução de problemas, desafios cognitivos, pesquisa, experimentos, experiência, jogos, trabalhos em grupo. Estudo do meio natural e social. Registro empírico. Instrução programada, módulos. Ênfase nos recursos audiovisuais, TICs, apostilas. Fundamentado na teoria comportamental — recompensa e punição (estímulo-resposta) – S – R. Transmissão de informações precisas, objetivas, rápidas. Tele-educação, EAD. Avaliação Valorização dos aspectos cognitivos com ênfase na memorização da matéria, ênfase na quantidade de informações assimiladas, ênfase no produto final, na classificação. Valorização dos domínios cognitivo, afetivo e psicomotor. Visa a resultados, à produtividade, ao alcance dos objetivos específicos, à mudança de comportamento — eliminação de resposta/comportamento inadequado. Aula 4: Correntes pedagógicas progressistas Professores progressistas e tradicionais O fato do professor se considerar progressista, crítico, não significa que não possa adotar uma prática mais tradicional, mas, apesar disso, você sabe qual é a diferença entre esses dois tipos de professores? Vejamos: Professor pesquisador O professor pesquisador aprendeu a ser autor do que faz, não reproduzindo modelos pedagógicos, não replicando conhecimentos, de modo que, ao adotar uma prática mais tradicional, ele terá consciência sobre o que está fazendo, conseguirá se responder sobre o sentido de sua prática e, em caso de ser questionado, argumentará com fundamento. Professor reprodutor Eis, aí, a diferença entre o professor pesquisador, crítico, transformador em relação ao professor reprodutor que, se for perguntado sobre sua prática, sobre o porquê de trabalhar um determinado assunto, responderá que o motivo é porque está no livro, no programa, na ementa, no planejamento determinado pela escola .Esse professor reprodutor, diferente do crítico, não interiorizou o conceito de pesquisador, de sujeito autônomo. Professor Reprodutor Trata-se do professor fazer a escuta trabalhada, partir do óbvio, da realidade do educando e devolver de forma sistematizada, científica, sob risco de submetê-lo à condição de opressão (velada ou não) ao sonegar a ciência a ele. Essa não deve ser a proposta quando se compreende a educação como instrumento de libertação, de transformação de realidades sociais. Nesse sentido, cabe ao professor indissociar escola e sociedade, ensino e pesquisa, tendo como objeto de estudos a sua própria prática, o cotidiano escolar. A opção pela metodologia da contradição é justificável, uma vez que não é possível prever teoricamente todos os casos e situações didáticas no desenrolar do processo educativo. Para que exista unidade entre escola e vida, entre instrução e educação, entre saber cotidiano e saber elaborado, é preciso que o educador e o educando tenham uma postura consciente e crítica dos contrastes sociais refletidos no processo de ensinoaprendizagem. Professor Pesquisador Eis, aí, o papel do professor pesquisador, crítico, transformador, que é aquele que se inquieta diante do desconhecido, do concreto ainda não pensado teoricamente e que investiga, que busca respostas para sua prática, que exercita a práxis (ação-reflexão-ação). A práxis tem um caráter intencional e não se refere a qualquer prática, mas uma prática pensada, fundamentada. Na práxis: Está contida a teoria por se tratar de uma prática de um ser consciente — o que equivale a dizer que se trata de uma prática dirigida por finalidades que são produtos da consciência; finalidades estas que para se efetivarem exigem um mínimo de conhecimento. O professor crítico, progressista não fica aprisionado ao “mito do porto seguro”, nem a uma única resposta sobre um determinado fato, fenômeno estudado. Ele indaga mais e responde menos, instiga o pensamento crítico do aluno, provoca a reflexão, a dúvida, administra os conflitos e não os evita; aponta as contradições sociais, adota o método da contradição entre o que se discursa academicamente e o que se vive, de fato; a metodologia contextualizada que: [...] nasce e renasce da situação didática em desenvolvimento, de uma situação didática específica que envolva (em termos de proximidade) a totalidade das contradições, da problematicidade do mundo educacional e do mundo social [...] a contradição é, sem dúvida, o elemento gerador que leva a ação didática a proporcionar a assimilação crítica e criativa do conhecimento e à elaboração de conhecimentos em situações didáticas específicas e às manifestações [...] a elaboração do conhecimento é relevante para toda e qualquer situação didática, uma vez que está diretamente ligada a sua própria possibilidade dialética de promover mudanças na realidade que gerou a situação de contradição e sua subsequente superação, em face do aparecimento de novos fenômenos de natureza instrucional, educacional, política, social, cultural e econômica. Prática Pedagógica A prática pedagógica pressupõe uma relação teórico-prática, pois a teoria e a prática encontram-se em indissolúvel unidade, e só por um processo de abstração podemos separá-las. Em outras palavras, separadas quando o professor disserta um conhecimento como verdade absoluta, não incluindo o aluno no processo de aprendizagem, determinando de fora para dentro, sem endereço, sem contexto. Como atividade humana, a prática pedagógica pode se constituir em atividade de prática, em uma visão utilitarista, imediatista, ativista, espontaneísta e pragmatista, com um fim em si mesmo, tomando como referência exclusivamente a própria prática ou em uma práxis guiada por intenções conscientes. De um lado, temos uma prática pedagógica repetitiva que o professor reproduz ano após ano e não se questiona e, de outro lado, temos a prática reflexiva. Prática pedagógica repetitiva A unidade teoriae prática é rompida, a fragmentação do conhecimento encontra espaço para efetivar-se, havendo dificuldades para a introdução do novo. Nesse terreno, a prática do professor vai se efetivando na estagnação, na continuidade de uma mesma ação, mecanizada, burocratizada, formal, o que poderá leva-lo à alienação do seu trabalho e de seus pares, parceiros de aprendizagem, correndo-se o risco de não se reconhecerem no que realizam. Prática reflexiva É aquela enunciada por Paulo Freire (1975, p. 9): “Ninguém educa ninguém, como tampouco ninguém se educa a si mesmo: os homens se educam em comunhão, mediatizados pelo mundo”. Tendências progressistas A prática pedagógica reflexiva tem como pontos de partida e chegada a prática social, tendo como preocupação produzir mudanças qualitativas e, para isso, procura-se munir-se de um conhecimento crítico e aprofundado da realidade. Caracteriza-se como fonte e geradora de novos conhecimentos. Dentro dessa perspectiva, expomos a seguir as três tendências progressistas: Libertadora Década de 1960; Libertária Década de 1980; Crítico social dos conteúdos. Trataremos de cada uma delas a seguir... Libertadora: Década de 1960 Esse modelo de Pedagogia tem Paulo Freire (1921-1997) como referência, considerado um dos maiores educadores brasileiros do século XX. Para esse pensador, a educação deve ser instrumento de libertação do estado de opressão. Ele defende uma prática educativa transformadora, fundada na ética, no respeito à dignidade e à própria autonomia do educando. Nas condições de verdadeira aprendizagem, os alunos vão se transformando em reais sujeitos da construção e da reconstrução do saber ensinado, ao lado do educador, igualmente, sujeito do processo. Atenção · Nessa linha de pensamento, o professor deve incentivar a curiosidade, a liberdade de expressão, a criatividade, o pensamento crítico através da pesquisa; viver e aprender com o diferente, criar possibilidades e saber escutar; · Nesse modelo, o professor deve dialogar sobre a negação do próprio diálogo. Ensinar exige a convicção de que a mudança é possível. A prática pedagógica deve ser problematizadora e dialógica; levar o sujeito à reflexão sobre o mundo, a reconstrução crítica do mundo. É um ato de criação que se estabelece entre aluno e professor. O diálogo deve ser autêntico. Paulo Freire é adepto do método da conscientização, da humanização, da politização. Acredita que a educação é uma prática libertadora. Através da educação, o homem pode criar sua possibilidade de ser livre, de romper com o estabelecido, com a ordem atual. Sem um trabalho pedagógico libertador, sem o reconhecimento do outro, encontramos homens oprimidos na luta para serem opressores e não para reverter uma situação histórica, de dominados e dominantes. Comentário O autor cita, em sua obra literária, o exemplo da Reforma Agrária onde os camponeses que se tornam capatazes passam a ser mais duros que seus antigos opressores. Isso significa dizer que a situação concreta vigente de opressão não foi transformada. O oprimido passa a ser assim porque tem introjetado nele o opressor. Um homem novo deve se libertar desse ciclo vicioso de opressor e oprimido. O oprimido acomodado, adaptado, conformado teme a liberdade, enquanto não se sente capaz de correr o risco de assumi-la. O homem novo, para Paulo Freire, é aquele que consegue, através da incessante busca, transformar uma realidade social, é aquele que se liberta em comunhão, nutrindo-se do amor à vida e não à morte (violência). Importante ressaltar que a opressão não ocorre apenas no contexto escolar, na relação aluno-professor e sim em todos os setores da sociedade, tais como saúde, transporte, segurança, ou seja, em diversas situações do nosso cotidiano. A educação libertadora teria como função formar cidadãos conscientes de seus direitos e deveres, despertando nos alunos o desejo de intervenção social a partir das inquietações que fazem com que saíamos do lugar, da zona de conforto. 01 Sobre a pedagogia libertadora de Paulo Freire, importante salientar que não se trata, apenas, de ficarmos no senso comum, no saber popular, mas, articulá-lo ao saber científico, partindo de temas geradores e fazendo a “ponte” entre escola e sociedade; 02 “Quem ensina aprende ao ensinar e quem aprende ensina ao aprender” (p. 25). Sua proposta de ensino volta-se para a necessidade de estabelecer intimidade entre os saberes curriculares (conhecimento científico / propedêuticos) e os saberes dos alunos (conhecimento espontâneo); 03 Para Freire, a história é um tempo de possibilidades, portanto, não deve ser compreendida como determinada e acabada. Alunos e professores são sujeitos ativos que fazem história e não simplesmente passam por ela. Exemplo de prática respaldada na pedagogia libertadora Situação do cotidiano escolar... Os alunos estão estudando sobre alimentação, sobre a importância das frutas para o funcionamento do organismo, quando ocorre uma pergunta:— “Professora, o que acontece se você comer manga e depois tomar leite?”— “Minha mãe dizia que comer manga e depois tomar leite fazia mal. Ela até conheceu um rapaz que morreu por isso. Pode até ser que não faça mal, mas eu não arrisco”. Atenção Como se vê, a partir do diálogo entre aluno e professor, a finalidade é partir do óbvio, segundo Freire e devolver de forma científica, desvelando-se os fatos, desocultando realidades. Libertária: Década de 1980 O modelo da pedagogia libertária não se afasta muito do modelo libertador. Não é à toa que foi classificado também como progressista, na medida em que seus representantes criticam todas as formas de autoritarismo, impessoalidade, formalidade e distanciamento. Na tendência libertária, há um sentido expressamente político, à medida que se afirma o indivíduo como produto do social e que o desenvolvimento individual somente se realiza no coletivo. Essa corrente foi pensada com a intenção de incentivar a participação grupal em assembleias, conselhos, eleições, reuniões, associações, grêmios, DCE, DA(s), de tal forma que o aluno, uma vez atuando nas instituições externas, levará para a escola tudo o que aprendeu. A ideia básica da pedagogia libertária é introduzir modificações institucionais, a partir dos níveis subalternos que, em seguida, vão contaminando todo o sistema. Quanto aos conteúdos de ensino, eles estariam presentes a partir das disciplinas, mas, não seriam exigidos. Importante é o conhecimento que resulta das experiências vividas pelo grupo, especialmente a vivência de mecanismos de participação crítica (LIBÂNEO, 1987). Célestin Freinet (1896-1966) Entre 1921 e 1924, Célestin Freinet pensou em práticas pedagógicas que pudessem originar atividades de aula voltadas para os interesses dos alunos. A Pedagogia de Freinet influencia, até os dias de hoje, diversas escolas no mundo, incluindo as brasileiras. As suas ideias são marcadas por alguns pressupostos básicos, dentre os quais: 01O desenvolvimento do senso de responsabilidade dos alunos; 02 O desenvolvimento do respeito e da cooperação entre alunos, professores e funcionários e; 03 A preocupação com a socialização do grupo e o desenvolvimento do julgamento, da autonomia pessoal, da expressão livre de ideias, da criatividade, da comunicação, da reflexão crítica e da afetividade entre todos que convivem no ambiente escolar. A pedagogia proposta por Freinet, diz que: 1 As notas e as classificações atribuídas aos alunos se constituem como um erro no sistema de ensino. 2 Os professores devem falar o menos possível; possibilitando mais a fala dos alunos. 3 A ordem e a disciplina são necessárias, mas não devem ser impostas, mas sim, discutidas e votadas democraticamente pelo grupo. 4 A vida escolar supõe cooperação e gestão e a democracia não é um conceito que se aprende, mas sim, que se vivencia na escola. Para Freinet o regime autoritário (tanto nas escolas, como na vida) não é capaz de formar cidadãos democratas. Assim, uma das primeiras condições para a renovação das escolas deveria estar relacionada ao respeito às crianças que, por sua vez,deveriam respeitar os professores e os funcionários. Aula Passeio Seu objetivo principal era motivar os alunos para a construção de novos conhecimentos em um ambiente não escolar Texto livre e correção Partiam da livre expressão, podendo ser realizada através de desenhos, poemas, textos ou pinturas. Os alunos estabeleciam a forma, o tema e o tempo para sua realização. Porém, caso um aluno desejasse publicar seu texto no jornal escolar, ele deveria passar pela correção coletiva e pela autocorreção, pois para Freinet o "erro" deveria ser trabalhado com e pelo os alunos. Imprensa escolar Partiam de entrevistas, pesquisas, vivências e aulas passeio. Freinet utilizou o tipógrafo para o processo de impressão do jornal escolar em construção coletiva Livro da vida Funcionava como um diário de classe, onde se registrava, livremente, os diferentes modos de compreender a aula e a vida. Fichário de Consulta Freinet criticava duramente os livros didáticos por estarem desvinculados da realidade dos alunos. Ele propôs a elaboração de exercícios e apostilas construídos pelos professores, em parceria com os alunos, destinados à aquisição dos mecanismos de Cálculo, Ortografia, Gramática, História e outros conteúdos das diversas áreas do conhecimento. Plano de trabalho O currículo escolar é seu ponto de partida, os alunos deveriam escolher as estratégias das atividades que poderiam ser realizadas em grupos, duplas ou individualmente. E, para o registro do plano de trabalho, deveriam ser elaboradas fichas com as atividades semanais. Correspondência interescolar Atividade que permitia a correspondência entre os alunos da própria escola e entre alunos de escolas diferentes Autoavaliação Os alunos registravam os resultados dos trabalhos em fichas, permitindo o acompanhamento dos seus progressos e de suas dificuldades. Para Freinet, a avaliação deveria ser um processo contínuo entre professores e alunos na perspectiva da aprendizagem e não da punição Maurice Tragtenberg (1929-1998) Através de uma crítica incisiva ao modelo pedagógico burocrático, Tragtenberg chega à teoria da pedagogia libertária, que se expressa pelo questionamento de toda e qualquer relação de poder estabelecida no processo educativo e das estruturas que proporcionam as condições para que essas relações se reproduzam no cotidiano das instituições escolares. Em sua visão, a própria prática de ensino pedagógica-burocrática permite a dominação na medida em que reduz o aluno ao papel de mero receptáculo de conhecimento e fixa uma hierarquia rígida e burocrática na qual o principal interessado encontra-se em uma posição submissa. E nessa ordem o professor é o ‘símbolo vivo’ da dominação. Em resposta a tudo isso, a pedagogia libertária propõe uma série de mudanças nas instituições de ensino, fundadas na: · Autogestão da educação pelos diretamente envolvidos no processo educacional e a ‘devolução do processo de aprendizagem às comunidades onde o indivíduo se desenvolve (bairro, local de trabalho)’; · Autonomia do indivíduo, solidariedade, crítica permanente de todas as formas educativas que estimulam ou fundamentem-se na competição e incentivo a liberdade de organização para os trabalhos da educação. Miguel Arroyo Formado em Ciências Sociais pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) é doutor em Educação pela Stanford University na Califórnia, além de ser professor titular emérito da Faculdade de Educação da UFMG. Para esse estudioso, a educação não se limita apenas a aprender as coisas, mas, sobretudo, a aprender a conhecer a si mesmo. Diante dessa perspectiva, a escola deve garantir o direito à humanidade de jovens e crianças. Para que essa ação seja efetivada, faz-se necessária uma participação ativa do gestor, por sua vez, discutindo os direitos dos estudantes em sala de aula. Para o educador, a escola é um espaço de aprendizagem e liberdade de atuação dos estudantes. Por isso, o professor deve respeitar o pensamento e a opinião dos alunos com relação aos conteúdos didáticos, assim como, ajudá-los a desenvolverem a consciência crítica. Exemplo de prática respaldada no modelo pedagógico libertário A modalidade de ensino a distância também pode ser um exemplo de prática libertária, pois o aluno é gestor do seu próprio conhecimento, escolhendo o seu próprio caminho. Os conteúdos estão dispostos: · Aulas teletransmitidas; · Conteúdos onlines; · Textos; · Vídeos; · Fóruns; · Gabarito comentado; · Dúvidas comentadas; · Livro proprietário; · Avaliando aprendizado; · Etc. Os alunos da graduação acessam o que for de mais interesse; rompendo com a linearidade do processo. Crítico social dos conteúdos Na tendência crítico-social dos conteúdos (Saviani, Snyders, Makarenko, Libâneo, Luckesi), a ideia é difundir os conteúdos escolares concretos, porém, indissociáveis da realidade social do aluno. O conteúdo teórico deverá ser vinculado à prática, para que o aluno veja sentido no que está aprendendo, podendo lhe ser útil em sua prática imediata/social, útil em sua vida; e a partir daí, introduzir a possibilidade de uma reavaliação crítica frente aos conteúdos sistematizados e aprendidos. Significa ligar o conteúdo à experiência concreta do aluno. Sugestão de aplicação dessa abordagem: iniciar a aula tratando de uma temática de ensino e articular a prática. Exemplo de prática respaldada no modelo pedagógico crítico social dos conteúdos Ao apresentar o assunto sobre avaliação escolar para uma turma de licenciandos, o professor solicita aos alunos do curso de formação docente que relatem situações vivenciadas em anos anteriores de escolaridade sobre provas, exames, avaliações sofridas/ocorridas. A ideia é confrontar a experiência com a explicação teórica do professor sobre o assunto avaliação, neste caso. Isso significa ir da ação, do particular, da prática, à compreensão geral, teórica; e da compreensão geral, teórica à ação (do particular para o geral e do geral para o particular), unificando teoria e prática. Vejamos uma cena do filme Escritores da Liberdade que se relaciona com o conteúdo que estamos estudando: Percebeu como o professor é o mediador entre o conhecimento científico e espontâneo? Professor e aluno colaboram para fazer progredir essas trocas. O professor intervém para que o aluno acredite nas suas possibilidades de ir mais distante. Assim, o professor está formando a consciência crítica face às realidades sociais, sendo aluno e professor, agentes ativos da transformação da sociedade e de si próprio. Os conteúdos escolares — fundamentais para as transformações das condições de vida das classes desfavorecidas — devem ser desenvolvidos pelos professores de forma responsável e comprometida. Não se trata de sonegar o conhecimento científico por acreditar que o aluno não seja capaz de compreendê-lo. Para a formação do pensamento elaborado e complexo a ação docente deve seguir os seguintes passos: 1 Criar situações motivadoras que instiguem o pensamento crítico. 