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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS PATRICIA TAVARES MAGALHÃES DE TOLEDO A GESTÃO DA INOVAÇÃO EM UNIVERSIDADES: EVOLUÇÃO, MODELOS E PROPOSTAS PARA INSTITUIÇÕES BRASILEIRAS CAMPINAS 2015 NÚMERO: 341/2015 UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS PATRICIA TAVARES MAGALHÃES DE TOLEDO A GESTÃO DA INOVAÇÃO EM UNIVERSIDADES: EVOLUÇÃO, MODELOS E PROPOSTAS PARA INSTITUIÇÕES BRASILEIRAS TESE APRESENTADA AO INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS DA UNICAMP PARA OBTENÇÃO DO TÍTULO DE DOUTORA EM POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA ORIENTADORA: PROF A . DR A. MARIA BEATRIZ MACHADO BONACELLI ESTE EXEMPLAR CORRESPONDE À VERSÃO FINAL DA TESE DEFENDIDA PELA ALUNA PATRICIA TAVARES MAGALHÃES DE TOLEDO E ORIENTADA PELA PROFA. DRA. MARIA BEATRIZ MACHADO BONACELLI. CAMPINAS 2015 UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA AUTORA: Patricia Tavares Magalhães de Toledo “A Gestão da Inovação em Universidades: evolução, modelos e propostas para Instituições Brasileiras”. ORIENTADORA: Profa. Dra. Maria Beatriz Machado Bonacelli Aprovada em: 28 / 08 / 2015 EXAMINADORES: Profa. Dra. Maria Beatriz Machado Bonacelli - Presidente Prof. Dr. Renato Hyuda de Luna Pedrosa Prof. Dr. Roberto de Alencar Lotufo Profa. Dra. Elizabeth Balbachevsky Profa. Dra. Geciane Silveira Porto A Ata de Defesa assinada pelos membros da Comissão Examinadora, consta no processo de vida acadêmica do aluno. Campinas, 28 de agosto de 2015. Caroline, razão e sentido da minha vida, e ao Reinaldo, por tudo o que construímos. Agradecimentos Acredito que a maior virtude de um ser humano é a gratidão. Só alcancei esta conquista e outras da minha vida com contribuições de pessoas extraordinárias. Concluir esta tese, trabalhando, sendo mãe e esposa foi uma tarefa árdua, que exigiu esforços e dedicação que estenderam meus limites. Homenagens dificilmente conseguem dar o justo reconhecimento a todas as pessoas, mas tento aqui registrar, do melhor modo possível, meu eterno agradecimento àquelas que ajudaram a viabilizar este trabalho. Agradeço à minha orientadora Bia, por ter me aceitado como aluna, pela confiança, pelos ensinamentos e por ter me ajudado a voltar ao rumo certo nos momentos mais necessários. Ao professor Roberto Lotufo, que me possibilitou entrar em contato com o tema da inovação, e me ensinou sobre as missões da universidade. A todos os professores do DPCT, pelos conhecimentos compartilhados, com um agradecimento especial aos que, além da minha orientadora, contribuíram mais proximamente para meu trabalho, tanto com sugestões como ao inspirar boas ideias: Sérgio Salles, Léa Velho, Leda Gitahi e Sérgio Queiroz. A todos os funcionários do departamento, principalmente à Valdirene, à Gorete e à Adriana, pela dedicação e paciência. Agradeço aos colegas de classe que encontrei, pela troca de conhecimentos e experiências, especialmente às amigas Valéria Ribeiro e Mariana Pfitzner. À minha banca de qualificação, professora Elizabeth Balbachevsky e professor Roberto Lotufo pelas valiosas contribuições, essenciais para a finalização deste trabalho. Agradeço também à professora Geciane Porto e ao professor Renato Pedrosa por aceitarem fazer parte da minha banca da defesa. Aos entrevistados que contribuíram tão generosamente para este estudo, dedicando seu tempo e compartilhando suas experiências e seus conhecimentos: Adalberto Cheiran, Adriano Rossi, Alexandre Lima, Alfonso Gomez, Ana Lúcia Torkomian, Ana Paula Zaccaron, Bárbara Ribbeck, Bryan Ritchie, Daphne Ioannidis, Daniel Dias, Fabíola Spiandorello, Genaro Gamma, Iain Thomas, Iris Souza, Jacqueline Piedade, James Thompson, Juliana Crepalde, Kenneth Nisbet, Keith Marmer, Kevin Wozniak, Lita Nelsen, Luciane Ortega, Nathalia Andrade, Patrícia Villar, Renee Ben-Israel, Richard Jennings, Rogério Filgueiras, Shirley Jamieson, Stephen Fleming, Vanderlan Bolzani, Vanessa Sensato e William Tucker. Ao Eduardo Machado, que me ensinou muito sobre vários temas, desde a administração pública até o comportamento humano. Grande amigo que apoiou minha carreira em inovação e me mostrou a importância de fazer o doutorado. Aos profissionais com quem trabalhei na Inova Unicamp, agradeço os incríveis anos que atuamos juntos, especialmente aos amigos: Adriana Arruda, Alexandre Calonego, Carolina Neves, Debora Iacovino, Elias Drummond, Edilaine Camillo, Flávia Pinho, Gabriel Guion, Gisláine Correa, Juliana D`Estefano, Karina Stipp, Marina Silva, Michele Imenes, Morgana Lúcio, Pollyana Varrichio, Soraia Buchignani e Véronique Hourcade. À GranBio, empresa onde trabalho há dois anos, que me deu a oportunidade de praticar a inovação sob outra perspectiva, igualmente interessante e desafiadora, agradeço pela oportunidade e pela confiança, especialmente ao Gonçalo Pereira, Bernardo Gradin, Luiz Rosa e Joana Benjamin. Agradeço também aos vários novos amigos que fiz na empresa, por tudo o que me ensinaram e pelo carinho com que me receberam. À minha família, por aceitar minha ausência, especialmente à minha filha Caroline – companheira incansável que sempre achava algo para estudar para não me deixar sozinha –, ao meu marido Reinaldo por aceitar os finais de semana perdidos, à minha mãe Perpétua e à minha irmã Andréa, por torcerem por mim, e a todos por apoiarem, cada um do seu jeito, minha dedicação intensa a este trabalho, muitas vezes sem entendê-lo. Não posso esquecer da Bibi, companheira que passou noites ao meu lado enquanto eu escrevia, e só ia para sua cama quando eu finalizava o trabalho do dia. A GESTÃO DA INOVAÇÃO EM UNIVERSIDADES: EVOLUÇÃO, MODELOS E PROPOSTAS PARA INSTITUIÇÕES BRASILEIRAS RESUMO Tese de Doutorado Patricia Tavares Magalhães de Toledo Nas últimas três décadas, universidades em todo o mundo têm se estruturado para atuar de forma mais abrangente nos Sistemas Nacionais de Inovação (SNI), enquanto as universidades brasileiras passaram a lidar com esse desafio mais intensamente nos últimos dez anos. Mais ativas no tema de inovação e empreendedorismo, muitas universidades têm buscado mecanismos que lhes permitam uma maior aproximação com a sociedade, sem comprometer a essência do trabalho acadêmico. Nesse contexto, o objetivo desta tese é propor diretrizes para a melhoria de modelos de gestão da inovação de universidades brasileiras e sugestões para a modernização de políticas e marcos legais de estímulo a ciência, tecnologia e inovação, de modo a contribuir para o estabelecimento de um ambiente mais propício à promoção da inovação no Brasil. Para tal, foram estudadas experiências virtuosas em gestão da inovação de dezesseis universidades de cinco países: Estados Unidos, Reino Unido, Israel, Chile e Brasil, a partir do levantamento de dados primários e secundários. Foram analisados também os principais aspectos do SNI, das políticas e do marco legal de estímulo à inovação desses países, especialmente no que tange à participação da universidade na inovação e no empreendedorismo tecnológico. Para as organizações que atuam na gestão da inovação e do empreendedorismo em universidades, foi adotada a denominação geral Instituições de Gestão da Inovação (IGI) e proposta uma classificação para os modelos de gestão de inovação em universidades. Apesar da diversidade das características dos SNI e da coordenação dos sistemas de ensino superior, podem-se observar alguns pontos comuns às experiências mais maduras: cultura favorável à inovação e ao empreendedorismo; envolvimento da liderança das universidades; percepçãoda responsabilidade social da ciência; atuação próxima das IGI com faculdades e departamentos na concepção de novas iniciativas e na formação e capacitação de alunos nesses temas; alta profissionalização e especialização das equipes das IGI; apoio financeiro de longo prazo do governo para as universidades aprimorarem suas estruturas e competências para o estímulo à inovação e ao empreendedorismo; incentivo à conciliação da carreira acadêmica com a empreendedora; construção de parcerias com a comunidade externa relacionada à inovação e ao empreendedorismo, em âmbito regional e nacional; alta relevância atribuída ao licenciamento para a criação de spin-offs. Nas universidades brasileiras estudadas predomina o modelo de gestão da inovação centralizado – neste trabalho defendido como o mais adequado para o contexto atual –, associado a um modelo de IGI centralizada. Constatou-se que o modelo jurídico-institucional e de gestão das IGI brasileiras, a falta de financiamento dedicado às IGI e a ausência de um plano de carreira para profissionais de inovação nas universidades são grandes entraves à evolução dessas instituições. Comprovou-se, também, que a atividade de criação de spin-offs não é priorizada pelas IGI brasileiras. Dentre as recomendações deste trabalho, destaca-se a mudança do modelo jurídico- institucional tradicional das IGI brasileiras para o modelo de instituições privadas qualificadas como Organizações Sociais. Espera-se que as propostas aqui apresentadas contribuam para a construção de um ambiente mais favorável à inovação no Brasil. Palavras-chave: gestão da inovação, transferência de tecnologia, universidade, empreendedorismo. MANAGEMENT OF INNOVATION IN UNIVERSITIES: EVOLUTION, MODELS AND PROPOSALS FOR BRAZILIAN INSTITUTIONS ABSTRACT PhD Thesis Patricia Tavares Magalhães de Toledo Over the last three decades, universities around the world have structured themselves in order to contribute more broadly to national innovation systems (NIS), while Brazilian universities only started to deal with this challenge over the last ten years. More active in innovation and entrepreneurship, several