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416 CAPÍTULO 45 Organização do Sistema Nervoso; Funções Básicas das Sinapses e Substâncias Transmissoras. O sistema nervoso, junto com o sistema endócrino, provê a maior parte das funções de controle para o corpo. Em termos genéricos, o sistema nervoso controla as atividades rápidas do corpo tais como: contrações musculares, eventos viscerais que se modificam rapidamente, e mesmo as velocidades de secreção de algumas glândulas endócrinas. O sistema endócrino, ao contrá- rio, regula principalmente as funções metabólicas corporais. O sistema nervoso é único, pela vasta complexidade das ações de controle que é capaz de executar. Ele recebe literalmente milhões de pequenos sinais de informação provenientes dos dife- rentes órgãos sensoriais e os integra em sua totalidade para deter- minar a resposta a ser elaborada pelo organismo. O objetivo deste capítulo é apresenta", primeiro, um apanhado do meca- nismo geral pelo qual o sistema nervoso executa tais funções. A partir daí, discutiremos as funções das sinapses do sistema nervoso central, estruturas básicas no controle da passagem dos sinais que entram, atravessam e saem do sistema nervoso central. Nos capítulos subseqüentes, analisaremos de modo detalhado as funções das partes individuais do sistema nervoso. No entanto, antes de começar essa discussão, seria interessante que o leitor revisse os Caps. 5 e 6, que apresentam, respectivamente, os fundamentos dos potenciais de membrana e da transmissão de sinais nos nervos e através das junções neuromusculares. MODELO GERAL DO SISTEMA NERVOSO O NEURÔNIO 00 SISTEMA NERVOSO CENTRAL - A UNIDADE FUNCIONAL BÁSICA O sistema nervoso central é composto de mais de 100 bilhões de neurônios. A Fig. 45.1 ilustra um neurônio típico do tipo encontrado no córtex cerebral motor. A informação aferente entra na célula em sua quase totalidade através de sinapses locali- zadas sobre os dendritos ou sobre o corpo celular neuronal; o número dessas conexões sobre cada neurônio pode variar desde apenas algumas centenas até vários milhares, chegando à ordem de 200.000. Por outro lado o sinal eferente se propaga ao longo de axônio único, o qual, por sua vez, fornece várias ramificações para outras partes do cérebro, medula espinhal ou periferia corpo- ral. Esses terminais irão fazer sinapses com os neurônios seguin- tes, com células musculares ou células secretoras. Uma propriedade especial da maioria das sinapses reside no fato de que o sinal passa apenas em direção à célula seguinte, exceto sob raras condições. Isso permite que os sinais sejam conduzidos nas direções requeridas para que sejam executadas as funções neurais necessárias. Também veremos que os neurô- nios são organizados em grande variedade de redes neuronais, que determinam as funções do sistema nervoso. A PARTE SENSORIAL DO SISTEMA NERVOSO -RECEPTORES SENSORIAIS A maioria das atividades do sistema nervoso é iniciada pela experiência sensorial emanada a partir dos receptores sensoriais, sejam eles receptores visuais, receptores auditivos, receptores táteis sobre a superfície corporal, ou outros tipos de receptores. A experiência sensorial pode provocar reação imediata, ou sua memória pode ser guardada no cérebro por minutos, semanas ou anos, podendo, assim, ajudar a determinar as reações corpo- rais em data futura. A Fig. 45.2 mostra a parte do sistema sensorial, a parte somática, que transmite a informação sensória! dos receptores de toda a superfície corporal e de algumas estruturas profundas. Esta informação entra no sistema nervoso central por meio dos nervos espinhais e é conduzida para as múltiplas áreas sensoriais primárias localizadas (1) em todos os níveis da medula espinhal, (2) na substância reticular do bulbo, ponte e mesencéfalo, (3) no cerebelo, (4) no tálamo e (5) nas áreas somestésicas do córtex cerebral. Porém, em adição, a essas áreas sensoriais primárias, os sinais também estão essencialmente interligados a todas as outras partes do sistema nervoso. A PARTE MOTORA — OS EFETORES O principal papel final do sistema nervoso é controlar as várias atividades corporais. Isto é conseguido por meio do con- trole exercido sobre (1) a contração dos músculos esqueléticos em todo o corpo, (2) a contração dos músculos lisos nos órgãos internos e (3) a secreção das glândulas endócrinas e exócrinas em várias partes do corpo. Estas atividades são chamadas, de forma coletiva, funções motoras do sistema nervoso, e os músculos e glândulas são denominados efetores, porque executam as funções ditadas pelos sinais nervosos. 417 Fíg. 45.2 O eixo sensorial somático do sistema nervoso Fig. 45.1 Estrutura de grande neurônio cerebral, mostrando suas partes funcionais importantes. (De Guyton: Basic Neuroscience: Anatomy and Physiology. Philadelphia, W. B. Saunders Co., 1987.) A Fig. 45.3 mostra o eixo motor do sistema nervoso envolvido no controle da contração do músculo esquelético. Funcionando paralelo a esse eixo há outro sistema semelhante, que controla os músculos lisos e glândulas, chamado sistema nervoso autonô- mico, que será discutido no Cap. 60. Observe, na Fig. 45.3, que os músculos esqueléticos podem ser controlados por níveis muito diferentes do sistema nervoso central, incluindo (1) a medula espinhal, (2) a substância reticular do bulbo, ponte e mesencéfalo, (3) os gânglios basais, (4) o cerebelo e (5) o córtex motor. Cada uma dessas diferentes áreas desempenha seu papel específico no controle dos movimentos corporais, os níveis mais baixos envolvidos primariamente com as respostas automáticas e instan- tâneas do corpo aos estímulos sensoriais; e as regiões superiores, com os movimentos deliberados, controlados pelos processos de pensamento do cérebro. PROCESSAMENTO DA INFORMAÇÃO - FUNÇÃO "INTEGRATIVA" DO SISTEMA NERVOSO A função primordial do sistema nervoso é a de processar a informação que chega, de tal forma que ocorra a resposta motora apropriada. Mais de 99% de toda a informação sensorial é descartada pelo cérebro como sendo irrelevante e não-impor-tante. Como exemplo, podemos citar o fato de que não são percebidas as partes do corpo que estão em contato com as roupas, bem como não é percebida a pressão da cadeira sobre as áreas corporais em contato com ela, quando estamos sentados. Da mesma forma, a atenção é dirigida para um objeto definido dentro do campo visual de visão, e mesmo o eterno ruído que existe no meio ambiente é ignorado em termos perceptivos. Uma vez selecionada, a informação sensória! considerada importante é, então, canalizada para as regiões motoras específicas do cérebro para causar as respostas desejadas. Essa canalização da informação é chamada de função integrativa do sistema nervoso. Dessa maneira, se a pessoa coloca a mão sobre um forno quente, a resposta desejada é a de levantar a mão. Ocorrem também outras respostas associadas, tais como mover todo o corpo para longe do forno e, talvez, até saltar com dor. Mesmo essas respostas representam apenas pequena fração da totalidade do sistema motor do corpo. Papel das sinapses no processamento da informação. A sinap-se é o ponto de junção entre um neurônio e o que a ele se segue e, por isso, é um local crucial para o controle da transmissão do sinal. Adiante, neste capítulo, discutiremos os detalhes da função sináptica. Entretanto, é importante colocarmos desde já que as sinapses determinam as direções em que os sinais nervosos se espalham dentro do sistema nervoso. Algumas sinapses transmitem sinais de um neurônio para o seguinte com facilidade, enquanto outras o fazem somente com dificuldade. Devemos também ter em mente que sinais fácilitatórios e inibitórios provenientes de outras áreas do sistema nervoso podem controlar a atividade sináptica, às vezes facilitando ou dificultando a transmissão do sinal. Além disso, alguns neurônios pós-sinápticos respondem com grande número de impulsos, enquanto outros respondem apenas com uns poucos. Assim, as sinapses exercem ação seletiva, sempre bloqueando os sinais fracos, enquanto permitem apassagem dos sinais fortes, sempre selecionando e amplificando certos sinais fracos e sempre canalizando os sinais em várias direções, em vez de o fazer simplesmente em uma direção. ARMAZENAMENTO DA INFORMAÇÃO — MEMÓRIA Apenas pequena fração da informação sensorial importante provoca resposta motora imediata. A maior parte do restante é armazenada para o controle futuro das atividades motoras e para uso nos processos de análise. A maior parte desse armazena- mento ocorre no córtex cerebral, mas não toda, uma vez que mesmo as regiões basais do cérebro e, provavelmente, a medula espinhal são capazes de 418 Fig. 45..3 Eixo do sistema nervoso. armazenar pequenas quantidades de informação. O armazenamento da informação é o processo a que chama- mos memória e isto é também uma função das sinapses. Isto é, cada vez que certos tipos de sinais sensoriais passam através de uma seqüência de sinapses, elas se tornam mais capazes de transmitir os mesmos sinais na próxima vez, um processo que é chamado de facilitação. Após os sinais sensoriais terem passado através das sinapses um grande número de vezes, as sinapses se tornam tão facilitadas que sinais gerados dentro do próprio cérebro são capazes de causar a transmissão dos impulsos através das mesmas seqüências de sinapses, mesmo quando o impulso sensorial não tenha sido excitado. Isso dá ao indivíduo a percepção de experimentar as sensações originais, apesar delas serem, na verdade, apenas memórias das sensações. Infelizmente, não sabemos o mecanismo exato pelo qual a facilitação das sinapses ocorre no processo da memória, mas o que se conhece sobre isso, bem como outros detalhes do processo da memória, será discutido no Cap. 57. Uma vez que as memórias tenham sido armazenadas no sistema nervoso elas se tornam parte do mecanismo de processamento. Os processos de decisão do cérebro comparam experiências sensoriais novas com as memórias armazenadas; as memórias ajudam a selecionar as informações sensoriais