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nº 184 • Agosto | Setembro • 2015 Data celebrada em 27 de agosto homenageou a categoria que, nesta edição especial, mostra onde e como faz Psicologia no dia a dia por uma sociedade mais democrática e igualitária A Psicologia Erika Caixa de texto ÍNDICE PSICOLOGIA CLÍNICA .......................... 03 PSICOLOGIA CLÍNICA .......................... 07 PSICOLOGIA ESCOLAR ....................... 12 PSICOLOGIA ESCOLAR ........................16 PSICOLOGIA ESCOLAR ....................... 25 PSICOLOGIA DO ESPORTE ................ 28 PSICOLOGIA DO ESPORTE ................. 34 PSICOLOGIA DO ESPORTE ................. 38 PSICOLOGIA FORENSE ....................... 45 PSICOLOGIA FORENSE ....................... 49 PSICOLOGIA FORENSE ....................... 54 PSICOLOGIA HOPITALAR .................... 59 PSICOLOGIA INSTITUCIONAL ............. 64 PSICOLOGIA INSTITUCIONAL ............. 72 NEUORPSICOLOGIA ............................ 78 PSICOLOGIA ORGANIZACIONAL ....... 81 PSICOLOGIA DO TRÂNSITO ............... 85 PSICOLOGIA ORGANIZACIONAL ........ 89 2 psi • Conselho Regional de PsiCologia de são Paulo Publicação do Conselho Regional de Psicologia de são Paulo, CRP sP, 6ª Região Diretoria Presidenta | elisa Zaneratto Rosa Vice-presidenta | adriana eiko Matsumoto secretário | guilherme luz Fenerich Tesoureira | gabriela gramkow Conselheiros alacir Villa Valle Cruces, aristeu Bertelli da silva, Bruno simões gonçalves, Camila de Freitas Teodoro, Dario Henrique Teófilo Schezzi, Graça Maria de Carvalho Camara, gustavo de lima Bernardes sales, ilana Mountian, Janaína leslão garcia, Joari aparecido soares de Carvalho, Jonathas José salathiel da silva, José agnaldo gomes, livia gonsalves Toledo, luis Fernando de oliveira saraiva, luiz eduardo Valiengo Berni, Maria das graças Mazarin de araujo, Maria ermínia Ciliberti, Marília Capponi, Mirnamar Pinto da Fonseca Pagliuso, Moacyr Miniussi Bertolino neto, Regiane aparecida Piva, sandra elena spósito, sergio augusto garcia Junior, silvio Yasui. Realização Linha Fina Jornalista responsável Milton Bellintani (MT b 18.122) Reportagens adriana Carvalho, denise Ramiro, Milton Bellintani Direção de arte Cláudio Franchini Fotos da capa Reprodução site CRP sP Revisão linha Fina Impressão Rettec Artes Gráficas Tiragem 89.300 exemplares Sede CRP SP Rua arruda alvim, 89, Jardim américa Cep 05410-020 são Paulo sP Tel. (11) 3061-9494 | fax (11) 3061-0306 E-mails atendimento | atendimento@crpsp.org.br diretoria | direcao@crpsp.org.br informações | info@crpsp.org.br Centro de orientação | orientacao@crpsp.org.br administração | admin@crpsp.org.br Comunicação | comunicacao@crpsp.org.br Site www.crpsp.org.br Subsedes CRP SP assis | tel. (18) 3322-6224, 3322-3932 Baixada santista e Vale do Ribeira tel. (13) 3235-2324, 3235-2441 Bauru | tel. (14) 3223-3147, 3223-6020 Campinas | tel. (19) 3243-7877, 3241-8516 grande aBC | tel. (11) 4436-4000, 4427-6847 Ribeirão Preto | tel. (16) 3620-1377, 3623-5658 são José do Rio Preto | tel. (17) 3235-2883, 3235-5047 sorocaba | tel. (15) 3211-6368, 3211-6370 Vale do Paraíba e litoral norte | tel. (12) 3631-1315 í n d i c e 184 PROCESSO | ACOLHIMENTO a psicóloga ana Maria e o estudante Wallace atuam em duas realidades. ela na atenção a pessoas com esclerose múltipla e ele, com usuários de crack. 4 PROCESSO | ACOMPANHAMENTO irineu atua com prevenção de perda de memória de idosos. Marcelo promove a religação dos vínculos de pessoas em condições de abandono. 8 PROCESSO | AVALIAÇÃO Armando introduziu a avaliação psicológica em um hospital para identificar níveis de estresse. lúcia analisa casos da justiça de crianças e adolescentes. 11 PROCESSO | EDUCATIVO Marcos coordena grupos de pesquisa docente na universidade. a estudante ester completa sua formação em sintonia com a professora que supervisiona estágios. 14 CAPA | PSICOLOGIA TODO DIA, EM TODO LUGAR E SEUS PROCESSO DE TRABALHO depoimentos em vídeo recebidos pelo CRP sP já somam mais de 300. Relatos estão organizados no site pelos processos da profissão e dão visibilidade às práticas psi. 16 PROCESSOS | FORMATIVO E FORMATIVO DE PSICÓLOGAS/OS Mariana e ana Cristina são professoras. uma no curso de Psicologia e a outra no de serviço social. Pablo fala de suas descobertas no estágio com Reintegração social. 20 PROCESSOS | GRUPAIS Marcella e ariadine contam sobre os benefícios da terapia grupal para promover o bem estar e a qualidade de vida das pessoas. 22 PROCESSO | ORGANIZATIVO a experiência de dreyf e eduardo passa por palcos distintos, cujo ponto em comum é colocar a Psicologia na proteção de quem tem direitos negados. 25 PROCESSOS | ORIENTAÇÃO E ACONSELHAMENTO Maria Celina atua com alunos em projeto de saúde coletiva de um Centro universitário. Ricardo com os 250 usuários de um CaPs e seus familiares. 27 PROCESSO | TERAPÊUTICO Cássia, Carlos e Wellington atendem estudantess em espaços distintos: consultório, clínica particular e serviço público. Veja o que há de comum em seu trabalho. 30 Capa (a partir da esquerda): dreyf gonçalves, ana Cristina nassif soares, Ma- ria Celina Trevizan Costa, ariadine Beneton de Campos, Cássia Bighetti, Mariana garbin, Wellington Passos, ester aline da silva, ana Maria Canzonieri, irineu Fer- reira de souza, Marcelo Marques de oliveira, lucia Maria Rodrigues de almeida e Marcella Milano. Contracapa (a partir da esquerda): Marcos Roberto Vieira garcia, Clélia Prestes, lívia Penteado, Carlos eduardo Mendes, ana Bock, eduardo neves, Priscila leite gonçalves, Carlos eduardo Cunha, Mathilde neder, Ricardo José her- nandes, armando Ribeiro das neves neto, ana Rita de Paula, lilian suzuki. Carlos Cunha entende e pratica a Psicologia como um fazer coletivo Veja o vídeo de Carlos Eduardo Cunha usando o leitor de QR Code do celular/tablet ou clicando com o mouse na foto. 30 psi • ConsElho REgional dE PsiCologia dE são Paulo Em seu consultório no distrito de souzas, na Região Metro-politana de Campinas, a psi- cóloga Cássia aparecida Bighet- ti atende pessoas com questões diversas. a depressão é uma das mais recorrentes e foi o tema de seu doutorado. sua inserção na carreira combina a atuação clínica individual com a docência. “desde a graduação, que concluí em 1993, meu foco é a terapia cognitivo comportamental. Comecei aten- dendo na Clínica da universidade são Francisco, em itatiba, quando cursava o mestrado. Foi onde me formei e, hoje, coordeno o curso de Psicologia”, explica Cássia. a pesquisa no doutorado pro- porcionou a ela ferramentas para aprofundar-se no tratamento da depressão e de pessoas com trans- torno de humor. “além de adultos, também trabalho com crianças que apresentam indícios de de- pressão infantil. Meu foco está na família: terapia individual de adul- tos, crianças, pais e casais. ” no caso dela, a atuação acadê- mica é o espaço onde, no dia a dia, realiza a troca de conhecimentos, se atualiza e torna a rotina indi- vidual no consultório o momento em que escolhe trabalhar sozinha. Carlos Eduardo Cunha trabalha não muito distante dali: em su- maré, cidade a apenas 41 km de distância. Mas seu ambiente pro- fissional é totalmente diferente, marcado