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Professora Ana Paula Correia de Souza Direito Processual Penal I APLICAÇÃO DO DIREITO PROCESSUAL PENAL NO ESPAÇO E NO TEMPO APLICAÇÃO DA LEI PROCESSUAL PENAL NO ESPAÇO O CPP, em seu artigo 1º, estabelece que o processo penal, em regra, reger-se-á, em todo o território brasileiro, pelo citado Código. Diante disso, aplica-se o PRINCÍPIO DA TERRITORIALIDADE (assim como no Direito Penal – art. 5º, do CP). Tal regra visa garantir a soberania popular, pois o direito alienígena não é fruto da vontade do povo brasileiro, mas de outro povo. No entanto, esta regra não é absoluta. O artigo 1º do CPP prevê exceções: a) Aplicação de tratados, as convenções e regras de direito internacional (art. 1º, I, do CPP). Diplomatas, que possuem imunidade em território nacional, quando estiverem em serviço a serviço do país de origem. Com a Convenção de Viena, assinada em 1961, o Brasil passou a conceder imunidade de jurisdição aos diplomatas e seus familiares, além de funcionários de organizações internacionais (exemplo: ONU). Logo, se qualquer deles cometer um crime em solo nacional, aqui não será punido. O mesmo ocorre com o cônsul, também imune à jurisdição brasileira, desde que cometa infração pertinente ao exercício de suas funções e no território do seu consulado. Certos atos processuais que devam ser praticados no exterior (citação, intimação, busca e apreensão, oitiva de testemunhas) devem obedecer a lei processual do país onde forem realizados (princípio da lex fori – lei do lugar), salvo se houver tratado firmado entre os países dispondo de modo diverso. Com base nisso, o Brasil, ao receber uma sentença estrangeira para homologação, poderá implicar o cumprimento, no Brasil, de decisão de magistrado alienígena. Submissão à jurisdição do Tribunal Penal Internacional (artigo 5º, §4º/CF). Tribunal com jurisdição subsidiária/adicional e complementar à do Estado, condicionada à incapacidade ou à omissão do sistema judicial interno. Em julho de 1998, na Conferência Diplomática de Plenipotenciários das Nações Unidas, foi aprovado o Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional, constituindo um Tribunal Internacional com jurisdição criminal permanente sobre as pessoas responsáveis pelos crimes de maior gravidade com alcance internacional, dotado de personalidade jurídica própria com sede em Haia (Holanda). Em âmbito internacional, o TPI entrou em vigor em 1º de julho de 2002. O governo brasileiro assinou o Tratado Internacional do Estatuto de Roma do TPI em fevereiro de 2000, o qual foi posteriormente aprovado pelo Congresso Nacional por meio do Decreto Legislativo nº 112/2002. Em 8 de dezembro de 2004, entrou em vigor a Professora Ana Paula Correia de Souza Direito Processual Penal I Emenda Constitucional nº 45, a qual reconheceu formalmente a jurisdição do TPI, por intermédio do acréscimo do §4º artigo 5º da Constituição Federal. Ressalta-se que a jurisdição do TPI não é estrangeira, mas internacional, podendo alcançar qualquer Estado signatário da ONU. O STF entende que o tratado somente é aplicado com primazia sobre leis federais se for mais recente, jamais podendo entrar e, conflito com a Constituição. Ressaltando que os tratados que tratam de direitos humanos, aprovados pelo Brasil, adquirem status supralegal. Há ainda outros exemplos desta exceção: - Cumprimento de cartas rogatórias; - Homologação de sentença estrangeira; - Processo de extradição. b) Jurisdição Política: o julgamento dos crimes de responsabilidade não é de competência do Poder Judiciário, mas sim do Poder Legislativo (art. 52, inciso I e II/CF). c) Justiça Especial: A Justiça Militar possui regras próprias, tanto no tocante ao direito material, quanto no que se refere ao direito processual. Embora não haja previsão expressa nesse dispositivo legal, impende lembrar que a justiça eleitoral é também uma justiça especial, tendo competência para o processamento e julgamento dos crimes eleitorais e conexos ou continentes. d) Tribunal de Segurança Nacional: Apesar de estar previsto no CPP, artigo 1º, inciso IV, não mais existe em nosso ordenamento jurídico. Os crimes contra a segurança nacional, são, em regra, julgados pela Justiça Federal Comum, pois são considerados delitos políticos (art. 109, IV/CF). APLICAÇÃO DA LEI PROCESSUAL PENAL NO TEMPO O artigo 2º do CPP estabelece o seguinte: Art. 2º A lei processual penal aplicar-se-á