universities have been searching for mechanisms to strengthen their interactions with society, without losing the fundamental characteristics of academic activity. In this scenario, the main objective of this thesis is to suggest guidelines for improving Brazilian universities’ innovation management models and to modernize national policies and legal framework dedicated to stimulate science, technology and innovation (STI), in order to contribute to the establishment of an environment more favorable to innovation. To address this objective, sixteen universities with virtuous experiences in innovation management were studied in five countries: United States, United Kingdom, Israel, Chile and Brazil, based on primary and secondary data collection. The main elements of the NIS, policies and legal framework to stimulate STI in these countries were analyzed; particularly those related to universities participation in innovation and in technology based entrepreneurship. The general denomination of Innovation Management Institutions (IMI) was adopted to represent the organizations involved in managing activities related to innovation and entrepreneurship in universities. Additionally, a classification of the main models to manage innovation in universities was defined. Despite the differences in the characteristics of the NIS and coordination of higher education, some common elements can be identified in the most mature experiences, such as: strong innovation and entrepreneurship cultures; high engagement of university leadership; recognition of the social responsibility of science; government long term financial support for universities to improve their structures and competencies in innovation and entrepreneurship; IMI staff is highly skilled, specialized and experienced; incentives for faculty to combine the academic career with entrepreneurial activity; close interactions between IMI and schools, colleges and departments to develop new initiatives and educational programs; multiple partnerships with national and regional innovation and entrepreneurship community; high importance given to licensing university´s IP to create spin-offs. Most of the Brazilian universities studied follow the centralized innovation model – defended in this thesis as the most appropriate for the current national context – associated with a centralized IMI organizational model. This thesis showed that Brazilian IMI legal-institutional model, management practices, lack of dedicated funding to IMI and lack of a career plan for IMI professionals are expressive barriers to the evolution of these institutions. Additionally, it also proved that Brazilian IMI do not prioritize the creation of spin-offs. One of the highlights of the recommendations presented in this thesis is the change in the Brazilian IMI traditional legal-institutional model to private institutions qualified as Social Organizations. We hope that the proposals presented contribute to the creation of a more favorable environment to innovation in Brazil. Keywords: innovation management, technology transfer, university, entrepreneurship SUMÁRIO INTRODUÇÃO 19 CAPÍTULO 1 – A UNIVERSIDADE E A INOVAÇÃO 30 INTRODUÇÃO .......................................................................................................................................................................................... 30 1.1. AVANÇO NA COMPREENSÃO DA INOVAÇÃO ................................................................................................................. 31 1.2. A ABORDAGEM DOS SISTEMAS DE INOVAÇÃO ............................................................................................................ 41 1.3. AS MISSÕES DA UNIVERSIDADE......................................................................................................................................... 45 1.4. A INTERAÇÃO UNIVERSIDADE, EMPRESA E GOVERNO EM INOVAÇÃO ............................................................ 53 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................................................................................... 67 CAPÍTULO 2 – A GESTÃO DA INOVAÇÃO TECNOLÓGICA NA UNIVERSIDADE 69 INTRODUÇÃO .......................................................................................................................................................................................... 69 2.1. A GESTÃO DA INOVAÇÃO ....................................................................................................................................................... 70 2.1.1. A inovação aberta e seu impacto na gestão da inovação ...................................................... 78 2.1.2. Desafios da gestão da inovação em instituições públicas de pesquisa ................................. 83 2.2. A GESTÃO DA INOVAÇÃO EM UNIVERSIDADES ........................................................................................................... 85 2.2.1. O papel dos Escritórios de Transferência de Tecnologia ...................................................... 89 2.2.2. Gestão da proteção e da transferência de propriedade intelectual ....................................... 93 2.2.3. Gestão da transferência de PI da universidade para a formação de spin-offs ..................... 98 2.2.4. Gestão de projetos U-E de pesquisa contratada, pesquisa colaborativa e de consultoria . 102 2.2.5. Gestão de iniciativas de estímulo ao empreendedorismo tecnológico ................................ 106 2.2.6. Modelos e governança da gestão da inovação na universidade ......................................... 109 CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................................................................................................................ 117 CAPÍTULO 3 – SNI, POLÍTICAS E MARCO LEGAL DE ESTÍMULO À INOVAÇÃO: CHILE, EUA, ISRAEL, REINO UNIDO E BRASIL 119 INTRODUÇÃO ....................................................................................................................................................................................... 119 3.1. COORDENAÇÃO E GOVERNANÇA DOS SISTEMAS DE ENSINO SUPERIOR ................................................... 121 3.2. DA POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA À POLÍTICA DE INOVAÇÃO ......................................................... 128 3.3. SNI, POLÍTICAS E MARCO LEGAL DE ESTÍMULO À INOVAÇÃO DAS EXPERIÊNCIAS INTERNACIONAIS 131 3.3.1. Avanço do marco legal e de políticas de estímulo à inovação ............................................ 134 3.3.2. O papel das universidades, das empresas e do governo no SNI .......................................... 147 3.3.3. Evolução das IGI e do sistema de TT universitária ............................................................. 163 3.4. SNI, POLÍTICAS E MARCO LEGAL DE ESTÍMULO A INOVAÇÃO DO BRASIL ................................................. 171 3.4.1. Avanço do marco legal e das políticas de estímulo à inovação ........................................... 172 3.4.2. O papel das universidades, das empresas e do governo no SNI .......................................... 177 3.4.3. A evolução das IGI e do sistema de TT universitárias ........................................................ 181 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................................................................................ 187 CAPÍTULO 4 – MODELOS VIRTUOSOS DE GESTÃO DA INOVAÇÃO NAS UNIVERSIDADES 189 INTRODUÇÃO ....................................................................................................................................................................................... 189 4.1. METODOLOGIA DE PESQUISA ............................................................................................................................................ 190 4.1.1. Critérios de escolha das experiências estudadas ................................................................ 191 4.1.2. Formas de coleta e análise de dados ................................................................................... 199 4.2. A GESTÃO DA INOVAÇÃO NAS UNIVERSIDADES NORTE-AMERICANAS ESTUDADAS ............................ 203 4.2.1. A criação das IGI ................................................................................................................. 205 4.2.2. Os modelos de gestão da inovação das universidades e de organização das IGI ............... 210 4.2.3. A estrutura organizacional das IGI norte-americanas ........................................................ 216 4.2.4. A gestão da proteção e da transferência de tecnologias ..................................................... 221 4.2.5. Práticas de estímulo à inovação e ao empreendedorismo tecnológico ............................... 237 4.2.6. Principais resultados ........................................................................................................... 248 4.2.7. Fatores de sucesso ............................................................................................................... 253 4.2.8. Principais desafios ............................................................................................................... 257 4.3. A GESTÃO DA INOVAÇÃO EM UNIVERSIDADES DO REINO UNIDO, DE ISRAEL E DO CHILE ............. 260 4.3.1. A gestão da Inovação na University of Cambridge ............................................................. 260 4.3.2. A gestão da inovação na Hebrew University of Jerusalem (HUJ) ...................................... 270 4.3.3. A gestão da inovação na Pontifícia Universidad Católica de Chile (UCC) ........................ 