por práticas coletivas. Como único psicólogo da secreta- ria Municipal de saúde, ele atua no apoio em saúde mental da equipe de saúde, que é composta, ainda, por um médicos e enfermeiros. “Prestei concurso público e fui se- lecionado para trabalhar na cida- de, que na época organizava o seu serviço de saúde mental”, conta. Carlos passou cinco anos traba- lhando na área de assistência à saúde até ser convidado a reorga- nizar os serviços, passando a atuar na gestão. “uma das medidas foi desmembrar o ambulatório de es- pecialidades médica, separando e fortalecendo o ambulatório de saú- de mental”, explica. segundo ele, foi uma época rica de debates so- bre o tema no município, embala- do pela Reforma Psiquiátrica e pela construçãodo sistema Único de saúde (sus). algum tempo depois, sumaré criou seu CaPs (Centro de atenção Psicossocial). Tecendo a rede Paralelamente a isso, Carlos fez uma especializacão em gestão de serviços de saúde. “no curso, de dois anos, se discutiu desde a filosofia do sus a uma proposta gerencial de uma unidade Básica de saúde.” o viés de gestor se colou definitiva- p r o c e s s o s : t e r a p ê u t i c o s ajuda o outro a falar Cássia, Carlos e Wellington atendem pessoas com questões como depressão, uso de drogas ilícitas e problemas respiratórios de ordem psicológica. Em consultório próprio, no serviço público e clínica particular. O processo de trabalho unifica essas diferenças Quem sabe ouvir Erika Caixa de texto PSICOLOGIA CLÍNICA mente em sua atuação como psicó- logo. “Como apoiador, minha ação principal é trabalhar na confecção da teia que potencializa os serviços de saúde, atuando com os gestores das unidades de saúde e com os traba- lhadores da saúde mental.” Ele conta que sua visão da Psicolo- gia, enquanto profissão que trabalha para diminuir o sofrimento psíquico das pessoas, está marcada por criar as condições para que esse serviço possa ser acessado universalmente – por quem pode pagar pelos servi- ços e por quem depende de que seja ofertado pelo setor público. Sujeitos de direitos ao formar-se em 2013, após cursar administração, Wellington Passos se imaginava trilhando o caminho em que melhor poderia aproveitar seu conhecimento anterior: a Psicologia organizacional. Em vez disso, foi atraído pela Psicologia Clínica, área em que cada vez mais reconhece uma habilidade nova: a de saber es- cutar as pessoas. a mudanca de prioridade não foi obra do acaso e sim sugestão de um amigo, dono de uma clínica de trata- mento de doenças respiratórias, que o convidou para usar uma sala em seu primeiro ano como psicólogo. “a clínica ofereceu a possibilidade de atendimento psicológico a quem tinha problemas respiratórios e esse serviço apurou que existia mais rela- ção entre dificuldades de respiração e questões de fundo psicológico do que se poderia imaginar”, relata. Quais eram essas questões? Para muitos fumantes, a atenção psicoló- gica revelou que o cigarro era conse- quência e não causa de seus proble- mas de saúde, apesar de agravá-los. se o tabaco levou à perda da capaci- dade respiratória, a necessidade de fumar passou a ser percebida como compensação para situações de ansiedade, angústia ou depressão. “algumas pessoas entenderam que se resolverem essas questões terão mais chance de deixar o fumo”, diz. Essas três experiências, tão dife- rentes entre si, não poderiam ser comparadas na análise da Psico- logia sob a luz da classificação por áreas. ao contrário. É no reconhe- cimento dessa diversidade que a Psicologia vislumbra novos cami- nhos de atuação. Wellington Passos se imaginava um psicólogo organizacional e virou clínico Veja o vídeo de Wellington Passos usando o leitor de QR Code do celular/tablet ou clicando com o mouse na foto. Cássia Bighetti atua sozinha em consultório e cercada de gente, na universidade Veja o vídeo de Cássia aparecida Bighetti usando o leitor de QR Code do celular/tablet ou clicando com o mouse na foto. Erika Caixa de texto PSICOLOGIA CLÍNICA Erika Caixa de texto PSICOLOGIA ESCOLAR Educação sob pressão 14 PERSPECTIVA DA/DO USUÁRIA/OPráticas Integrativas Complementares crescem em variedade4 ORIENTAÇÃOPosse de armas e o papel das/dos psicólogas/os 20 MATÉRIA ESPECIALA importância de compreender (e defender) a laicidade Em meio a propostas conservadoras, psicólogas e psicólogos podem contribuir para defender a pluralidade e a democracia nas escolasnº 195 • Fevereiro | Março | Abril • 2019 2 S U M Á R I O 13 PENALIDADES 14 PERSPECTIVA DO USUÁRIO Práticas Integrativas Complementares focam a saúde dos pacientes e os ajudam a reencontrarem-se. 27 UM DIA NA VIDA | COACHING Eliana Totti detalha os fundamentos e objetivos da profissão e defende a melhor formação na área. 7 CAPA | EDUCAÇÃO Medidas e projetos conservadores que rondam o setor no Brasil e o papel da Psicologia nesse cenário. 24 ARTIGO | SUICÍDIO Marcia Matos trata do tema (e de sua relação com ele), que ainda é um tabu na sociedade. 26 SUBSEDE | ALTO TIETÊ Depois de décadas de espera, profissionais de 11 municípios passam a ter o apoio de nova unidade. 30ESTANTE | MURALUma seleção de livros lançados e eventos programados relacionados aos temas da edição. 20 MATÉRIA ESPECIAL | LAICIDADE A separação entre Estado e Igreja é tema tão antigo, latente e maltratado quanto relevante para assegurar a pluralidade e os Direitos Humanos. Publicação do Conselho Regional de Psicologia de São Paulo, CRP SP, 6ª Região Diretoria Presidenta | Luciana Stoppa dos Santos Vice-presidenta | Larissa Gomes Ornelas Pedott Secretária | Suely Castaldi Ortiz da Silva Tesoureiro | Guilherme Rodrigues Raggi Pereira Conselheiras/os Aristeu Bertelli da Silva (Afastado desde 1º/03/2019 - PL 2068ª de 16/03/2019), Beatriz Borges Brambilla, Beatriz Marques de Mattos, Bruna Lavinas Jardim Falleiros (Afastada desde 16/03/2019 - PL 2068ª, de 16/03/2019), Clarice Pimentel Paulon (Afastada desde 16/03/2019 - PL 2068ª de 16/03/2019), Ed Otsuka, Edgar Rodrigues, Evelyn Sayeg (Licenciada desde 20/10/2018 - PL 2051ª de 20/10/18), Ivana do Carmo Souza, Ivani Francisco de Oliveira, Magna Barboza Damasceno, Maria das Graças Mazarin de Araújo, Maria Mercedes Whitaker Kehl Vieira Bicudo Guarnieri, Maria Rozineti Gonçalves, Maurício Marinho Iwai (Licenciado desde 1º/03/2019 - PL 2068ª, de 16/03/2019), Mary Ueta, Monalisa Muniz Nascimento, Regiane Aparecida Piva, Reginaldo Branco da Silva, Rodrigo Fernando Presotto, Rodrigo Toledo , Vinicius Cesca de Lima (Licenciado desde 07/03/2019 - PL 2068ª de 16/03/2019) Realização Coordenação de Relações Externas CRP SP Cristina Fernandes de Souza e KMZ CONTEÚDO Jornalista responsável Gustavo Dhein (MTB 39.546 SP) Reportagens e Edição Gustavo Dhein e Erika Mazon Direção de arte Sergio Honório Capa Sergio Honório | Foto Freepik Fotos internas Arquivo CRP-SP, iStock e Pixabay Revisão CRP SP Impressão Rettec Artes Gráficas e Editora Ltda Tiragem 107.000 exemplares Sede CRP SP Rua Arruda Alvim, 89, Jardim América Cep 05410-020 São Paulo SP Tel. (11) 3061-9494 | fax (11) 3061-0306 E-mails Atendimento | atendimento@crpsp.org.br Diretoria | direcao@crpsp.org.br Informações | info@crpsp.org.br Centro de Orientação | orientacao@crpsp.org.br Administração | admin@crpsp.org.br Comunicação | comunicacao@crpsp.org.br Site www.crpsp.org.br Subsedes CRP SP Assis | tel. (18) 3322-6224, 3322-3932 Baixada Santista e Vale do Ribeira tel. (13) 3235-2324, 3235-2441 Bauru | tel. (14) 3223-3147, 3223-6020 Campinas | tel. (19) 3243-7877, 3241-8516 Grande ABC | tel. (11) 4436-4000, 4427-6847 Ribeirão Preto | tel. (16) 3620-1377, 3623-5658 São José do Rio Preto | tel. (17) 3235-2883, 3235-5047 Sorocaba | tel. (15) 3211-6368, 3211-6370 Vale do Paraíba e Litoral Norte | tel. (12) 3631-1315 Errata Na edição nº 194, pág. 6, foi publicado errado o crédito da entrevistada Cláudia Catão, que é doutora em psicologia clínica e psicanalista; e na pág. 26, também foi publicado errado o crédito da entrevistada Ana Gebrim, que é psicanalista e socióloga. 