novas consideradas importantes, bem como a canalizá-las para áreas apropriadas de armazenamento, com vistas a utilizações futuras, ou para áreas motoras, causando respostas corporais. OS TRÊS PRINCIPAIS NÍVEIS DA FUNÇÃO DO SISTEMA NERVOSO CENTRAL O sistema nervoso humano tem características específicas adquiridas em cada estágio do desenvolvimento evolutivo. Dessa herança, três principais níveis do sistema nervoso central têm atributos funcionais específicos: (1) nível medular, (2) nível cerebral inferior, e (3) nível cerebral superior ou nível cortical. Nível medular Muitas vezes, conceituamos a medula espinhal como uma estrutura cuja função primordial é apenas a de possibilitar a condução de sinais que vêm da periferia corporal em direção ao encéfalo ou dos que, gerados em estruturas cerebrais, vão para a periferia corporal. Essa conceituação é totalmente equivo- cada. Mesmo após a secção transversa da medula na altura da região cervical superior, muitas funções medulares ainda ocorrem. Os circuitos neuronais da medula podem causar, por exemplo: (1) movimentos de marcha, (2) reflexos que afastam parte do corpo dos objetos, (3) reflexos que estiram os membros inferiores para suportar o corpo contra a ação da gravidade, e (4) reflexos que controlam os vasos sanguíneos locais, movimentos gastrintestinais, além de várias outras funções. Na verdade, os níveis superiores do sistema nervoso não enviam sinais diretamente para a periferia corporal. Em vez disso, eles enviam os sinais aos centros de controle da medula espinhal, simplesmente "comandando" os centros medulares a executarem as funções correspondentes. Nível cerebral inferior Muitas, se não a maioria, daquelas que denominamos ativi- dades orgânicas subconscientes são controladas em áreas cere- brais inferiores — bulbo, ponte, mesencéfalo, hipotálamo, tála- mo, cerebelo e gânglios basais. O controle subconsciente da pres- são arterial e respiração ocorre principalmente ao nível do bulbo e da ponte. O controle do equilíbrio é função combinada de partes mais antigas do cerebelo com a substância reticular do bulbo, ponte e mesencéfalo. Os reflexos de alimentação, tais como a salivação em resposta ao sabor dos alimentos e o lamber dos lábios, são controlados por centros localizados no bulbo, ponte, mesencéfalo, amígdala e hipotálamo. Da mesma forma, muitas respostas emocionais, tais como a raiva, a excitação, as atividades sexuais, a reação à dor ou a de prazer, podem ocorrer em animais sem córtex cerebral. Nível cerebral superior ou nível cortical Após o que foi relatado acerca das funções do sistema nervoso que podem ocorrer nos níveis medular e cerebral inferior, o que resta a ser feito pelo córtex cerebral? A resposta a esta pergunta é complexa, mas podemos começar pelo fato de ser o córtex cerebral uma área de armazenamento de informações extremamente grande. O córtex cerebral nunca funciona sozinho, mas sempre em associação com os centros inferiores do sistema nervoso. Sem o córtex cerebral, as funções dos centros cerebrais inferiores são sempre muito imprecisas. A grande massa de memória da informação cortical converte habitualmente essas funções em operações muito definidas e precisas. Finalmente, o córtex cerebral é essencial para a maior parte dos nossos processos mentais, apesar dele também não funcionar sozinho nisso. Na verdade, são os centros cerebrais inferiores que mantêm o córtex cerebral em alerta, abrindo seu banco de memórias para a máquina de pensamento do cérebro. Assim, cada parte do sistema nervoso executa funções espe- cíficas. Muitas funções integrativas são bem desenvolvidas na medula espinhal, e muitas das funções subconscientes se originam e são inteiramente executadas nas regiões cerebrais inferiores. No entanto, é o córtex que abre o mundo para o nosso pensa- mento. COMPARAÇÃO DO SISTEMA NERVOSO COM UM COMPUTADOR ELETRÔNICO Quando diferentes cientistas, em diferentes laboratórios do mundo, desenvolveram os primeiros computadores eletrônicos, rapidamente fi- cou claro que todas essas máquinas tinham muitas coisas em comum com o sistema nervoso. Em primeiro lugar, todas elas têm circuitos de entrada, que são comparáveis à parte sensorial do sistema nervoso, e circuitos de saída, comparáveis à parte motora do mesmo. 419 Nas vias de condução, situadas entre as entradas e saídas, estão localizadas estruturas envolvidas na execução de diferentes tipos de computações. Nos computadores simples, os sinais de saída são diretamente contro- lados pelos sinais de entrada, operando de modo semelhante ao dos reflexos simples da medula espinhal. No entanto, nos computadores mais complexos, a saída é determinada tanto pelos sinais de entrada como por informações já existentes, armazenadas em sua memória, o que é análogo aos reflexos mais complexos e aos mecanismos de processa- mento de nosso sistema nervoso superior. À medida que os computadores tornam-se mais complexos, é necessário adicionar ainda uma outra unida- de, denominada unidade de programação central, que determina a se- qüência de todas as operações. Essa unidade é análoga ao mecanismo cerebral que nos possibilita dirigir nossa atenção primeiro para um pensa- mento, sensação ou atividade motora, depois para outro, e assim por diante, até que seqüências completas de pensamento ou ação se desen- volvam. A Fig. 45.4 é um diagrama de bloco simples de um computador moderno. Mesmo o rápido estudo desse diagrama demonstra sua seme- lhança com o sistema nervoso. A analogia entre os componentes básicos do computador para utilização múltipla e os do sistema nervoso demons- tra que o cérebro é basicamente um computador que coleta continua- mente informação sensorial e, juntamente com as informações já armaze- nadas, computa a programação diária da atividade orgânica. Fig. 45.4 Esquema de um computador eletrônico de utilização geral mostrando os componentes básicos e suas inter-relações. AS SINAPSES DO SISTEMA NERVOSO CENTRAL Todo estudante de medicina sabe que a informação é trans- mitida nosistema nervoso central principalmente sob a forma de impulsos nervosos ao longo de uma sucessão de neurônios, um após o outro. Entretanto, não está claro, à primeira vista, que cada impulso: (1) pode ser bloqueado na sua transmissão de um neurônio para o seguinte, (2) pode ser modificado de um impulso único para impulsos repetitivos, ou (3) pode ser integrado com impulsos provenientes de outros neurônios, cau- sando padrões de impulsos altamente complexos em neurônios sucessivos. Todas essas funções podem ser classificadas como funções sinápticas dos neurônios. Tipos de sinapses — químicas e elétricas Os sinais nervosos são transmitidos de um neurônio para o seguinte através de junções interneuronais chamadas sinapses. No mundo animal, há basicamente dois tipos diferentes de sinap- ses: (1) a sinapse química e (2) a sinapse elétrica. No ser humano, quase todas as sinapses utilizadas para a transmissão de sinais, no sistema nervoso central são sinapses químicas. Nessas sinapses, o primeiro neurônio secreta, na jun- ção, uma substância química chamada neurotransmissor, e esse transmissor, por seu lado, atua sobre proteínas receptoras locali- zadas na membrana do neurônio seguinte para o excitar, o inibir ou modificar sua sensibilidade de alguma outra maneira. Até o momento já foram descobertas mais de 40 diferentes substâncias transmissoras. Algumas das mais conhecidas são: acetilcolina, norepinefrina, histamina, ácido gama-aminobutírico (GABA) e glutamato. As sinapses elétricas, por outro lado, são caracterizadas por canais diretos que conduzem eletricidade de uma célula para a seguinte. A maior parte delas é composta de pequenas estru- turas protéicas tubulares chamadas junções abertas, que permitem o livre movimento de tons do interior de uma célula para a seguinte. Essas junções foram discutidas no Cap. 4. Apenas algu- mas junções abertas foram encontradas no sistema nervoso cen- tral e seu significado geral não é conhecido. Por outro lado, é através das junções abertas e outras junções semelhantes que os potenciais de ação são transmitidos de uma fibra muscular lisa para a seguinte, na musculatura lisa visceral (Cap. 8) e tam- bém de uma célula muscular cardíaca para a seguinte, na muscu- latura cardíaca (Cap. 10). Condução unidirecional através das sinapses químicas. As sinapses químicas têm uma característica extremamente impor- tante que as torna altamente desejáveis como forma de trans- missão de sinais no sistema nervoso: elas sempre transmitem os sinais em uma só direção, isto é, do neurônio que secreta o transmissor, denominado neurônio pré-sináptico, para o neurô- nio sobre o qual o transmissor atua, denominado neurônio pós-si- náptico. Este é o princípio da condução unidirecional, através das sinapses químicas, e que é bem diferente da condução através das sinapses elétricas, que são capazes de transmitir os sinais em ambas as direções. Pense, por um momento, na extrema importância da proprie- dade de condução unidirecional. Ela permite que os sinais sejam dirigidos para pontos específicos. Na verdade, o que possibilita que o sistema nervoso execute essa miríade de funções de sensa- ção, controle motor, memória e muitas outras, é essa transmissão específica de sinais para áreas discretas e altamente circunscritas no mesmo. 