276 4.4. A GESTÃO DA INOVAÇÃO NAS UNIVERSIDADES BRASILEIRAS ESTUDADAS ............................................. 282 4.4.1. A criação das IGI ................................................................................................................. 284 4.4.2. Os modelos de gestão da inovação das universidades e de organização das IGI ............... 289 4.4.3. A estrutura das IGI brasileiras ............................................................................................ 293 4.4.4. A gestão da proteção e da transferência de tecnologias ..................................................... 300 4.4.5. Práticas de estímulo à inovação e ao empreendedorismo tecnológico ............................... 304 4.4.6. Principais resultados ........................................................................................................... 315 4.4.7. Fatores de sucesso ............................................................................................................... 318 4.4.8. Principais desafios ............................................................................................................... 321 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................................................................................ 323 CAPÍTULO 5 - RECOMENDAÇÕES PARA O APRIMORAMENTO DE POLÍTICAS E MODELOS DE GESTÃO DA INOVAÇÃO EM UNIVERSIDADES BRASILEIRAS 326 INTRODUÇÃO ....................................................................................................................................................................................... 326 5.1. FRAGILIDADES E BARREIRAS À PARTICIPAÇÃO DAS UNIVERSIDADES BRASILEIRAS NA INOVAÇÃO E NO ESTÍMULO AO EMPREENDEDORISMO TECNOLÓGICO .......................................................................................... 327 5.2. BOAS PRÁTICAS DE PARTICIPAÇÃO NA INOVAÇÃO E NO EMPREENDEDORISMO TECNOLÓGICO...... 337 5.3. PROPOSTAS PARA AS UNIVERSIDADES E IGI BRASILEIRAS ................................................................................ 340 5.3.1. Modernizar as políticas, normas e diretrizes universitárias relacionadas à inovação e ao empreendedorismo ...................................................................................................................... 341 5.3.2. Redefinir os modelos das IGI para torná-las instituições profissionais, ágeis e autônomas .... ............................................................................................................................................. 342 5.3.3. Assegurar condições para a criação de novos negócios a partir de tecnologias universitárias ............................................................................................................................................. 345 5.3.4. Intensificar a integração das iniciativas de ensino e pesquisa com as de estímulo à inovação e ao empreendedorismo .............................................................................................................. 347 5.4. PROPOSTAS PARA O GOVERNO E FORMULADORES DE POLÍTICAS DE ESTÍMULO À INOVAÇÃO ........ 348 5.4.1. Modernizar e aprimorar artigos da Lei de Inovação e do projeto de Lei 2177/2011 ......... 349 5.4.2. Estabelecer a criação de um programa obrigatório de auxílio às IGI em todas FAP ........ 353 5.4.3. Aprimorar incentivos para estimular investimentos privados em P&D .............................. 354 5.4.4. Fortalecer o INPI ................................................................................................................ 355 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................................................................................ 356CONCLUSÕES 358 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 364 ANEXO I 395 ANEXO II 415 ANEXO III 430 ANEXO IV 432 ANEXO V 434 ANEXO VI 439 ILUSTRAÇÕES (FIGURAS, QUADROS E TABELAS) Figuras Figura 2.1: Modelo integrado da gestão da inovação ............................................................... 75 Figura 2.2: Co-evolução e multilinearidade das relações universidade-empresa ..................... 88 Figura 2.5: Modelo básico de transferência de tecnologias da universidade ........................... 97 Figura 2.3: Classificação dos modelos de gestão da inovação em universidades .................. 115 Figura 2.4: Classificação dos modelos organizacionais das IGI ............................................ 116 Figura 3.1: O triângulo da coordenação ................................................................................. 122 Figura 4.1: Ecossistema de Inovação da University of Utah .................................................. 212 Figura 4.2: Visão geral das IGI do Sistema da UC ................................................................. 221 Figura 4.3: Engine – Processo de Comercialização de Tecnologias do TVC ........................ 223 Figura 4.4: O Processo de Proteção e Transferência de Tecnologias do TLO ....................... 226 Quadros Quadro 1.1: Modelos teóricos sobre a universidade empreendedora ....................................... 48 Quadro 1.2: Prós e contras das colaborações U-E .................................................................... 66 Quadro 2.1: Influências do contexto organizacional no modelo genérico de inovação ........... 73 Quadro 2.2: Processos de Gestão da inovação ......................................................................... 77 Quadro 2.3: Contexto organizacional para a inovação ............................................................. 78 Quadro 2.4: Vantagens das diferentes formas de colaboração ............................................... 105 Quadro 3.1: Órgãos centrais de apoio à inovação no Reino Unido apoiados pelo governo .. 140 Quadro 3.2: Fundos governamentais de estímulo à inovação e ao empreendedorismo dedicados às universidades inglesas ....................................................................................... 167 Quadro 3.3: Destaques do marco legal e políticas de inovação dos países estudados ........... 188 Quadro 4.1: Delineamento da pesquisa .................................................................................. 191 Quadro 4.2: Universidades e IGI selecionadas para o estudo de casos múltiplos .................. 193 Quadro 4.3: As 20 melhores universidades da América Latina segundo QS University Rankings Latin America 2014 ................................................................................................ 194 Quadro 4.4: Estrutura dos questionários aplicados nas IGI brasileiras .................................. 201 Quadro 4.5: Estrutura dos questionários aplicados nas IGI internacionais ............................ 202 Quadro 4.6: Panorama geral das seis universidades norte-americanas estudadas .................. 205 Quadro 4.7: Modelos de gestão da inovação das universidades e de organização das IGI norte- americanas .............................................................................................................................. 211 Quadro 4.8: Estruturas e programas de estímulo ao empreendedorismo no MIT .................. 239 Quadro 4.9: Programas de estímulo ao empreendedorismo e ao Desenvolvimento Regional do Georgia Tech ........................................................................................................................... 242 Quadro 4.10: Iniciativas da U-M de estímulo a inovação e empreendedorismo para docentes e pesquisadores .......................................................................................................................... 244 Quadro 4.11: Programas e Iniciativas da U-M de estímulo ao empreendedorismo para alunos ................................................................................................................................................ 246 Quadro 4.12: Principais resultados em inovação das universidades norte-americanas estudadas ................................................................................................................................................ 250 Quadro 4.13: Dados gerais da University of Cambridge ........................................................ 261 Quadro 4.14: Principais resultados em inovação e empreendedorismo da CE ...................... 269 Quadro 4.15: Dados gerais da The Hebrew University of Jerusalem (HUJ) .......................... 271 Quadro 4.16: Principais resultados em inovação da Yissum .................................................. 276 Quadro 4.17: Dados gerais da Pontifícia Universidad Católica de Chile (UCC) .................. 277 Quadro 4.18: Principais resultados em inovação e empreendedorismo da UCC ................... 282 Quadro 4.19 Panorama geral das universidades brasileiras estudadas ................................... 284 Quadro 4.20: Visão geral dos modelos de gestão da inovação e organizacionais das instituições brasileiras estudadas ............................................................................................ 290 Quadro 4.21: Principais resultados em inovação das universidades brasileiras estudadas .... 316 Quadro 5.1: Principais fragilidades das universidades e IGI brasileiras estudadas................ 330 Quadro 5.2: Principais fragilidades do SNI brasileiro que afetam a participação da universidade na inovação........................................................................................................ 335 Quadro 5.4: Propostas para universidades e IGI brasileiras ................................................... 340 Quadro 5.5: Propostas para o governo e formuladores de políticas de estímulo à inovação . 