4 ORIENTAÇÃO | POSSE DE ARMAS Decreto facilita o acesso e amplia o intervalo entre as avaliações psicológicas para 10 anos. 18 COTIDIANO | COREP A Psicologia brasileira se organiza, por meio de eventos preparatórios, pré-congressos, congressos regionais e nacional, para definir suas diretrizes. Conselho Regional de Psicologia de São Paulo • 3 A educação sempre foi um campo em disputa e nos últimos tempos tem estado ainda mais no centro do debate público. E a Psicologia tem muito a contri- buir com este debate e não é somente nas situações emergenciais como a ocorrida em uma escola esta- dual de Suzano (SP) em março, naqual dois jovens atentaram contra a vida de estudantes e funcionários da unidade educacional. Tampouco a atuação das psicólogas e psicólogos é exclusiva para atender es- tudantes considerados como “problemáticos”. Dedi- camos a matéria de capa desta edição para jogar luz na complexa teia de relações que acontecem dentro da escola e fora dela que afetam sobremaneira quem está na ponta, principalmente os estudantes, profes- sores e a comunidade escolar, e que necessitam, hoje mais que nunca, do olhar e da atuação dedicada e cui- dadosa da Psicologia. Atentos aos desafios a serem enfrentados pela sociedade para o fortalecimento do Estado Democrá- tico que assegura o cumprimento dos direitos huma- nos inalienáveis e a proteção da vida, trazemos tam- bém nesta edição a orientação para a/o psicóloga/o em como atuar frente às mudanças geradas pelo de- creto que flexibiliza a posse de arma. Também baseados na premissa de políticas pú- blicas que garantam o bem-estar de toda a popula- ção, destacamos a inclusão das Práticas Integrativas Complementares no Sistema Único de Saúde (SUS). Vale ressaltar que o Sistema Conselhos vem discutin- do os limites e possibilidades da prática profissional da/o psicóloga/o neste campo. É justamente pensan- do no bem-estar dos indivíduos e na qualidade dos serviços oferecidos a quem precisa deles que pro- duzimos uma matéria sobre coaching, em que expli- citamos as diferenças e complementariedade entre coaching e Psicologia. Na matéria, é ressaltada, so- bretudo, a importância da formação adequada e uma prática baseada em evidências científicas e orienta- da pelo rigor ético. O Código de Ética Profissional da/o Psicóloga/o no artigo 2º das Responsabilidades da/o Psicóloga/o diz que ao psicólogo é vedado “induzir a convicções po- líticas, filosóficas, morais, ideológicas, religiosas, de orientação sexual ou a qualquer tipo de preconceito, quando do exercício de suas funções profissionais. Foi a partir desse princípio que produzimos a matéria especial sobre laicidade. Não se trata de posição con- trária às religiões, mas sim de assegurar a pluralidade e a separação entre Estado e religião. A laicidade in- teressa a todas as religiões pois protege a diversida- de de crenças. Na seção Cotidiano contamos um pouco como foi todo o processo que culminou no 10º Corep, que aconteceu nos dias 5, 6 e 7 de abril. Foram 129 even- tos preparatórios desde outubro de 2018 que reuniu 4.551 participantes, além dos 36 pré-congressos com 449 psicólogas/os que ocorreram nas sede e subse- des do Estado de São Paulo. Foram produzidas 1.380 propostas foram eleitas 209 delegadas e 32 estudan- tes delegadas para estarem presentes no Congres- so Regional. A cobertura completa estará na próxima edição do Jornal Psi. E por que tratamos do Corep na seção Cotidiano? Porque acreditamos que o Corep é o momento em que exercemos nosso ideal de respeito mútuo com as diferenças e os diferentes, no espaço da categoria, para se pensar e repensar a Psicologia como profissão e sua fundamental contribuição para a sociedade. E foi justamente no IX Congresso Regional da Psi- cologia que foi proposta e aprovada a instalação de uma nova subsede para atender a região Alto Tietê. É com muita alegria que apresentamos nesta edição a nova subsede localizada em Mogi das Cruzes que atenderá cerca de 5 mil psicólogas/os de 11 municí- pios da região. É uma conquista que vem atender a uma reinvindicação de três décadas da categoria! XV Plenário do Conselho Regional de Psicologia de São Paulo E D I T O R I A L A PSICOLOGIA EM DEFESA DA EDUCAÇÃO Erika Caixa de texto PSICOLOGIA ESCOLAR n ° 1 9 5 • F e v e r e i r o - M a r ç o - A b r i l • 2 0 1 9 Conselho Regional de Psicologia de São Paulo • 7 A Psicologia pode ajudar a frear a onda conservadora que ameaça avançar sobre o ensino com consequências desastrosas EDUCAÇÃO COM TODAS E PARA TODAS AS PESSOAS Para ela, as ações relacionadas a essa onda con- servadora favorecem a perpetuação do status quo, a não abertura ao diferente, e integram um bem articula- do projeto de doutrinação que inclui até mesmo o se- questro semântico de expressões e termos. Exemplo é a própria “Escola sem partido”, conceito que provoca debates e é bastante ideológico: quer um partido único. “A verdadeira escola sem partido é aquela que nós e os professores, em sua maioria, defendemos há tempos, caracterizada pela defesa da pluralidade e do respei- to. Alguém se atreve a dizer que as escolas militares – que o governo pretende expandir – não têm partido?”, questiona Fabíola. Beatriz complementa: “autores como Paulo Freire e Ignácio Martín-Baró, nos anos de 1970 e 1980, já falavam sobre a necessidade de de- sideologização na educação, mas, para eles, isso sig- nifica desocultar aquilo que está escamoteado, como as opressões, as violências e as desigualdades. Ou seja, desideologizar passa por explicitar como a rea- lidade se constituiu, justamente o que as propostas conservadoras pretendem eliminar”. “E scola sem partido, reforma curricular do ensino médio, ensino domiciliar, cortes orçamentários, militarização das escolas. Os temas e projetos são variados, mas a pauta de todos está alinhada a um objetivo comum: interdição à formação do pensamento crítico. Essa síntese é possível de ser construída a partir das declarações das professoras universitárias e psicólogas Marilene Proença Rebello de Souza, Fabiola Freire Saraiva Melo e Beatriz Borges Brambilla a respeito da educação brasileira atual e dos desafios que ela enfrenta com o fortalecimento de uma onda conservadora que tenta avançar sobre o setor. O que está em questão é, fundamentalmente, o tipo de formação a ser oferecida e que escola deve ser consolidada. “Ela pode ser um