desde logo, sem prejuízo da validade dos atos realizados sob a vigência da lei anterior. Tal dispositivo legal consagra o princípio da aplicação imediata (tempus regit actum) ou sistema de isolamento dos atos processuais, segundo o qual a lei processual penal tem aplicação imediata. São dois os efeitos que derivam do citado princípio: 1º - A norma processual penal tem aplicação imediata, regulando todo o desenrolar do processo em andamento; Professora Ana Paula Correia de Souza Direito Processual Penal I 2º - os atos processuais realizados na vigência da lei anterior são considerados válidos. Ementa: PROCESSUAL PENAL. ALTERAÇÃO DO RITO DO TRIBUNAL DE JÚRI. LEI Nº 11.689/2008. PRAZO PARA DEFESA PRÉVIA. APLICAÇÃO IMEDIATA. CONFIRMAÇÃO DOS ATOS PRATICADOS NA VIGÊNCIA DA LEGISLAÇÃO ANTERIOR. 1. A Lei nº 11.689/2008, norma de caráter processual, de aplicação imediata, a despeito de estipular o prazo de 10 dias para o oferecimento da defesa prévia, a teor do atual art. 406, do Código de Processo Penal, não autoriza a sua incidência sobre os atos processuais praticados sob a égide da legislação anterior. 2. Precedentes desta Corte. 3. Recurso desprovido. (STJ. RHC 28015 SP 2010/0062816-5. QUINTA TURMA. DJe 04/11/2014. Relator: Min. GURGEL DE FARIA) Exceção ao princípio do efeito imediato vem previsto no artigo 3º da Lei de Introdução ao Código de Processo Penal, segundo o qual “o prazo já iniciado, inclusive o estabelecido para a interposição de recurso, será regulado pela lei anterior, se esta não prescrever prazo menor do que o fixado no Código de Processo Penal”. As regras de aplicação da lei processual penal e da lei penal são diferentes. A lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu (art. 5º, inciso XL/CF). Diante disso, faz-se necessário distinguir a normal penal da norma processual. São normas penais aquelas que estabelecem as infrações penais e as respectivas penas; assim como as que cuidam da aplicação da pena e medidas de segurança, causas excludentes da ilicitude, culpabilidade e punibilidade. Já as normas processuais penais, são, de modo geral, todas aquelas que regulam o processo e seus institutos. Há situações em que normas eminentemente processuais penais têm reflexos penais, em razão de possuir caráter penal (NORMA DE NATUREZA HÍBRIDA OU NORMAS PROCESSUAIS PENAIS MATERIAIS). Se, por exemplo, surge uma nova lei alterando para ação penal privada o crime que hoje se procede mediante ação penal pública incondicionada. Apesar da ação penal ser uma matéria eminentemente processual, tal mudança implicaria em irrefutável benefício ao réu, pois a ação penal no caso de cometimento desse crime somente se procederia se a vítima quisesse, o que é mais benéfico ao acusado (nova lei). Por outro lado, se fosse o contrário, se a lei modifica para ação penal pública incondicionada um crime cuja ação penal é privada, a lei nova é menos benéfica ao acusado. Em ambos os casos, a solução seria a mesma. Deve ser aplicada a regra de temporalidade das leis penais, fazendo retroagir em benefício do réu. http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/93624/lei-11689-08 http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/93624/lei-11689-08 http://www.jusbrasil.com.br/topicos/10636447/artigo-406-do-decreto-lei-n-3689-de-03-de-outubro-de-1941 http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/1033703/c%C3%B3digo-processo-penal-decreto-lei-3689-41 Professora Ana Paula Correiade Souza Direito Processual Penal I EMENTA: Crime falimentar (caso). Lei nº 11.101/05 (extinção do inquérito judicial). Aplicação retroativa (impossibilidade). Art. 106 do Decreto-Lei nº 7.661/45 (ultra-atividade). 1. A Lei nº 11.101/05, entre outras alterações no Decreto-Lei nº 7.661/45, excluiu, nos crimes falimentares, o inquérito judicial. 2. No caso, a supressão do inquérito judicial, porque reduz o exercício do direito de defesa - norma processual com reflexos penais concretos e prejudiciais -, só se aplica aos delitos ocorridos a partir da entrada em vigor da Lei nº 11.101/05. 