349 Tabelas Tabela 3.1: Empresas criadas a partir de universidades no Reino Unido de 2012-2014 ........ 155 Tabela 3.2: Alguns indicadores de ICT públicas e privadas 2012-2013................................. 185 Tabela 4.1: Lista dos 10 principais depositantes de pedidos de patente no Brasil no período de 2004 a 2008 ............................................................................................................................ 194 Tabela 4.2: Spin-offs criadas por ano e total de spin-offs operacionais de universidades dos EUA, média dos valores de 2009-2013, ranking das 30 melhores ........................................ 196 Tabela 4.3: Número de licenças gerando receitas, licenças ativas e licenças fechadas por ano de universidades dos EUA, média dos valores de 2009-2013, ranking das 30 melhores ...... 197 Tabela 4.4: Número de pedidos de patentes depositados por ano, de universidades dos EUA, média dos valores de 2009-2013, ranking das 30 melhores ................................................... 198 ABREVIATURAS E SIGLAS ABDI Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial ANPROTEC Associação Nacional de Entidades Promotoras de Empreendimentos Inovadores ATDC Advanced Technology Development Center AUSPIN Agência USP de Inovação AUTM Association of University Technology Managers BID Banco Interamericano de Desenvolvimento BIRD Binational Industrial Research and Development BRICS Acrônimo dos países membros fundadores do Grupo: Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul CAPES Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior CENPES Centro de Pesquisas da Petrobrás CEPID Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão C&T Ciência e Tecnologia CI Comunicação de invenção CINDA Centro Interuniversitario de Desarrollo, Chile CNIC Consejo Nacional de Innovación para la Competitividad, Chile CNPq Conselho Nacional de Desenvolvimento Científicoe Tecnológico COEPI Comissão Especial de Propriedade Intelectual da UFSCar CONICYT Comisión Nacional de Investigación Científica y Tecnología CONSU Conselho Universitário COPPE/ UFRJ Instituto Alberto Luiz de Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa em Engenharia CORFO Corporación de Fomento e Producción CPPI Comissão Permanente de Propriedade Industrial da Unicamp CRIAR Coordenadoria de Relações Institucionais e Articulações com a Sociedade da UFRJ CT&I Ciência, Tecnologia e Inovação CTIT Coordenadoria de Transferência de Inovação Tecnológica da UFMG DBIS Department for Business, Innovation and Skills do Reino Unido DIC Division of Industrial Cooperation DPITT Divisão de Propriedade Intelectual e Transferência de Tecnologia, UFRJ EAP Escritório de Assessoria à Projetos da UFRGS Edistec Escritório de Difusão de Tecnologia da Unicamp EI 2 Enterprise Innovation Institute, Georgia Tech Embrapii Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial ENIAC Electronic Numerical Integrator Analyzer and Computer ETT Escritório de Transferência de Tecnologia FAI.UFSCar Fundação de Apoio Institucional ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico da UFSCar FAPEMIG Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais FAPESP Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo FAURGS Fundação de Apoio da UFRGS FIEMG Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais FINEP Financiadora de Estudos e Projetos FONTEC Fondo Nacional de Desarrollo Tecnológico FONDECYT Fondo Nacional de Desarrollo Científico y Tecnológico FONDEQUIP Fondo de Equipamiento Científico y Tecnológico FORMICT Formulário para Informações sobre a Política de Propriedade Intelectual das Instituições Científicas e Tecnológicas do Brasil FORTEC Fórum Nacional de Gestores de Inovação e Transferência de Tecnologia Funcamp Fundação de Desenvolvimento da Unicamp FUNDEP Fundação de Desenvolvimento da Pesquisa da UFMG FUNDEPAR Fundep Participações S.A. FORTEC Fórum Nacional de Gestores de Inovação e Transferência de Tecnologia GEDI Global Entrepreneurship and Development Institute GII Global Innovation Index (Índice Global de Inovação) GRA Georgia Research Alliance GTRC Georgia Tech Research Corporation HEIF Higher Education Innovation Funding HUJ The Hebrew University of Jerusalem IA Inovação Aberta IAS Innovation Alliances and Services, da University of California ICT Instituição Científica e Tecnológica IGI Instituição de Gestão da Inovação II GM Segunda Guerra Mundial INPI Instituto Nacional da Propriedade Industrial IPP Instituição de Pesquisa Pública ITA Office of Innovation, Technology & Alliances da UCSF JV joint-ventures LPI Lei de Propriedade Industrial brasileira (Lei 9279/96) MBA Master of Business Administration MCTI Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação MIT Massachussets Institute of Technology MPE Micro e Pequenas Empresas NIH National Institutes of Health, Estados Unidos NIT Núcleo de Inovação Tecnológica NSF National Science Foundation, Estados Unidos OECD Organization for Economic Co-operation and Development OI Open Innovation OIE Office of Industry Engagement, Georgia Tech OSRD Office of Scientific Research and Development OTL Oficinas de Transferencia y Licenciamiento OTT Office of Technology Transfer OTRI Oficinas de Transferencia de Resultados de Investigación PCI Penn Center for Innovation, da University of Pennsylvania PCT Patent Cooperation Treaty (Tratado de Cooperação de Patentes) PCT Chile Programa de Ciência e Tecnologia do Chile PD&I Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação PDTA Programas de Desenvolvimento Industrial Agropecuário PDTI Programa de Desarrollo e Innovación Tecnológica P&D Pesquisa e Desenvolvimento PI Propriedade Intelectual PINTEC Pesquisa de Inovação elaborada pelo IBGE PITCE Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior RC Research Corporation SBIR Small Business Innovation Research, Estados Unidos http://en.wikipedia.org/wiki/Organisation_for_Economic_Co-operation_and_Development SEDETEC Secretaria de Desenvolvimento Tecnológico da UFRGRS SENAI Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial SI Sistemas de Inovação SNI Sistemas Nacionais de Inovação STATT Statistics Access for Tech Transfer, base de dados da AUTM STTR Small Business Technology Transfer, fundo dos Estados Unidos THE The Times Higher Education World University Rankings TIC Tecnologia da Informação e Comunicação TLO Technology Licensing Office, IGI do MIT TT Transferência de Tecnologia TTO Technology Transfer Office TVC Technology & Ventures Commercialization, IGI da University of Utah UCB University of California Berkeley UC University of California UCC Pontificia Universidad Católica de Chile UCLA University of California Los Angeles UCSF University of California San Francisco U-E Universidade-Empresa U-M University of Michigan UFMG Universidade Federal de Minas Gerais UFRGS Universidade Federal do Rio Grande do Sul UFRJ Universidade Federal do Rio De Janeiro UFSCar Universidade Federal de São Carlos UNESP Universidade Estadual Paulista Unicamp Universidade Estadual de Campinas USP Universidade de São Paulo UPenn University of Pennsylvania UU University of Utah WARF Wisconsin Alumni Research Fundation WIPO World Intellectual Property Organization 19 INTRODUÇÃO Just as castles provided the source of strength for medieval towns, and factories provided prosperity in the industrial age, universities are the source of strength in the knowledge-based economy of the twenty-first century. (Lord Dearing 1 , 2002) Diversas iniciativas têm sido promovidas para estimular a apropriação de novos conhecimentos e a interação entre os distintos atores envolvidos na concepção e difusão de inovações. A capacidade de um país gerar riqueza e alcançar um desenvolvimento sustentável está, cada vez mais, relacionada à sua competência em converter ciência e tecnologia em inovação, e essa capacidade depende da atuação e da interação de múltiplos agentes institucionais, destacadamente empresas, universidades e governo. Com a evolução da compreensão do progresso técnico e institucional, ganha realce a relação entre inovação e desenvolvimento econômico. Nesse cenário, a tradicional visão linear do processo de inovação tem sido fortemente colocada à prova e substituída por modelos mais interativos, que apresentam a inovação como um sistema em que concorrem diversos atores, fontes de conhecimentos e fluxos retro alimentadores entre as dimensões científicas e tecnológicas que asseguram o trânsito de informação e conhecimentos nos dois sentidos (FREEMAN, 1988; LUNDVALL, 1992; NELSON, 1993; CASSIOLATO; LASTRES, 2005; COHEN et al., 2002; LAURSEN; SALTER, 2006; PERKMANN; WALSH, 2007; QUADROS, 2008; SUZIGAN et al., 2011). Uma das ações centrais da política científica e tecnológica de diversos países tem sido o estímulo à criação de um círculo virtuoso de troca de conhecimento entre empresas e instituições de pesquisa públicas e privadas. Marcadamente a partir dos anos 1980, a partir da melhor compreensão da dinâmica interativa dos sistemas nacionais de inovação (SNI). Governos promovem reformas com o intuito de mobilizar as instituições públicas de pesquisa a contribuir de modo mais amplo com os esforços de estímulo à inovação. Paralelamente, têm buscado formas de incrementar a absorção pelo setor industrial do conhecimento gerado nessas instituições (PACHECO, 2006; KENNEY; MOWERY, 2014). Uma instituição que tem recebido grande atenção de políticas de inovação é a universidade. Grande parte dos avanços tecnológicos que tiveram impacto econômico 1 Lord Dearing foi o quinto Chancellor da University of Nottingham e autor do Dearing Report sobre ensino superiorno Reino Unido. 