espaço em que as relações sociais se reproduzem, com violência, desigualdade, preconceito, ou seja, tal como funciona a sociedade, ou um espaço para a produção do novo, de elaboração de sentimentos e histórias, de retomadas de memórias pessoal e/ou coletivas”, diz Beatriz. “passivos”, mas que para compreender o espaço dado pela população ao conservadorismo é preciso levar em conta o fato de sermos frutos de uma história de dominação, de colonialidade, que acaba traduzindo em silenciamentos: hoje, a colonialidade espelha o neoli- beralismo, que vai muito além da economia e interfere inclusive no conjunto de afetos que os sujeitos podem ou não produzir a partir de sua lógica individualista. Marilene ressalta o período entre 2002 e 2014 como altamente relevante para a educação em razão do desenvolvimento de valores progressistas e da promoção de ações como a criação da Conferência Nacional da Educação, da qual a categoria de psicólo- gas e psicólogos participou ativamente. “Houve mais recursos para o ensino e a formação de professores, aprovação 10% do PIB para o setor, redução na eva- são escolar, articulação do governo federal com Es- tados e municípios, criação do Ideb e a reorganização de áreas estratégicas no Ministério da Educação. Ou seja, a educação passou a ter lugar central nas políti- cas governamentais, para além da retórica”, sintetiza a docente da USP. Ilu st ra çõ es : S er gi o R os si Os motivos para que o pensamento conservador avance no Brasil incluem, na opinião de Fabíola, a crise econômica e a descrença em relação à política tradi- cional, fenômenos interligados. Eles ajudam a com- preender, por exemplo, a ascensão ao poder do novo governo federal, que se comprometeu com pautas re- trógradas e baseadas na defesa da moral. Além disso, segundo ela, esse tipo de posicionamento encontra eco em nossa sociedade porque ela remanesce estru- turalmente racista, homofóbica e machista, reflexo de nossa história. “Com isso, abre-se espaço para uma série de políticas educacionais intencionais, que aca- bam sendo chamadas de reformas, mas são extrema- mente perigosas, porque trazem à tona coisas que in- genuamente imaginávamos ter ficadono passado. Se olharmos para trás, confirmaremos que, em vários mo- mentos, a educação foi empregada como instrumento de domesticação, para colonizar as pessoas, ou, como diria Hannah Arendt, promover a coerção sem a neces- sidade de empregar a violência”, explica. Para Fabíola, existe uma tendência de muitos assumirem, a partir do cenário atual, que os brasileiros são “conformados”, CAPA Conselho Regional de Psicologia de São Paulo8 No entanto, paralelamente a esses aspectos re- levantes, outros foram relegados a segundo plano, o que parece interferir diretamente no atual cenário. “Apesar de extremamente importante, o aporte maior na educação representou, para um grande número de brasileiros, o acesso às novas políticas sociais, mas não a uma nova política educacional efetivamente”, diz Fabíola. Formação crítica x submissão e disciplina As três psicólogas fazem uma leitura convergente sobre o que pode representar o avanço do conser- vadorismo sobre a educação em relação ao desen- volvimento dos estudantes: a interdição do pensar sobre os processos históricos e sociais e a formação de pessoas submissas, disciplinadas, subordinadas, que não conhecem – e tornam-se, portanto, menos aptas a contestar – as contradições e de- sigualdades existentes. “Há vários in- teresses em jogo nisso, incluindo, é claro, o do mercado, ao qual pouco interessa a existência de profis- sionais críticos. Para o mercado, interessa que existam executo- res. Quando você cria – ou pelo menos pretende criar – uma lei que proíbe temáticas específi- cas na escola, você está privan- do as pessoas de aprenderem a pensar. Como não falar sobre as- suntos como o feminismo, em pleno século XXI, num país com alto índice de feminicídio e estupros, sendo muitos deles dentro das famílias?”, analisa Fabíola. Para Marilene, o conservadorismo no campo da educação se manifesta em aspectos básicos e afir- mações simplistas, como as de que “as famílias das classes populares não cuidam de seus filhos”, “a criança pobre não é capaz de aprender”, bem como na manutenção de uma escola disciplinar com esva- ziamento dos conteúdos e do conhecimento. “A dis- puta que está em jogo é por valores e direitos sociais, e ainda estamos em choque, precisamos entender melhor o que está acontecendo para encontrar nos- sos argumentos e fortalecê-los”, avalia. A regulamentação do ensino domiciliar também preocupa por seguir a orientação ideológica reacio- nária. “É um movimento contrário à democratização da sociedade retirar crianças e jovens do convívio es- colar, de um espaço tão importante de socialização que é a escola”, afirma Marilene. Os educandários, especialmente os públicos, a despeito de suas po- tenciais falhas ou fragilidades, configuram um cená- rio que possibilita o contato com diferentes classes sociais, ideias, raças, etc. Ela critica um dos principais argumentos dos defensores da educação domiciliar, que veem nela a possibilidade de blindar seus filhos da violência, do bullying e de comportamentos inde- sejáveis. “Pode-se acabar formando novos guetos que impeçam a interação com o diferente, o divergen- te, que é o que as escolas também possibilitam. As famílias podem optar por matricular seus filhos em colégios com uma inclinação religiosa específica, por exemplo, o que não podemos aceitar é que a escolha religiosa se torne uma política pública. Considerar que a educação domiciliar se torne uma política de Estado é desconsiderar a luta pela democratização da edu- cação que sempre defendemos e continuare- mos defender”, diz. Beatriz considera que a pauta vai de encontro à batalha travada há anos por profissionais da educação, pis- cólogas e psicólogos, no sentido de garantir a educação pública, gratuita e de qualidade, com o Estado se responsabilizando pelo acesso de todos ao ensino. “Além disso, a educação domiciliar fere a Lei das Diretrizes e Bases (LDB), que pressupõe relações de convivência e diversidade do conteúdo ensinado”, ar- gumenta. Para Fabíola, a educação domiciliar, além de ser uma forma de o governo transferir suas responsa- bilidades para os indivíduos, tende a afetar especial- mente as classes menos favorecidas – além de legiti- mar a possibilidade de haver crianças fora da escola. “Estamos em um país em que persiste uma alta taxa de analfabetismo, em que crianças não conseguem fazer contas básicas. Como esperar, por exemplo, que um pai sem o devido preparo seja capaz de repassar conhecimentos aos filhos? Professores formados en- contram dificuldades para isso; imagine alguém sem experiência e técnicas didáticas”, considera Fabíola. O conjunto de pautas conservadoras pode esbar- rar em outra batalha travada por psicólogas e psicó- logos no campo da educação, contra a medicalização. “Definitivamente são propostas que não pretendem levar ao pensamento nem à criatividade, mas de con- trole sobre mentalidades, corpos e comportamentos. n ° 1 9 5 • F e v e r e i r o - M a r ç o - A b r i l • 2 0 1 9 Conselho Regional de Psicologia