420 ANATOMIA FISIOLÓGICA DAS SINAPSES A Fig. 45.5 ilustra um motoneurônio típico na ponta anterior da medula espinhal. Ele é composto de três partes principais: o soma, que é o corpo principal do neurônio; um axônio único, que se estende do soma em direção ao nervo periférico; e os dendritos, que são projeções finas do soma que se estendem por até 1 mm nas áreas circunvizinhas da medula. Sobre as superfícies dos dendritos ou do soma do motoneu- rônio repousam pequenos botões denominados terminais prê-si- nápticos, cuja quantidade pode atingir até cerca de 100.000 para cada motoneurônio. Aproximadamente 80 a 95% desses botões se situam sobre os dendritos e apenas 5 a 20% deles sobre o soma. Esses terminais são as extremidades de fibras nervosas que se originam em muitos outros neurônios; comumente, não mais que uns poucos desses terminais têm origem em um mesmo neurônio. Adiante ficará evidente que muitos desses terminais pré-sinápticos são excitatórios e secretam uma substância que excita o neurônio pós-sináptico, mas muitas outras são inibitórias e secretam uma substância que inibe esse neurônio. Tanto na medula espinhal como no cérebro há outros neurônios que diferem de modo marcante dos motoneurônios em (1) tamanho do corpo celular; (2) comprimento, largura e número de dendritos, com o comprimento podendo variar desde um valor praticamente nulo até vários centímetros; (3) comprimento e largura do axônio; e (4) número de terminais pré-sinápticos. que podem variar desde apenas uns poucos até várias centenas de milhares. Essas diferenças fazem com que neurônios de deferentes partes do sistema nervoso reajam de modo diferente a sinais que estão chegando até eles e, por esse motivo, executem funções diferentes. Os terminais pré-sinápticos. Estudos de microscopia eletrô- nica mostram que os terminais pré-sinápticos têm diversas formas anatômicas, mas, na maior parte das vezes, fazem lembrar peque- nos botões redondos ou ovais e, por isso, são freqüentemente denominados botões terminais, botões, pés terminais ou botões sinópticos. A Fig. 45.6 ilustra a estrutura básica do terminal pré-si- náptico. Ele é separado do soma neuronal pela fenda sinóptica, com largura da ordem de 200 a 300 Å. O terminal tem duas estruturas internas importantes para a função excitatória ou inibitória da sinapse: as vesículas sinópticas e as mitocôndrias. As vesículas sinápticas contêm substâncias transmissoras que, quando liberadas na fenda sináptica, podem excitar ou inibir o neurônio pós-sináptico — excitam, se a membrana neuronal contém receptores excitatórios, inibem, se ela contém receptores inibitórios. As mitocôndrias fornecem trifosfato de adenosina (ATP), que é requerido para a síntese de mais substância trans- missora. Quando um potencial de ação se propaga sobre um terminal pré-sináptico, a despolarização da membrana causa o esvazia- mento de um pequeno número de vesículas no interior da fenda sináptica e o transmissor liberado causa, por sua vez, imediata modificação das características de permeabilidade da membrana neuronal pós-sináptica, que leva à excitação ou inibição do neurô- nio, dependendo das características de seus receptores. Mecanismo pelo qual os potenciais de ação causam liberação do transmissor nos terminais pré-sinápticos - papel dos íons cálcio A membrana sináptica dos terminais pré-sinápticos contém grande número de canais de cálcio voltagem-dependentes. Esse local é bem diferente de outras áreas da fibra nervosa, que contêm poucos desses canais. Quando o potencial de ação despolariza o terminal junto com os íons sódio responsáveis pela maior parte do potencial de ação, ocorre o fluxo de grande número de íons cálcio para dentro do terminal. A quantidade de substância trans- missora que é liberada para o interior da fenda sináptica está diretamente relacionada ao número de íons cálcio que entram no terminal. O mecanismo preciso pelo qual os íons cálcio causam essa liberação não é conhecido, mas se acredita que seja o que se segue. Quando os íons cálcio entram no terminal sináptico, acredi- ta-se que eles se liguem a moléculas protéicas na superfície interna da membrana em locais denominados sítios de liberação. Essa ligação faz com que as vesículas transmissoras situadas na vizi- nhança do local também se liguem à membrana, na verdade fundindo-se com ela, e, finalmente, abram-se para o exterior por meio do processo chamado exoeitose, descrito no Cap. 2. Fig. 45.5 Um típico neurônio motor mostrando terminais pré-sinápticos no soma neuronal e nos dendritos. Observe também o axônio único. Fig. 45.6 Anatomia fisiológica da sinapse. 421 Comumente, a chegada de cada potencial de ação ao terminal pré-sináptico faz com que algumasvesículas liberem o transmissor para o interior da fenda sináptica. Com relação ao neurotrans- missor acetilcolina, cada vesícula contém entre 2.000 e 10.000 moléculas e há, no terminal pré-sináptico, vesículas suficientes para transmitir desde algumas centenas até mais de 10.000 poten- ciais de ação. Ação da substância transmissora sobre o neurônio pós- sináptico — a função dos receptores Nas sinapses, a membrana do neurônio pós-sináptico contém grande número de proteínas receptoras, também ilustradas na Fig. 45.6. Esses receptores têm dois componentes importantes: (1) um componente de ligação que se projeta para fora da mem- brana, no interior da fenda sináptica, onde ocorre o acoplamento com o neurotransmissor proveniente do terminal pré-sináptico e (2) um componente ionóforo que atravessa toda a membrana rumo ao interior do neurônio pós-sináptico. Por seu lado, o ionó- foro pode ser de um dos dois tipos: (1) um canal iônico quimica- mente ativado ou (2) uma enzima que ativa uma modificação metabólica interna dentro da célula. Os canais iônicos. Os canais iônicos quimicamente ativados (também chamados canais ligando-ativados) são comumente de três tipos: ( X ) canais de sódio, que permitem a passagem principal- mente de íons sódio (mas também de alguns íons potássio-), (2) canais de potássio, que permitem principalmente a passagem dos íons potássio através da membrana, e (3) canais de cloreto, que permitem a passagem de cloreto e de alguns outros íons. Como veremos adiante, a abertura dos canais de sódio excita o neurônio pós-sináptico. Por isso, a substância transmissora que abre os canais de sódio é chamada de transmissor excitatório. Por outro lado, a abertura dos canais de potássio e cloreto inibe o neurônio, e os transmissores que abrem um ou ambos os canais são denomi- nados transmissores inibitórios. Os receptores enzimáticos. A ativação de um receptor do lipo enzimático causa outros efeitos sobre o neurônio pós-si- náptico. Um dos efeitos é o de ativar a máquina metabólica celular, como, por exemplo, pela formação do monofosfato de adenosina cíclico (AMP cíclico) que, por seu lado, excita muitas outras atividades intracelulares. Outro efeito é o de ativar genes celulares, os quais produzem receptores adicionais para a mem- brana pós-sináptica. Ainda um terceiro efeito é o de ativar as proteínas quinases, que diminuem o número de receptores. Mu- danças como essas podem alterar a reatividade das sinapses por minutos, dias, meses ou mesmo anos. Por isso, as substâncias transmissoras que causam tais efeitos são muitas vezes chamadas de moduladores sinápticos. Experiências recentes demonstraram que tais moduladores são importantes em pelo menos alguns dos processos da memória, que discutiremos no Cap. 57. Receptores excitatórios e inibitórios Alguns dos receptores sinápticos, quando ativados, causam excitação do neurônio pós-sináptico, enquanto outros causam inibição. A importância de se ter tanto receptores excitatórios como inibitórios reside no fato de que isso dá uma dimensão adicional à função neural, permitindo que a ação neural seja tanto restringida quanto estimulada. Os diferentes mecanismos moleculares e de membrana em- pregados pelos diferentes receptores para causar excitação ou inibição incluem os seguintes: Excitação 1. Abertura dos canais de sódio para permitir o fluxo de grande número de cargas positivas para o interior da célula pós-si- náptica. Isso faz com que o potencial de membrana se altere em direção ao nível do limiar para a excitação. Essa é, de longe, a maneira mais usada de causar excitação. 2. Depressão da condução através dos canais de potássio ou cloreto, ou de ambos. Isso diminui a difusão de íons potássio, carregados positivamente, para fora do neurônio pós-sináptico, ou diminui a difusão de íons cloreto, carregados negativamente, para dentro. Em ambos os casos, isso tende a fazer com que o potencial de membrana se torne internamente mais positivo do que o normal, o que é excitatório. 3. Várias modificações do metabolismo celular interno no sentido de excitar sua atividade ou, em algumas situações, de aumentar o número de receptores excitatórios da membrana ou diminuir o número de receptores inibitórios. Inibição 1. Abertura dos canais de potássio através das moléculas dos receptores. Isso permite a difusão rápida de íons potássio positivamente carregados para fora do neurônio pós-sináptico, aumentando a negatividade intracelular, o que é inibitório. 2. Aumento da condutância de íons cloreto através dos re ceptores. Isso permite que íons cloreto carregados negativamente se difundam para o interior do neurônio pós-sináptico, o que também é inibitório. 