20 expressivo está relacionada direta ou indiretamente a essa instituição, seja por meio da oferta de treinamento, trocas de conhecimentos, pesquisas desenvolvidas, ou parcerias com empresas que permitiram o desenvolvimento conjunto de novas tecnologias (YUSUF, 2007; KENNEY; MOWERY, 2014). Grandes inovações tecnológicas como a tecnologia de DNA recombinante, o Global Positioning System (GPS), a tecnologia MP3 e a tecnologia de reconhecimento de voz Siri lançada pela Apple são exemplos dos resultados de pesquisas realizadas em universidades e institutos de pesquisa públicos que chegaram até à sociedade por meio da interação com empresas (OECD, 2013). O papel singular das universidades na pesquisa e na formação de profissionais na fronteira do conhecimento científico faz delas uma fonte valiosa de conhecimentos e tecnologias. As várias atividades que as universidades exercem e que são relevantes para a inovação se ampliam continuamente (YUSUF, 2007; KENNEY; MOWERY, 2014). Dos três papéis básicos das universidades, o ensino e a pesquisa são comumente referenciados como a primeira e a segunda missão, respectivamente. As atividades de extensão ou serviço à sociedade envolvem tradicionalmente a difusão do conhecimento e relacionamentos com públicos externos – por meio de prestação de serviços, cursos de especialização, dentre outras ações –, e ampliaram-se expressivamente nas últimas três décadas, passando a abarcar também atividades voltadas à promoção da inovação e do empreendedorismo de base tecnológica, passando a ser comumente referenciadas como a terceira missão das universidades (PEDROSA, 2014). Essa missão – que complementa e retroalimenta as missões de ensino e pesquisa – transcende as atividades típicas da extensão universitária e requer uma ação mais ampla de inserção e interação com a sociedade. A Universidade do século XXI enfrenta os desafios de integrar novos elementos sem comprometer sua autonomia e de transformar a excelência acadêmica em benefícios mais abrangentes e relevantes para a sociedade (BALBACHEVSKY, 2011). Apesar de serem reconhecidas como importantes produtoras de novos conhecimentos, as universidades ainda são pouco utilizadas pelas empresas como fonte de inovação (COHEN et al., 2002; LAURSEN; SALTER, 2004). Do ponto de vista dos profissionais de empresas, fatores como redução de riscos, incertezas e custos das atividades de P&D, bem como acesso a conhecimento de ponta em diversas áreas, servem de estímulo para avaliar parcerias estratégicas com universidades. Do ponto de vista dos pesquisadores de universidades, a possibilidade de testar suas pesquisas em campo e o acesso a recursos adicionais para suas agendas e melhoria de infraestrutura são motivadores para a interação 21 com empresas. As interações empresas, universidades e o governo não só viabilizam como potencializam a inovação, em face da complexidade, dos altos custos e riscos associados ao processo inovativo (PORTO; BARONI, 2013). Contudo, concretizar com êxito essas parcerias não é trivial, uma vez que a cooperação universidade-empresa (U-E) requer mudanças em seus modelos institucionais e gerenciais, e a superação de diversos desafios estratégicos, culturais e organizacionais (COHEN et al., 2002). Essas dificuldades se tornam ainda mais evidentes em países como o Brasil, no qual a fragilidade dessas interações se deve em grande parte à criação tardia das universidades e da industrialização no país (SUZIGAN et al., 2011). Geração e aplicação de conhecimento não são necessariamente sequenciais, e estudos mostram que as melhores instituições científicas são as que conseguem realiza-los eficientemente (BOTELHO; ALVES, 2011). Em nações desenvolvidas, parte importante da pesquisa e do desenvolvimento tecnológico é realizada em empresas, bem como em instituições de pesquisa. No contexto dos países da América Latina, uma das características estruturais é que a pesquisa básica, grande parte da pesquisa tecnológica e das atividades de inovação se desenvolvem eminentemente nas universidades públicas (SUTZ, 2000; SPATH, 1993; BOTELHO; ALVES, 2011). Como exemplo, os maiores depositantes de patentes junto ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), residentes no país são as universidades e as agências de fomento, e não as empresas, como em nações desenvolvidas (BRITO CRUZ, 2014). Nos países em desenvolvimento, com seus SNI em estágio incipiente de construção devido ao patamar de desenvolvimento de suas economias e instituições, a infraestrutura científica exerce papel central, e constitui um importante instrumento de suporte ao desenvolvimento industrial: fornece os conhecimentos vitais para o país transformar setores produtivos atuais e desenvolver novos setores de caráter estratégico (SUZIGAN et al., 2011). Nas últimas décadas, o Brasil empreendeu esforços no aprimoramento de suas competências científicas e tecnológicas, agregando um conjunto de instituições relevantes para o SNI, com universidades de excelência, grande número de doutores formados anualmente e diversos planos governamentais de estímulo à inovação nas empresas (PEDROSA; QUEIROZ, 2014). Governos nacional e regionais, instituições e vários grupos da sociedade têm se mobilizado e buscado impulsionar a inovação, que na última década entrou decisivamente nas agendas das políticas de economia, ciência e tecnologia, e industrial (BOTELHO, 2011). As políticas de apoio à inovação no Brasil têm sido aprimoradas e importantes progressos já foram alcançados com a criação dos Fundos Setoriais, da Lei de Inovação, da Lei do Bem e com a definição de linhas de financiamento à inovação nas 22 agências públicas. O antigo Ministério de Ciência e Tecnologia teve seu nome alterado para Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), evidenciando a incorporação do tema à sua agenda. Merecem destaque outras iniciativas recentes como o plano Inova Empresa, a Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial (Embrapii), o programa Finep 30 dias, e os Institutos SENAI de Inovação. Em que pese o progresso já obtido com o marco legal de estímulo à inovação, cujo eixo é a Lei de Inovação (Lei N o 10973/2004) e seu decreto de regulamentação (Decreto N o 5563/2005) e a Lei do Bem (Lei N o 11196/2005), os resultados em inovação tecnológica ainda são fracos. A própria Lei de Inovação, embora constitua um avanço expressivo para fomentar a atividade no país, possui entraves importantes ainda não solucionados, mesmo após 10 anos de sua promulgação. O Brasil ainda se encontra em posição desfavorável em relação ao desempenho global e ao volume de recursos destinados ao desenvolvimento científico e tecnológico. Os resultados alcançados pela implementação do marco legal de estímulo à inovação são limitados especialmente porque não tratou das incertezas e restrições jurídicas, que dificultam a interação entre as instituições públicas de pesquisa e o setor privado (BALBACHEVSKY, 2010; BOTELHO; BUENO, 2008). O próprio texto original do projeto de Lei N o 2177 de 2011 (BRASIL, 2011) reconhece que o Brasil não tem sido eficaz na promoção do desenvolvimento econômico e social. O país está em posição desvantajosa não somente em relação às economias avançadas, mas também em relação a algumas em desenvolvimento. No Global Innovation Index (Índice Global de Inovação – GII) de 2014, o Brasil ocupa o 61º lugar no mundo e quinto entre países da América Latina e Caribe (CORNELL UNIVERSITY; INSEAD; WIPO, 2014). O dispêndio em atividades de P&D em relação ao produto interno bruto (PIB) permaneceu relativamente estável na última década, passando de 1,02% em 2000 para 1,24% em 2013 que, segundo Kupfer (2013), é inferior ao de países avançados que têm a média de investimento de 2,4% do PIB, ao de outros BRICS e ao de economias de menor dimensão como Itália, Espanha,Coreia do Sul e Portugal. Segundo a Pesquisa de Inovação (PINTEC) de 2011, o número de empresas brasileiras que investiu em inovação no período reduziu para 35,6% do universo pesquisado, em comparação com 38,1% da PINTEC de 2008. Os investimentos em inovação em 2011 chegaram a R$ 64,9 bilhões, atingindo a média de 2,56% da receita líquida das empresas. A compra de máquinas e equipamentos permanece concentrando a maior parte dos investimentos em inovação feitos pela indústria, 1,11% da receita líquida, seguida pelo investimento em atividades internas de P&D, que totalizou http://www.wipo.int/export/sites/www/freepublications/en/economics/gii/gii_2013.pdf 23 0,71% da receita líquida, enquanto a aquisição externa de P&D e a introdução de inovações tecnológicas no mercado ficaram, cada uma, com apenas 0,11% da receita líquida (IBGE, 2013). Para Kupfer (2013), os dados das PINTEC anteriores revelavam um panorama da indústria brasileira comparável ao da francesa e da espanhola; já a PINTEC 2011 revela um panorama mais próximo ao da indústria de economias com a da Turquia. Segundo Pedrosa (2014), o reduzido nível de inovação no país parece estar relacionado em grande parte ao limitado interesse ou capacidade do setor produtivo de investir em atividades de P&D e ao ambiente institucional de estímulo à inovação, que ainda tem avançado vagarosamente. Nesse contexto, torna-se premente uma reflexão sobre as principais barreiras à promoção da inovação no país e sobre a atuação dos três grandes atores envolvidos – empresas, universidades e institutos de pesquisa e governo –, com enfoque especial para as universidades, nas quais se concentra a maior parte da competência e das atividades nacionais de geração de novos conhecimentos científicos e tecnológicos do Brasil. Uma das propostas centrais deste trabalho é contribuir para o debate e oferecer soluções para obstáculos e desafios do SNI brasileiro quanto à contribuição da universidade, com