de São Paulo • 9 Nos anos de 1970 falava-se em disciplina. Hoje esta- mos calando a vida por meio da medicalização exces- siva”, pondera Beatriz. Com uma série de ações e movimentos, nos últi- mos anos profissionais da Psicologia e da Educação conseguiram barrar um pouco o avanço de iniciati- vas que preconizavam o diagnóstico dos alunos para a indicação de tratamentos medicamentosos, que atendem a interesses comerciais específicos e não se tratam de ações educativas preocupadas com o que é melhor para o aluno.. A ampliação de políticas e discursos que ressaltam comportamentos “indese- jados” poderia significar um incremento da “patolo- gização” dos estudantes. “A questão é que a medi- calização aparentemente funciona. Aí é que está a perversidade. Porque se eu te dou um remédio que te dopa, te domestica, é claro que ‘funciona’. O número de pessoas medicalizadas só cresce, e isso traduz, mais uma vez, a ideia da busca individualizada, e não coletiva, para a solução de problemas”, acrescenta Fabíola. O impacto nos docentes Os impactos das pautas conservadoras já são sentidos entre os docentes. Para Fabíola, um projeto como o “Escola sem Partido”, mesmo sem ser apro- vado, já ocasionou prejuízos sensíveis à categoria, em razão da desqualificação dos professores que ele estimula e, mais pontualmente, por meio da criação de espaço para o denuncismo. “Já se estabeleceu um clima de tensão e vigilância e de destruição da imagem do docente, que é desabonado em relação, inclusive, aos conhecimentos que detém”, explica a docente da PUC-SP, que acredita que acabar com a autoridade do professor mina a educação. “Isso não tem a ver com autoritarismo, que é inaceitável. Tem a ver com autoridade, e essa relação é fundamental para que a educação de fato aconteça”. Além do mais, acarreta perda de autonomia por parte dos educadores, o que é uma das principais causadoras de desânimo entre eles. Os reflexos po- dem incluir o sentimento de “desresponsabilização” com a formação dos alunos. Se a ideia prevalecen- te for a de que a eles cabe simplesmente transmitir saberes “mecanicamente”, essa perspectiva esvazia o seu papel em sala de aula. “Eu trabalho com pro- fessoras/es, e a maioria delas/deles é extremamente comprometida, chega a desembolsar recursos pró- prios para prover materiais aos alunos”, conta Fa- bíola. A categoria já é uma das que apresenta mais incidência de problemas psíquicos, em razão do des- gaste emocional e das péssimas condições de tra- balho. Para Marilene, a questão do sofrimento docente é altamente relevante, mas é necessário repensar as condições de trabalho dele e sua participação nos processos de mudanças. “É preciso avançar muito no campo sindical, politizar mais o movimento e as/ os docentes para que sejam capazes de reivindicar melhores condições, para não cairmos apenas no discurso sobre o sofrimento, sem que isso se reverta em melhorias.Precisamos refletir sobre como mudar essa condição para não colocá-los simplesmente na condição de vítima, o que pode levá-los a serem ainda menos valorizados do ponto de vista social”, avalia. Um projeto como o Escola sem Partido, mesmo sem ser aprovado, já ocasionou prejuízos sensíveis à categoria, em razão da desqualificação dos docentes que ele estimula e, mais pontualmente, por meio da criação de espaço para o “denuncismo”. CAPA Conselho Regional de Psicologia de São Paulo10 A contribuição da Psicologia para a Educação “Hoje temos uma produção acadêmica importan- te na área da Psicologia da Educação e existe o re- conhecimento do papel da categoria nos debates e propostas para o setor no Brasil”, avalia a professora Marilene. O que ainda falta, no entanto, segundo ela, é uma regulamentação sobre a atuação de psicólo- gas e psicólogos na educação. Boa parte deles atua nos estados e municípios em postos “alternativos”, já que não existem vagas específicas. Projeto para que isso mude já tramita há quase duas décadas no Senado, mas até agora não houve definição sobre o tema. O resultado é a falta de “uniformidade” no que diz respeito à presença dessas/desses profissionais em educandários para dar apoio aos alunos e profes- sores: há municípios grandes com poucos profissio- nais; e cidades pequenas com uma boa concentra- ção deles. “É claro que precisamos pensar também no perfil de psicólogas e psicólogos que queremos atuando na educação. Porque se forem profissionais interes- sados somente em diagnosticar e medicalizar, não adianta”, observa Fabíola. Mas, se forem comprome- tidas/os com a defesa dos pilares da profissão, ela diz, a presença é altamente relevante para defender o respeito às diferenças e à pluralidade de ideias, es- timular o diálogo e ajudar na mediação de conflitos. “Posso falar do trabalho que realizo cotidianamente com alunos nas escolas. Não à toa, os colégios que- rem muito receber estagiários de Psicologia e reco- nhecem o trabalho desenvolvido, especialmente em instituições em que há crianças e jovens vistos como ‘desinteressados e agressivos’”. Segundo ela, por meio de ações psicoeducacionais – incluindo rodas de conversa, assembleias de classe e oficinas lúdi- cas psicoeducativas –, os estudantes encontram ca- minhos para dialogar, debater diferentes pontos de vista. “Na Psicologia, temos ferramentas que permi- tem ir além do simples ´não faça isso` ou da adoção de soluções punitivas e simplistas. Quando compre- endem mais sobre as razões pelas quais carregamos em nós o machismo e o racismo, alunos passam a ouvir o outro, a saber como ele se sente, e isso muda muita coisa”, garante. Beatriz, por sua vez, define que a Psicologia nas escolas é uma oportunidade para “construir a partir do diálogo, que é encontrar a diferença”. Ela concedeu a entrevista ao Jornal PSI um dia após dois jovens te- rem atirado contra colegas em uma escola em Suza- n ° 1 9 5 • F e v e r e i r o - M a r ç o - A b r i l • 2 0 1 9 Conselho Regional de Psicologia de São Paulo • 11 no (SP). “Ainda estou abalada com isso. A experiência educacional, quando olhamos para a nossa história, revela que não há sujeitos com boa experiência es- colar: o colégio se apresenta como espaço de dispu- ta, de sofrimento. Quando não temos psicólogas/os nesses espaços, isso fica muito encoberto, como se fosse natural. A Psicologia oferece instrumentos ca- pazes de desvelar processos que foram escamotea- dos e encobrem as violências. O papel dela na escola é construir a partir de outro lugar, construir um novo espaço em que toda a comunidade escolar pode fa- lar. A Psicologia coletiviza os processos”. Repensar nossa forma de comunicar e relacionar Para Marilene, o atual cenário brasileiro leva a refletir sobre a necessidade de repensar a manei- ra como acessar e mobilizar a população em torno de ideias progressistas e da luta pela manutenção de conquistas e direitos, e para a continuidade dos avanços. “Dia desses conversava com uma pessoa aqui na Universidade e ela me disse que a Mangueira, no carnaval deste ano, fez o que nós, como socieda- de, não conseguimos fazer”, exemplificou. A escola de samba desenvolveu o enredo “História para ninar gente grande” e exaltou líderes que influenciaram a história