3. Ativação de enzimas metabólicas que inibem as funções metabólicas celulares, ou que provoquem aumento do número de receptores sinápticos inibitórios ou diminuição do número de receptores sinápticos excitatórios. SUBSTÂNCIAS QUÍMICAS QUE FUNCIONAM COMO TRANSMISSORES SINÁPTICOS Mais de 40 substâncias químicas diferentes já foram provadas ou postuladas funcionarem como transmissores sinápticos. Muitas delas estão listadas nos Quadros 45.1 e 45.2, que as dividem em dois grupos distintos de transmissores sinápticos. Um dos grupos, formado por substâncias com moléculas pequenas, são transmissores de ação rápida. O outro grupo, constituído por grande número de neuropeptídios de peso molecular muito mais elevado, age bem mais lentamente. Os transmissores de baixo peso molecular e ação rápida são os que causam a maior parte das respostas agudas do sistema nervoso, tais como a transmissão dos sinais sensoriais em direção ao cérebro, bem como dos sinais motores em direção aos múscu- los. Os neuropeptídios, por outro lado, causam comumente ações mais prolongadas, tais como as modificações a longo prazo do número de receptores, o fechamento duradouro de certos canais iônicos e, possivelmente, as alterações a longo prazo do número de sinapses. Quadro 45.1 Transmissores de baixo peso molecular, de ação rápida Classe I Acetilcolina Classe II: As aminas Norepinefrina Epínefrina Dopamina Serotonina Histamina Classe III: Aminoácidos Ácido y-aminobutírico (GABA) Glicina Glutamato Aspartato 422 Quadro 45.2 Transmissores de ação lenta — neuropeptídios A. Harmônios liberadores hipotaiâmicos Hormônio liberador de tireotropína Hormônio liberador do hormônio luteinizante Somatostatina (fator inibitório do hormônio do crescimento) B. Peptidios pituitários ACTH 0-Endorfina Hormônio a-melanócito-estimulante Prolactina Hormônio luteinizante Tireotropina Hormônio do crescimento Vasopressina Ocitocina C. Peptidios que agem sobre o intestino e sobre o cérebro Leucina-encefalina Metionina-encefalina Substância P Gastrina Colecistocinina Polipeptídio intestinal vasoativo (PIV) Neurotensina Insulina Glucagon D. De outros tecidos Angiotensina II Bradicinina Carnosina Peptidios do sono Calcitonina Os transmissores de baixo peso molecular que agem rapidamente Os tipos de transmissores de baixo peso molecular, quase sem exceção, são sintetizados no citosol do terminal pré-sináptico e absorvidos, por transporte ativo, para o interior das vesículas transmissoras aí localizadas. Então, cada vez que um potencial de ação chega ao terminal pré-sináptico, algumas vesículas, por exocitose, liberam, ao mesmo tempo, o transmissor para o inte- rior da fenda sináptica, dentro de 1 milissegundo ou menos. A ação subseqüente desses tipos de transmissores sobre os recep- tores da membrana também ocorre comumente dentro de 1 ms ou menos. Mais comumente, o efeito é aumento da condutância dos canais iônicos; como exemplo temos o aumento da condu- tância ao sódio, que causa excitação, ou o aumento da condu- tância ao potássio, que causa inibição. No entanto, os tipos de transmissores de baixo peso molecular podem, ocasionalmente, estimular as enzimas receptores-ativadas, em lugar de abrir canais iônicos, provocando alterações do funcionamento da máquina metabólica intracelular. Reciclagem das vesículas que contêm transmissoresde baixo peso molecular. As vesículas que armazenam e liberam os trans- missores de baixo peso molecular são continuamente recicladas, isto é, são usadas várias e várias vezes. Após se fundirem com a membrana sináptica e liberarem o transmissor, as vesículas, em primeira instância, simplesmente se tornam parte da mem- brana sináptica. No entanto, dentro de alguns segundos ou minu- tos, a parte da membrana correspondente à vesícula se invagina para o interior do terminal pré-sináptico e se desprende, para formar uma nova vesícula. Essas membranas ainda contêm as proteínas de transporte apropriadas, necessárias para que nova quantidade de substância transmissora se concentre no interior da vesícula. A acetilcolina é um típico transmissor de baixo peso mole- cular que obedece os princípios acima com relação à síntese e liberação. Ela é sintetizada no terminal pré-sináptico a partir de acetil-coenzima A (acetil-CoA) e colina na presença da enzima colina acetiltransferase. A seguir, ela é transportada para o inte- rior de vesículas específicas. Quando, mais tarde, as vesículas liberam a acetilcolina na fenda sináptica, ela é quebrada em acetato e colina sob a ação da enzima colinesterase, que está ligada ao retículo proteoglicano que enche o espaço da fenda sináptica. Então, as vesículas são recicladas e a colina é transpor- tada ativamente de volta para o interior do terminal para ser, outra vez, usada na síntese de nova molécula de acetilcolina. Características de alguns dos mais importantes transmissores de baixo peso molecular. Os mais importantes transmissores de baixo peso molecular são os seguintes: Acetilcolina — é secretada pelos neurônios de muitas áreas cerebrais, mas especificamente pelas grandes células piramidais do córtex motor, por diversos neurônios dos gânglios basais, pelos motoneurônios que inervam os músculos esqueléticos, pelos neurônios pré-ganglionares do sistema nervoso autonômico, pe- los neurônios pós-ganglionares do sistema nervoso parassimpá- tico e por alguns neurônios pós-ganglionares do sistema nervoso simpático. Na maior parte das vezes, a acetilcolina tem efeito excitatório; no entanto, sabe-se que ela tem efeitos inibitórios em algumas terminações nervosas parassimpáticas periféricas, tais como a inibição do coração pelos nervos vagos. Norepinefrina — é secretada por muitos neurônios cujos corpos celulares estão localizados no tronco cerebral e hipotá- lamo. Especificamente, os neurônios secretores de norepinefrina, localizados no locus ceruleus da ponte, enviam fibras nervosas para áreas espalhadas no cérebro e ajudam a controlar o estado geral e o estado de ânimo mental. Em muitas dessas áreas, ela ativa receptores excitatórios mas, em umas poucas, ativa recep- tores inibitórios. A norepinefrina é também secretada pela maior parte dos neurônios pós-ganglionares do sistema nervoso simpá- tico, onde ela excita alguns órgãos mas inibe outros. Dopamina — é secretada por neurônios originários da subs- tantia nigra. Esses neurônios terminam principalmente na região estriatal dos gânglios basais. O seu efeito é comumente de ini- bição. Glicina — é secretada principalmente nas sinapses da medula espinhal. Provavelmente, atua sempre como transmissor inibi- tório. Ácido gama-aminobutírico (GABA) — é secretado por ter- minações nervosas na medula espinhal, no cerebelo, nos gânglios basais e em muitas outras áreas do córtex. Acredita-se que cause sempre inibição. Glutamato — é provavelmente secretado por terminais pré- sinápticos em muitas das vias sensoriais, bem como em muitas áreas do córtex, é provável que cause sempre excitação. Serolonina — é secretada pelos núcleos que se originam na parte mediana do tronco cerebral e se projetam para muitas outras áreas do sistema nervoso, especialmente para a ponta dorsal da medula espinhal e para o hipotálamo. A serotonina age como inibidora da via algésica na medula e acredita-se, tam- bém, que ela ajude a controlar o humor da pessoa, talvez até provocando sono. Os neuropeptídios Os neuropeptídios formam um grupo inteiramente diferente de neurotransmissores, sintetizados de modo diferente e cujas ações são lentas e, por outro lado, bastante diferentes das corres- pondentes aos transmissores de baixo peso molecular. Os neuropeptídios não são sintetizados no citosol dos termi- nais pré-sinápticos. Em vez disso, eles são sintetizados pelos ribossomas, localizados no corpo celular dos neurônios, como partes integrais de grandes moléculas protéicas, e são transpor- tados imediatamente para o retículo endoplásmico do corpo celu- 423 lar. O retículo endoplásmico e, subseqüentemente, o aparelho de Golgi funcionam juntos para fazer duas coisas: primeiro, eles quebram enzimaticamente a proteína original em fragmentos me- nores e, dessa maneira, liberam tanto o próprio neuropeptídio como seu precursor. Segundo, o aparelho de Golgi empacota o neuropeptídio em minúsculas vesículas transmissoras, que são liberadas no interior do citoplasma. As vesículas transmissoras são, então, transportadas por toda a extensão da célula até a extremidade das fibras nervosas por meio da corrente de fluxo iônico do citoplasma do axônio, com velocidade de fluxo de apenas alguns centímetros por dia. Finalmente, essas vesículas liberam seu transmissor em resposta a potenciais de ação, da mesma forma como ocorre com os transmissores de baixo peso molecular. Entretanto, há autólise da vesícula, e ela não é reuti- lizada. Devido ao seu laborioso método de formação, os neuropep- tídios são liberados em quantidades habitualmente muito meno- res que as dos transmissores de baixo peso molecular. No entanto, isso é parcialmente compensado pelo fato de que, geralmente, os neuropeptídios são mil ou mais vezes mais potentes que os transmissores de baixo peso molecular. Outra característica im- portante dos neuropeptídios é que, habitualmente, causam ações muito mais prolongadas. Algumas dessas ações incluem fecha- mento prolongado dos canais de cálcio, alterações prolongadas da máquina metabólica celular, alterações prolongadas na ativação ou desativação de genes específicos no núcleo celular e alterações prolongadas do número de receptores excitatórios ou inibitórios. Alguns desses efeitos podem durar dias ou, às vezes, meses ou anos. Infelizmente, nossos conhecimentos sobre as funções dos neuropeptídios estão ainda em seus primórdios. Liberação de apenas um só transmissor de molécula pequena para cada tipo de neurônio Quase invariavelmente, apenas um só tipo de transmissor de molécula pequena é liberado para cada tipo de neurônio. No entanto, os terminais de um mesmo neurônio também podem liberar, ao mesmo tempo, um ou mais neuropeptídios. Mais ain- da, qualquer que seja o transmissor ou neuropeptídio liberado em um terminal do neurônio, todos os outros terminais desse mesmo neurônio irão liberar os mesmos transmissores, não im- portando se os terminais são em número pequeno ou grande, como também se suas extremidades terminam dentro do sistema nervoso ou em órgãos periféricos. Remoção da substância transmissora nas sinapses Depois que o transmissor é liberado em um terminal nervoso, ele é destruído ou removido de alguma outra maneira, a fim de evitar que sua ação continue para sempre. No caso dos neuro- peptídios, eles são removidos principalmente por difusão para os tecidos vizinhos e, em seguida, são destruídos dentro de minu- tos ou horas por enzimas específicas ou não-específicas. Para os transmissores de ação rápida, a remoção ocorre comumente em alguns milissegundos, ò que pode ser conseguido por três maneiras diferentes: 1. Por difusão do transmissor da fenda para os líquidos em volta. 2. Por destruição enzimática dentro da fenda sináptica. No caso da acetileolina, por exemplo, a enzima colinesterase está presente na fenda, ligada à matriz de proteoglicano que enche o espaço. Cada molécula dessa enzima é capaz de quebrar até 10 moléculas de acetileolina a cada milissegundo, inativando a substância transmissora. Efeitossemelhantes ocorrem com outros transmissores. 