2 Colocar os assuntos desenvolvidos de forma clara e objetiva. 3 Relacionar os conhecimentos produzidos no decorrer das aulas aos saberes dos alunos, propondo um roteiro de trabalho que contenha desafios significativos. 4 Desenvolver operacionalmente atividades, como: pesquisas, estudos individuais e em grupos, seminários e exercícios. 5 Integrar os movimentos de análise, síntese, generalização e consolidação dos conceitos desenvolvidos em aula. Por fim, é preciso ressaltar que a teoria crítica social dos conteúdos deve partir da avaliação das circunstâncias histórico e sociais dos alunos, que determinam o desenvolvimento e a aquisição de novos conhecimentos e práticas pedagógicas, tendo em vista os objetivos de ensino que motivem as verdadeiras mudanças sociais. A valorização da escola como instrumento de apropriação do saber é o melhor serviço que se presta aos interesses populares, já que a própria escola pode contribuir para eliminar a seletividade social e torná-la democrática. Se a escola é parte integrante do todo social, agir dentro dela e também agir no rumo da transformação dasociedade. Se o que define uma pedagogia crítica é a consciência de seus condicionantes histórico-sociais, a função da pedagogia dos conteúdos é dar um passo à frente no papel transformador da escola, mas, a partir das condições existentes. Assim, a condição para que a escola sirva aos interesses populares é garantir a todos um bom ensino, isto é, a apropriação dos conteúdos escolares básicos que tenham ressonância na vida dos alunos. Libâneo (1987, p. 39) Sistematizando informações sobre os modelos pedagógicos estudados Libertador Libertário Crítico social dos conteúdos Papel da escola Conscientização acerca da realidade, transformação da sociedade. Exercer uma transformação da personalidade dos alunos em um sentido libertário e autogestionário. Difundir os conteúdos concretos, indissociáveis das realidades sociais. Valorização da apropriação do saber científico, articulado ao saber da prática, servindo aos interesses populares, visando à transformação social. Organização da escola Autoridade competente e democrática. Democrática, participativa, de qualidade, Igualitária, plural. Democrática, participativa, de qualidade, Igualitária, plural. Professor É o transmissor dos conteúdos aos alunos. Autoridade democrática. Autoridade democrática. Aluno: Livres, autodisciplinados. Aluno Sujeito protagonista da história. Livres, autodisciplinados. Livres, autodisciplinados. Relação aluno-professor Igualitária, não paternalista. Baseada no respeito mútuo, visando objetivos comuns. Relação democrática. Pressupostos de aprendizagem Educação como transformação Social. Aprendizagem informal, via grupo (ex.: diretórios acadêmicos, sindicatos etc.) Aprender é desenvolver a capacidade de processar informações, organizando os dados disponíveis das vivências. O ensino consiste na preparação do aluno para o mundo adulto e suas contradições, fornecendo-lhe um instrumental para a participação ativa e organizada na sociedade. Objetivos educacionais Definidos a partir da realidade concreta, do contexto histórico-social no qual se encontram os sujeitos; visão crítica de mundo; libertação da opressão. Autogestão, construção de uma nova ordem social. Construção de uma nova ordem social a partir do conhecimento científico. Conteúdos escolares/programáticos Temas geradores extraídos da problematização da prática de vida dos alunos. A matéria está disponível, mas não é exigida. Culturais e universais, que se constituíram em domínios do conhecimento incorporados pela humanidade, mas, permanentemente reavaliados face às realidades sociais. Método Da conscientização, da polemização, da problematização, grupo de discussão, da confrontação, dialógica, dialética. Teoria e prática. Temas geradores. Vivência grupal, tomada de decisões, votações. Privilegia a aquisição de um saber, vinculado à compreensão da realidade. Articulação teoria e prática. Escola e sociedade. Conteúdo e forma. Avaliação Visa à superação do estágio do senso comum (“desorganização” do conteúdo) para a consciência crítica. Participação. Assistemática. Reflexivas, contextualizadas. Aula 5: Planejamento no campo da educação Planejamento no campo da educação: níveis de planejamento e seus fundamentos Diferentes instâncias Todo planejamento envolve definir metas; incluir parâmetros e refletir princípios educacionais que sejam capazes de orientar o processo de formação humana, ter relação com a sociedade e com que projeto de homem se pretende formar. Podemos dizer que planejar é estudar, é assumir uma atitude séria e curiosa diante de um problema. Diante de um problema devemos procurar refletir para decidir quais as melhores alternativas de ação possíveis para alcançar determinados objetivos a partir de certa realidade. Imaginar o futuro, antever o próximo passo, pensar antes de agir, é uma atividade que expressa a racionalidade humana. O planejamento se preocupa com “para onde ir” e quais as maneiras adequadas de se chegar lá, tendo em vista a situação presente e as possibilidades futuras. Planejamento no campo educacional No campo da educação, temos os seguintes níveis de planejamento: educacional, curricular e de ensino. Vamos compreender cada um desses níveis? Planejamento Educacional “Consiste na tomada de decisões sobre a educação no conjunto do desenvolvimento geral do país. A elaboração desse tipo de planejamento requer a proposição de objetivos a longo prazo que definam uma política da educação” (PILETTI, 2004, p.62). É aquele que se desenvolve em um nível mais amplo de um país ou região, estando a cargo de especialistas e autoridades educacionais no âmbito do Ministério da Educação, dos Conselhos de educação e dos órgãos específicos relacionados a cada segmento de ensino. Estamos nos referindo às secretarias de educação estaduais e municipais. É o planejamento de políticas públicas em educação, referentes aos planos de governos sobre os princípios que devem nortear as práticas educativas e as ações programadas, seja por nível de ensino (educação infantil, ensino fundamental, ensino médio, ensino superior ou pós-graduação) ou nível de atuação/abrangência nacional, estadual e municipal. Nesse sentido, o planejamento educacional de um país será sempre fruto de variadas tensões: diferentes grupos sociais irão discutir e tentar definir as políticas públicas para a educação. Um Estado democrático deve possibilitar e estimular essa participação de diferentes grupos na definição de políticas públicas. Planejamento Curricular Refere-se aos planos desenvolvidos por instituições educacionais que deverão tomar como base os órgãos governamentais para elaborar e executar suas propostas pedagógicas, implicando na definição de conteúdos, carga horária, tipos de atividades, e obedece às orientações das Diretrizes curriculares. Para Piletti (2004, p. 62) “o problema central do planejamento curricular é formular objetivos educacionais a partir daqueles expressos nos guias curriculares oficiais. A escola não deve simplesmente executar o que é prescrito pelos órgãos oficiais. Embora o currículo seja mais ou menos determinado, cabe à escola interpretar e operacionalizar estes currículos. A escola deve procurar adaptá-los às situações concretas selecionando aquelas experiências que mais poderão contribuir para alcançar os objetivos dos alunos, das suas famílias e da comunidade”. Porém, será que a escola, representada por seus profissionais conseguem resgatar a autonomia e garantir a sua identidade? Planejamento de Ensino Para Piletti (2004, p. 62), o planejamento de ensino “é a especificação do planejamento curricular. Consiste em traduzir em termos mais concretos e operacionais o que o professor fará em sala de aula para conduzir os alunos a alcançar os objetivos educacionais propostos”. Podemos dizer também que é aquele planejamento desenvolvido por educadores/professores no âmbito de suas atividades. Tem relação direta com o fazer docente, pois ao assumir uma disciplina, um professor precisa tomar uma série de decisões tendo como base o planejamento curricular para elaborar seu planejamento de ensino e seus planos de aula. A importância do planejamento Parece que não há mais dúvidas quanto à importância do ato de planejar, independente da instância, porém, no que diz respeito ao planejamento de ensino, há que se dizer que muitos professores lidam com ele como se fosse apenas uma tarefa burocrática, não tomando essa tarefa como uma oportunidade de reflexão sobre o sentido da prática, de educar e do aprendizado. Normalmente, isso ocorre com professores que fazem de sua aula mera reprodução de conhecimentos; ficam aprisionados ao livro didático e tomam aqueles conteúdos como única possibilidade, repetindo o que foi construído por outra pessoa. Estando o material todo pronto, basta repassá-lo. Então, pra que planejar? Qual é o papel do planejamento se já está tudo pronto e não se reconhece a possibilidade de se fazer diferente porque se acredita que não há mais nada a fazer? O que falta a esse professor para transformaro que está posto, para romper com o determinismo técnico? Que competências são necessárias ao professor para que sua prática seja transformadora? Para transformar é preciso um pé no sonho e outro na realidade e um bocado de ousadia louca. Paulo Freire, 1976. Ele entendia que o ato educativo é uma atividade intencional, orientada por determinados interesses, visões e valores. Nesse sentido, envolve uma tomada de posição, é um ato político-ideológico. Pretende, a partir de uma realidade vivida construir a realidade desejada. Mas sabemos que muitos professores ficam reféns dos planejamentos propostos pelas instituições de ensino, se submetendo a mera execução. Esse professor não interiorizou ainda o papel de pesquisador que é aquele que constata fatos, realidade, o que está posto e, apenas, a reproduz mecanicamente; não a transformando. Uma das grandes, se não a maior tragédia do homem moderno, está em quem é hoje dominado pela força dos mitos e comandado pela publicidade organizada, ideológica ou não, e por isso vem renunciando cada vez, sem saber, à sua capacidade de decidir [...] e, quando julga que se salva seguindo as prescrições, afoga-se no anonimato nivelador da massificação, sem esperança e sem fé, domesticado e acomodado... Já não é mais sujeito, rebaixa-se a puro objeto. Paulo Freire, 1976, p. 43. Menegolla e Sant’anna (1997, p.19) assinalam que “o ato de planejar sempre parte das necessidades e urgências que surgem a partir de uma sondagem sobre a realidade”. Ainda que iniciemos nossas aulas com uma proposta educativa, consistente, organizada, estudada, articulada ao projeto pedagógico da escola, há que se considerar que é através do conhecimento da realidade que se pode estabelecer o que deve ser focalizado. Sendo assim, o ato de planejar se faz e refaz ao caminhar. O destino do viver faz parte da própria natureza, isto é, ele é determinado e dado pela natureza. Porém, o destino de como viver não é determinação exclusiva, mas, essencialmente, do homem. Menegolla e Sant’anna, 1997, p.23. É necessário um planejamento que dimensione o processo educativo e reconstrutivo do homem. Aí está a possibilidade de uma educação criadora e libertadora que conscientize o homem diante do mundo. Parte inferior do formulário O planejamento e o compromisso sócio-político O planejamento busca um rumo, é uma ação intencional com sentido explícito, com compromisso, porém, deve ser definido e redefinido coletivamente. Deve estar intimamente articulado ao compromisso sócio-político e de acordo com o interesse da população majoritária, ou seja, de todos os membros da comunidade escolar, dentre eles alunos, professores, direção, funcionários, de modo que ao participarem democraticamente de sua elaboração, se sintam retratados e responsáveis com as decisões educacionais. Conforme as palavras de Freitas (1991, p. 23) “tem que nascer no próprio chão da escola”. Na concepção de Veiga (2002) ao se construir um processo democrático de decisões, a preocupação deve voltar-se para a instauração de uma forma de organização do trabalho pedagógico que: supere os conflitos, buscando eliminar as relações competitivas, corporativas e autoritárias, rompendo com a rotina do mando impessoal e racionalizado da burocracia que permeia as relações no interior da escola, diminuindo os efeitos fragmentados da divisão de trabalho que reforça as diferenças e hierarquiza os poderes de decisão (p.13-14). Na prática, significa abrir um espaço permanente de diálogo entre os profissionais da educação, os sujeitos da comunidade escolar, visando à contextualização do ensino, a não dicotomia entre escola e sociedade, não trabalhando, exclusivamente, os conteúdos estabelecidos no currículo obrigatório determinado pelos órgãos superiores governamentais e consequentemente pela escola. Comentário Em outras palavras, estamos convidando os graduandos do curso de formação de professores à reflexão sobre o planejamento como um ato político, cujos contextos, social imediato (a sala de aula) e social mais amplo (a sociedade) deverão ser indissociáveis. Leia sobre Planejamento como ato político. Autonomia docente na escola Mas, como propor uma escola democrática e uma educação transformadora e emancipada aos alunos se o próprio professor não resgata a sua autonomia docente na escola, se o próprio professor não é autor de sua própria prática porque não interiorizou o conceito de autonomia docente? Na visão de Vasconcellos (1995) o planejamento é um excelente caminho para melhoria da qualidade do ensino, pode ser uma estratégia política de lutas, de emancipação do professor, cumprindo um papel social de humanização, onde o aluno cresça como pessoa e como cidadão, e onde o professor tenha um trabalho menos alienado e alienante, que possa repensar sua prática, (re)significá-la e buscar novas alternativas junto com seus alunos. Há uma diferença substancial entre traçar nossos próprios caminhos e reproduzir mecanicamente a prática de “terceiros”, sem noção clara do que se está fazendo. Lopes (1992), por sua vez, indica alguns pressupostos que consideram a dinamicidade do conhecimento escolar e sua articulação com a realidade histórica quando se trata de planejar o ensino. São eles: produzir conhecimentos tem o significado de processo, de reflexão permanente sobre os conteúdos aprendidos buscando analisá-los sob diferentes pontos de vista; significa desenvolver a atitude de curiosidade científica, de investigação da realidade, não aceitando como conhecimentos perfeitos e acabados os conteúdos transmitidos pela escola, ou seja, previstos no planejamento curricular. O currículo e a cultura dos alunos Para Sacristàn (1995), o currículo obrigatório oficial deve ser articulado à cultura vivida e, nesses termos, o autor propõe que o currículo se fundamente no multiculturalismo, no qual os interesses de todos sejam representados. Para torná-lo possível, é necessária uma estrutura curricular diferente da dominante e uma mentalidade diversa por parte dos sujeitos envolvidos no processo educativo: alunos e professores reflexivos e culturalmente comprometidos, conforme sinaliza Canen (1997), além da direção e da comunidade. Essa mentalidade, essa estrutura e esse currículo têm de ser elaborados e desenvolvidos de modo que a escola seja considerada um projeto aberto, no qual caiba uma cultura que respeite a heterogeneidade e seja um espaço de diálogo e de comunicação entre grupos sociais diversos. Trata-se de criar um contexto democrático de decisão sobre os conteúdos de ensino, configurando uma ideia mais ampla e real de escolarização. Na visão de Moreira e Santos (1995) os conteúdos têm de ser vistos como algo a ser questionado, analisado e negociado e não divorciado do significado humano. Leitura Leia mais sobre O currículo e a cultura dos alunos. Planejamento de ensino/didático Vejamos, a seguir, as perspectivas tradicionais e crítica da educação: TRADICIONAL PROGRESSSISTA/CRÍTICA Documento burocrático, formal. Extrapola a simples tarefa de elaborar o documento; envolve reflexão sobre o sentido da prática. Desmistificar (planejar e arquivar) – o engodo do faz de conta (preenchimento de documentos). Mais controle das ações por receio quanto ao alcance dos objetivos educacionais; objetivos definidos e estreitos. Ações mais flexíveis: ampliação dos objetivos educacionais. Conteúdos isolados, estáticos, sistematizados, tratados de forma mais rígida; desarticulação teoria/prática, escola/sociedade. Conteúdos mais dinâmicos, menos sistematizados no quadro; articulação teoria/prática, escola/sociedade. Predomínio da transmissão e assimilação dos conteúdos; ênfase na memorização; relação verticalizada entre aluno e professor; processo ensino-aprendizagem: via de mão única. Predomínio da pesquisa, do pensamento crítico e independência; ênfase na reflexão; relação horizontal entre aluno e professor; processo ensino-aprendizagem: vida de mão dupla. Alunos – Sujeitos passivos no processo ensino-aprendizagem. Alunos – Sujeitos ativos no processo ensino-aprendizagem.Visa ao resultado, à quantidade de informações assimiladas e memorizadas – ênfase nos testes e provas. Visão ao processo, à construção do conhecimento, à formação do aluno – ênfase na