propostas para agentes governamentais formuladores de políticas de estímulo à CT&I. Para isso é mais que necessária uma avaliação da forma como essas instituições têm se organizado e estruturado no sentido de incrementar sua participação na inovação. Nas últimas três décadas, universidades em todo o mundo têm se estruturado e evoluído para atuar de forma efetiva nos SNI, enquanto as universidades brasileiras passaram a lidar com esse novo desafio mais intensamente na última década. As universidades públicas brasileiras viram-se compelidas a elaborar ou atualizar – a partir da Lei de Inovação – normas e políticas internas para organização e efetivação de uma capacidade de proteção e gestão de sua propriedade intelectual, bem como a estabelecer instâncias administrativas e procedimentos para sua transferência, negociação e licenciamento, com base no disposto na nova legislação. Conforme o art.16 da referida Lei, cada Instituição Científica e Tecnológica (ICT) “[...] deverá dispor de núcleo de inovação tecnológica próprio ou em associação com outras ICT, com a finalidade de gerir sua política de inovação”. Para a universidade poder contribuir com o SNI de forma efetiva e abrangente, é fundamental o desenvolvimento e a incorporação de novas competências e funções distintas das relacionadas ao ensino e à pesquisa. São também elementos pertinentes ao papel da universidade nos SNI, associados às missões de formação de recursos humanos e de produção e difusão de conhecimentos: a gestão da propriedade intelectual (proteção dos resultados das 24 pesquisas desenvolvidas por membros de sua comunidade docente, discente e técnica); a transferência de propriedade intelectual e do know-how desenvolvido pela universidade para empresas existentes ou para formação de novas; a gestão das interações U-E em inovação, que envolve os projetos de pesquisa e desenvolvimento colaborativos com empresas, consultorias acadêmicas e prestação de serviços tecnológicos; o estímulo e o apoio ao empreendedorismo (SIEGEL et al. 2003a,b, 2007; LOCKET et al. 2005; GRIMALDI et al. 2011). Diversos estudos consideram que há maior probabilidade de se explorar melhor certas tecnologias universitárias via licenciamento para formação de spin-offs 2 (WRIGHT et al., 2008; HUYGHE et al. 2014). Há evidências de que as Spin-offs universitárias têm maior taxa de sucesso que outras start-ups (LAWTON SMITH; HO, 2006; AUTM, 2014), e como tendem a permanecer na região da universidade que licenciou a patente, geram impactos significativos na economia local (SHANE, 2004; LAWTON SMITH; HO, 2006; AUTM, 2014). Em face da limitada participação das empresas existentes no Brasil em atividades inovativas, o estabelecimento de condições favoráveis para a criação de novos empreendimentos pode ser uma forma de incrementar investimentos privados em P&D e de levar mais tecnologias universitárias ao mercado. Além disso, uma vez que os resultados de pesquisas universitárias se encontram, em geral, em estado incipiente de desenvolvimento, a realização de desenvolvimento complementar e prova de conceito 3 da tecnologia por uma empresa spin-off é uma forma de reduzir seu risco e acelerar a sua disponibilização no mercado. O escritório de transferência de tecnologia (ETT) ou núcleo de inovação tecnológica (NIT) 4 tem constituído uma experiência amplamente difundida internacionalmente, com a missão central de promover a proteção e transferência para 2 Conforme será discutido no Capítulo 2, neste trabalho adota-se a definição de spin-offs de Wright et al. (2008, p.1207): "spin-offs são novos empreendimentos dependentes de licenciamento ou cessão de propriedade intelectual de uma instituição para a sua criação”. 3 Tecnologias que ainda não possuem prova de conceito estão em estágio de desenvolvimento inicial, consistindo em uma ideia, que pode funcionar na prática, mas não tem ainda testes suficientes que validem seu conceito. Dependendo do tipo de tecnologia, só foram feitos testes preliminares de bancada. O próximo estágio de desenvolvimento é a prova de conceito, na qual testes adicionais foram feitos para a validação de sua aplicação (MARKMAN et al., 2005). Segundo a National Science Foundation (NSF), projetos voltados à prova de conceito tem por objetivo validar o uso de uma tecnologia no contexto de uma aplicação comercial específica. 4 Nos Estados Unidos e na Europa, os termos Technology Transfer Offices – TTO, Office of Technology Transfer – OTT e/ou variações destes como OTL – Office of Technology Licensing, abrangem diferentes tipos de organizações. Em geral, referem-se a escritórios atuantes na área de transferência de tecnologia de universidades ou laboratórios de pesquisas, cuja estrutura pode variar desde repartições exclusivas ligadas às administrações gerais das organizações até escritórios semiautônomos ou empresas de propriedade da instituição de pesquisa. No Brasil, a denominação dessas instituições padronizada pela Lei de Inovação federal e pelas Leis Estaduais é Núcleo de Inovação Tecnológica (NIT). 25 empresas do conhecimento gerado nas universidades. No Brasil, apesar de a Lei de Inovação ter padronizado a denominação destas instituições como NIT, comumente encontram-se designações como Agências de Inovação, Coordenadorias e Secretarias, especialmente as que já tinham sido criadas antes da promulgação dessa Lei. No exterior, além da diversidade ainda maior de nomeação, vinculação e escopo de atuação, há também a diversidade de natureza jurídica. Assim, como há diversas denominações e distintos escopos de atuação, para facilitar a identificação destas estruturas importantes para a gestão da inovação e do empreendedorismo de base tecnológica em universidades, que constituem a unidade de análise desta pesquisa, será adotada neste trabalho a denominação geral de Instituições de Gestãoda Inovação (IGI). De modo a aprimorar a gestão da inovação na universidade, uma das proposições deste trabalho é que as IGI não se limitem à gestão da proteção e da transferência de tecnologias resultantes de suas pesquisas, mas atuem também na gestão das demais iniciativas de estímulo à inovação e ao empreendedorismo como a articulação de interações com empresas por meio de projetos colaborativos de pesquisa, desenvolvimento e inovação (PD&I), a gestão de iniciativas de empreendedorismo tecnológico (como o impulso à criação de spin-offs, a gestão de parques científicos e tecnológicos, incubadoras, pré-incubação e aceleração de empreendimentos de base tecnológica) e no apoio às iniciativas de ensino e capacitação em inovação e empreendedorismo tecnológico realizadas pela universidade, atuando, inclusive, como um “laboratório” da universidade para capacitar alunos com maior entendimento de inovações e empreendimentos gerados a partir dos resultados das atividades inventivas do corpo docente e discente. Nesse sentido, uma das hipóteses da presente tese é que universidades de países com SNI em estágio intermediário de construção devem centralizar a gestão das grandes atividades da sua participação na inovação em uma IGI. Os modelo de gestão da inovação em universidades detalhados no Capítulo 2 podem ser resumidos em três: 1) centralizado, no qual a gestão dos grandes grupos de atividades relacionadas à participação da universidade na inovação e no empreendedorismo acadêmico serão geridos pela IGI; 2) descentralizado – no qual a gestão dos grandes grupos de atividades relacionadas à participação da universidade é realizada em partes pela IGI e em partes por outras instituições da universidade, autonomamente, sem coordenação com a IGI; 3) híbrido – a IGI centraliza a gestão da maior parte dos grupos de atividades e compartilha com outra instituição da universidade (fundação ou gestores de parque e/ou incubadora, por exemplo) a atuação em um destes elementos, mas com algum grau de coordenação e 26 interação, e no qual a IGI tem um papel de destaque na gestão e decisões estratégicas sobre a maior parte dos elementos relacionados à participação da universidade em inovação. Além do modelo geral adotado pela universidade, é importante analisar também os modelos de organização adotados pela IGI, cujas possibilidades são as mesmas, mas com concepções distintas: 1) centralizada – apenas uma unidade funcional, com poder decisório centralizado em um pequeno grupo, sem escritórios satélites e/ou autônomos em unidades ou outros campi; 2) descentralizada – comum em grandes universidades com múltiplos campi, com um escritório central e outros alocados em distintos campi e com autonomia, de modo que o escritório possui pouco poder decisório e 3) híbrida – a IGI tem um escritório central forte, responsável pelas decisões estratégicas e pela maior parte de suas atividades, mas possui agentes ou escritórios alocados próximo a unidades ou faculdades da universidade, de modo a estreitar relações com grupos de pesquisa mais atuantes. Essas duas classificações – dos modelos de gestão da universidade e da IGI – são propostas no item 2.2.6 desta tese, com base nos trabalhos de Huyghe et al. (2014), Axanova (2012), e Markman et al. (2005). Apesar de constituírem referência importante a ser estudada e discutida sabe-se que não é possível transpor diretamente esses modelos de experiências de êxito internacionais para o Brasil. Segundo Lemos (2011), as melhores práticas tendem a ser únicas e originais, estando intrinsecamente relacionadas à identidade da organização. Assim, é preciso identificar pontos de sinergia, adaptá-los às especificidades do sistema nacional de inovação e às características próprias da universidade brasileira, construindo um conjunto de orientações que inspire cada instituição a evoluir e se diferenciar em seu caminho específico. Essa adaptação está relacionada ao objetivo central desta tese que é propor diretrizes para a melhoria de modelos de gestão da inovação de universidades brasileiras e sugestões para a modernização de políticas e marcos legais nacionais de estímulo a ciência, tecnologia e inovação, de modo a contribuir para a criação de um ambiente mais propício à promoção da inovação no Brasil. Tais diretrizes e sugestões baseiam-se no estudo de experiências internacionais e nacionais virtuosas 5 , nas últimas três décadas, e nas particularidades do sistema nacional de inovação brasileiro. O objetivo geral detalha-se nos seguintes objetivos específicos: i) contextualizar o papel mais abrangente das universidades no sistema nacional de inovação; ii) caracterizar as 5 Neste trabalho, entende-se que uma experiência virtuosa é aquela que possui características e resultados distintos em alguma área ou elemento da gestão da inovação em universidades, apresentando formas diferentes e eficazes de cumprir seus objetivos. 