3. Por transporte ativo de volta ao terminal pré-sináptico que o liberou e reutilização. Esse processo é denominado recap- tação do transmissor. Ele ocorre de forma intensa, principalmente nos terminais do sistema nervoso simpático, para recaptação de norepinefrina, como discutiremos no Cap. 60. O grau em que cada um destes métodos de remoção é utili- zado é diferente para cada tipo de transmissor. EVENTOS ELÉTRICOS DURANTE A EXCITAÇÃO NEURONAL Os eventos elétricos que ocorrem durante a excitação neuro- nal foram estudados especialmente nos grandes motoneurônios das pontas anteriores da medula espinhal. Por esse motivo, os eventos que serão descritos nas seções a seguir se relacionam essencialmente a esses tipos de neurônios. No entanto, à exceção de algumas diferenças quantitativas, eles também se aplicam à maior parte dos outros neurônios do sistema nervoso. O potencial de repouso da membrana do soma neuronal. A Fig. 45.7 ilustra o corpo de um motoneurônio, mostrando que o potencial de repouso da membrana é da ordem de -65 milivolts. Esse potencial é menor que os -90 milivolts encontrados nas grandes fibras nervosas periféricas e nas fibras musculares esqueléticas. Essa voltagem menor é, no entanto, importante, pois permite o controle tanto positivo como negativo do grau de excitabilidade do neurônio. Isto é, levando a voltagem para um valor menos negativo, torna a membrana do neurônio mais excitável, enquanto aumentando a voltagem para um valor mais negativo torna o neurônio menos excitável. Como será explicado nas seções seguintes, esta é à base dos dois modos de funcionamento dos neurônios — tanto a excitação quanto a inibição. Diferenças de concentração iônica, através da membrana do soma neuronal. A Fig. 45.7 também ilustra as diferenças de con- centração, através da membrana do soma neuronal, para os três íons considerados mais importantes para a função neuronal: íons sódio, íons potássio e íons cloreto. Na parte superior é mostrado que a concentração de íons sódio é muito grande no líquido extracelular mas é pequena no interior do neurônio. Esse gradiente de concentração é man- tido graças a uma potente bomba de sódio que bombeia continua- mente esse íon para fora do neurônio. A figura também mostra que a concentração de íons potássio é grande dentro do soma neuronal, mas muito baixa no líquido extracelular. Ela ilustra que também há uma bomba de potássio (a outra metade da bomba de Na+-K+, como já descrito no Cap. 4) que bombeia o potássio para o interior. No entanto, Fig. 45.7 Distribuição dos íons sódio, potássio e cloro através da mem- brana do soma neuronal; origem do potencial da membrana no interior do soma. 424 há vazamento de íons potássio através dos canais iônicos da mem- brana com velocidade suficiente para anular grande parte da eficiência da bomba de potássio. A concentração de íon cloreto é alta no líquido extracelular, mas é baixa dentro dos neurônios, conforme mostra a Fig. 45.7. Ela também mostra que a membrana é bastante permeável aos íons cloreto e que parece existir uma fraca bomba de cloreto. Mostra ainda que a razão da baixa concentração de íons cloreto dentro do neurônios se deve, em grande parte, ao potencial de -65 mV do interior do neurônios. Isto é, a voltagem negativa repele os íons cloreto negativamente carregados, forçando-os a fluírem para fora do neurônio através dos poros até que sua concentração iônica se torne muito maior do lado de fora que do lado de dentro. Vamos relembrar, neste ponto, o que aprendemos nos Caps. 4 e 5 sobre as relações entre as diferenças de concentrações iônicas e os potenciais de membrana. Deve ser lembrado que um potencial elétrico através da membrana, tendo polaridade e magnitude adequadas, é capaz de se opor plenamente ao movi- mento de íons através da mesma, a despeito das diferenças de concentração existentes entre o lado de dentro e o lado de fora da membrana. Tal potencial, que é capaz de exercer essa oposição total e exata ao movimento de cada tipo de íon, é chamado de potencial de Nernst para aquele íon. A equação para ele é a seguinte: Concentração fora Concentração dentro onde EMF é o potencial do lado de dentro da membrana em milivolts. O potencial será positivo (+) para um íon positivo, e negativo (-) para um íon negativo. Agora, vamos calcular o potencial de Nernst que exercerá oposição exata ao movimento de cada um dos três íons distintos: sódio, potássio e cloreto. Para a diferença de concentração de íons sódio mostrada na Fig. 45.7, 142 mEq/1 no exterior e 14 mEq/1 no interior, o potencial de membrana que exercerá oposição exata ao movi- mento do íon através dos canais de sódio, seria de +61 mV. No entanto, o verdadeiro potencial de membrana é de -65 mV, e não +61 mV. Por isso, os íons sódio normalmente se difundem para o interior do neurônios através dos canais de sódio; no entan- to, essa quantidade não c muito grande, porque a maior parte dos canais de sódio está normalmente fechada. Além disso, os íons que conseguem se difundir para o interior são, em condições normais, imediatamente bombeados para o exterior pela bomba de sódio. Para os íons potássio, o gradiente de concentração é 120 mEq/1 dentro dos neurônios e 4,5 mEqA do lado de fora. Isso origina um potencial de Nernst de -86 mV dentro do neurônios, que é mais negativo que os -65 mV realmente registrados. Por isso, há uma tendência dos íons potássio de se difundirem para o lado de fora do neurônios, o que é contraposto pelo contínuo bombeamento desses íons para o interior. Finalmente, o gradiente do íon cloreto, 107 mEq/1 fora e 8 mEq/1 dentro dos neurônios, corresponde a um potencial de Nernst de -70 mV dentro do neurônio, que é ligeiramente mais negativo que o valor realmente medido. Por isso, os íons cloreto tendem normalmente a fluir para o interior dos neurônios, e os que o conseguem são trazidos de volta para fora, provavelmente por meio de um bombeamento ativo de cloreto. Tenha em mente esses três potenciais e lembre-se da direção em que os diferentes íons tendem a se difundir, pois essa infor- mação será importante para o entendimento tanto da excitação quanto da inibição do neurônios pela ativação sináptica dos canais receptores. Origem do potencial de repouso da membrana do soma neuronal. A causa básica para que o potencial de repouso da membrana do soma neuronal seja da ordem de -65 mV é a bomba de sódio-potássio. Essa bomba causa a extrusão de mais íons sódio positivamente carregados para o exterior do que íons potássio para o interior - três íons sódio são transportados para fora enquanto dois íons potássio são transportados para dentro. Devido ao fato de existirem dentro do soma neuronal muitos íons negativamente carregados que não podem difundir-se através da membrana - íons protéicos, íons fosfato e muitos outros -, a extrusão do excesso de íons positivos para o exterior deixa alguns desses íons negativos não-difusíveis em desequilíbrio com os íons positivos no interior das células. Por isso, o interior do neurônio fica negativamente carregado como resultado da bomba de sódio-potássio. Esse princípio foi discutido com maiores detalhes no Cap. 5, em relação ao potencial de repouso da membrana das fibras nervosas. Além disso, como também foi explicado no Cap. 5, a difusão dos íons potássio para fora, através da membrana, é outra causa da negatividade intracelular. Distribuição uniforme do potencial dentro do soma. O interior do soma neuronal contém uma solução eletrolítica altamente condutora, o líquido intracelular do neurônios. Além disso, o diâmetro do soma neuronal é muito grande de 10 a 80 fim provocando ausência quase completa de resistência à condução da corrente elétrica de uma parte a outra no interior do soma. Por isso, qualquer modificação de potencial em qualquer parte do líquido intrassômico leva a mudança de potencial praticamente igual em todo o interior do soma neuronal. Isto é um princípio importante, pois é o principal fator envolvido na somaçãode sinais que chegam ao neurônio provenientes de várias fontes, como veremos em seções subseqüentes deste capítulo. Efeito da excitação sináptica sobre a membrana pós-sináptica - o potencial pós-sináptico excitatório. A Fig. 45.8A ilustra o neurônios em repouso, com um terminal pré-sináptico não-ex- citado em contato com sua superfície. O potencial de repouso da membrana em qualquer ponto do soma é de -65 mV. A Fig. 45.8B ilustra um terminal pré-sináptico que secretou seu transmissor na fenda entre o terminal e a membrana somática neuronal. Esse transmissor age sobre um receptor excitatório da membrana para aumentar a permeabilidade da membrana ao Na. Devido ao grande gradiente eletroquímico que tende a promover o influxo de íons sódio, o grande aumento da condutân- cia ao íon sódio permite a passagem desse íon através da mem- brana. O rápido influxo de íons sódio positivamente carregados para o neurônio neutraliza parte da negatividade do potencial de repouso da membrana. Assim, na Fig. 45.8B, o potencial de repouso da membrana passou de -65 mV para -45 mV. Essa modificação da voltagem do potencial de repouso neuronal, indo para um valor menos negativo, é chamada de potencial pós- sináptico excitatório (ou PPSE) porque, se esse potencial aumentar suficientemente, é capaz de evocar um potencial de ação no neurônio, excitando-o. Nesse caso, o PPSE é de +20 mV. No entanto, gostaríamos de chamar a atenção para um pon- to. A descarga de um só terminal pré-sináptico é incapaz de levar o potencial neuronal de -65 mV para -45 mV. Uma alteração dessa magnitude requer, na verdade, a descarga simultânea de muitos terminais - cerca de 40 a 80 para um motoneurônios comum - ao mesmo tempo ou em rápida sucessão. Isso ocorre pelo processo denominado somação, que será discutido em deta- lhe nas seções seguintes. Geração dos potenciais de ação no segmento inicial do axõnio que sai do neurônio - limiar de excitação. Quando o potencial pós-sináptico excitatório se eleva até valor suficiente, chega a um ponto em que se inicia um