avaliação formativa e autoavaliação. Planejamento participativo O planejamento participativo se propõe a romper a lógica hierarquizada e verticalizada de gestão. Ele emerge de estruturas mais horizontais que permitam a fluidez de informações entre todos os participantes, sem fomentar a tradicional separação entre “pensar” e “fazer”, “decidir” e “executar”. Assume que a efetividade de um processo está na capacidade de entender que o poder emana da responsabilidade de cada um e não da posição hierárquica que ocupa na organização. Neste modelo, todos têm um nível de responsabilidade, que se transforma em corresponsabilidade na tomada e execução das decisões. Atenção Diferentes instâncias envolvem diferentes níveis/formas de participação dos agentes envolvidos no projeto educativo que se deseja planejar, seja em nível governamental ou na escola propriamente dita. Especialmente, tratando-se do planejamento participativo na escola, requer abrir espaço para que vozes sejam ouvidas; requer uma mentalidade diferente por parte de alunos, professores, pais, funcionários, comunidade, inclusive os agentes que confeccionam os materiais didáticos como as editoras. O planejamento participativo não dispensa uma coordenação, ao contrário, seu papel será de fundamental importância visto que deverá ser capaz de articular e catalisar os diferentes interesses e perfis existentes no grupo. Seu desafio é estimular a participação construtiva de todos os sujeitos da comunidade escolar e para isso precisa ser incentivadora, dinamizadora e facilitadora do processo de construção coletiva para que as metas definidas sejam alcançadas. Claro que a realização de um planejamento participativo não é uma tarefa fácil, pois exige um comprometimento maior de todos os sujeitos envolvidos com a formação das novas gerações. No entanto, podem existir resistências daqueles que perderão privilégios, medo e insegurança frente às situações desconhecidas. Daí a relevância de uma gestão democrática, com uma definição clara do que se pretende. Fundamental é estudar o contexto onde a escola está inserida, fazer um diagnóstico da realidade, um levantamento das necessidades da clientela. Vejamos algumas especificidades do planejamento participativo: Dificuldades encontradas durante o processo · Carência de objetivos claros e bem definidos; · Exigência de planejamentos sofisticados; · Centralização das decisões e ações; crença de que quem planeja é uma pessoa hierarquicamente acima; · Manutenção das estruturas tradicionais; · Falta de hábito de crítica e autocrítica; medo, resistência; · Falta de habilidade para focalizar necessidades presentes e futuras; · Carência de recursos humanos e materiais; · Ausência do diálogo. Requisitos · Criatividade; · Vontade e ousadia; · Tempo para que vozes sejam ouvidas; · Recursos; · Flexibilidade; · Bom senso para definir prioridades; · Disponibilidade para enfrentar os problemas da comunidade escolar; · Gestão democrática. Riscos · Manipulação — tendo em vista decisões que são tomadas em nome de interesses individuais, daí a relevância da formação ética; · Alienação — sobretudo, daqueles que resistem à participação, ao novo por medo e insegurança. Aula 6: Planejamento didático e os objetivos educacionais Os objetivos educacionais são necessários? Diferentes concepções de aprendizagem e de ensino vão dar diferentes valores aos objetivos educacionais. Muitos educadores questionam a necessidade de se discriminar objetivos em educação. Alguns associam a uma concepção tecnicista de educação, decorrente da “influência dos educadores norte-americanos sobre a educação brasileira” (Gil, 2011). Os professores creem que o planejamento e a formulação de objetivos estariam relacionados a uma perspectiva autoritária de ensino, tecnicista, em que os professores (detentores de poder) almejam controlar os processos pedagógicos e conformar o comportamento dos alunos segundo interesses do mercado, garantindo assim a reprodução, a manutenção do status quo. Outros consideram que as práticas educacionais estão acima da definição de objetivos. Elas acontecem e promovem aprendizagens independentemente das “vontades explícitas” dos sujeitos envolvidos e, assim, não há sentido em se gastar tempo com isto. Delimitando objetivos Você se lembra da situação da professora Carolina e da aluna Mariana na aula 3? A professora Carolina delimita em seu roteiro de aula sobre a Europa o seguinte objetivo: identificar as capitais dos países europeus. Os alunos deverão dar conta desse objetivo através da ação identificar; o que faz do objetivo ser considerado comportamental. Durante a explanação da professora Carolina sobre os países europeus, Mariana, sua aluna, apresenta um cartão postal da Torre Eiffel e a professora solicita a estudante para guardar o cartão, pois não estaria tratando dos pontos turísticos em sua aula. Note que, de fato, trata-se da aula da professora: “em sua aula”, pois, aprisionada ao determinismo técnico, não admite novas possibilidades, impondo uma ideologia dominante no sentido de que ela, a professora, é “dona” da aula e, por conta disto, ela decide o que o outro deve aprender. Reflita: uma postura como essa é necessária? Comentário A postura autoritária está de acordo com os modelos liberais de ensino tradicional ou tecnicista, em que o aluno não tem o direito de questionar o que está posto, ou a construir uma nova ordem social, tendo que se enquadrar no sistema vigente e adaptar-se a este. Com isso, questiona-se o papel da escola e a formação do sujeito, pois este não estaria sendo preparado, nessas perspectivas pedagógicas, para exercitar a cidadania crítica, para questionar os fatos e a realidade. O aluno estaria sendo formado para aceitar os fatos como inexoráveis, garantindo assim a reprodução da estrutura social vigente. Segundo essa lógica, se estamos inseridos em uma sociedade capitalista, marcada pela competitividade, pelo individualismo, pelo imediatismo, assim permaneceríamos; formados exclusivamente pela lógica do capital, do mercado. Formação para o mercado de trabalho Alguns podem perguntar: Não precisamos formar as novas gerações para o mercado de trabalho? Sem dúvida nenhuma, responderíamos que sim; este é um dos objetivos da escola. Contudo, é preciso desenvolver, aqui, certa sensibilidade para compreender o que está por trás dos fatos e desenvolver uma visão crítica sobre o sentido da educação. Precisamos cuidar da formação do sujeito, no sentido de não empobrecermos o papel da escola ao limitarmos a mesma exclusivamente à lógica do mercado de trabalho, de modo que o cidadão acredite que o capitalismo triunfou ou de modo que ele acredite ser o único responsável pelo seu sucesso ou fracasso escolar e na vida, como se não tivesse mais nada a fazer. Sendo assim, o desafio imposto à docência está em irmos além da formação técnica; em ultrapassarmos o modelo reprodutivista. Assim, contribuiremos para que os educandos se sintam capazes de construir um novo cenário social. Mas, para que nos aproximemos desse objetivo educacional mais amplo, nós profissionais da educação devemos não superdimensionar os objetivos menores, específicos, comportamentais, imediatistas, com finalidades meramente utilitaristas. O caminho do sucesso Precisamos querer mais para as novas gerações, que se formem capazes de corresponder às demandas sociais atuais, mas que busquem a emancipação social, o protagonismo da história. Isso também não significa que não tenhamos que perseguir os objetivos específicos, mas que não se percam de vista os objetivos mais nobres, ou seja, o “salto na qualidade”. Portanto, retomando o questionamento inicial, se os objetivos educacionais são necessários, parece que não há mais dúvidas quanto a isso, uma vez que oferecem ao professor um norte, uma direção. Entretanto, que não sejam delimitados em demasia, impedindoque novas construções, novos saberes e competências surjam no processo de aprendizagem até então não pensados pelo professor ao elaborar seu plano didático. Objetivos educacionais Vamos ver o que pensam alguns autores sobre os objetivos educacionais, suas definições e classificações quanto ao nível de especificação e quanto ao domínio. 1 Nelson Piletti É a descrição clara do que se pretende alcançar como resultado da nossa atividade [...] os objetivos educacionais são as metas e os valores mais amplos que a escola procura atingir (Piletti, 2004, p. 65). 2 Bloom A formulação de objetivos tem por finalidade classificar para o professor, em sua própria mente, ou comunicar a outros as mudanças desejadas no aprendiz (Bloom, 1973). Saiba mais O comportamento O que Piletti e Bloom dizem são formulações explícitas das mudanças que se espera que ocorram nos alunos mediante o processo educacional, isto é, mudanças que ocorram no pensamento, no sentimento e nas ações dos alunos. Em outras palavras, os objetivos de ensino devem se referir aos comportamentos que os alunos, e não o professor, devem apresentar. Para fins de cumprimento burocrático, ao elaborarmos nosso plano didático, é comum listarmos os objetivos iniciando com uma ação, isto é, com um verbo no infinitivo, com as terminações ar, er, ir e or. Plano didático burocratizado Vamos imaginar uma aula intitulada DSTs – doenças sexualmente transmissíveis, cujos objetivos comportamentais são: · Identificar as DSTs; · Diferenciar formas de tratamento. Ressalta-se que, se o professor respaldar a prática nos modelos tradicional e tecnicista, ele tenderá a perseguir apenas esses dois objetivos. Plano didático contextualizado Já um professor que respalda a prática na pedagogia progressista admitirá que outros objetivos surjam no caminho, rompendo com a fragmentação e isolamento do conhecimento, sendo o conteúdo tratado de forma contextualizada. Nesse caso, o aluno é levado em consideração e seus saberes são legitimados no processo de aprendizagem, ou seja, o currículo disciplinar é articulado ao currículo real, vivido. Comentário Consciência do professor Os objetivos de ensino devem estar relacionados e ser complementares, explícitos, significativos, relevantes, levando-se em conta o tempo e os recursos disponíveis. Sobretudo, o professor deve ter a consciência sobre o que pretende para os alunos, por que pretende, que tipo de formação deseja para os alunos e que tipo de sociedade deseja ajudar a construir, o que se refletirá em seu fazer docente. Objetivos educacionais intencional e sistemática Sobre os objetivos educacionais, Libâneo (2013) assinala que a prática educacional se orienta, necessariamente, para alcançar determinados objetivos, por meio de uma ação intencional e sistemática. 01 Os objetivos educacionais expressam, portanto, propósitos definidos explícitos quanto ao desenvolvimento das qualidades humanas que todos os indivíduos precisam adquirir para se capacitarem para as lutas sociais de transformação da sociedade; 02 O caráter pedagógico da prática educativa está, precisamente, em explicitar fins e meios que orientam tarefas da escola e do professor para aquela direção; 03 A elaboração dos objetivos pressupõe, da parte do professor, uma avaliação crítica das referências que utiliza, balizada pelas suas opções em face dos determinantes sociopolíticos da prática educativa. Assim, o professor precisa saber avaliar a pertinência dos objetivos e conteúdos propostos pelo sistema escolar oficial, verificando em que medida estes atendem a exigências de democratização política e social. Deve também saber compatibilizar os conteúdos com necessidades, aspirações e expectativas da clientela escolar, bem como torná-los exequíveis face às condições socioculturais e de aprendizagem. Quanto mais o professor tiver consciência sobre o seu papel diante da sociedade, mais capaz ele será de fazer correspondência entre os conteúdos que ensina e sua relevância social, frente às exigências de transformação da sociedade presente e diante das tarefas que cabe ao aluno desempenhar no âmbito social, profissional, político e cultural. Os objetivos educacionais são, pois, uma exigência indispensável para o trabalho docente, requerendo um posicionamento ativo do professor em sua explicitação, seja no planejamento escolar, seja no desenvolvimento das aulas. Classificação dos objetivos educacionais Quanto ao nível de especificação/abrangência: Objetivos gerais São mais amplos, alcançados em médio e longo prazo, mas abstratos, refletindo uma filosofia de educação; ou seja, consistem na nossa contribuição na formação do sujeito. Objetivos específicos São mais precisos, concretos, alcançados em curto prazo, imediatistas, operacionais, instrucionais. Objetivos educacionais específicos e gerais Sobre os objetivos educacionais específicos e gerais, ressalta-se que, normalmente, na aula em si, o professor dá conta dos objetivos específicos e, ao término do período letivo, alcança o objetivo geral. Entretanto, sabemos que isso não é tão simples assim, pois o fato de o professor se preparar pedagogicamente não significa que conseguirá dar conta dos objetivos, sejam eles específicos ou gerais. Pedagogia progressista Se o professor respaldar a prática na pedagogia progressista, ele perseguirá na aula os objetivos específicos, mas não perderá de vista o “salto na qualidade” a que já nos referimos nesta aula. Ou seja, ele perseguirá os objetivos menores, específicos, mas levará seus alunos à reflexão sobre o sentido de aprender tal conteúdo. Pedagogia tradicional Já o professor tradicional, tecnicista ficará aprisionado ao objetivo específico, cometendo exageros por este e, com isso, não contribuirá para uma formação mais crítica, ampla e consciente. Quanto ao domínio Cognitivo/ intelectual Quando o aluno apresenta o domínio da matéria, quando está em dia com os conteúdos de ensino. Para Piletti (2004, p. 32) Abrange a aquisição de informações e conhecimentos. Pode ser uma simples informação sobre os fatos ou suas interpretações, com base em conceitos, princípios e teorias. Afetivo / humanístico Diz respeito aos sentimentos e emoções. Aprender a apreciar o belo através das obras de artes é uma aprendizagem afetiva. A aprendizagem afetiva tem uma série de implicações pedagógicas. Ela é decorrência do clima da sala de aula, da maneira de tratar o aluno, do respeito e da valorização da pessoa do aluno (Piletti, 2004). Psicomotor Consiste na aprendizagem de hábitos que incluem desde habilidades motoras, como aprender a andar e a dirigir um automóvel, por exemplo, até habilidades verbais e gráficas, ou seja, aprender a falar e a escrever (Piletti, 2004). Sobre esse domínio, podemos acrescentar: aprender a dissecar um animal, fazer uma massa de pão, preparar uma horta, a manusear o computador etc. Aqui, surge um questionamento: será que estamos tratando do modelo escolanovista, do aprender fazendo, “colocando a mão na massa”? Será que estamos tratando do pragmatismo? A razão da aprendizagem Comentário Qual o sentido de apreciarmos uma obra de arte? Certamente há um forte sentido nessa ação, mas cabe ao professor de arte, por exemplo, desvelar isso para o aluno, deixando claro em que esse aprendizado poderá representá-lo na sociedade. Ocorre que os professores mais conservadores provavelmente não sabem responder sobre o sentido do aprendizado porque não aprenderam os porquês; simplesmente reproduzem práticas da mesma forma que aprenderam ou porque consta no livro didático do professor que assim devam proceder. Desenvolver a afetividade sem dúvida nenhuma é louvável, pois contribuiríamos para que os alunos se relacionassem melhor entre si e com os professores e desenvolvessem o espírito de equipe, porém, há que se ressaltar que esse foco ainda se dá nos intramuros escolares. O olhar é para as relações interpessoais no espaço de sala de aula e na escola e, não, necessariamente, para o senso de coletividade que destacamos anteriormente ao falarmos do domínio cognitivo, no sentidode formarmos um cidadão mais comprometido com a sociedade. Entretanto, já um grande passo se conseguirmos alcançar, os objetivos afetivos no espaço escolar, contribuindo para o desenvolvimento de valores que poderão se estender e se refletir ao longo da vida dos seres humanos. Saiba mais Mais uma vez, insistimos que precisamos nos responder sobre o que desejamos para as novas gerações. Será que se trata de pararmos por aí, acenando apenas para os domínios cognitivos, afetivos e psicomotores, para objetivos intramuros escolares? Certamente o professor progressista cobraria dos professores liberais “tirar a poeira de cima”; desvelando-se a ciência, indo na essência da questão, relacionando os conteúdos escolares às questões sociais, apontando as contradições sociais entre o que se disserta academicamente e o que se vive, de fato. Afinal, qual o sentido da educação? Em aulas anteriores, já tivemos a oportunidade de refletir sobre as aulas práticas, o plantar feijão no algodão e não se discutir sobre a miséria, sobre a fome e a desigualdade social. Já tivemos a oportunidade de falar sobre as aulas de culinária, de prendas domésticas, do fazer o pão e não se discutir por que nem sempre temos direito a consumir esse pão; bem como não se discutir sobre o papel da mulher na sociedade. Aí, vale a pena nos reportamos a Paulo Freire, para finalizarmos esta aula, quando o filósofo e educador brasileiro sinaliza para os professores em formação permanente que, talvez, o desafio seja dialogarmos sobre a negação do próprio diálogo. A ideia é que os profissionais da educação se comprometam com uma educação além das ciências, além da certificação; em outras palavras, que a educação seja voltada para os aspectos sociais, políticos, culturais e históricos, e não apenas voltada para os domínios cognitivos, afetivos e psicomotores. Aula 7: Planejamento didático e os conteúdos escolares Planejamento de Ensino e os Conteúdos Escolares Você já se questionou sobre os conteúdos escolares e a forma como ele é aplicado em sala de aula? Vamos iniciar nossa aula sobre esses conteúdos fazendo alguns questionamentos que poderão ser respondidos, ainda que parcial ou provisoriamente ao longo do processo de aprendizagem. Vamos descobrir quais são eles? A quem compete a seleção e organização dos conteúdos escolares? Eis um questionamento que precisamos fazer, pois se é o professor que trabalha de forma direta o conhecimento com seus alunos, será que se trata de outras pessoas pensarem o que deve ser feito em sala de aula, e na escola o professor ser apenas um mero executor de tarefas? Como devem ser tratados os conteúdos no espaço de sala de aula, virtual ou presencial? Cabe ao professor tratar o conhecimento de forma isolada e fragmentada ou se trata de estabelecermos relações entre os assuntos da disciplina? Que tipo de formação estamos oferecendo aos nossos alunos quando fragmentamos o saber e que tipo de formação oferecemos quando integramos os conteúdos e contextualizamos o ensino? Há diferenças no tipo de contribuição que o professor oferece aos seus alunos quando ele trata o conteúdo de forma articulada à sociedade e quando ele trata o conhecimento de forma abstrata, generalizada? Os alunos compreendem o sentido do aprendizado? Compreendem o porquê de estarem aprendendo determinado conteúdo? Eles conseguem fazer a “ponte” entre o que aprendem na escola e o que vivem em suas realidades? Afinal, qual o propósito do conteúdo? Há que se ter um fim em si mesmo ou há que ser um meio para se alcançar um fim? Esperamos, se não respondermos a todos esses questionamentos, que, no mínimo, despertemos em você a curiosidade do curso de formação de professores, para que continue buscando suas respostas, permitindo-se viver a aventura que se chama aprender. Depois de gerar inquietações, vamos a algumas respostas, visando organizar melhor nosso pensamento a respeito dos conteúdos de ensino. O que são Conteúdos Escolares ou Conteúdos de Ensino? Trata-se do conhecimento científico que se ensina aos alunos para que desenvolvam as capacidades que lhe permitam produzir e usufruir dos bens culturais, sociais e econômicos. Vejamos a charge a seguir: Os conteúdos não devem ter características de terminalidade e devem servir como ponto de partida para novos conhecimentos. Entretanto, como apresentado na charge que acabamos de ver, quando o professor respalda a prática no modelo tradicional e tecnicista de ensino, o conteúdo estudado tem caráter de terminalização, isto é, como se o assunto subsequente não tivesse nenhuma relação com o assunto anterior. Além disso, é trabalhado de forma fragmentada e isolada de um contexto. Saiba mais É muito comum nos depararmos com situações em que os alunos perguntam, após receberem o resultado de uma prova: “professor, hoje vai ter matéria nova?”