3. Agravo regimental improvido. (STJ - AgRg no HC: 72770 RJ 2006/0277132-5, Relator: Ministro NILSON NAVES, Data de Julgamento: 29/09/2009, T6 - SEXTA TURMA, Data de Publicação: --> DJe 30/11/2009) EMENTA: HABEAS CORPUS. DOIS HOMICÍDIOS QUALIFICADOS PELO EMPREGO DE RECURSO QUE DIFICULTE A DEFESA DO OFENDIDO, UM CONSUMADO E OUTRO TENTADO, EM CONCURSO MATERIAL (ART. 121, § 2º, IV, E ART. 121, § 2º, IV, C.C ART. 14, II, N/F DO ART. 69, TODOS DO CP). ACUSADO QUE, APESAR DE CIENTIFICADO DA PRONÚNCIA E DO LIBELO, SE EVADE DO SISTEMA PRISIONAL, PERMANECENDO EM LOCAL INCERTO E NÃO SABIDO. PROCESSO SOBRESTADO, NOS TERMOS DO DISPOSTO NA ANTIGA REDAÇÃO DO ART. 451, § 1º, DO CPP. DECISÃO DO JUÍZO DO PRIMEIRO GRAU DE JURISDIÇÃO QUE, EM RAZÃO DO ADVENTO DA LEI N.º 11.689/08 QUE DEU NOVA REDAÇÃO AOS ARTS. 420, 422 E 431 DO CÓDIGO DE RITOS, DETERMINOU A INTIMAÇÃO EDITALÍCIA DO RÉU PARA O JULGAMENTO PERANTE O TRIBUNAL DO JÚRI. NORMAS DE NATUREZA HÍBRIDA, QUE NÃO PODEM RETROAGIR EM PREJUÍZO DO ACUSADO. ORDEM QUE SE CONCEDE. 1. A nova redação de dispositivos do Código de Processo Penal introduzida pela Lei n.º 11.689, de 09/06/2008, que entrou em vigor em 09/08/2008 estabeleceu a possibilidade de intimação editalícia da decisão de pronúncia do acusado solto que não for encontrado (art. 420 e seu parágrafo único), bem assim passou a permitir, em idêntica situação, que o réu seja intimado por edital para a sessão de instrução e julgamento (art. 431, c/c. o art. 420, parágrafo único) e que seja ele, caso não compareça, julgado à revelia pelo Tribunal do Júri (art. 457). 2. Cuidando-se, portanto, de normas de Professora Ana Paula Correia de Souza Direito Processual Penal I natureza processual e material, eis que influem no curso do prazo prescricional porquanto restará ele interrompido em caso de condenação do acusado pelo júri , é de se reconhecer a irretroatividade dos referidos dispositivos legais, que, por serem mais gravosos, não têm aplicação aos delitos cometidos anteriormente à sua vigência, impondo-se, pois, a anulação do processo a partir da decisão que determinou a realização de julgamento do paciente pelo Tribunal Popular sem a sua intimação pessoal, reconhecendo-se, em consequência, a ultra-atividade do disposto no § 1º do art. 451 do CPP, interpretado a contrario sensu, com a redação em vigor antes do advento da Lei n.º 11.689/08. 3. Ordem concedida. (TJ-RJ - HC: 00509831820118190000 RJ 0050983-18.2011.8.19.0000, Relator: DES. JOSE AUGUSTO DE ARAUJO NETO, Data de Julgamento: 31/01/2012, SEGUNDA CAMARA CRIMINAL, Data de Publicação: 20/05/2013). Guilherme de Souza Nucci (2018. p. 198) ainda ressalta a natureza processual penal material das normas relacionadas à prisão, uma vez que se referem à liberdade do indivíduo. Logo, havendo qualquer mudança legal, benéfica ao réu, podem elas retroagir para abranger situações ocorridas antes da sua existência, desde que contribua para garantir a liberdade do acusado. É o que dispõe o artigo 2º da Lei de Introdução ao Código de Processo Penal, in verbis: “Art. 2º À prisão preventiva e à fiança aplicar-se-ão os dispositivos que forem mais favoráveis”. Mirabete corrobora com o entendimento de Nucci e acrescenta que o dispositivo legal citado acima ainda continuar em vigor. Embora a LICPP visasse especialmente a transição da lei anterior para o CPP atual, não foi ela revogada. Em entendimento contrário está Tourinho Filho, o qual entende que as normas que tratarem de fiança ou prisão preventiva, por exemplo, devem incidir imediatamente, salvo nos casos em que o legislador determine expressamente de outra forma. Exemplos de normas processuais híbridas: - Lei nº 8884/94: alterou o artigo 312 do CPP, possibilitou a prisão preventiva como garantia da ordem econômica; - Lei nº 9271/96: alterou o artigo 366 do CPP, permitindo a suspensão do processo e do curso do prazo prescricional, bem como a prisão preventiva do acusado e a produção antecipada de provas, nos casos em que o réu citado por Edital não compareça em juízo nem constitua advogado; - Lei nº 13718/18: alterou o artigo 225 do Código Penal, estabelecendo como ação penal pública incondicionada os crimes contra a dignidade sexual. Professora Ana Paula Correia de Souza Direito Processual Penal I APLICAÇÃO DAS LEIS No tempo No espaço PROCESSUAIS PENAIS Tempus regit actum (art. 2º/CPP) Princípio da lex fori (art. 5º/CP) PENAIS Retroagem se forem mais benéficas (art. 5º, XL/CF e art. 2º/CP) Princípio da lex fori com as ressalvas do art. 7º/CP INTERPRETAÇÃO DAS LEIS PROCESSUAIS PENAIS Aplica-se a analogia e interpretação extensiva (art. 3º/CPP) PENAIS Não incriminadoras Aplica-se a analogia in bonam partem Incriminadoras Não se aplica a analogia nem a interpretação extensiva
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