do Brasil, especialmente índios e negros. Também homenageou a vereadora Marielle Franco, assassinada em março de 2018, e despertou a aten- ção e o interesse pelos temas. “Talvez seja preciso pensar em renovar as nossas formas de comunicar e nos relacionarmos com os públicos para além da- quilo que já sabemos fazer, como seminários”, ava- lia a docente. Na mesma linha, Fabíola refere-se à necessidade de buscar novas linguagens e meios de atin- gir o público e convidá-lo ao debate e à reflexão. “Precisamos desco- brir como chegar às pessoas de forma mais contundente. Utilizar uma lingua- gem menos formal, rebuscada, e mais acessível, por exemplo, para nos fazermos enten- der e sermos combativos. Há uma série de veículos midiáticos muito interessantes, mas a sua linguagem rebusca- da, difícil de entender, acaba afastando muitas pes- soas do debate”, avalia. CAPA Conselho Regional de Psicologia de São Paulo12 Erika Caixa de texto PSICOLOGIA ESCOLAR nº 192 • Maio | Junho | Julho • 2018 26 UM DIA NA VIDAO cotidiano de uma psicóloga dentro da Fundação Casa12 MATÉRIA ESPECIALA Psicologia do Esporte e a Copa do Mundo 24 MUNDO MELHORPsicologia e questão racial no Fórum Social Mundial 2 S U M Á R I O 4 7 10 12 21 24 29 26 30 AMÉRICA LATINA | VII CONGRESSO DA ULAPSI A Costa Rica sediará, em julho, a sétima edição do encontro da União Latino-americana de Entidades da Psicologia. MATÉRIA ESPECIAL | A PSICOLOGIA DO ESPORTE NO BRASIL Em período de mais uma Copa do Mundo de futebol, vem à tona o papel, a história e os aportes da Psicologia do Esporte. ORIENTAÇÃO | ESCUTA E DEPOIMENTO ESPECIAL Nova lei referente aos direitos de crianças e adolescentes vítimas ou testemunhas de violência é problematizada por entidades da Psicologia. QUESTÕES ÉTICAS | MEDIAÇÃO NO CRP SP Veja como está, na prática, a implementação da experiência de mediação nos processos éticos e disciplinares do Conselho. PENALIDADES ÉTICAS MUNDO MELHOR | FÓRUM SOCIAL MUNDIAL 2018 Em artigo, psicóloga e educadora social conta sua vivência em atividades sobre a questão racial durante FSM realizado em março em Salvador. UM DIA NA VIDA | ADOLESCENTES EM CONFLITO COM A LEI Mônica dos Santos conta como é o seu cotidiano de trabalho como psicóloga dentro de uma Fundação Casa em São Paulo. ESTANTE | MURAL Livro do importante pensador pós colonial camaronense Achille Mbembe – “Crítica da razão negra” - é lançado no Brasil pela editora n-1. SUBSEDES | FECHAMENTO DE MAIS UM MANICÔMIO Sorocaba e região comemora a desativação do Hospital Psiquiátrico Vera Cruz, depois de anos de denúncias de maus tratos. Publicação do Conselho Regional de Psicologia de São Paulo, CRP SP, 6ª Região Diretoria Presidenta | Luciana Stoppa dos Santos Vice-presidenta | Maria Rozineti Gonçalves Secretária | Suely Castaldi Ortiz da Silva Tesoureiro | Guilherme Rodrigues Raggi Pereira Conselheiras/os Aristeu Bertelli da Silva, Beatriz Borges Brambilla, Beatriz Marques de Mattos, Bruna Lavinas Jardim Falleiros, Clarice Pimentel Paulon, Evelyn Sayeg, Ed Otsuka, Edgar Rodrigues, Ivana do Carmo Souza, Ivani Francisco de Oliveira, Larissa Gomes Ornelas Pedott, Magna Barboza Damasceno, Maria das Graças Mazarin de Araújo, Maria Mercedes Whitaker Kehl Vieira Bicudo Guarnieri, Mary Ueta, Maurício Marinho Iwai, Monalisa Muniz Nascimento, Regiane Aparecida Piva, Reginaldo Branco da Silva, Rodrigo Fernando Presotto, Rodrigo Toledo, Vinicius Cesca de Lima Realização Jornalista responsável Gabriela Moncau (MTB 0069610 SP) Reportagens e Edição Gabriela Moncau Direção de arte Sergio Rossi Capa Sergio Rossi Revisão CRP SP ImpressãoRettec Artes Gráficas Tiragem 100.000 exemplares Sede CRP SP Rua Arruda Alvim, 89, Jardim América Cep 05410-020 São Paulo SP Tel. (11) 3061-9494 | fax (11) 3061-0306 E-mails Atendimento | atendimento@crpsp.org.br Diretoria | direcao@crpsp.org.br Informações | info@crpsp.org.br Centro de Orientação | orientacao@crpsp.org.br Administração | admin@crpsp.org.br Comunicação | comunicacao@crpsp.org.br Site www.crpsp.org.br Subsedes CRP SP Assis | tel. (18) 3322-6224, 3322-3932 Baixada Santista e Vale do Ribeira tel. (13) 3235-2324, 3235-2441 Bauru | tel. (14) 3223-3147, 3223-6020 Campinas | tel. (19) 3243-7877, 3241-8516 Grande ABC | tel. (11) 4436-4000, 4427-6847 Ribeirão Preto | tel. (16) 3620-1377, 3623-5658 São José do Rio Preto | tel. (17) 3235-2883, 3235-5047 Sorocaba | tel. (15) 3211-6368, 3211-6370 Vale do Paraíba e Litoral Norte | tel. (12) 3631-1315 16 CAPA | A LUTA ANTIMANICOMIAL E O DESMONTE DO SUS Psicólogas/os debatem a importância da resistência frente aos recentes ataques à Reforma Psiquiátrica e, mais amplamente, ao Sistema Único de Saúde. EM TEMPOS DE COPA DO MUNDO, A PSICOLOGIA DO ESPORTE EXPÕE SUA HISTÓRIA S uécia, 1958. O mundo viu, pela primeira vez, o garoto de 17 anos que seria o maior jogador de futebol de todos os tempos. A Copa do Mundo que trouxe ao Brasil o pri- meiro título mundial contou com dribles e golaços de Pelé, Garrincha, Didi, Djalma Santos, Zito, Vavá e Zagallo. Na final contra o time da casa, o placar de 5 a 2 marca não só a maior goleada em finais de Copa do Mundo até então, como também o mito de origem da Psicologia do Esporte no Brasil. De 1958 para cá passaram-se cinco décadas e vin- te Copas do Mundo. Depois do fatídico 7x1 que des- classificou a seleção brasileira frente à Alemanha em pleno Belo Horizonte na Copa de 2014, a equipe vai à Rússia para a nova edição da competição. O momento traz à tona os desafios referentes ao preparo emo- cional dos atletas e, mais amplamente, sobre o papel, a história e os aportes da Psicologia do Esporte no Apesar de não ser acompanhado pelo investimento necessário, Brasil vê o crescimento da Psicologia do Esporte I lu st ra çõ e s: S e rg io R o ss i país. Será que foi mesmo em 1958 que esse campo da Psicologia nasce no Brasil? Rebobinemos um pouco. A história da Psicologia do Esporte no Brasil João Carvalhaes (1917-1976) foi o psicólogo da seleção brasileira da Copa de 1958. É considerado por boa parte da literatura como o pioneiro da Psicologia do Esporte por suas grandes contribuições à área, antes mesmo da Psicologia ser considerada uma ciência, reconhecimento que aconteceu em 1962. Paulista de Santa Rita do Passo Quatro, Carva- lhaes foi jornalista e psicólogo. Com o pseudônimo de João do Ringue, publicava artigos sobre boxe no começo da década de 1950. Na Psicologia, aplicou seus conhecimentos de psicotécnica na Federação Paulista de Futebol, em uma unidade de seleção de árbitros, no São Paulo Futebol Clube e na Seleção Brasileira de Futebol. MATÉRIA ESPECIAL Conselho Regional de Psicologia de São Paulo12 Erika Caixa de texto PSICOLOGIA DO ESPORTE As manchetes dos jornais estampavam o estra- nhamento e o reconhecimento ao trabalho psicológico com a seleção campeã de 1958: “Não há jururus na se- leção... Carvalhaes, peça útil na máquina da seleção”; “Como a psicologia ajudou o Brasil a ganhar a Copa de 1958?”; “A seleção seria campeã sem ‘doidões’ como Pelé, Garrincha, Gilmar?”