. Para ilustrarmos a questão da fragmentação do conhecimento X contextualização do saber, tomemos com o exemplo novamente o tema das DSTs - doenças sexualmente transmissíveis. Professor pesquisador Para trabalharmos um conteúdo com mais desenvoltura e autonomia, precisamos no mínimo estudar mais referências, o que nos ajudará a ir construindo e consolidando o conhecimento, buscando nossas próprias respostas, apresentando novas sínteses e possibilidades. Sobretudo quando o professor inclui o aluno no processo de aprendizagem, abrindo espaço para o diálogo, partindo da realidade dos educandos e devolvendo-o de forma científica. Neste caso, o professor legitima os saberes dos alunos, não considerando legítimo apenas o seu conhecimento. Na verdade, no caso do professor, “único” detentor do saber, já estaríamos na dúvida quanto ao fato de o conhecimento ser mesmo dele ou dos autores que produziram e publicaram em livros, revistas ou sites e que ele reproduz como se fosse de sua autoria. Não há como desenvolver uma visão crítica sobre o objeto de estudos em questão sem o aprofundamento do conhecimento. E quando o professor dialoga com seus alunos sobre os conteúdos de ensino, eis uma forma de estabelecer relações entre a escola e a sociedade. A fim de compreendermos melhor o conteúdo tratado nesta seção, vejamos uma cena do filme Sociedade dos Poetas Mortos: O vídeo mostra que o professor não deve fragmentar o saber, e sim se contextualizá-lo, porque o saber deve partir da realidade, do saber do aluno, do óbvio, do senso comum, e se devolver de forma sistematizada, organizada e científica, sob o risco de submetermos os educandos à condição de opressão ao sonegarmos a ciência a eles. Essa não é a proposta quando se compreende a educação como instrumento de libertação da condição de opressão, como instrumento de transformação de realidades sociais. O aluno precisa do conhecimento para se equipar cognitivamente e colocar a ciência a seu favor e da sociedade. Somente assim contribuiremos para a construção de um mundo melhor. Por outro lado, sabemos que os professores muitas vezes se veem pressionados a cumprir todos os conteúdos de ensino previstos no livro didático ou impostos pelos órgãos governamentais e/ou pelas escolas. Atenção Ressalta-se assim a superficialidade em que são tratados, tendo em vista o fator tempo e impedindo uma interação social maior com os alunos. Entretanto, mesmo levando em conta o fator tempo como um obstáculo à prática docente, acrescenta-se que quando o professor é pesquisador, emancipado socialmente e tem consciência acerca do seu papel na sociedade, ele rompe com o determinismo técnico e com a hierarquização, de modo que o conhecimento deixa de ser um fim em si mesmo. É preciso segurança, fundamentação e um pouco de ousadia para trabalhar de forma contextualizada, articulada à prática e à sociedade, pois do contrário, o professor ficará mesmo submetido às imposições externas, ou seja, às determinações da escola e dos órgãos governamentais, ou ainda, aprisionado ao livro didático adotado pela escola. Fragmentação e Isolamento do Conteúdo X Conhecimento Significativo Vale acrescentar que todo conteúdo deve ter utilidade à vida do aluno, em consonânciacom as questões sociais. Entretanto, mais uma vez, ressaltamos que, se o professor respaldar a prática no modelo tradicional de ensino, bem como no modelo tecnicista, ele tratará o conteúdo como verdade absoluta. Assim, determina o que o aluno deverá aprender, tornando o assunto abstrato, generalizado, do tipo que se aplica a todos e a ninguém ao mesmo tempo. Nesse caso, o professor não dialoga com o aluno sobre o objeto de estudos; não desmistifica a ciência; não estabelece relações entre a escola e a sociedade. Em outras palavras, o aluno não é representado no currículo escolar, na medida em que seu saber não é valorizado e legitimado na escola e por ela. Saiba mais Paulo Freire denominou o conteúdo transmitido como verdade absoluta de “Educação Bancária” ou “Enciclopedista”, considerando-o vazio de sentidos, “verbalização oca”, sem contexto e sem endereço. Um saber ou conhecimento não é considerado legítimo quando é arbitrário, porque é propriedade de grupos distintos, que os selecionou ou produziu a partir das necessidades desses grupos. Logo, a validade universal desse saber é negada (Santos; Grumbach, 2005, p. 25). Leia sobre a Compreensão do sentido do conhecimento. Ainda sobre os Conteúdos de Ensino na Visão de Nilda Alves O mundo é cheio de conhecimentos de toda ordem, que nos aparecem de múltiplas formas. Nem todos eles estão na escola; quer dizer, alguém que têm o poder faz a escolha dos conhecimentos que vão estar na escola e que nela devem ser ensinados. Ou seja, há a seleção daqueles conhecimentos que na escola serão chamados conteúdos pedagógicos e que todos deverão aprender. Isto nos leva a reconhecer que outros conhecimentos tiveram a sua entrada proibida na escola. Ao menos oficialmente. Em geral, a escolha para o que podia/devia entrar na escola como conhecimento a ser aprendido era feita buscando o que era conveniente ou não aos que iam aprender, decidido a partir de critérios exteriores a eles próprios e a partir da autoridade de alguém que se considerava e era reconhecido em posição de fazer a escolha. Escolha essa que privilegiava aspectos morais que levassem à manutenção da autoridade nas mãos de quem sempre a teve, servindo para formar pessoas subordinadas a ordens sociais prescritas. Dessa maneira, eram deixados de fora aqueles conhecimentos que pudessem “enfraquecer” a alma dos educandos, bem como, os saberes “inúteis”, como eram entendidos os saberes cotidianos. A fim de entendermos melhor a relação do Sujeito com o Conhecimento, vamos ver alguns exemplo de desarticulação entre teoria e prática, de conhecimento vazio e sem significado, estéril, isolado do contexto e fragmentado? Exemplo de desarticulação entre teoria e prática, de conhecimento vazio e sem significado, estéril, isolado do contexto e fragmentado Depoimento de professora Leia o seguinte depoimento de uma professora: Ontem, depois que saí do curso, fiquei em casa pensando em quanta besteira eu já fiz na sala de aula. Ainda lecionava lá no interior, a escola ficava num vilarejo, com duas casas, uma farmácia e a venda do seu Jadir. Lá estava eu ensinando sobre meios de comunicação para crianças que nunca haviam visto um telefone, nunca haviam recebido uma carta, televisão só a da venda, ninguém tinha televisão em casa. Para aquelas crianças, os meios de transporte — cavalo, carroça, bicicleta — eram também meios de comunicação, mas eu não dei atenção a isto. O que me importava era dar o conteúdo certo, aquele do livro. E continuei a falar de telefone, televisão... Aí o menino me interrompe e diz: ‘professora, nóis nun tem telefone não, quando nóis qué fala co’alguém, nóis pega a bicicleta e vai lá. Televisão, nóis num tem também não, só a de seu Jadir lá da venda, mas ela num comunica nada, quando tem feição num proseia, quando proseia num tem feição’. Eu nunca me senti tão ridícula como naquele dia. Aula de Ciências Sociais Os alunos leem em silêncio uma lição sobre a Revolução Francesa. Depois de uma longa pausa, o professor lhes diz: “Vamos lá, vocês devem saber de cor. Digam o pouco que souberem; fechem os livros”. Uma aluna, Juliana, começa a dizer algo sobre os camponeses (o texto é breve, mas menciona quatro vezes os camponeses). O professor interrompe: “Não, não; primeiro, do que se trata?”. Os alunos não respondem. P.: Vamos ver, Angels: o que havia na França? A menina responde: “lá há muitas terras férteis, rios e carneirinhos” (o texto diz apenas que havia muito gado). P.: Carneirinhos? O que você está dizendo? (em tom sério) Os outros alunos riem. A aluna não diz nada. Detalhe: isto ocorre numa localidade onde se criam carneiros. Comentários: Em sua relação com o conhecimento, a aluna faz uma tentativa de vincular o texto com sua experiência, mas se vê cortada pela exigência do professor de que o texto seja reproduzido de acordo com o que está escrito, e sobretudo numa ordem que ele mesmo determina, como quando diz: “Não, não; primeiro, do que se trata?”. Essa forma de apresentação do conhecimento enfatiza o lugar e a sequência em que se reproduzem os dados da lição e inibem a elaboração dos alunos, que tendem a encontrar sentido no texto interpretando-o, relacionando-o com seus conhecimentos prévios e com elementos do texto contíguos a sua experiência. Esse conhecimento, cuja lógica é a identificação tópica, impele o aluno a esquecer suas próprias elaborações, como condição para poder aprender essa lógica e dar a resposta “correta”. Reflitamos: correta pra quem? Aula de Ciências Naturais Numa aula de ciências naturais da sexta série da escola, também se transmite essa forma de conhecimento. Apresenta-se, em primeiro lugar, o desenho do aparelho digestivo num cartaz grande e colorido. Cada uma de suas partes é identificada com um nome científico, ou seja, não conhecido ou pouco conhecido na linguagem cotidiana. O desenho permite a localização no espaço das partes que vão sendo nomeadas. Em segundo lugar, lê-se uma informação sobre o aparelho digestivo na Enciclopédia para Maestros Quid. Esta é lida textualmente pelo professor e depois por uma aluna. O texto vai nomeando as partes do aparelho digestivo, na sequência determinada pela passagem do bolo alimentar por tal aparelho. A informação transmitida atém-se estritamente ao texto. Não é modificada nem ampliada. Assume-se que a informação é verdadeira e que delimita o saber sobre aparelhos digestivos. A aluna termina de ler a informação. P.: Em linhas gerais, quem quer me dar o resumo disto? (mostra a primeira parte do aparelho digestivo no cartaz). ... P.: Comece você, Marcela. (A menina começa a fazer o resumo. O professor a interrompe para dizer com suas palavras.) P.: (pergunta de novo à menina): E depois? Marcela: Depois passa pelo esôfago... P.: O que é esôfago, Martin? ... P.: O que mais, José Manuel? O menino não responde corretamente, na opinião do professor, que o corrige: P.: O bolo alimentar passa pela cárdia. O que é cárdia? Aponta a um menino para que responda. O menino responde algo que o professor não ouviu direito. O professor, fazendo caso omisso de sua resposta, continua: P.: É o órgão que une o estômago ao esôfago. O que recebe no estômago o bolo alimentar? Vamos lá, Ana Luisa. (Ana Luisa não responde). P.: O suco gástrico. Por meio de que está comunicado o intestino delgado com o estômago? Alunos: Pelo piloro! P.: Qual é a segunda parte do intestino delgado, Beatriz? (Beatriz não responde de imediato, depois diz): “Intestino grosso” (hesitante). P.: (aborrecido): O que está acontecendo, Beatriz? Se estamos falando de intestino delgado, não podemos falar do grosso. ... P.: Anotem o resumo. Sentado em sua mesa, dita aos alunos o resumo, e eles copiam. O professor termina de ditar e começa de novo o resumo, agora oralmente, apontando as partes correspondentes no cartaz. Os alunos ficam entediados e cansados, olham ao redor, conversam, apoiam a cabeça na mesa, levantam, caminham pela sala de aula etc. Em geral, aumenta o ruído. Comentários: Perto do final da aula, o professor dita aos alunos um resumo da informação lida na enciclopédia.Assim se assegura de transmitir a todos os alunos a informação correta e completa por escrito, ou seja, de forma duradoura. Depois reforça, repetindo o resumo oralmente e indicando suas partes no desenho. Nessa forma de conhecimento, o que se enfatiza é a localização espacial de partes que têm um nome específico: piloro, esôfago, suco gástrico etc. A apropriação do conhecimento consiste, então, em poder recordar e nomear as partes numa determinada ordem, que é a que está assinalada pelo itinerário do bolo alimentar. As perguntas não admitem a explicitação das elaborações pessoais que os alunos podem estar fazendo. Para responder, não é preciso fazer relações nem aplicar conhecimentos; apenas lembrar e nomear termos numa determinada ordem. Os termos que se dizem dão conta de um aparelho do organismo humano, mas em sua esquematização perde-se de vista tal ligação, e o resultado é um ordenamento de lugares. As referências ao funcionamento do aparelho digestivo, por exemplo, são escassas e fracas, isto é: “O que recebe o bolo alimentar no estômago?” “O suco gástrico”. Nesse caso, refere-se implicitamente a uma função que o suco gástrico deveria realizar no bolo alimentar. O resto da informação da aula se refere à localização das partes: “O que une o estômago ao esôfago?” “A cárdia”. “Por meio de que está comunicado o intestino delgado com o estômago?” “Pelo piloro”. Exemplo de articulação entre o saber popular e o saber científico. Aula sobre alimentação e hábitos de higiene e saúde Aula sobre alimentação e hábitos de higiene e saúde Leia o seguinte depoimento de uma professora: Situação do cotidiano escolar: os alunos estão estudando sobre a importância das frutas para o funcionamento do organismo, quando ocorre uma pergunta: “professora, o que acontece se você comer abacaxi e depois tomar leite?”. Aluna 1: “Minha mãe dizia que comer abacaxi e depois tomar leite fazia mal. Ela até conheceu um rapaz que morreu por isso. Pode até ser que não faz mal, mas eu não arrisco”. Aluno 2: “Quando eu era pequena, engoli dois chicletes e diziam que a gente morria porque o chiclete tapava a boca do estômago. Minha mãe falava que tapava a boca do bucho e a gente podia comer que não fazia efeito. Mas minha culpa foi porque o dinheiro que eu comprei os chicletes era para eu dar para a igreja e Deus sabia disso”. Aluna 3: “Eu sempre vi minha mãe cortando a ponta do pepino e esfregando para tirar o veneno”. Aluno 4: “Tem muita coisa que a gente pensa que se comer faz mal e não faz. Quando o avião do Mezenga caiu na mata, pra sobreviver, ele comeu carne de macaco e até aqueles vermes que dão dentro das cascas das árvores”. Professor: “Mas o médico não fala que faz mal misturar leite com abacaxi. Ele fala que depende do organismo de cada um. Então, como a gente fica? Essa ideia vem do tempo da escravidão. Para os escravos não comerem muito, os donos das fazendas falavam que fazia mal comer abacaxi com leite, manga com leite e outras coisas. Eles colocavam medo nos escravos e isso chegou até nós”. Comentários: Percebe-se que o professor não desprezou o conhecimento dos alunos a respeito do assunto em pauta, dialogando com eles sobre o objeto de estudos, partindo de suas realidades, seus saberes, partindo do óbvio, segundo Paulo Freire, e devolvendo de forma científica, sob o risco de submetê-los à condição de opressão ao sonegar a ciência a eles, o que não foi a proposta do professor. A seleção dos conteúdos requer do professor um bom conhecimento da disciplina que leciona e é imprescindível a atuação permanente do professor através de reciclagens, aprofundamento teórico e prático. É muito importante que o professor tenha grande bagagem cultural, abrangendo, obrigatoriamente, seu campo específico de estudo, pois somente desta forma ele poderá ‘se dar o luxo’ de abrir mão do conteúdo como um fim em si mesmo, utilizando-o como meio, objeto de reflexão e de crítica (Balzan, citado por Piletti, 2004). Aula 8: Planejamento didático e os procedimentos de ensino Planejamento e os Procedimentos de Ensino São meios para alcançar objetivos gerais e específicos do ensino, ou seja, ao “como” do processo de ensino, englobando as ações a serem realizadas pelo professor e pelos alunos para atingir objetivos e conteúdos. Libaneo É o caminho para se alcançar objetivos (Libaneo, 2013). Segundo o autor, estamos sempre perseguindo objetivos e estes não se realizam por si mesmos, sendo necessária a atuação docente, ou seja, a organização de ações para atingi-los. Haydt Na visão de Haydt (2006), consiste em procedimentos que colocam o aluno em contato direto com coisas, fatos ou fenômenos que lhes possibilitem modificar sua conduta, em função dos objetivos previstos. Dizem respeito às formas de intervenção na sala de aula; são ações, processos ou comportamentos planejados pelo professor, de modo que o aluno entre em contato direto com o conhecimento científico. Piletti Para Piletti (2004), trata-se do “como ensinar”, ou seja, de procedimentos de ensino, de estratégias, métodos e técnicas. Bordenave e Pereira Para Bordenave e Pereira (1986), método é o conjunto organizado de técnicas e procedimentos empregados pelo professor. Vejamos algumas definições importantes 1 Estratégia É uma palavra emprestada da terminologia militar. Trata-se de uma descrição dos meios disponíveis pelo professor para atingir os objetivos específicos 2 Método O significado etimológico da palavra método é: caminho a seguir para alcançar um fim; um roteiro geral para a atividade. O método indica as grandes linhas de ação. 3 Técnica É a operacionalização do método. Se um professor, por exemplo, quer utilizar um método ativo para atingir seus objetivos, poderá operacionalizar esse método através da utilização das diferentes técnicas de dinâmica de grupo. 