27 mudanças nas políticas e no marco legal de estímulo à inovação nos países selecionados para estudo – Brasil, Chile, Estados Unidos, Israel e Reino Unido –, bem como seus principais impactos nas universidades – notadamente a partir da década de 1980; iii) identificar as principais barreiras e limitações para a promoção da inovação ainda existentes no Brasil, com destaque para as relacionadas ao marco legal, às políticas, à governança, aos instrumentos e à infraestrutura; iv) analisar as práticas, os modelos, a governança e os principais resultados em inovação obtidos e as principais características de dezesseis IGI 6 dedicadas à gestão da inovação de universidades do Brasil e de países com experiências referenciadas como virtuosas: Georgia Technology Institute (Georgia Tech), Hebrew University of Jerusalém (HUJ), Massachusetts Institute of Technology (MIT), Pontificia Universidad Católica de Chile (UCC), University of California (UC), University of Cambridge (Cambridge), University of Michigan (U-M), University of Pennsylvania (UPenn), University of Utah (UU), Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Universidade Estadual Paulista (UNESP), Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e Universidade de São Paulo (USP). Nesse contexto, são questões desta pesquisa: i) qual é o papel da universidade no SNI do Brasil?; ii) qual é o papel da universidade na criação e na evolução das IGI?; iii) como as IGI brasileiras se estruturaram e quais as principais limitações à sua evolução?; iv) que políticas, marco legal, modelos de gestão e governança são necessários para que as universidades brasileiras possam participar mais efetivamente da inovação no país? A partir dessas questões de pesquisa, foram construídas as seguintes hipóteses: i) o modelo centralizado de gestão da inovação associado a um modelo organizacional da IGI centralizado ou híbrido é o mais adequado para as universidades brasileiras; ii) o modelo jurídico-institucional e de gestão das IGI brasileiras, a falta de financiamento dedicado às IGI e a ausência de um plano de carreiras específico para a inovação nas universidades são grandes entraves à sua evolução; iii) o estímulo ao licenciamento de tecnologias universitárias para a formação de empresas spin-offs é uma das prioridades das experiências virtuosas internacionais de gestão da inovação em universidades; iv) as restrições na legislação brasileira, nas políticas universitárias, estruturas e modelos das IGI brasileiras fazem com que a atividade de criação de spin-offs não seja priorizada na maioria das universidades do país. 6 Os critérios de escolha dessas instituições selecionadas para estudo encontram-se no item 4.2 desta tese. 28Esta tese está organizada em cinco capítulos, além desta introdução e das conclusões. A ordem de apresentação reflete a progressão e o encadeamento da análise que este trabalho se propõe. O Capítulo 1 discute o novo posicionamento das universidades nos sistemas de inovação, reproduzindo o debate sobre as principais mudanças promovidas nas últimas três décadas e as diferentes visões sobre a real contribuição da universidade para a inovação, em consonância com suas tradicionais missões de ensino e pesquisa. Dentro do escopo da tese, esse capítulo tem as seguintes funções: i) situar o objeto em estudo e o marco teórico que embasa o trabalho de pesquisa; ii) fazer uma revisão da literatura recente sobre a evolução das ideias de inovação e progresso técnico, sistemas de inovação, o papel das universidades no sistema de inovação, a evolução das missões da universidade e a cooperação tecnológica U-E. O objetivo do Capítulo 2 é debater a evolução nos modelos de gestão da inovação, com enfoque na gestão da inovação em universidades, visto que ainda há poucos trabalhos na literatura com esse enfoque. Serão explorados nesse capítulo a gestão da inovação em organizações, a inovação aberta, os elementos-chave que compõem a gestão da inovação em universidades, e será proposta uma classificação para os modelos de gestão da inovação em universidades. O objetivo do Capítulo 3 é contextualizar a evolução das políticas, do marco legal e dos mecanismos de estímulo à inovação em países avançados e países em desenvolvimento selecionados para estudo: Brasil, Chile, Estados Unidos, Reino Unido e Israel. A análise mostra como a construção de um arcabouço legal e institucional na área de desenvolvimento científico e tecnológico, associada à adoção de medidas de incentivo à inovação, pode estimular o desenvolvimento do país, e são discutidos os impactos dessas políticas e das consequentes mudanças no marco legal para as universidades. Dessa forma, são objetivos deste capítulo: i) complementar as discussões teóricas dos Capítulos 1 e 2, para fundamentar as hipóteses principais do trabalho; ii) possibilitar um aprendizado sobre os sistemas de inovação, políticas e marco legal de estímulo à inovação dos países em estudo; iii) auxiliar a análise do caso brasileiro e v) extrair elementos para construir as propostas para formuladores e gestores de políticas de apoio à inovação no Brasil, com base no estudo dos países selecionados, a serem apresentadas no Capítulo 5. O Capítulo 4 apresenta as boas práticas de contribuição da universidade para os sistemas de inovação de instituições selecionadas nos países estudados, por meio de estudos de caso elaborados com base nas informações coletadas de fontes primárias (questionários elaborados pela autora e distribuídos para gestores de IGI, entrevistas semiestruturadas 29 complementares e observações participantes) e secundárias (artigos, relatórios de atividades, informações publicadas pelas IGI, informações de associações como a Association of University Managers - AUTM, da Praxis Unico, do Fórum de Gestores de Transferência de Tecnologia - FORTEC, entre outros). Dessa forma, são objetivos deste capítulo: i) descrever a metodologia de pesquisa adotada; ii) apresentar os estudos de caso da gestão da inovação nas universidades selecionadas no exterior (9) e no Brasil (7); iii) extrair elementos para a formulação das recomendações de aprimoramento da gestão da inovação para profissionais de universidades e de IGI brasileiras, descritas no Capítulo 5. As propostas para melhoria dos modelos de gestão da inovação e de políticas de inovação da universidade, bem como sugestões de melhorias na legislação e nas políticas públicas brasileiras de apoio à inovação, encontram-se no Capítulo 5 deste trabalho, cuja função encerra o objetivo central da tese, identificando as lacunas de estímulo à inovação nas esferas institucionais (políticas e modelos de gestão da inovação das universidades) e governamentais (marco legal, estruturais) e apresentando sugestões para seu aprimoramento. Espera-se que a tese contribua, portanto, orientando profissionais envolvidos com os esforços de melhoria de IGI, e pesquisadores da área de inovação, em estudos sobre a participação da universidade na inovação e no empreendedorismo, além da transferência de tecnologias acadêmicas. Os governos também podem se apropriar das discussões aqui realizadas para refletir sobre suas políticas em prol da inovação e da relação U-E. Também as empresas podem encontrar aqui um panorama sobre a estrutura e o papel das IGI e das universidades no SNI, favorecendo seu estreitamento com esse ator para a promoção da inovação empresarial. 