. O compilado de manchetes é feito por artigo das psicólogas Cristianne Carvalho e Ana Maria Jacó-Vilela, Psicologia do esporte no Brasil em dois tempos: uma história contada e uma história a ser contada. As autoras constatam que há registros de outras pessoas, fatos e informações significativos da relação da Psicologia com o Esporte antes da dé- cada em que Pelé brilhou. A importância da atuação da/o psicóloga/o junto a equipes esportistas já era discutida no Brasil nos anos 1930. Uma prova disso são artigos encontrados por Carvalho e Jacó-Vilela em revistas, por exemplo, da Escola de Educação Física do Exército e da Escola Nacional de Educação Física e Desportos da Univer- sidade do Brasil (hoje, a UFRJ). Em 1960 é fundada a Sociedade Internacional da Psicologia do Esporte, impulsionando a produção acadêmica que se expandiria na década seguinte. Os anos 1970 são marcados pela criação da Sociedade Brasileira de Psicologia do Esporte, da Atividade Físi- ca e da Recreação (organização constituída predomi- nantemente por profissionais da Educação Física) e pela ampliação da atuação de profissionais em equi- pes de futebol profissional. Em 1981, Porto Alegre sedia o I Congresso Brasi- leiro de Psicologia do Esporte. No artigo A psicologia do esporte no contexto do Sistema de Conselhos, Mô- nica d’Fátima Freires da Silva recorda que a primeira iniciativa de formação específica foi na Faculdade de Educação Física da FMU - Faculdades Metropolitanas n ° 1 9 2 • M a i o | J u n h o | J u l h o • 2 0 1 8 Conselho Regional de Psicologia de São Paulo • 13 Unidas, que promoveu em 1994 uma especialização em Psicologia do Esporte. No ano seguinte, a PUC-RS criou o primeiro curso da América do Sul de pós-gra- duação em Psicologia do Exercício & Esporte. Em 2002 o Instituto Sedes Sapientiae inaugura o curso de especialização profissional em Psicologia do Esporte, primeiro curso no Brasil a ser reconhecido pelo CFP. Em 2003 é fundada a Associação Brasileira de Psicologia do Esporte (ABRAPESP). Na década de 2010, narra Luciana Ângelo, inte- grante do Núcleo Psicologia e Esporte do CRP SP, um grupo de psicólogos é oficializado no Comitê Olímpico Brasileiro (COB) e é criado o primeiro Grupo de Traba- lho sobre o tema na Assembleia de Políticas, da Admi- nistração e das Finanças (APAF) – órgão do Sistema Conselhos. A Psicologia do Esporte hoje “Implicada em seus primórdios com aspectos mais biológicos, hoje, a Psicologia do Esporte vem estu- dando e atuando em situações que envolvem moti- vação, personalidade, agressão e violência, liderança, dinâmica de grupo, bem-estar de atletas caracte- rizando-se como um espaço onde o enfoque social, educacional e clínico se complementam”. A descrição é da psicóloga Katia Rubio, mestra em Educação Físi- ca e doutora em Educação, no artigo A psicologia do esporte: histórico e áreas de atuação e pesquisa. Marcos Gercino da Silva é psicólogo esportivo do Grêmio Osasco Audax, Programing e-sports e São Cristóvão Saúde/São Caetano. “Uma coisa funda- mental no trabalho é a abordagem inicial: explicar aos atletas a função do trabalho, pois ainda existe pre- conceito por conta da falta de conhecimento”, conta. O preconceito a que se refere Marcos pode ser exemplificado com as declarações feitas por Dunga, ex-técnico da seleção brasileira. Durante a última Copa do Mundo, o então técnico deu entrevistas cri- ticando a imagem deixada por jogadores brasileiros por chorarem em campo e colocou em dúvida a efi- ciência do trabalho de psicólogas/os no futebol. “Uma cena de choro como a do jogo contra o Chile pega mal no meio do futebol. Nós somos machistas, temos aquela coisa de que homem não chora”, disse Dunga: “Não sei se psicólogo resolve. Nada contra, mas dificilmente um jogador vai se abrir em cinco mi- nutos A primeira coisa que pensa é: será que ela vai contar ao treinador o que falei?”. Em nota de repúdio às declarações de Dunga, o CRP SP critica seu “total desconhecimento do campo de exercício da Psicolo- gia como ciência e profissão no contexto esportivo”. A tranquilidade do ex-técnico da seleção brasilei- ra em recorrer ao machismo presente no futebol para confirmar sua opinião é também uma mostra inegável de que as questões de gênero, tão presentes no de- bate público atualmente, atravessam também o es- porte e a Psicologia do Esporte. “Um debate que está latente, por exemplo, é a respeito da presença de atletas trans”, relata Victor Cavallari, também membro do NúcleoPsicologia e Es- porte do CRP SP. Para ele, as discussões têm ocorrido de forma reducionista. “As pessoas não veem que es- colher um argumento biológico é também assumir um posicionamento político ideológico”, comenta. “Essas manifestações no esporte refletem as características violentas e preconceituosas da nossa sociedade”. Recentemente veio à público a denúncia de 42 atletas da seleção brasileira masculina de ginástica artística, que revelaram ter sofrido abusos sexuais cometidos pelo ex-técnico, quando eram crianças e adolescentes. No tocante a orientações para atletas, familiares e psicólogas/os em casos de abuso sexual no âmbito esportivo, o Núcleo Psicologia e Esporte do CRP SP recomenda a leitura das “Onze dicas para que famí- lias e cuidadores garantam a proteção de suas crian- ças e adolescentes”, da Unicef Brasil. Entre os pon- tos, estão a garantia às crianças e adolescentes de serem ouvidos, a devida atenção à denúncias feitas pelos meninos e meninas e a exigência de todas as informações sobre cláusulas contratuais asseguran- do que estejam de acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente. “Outra orientação pós escuta é o Disque 100”, explica Cavallari. “Nós mesmos podemos fazer a de- MATÉRIA ESPECIAL Conselho Regional de Psicologia de São Paulo14 núncia. Em um caso em que participei, fizemos um re- latório para o Conselho Tutelar e o caso já ser aten- dido no CRAS [Centro de Referência de Assistência Social]”, conta. Luciana Ângelo destaca a importância de psicólogas/os se informarem sobre a responsabi- lidade que têm no campo do trabalho, consultando o Código de Ética, o Ministério Público e o Conselho. “É possível entrar em contato com o CRP SP, seja para fazer uma denúncia anônima, seja para pedir orienta- ção”, informa. A presença de atletas trans, o investimento em modalidades femininas, os assédios e abusos se- xuais, os espaços de poder e decisão na gestão do esporte são temas sobre os quais a Psicologia, na vi- são de Cavallari, deve contribuir de forma profunda. “Precisamos buscar meios de reduzir os sofrimentos das pessoas e contribuir de maneira mais efetiva para a garantia de acesso à prática esportiva”, salienta. Oportunidades de trabalho Para Gercino, a ampliação das oportunidades de trabalho na área comprovam que a Psicologia do Es- porte tem ganhado mais espaço. “Nas Olimpíadas de Londres de 2012 havia sete psicólogas/os junto com os atletas. Já nas Olimpíadas do Rio de 2016 esse número saltou para cerca de 40 profissionais”, exem- plifica. Mas pondera, ao dizer que as/os profissionais ficam “reféns dos incentivos do governo”: “O governo federal fez um corte de 87% no orçamento do Minis- tério do Esporte de 2017 para 2018. Isso é um absur- do. Sem dizer o corte de 36% do valor do bolsa atleta. Se não há investimento para a/o própria/o atleta e para a