4 Procedimentos Maneira de efetuar alguma coisa. Consiste em descrever as atividades desenvolvidas pelo professor e as atividades desenvolvidas pelos alunos. Como cada autor descreve a metodologia Rays O método de ensino deve ser entendido como o caminho para a promoção de ações pedagógicas conscientes, organizadas criticamente, com a finalidade de tornar o trabalho docente e discente mais fácil e mais produtivo para o alcance das metas desejadas e necessárias para o desenvolvimento integral dos educandos (Rays, 2011). Para Rays, o tema da metodologia é polêmico, pois a literatura especializada que normalmente aborda esta questão tem deixado em plano inferior as reflexões de cunho epistemológico, o sentido das práticas, e se preocupado mais com abordagens do tipo técnico-instrumental. Verifica-se a supremacia da dimensão técnico-instrumental na medida em que a literatura tende a apresentar tipos de metodologias ou técnicas, o que poderá induzir ao professor em formação desejar empregá-las sem uma justificativa teórica que se aproxime dos reais propósitos da ação educativa escolarizada. Respaldados nessa linha de pensamento, pretendemos apresentar algumas sugestões de métodos ou práticas sem perder de vista seu sentido, esperando que o professor em formação se aproprie criticamente. Dessa forma, o professor resgata sua condição de professor pesquisador, sujeito autônomo de sua prática, de modo que não adote um método pelo método, uma técnica pela técnica, sem saber o que está fazendo e por que está adotando tal prática. Lucy Valentini Citamos, aqui, o pensamento de uma autora de livros de História, Lucy Valentini (2001): Eu fujo de nomes e métodos, pois penso que o professor de história que veste a camisa de um método corre o risco de se fechar no desafio que cada turma, a cada aula, costuma apresentar. Afinal, ele lida com pessoas e elas nos surpreendem sempre. A História explica isso. A sala de aula é um nascedouro de raciocínios que fazem uma aula nunca ser igual a outra. O que importa é despertar o interesse do aluno, levá-lo à reflexão e ao espírito crítico... Se isso é método, então é o que eu sigo. Diante desse pensamento de Lucy Valentini, como podemos pensar em adotar um único método de ensino, tendo emvista os diversos contextos em que estamos inseridos? Por outro lado, também não se trata de diversificarmos os métodos ou técnicas aleatoriamente, como se estivéssemos “atirando para todos os lados”, sem saber aonde chegar, apenas para preenchermos o tempo “ocioso”. Trata-se de uma prática refletida, fundamentada, conforme já mencionado. Talvez pudéssemos dizer que o melhor método é aquele que o professor tem consciência sobre o que está fazendo e por quê. Paulo Freire Para Paulo Freire (1999, p. 155), a formação dos professores devia insistir na constituição deste saber necessário e que me faz certo desta coisa óbvia, que é a importância inegável que tem sobre nós o contorno ecológico, social e econômico em que vivemos. E ao saber teórico desta influência teríamos que juntar o saber teórico-prático da realidade concreta em que os professores trabalham [...] preciso, agora, saber ou abrir-me à realidade desses alunos com quem partilho a minha atividade pedagógica. Preciso tornar-me, se não absolutamente íntimo de sua forma de estar sendo, no mínimo, menos estranho e distante dela. E a diminuição de minha estranheza ou de minha distância da realidade hostil em que vivem meus alunos não é uma questão de pura geografia. Minha abertura à realidade negadora de seu projeto de gente é uma questão de real adesão de minha parte a eles e a elas, a seu direito de ser. Em outras palavras, o autor está sinalizando para a relevância de uma prática contextualizada, não vazia de sentidos, endereçada, desveladora, desmistificadora. É com base nessa linha de pensamento que apresentamos um modelo de prática através da charge a seguir, que denominaremos de: método da desmistifação da ciência, dos fatos, da realidade Método da Desmistifação da Ciência, dos Fatos, da Realidade Um dos desafios dos professores seria criar, na sala de aula, um ambiente onde os alunos se sintam insatisfeitos com as limitações de suas representações, com suas realidades sociais. Realidades essas que estão postas, determinadas e abertas às explicações científicas, no sentido de, através do conhecimento, poder transformar suas realidades sociais, ficando evidente a relevância da conscientização acerca dos fatos, pois, do contrário, não se intervém, não se sai da zona de conforto. Logo, espera-se, com essa prática desveladora, em que se desocultam realidades, contribuir para a formação crítica dos alunos, de modo que eles se inquietem frente à realidade e, a partir da educação, possam melhorar suas condições de vida. Nesse sentido, cabe ao professor não sonegar a ciência a eles, estabelecendo a “ponte” entre a escola e a sociedade. Leia a tirinha abaixo: Parte inferior do formulário Método da contradição Tomando por base as contribuições de Alonso Rays, acrescentamos que essa abordagem se trata de enfrentarmos os paradoxos entre a teoria e a prática no processo de aprendizagem. Para o autor, o professor deve proporcionar ao educando um modo significativo de assimilação crítica da ciência, representada na escola pela matéria de ensino e o confronto desta com as necessidades sócio-culturais dos diferentes grupos sociais que frequentam a mesma escola. O ensino como fenômeno da realidade concreta é um processo que se desenvolve dialeticamente. Para tanto, torna-se premente a interrelação entre a informação acabada (a cultura elaborada) e a produção do conhecimento. Saiba mais Isso significa dizer que alunos e professor fazem da sala de aula um espaço de trabalho, de pesquisa, de busca de novas respostas, novas possibilidades a partir da constatação de fatos. Trata-se de constatarmos fatos, realidade e agirmos sobre ela, transformando-a. Eis o movimento da dialética, da superação. Talvez não tenha muita diferença, na prática, em relação ao modelo anterior, uma vez que professores que respaldam a prática nesses modelos têm como intenção a formação crítica, a emancipação e a transformação social. Podemos dizer que é só uma questão de termos e isso, talvez, não seja tão relevante, mas sim o que se pretende com tal ação pedagógica. Modelo da contradição ilustrado Para ilustrar o modelo da contradição, citamos um exemplo de prática real, em forma de contribuição fornecida pela professora Regina Fátima de Oliveira, aluna em formação continuada docente no curso de licenciatura em Letras da Universidade Estácio de Sá, na modalidade à distância, turma 2013, segundo semestre. Ao ministrar a disciplina de Inglês, a tarefa prevista no plano de ensino, segundo a professora, é que trabalhasse os cômodos de uma casa, tais como: kitchen, bathroom, bedroom etc. Segundo a referida professora, na hora em que preparava a aula a partir das determinações da escola, pensou em como iria apresentar o termo dinning room (sala de jantar), quando a maior parte de seus alunos, segundo seu depoimento em fóruns da disciplina de didática, comiam na cozinha ou sentados no chão da sala e, com sorte, num sofá. A professora Regina teve que pensar num mini-discurso para falar de diferenças de mundo, da “farsa” das ilustrações dos livros, da ideologia dominante por trás daquilo tudo e acrescentou que parecia até “novela das oito” com aquelas mesas com 12 lugares e aquele café da manhã de hotel 5 estrelas. Ao tratar desse assunto em um dos fóruns de didática, ela fez o seguinte questionamento: “Agora, imagine só se eu tentasse apresentar o termo sem ter tido essa preocupação? O que passaria pela cabeça dos meus alunos? Eu falando inglês fluentemente, em cima do meu salto alto, dizendo que o “normal” é a pessoa jantar no seu ‘dinning room’ e os alunos comendo no chão?” Entretanto, apesar da contradição entre teoria e prática, entre conhecimento científico, escolarizado e conhecimento popular, não significa dizer que a professora não deveria ensinar os termos, o vocabulário sofisticado, pois, de outra forma, como contribuir para a libertação da condição de opressão? Sendo assim, ao compreendermos a educação como instrumento de mudança social, cabe ao professor, sim, partir das realidades dos educandos, mostrar as contradições e instigá-los ao desejo de intervenção social, pois ele não transforma quando acredita que tudo está determinado e que não há mais nada a fazer. Atenção Para reforçar essa análise, vejamos o que Paulo Freire assinala Não é se mudando para a favela que ele, o professor, mostrará solidariedade aos alunos, pois, para o autor, isso seria considerado suicídio de classe. Trata-se, então, de, em nossa prática, rompermos com a visão fatalista de mundo, acreditando em possibilidades, fazendo com que nossos alunos também acreditem que são capazes de construir uma nova ordem social. Método da Aula Prática/ Aula-passeio Até o momento, estamos falando de metodologias de ensino respaldadas na perspectiva crítica e progressista da educação, mas não existem apenas essas. Faz-se necessário apontarmos para outras práticas consideradas ativas, na medida em que se permite a participação do aluno no processo de aprendizagem; porém, não garantem necessariamente uma visão crítica sobre o que se está estudando. Para exemplificar o que estamos dizendo, segue um exemplo de aula que denominaremos de método da aula passeio. Vale acrescentar que o exemplo da Aula de pesca foi retirado da obra de Andrea Ramal (1999) intitulada Histórias de gente que ensina e aprende. Aproveitaremos para fazer uma análise crítica não da autora, que oferece uma contribuição ao destacar em seu livro várias situações do cotidiano escolar, mas da prática apontada por ela que, certamente, teve a intenção de suscitar nos leitores uma reflexão crítica sobre a docência. Parte inferior do formulário Comentário Adotar as aulas-passeio como estratégia é louvável, mas, se desejamos contribuir para a formação crítica e emancipada das novas gerações, não podemos parar por aí. Cabe ao professor retornar para a sala de aula e atribuir um sentido mais amplo sobre a atividade realizada, além de uma simples demonstração, frustrando os alunos em não permitir a experimentação, ou seja, o aprender fazendo. Aproveitando aqui a “deixa”do “aprender fazendo”, destacaremos a seguir outro método de ensino, ressaltando que também aprendemos pela diferença. Isso quer dizer que, ao assistirmos ou participarmos de uma aula como alunos, podemos aprender, também, sobre o que não devemos fazer quando assumirmos a docência. Método do Aprender Fazendo Tomaremos como base os ensinamentos de J. Dewey (1859-1952): “Agir como uma meta é agir inteligentemente. Aprender fazendo”. Ação precede o conhecimento e o pensamento. “Antes de existir como um ser pensante, o homem é um ser que age”. Trata-se de um método ativo que valoriza a experiência concreta do aluno, que observa, manipula materiais, objetos, experimenta, pesquisa. É considerado método da descoberta, pois o aluno fica em contato direto com o meio natural, tendo como objetivo o desenvolvimento espontâneo e intelectual. A ideia é fazer com que o aluno aprenda atuando, e não mais apenas ouvindo seu professor dissertar sobre conteúdos de ensino. O trabalho do aluno deve estar orientado para um fim prático bem definido, como construir um brinquedo, o que levou um educador progressista como Libâneo (2013) a denominá-lo de pragmatista, progressivista, escolanovista ou, ainda, escola ativa. O professor incentiva, orienta, organiza as situações de aprendizagem, adequando-as às capacidades de características individuais dos alunos. As atividades podem ser em grupo ou individuais; porém, há uma preocupação por parte do professor com o ritmo cognitivo do indivíduo, com suas lacunas e potencialidades intelectuais. O processo de assimilação do conhecimento é ativo porque o aluno “coloca a mão na massa”, ou seja, pratica. A aprendizagem se dá mediante a aplicação prática em seu cotidiano. A própria aula de pesca poderia ser enquadrada nesse método do aprender fazendo, mas a professora não permitiu que os alunos experimentassem; apenas ficaram ouvindo a professora dissertar e demonstrar, o que é típico de um modelo tradicional, apesar de os alunos terem saído dos bancos da escola. Por outro lado, ainda sobre o método do aprender fazendo, apesar de ser um método ativo que incentiva a pesquisa e a aplicação da teoria à prática, é preciso ressaltar que é uma aplicação pela aplicação, sem necessariamente desmistificar o que se está aprendendo. Aprender e colocar em prática não garantem a visão crítica sobre o que se está fazendo mas, talvez, nesse método, o objetivo não seja a formação crítica, e sim alcançar resultados mais imediatistas a partir da mobilização da motivação para aprender. Leitura Leia mais sobre o Método de Aprender Fazendo. Conforme mencionamos, seria ingenuidade pensar que aulas dinâmicas, lúdicas, práticas, em laboratórios, aulas na horta etc. fossem suficientes para envolver os alunos com o objeto de estudos em questão, o que se refletiria em resultados favoráveis, satisfatórios. Além disso, o fato de tentarmos envolver o aluno com o objeto de estudos a partir de aulas mais dinâmicas e práticas não garante que daremos conta dos problemas sociais que vão além do aprendizado das ciências. Quando nos referimos aos problemas sociais, estamos pensando na miséria, na fome, na saúde, no meio ambiente, na educação, no transporte e em mais tantos outros com que nos deparamos diariamente desde que acordamos e saímos de casa até o retorno para os nossos lares. O mundo não é tão “certinho” como gostaríamos; não corre naturalmente como se fosse o fluxo de um rio. O mundo é contraditório e não livre de tensões, então, quando estamos comprometidos ideologicamente em formar as novas gerações conscientes disso, não é suficiente adotar métodos ativos de aprendizagem que possuem fins em si mesmos. Precisamos querer mais para os nossos alunos: que eles não, apenas, constatem fatos ou fenômenos naturais, mas que constatem a partir da sua investigação e que sejam despertados para a ação, no sentido da transformação de suas realidades sociais. Mediante o que estamos dizendo, será que podemos falar em método da instigação, da indagação, da polemização, da conscientização, da criticidade? Como colocar em prática? Será que é imprescindível fazer essa delimitação entre esses termos? Ou podemos sintetizar denominando de método da produção de conhecimentos, métodos progressistas, críticos, na medida em que se tem como finalidade avançar na busca pelo conhecimento, superar, transformar, contribuir socialmente? Afinal, o que significa produzir conhecimentos? Significa fazer pesquisa, significa aprofundamento teórico, confrontação dialética entre teoria e prática e a busca de uma nova resposta, uma nova possibilidade; a contribuição. E fazer pesquisas requer instigação frente aos fatos, insatisfação com a realidade posta, determinada, requer indagação, reflexão, ação/intervenção. Método da Produção de Conhecimentos Podemos partir de um tema gerador de polêmicas, mas não se trata de um tema qualquer. É preciso que esteja relacionado à disciplina em questão. Se pensarmos na disciplina de ciências biológicas, podemos partir de temas como: meio ambiente, saúde, alimentação, doenças sexualmente transmissíveis, higiene, obesidade e tecnologia, dengue etc., pois não conseguiríamos finalizar essa lista de temas polêmicos e geradores de discussão e trabalho no espaço de sala de aula. Se pensarmos na disciplina de Matemática, podemos apontar temas como: cálculos, operações matemáticas, compras, consumo, gráficos, porcentagem, levantamento de índices estatísticos. As possibilidades são infinitas e dependerão, claro, da criatividade do professor, de sua curiosidade e ânsia pelo conhecimento, visando oferecer aos alunos condições de pesquisa, de produção de conhecimentos. Esperamos que, a partir dos resultados da aula, se debata sobre esses mesmos resultados, no sentido de conscientização e contribuição social, o que nem sempre é tarefa fácil, pois, mais uma vez, estamos lidando com seres humanos. Fazer pesquisas sobre DSTs – doenças sexualmente transmissíveis também não oferece garantias de que os jovens envolvidos no estudo em questão não adotarão mais atitudes irresponsáveis e impensadas, de modo que fiquem protegidos contra os males das doenças. Retornando à proposta desse item, de apresentar o método da produção de conhecimentos; trata-se de abrirmos um espaço para o debate, indagando os alunos sobre o que poderiam dizer sobre o assunto, mediando os saberes deles, refletindo sobre suas falas, comparando ao conhecimento científico, buscando novas informações, gerando a dúvida e o senso de inquietação e coletividade. A descoberta de um aluno poderá contribuir para todos os sujeitos envolvidos no processo formativo. Cabe ao professor falar com os alunos, questioná-los, fazer a escuta trabalhada que, segundo Paulo Freire, trata-se de partirmos do óbvio, da realidade do educando, de seu saber e devolver de forma sistematizada, científica. Enquanto os alunos debatem sobre o assunto, mediados pelo professor, produzem-se conhecimentos, sem a pretensão de que se encontrou a resposta definitiva para o objeto de estudos em questão. A postura de alunos e professores se modifica, pois rompe-se com o modelo linear de ensino, do professor para o aluno, na medida em que o conhecimento é tratado interativamente, em forma de rede. Estilos de sala de aula A seguir, podemos comparar, através dos desenhos, dois estilos de sala de aula: O primeiro, o modelo de uma aula tradicional; O segundo, o modelo interativo, em forma de rede, em que não sabemos mais onde começa o processo de aprendizagem e onde termina, se é que termina. Vamos refletir sobre os modelos de sala de aula A e B expostos a seguir? Modelo A Nesse caso, o professor faz um monólogo e sequer se dá conta das necessidades especiais de seus alunos. Ele é distante, formal e determina o conhecimento como verdade absoluta. Não há produção de conhecimentos, produção de saberes. Modelo B Já no modelo de sala de aula B, é difícil precisar em que ponto se iniciou o processo de aprendizagem; se iniciou no professor ou no aluno a, b ou c, pois, a ênfase é na coletividade, na participação democrática,na interação social, na dialética. Método da Interdisciplinaridade O método da interdisciplinaridade se dá pelo estabelecimento de relações entre as temáticas de ensino de uma mesma disciplina. O ensino interdisciplinar nasce da proposição de novos objetivos, de novos métodos, de uma nova pedagogia, cuja tônica primeira é a supressão do monólogo e a instauração de uma prática dialógica. Para tanto, faz-se necessário a eliminação das barreiras entre as pessoas que pretendem desenvolvê-las. Não significa desrespeitar a “verdade” de cada disciplina; é uma relação dialógica em que a posição é de construção do conhecimento. A atitude interdisciplinar nos ajuda a viver o drama da incerteza e da insegurança. Possibilita-nos dar um passo no processo de libertação do mito do porto seguro. Para ilustrar um caso de falta de visão interdisciplinar, mencionaremos aqui um diálogo entre aluno e seu professor de língua portuguesa: Aluno - Professor, o que é Teorema de Pitágoras? Professor - Não sei, vai perguntar para o professor de matemática!! Com o exemplo citado, fica evidente que o professor da língua portuguesa não foi preparado para trabalhar de forma interdisciplinar. Ele perde a oportunidade de construir conhecimentos com seu próprio aluno, buscando informação sobre o conceito ou significado do termo “Teoremas de Pitágoras”, o que poderia contribuir para o aprendizado do aluno na própria disciplina de matemática. Outras possibilidades de métodos, técnicas, estratégias, recursos ou instrumentos Vamos ver outras possibilidades de métodos, técnicas, estratégias, recursos ou instrumentos que, normalmente, são citados na literatura especializada e que você poderá consultá-las para maior aprofundamento. Vamos nos limitar, então, apenas a citá-los, indicando ora a referência, apresentando uma breve explicação sobre os mesmos, ora tomando como orientação a nossa própria prática de professores que formam professores. São eles: aula expositiva, estudo dirigido, jogos, dramatização, estudo de casos, método de projetos etc. (Haydt, 2006). Percebe-se que há similaridades entre os autores no que diz respeito às estratégias, procedimentos ou técnicas de ensino. Vale reforçar que assimilar mecanicamente os termos é irrelevante frente à importância de o professor se responder sobre o sentido da prática, sobre o objetivo que deseja alcançar com ela. Aula expositiva É o método mais simples e conhecido, em que o professor fala e o aluno escuta passivamente. Normalmente, o conteúdo é transmitido linear e hierarquicamente do professor para o aluno como verdade absoluta. Trata-se de um modelo tradicional de ensino; entretanto, a nossa prática indica que podemos (re)ssignificar a aula expositiva e torná-la, além de expositiva, interativa, ao dialogarmos com os alunos sobre o objeto de estudos em questão, “quebrando” a rotina de uma prática mais conservadora quando apenas o professor é o centro do processo de aprendizagem. Estudo Dirigido É uma estratégia que, quando bem utilizada, pode oferecer bons frutos. O professor propõe algumas temáticas de estudo e orienta literaturas, pesquisas, incentivando a autonomia do educando. Entretanto, há professores que adotam o estudo dirigido como prática elencando um número significativo de perguntas com respostas e solicitando ao aluno que as memorize. Posteriormente, seleciona perguntas do próprio estudo dirigido para a prova e exige que as respostas dos alunos sejam as mesmas que ele determinou, ou seja, o professor padroniza as respostas que os alunos deverão apresentar. Como se vê, a grande questão são os fundamentos da prática, pois as estratégias, as técnicas ou recursos serão utilizados de acordo com a visão de educação que o professor apresenta. Jogos São uma estratégia ou técnica que torna a aula mais lúdica. O professor pode criar jogos tais como cruzadas, jogo da memória, trilha, competições entre os alunos. O ideal é que o jogo, assim como qualquer outra estratégia, não tenha um fim em si mesmo. Em outras palavras, é importante que o professor tenha objetivos, saiba o que está fazendo e por quê. Dramatizações Através do teatro, criar situações de estudo que poderão ser representadas pelos educandos Estudo de Caso O professor pode propor uma situação-problema para que os alunos resolvam e proponham soluções. É importante ressaltar que as soluções não sejam aleatórias, espontaneístas, e sim fundamentadas, evitando-se assim que os alunos “atirem” para todos os lados sem saber onde chegar. Método de projetos Permitir que os alunos escolham as temáticas de estudo relacionadas à disciplina, cabendo ao professor fazer um trabalho de orientação sobre o que pesquisar, como pesquisar, para que pesquisar; além da orientação acerca da produção de texto, em que o aluno apresentaria os resultados de sua pesquisa. Esse método valoriza mais o processo de aprendizagem em detrimento do produto final, sendo mais aceito nos cursos superiores. Denominação de método Para Santos e Grumbach (2005), o método pode ser denominado de: 1 Analógico É aquele que faz a integração dos outros dois). 2 Dedutivo É aquele que vai do geral para o particular. 3 Indutivo É aquele que vai do particular para o geral. Ao se referirem ao geral, os autores estão sinalizando para o conceito abstrato, universal, para o conhecimento científico. Ao se referirem ao particular, eles sinalizam para casos concretos, específicos, reais. Cabe ao professor dialogar com essas duas lógicas, articulando-as dialeticamente e apresentando suas próprias respostas, sobretudo, quando respalda a prática em perspectivas progressistas, crítica da educação. Recursos Didáticos: Meios Auxiliares da Prática Baseados em nossa experiência docente, apresentamos mais alguns recursos didáticos que são definidos como meios auxiliares da prática que facilitam o aprendizado; fontes de ajuda que vão dos mais simples aos mais sofisticados; porém, não substituem o professor. Clique nos botões para ver as demais informações. Recursos materiais Naturais: animais, plantas, água. Inanimados: equipamentos: data show, TV, vídeo, retroprojetor, slides, gravuras, quadro, jornal, revista, cartaz, fotos, computador, textos etc. Recursos humanos Aluno, professor, pessoal da escola, comunidade. Para finalizar esta aula, listamos mais algumas possibilidades de práticas, ações pedagógicas, métodos, estratégias, técnicas, procedimentos ou recursos. Mapas conceituais São diagramas indicando relações entre conceitos ou entre palavras usadas para representar conceitos. Embora normalmente tenham uma organização hierárquica e, muitas vezes, incluam setas, tais diagramas não devem ser confundidos com organogramas ou diagramas de fluxo, pois não implicam sequência, temporalidade ou direcionalidade, nem hierarquias organizacionais ou de poder. Mapas conceituais são diagramas de significados, de relações significativas; de hierarquias conceituais, se for o caso [...] Mapas conceituais não buscam classificar conceitos, mas sim relacioná-los (Moreira, 1997). Acrescenta-se que os termos e palavras-chave podem surgir como temas geradores de discussão e a partir da realidade dos educandos, tornando assim o aprendizado significativo. Aulas teletransmitidas (teleaulas) O professor, atrás de uma câmera, disserta sobre o conteúdo. A forma como ele operacionalizará essa ação também dependerá de sua concepção de educação, pois ou bem poderá dissertar linearmente, seguindo uma sequência rígida, previamente determinada com a ajuda de slides ou dissertar fazendo questionamentos, indagando-se, indagando o outro, e não necessariamente aprisionado ao recurso do datashow. Fóruns São espaços virtuais de aprendizagem em que um professor tutor é o mediador dos diversos saberes/ posicionamentos, valendo ressaltar que também a forma como esta técnica é operacionalizada dependerá da concepção que se tem de educação. Chat É uma conversa online entre duas ou mais pessoas; entretanto, como se trata de formação acadêmica, não deverá ser uma conversa qualquer, mas sobre o objeto de estudos em questão,e poderá ser em tempo real. Tecnologia móvel (tablets, celulares, iphone) Recursos móveis em que o aluno poderá ter acesso ao webaula, aos conteúdos online e acessá-los em diversos lugares, administrando seu próprio ritmo e tempo de estudos. Sala de aula invertida O professor não fica mais posicionado à frente dos alunos dissertando para que eles ouçam apenas, mas os alunos que vão em busca do professor para obter orientação, tirar dúvidas sobre conteúdo etc. Plataforma Mooc (cursos abertos online massivos) Com mais de um século de história e regulamentada no Brasil desde 1995, a Educação a Distância (EaD) já está consolidada no Brasil, mas nem todos estão familiarizados com o termo MOOC (Massive Open Online Course), conceito que vem ganhando visibilidade nos últimos anos. Os MOOCs têm se disseminado por meio de diversas plataformas espalhadas pelo mundo, atraindo milhares de adeptos. O que diferencia um MOOC de uma iniciativa tradicional de EaD é principalmente a abrangência. Os MOOCs são pensados para atender a um número massivo de estudantes, além de ser majoritariamente gratuitos e de curta duração. O Professor e as Novas Tecnologias Educacionais Acredita-se que o professor poderá explorar tais recursos; que não podemos mais negar a presença das novas tecnologias no setor educacional, tendo em vista que cada vez mais as novas gerações são consideradas usuárias que navegam na internet com intensa facilidade, “saltando” de um ponto a outro, explorando links e buscando informação com mais autonomia. 01 Kensky (1998) ressalta que as velozes transformações tecnológicas da atualidade impõem novos ritmos e dimensões à tarefa de ensinar e aprender. É preciso que se esteja em permanente estado de aprendizagem e de adaptação ao novo; 02 Levando em conta que o conhecimento se encontra desterritorializado; a informação indo para todas as direções em forma de rede e não mais de reta, rota, conforme Marco Silva (2010); fazem-se necessárias novas posturas por parte de alunos e professores diante do saber; 03 O leitor, denominado por Andréa Ramal (1998) de “leitautor”, participa ativamente do processo de construção de conhecimento, não ficando preso a um único aspecto: o livro, a página, o texto. Rompe-se a leitura linear, desaparece a noção de página. Nada mais é fixo, estático, tratando-se das multimídias, do hipertexto (conjunto de textos, imagens, sons, enfim, estímulos) como se fosse um caleidoscópio. A construção do saber O espaço cibernético está se tornando um lugar essencial para a construção do saber, uma vez que abre infinitas possibilidades. Surge, então, uma nova cultura de aprendizagem com a emergência de uma nova inteligência, a inteligência coletiva. Levy, 1994. Tudo isso graças a essa nova forma de cooperação e coordenação em tempo real. Sobre esse fenômeno da plasticidade da informação, reflexos já se fazem sentir no campo da educação e todos, em especial, professores e alunos, poderão se beneficiar. Porém, faz-se necessária a atualização docente, visando atender às demandas sociais atuais, sob risco de os professores ficarem na contramão da história. Não há mais como evitar essa realidade no campo educacional, o que requer do educador novas posturas para planejar o cenário pedagógico, levando em conta que cada vez mais pessoas se tornam usuárias e navegam com intensa facilidade no espaço virtual. Inclusão digital Marco Silva (2003) se refere à infoexclusão, afirmando que deve ser combatida. Para esse estudioso, não basta ter acesso à informação digitalizada: Se não houver investimento na formação dos usuários para que a tecnologia não seja subutilizada, não haverá inclusão digital de fato, e a internet perderá a perspectiva democratizante. É preciso qualificar comunidades excluídas dotando-as de competências para participar na era digital, na cybercultura, na sociedade da informação. Softwares educativos devem ser concebidos para “potenciar a aprendizagem e o trabalho do professor (Ibid., p. 262), e não para servir como mero instrumental. Computadores ligados à internet disponíveis aos alunos não implicam aulas interativas capazes de promover o desenvolvimento da autonomia e visão crítica de mundo dos estudantes. Saiba mais Cybercultura é uma metodologia de ensino fechada, sem a possibilidade de estabelecer relações de reciprocidade entre educador e educando no universo cibernético, não permite a colaboração na manipulação das informações, que ganham sentido através das ações de cada indivíduo, o qual deixa de ser mero receptor para tornar-se também emissor da informação (Ibid.). Diante disso, é preciso estimular os alunos a uma nova atitude frente à cybercultura, tendo em vista os modelos tradicionais, conservadores enraizados e presentes, ainda hoje, início do século XXI, nas escolas e universidades. O ambiente virtual requer do docente: · Entender o contexto atual e buscar soluções para os problemas encontrados na vida profissional e cotidiana; · Incentivar a imaginação, a criatividade, a socialização entre os parceiros de aprendizagem; · A capacidade de investigar e escolher a opção “mais adequada”, ainda que provisória, bem como utilizar e indicar fontes de consulta, sem, no entanto, perder de vista a atribuição de um sentido maior ao processo educacional. O ambiente em sala de aula Silva (2010, p. 27-45) propõe que a sala de aula seja interativa e considerada um ambiente em que: [...] o professor interrompe a tradição de falar/ditar, deixando de identificar-se com o contador de histórias, e adotar uma postura semelhante a do designer de software interativo. Ele constrói um conjunto de territórios a serem explorados pelos alunos e disponibiliza coautoria de múltiplas conexões, permitindo que o aluno também faça por si mesmo [...] uma possibilidade libertadora da autoria do usuário sobre sua ação de conhecer. O educando assumirá, então, o papel de conduzir seu próprio saber e será não mais aquele que se submete à emissão do professor, mas aquele que (re)inventa a mensagem, salta de um ponto a outro fazendo o seu próprio roteiro, não seguindo mais as páginas do livro de modo unitário e contínuo. Aula 9: Planejamento didático e a avaliação escolar Planejamento de Ensino e a Avaliação Escolar Definições de avaliação escolar Falar de avaliação escolar é bastante complexo, pois trata-se de uma ação pedagógica realizada por uma pessoa, o que faz dessa prática poder se submeter ao risco da subjetividade, do olhar tendencioso, impreciso e desatento do professor, principalmente quando se trabalha em diversas turmas e com um número elevado de alunos. Por mais que o professor seja muito bem formado na ética, é possível cometer injustiças nas avaliações, ficando evidente que todo instrumento ou modo de avaliar tem suas fragilidades. Considerando que o tema é polêmico, iniciaremos apontando algumas definições a partir do olhar de educadores, estudiosos no assunto: Nérici É a verificação da aprendizagem, é a parte final do processo de ensino iniciado com o planejamento do curso e é por meio dela que se chega à conclusão sobre a utilidade ou não dos esforços despendidos pelo professor e alunos nos trabalhos escolares (Nérici, 1969). Piletti Avaliação é um processo contínuo de pesquisas que visa interpretar os conhecimentos, habilidades e atitudes dos alunos, tendo em vista mudanças esperadas no comportamento, propostas nos objetivos, a fim de que haja condições de decidir sobre alternativas do planejamento do trabalho do professor e da escola como um todo (Piletti, 2010). Atenção Se analisarmos essas duas definições de Nérici (1969) e Pilletti (2010), percebemos que há diferenças, obviamente, tendo em vista as suas épocas: enquanto na primeira o autor enfatiza o resultado final, na segunda, a ênfase é no processo. Para Haydt (2006), o termo avaliar tem sido constantemente associado a expressões como fazer prova, fazer exame, atribuir nota, repetir ou passar de ano. Esta associação, tão frequente em nossas escolas, é resultante de uma concepção pedagógica arcaica, mas tradicionalmente dominante.Nela, a educação é concebida como mera transmissão e memorização de informações prontas, e o aluno é visto como um ser passivo e receptivo. Em consequência, a avaliação se restringe a medir a quantidade de informações retidas. Nessa abordagem, em que educar se confunde com informar, a avaliação assume um caráter seletivo e competitivo. Comentário Embora as palavras verificação, exames, resultado, teste, prova, grosso modo, datem do início do século XX, ainda hoje observamos essas práticas nas escolas. Mais precisamente a partir da década de 1990 que as palavras teste, prova e exames foram sendo substituídas por avaliação. Porém, não se trata apenas de um “jogo de palavras”. É preciso ver se, de fato, houve mudança no ato de avaliar o educando, pois mudar a palavra não significa mudar as estratégias, as ações pedagógicas que dependerão da concepção que o professor tem de educação, assim como também da cultura da escola, se mais tradicional, mais conservadora ou construtivista e progressista. Modelos tradicional e progressista Parte inferior do formulário Saiba mais Um exemplo de questão de prova que envolve a memorização é: qual a diferença entre o morcego e a baleia? E a resposta esperada: “um mamífero que voa e um mamífero que nada”. Mas será que essa é a única diferença entre os mamíferos? Pois é, existem diversas peculiaridades, mas os alunos geralmente não são preparados para pensar, e sim para responder automaticamente. O conhecimento é concebido como algo pronto e acabado, verdade absoluta externa ao aluno que deve ser nele inculcada para depois ser memorizada, reproduzida e avaliada (Veiga, 2011). Mas, se perguntássemos sobre o que o aluno poderia dizer sobre a dinâmica da terra, provavelmente, as respostas seriam diversas, com possibilidades de qualidade, e não padronizadas. Mas aí, estaríamos respaldando a nossa prática em modelos mais construtivistas e progressistas da educação. Clique nos botões para ver as demais informações. Observe outra parte da definição de Nérici: [...] é por meio dela que se chega à conclusão sobre a utilidade ou não dos esforços despendidos pelo professor e alunos [...]