potencial de ação no neurônios. EMF (mV) = ±61 x log 425 Fig. 45..8 Três estados de um neurônio. A, Neurônio em repouso. B, Neurônio em estado excitado, com potencial intraneuronal aumentado devido ao influxo de sódio. C, Neurônio em estado inibido, com redução do potencial da membrana intraneuronal devido ã saída de íons potássio e ao influxo de íons cloro. Entretanto, o potencial de ação não se inicia na membrana somá- tica adjacente às sinapses excitatórias. Em vez disso, ele começa no segmento-inicial do axônio que deixa o soma neuronal. A principal razão para esse ponto de origem do potencial de ação reside no fato de que o soma tem, em sua membrana, relativa- mente poucos canais de sódio voltagem-dependentes, o que torna difícil a abertura do número de canais necessários para provocar um potencial de ação. Por outro lado, a membrana do segmento inicial tem concentração sete vezes maior de canais de sódio volta- gem-dependentes e, por isso, é capaz de deflagrar um potencial com muito mais facilidade que o soma neuronal. O potencial pós-sináptico excitatório capaz de deflagrar um potencial de ação no segmento inicial fica entre +15 e +20 mV, ao contrário do que ocorre com o soma, onde, para que seja deflagrado um potencial de ação, é necessário um potencial pós-sináptico de +30 mV ou mais. Uma vez deflagrado, o potencial de ação caminha tanto em direção periférica ao longo do axônio, como em direção con- trária. Eles são capazes de também se propagar até os dendritos, mas não em todos eles, pois, da mesma forma que o soma neuro- nal, os dendritos possuem muito poucos canais de sódio voltagem- dependentes e, por isso, são freqüentemente incapazes de gerar potenciais de ação. Assim, na Fig. 45.8B, é mostrado que, sob condições nor- mais, o limiar para excitação dos neurônios é da ordem de -45 mV. o que representa um potencial pós-sináptico excitatório de +20 mV, isto é, 20 mV mais positivo que o potencial de repouso normal do neurônio, que é de -65 mV. EVENTOS ELÉTRICOS NA INIBIÇÃO NEURONAL Efeitos das sinapses inibitórias sobre a membrana pós-sináp- tíca - o potencial pós - sináptico inibitório. As sinapses inibitórias, em lugar de abrirem os canais de sódio, abrem os canais de potássio ou de cloreto, ou ambos, permitindo que um ou os dois íons passem com facilidade através da membrana. Para entender como as sinapses inibitórias inibem o neurônio pós-si-nãptico, vamos relembrar o que aprendemos sobre os potenciais de Nernst tanto para os íons potássio como para os íons cloreto. Calculamos que, para os íons potássio, esse potencial é da ordem de -86 mV e, para os íons cloreto, da ordem de -70 mV. Os dois potenciais são mais negativos que os -65 mV registrados para o potencial de repouso da membrana neuronal. Por isso, a abertura dos canais de potássio permitem que os íons potássio positivamente carregados fluam para o exterior, o que tornará o potencial de membrana mais negativo que o normal. A abertura dos canais de cloreto permite que íons cloreto, negativamente carregados, fluam para o interior, o que vai fazer com que o potencial de membrana do neurônio fique mais negativo do que o normal. Isso aumenta a negatividade intracelular, o que é denominado hiperpolarização. Isso provoca, obviamente, inibição do neurônio, pois o potencial de membrana está agora mais longe do limiar de excitação. Por isso, o aumento da negatividade intracelular, para além do valor normal do potencial de repouso da membrana, é denominado potencial pós-sináptico inibitório (PPSI). Assim, a Fig. 45.8C ilustra o efeito causado pela ativação das sinapses inibitórias sobre o potencial de membrana, permi- tindo o influxo de cloreto ou o efluxo de potássio da célula, com o potencial de membrana indo do seu valor normal de -65 mV para o valor mais negativo de -70 mV. Esse potencial de membrana, que é 5 mV mais negativo, é o potencial pós-sináptico inibitório. Então, o PPSI nessa situação é -5 mV. Inibição dos neurônios sem provocar potencial pós-sináptico inibitório - "curto-circuito" da membrana. Algumas vezes, a ativação de sinapses inibitórias não altera o potencial de mem- brana ou causa potencial pós-sináptico muito pequeno, mas leva à inibição do neurônio. A razão pela qual algumas vezes o potencial de membrana não se altera está no fato de que, em alguns neurônios, as diferen- ças de concentração para os íons potássio e cloreto levam a poten- cial de equilíbrio de Nernst igual ao potencial de repouso da membrana. Por isso, quando os canais inibitórios se abrem, a resultante do fluxo dos íons é zero, e não ocorre potencial pós-si- náptico inibitório. Além disso, os íons potássio ou cloreto, ou ambos, difundem bidirecionalmente, através dos canais, que es- tão altamente permissíveis à passagem desses íons muito mais rapidamente que o normal, e esse alto fluxo inibe o neurônio da seguinte maneira: quando as sinapses excitatórias causam o fluxo de íons sódio para o interior do neurônio, os canais de potássio ou cloreto que estão muito permeáveis fazem com que o potencial pós-sináptico excitatório seja muito menor do que o usual, uma vez que qualquer tendência de mudança no potencial de repouso da membrana é imediatamente anulada pelo fluxo rápido de íons potássio ou cloreto, através dos canais inibitórios, trazendo o potencial de volta ao potencial de equilíbrio de Nernst para esses dois íons. Por isso, o fluxo de íons sódio necessário para se sobrepor ao fluxo de íons potássio ou cloreto e, conse- qüentemente, provocar a excitação, terá que ser entre 5 e 20 vezes maior que o normal. A propriedade dos íons potássio e cloreto tenderem a manter o potencial de membrana em um valor próximo ao do potencial de repouso, quando os canais inibitórios ficam muito permeáveis, c chamada de "curto-circuito" da membrana, que faz com que o fluxo de corrente de sódio, causado pelas sinapses excitatórias, seja ineficiente para a excitação da célula. Para expressar o fenômeno do curto-circuito mais matematicamente,é necessário relembrarmos a equação de Goldman, no Cap. 5. Essa equação mostra que o potencial de membrana é determinado pela somação da capacidade dos diferentes íons para transportar cargas elétricas através da membrana em ambas as direções. 426 O potencial de membrana se aproximará dos potenciais de equilíbrio de Nernst para os íons aos quais a membrana é mais permeável. Quando os canais inibitórios estão muito abertos, a membrana está muito permeável aos íons cloreto e potássio. Por isso, quando os canais excitatórios se abrem, os efeitos somados dos canais inibitórios fazem com que seja muito difícil a chegada do potencial neuronal aos valores limiares para a excitação Inibição pré-sináptica Além da inibição causada por sinapses inibitórias, operando sobre a membrana neuronal, que é chamada inibição pós-sináp- tica, comumente ocorre outro tipo de inibição nos terminais pré- sinápticos, antes que o sinal chegue à sinapse. Acredita-se que esse tipo de inibição, chamado de inibição pré-sináptica, ocorra como se segue. Na inibição pré-sináptica, a inibição é causada pelas sinapses "pré-sinápticas" sobre as extremidades das fibras nervosas, antes que elas entrem em contato com o neurônio seguinte. No momen- to, supõe-se que a ativação dessas sinapses sobre os terminais pré-sinápticos diminua a capacidade da membrana em abrir os canais de cálcio. Como os íons cálcio têm que entrar nos terminais pré-sinápticos para que as vesículas possam liberar o transmissor na sinapse neuronal, o resultado óbvio é a redução da excitação neuronal. A causa da entrada reduzida de cálcio nos terminais pré-si- nápticos ainda é desconhecida. Uma teoria sugere que as sinapses pré-sinápticas liberem um transmissor que bloqueia diretamente os canais de cálcio. Outra teoria propõe que o transmissor iniba a abertura dos canais de sódio, reduzindo, dessa forma, a ampli- tude do potencial de ação no terminal. Como os canais de cálcio voltagem-ativados são extremamente voltagem-sensitivos, qual- quer diminuição do potencial de ação reduziria drasticamente a entrada de cálcio. A inibição pré-sináptica ocorre em muitas vias sensoriais do sistema nervoso. Isto é, as fibras nervosas adjacentes inibem as fibras ao lado, o que minimiza a dispersão lateral dos sinais de uma fibra para suas vizinhas. Esse fenômeno será discutido de maneira mais completa em capítulos subseqüentes. A inibição pré-sináptica difere da inibição pós-sináptica em sua seqüência temporal. Ela necessita de vários milissegundos para se desenvolver mas, uma vez que ocorra, pode durar por minutos ou mesmo horas. Por outro lado, a inibição pós-sináptica dura, normalmente, apenas poucos milissegundos. Somação dos potenciais pós-sinápticos Curso temporal dos potenciais pós-sinápticos. Quando a si- napse excita o motoneurônio da ponta ventral, a membrana neu- ronal permanece com a permeabilidade aumentada por apenas 1 a 2 ms. Durante esse tempo, os íons sódio se difundem rapida- mente para o interior da célula, criando o potencial pós-sináptico excitatório, ilustrado nas duas curvas inferiores da Fig. 45.9. Esse potencial se dissipa lentamente ao longo dos 15 ms seguintes, porque esse é o tempo requerido para que as cargas positivas fluam das sinapses excitadas ao longo do comprimento de dendri- tos e axônios, e, também, para que ocorra o fluxo de íons potássio (para fora) e cloreto (para dentro), de forma a restabelecer o potencial de repouso normal da membrana. O que ocorre durante o potencial pós-sináptico inibitório é exatamente o oposto, isto é, a sinapse inibitória aumenta a permeabilidade da membrana para os íons potássio ou cloreto, ou ambos, durante 1 a 2 ms, e isso leva o potencial intraneuronal para valores mais negativos que o normal, criando, em conse- quência, o potencial pós-sináptico inibitório. Esse potencial tam- bém persiste por cerca de 15 ms. Entretanto, outros tipos de substâncias transmissoras atuan- do sobre outros neurônios podem excitá-los ou inibi-los por cente- nas de milissegundos, ou mesmo segundos, minutos