30 CAPÍTULO 1 – A Universidade e a Inovação Although there is much good collaborative work underway already, there is more to be done. Universities will have to get better at identifying their areas of competitive strength in research. Government will have to do more to support business-university collaboration. Business will have to learn how to exploit the innovative ideas that are being developed in the university sector. (LAMBERT, 2003, p.2) Introdução Este capítulo discute, principalmente, o novo posicionamento das universidades nos sistemas de inovação a partir da década de 1980. O objetivo central é sintetizar os elementos e conceitos que auxiliam na compreensão dos sistemas de inovação, dos papéis tradicionais da universidade na sociedade e dos papéis ampliados que ela tem sido instada a exercer nos sistemas de inovação, mais expressivamente nas últimas três décadas. A compreensão do processo de inovação avançou muito a partir desse período. Passou-se a entender o caráter sistêmico, interativo e não-linear da inovação; ampliou-se a classificação das inovações além de incrementais e radicais, abarcando também as inovações organizacionais, bem como destacou-se a relevância da contribuição e interação das variadas fontes de inovação internas e externas à firma. O conceito de sistemas de inovação (SI) foi concebido nesse período, no momento em que se difundia a ideia da aceleração da globalização e as especulações sobre a possibilidade do tecnoglobalismo. Defendendo que “[...] a capacidade inovativa de um país ou região é vista como resultado das relações entre os atores econômicos, políticos e sociais, e reflete condições culturais e institucionais próprias” (CASSIOLATO; LASTRES, 2005, p.37), a abordagem dos SI enfatiza o caráter local e nacional da inovação e, simultaneamente, enfraquece a hipótese de tecnoglobalismo. Entende- se, assim, que cada empresa, região e/ou nação possui uma estratégia de desenvolvimento tecnológico específica, uma vez que estão inseridas em contextos econômicos, políticos e sociais específicos, e cada estratégia deve ser definida respeitando-se as particularidades desses contextos. A partir desse mesmo período, as universidades passaram a ser solicitadas a contribuir mais diretamente e significativamente para o desenvolvimento econômico local e nacional. Essa convocação que provocou novas discussões associadas tanto às contribuições que as universidades de fato trazem à sociedade quanto aos impactos e às transformações que 31 se engendram na missão e na atuação da universidade a partir dessa demanda de contribuição mais significativa para o desenvolvimento econômico local e nacional. Tradicionalmente, as universidades já possuem papel relevante nos sistemas nacionais e locais de inovação, atuando como formadoras de recursos humanos qualificados e produtoras de conhecimentos científicos importantes para o desenvolvimento tecnológico. Nas últimas três décadas, com a percepção de que sua missão pode ser mais abrangente do que a produção e a disseminação do conhecimento e das atividades tradicionais de extensão universitária, as universidades passam a exercer umpapel mais proativo nos sistemas de inovação, ampliando as formas de atender às demandas da sociedade sem comprometer os valores acadêmicos. Nesse sentido, parcerias público-privadas em P&D têm sido incentivadas e fortalecidas, uma vez que a cooperação entre esses atores, em uma perspectiva sistêmica da inovação, torna-se relevante para a competitividade das empresas e da nação. A intensificação do estímulo à cooperação com as empresas tem provocado expressivas transformações estruturais nas ICT. Dentro dessa perspectiva, este capítulo, composto de quatro seções, inicia-se com a discussão das mudanças no entendimento do processo de inovação ocorridas nas últimas décadas, apresentada na primeira seção a partir da definição de conceitos como inovação e progresso técnico, fundamentais para este trabalho, e, discutindo modelos interpretativos do processo de inovação como o modelo linear e os modelos interativos. A segunda seção discute a abordagem de sistemas de inovação, outro corpo de conhecimento fundamental para esta tese. Na terceira seção, é contextualizada a evolução histórica das missões da universidade até chegar no debate do novo papel da universidade nos SI, denominado por muitos autores como a terceira missão da universidade da universidade. Finaliza-se o capítulo com algumas considerações teóricas sobre a interação da universidade com empresas em inovação, que é um elemento importante da sua terceira missão. 1.1. Avanço na Compreensão da Inovação O debate sobre a inovação – sua natureza, suas características e fontes – com o objetivo de buscar uma maior compreensão do seu papel no desenvolvimento econômico tem se intensificado nas últimas décadas, destacando-se como grande divisor a contribuição de Joseph Schumpeter, na primeira metade do século XX, que tornou evidente a importância das inovações no desenvolvimento de empresas e da economia (SCHUMPETER, 1982; LEMOS, 32 1999; NIOSI et al., 1993; CASSIOLATO; LASTRES, 2005). Referência notória no estudo do processo de inovação, Schumpeter a entendia como uma nova combinação de recursos produtivos e defendia que o desenvolvimento econômico é direcionado pela inovação por meio de uma dinâmica em que as novas tecnologias substituem as antigas, em um processo que ele chamou de “destruição criadora”. Para Dosi (1982), o processo inovativo é moldado pela influência mútua de fatores institucionais e econômicos. Kline e Rosenberg (1986) enxergaram a inovação como um processo interativo, envolvendo o relacionamento entre diferentes atores. Cohen e Levinthal (1990) a descreveram como um processo diversificado de aprendizado, que pode ocorrer por meio do uso ou compartilhamento de fontes internas ou externas de conhecimento e da capacidade de absorção das firmas. Patel e Pavitt (1994) contemplaram a inovação como um processo envolvendo a troca de conhecimentos codificados e tácitos. Edquisit (1997) a interpretou como o resultado de processos interativos e cumulativos de aprendizado, no qual conhecimentos existentes são combinados de novas formas ou novos conhecimentos são gerados por meio da interação entre instituições diversas. O manual de Oslo (2005) contribuiu com uma visão mais holística da inovação. Nos próximos parágrafos será detalhada a evolução no entendimento da inovação promovida nas últimas cinco décadas. A visão linear do processo de inovação foi estabelecida, notadamente, a partir do modelo de desenvolvimento científico e tecnológico introduzido pelo relatório Science, the Endless Frontier7 de Vannevar Bush, em 19458, que ficou conhecido como o “modelo linear de inovação”. Esse modelo institucionalizou a crença – ainda existente na comunidade científica e no governo de algumas nações – de que conhecimento e uso são objetivos de pesquisa conflitantes e que a pesquisa básica e pesquisa aplicada são categorias distintas. O modelo linear compreende a inovação como um processo sequencial, em que novos conhecimentos advindos da pesquisa básica levariam a processos de invenção que seriam seguidos por atividades de pesquisa aplicada e desenvolvimento, resultando na produção e introdução de produtos e processos no mercado. Pressupõe, entre outras coisas, a separação institucional entre a pesquisa básica (realizada por universidades e institutos de 7 Bush, V. Science, the Endless Frontier: a report to the president on a program for postwar scientific research. Washington: NSF, 1945. 8 Em 1944, o então Presidente dos EUA Franklin Roosevelt pediu ao seu diretor do Office of Scientific Research and Development, Vannevar Bush, um relatório sobre o papel da ciência em tempos de paz. Bush definiu uma visão de como a nação poderia manter seus investimentos em pesquisa científica quando a guerra terminasse, tornando-se um referencial para política científica nacional ao longo das décadas subsequentes (STOKES, 2005). 33 pesquisa) e a pesquisa aplicada e desenvolvimento (realizada por empresas). Esse modelo suscitou diversas críticas devido à visão restrita da dinâmica inovativa que ele defende. A separação entre pesquisa básica e aplicada é uma de suas fragilidades, uma vez que muitos avanços científicos ocorrem em função de problemas práticos. O embasamento excessivo do modelo na pesquisa básica como fonte de novas tecnologias também representa outra grande limitação desse modelo, uma vez que a ideia de que a inovação é sempre iniciada a partir da pesquisa científica é equivocada (SIRILLI, 1998). Na realidade, muitas tecnologias foram criadas sem que houvesse conhecimento científico prévio, de modo que grande parte das inovações tecnológicas não é decorrente da pesquisa científica, procedendo muitas vezes de iniciativas das empresas para atender as necessidades de mercado que de oportunidades tecnológicas. A ausência de feedbacks entre os processos de desenvolvimento e dos clientes e/ou usuários finais é mais uma limitação do modelo linear, conforme Kline e Rosenberg (1986). Salientam esses autores que feedbacks são inerentes ao processo de desenvolvimento, uma vez que a inovação requer interação e intercâmbio de informações de várias fontes para o ajuste e a adequação do processo, bem como para a adequada tomada de decisão. Outras duas limitações importantes do modelo linear de inovação são: i) a visão tecnocrática do processo de inovação, visto que define a inovação tecnológica em termos de construção de equipamentos e dispositivos e de desenvolvimento de conhecimentos relacionados a produtos e processos específicos; ii) a negligência com relação às atividades não relacionadas a P&D, já que trata a inovação tecnológica como um ato de produção em vez de um processo social que envolve atividades de gestão, coordenação, aprendizado, negociação, investigação de necessidades de usuários, aquisição de competência, gestão do desenvolvimento de novo produto, gestão financeira, entre outras (SIRILLI, 1998). A partir da década de 1980, tornou-se mais difundido o entendimento de que investimentos em P&D não necessariamente asseguram o êxito no desenvolvimento tecnológico, evidenciando-se as limitações dos aspectos tecnocráticos do modelo linear, bem como a importância das empresas, das habilidades organizacionais e do desenvolvimento e da acumulação de um conjunto abrangente de competências para o sucesso do processo inovativo. Foram desenvolvidas abordagens não-lineares ou interativas desse processo, que enxergam a inovação como “[...] um processo de aprendizado não-linear, cumulativo, específico da localidade e conformado institucionalmente” (CASSIOLATO; LASTRES, 2005, p.35). 34 Kline e Rosenberg (1986) introduziram um dos mais discutidos modelos interativos do processo de inovação, o chain-linked model, que combina interações no interior das empresas e interações entre as empresas e o sistema
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