. Segundo essa linha de pensamento, o que o aluno apresenta terá valor ou não; ele será considerado apto ou inapto. É o resultado final que determinará o futuro do aluno, se ele será aprovado ou reprovado. Não se considera, nesse modelo, o que o aluno conseguiu fazer, produzir; não se consideram “outras” habilidades além do domínio cognitivo da matéria. No modelo construtivista e progressista, o aluno é avaliado integralmente, por se entender que não apenas o domínio das ciências é fundamental no processo formativo, pois de que adianta um aluno de biologia estar em dia com os conteúdos da matéria e não demonstrar consciência ecológica? De que adianta um aluno do curso de docência estar em dia com os estágios de Piaget e não demonstrar atitude diante do outro; não ser participativo, não demonstrar desejo de crescer pessoal e profissionalmente? Note como avaliar é complexo. Também não precisamos escolher um modelo ou outro, pois todos possuem suas fragilidades, na medida em que uma pessoa avalia outra, conforme mencionamos no início desta aula; que o processo avaliativo corre o risco da subjetividade; de um professor criar estereótipos acerca de um aluno ou ficar impressionado com um aluno que fala o tempo todo querendo participar ou porque tirou uma nota muito boa na primeira avaliação. Precisamos ficar bem atentos, pois os fatos não são isolados. Talvez um aluno que conseguiu aumentar de 4,0 para 7,0 tenha mais impacto na avaliação do que outro aluno que mantém o seu 8,0 em duas avaliações. Avaliar integralmente significa trabalhar com o que o aluno conseguiu produzir, e não apenas com as suas falhas, com o que ele está devendo ao professor. Aprender a aprender Segundo Vasco Moretto (2003), a avaliação não deverá ser um acerto de contas, e sim um momento privilegiado de estudos. Mas sabemos que nem todas as pessoas pensam assim. Normalmente, os alunos não apreciam realizar provas; eles sentem medo de errar e da reprovação, o que é compreensível. Se observarmos as bibliotecas e filas nas “xerox”, constatamos que elas ficam mais cheias poucos dias antes da prova. Isso mostra que talvez tenhamos de construir uma nova cultura de aprendizagem, do aprender a aprender. Kensky e o pensamento progressista Segundo Kensky, ao assumirmos que o ato de avaliar se faz presente em todos os momentos da vida humana, estamos admitindo que ele também está presente em todos os momentos vividos em sala de aula. Vejamos: O dia a dia da sala de aula é um rico momento do cotidiano de cada uma das pessoas que ali se encontram. Na atualidade, a sala de aula é um dos raros espaços onde as pessoas se encontram fisicamente presentes para realizar atividades em comum e se ajudar mutuamente a aprender. A avaliação se transforma, assim, em dinâmica que orienta a prática. Como processo de investigação permanente, todas as atividades devem ser discutidas, planejadas, executadas e servir de impulso para novas realizações. O processo avaliativo percorre como fio condutor e propulsor cada um desses momentos de interação professor-alunos e conteúdos a serem trabalhados pedagogicamente. Na interação proporcionada pelas atividades pedagógicas, alunos e professores avaliam tudo e todos permanentemente. São formulados juízos provisórios que orientam a tomada de decisões e a definição das tarefas e atividades a serem realizadas, como a participação em um projeto, a melhor utilização do ambiente da sala de aula ou os questionamentos sobre determinado assunto, que podem resultar em vários desdobramentos de projetos e de pesquisas individuais ou coletivas. Essas definições, julgamentos e reorientações de percurso fazem parte de um processo que vai resultar, de alguma forma, no objetivo principal da ação docente: a aprendizagem do aluno. Portanto, é preciso ter consciência de que avaliar essa aprendizagem é uma ação que começa bem antes, no início da interação didática, e prossegue como energia circulante durante todo o processo de aprendizagem. Kensky, 2011, p.139-140 O pensamento de Kensky é bastante progressista, na medida em que reconhece a possibilidade de o professor também ser avaliado além do aluno, já que este pode tornar o processo de aprendizagem mais flexível, bem como estimular o trabalho coletivo e não o individualismo, o que é comum em práticas pedagógicas respaldadas no modelo tradicional de ensino. A avaliação escolar, na perspectiva da autora, é mais formativa, por valorizar o processo de aprendizagem em detrimento do produto final. Não é um fim em si mesmo, cabendo ao professor que respalda a prática nessa lógica ser pesquisador. Em outras palavras, trata-se de o professor se inquietar frente aos fatos, como por exemplo, o baixo rendimento de um aluno ou de uma turma; agir sobre essa realidade, buscando transformá-la, construindo uma nova ordem social. Leitura Para ilustrar uma prática construtiva, segue o Exemplo de uma professora de Língua Portuguesa que solicita aos alunos para fazerem uma redação, uma espécie de biografia. É preciso dar voz aos alunos, humanizar o discurso; abrir espaço para que eles se posicionem sem patrulhamento ideológico, resgatando o caráter polissêmico da escola. Posicionar-se diante dos alunos não com tantas certezas, mas com indagações e, se possível, não perder o desejo de querer se surpreender sempre. Cabe ao professor assumir o fracasso escolar como um desafio, buscando alternativas para sua superação. Vejamos uma cena do filme Escritores da liberdade onde a professora se sente desafiada a incentivar a construção da autonomia de seus alunos, passando a valorizar o processos de construção de identidade de cada um deles. Leitura Leia o Pensamento de Esteban sobre a avaliação escolar. A avaliação na ótica do exame Para continuarmos nossos estudos, vejamos a charge: Segundo essa lógica do exame, os alunos são classificados hierarquicamente como bons ou ruins, mas bom ou ruim para quê e paraquem? Para o sistema? Qual o nosso objetivo como docentes? Ajustar o indivíduo ao sistema ou contribuir para a sua emancipação social, para que questione o sistema, a sociedade que está posta? Qual lógica predomina em nossa prática? A lógica do capital, do mercado ou uma lógica mais humana? Ou será que precisamos escolher entre uma e outra? Pedro Demo afirma que não devemos negar a modernidade, as exigências do mercado, produtividade e o capitalismo. No momento em que a formação básica e continuada incidir decisivamente sobre a produtividade, pode alargar seu espaço de influência e ousar posição central na contenção dos desvarios do mercado. Isso significa substituir a lógica do mercado, do consumo por uma lógica mais humana, ética e não utilitarista. É importante o educador dialogar com o lado econômico e deixar de puritanismo. Ignorar seria a pior estratégia. Fundamental é reconhecer que hoje posições rígidas apenas fossilizam o conhecimento. O centro da inteligência é aprender a aprender. Saber pensar, elaborar com mão própria. Outros importantes autores Vamos ver o que dizem outros importantes autores brasileiros, que vêm se destacando ao trilhar esse caminho rumo a uma prática de avaliação da aprendizagem mais inclusiva, mediadora, emancipatória, com vistas à participação, à negociação e à democratização do saber, além dos que aqui já foram citados? Jussara Hoffman Jussara Hoffman propõe uma forma mediadora, como postura de avaliação e de vida, pois acredita que a ação avaliativa mediadora se desenvolve em benefício do educando e se dá, especialmente, pela proximidade entre quem educa e quem é educado. Luckesi Luckesi propõe que a prática de avaliação da aprendizagem supere o autoritarismo, buscando, pela via da autonomia do educando, a participação democrática para todos, o que significa: igualdade, fato que não se dará se não se conquistar a autonomia e a reciprocidade nas relações. Santos e Grumbach Santos e Grumbach (2005) se posicionam sobre a lógica do absurdo na prática da avaliação da aprendizagem. Para essas autoras, a avaliação da aprendizagem não existe dissociada do processo de ensinar e do projeto educativo da escola, e os profissionais da educação devem se preocupar com a qualidade da aprendizagem do aluno. Comentário O aluno pode errar? Muitos autores ainda veem o “erro” como algo inadmissível, repugnante, de incapacitação de quem os comete, numa total arrogância e preconceito. Contudo, o erro é decorrente de um padrão considerado correto por alguém, e quem não erra no processo de aprender e crescer? Infelizmente existem profissionais que acreditam estar acima do bem e do mal, num pedestal de hipocrisia e de autoritarismo. A crítica que precisa ser feita recai, na maioria das situações avaliativas, sobre os aspectos mais negativos do que positivos. Em vez de observar o processo de construção do aluno diante de sua própria realidade e as possíveis dificuldades transpostas para a construção do conhecimento, seja num trabalho ou numa prova, os professores, geralmente, quando respaldam a prática na pedagogia tradicional, optam por não apostar no aluno. Alguns desses professores não se preocupam em discutir os critérios avaliativos com suas turmas no início do período, antes de cada prova, de partilhar isso com os responsáveis, num trabalho de negociação. Denúncias: os professores e as escolas Muitos alunos ainda se calam diante do medo de punições, e muitos pais se veem coagidos, pois temem buscar explicações do professor sobre algo de que ele discorda ou não compreende, com medo de retaliações e represálias para com seus filhos. É claro, segundo as autoras, que essas denúncias têm dois lados: o dos professores e o das escolas. Ambos precisam ser ouvidos. As denúncias são muitas e vão desde a falta de educação dos alunos, a pouca dedicação e interesse nos estudos, a falta de apoio, cobrança e autoridade dos pais; o desinteresse dos pais em participar de reuniões escolares; até a falta de apoio das autoridades. Há outras denúncias além dessas: a pouca autonomia dos professores diante das propostas de trabalho que vêm dos órgãos gestores; a falta de disciplina na escola, a pouca autoridade de algumas direções na condução de atos disciplinares; a sobrecarga de trabalho, a pouca preocupação da escola em articular a comunidade de pais ao trabalho escolar. Entre idas e vindas, a avaliação caminha. Porém, é preciso que professores e partícipes assumam essa responsabilidade em relação à democratização do caminho para o acesso ao conhecimento. Reflexão sobre a prática avaliativa A prática avaliativa, quando responsável, amorosa, formativa e dialética, resgata a autoestima dos alunos e os ajuda na sua trajetória pessoal e de aprendizagem. Quando não, criam alienados, oportunizam desigualdades, alimentam desesperança e exclusão. Dessa forma, Santos e Grumbach (2005) conclamam os governos, escolas, educadores, educandos e responsáveis para uma jornada ética na avaliação com vistas à transformação da educação brasileira. Propomos uma reflexão a partir da letra de música do Gabriel O Pensador, Estudo errado: Leitura Leia sobre A avaliação escolar, fracasso escolar e exclusão social, de acordo com Maria Helena Patto (1981) e Coria Sabini (2003). Funções da avaliação Na visão de Libaneo (2013), a avaliação exerce três funções: Função pedagógico-didática Refere-se ao papel da avaliação no cumprimento dos objetivos gerais e específicos da educação escolar. Ao se comprovar sistematicamente os resultados do processo de ensino, evidencia-se ou não o atendimento das finalidades sociais do ensino, de preparação dos alunos para enfrentarem as exigências da sociedade, de inseri-los no processo global de transformação social e de propiciar meios culturais de participação ativa nas diversas esferas da vida social. Ao mesmo tempo, favorece uma atitude mais responsável do aluno em relação ao estudo, assumindo-o como um dever social. Cumprindo sua função didática, a avaliação contribui para a assimilação e fixação, pois a correção dos erros cometidos possibilita o aprimoramento, a ampliação e o aprofundamento de conhecimentos e habilidades e, desta forma, o desenvolvimento das capacidades cognoscitivas Função diagnóstica Permite identificar progressos e dificuldades dos alunos e a atuação do professor que, por sua vez, determinam modificações do processo de ensino para melhor cumprir as exigências dos objetivos. Na prática escolar cotidiana, a função de diagnóstico é mais importante porque é a que possibilita a avaliação do cumprimento da função pedagógico-didática e a que dá sentido pedagógico à função de controle. A avaliação diagnóstica ocorre no início, durante e no final do desenvolvimento das aulas ou unidades didáticas. No início, verificam-se as condições prévias dos alunos de modo a prepará-los para o estudo da matéria nova. Esta etapa inicial é a sondagem de conhecimentos e de experiências já disponíveis, bem como de provimento dos pré-requisitos para a sequência da unidade didática. Durante o processo de transmissão e assimilação, é feito o acompanhamento do progresso dos alunos, apreciando os resultados, corrigindo falhas, esclarecendo dúvidas, estimulando-os a continuarem trabalhando até que alcancem os resultados positivos. Ao mesmo tempo, essa avaliação fornece ao professor informações sobre como ele está conduzindo o seu trabalho: andamento da matéria, adequação de métodos e materiais, comunicação com os alunos, adequabilidade da sua linguagem etc. Finalmente, é necessário avaliar os resultados da aprendizagem no final de uma unidade didática, do bimestre ou do ano letivo. A avaliação global de um determinado período de trabalho também cumpre a função de realimentação do processo de ensino. Função de controle Refere-se aos meios e à frequência das verificações e de qualificação dos resultados escolares, possibilitando o diagnóstico das situações didáticas. Há um controle sistemático e contínuo que ocorre no processo de interação professor-alunos no decorrer das aulas, através de umavariedade de atividades, que permite ao professor observar como os alunos estão conduzindo-se na assimilação de conhecimentos e habilidades e no desenvolvimento de capacidades mentais. Nesse caso, não se deve quantificar os resultados. O controle parcial e final se refere a verificações efetuadas durante o bimestre, no final do bimestre e no final do semestre ou ano, caso a escola exija o exame final. Tipos de Instrumentos de Avaliação Vamos nos limitar apenas a citar diversos instrumentos de avaliação, por entendermos que a literatura especializada é bastante vasta sobre esse assunto, fazendo um breve comentário para concluirmos nossa aula. Testes, provas escrita, oral, de múltipla escolha, discursivas, de memorização, reflexivas, redação, trabalhos, individual e em grupo, seminários, pesquisas, observação e registro em diário de bordo, portfólio, autoavaliação, conselho de classe. Dica Sobre os instrumentos de avaliação, é fundamental que o professor seja claro em seus critérios. No caso das provas e testes, mencionar o valor das questões, comentar a prova após entrega dos resultados, evitar comparações desnecessárias que expõem o aluno diante da turma, evitar hierarquizá-los entregando as provas da maior nota para a menor ou afixando seus nomes e respectivos conceitos no quadro de avisos da sala de aula. Esses são cuidados que, se o professor tomar, muito contribuirá para a relação aluno-professor e consequentemente para o processo de aprendizagem, pois se estabelece uma relação de confiança, de parceria, de cumplicidade. É importante ressaltar ainda que os instrumentos de avaliação não se excluem; eles se complementam, cabendo ao professor diversificar os caminhos, visando contemplar os diversos saberes dos educandos, as múltiplas inteligências. Ele deve levar em conta que há aqueles que apresentam facilidade na escrita; outros na oralidade, na criatividade, no relacionamento, na cinestesia, na arte... E que o professor não perca o desejo de querer se surpreender sempre a cada dia, conforme vai tecendo o seu cotidiano escolar. Aula 10: Trabalho docente Analisando os Fenômenos Educativos à Luz das Teorias no Campo da Educação Na turma A, os alunos pareciam desanimados, apáticos e infelizes. Na turma B, todos os alunos estavam atentos e interessados. O que produziu a diferença? Turma A Na turma A, o professor chamou um dos alunos para definir uma palavra. O aluno deu a ideia correta da palavra, mas não a apresentou numa sentença completa. Tudo o que o professor disse foi: “Errado!” O aluno ficou constrangido e escorregou na carteira, inibido por ter falhado perante o grupo. Turma B Na turma B, a professora pediu a definição de museu. Um aluno disse: “É um lugar onde ficam os peixes”. No lugar de dizer “errado”, a professora perguntou: “De onde você tirou essa ideia?” O aluno explicou: “Quando era criança, fui a um museu e lá vi o esqueleto de uma baleia”. ”É verdade” — disse a professora. “De fato, existem esqueletos de peixes em museus, mas o lugar onde se colocam os peixes vivos é...” Alguém disse: “Um aquário”. A professora da turma B, ao contrário do professor da turma A, tinha curiosidade em saber como o aluno adquire a ideia, como aprende, incentivando a turma a se envolver no assunto. Ela construiu algo sobre o que já existia em suas mentes. Estava preocupada com o processo de aprendizagem – o efeito da experiência sobre o desenvolvimento do aluno, e não simplesmente com os resultados. Podemos dizer que o professor da turma A respalda a prática na pedagogia tradicional, na medida em que encerra a discussão, falando que a resposta do aluno estava errada, incompleta, ou seja, não estava da forma como ele, certamente, determinou previamente. Assim, fica evidente que o professor trata o conteúdo como verdade absoluta, não admitindo discussão, não incentivando a participação dos educandos, não os incluindo no processo de aprendizagem. Educação bancária No centro do processo, é o professor que detém o saber e espera que o aluno assimile-o passivamente. A esse modelo, o autor denominou de educação bancária, enciclopedista, conteudista. Segundo Paulo Freire (1987) (p. 57-58): 01 A educação se torna um ato de depositar, em que os educandos são os depositários e o educador o depositante. Em lugar de comunicar-se, o educador faz comunicados e depósitos que os educandos, meras incidências recebem pacientemente, memorizam e repetem [...]; 02 A única margem de ação que se oferece aos educandos é a de receberem os depósitos, guardá-los e arquivá-los [...] no fundo, os grandes arquivados são os homens [...] arquivados, porque, fora da busca, fora da práxis, os homens não podem ser; 03 Educador e educandos se arquivam na medida em que; nesta distorcida visão da educação, não há criatividade, não há transformação, não há saber. Só existe saber na invenção, na reinvenção, na busca inquieta, impaciente, permanente, que os homens fazem no mundo, com o mundo e com os outros. [...]; 04 Na visão bancária da educação, o ‘saber’ é uma doação dos que se julgam sábios aos que julgam nada saber. Doação que se funda numa das manifestações instrumentais da ideologia da opressão – a absolutização da ignorância, que constitui o que chamamos de alienação da ignorância, segundo a qual esta se encontra sempre no outro; 05 O educador que aliena a ignorância se mantém em posições fixas, invariáveis. Será sempre o que sabe, enquanto os educandos serão sempre os que não sabem. A rigidez destas posições nega a educação e o conhecimento como processos de busca. Escolas matam a criatividade? A relação aluno - professor é marcada pela hierarquia, pelo distanciamento e formalidade. O aluno não se sente representado no currículo escolar, pois não participa como sujeito protagonista do processo de aprendizagem. Paulo Freire nos diz que no modelo da educação bancária não há criatividade, não há transformação e não há saber. Como a escola poderia se transformar? É impossível discutir Educação sem citar Ken Robinson. Ele escreveu dez livros, lecionou em diversas universidades britânicas e recebeu dezenas de prêmios. Mas ele é mais conhecido pelas suas palestras no TED. Assista a seguir “Porque escolas matam a criatividade”, onde Ken Robinson expõe suas ideias a respeito da necessidade de uma revolução do sistema educacional, e não de uma simples reforma. Essa mudança não consistiria em uma melhoria de um modelo falho, mas uma reforma que o transformaria em algo novo, e por vezes melhor. A cultura do silêncio Na condição da educação bancária, o aluno é o sujeito passivo e sua formação é meramente reprodutora, contribuindo apenas para garantir a manutenção da estrutura social vigente, ou seja, garantir o status quo. Paulo Freire (1987, p. 59) sinaliza para a cultura do silêncio e acrescenta que, nesse caso: 1 O educador é o que educa; os educandos são educados. 