ou horas. Somação espacial dos potenciais pós-sinápticos - o limiar para o disparo Já foi mostrado antes que a excitação de um só terminal sobre a superfície de um neurônio provoca excitação mínima. Isso se deve ao fato de que a quantidade de substância transmis- sora liberada por um só terminal origina, na maior parte das vezes, potencial pós-sináptico excitatório com amplitude entre 0,5 e 1 mV, em lugar dos 10 a 20 mV usualmente necessários para que seja alcançado o limiar de excitação. No entanto, du- rante a excitação de um grupo neuronal do sistema nervoso, muitos terminais pré-sinápticos são comumente estimulados ao mesmo tempo e, apesar desses terminais estarem espalhados so- bre áreas extensas do neurônio, seus efeitos são ainda capazes de se somar. A razão para que isso ocorra é a seguinte: Já foi apontado antes, que a modificação de potencial em qualquer pon- to do soma faz com que, em toda sua extensão, ocorra alteração do potencial com amplitude quase exatamente igual à do ponto de origem. Por isso, para cada sinapse excitatória que dispara simultaneamente, o potencial do interior do soma se torna mais positivo por uma fração de milivolt, podendo chegar até 1 mV. Quando o potencial pós-sináptico excitatório alcança amplitude suficiente, é atingido o nível de disparo, deflagrando um potencial de ação no segmento inicial do axônio. Esse efeito é ilustrado na Fig. 45.9, que mostra vários potenciais pós-sinápticos excitató- rios. O potencial pós-sináptico excitatório da parte de baixo da figura foi causado pela estimulação simultânea de quatro sinapses; o potencial imediatamente acima foi causado pela estimulação de número duas vezes maior de sinapses; finalmente, o potencial pós-sináptico da parte superior da figura foi causado pela estimu- lação de um número quatro vezes maior de sinapses. Nesse último caso, foi deflagrado um potencial de ação no segmento inicial do axônio. O efeito da somação de potenciais pós-sinápticos pela esti- mulação de terminais múltiplos sobre áreas extensas da mem- brana é chamado de somação espacial. Somação temporal Cada vez que um terminal dispara, a substância transmissora liberada abre os canais da membrana por 1 a 2 ms. Uma vez Fig. 45..9 Potenciais pós-sinápticos excitatórios mostrando que a descar- ga simultânea de apenas algumas sinapses não vai provocar um potencial somado suficiente para produzir um potencial de ação, mas que a descarga simultânea de muitas sinapses vai elevar o potencial somado até o limiar de excitação e dar lugar a um potencial de ação sobreposto. 427 que os potenciais pós-sinápticos duram até 15 ms, uma segunda abertura dos mesmos canais pode fazer com que o potencial pós- sináptico tenha maior amplitude. Por isso, quanto mais rápida for à freqüência da estimulação do terminal, maior será o potencial pós-sináptico resultante. Dessa maneira, se os potenciais pós- sinápticos ocorrerem com freqüência suficientemente rápida, eles podem somar-se, da mesma forma como podem somar-se os potenciais pós-sinápticos originados pelos terminais extensamente distribuídos sobre a superfície do neurônios. Essa somação é denominada somação temporal. Somação simultânea dos potenciais pós-sinápticos excitatórios e inibitórios. Obviamente, se um potencial pós-sináptico inibitório tende a levar o potencial de membrana para um valor mais nega- tivo enquanto o potencial pós-sináptico excitatório tende, ao mes- mo tempo, a fazer com que o potencial de membrana se torne menos negativo, esses dois efeitos podem anular-se total ou par- cialmente. O potencial pós-sináptico excitatório também pode ser severamente anulado pelo "curto-circuito" inibitório da mem- brana. Assim, se um neurônio está sendo excitado por um poten- cial pós-sináptico excitatório, um sinal inibitório proveniente de outra fonte pode facilmente reduzir o potencial pós-sináptico para valores abaixo do limiar para excitação, diminuindo, dessa maneira, a atividade do neurônio.Facilitarão dos neurônios. Muitas vezes, a somação dos po- tenciais pós-sinápticos é de natureza excitatória, mas o potencial não tem amplitude suficiente para atingir o limiar de excitação. Quando isso acontece, dizemos que o neurônio está facilitado, isto é, o potencial de membrana está mais perto do limiar de disparo do que normalmente, mas ainda não atingiu o nível de disparo. Entretanto, outro sinal que entre no neurônio, prove- niente de outra fonte, é capaz de excitá-lo muito facilmente. Sinais difusos no sistema nervoso sempre facilitam grandes grupos neuronais, de tal forma que eles podem responder rápida e facilmente a sinais provenientes de fontes secundárias. FUNÇÕES ESPECIAIS DOS DENDRITOS NA EXCITAÇÃO DOS NEURÔNIOS O grande campo espacial de excitação dos dendritos. Os den- dritos do motoneurônio da ponta ventral se estendem por 500 a 1.000 µm em todas as direções a partir do soma neuronal. Por isso, esses dendritos podem receber sinais vindos de grande área espacial em torno do motoneurônio. Isso cria grande oportu- nidade para a somação de sinais vindos de muitos neurônios pré-sinápticos em separado. Também é importante o fato de 80 a 90% dos terminais pré- sinápticos ficarem localizados sobre os dendritos do motoneu- rônio da ponta ventral, enquanto apenas 10 a 20% terminam sobre o soma neuronal. Por isso, a parte mais preponderante da excitação provém de sinais transmitidos para os dendritos. Muitos dendritos não podem transmitir potenciais de ação - mas podem transmitir sinais por condução eletrotônica. Muitos dendritos não são capazes de transmitir potenciais de ação porque, têm relativamente poucos canais de sódio voltagem-dependentes. de tal forma que seus limiares para excitação são muito elevados para que ocorram potenciais de ação. Ainda assim, eles trans- mitem correntes eletrotônicas dos dendritos para o soma. Trans- missão de corrente eletrotônica significa a propagação de corrente por condução elétrica nos líquidos dos dendritos sem a geração de potenciais de ação. A estimulação do neurônio por esse tipo de corrente tem características especiais, como se segue. Decremento da condução eletrotônica nos dendritos — maior excitação provocada pelas sinopses mais próximas ao soma. Na Fig. 45.10, são mostradas algumas sinapses excitatórias e inibitó- rias estimulando os dendritos de um neurônio. Sobre os dois Fig. 45.10 Estimulação de neurônio por terminais pré-sinápticos, locali- zados sobre os dendritos, mostrando, especialmente, a condução com decremento dos potenciais eletrotônicos excitatórios nos dois dendritos à esquerda e a inibição da excitação, no dendrito da parte mais superior. Também é mostrado o potente efeito das sinapses inibitórias, localizadas no segmento inicial. dendritos à esquerda da figura são mostrados os efeitos excita- tórios na proximidade das extremidades dos dendritos. Note as altas amplitudes dos potenciais excitatórios nessas extremidades, isto é, os potenciais de membrana ficam menos negativos nesses pontos. Entretanto, boa parte da amplitude dos potenciais pós-si- nápticos excitatórios a perdida antes que eles atinjam o soma. Essa perda ocorre porque os dendritos são longos e finos, e suas membranas são também finas e excessivamente permeáveis aos íons potássio e cloreto, possibilitando o "vazamento" da corrente elétrica. Por isso, antes que os potenciais excitatórios consigam alcançar o soma, grande parte do potencial é perdida por vazamento através da membrana. Essa diminuição do poten- cial de membrana, verificada à medida que ele se propaga eletro- tonicamente ao longo dos dendritos em direção ao soma, é chama- da de condução com decremento. Também é óbvio que o decremento da condução será menor à medida que a sinapse excitatória estiver mais próxima do soma neuronal. Por isso, as sinapses excitatórias localizadas perto do soma têm efeito excitatório muito maior que as localizadas em pontos mais distantes. Reexcitação rápida do neurônio pelos dendritos, após a descarga neuronal. Quando um potencial de ação é deflagrado pelo neurônio ele comumente se propaga também para trás, por sobre o soma neuronal, mas nem sempre por sobre os dendritos. Por isso, habitualmente, os potenciais pós-sinápticos excitatórios nos dendritos são apenas parcialmente perturbados pelo potencial de ação, de modo que, imediatamente após o termino do potencial de ação, os potenciais ainda existentes nos dendritos estão prontos e esperando para excitar novamente o neurônio. Assim, os dendritos têm uma "capacidade de sustentação" dos sinais excitatórios provenientes de fontes pré- sinápticas. Somação da excitação e inibição nos dendritos. Na ilustração da Fig. 45.10, o dendrito da parte superior está sendo estimulado tanto por sinapses excitatórias como inibitórias. Na extremidade do dendrito ocorre grande potencial pós-sináptico excitatório mas, mais próximo ao soma, há duas sinapses inibitórias atuando sobre o mesmo dendrito. Essas sinapses inibitórias provocam voltagem hiperpolarizante que anula completamente, o efeito excitatório e, além disso, transmite pequena inibição, por condu- ção eletrotônica, em direção ao soma. Isso mostra que os dendri- 428 tos são capazes de somar potenciais pós-sinápticos excitatórios e inibitórios da mesma maneira que o soma. Na mesma figura, também são mostradas várias sinapses inibitórias sobre o cone axônico e o segmento inicial do axônio. Essa localização determina inibição especialmente poderosa, pois tem efeito direto, aumentando o limiar para a excitação exata- mente sobre o ponto onde o potencial de ação é normalmente de flagrado. RELAÇÃO ENTRE O ESTADO DE EXCITAÇÃO DO NEURÔNIO E A FREQUÊNCIA DE DISPARO O estado excitatório. O "estado excitatório" de um neurônio é definido pelo grau de atividade excitatória a ele dirigida. Se, em determinado instante, o grau de excitação do neurônio for maior que o de inibição, consideramos que há um estado excita- tório. Por outro lado, se há mais inibição do que excitação, dize- mos que há um estado inibitório. Quando o estado excitatório de um neurônio