2 O educador é o que sabe; os educandos, os que não sabem. 3 Educador é o que pensa; os educandos, os pensados. 4 O educador é o que diz a palavra; os educandos, os que a escutam docilmente. 5 O educador é o que disciplina; os educandos, os disciplinados. 6 O educador é o que opta e prescreve sua opção; os educandos, os que seguem a prescrição. 7 O educador é o que atua; os educandos, os que têm a ilusão de que atuam, na atuação do educador. 8 O educador escolhe o conteúdo programático; os educandos, jamais ouvidos nesta escolha, acomodam-se a ele. 9 O educador identifica a autoridade do saber com sua autoridade funcional, que opõe antagonicamente à liberdade dos educandos; estes devem adaptar-se às determinações daquele. 10 O educador, finalmente, é o sujeito do processo; os educandos, meros objetos. Aula teórica X prática Vamos observar dois tipos de aula: Aula 1 Na primeira aula, o professor disserta sobre o conceito de mamífero de forma abstrata e universal. Repare que os alunos desconhecem o conceito, têm dúvidas, interrogações. Aula 2 Já na segunda aula, o professor demonstra “ao vivo e a cores” o conceito de mamífero para que o aluno visualize, na prática, o conceito demamífero. Podemos dizer que a aula 1 foi respaldada na pedagogia tradicional e a aula 2 foi respaldada pelo modelo escola-novista, com influências de J. Dewey e J. Piaget. Aula prática No modelo escola-novista, os alunos aprendem fazendo, vendo, no plano concreto, debruçando-se diretamente sobre o objeto de estudos, o que facilita o aprendizado, na medida em que mobiliza positivamente a motivação dos estudantes em participar ativamente do processo de aprendizagem. Mostrar “ao vivo e a cores” o objeto de estudos não garante a visão crítica sobre o que se está estudando, pois qual o sentido desta prática? Se desejamos formar o aluno criticamente frente ao mundo, precisamos levantar questionamentos a respeito do objeto de estudos. Talvez um debate sobre a alimentação, o direito a uma necessidade básica; discutir sobre a miséria, sobre a fome, sobre a desigualdade social. Podemos dizer o mesmo a respeito de aulas em que o professor solicita aos alunos que plantem o feijão no algodão para que eles estudem, conheçam as partes do vegetal; mas, se a aula parar por aí, apenas na demonstração, apesar de prática, não abriremos espaço para que os alunos manifestem suas inquietações frente à realidade vivida. A construção de uma nova ordem social Cabe ao professor contribuir para a formação crítica, emancipada e transformadora dos educandos, instigando-os a pensar criticamente, visando construir uma nova ordem social. Em outras palavras, o professor os faz acreditar que os fatos não são inexoráveis, não estão consumados por uma ideologia dominante de que eles não são capazes de terem acesso a uma alimentação de qualidade, dentre outras necessidades, tais como educação, lazer, transporte, moradia, saúde, segurança, trabalho etc. Note que a educação pode funcionar como um instrumento de opressão ou libertação e transformação, e que isto não ocorre apenas na relação aluno - professor, mas que a partir da prática docente, é possível contribuir para transformar o sistema. O vídeo a seguir é uma cena do filme Sociedade dos Poetas Mortos, onde conta que em 1959, na Welton Academy, em uma tradicional escola preparatória, um ex-aluno volta à instituição como o novo professor de literatura, mas logo seus métodos de incentivar aos alunos a pensarem por si mesmos cria um choque com a ortodoxa direção do colégio. Isso ocorre, principalmente, quando o docente trata da "Sociedade dos Poetas Mortos" com seus alunos. Ficha técnica: DEAD Poets Society = SOCIEDADE dos poetas mortos. Intérpretes: Robin Williams, Ethan Hawke, Robert Sean Leonard. EUA: Disney / Buena Vista, 1989. 128 min., son., color. Não é de estranhar, pois, que nesta visão bancária da educação, os homens sejam vistos como seres da adaptação, do ajustamento, que se conformam com os fatos. Quanto mais se exercitem os educandos no arquivamento dos depósitos que lhes são feitos, tanto menos desenvolverão em si a consciência crítica de que resultaria a sua inserção no mundo, como transformadores dele. Quanto mais se lhes imponha passividade, tanto mais ingenuamente, em lugar de transformar, tendem a adaptar-se ao mundo, à realidade parcializadas nos depósitos recebidos. Na medida em que esta visão bancária anula o poder criador dos educandos ou o minimiza, estimulando sua ingenuidade e não sua criticidade, satisfaz aos interesses dos opressores: para estes, o fundamental não é o desnudamento do mundo, a sua transformação [...] O que pretendem os opressores é transformar a mentalidade dos oprimidos e não a situação que os oprime, e isto para que, melhor adaptando-os a esta situação, melhor os dominem. O que é Práxis? De acordo com Vázquez, o homem comum só concebe a prática como prática-utilitária, isto é, aquilo que ele usa para satisfazer as necessidades imediatas da vida cotidiana, o que não é suficiente quando pensamos em construir um mundo mais justo, digno, democrático e, portanto, melhor de se viver. O homem crítico e não pragmatista apenas tem um olhar mais amplo e não imediatista, individualista, pois está comprometido com o mundo, e não apenas consigo mesmo. Nessa perspectiva, a práxis, por sua vez, é: A atividade humana que produz objetos, sem que, por outro lado, essa atividade seja concebida com o caráter estritamente utilitário que se infere do prático na linguagem comum [...] A práxis é a atividade humana transformadora da realidade natural e humana. Saiba mais Diferença entre prática e práxis É preciso reforçar que não é suficiente uma aula prática para formar um aluno crítico, pois, o sentido da prática pode se perder caso o professor não tenha esses valores interiorizados dentro de si; se a sua própria formação docente é acrítica e pragmatista. Muitos pensam que propor uma aula prática, lúdica, dinâmica, experimental, em laboratórios e aulas-passeio é uma solução para os problemas da educação, para os problemas sociais, mas há uma diferença substancial entre as palavras prática e práxis. Para Vázquez, A prática tem uma dimensão prático-utilitária quando tenta resolver apenas as necessidades imediatas. O homem comum, segundo o autor, “considera a si mesmo como o verdadeiro homem prático; é ele que vive e age praticamente”. Dentro de seu mundo, as coisas não apenas são e existem em si, como também são e existem, principalmente, por sua significação prática, na medida em que satisfazem necessidades imediatas de sua vida cotidiana [...] o mundo prático – para a consciência comum – é um mundo de coisas e significação em si. Práticas pedagógicas Como atividade humana, a prática pedagógica pode se constituir em atividade de prática, numa visão utilitarista, ativista e espontaneísta, ou sem uma práxis guiada por intenções conscientes. Dessa forma, ela toma uma dupla diretriz: de um lado, temos uma prática pedagógica repetitiva e, de outro, reflexiva (Veiga, 1989). Na pratica pedagógica repetitiva, a unidade teoria e prática é rompida, a fragmentação do conhecimento encontra espaço para efetivar-se, havendo dificuldades para a introdução do novo. Neste terreno, a prática do professor vai se efetivando num marasmo respaldado pela rígida burocracia e controle escolares (Veiga, 1989). As ações do professor não são mais pensadas, ele faz por fazer, sem conhecimento de causa, sem saber por que fazer; ele executa porque lhe determinaram e não porque está consciente do valor ou não da ação na vida dos cidadãos. [no cotidiano da atividade docente] as ações parecem acontecer sem dúvidas nem reflexões, num ativismo sem precedentes, o qual pode levar o professor a alienar-se do seu trabalho e dos seus pares, correndo o risco de não se reconhecer no que realiza. Embora haja nele certa consciência, mesmo débil, em relação à sua prática, esta tende a desaparecer pelo caráter mecânico e burocratizado dessa prática. As condições concretas de trabalho do professor transformam-no no último elo de uma cadeia rígida de poder, motivo pelo qual ele se sente impelido a cumprir um papel no qual não se reconhece. Regimento Escolar Na sala de aula, o trabalho do professor é condicionado pelo regimento escolar, pelas leis do sistema de ensino, pelas relações de emprego e pela formação deficiente e inadequada que possui. Regimento escolar é o documento administrativo e normativo de uma unidade escolar que, fundamentado na proposta pedagógica, estabelece a organização e o funcionamento da escola e regulamenta as relações entre os participantes do processo educativo. Saiba mais Legislação Básica para elaboração do Regimento Escolar: · Lei 9394/96 – Lei de Diretrizes e Bases da Ed. Nacional; · Deliberação CEE 10/97 – Fixa normas para elaboração do Regimento dos estabelecimentos do Ensino Fundamental e Médio; · Indicação CEE 9/97– Diretrizes para elaboração do Regimento das escolas no Estado de São Paulo; · Indicação CEE 13/97 – Diretrizes para elaboração do Regimento das escolas no Estado de São Paulo; · Indicação CEE 67/98 – Normas Regimentais Básicas para as Escolas Estaduais. Praxis humana total É preciso ter uma consciência elevada da práxis para poder captar e exprimir de modoadequado o verdadeiro significado da práxis humana total e de suas manifestações particulares, concretas e específicas, como é o caso da prática pedagógica. Essa prática, como forma específica de práxis, é uma dimensão da prática social dirigida por objetivos, finalidades e conhecimentos, vinculada com a prática social mais ampla Veiga, 1989. Isso significa que, se desejamos contribuir para uma formação mais crítica, para uma sociedade mais democrática, mais justa, cabo ao professor ser, igualmente, crítico, e não mero reprodutor de práticas alheias. Senso de coletividade Cabe ao professor despertar no educando o senso de coletividade, o desejo de ir além do imediatismo, compreendendo a educação como instrumento de transformação de realidades sociais, e não apenas para mobilizar a motivação pessoal, o interesse pessoal, visando à aprovação no final do ano letivo. É preciso querer mais para os nossos alunos: que eles, de fato, se comprometam socialmente com o que estão fazendo, estudando, afinal, o que ficamos fazendo anos sentados nos bancos escolares, não é mesmo? Construindo uma sociedade O projeto de escola deverá ser mais aberto, e não apenas responder aos interesses de uma sociedade capitalista, respaldada na lógica do mercado, e, portanto, individualista e competitiva. Em se tratando de educação, podemos compreendê-la como superação, contribuição, mudança social, construção de uma sociedade mais solidária e humana. Avaliação Tradicional X Avaliação Construtivista/ Progressista No caso desta charge, o professor respalda a prática no modelo tradicional, na medida em que compara os alunos reforçando a fragilidade de Alcides, expondo-o publicamente, o que mobiliza negativamente sua autoestima. Posturas como essa do professor fazem os alunos temerem as avaliações. A avaliação do rendimento escolar acaba por se constituir como um instrumento de reprodução das relações de poder típicas de uma sociedade dividida em classes sociais. Em outras palavras, ela se constitui como um elemento de seleção “natural” entre os que sabem e os que não sabem, entre os que se dedicam e os que não se dedicam, cabendo ao professor aprender a lidar com o aluno real e não, apenas, com o aluno “ideal”. O aluno ideal existe? Ideal pra quê e pra quem? Para o sistema? Ideal, porque se enquadrou no sistema, na medida em que apresenta as habilidades cognitivas exigidas pelo mesmo? Nessa perspectiva, a avaliação é entendida como procedimento de medida e tem por finalidade a classificação do aluno, com base nas notas obtidas, tendo em vista a seleção daqueles com condições de prosseguir nos estudos; portanto, é excludente. Com esse discurso, não estamos querendo dizer que devemos aprovar todos os alunos incondicionalmente, mas que devemos, como professores, reconhecer “outras” habilidades, saberes, tão formativos quanto o domínio das ciências, admitindo que as pessoas são diferentes. Atenção Para Mesquita e Coelho (2008): O sistema de notas introduzido na escola, com base nessa concepção, passa a ter a função de medir o conhecimento dado pelo professor de forma decorativa e memorizativa. Observa-se, nesse tipo de avaliação, sua forma disciplinadora de condutas sociais: se o aluno não atingir a média estabelecida pela rede de ensino, é punido com a reprovação. Neste contexto, a avaliação constitui um fim em si mesmo, pois é utilizada como instrumento de medição da capacidade de apreensão de conteúdos. Estudo de casos Veja agora os casos a seguir: · Conflito na Aula; · O Aluno Ideal; · Aula de Matemática; · A visão Reducionista. Fábula: A Menina e o Leite A professora do 5º ano do Ensino Fundamental pede aos alunos que leiam a fábula a seguir, e em seguida, ela dita as respostas para as perguntas referentes ao texto. Vamos à leitura da fábula e em seguida, refletir sobre a ação da professora? A menina não cabia em si de felicidade. Pela primeira vez iria à cidade vender o leite de sua vaquinha. Trajando o seu melhor vestido, ela partiu pela estrada com a lata de leite na cabeça. Enquanto caminhava, o leite chacoalhava dentro da lata. E os pensamentos faziam o mesmo dentro da sua cabeça. “Vou vender o leite e comprar uma dúzia de ovos”. “Depois, choco os ovos e ganho uma dúzia de pintinhos”. “Quando os pintinhos crescerem, terei bonitos galos e galinhas”. “Vendo os galos e crio as frangas, que são ótimas botadeiras de ovos”. “Choco os ovos e terei mais galos e galinhas”. “Vendo tudo e compro uma cabrita e algumas porcas”. “Se cada porca me der três leitõezinhos, vendo dois, fico com um e...”. A menina estava tão distraída que tropeçou numa pedra, perdeu o equilíbrio e levou um tombo. Lá se foi o leite branquinho pelo chão. E os ovos, os pintinhos, os galos, as galinhas, os cabritos, as porcas e os leitõezinhos pelos ares. Não se deve contar com uma coisa antes de consegui-la. (Jean de La Fontaine. Fábulas de Esopo. SP, Scipione, 1998. In: VASCONCELOS, A. Aprender juntos português: ensino fundamental 4. São Paulo: SM, 2006.) Releia a moral da fábula: “Não se deve contar com uma coisa antes de consegui-la”. Vejamos, a seguir, alguns questionamentos levantados a respeito da fábula que acabamos de ler e suas respectivas respostas: Você concorda com esse ensinamento ou discorda? Explique: Sim, porque nós devemos sempre fazer algo pensando no futuro. Explique o sentido do ensinamento que você marcou: Sempre há sacrifício e custo para alcançarmos o que queremos obter. O que faltou à menina para conquistar os objetivos que tinha? Faltou determinação e atenção. No início do texto, a menina não cabia em si de felicidade. E no final do texto, quais sentimentos ela, provavelmente, experimentou? Angústia, tristeza e arrependimento. Se, por algum motivo, você não consegue atingir um de seus objetivos, que atitude você tem: desiste ou tenta novamente? Comente: Eu tento novamente, mas com outra estratégia que dê certo. Leitura Você sabia que essas respostas não foram dadas pelos alunos do 5º ano, e sim pela professora, que solicita que todos os alunos as copiam, não oferecendo oportunidade para que eles debatessem e se manifestassem, exercendo assim o senso de cidadania? Com o ditado, ela determina o que é certo e errado, e com isso, percebemos o objetivo da aula: o desenvolvimento moral dos alunos. Leia sobre esta Prática pedagógica. Professor Alienado e Alienante Um professor de Ciências falava a seus alunos sobre a fotossíntese. De repente, um problema: a luz do sol que entrava pela janela atrapalha a visão de alguns alunos que, desta maneira, não conseguiam ler o que o professor escrevia no quadro-negro. Alguém tentou fechar a cortina, mas um dos galhos da enorme folhagem que enfeitava a sala impediu que a cortina fosse totalmente fechada. Resolvido o problema, o professor continuou tranquilamente falando sobre fotossíntese e escrevendo suas explicações no quadro-negro. Tão condicionado estava a dar aula utilizando apenas saliva e giz que nem lhe ocorreu chamar a atenção de seus alunos para o fato de que estavam diante do fenômeno da fotossíntese: o galho da folhagem crescera voltado para a janela em busca da luz, comprovando o fenômeno que estavam estudando. Talvez esse professor nem tenha consciência sobre o que está fazendo, ensinando e sobre o sentido da aula. O professor não mostra familiaridade com o objeto de estudos; apenas repete e transmite o conteúdo que é repassado de geração a geração, sem um compromisso que vá além do desenvolvimento intelectual e moral do aluno. Nesse sentido, a ciência não é desvelada; o aluno estuda por estudar e, na maioria das vezes, fica com o sentimento da inutilidade dos conteúdos em suas vidas. Claro quem com esse discurso, não estamos afirmando que bastaria constatar na prática, no plano concreto, o fenômeno estudado teoricamente, mas que se vá além disso, além da constatação do fenômeno que, na verdade, o professor nem cogitou sua presença, mostrando-se totalmente alienado e alienante, lamentavelmente. Planejamento Educacional Por mais que o professor já encontre na instituiçãode ensino uma proposta de trabalho pronta, cabe a ele se apropriar criticamente acerca do que foi planejado por terceiros, (re)elaborar, resgatar a sua condição de sujeito autônomo. Planejar o processo educativo é planejar o indefinido, porque educação não é o processo, cujos resultados podem ser totalmente predefinidos, determinados ou pré-escolhidos, como se fossem produtos de correntes de uma ação puramente mecânica e impensável. Devemos, pois, planejar a ação educativa para o homem, não lhe impondo diretrizes que o alheiem, permitindo, com isso, que a educação ajude o homem a ser criador de sua história. A flexibilidade e a humildade científica são necessárias para que possamos fazer a revisão de nossas ações pedagógicas; fazer a leitura de mundo, o que não significa fazer qualquer coisa, mas aprender a lidar com as incertezas que surgem no cotidiano escolar. Um dos momentos essenciais para a elaboração de um planejamento é a definição das metas a serem alcançadas, bem como os conteúdos e a organização da ação educativa. Lembre-se que a prática educacional institucionalizada é intencional e deve ser organizada de forma lógica, precisa e rigorosa, ou seja, não deve decorrer de um espontaneísmo individual, mas de um trabalho coletivamente pensado, organizado e, fundamentalmente, contextualizado. No caso relatado em questão, o inusitado foi o fenômeno da fotossíntese apresentado “ao vivo e a cores”, mas, num espaço em que convivem pessoas, não podemos acreditar que controlaremos tudo e todos, pois isto seria uma ingenuidade. Logo, fica evidente a necessária compreensão crítica da relação que deve se estabelecer entre teoria e prática e que as mesmas se gestam a partir de uma materialidade concreta, viva.