alcança valores acima do limiar para excitação, o neurônio irá disparar repetitiva- mente enquanto o estado excitatório permanecer nesse nível. No entanto, a freqüência de disparo do neurônio é definida pela quantidade em que o estado excitatório excedeu o limiar. Para explicar isso, temos que considerar, antes de tudo, o que ocorre com o potencial do soma neuronal durante e após o potencial de ação. Modificações do potencial somático neuronal durante e após o potencial de ação. A curva inferior da Fig. 45.11 ilustra um potencial de ação se propagando, em direção retrógrada, sobre o soma neuronal, após ter sido deflagrado no segmento inicial do axônio por potencial pós-sináptico excitatório. Após a ponta do potencial de ação, ocorre estado muito longo de "hiperpolari- zação", que dura muitos milissegundos. Durante esse intervalo, o potencial da membrana somática permanece mais negativo do que o potencial de repouso habitual da membrana. Isso é causado, pelo menos parcialmente, pelo alto grau de permea- bilidade da membrana neuronal aos íons potássio, que persiste por muitos milissegundos após o término do potencial de ação. Essa alta condutividade da membrana para o potássio também provoca "curtos-circuitos" da membrana para os potenciais exci- tatórios, como já foi explicado antes. A importância dessa hiperpolarização, bem como do curto- circuito que ocorre após o término do potencial em ponta, está no fato de que o neurônio permanece em estado de inibição durante esse período de tempo. Por isso, durante esse tempo, é requerido um estado excitatório maior que o normal para causar a reexcitação do neurônio. Relação entre o estado excitatório e a freqüência de disparo. A curva mostrada na parte superior da Fig. 45.11, referida como "Estado excitatório requerido para reexcitação", representa o nível relativo do estado excitatório requerido para reexcitar o neurônio, a cada instante após o término do potencialde ação. Note que, imediatamente após o término do potencial de ação, é necessário um estado excitatório muito elevado. Isso quer dizer que um número muito grande de sinapses excitatórias tem que disparar simultaneamente. A seguir, após terem se passado muitos milissegundos e o estado de hiperpolarização e o curto-circuito do neurônio começarem a desaparecer, o estado excitatório re- querido torna-se acentuadamente reduzido. Por esse motivo, quando o estado excitatório é elevado, um potencial de ação é rapidamente seguido por outros (um segundo, um terceiro, e assim por diante), com o processo prosse- guindo indefinidamente. Assim, no estado excitatório muito ele- vado, a freqüência de disparo do neurônio é alta. Por outro lado, quando o estado excitatório está apenas ligeiramente acima do limiar, para que possa deflagrar outro Fig. 45.11 Potencial neuronal seguido por prolongado período de hiper- polarização neuronal. É mostrado também o "estado excitatório"' neces- sário para a reexcitação do neurônio a intervalos determinados após o término do potencial de ação. potencial de ação, o neurônio terá que se recuperar quase comple- tamente da hiperpolarização e do curto-circuito, o que leva vários milissegundos. Isso implica baixa freqüência de disparo neuronal. Características de respostas de diferentes neurônios a níveis elevados do estado excitatório. O estudo histológico do sistema nervoso demonstra que, nas diferentes áreas, existem vários tipos de neurônios e, fisiologicamente, os diferentes tipos de neurônios executam funções diferentes. Por isso, como seria de se esperar, a capacidade de responder a estímulos que chegam às sinapses varia de um tipo de neurônio para outro. A Fig. 45.12 ilustra as respostas teóricas de três tipos diferen- tes de neurônios em níveis variáveis de estado excitatório. Note que o neurônio 1 tem limiar de excitação baixo, enquanto o neurônio 3 tem limiar alto. Deve-se também notar que, enquanto o neurônio 2 tem a freqüência máxima de descarga mais baixa, o neurônio 3 tem a mais alta. Alguns neurônios do sistema nervoso central disparam conti- nuamente porque o estado excitatório está normalmente acima do nível limiar. A freqüência de disparo desses neurônios pode aumentar ainda mais, por elevação de seu estado excitatório, e se superpõe a um estado inibitório no neurônio. Assim sendo, os diferentes neurônios respondem de modo diverso, com limiares de excitação distintos e freqüências máxi- Fig. 45.12 Características da resposta de diferentes tipos de neurônios a níveis progressivamente crescentes do estado excitatório. 429 mas de descarga também diferentes. Com uma pequena dose de imaginação, é fácil entender a importância desses vários tipos de neurônios. com diferentes características de resposta, para que o sistema nervoso possa desempenhar com precisão e eficiên- cia a imensa gama de funções que executa. ALGUMAS CARACTERÍSTICAS ESPECIAIS DA TRANSMISSÃO SINÁPTICA Fadiga da transmissão sináptica. Quando as sinapses excita- tórias são repetitivamente estimuladas com freqüência elevada, o número de descargas pelo neurônio pós-sináptico é inicialmente muito elevado mas, com o tempo (milissegundos ou segundos), torna-se progressivamente menor. Esse fenômeno é denominado fadiga da transmissão sináptica. A fadiga é uma característica muito importante da função sináptica, pois, quando áreas do sistema nervoso se tornam supe- rexcitadas, a fadiga faz com que esse excesso de excitabilidade se desfaça rapidamente. Tomemos como exemplo a convulsão epiléptica: é provável que, durante a crise convulsiva, a fadiga seja o principal meio pelo qual o excesso de excitabilidade cere- bral seja vencido, fazendo cessar a convulsão. Assim, a fadiga é um mecanismo de proteção contra o excesso de atividade neuro- nal. Isso será mais discutido no capítulo seguinte, na descrição dos circuitos neuronais reverberativos. A fadiga se deve principalmente à exaustão dos estoques dos transmissores nos terminais pré-sinápticos. Foi calculado que os terminais excitatórios têm capacidade para armazenar trans- missores em quantidade suficiente para apenas 10.000 transmis- sões sinápticas normais. Assim sendo, apenas alguns segundos ou minutos de estimulação com alta freqüência são suficientes para levar à exaustão dos transmissores. Entretanto, é provável que parte do processo de fadiga também esteja ligado a dois outros fatores que são: (1) inativação progressiva de receptores da membrana pós-sináptica e (2) retenção lenta e progressiva de íons cálcio no interior do neurônio pós-sináptico, causada pelos sucessivos potenciais de ação esses íons, por seu lado, abrem os canais de potássio cálcio-dependentcs, o que causa um efeito inibitório sobre o neurônio pós-sináptico. Facilitação pós -tetânica. Quando uma série de impulsos repetitivos de alta freqüência estimula uma sinapse excitatória que é a seguir deixada em repouso por determinado período, observamos que, durante algum tempo (segundos ou minutos), a resposta da sinapse será maior do que a normalmente verificada. A isto chamamos facilitação pós-tetânica Experimentos mostraram que a facilitação pós-tetânica se deve prin- cipalmente ao acúmulo de excesso de íons cálcio nos terminais pré-sináp- ficos, devido à lentidão com que a bomba de cálcio remove esses íons a cada potencial de ação. O acúmulo progressivo desses íons leva a liberação cada vez maior da substância transmissora, pelas vesículas po- dendo, ocasionalmente, dobrar a quantidade de transmissor que é nor- malmente liberada. O significado fisiológico da facilitação pós-tetânica é ainda duvidoso, e pode não ter significado real. Entretanto, os neurônios poderiam arma zenar as informações por este mecanismo. Por isso, a facilitação pós-te- tânica poderia ser um mecanismo da memória de curto prazo no sistema nervoso central. Efeito da acidose e alcalose sobre a transmissão sináptica. Os neurô- nios são muito responsivos às modificações do pH nos líquidos intersticiais em torno deles. A alcalose provoca um grande aumento da excitabilidade neuronal. Quando, por exemplo, ocorre aumento do pH arterial de seu valor normal de 7,4 para 7,8 ou 8,0, observamos, com freqüência, convulsões cerebrais devido ao aumento da excitabilidade dos neurônios. Isso pode ser demonstrado com facilidade quando se faz hiperventilação em pessoa que tenha predisposição a convulsões epilépticas. A hiperven- tilação eleva o pH do sangue apenas momentaneamente, mas esse pequeno tempo é, muitas vezes, suficiente pai a provocar um ataque epiléptico. Por outro lado, a acidose provoca grande depressão da atividade neuronal e queda do pH de 7,4 para 7,0 leva, habitualmente, ao estado comatoso. Como exemplo, podemos citar o coma que sempre se desen- volve nos casos de grave acidose diabética ou urêmica. Efeito da hipoxia sobre a transmissão sináptica. A excitabilidade neuronal também é muito dependente de suprimento adequado de oxigê- nio. A retirada de oxigênio por apenas alguns segundos pode levar a completa inexcitabilidade dos neurônios. Isso é observado com frequên- cia quando há interrupção temporária da circulação cerebral, situação na qual. dentro de 3 a 5 segundos, a pessoa fica inconsciente. Efeito de medicamentos sobre a transmissão sináptica. É sabido que diversos medicamentos são capazes de aumentar a excitabilidade dos neurônios, enquanto outros são capazes de diminuí-la. Como exemplo de substâncias excitatórias temos a cafeína, a teofilina e a teobromina, encontradas, respectivamente, no café, chá e chocolate, que aumentam a excitabilidade neuronal presumivelmente devido à redução do limiar para excitação dos neurônios. Outro exemplo de agente capaz de aumen- tar a excitabilidade dos neurônios é a estrienina. No entanto, em vez de reduzir o limiar para a excitação dos neurônios, ela inibe a ação de alguns transmissores inibitórios sobre os neurônios, especialmente os efeitos inibitórios da glicina sobre a medula espinhal. Isto potencializa os efeitos dos transmissores excitatórios, fazendo
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