estrutura do esporte, isso se reflete também para a/o psicóloga/o”. Investimentos em assistência psicológica conti- nuada são feitos apenas na ponta da pirâmide, em atletas consagradas/os, “sem considerar a sustenta- bilidade do sistema com planejamento para o futuro”, analisa Luciana Ângelo. Fatores como desenvolvi- mento de talentos, suporte à carreira de atletas e ins- talações são alguns dos que formam, para Luciana, “aquilo que permitiria desenvolver o esporte no Brasil de maneira plena e positiva, com entregas de valor para um maior contingente de pessoas, organizações e sociedade de modo geral”. Lais Yuri começou a trabalhar na Psicologia do Es- porte há cerca de 10 anos e observa um crescimento da área. Atualmente, ela atende cerca de 120 atletas entre 14 e 37 anos do Ituano Futebol Clube e trabalha também no Instituto Tênis, um projeto de incentivo ao esporte com foco em tênis de alto rendimento juvenil e profissional. “Com as Olimpíadas no Brasil em 2016 houve um aumento da demanda de atletas olímpicos por profissionais da Psicologia do Esporte. Mas não houve continuidade. Acabaram os patrocínios às/aos atletas e com isso acabou a contratação e remunera- ção de psicólogas/os”, lamenta. Copa do Mundo 2018 Com a chegada de mais uma Copa do Mundo e com a ainda fresca memória do 7x1, vem à tona de- bates a respeito da importância do equilíbrio emocio- nal para o bom desempenho dos atletas e o papel da preparação psicológica. No entanto, Lais reforça que as contribuições da Psicologia do Esporte precisam ser entendidas para além de importantes momentos de decisão. “O trabalho da/o psicóloga/o do esporte é contínuo, de médio e longo prazo. Defendemos que nosso trabalho não seja requisitado apenas durante grandes eventos. Tem atletas que eu acompanho há seis, oito anos”, atesta. Mesmo em situação de Copa do Mundo, Marcos Gercino defende, como Lais, que a Psicologia do Es- porte pode ajudar muito a seleção brasileira, desde que não seja vista como algo emergencial, mas “pre- ventivo e inserido desde o início da preparação desse grupo de jogadores”. A equipe técnica definida pela Confederação Brasileira de Futebol (CBF) para acom- panhar a seleção brasileira na Rússia, no entanto, não inclui psicóloga/o. “Em situações como Copa do Mundo – o sonho de qualquer criança que inicia no futebol – entendemos que essa dobradinha, a importância do jogo com a incerteza do resultado, promove uma desregulação emocional, que pode causar falta de concentração, alteração do humor, nervosismo”, narra Lais. Em seu artigo, Katia Rubio aponta que a ansieda- de tem sido estudada no esporte partindo de seus efeitos emocionais negativos. Porém, estudos feitos em Fisiologia e Psicologia têm demonstrado que um determinado tipo de ansiedade é necessário para a prontidão na execução de algumas tarefas. Esse es- tado é chamado de ativação. Para Lais Yuri, “a Psi- cologia do Esporte, para situações como de Copa do Mundo, ajuda a trabalhar que o fator emocional não atrapalhe, mas pelo contrário, colabore”. n ° 1 9 2 • M a i o | J u n h o | J u l h o • 2 0 1 8 Conselho Regional de Psicologia de São Paulo • 15 CATEGORIA DEFINIRÁ NOVAS GESTÕES DOS CONSELHOS CATEGORIA DEFINIRÁ NOVAS GESTÕES DOS CONSELHOS ELEIÇÕES: nº 187 • Abri l | Maio | Junho • 2016 26 MUNDO MELHORAbordagens que proporcionam ao idoso voz e escuta 4 MATÉRIA ESPECIALOs impactos da publicidade infantil na subjetividade da criança 9 QUESTÕES ÉTICASDilemas e avanços necessários relativos aos serviços psicológicos online S U M Á R I O 4 6 10 14 16 24 28 30 QUESTÕES ÉTICAS | SERVIÇOS PSICOLÓGICOS ONLINE As polêmicas que envolvem o trabalho da psicologia realizadas por meios tecnológicos de comunicação à distância. CAPA | ELEIÇÕES DO SISTEMA CONSELHOS Conheça as chapas que se propõem a ser gestão do Conselho Regional de Psicologia de São Paulo pelos próximos três anos. ORIENTAÇÃO | COBRANÇA DO CONSELHO REGIONAL DE ADMINISTRAÇÃO Nota técnica explica às/aos psicólogas/os que pedidos de contribuição por conselhos de outras categorias são indevidos. MATÉRIA ESPECIAL | PUBLICIDADE INFANTIL Como estimular a construção de uma consciência crítica frente aos impactos das propagandas na subjetividade das crianças? PERSPECTIVA DO USUÁRIO | ATLETAS DE ALTO RENDIMENTO Às vésperas das Olimpíadas no Brasil, atletas falam da importância de seu preparo psicológico. MUNDO MELHOR | ENVELHECIMENTO Oficinas de memória e acompanhamento terapêutico são algumas das abordagens comprometidas com o protagonismo do idoso. PSICOLOGIA E COTIDIANO | DISPUTA DA GUARDA DOS FILHOS Aspectos importantes e desafios para fazer uma avaliação psicológica que embase a decisão jurídica sobre a guarda dos filhos. UM DIA NA VIDA | A LÍNGUA DOS SINAIS Priscila Mourão relata como é sua experiência de fazer atendimento psicológico voltado para a população com deficiência auditiva. Publicação do Conselho Regional de Psicologia de São Paulo, CRP SP, 6ª Região Diretoria Presidenta | Elisa Zaneratto Rosa Vice-presidenta | Adriana Eiko Matsumoto Secretário | JoséAgnaldo Gomes Tesoureiro | Guilherme Luz Fenerich Conselheiros Alacir Villa Valle Cruces, Aristeu Bertelli da Silva, Bruno Simões Gonçalves, Camila de Freitas Teodoro, Dario Henrique Teófilo Schezzi, Gabriela Gramkow, Graça Maria de Carvalho Camara, Gustavo de Lima Bernardes Sales, Ilana Mountian, Janaína Leslão Garcia, Joari Aparecido Soares de Carvalho, Livia Gonsalves Toledo, Luis Fernando de Oliveira Saraiva, Luiz Eduardo Valiengo Berni, Maria das Graças Mazarin de Araujo, Maria Ermínia Ciliberti, Marília Capponi, Mirnamar Pinto da Fonseca Pagliuso, Moacyr Miniussi Bertolino Neto, Regiane Aparecida Piva, Sandra Elena Spósito, Sergio Augusto Garcia Junior, Silvio Yasui Realização Jornalista responsável Gabriela Moncau (MTB 0069610 SP) Reportagens e Edição Gabriela Moncau Direção de arte Sergio Rossi Capa | Arte Sergio Rossi | Foto: Divulgação CRP-SP Revisão CRP-SP Impressão Rettec Artes Gráficas Tiragem 92.000 exemplares Sede CRP SP Rua Arruda Alvim, 89, Jardim América Cep 05410-020 São Paulo SP Tel. 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PENALIDADES Conselho Regional de Psicologia de São Paulo10 P E R S P E C T I V A D O U S U Á R I O Às vésperas dos Jogos Olímpicos no Rio de Janeiro, atletas de alto rendimento dão peso ao preparo psicológico Ilu st ra çã o : S e rg io R o ss i EXERCITANDO O EQUILÍBRIO EMOCIONAL Marina Zablith passou boa parte dos seus 29 anos de vida dentro da água. Desde pequena se acostumou com o mundo das piscinas. Seu pai integrou a equipe brasileira de natação nas Olim- píadas de Roma em 1960 e de Tóquio em 1964. Sua mãe foi campeã brasileira no mesmo esporte. A irmã, como ela, nadou e jogou polo aquático. Quan- do tinha 14 anos Marina foi convocada para o time júnior da seleção brasileira de polo. Hoje é a capitã da seleção e uma das mais experientes da equipe que vai competir na Olimpíada desse ano. Carrega no currículo o bicampeonato sul-americano e a me- dalha de bronze nos jogos Pan-Americanos de To- ronto e de Guadalajara. Há pouco tempo Marina se mudou para a Itália. Apesar de toda a bagagem enquanto atleta, o frio na barriga veio. “Na Itália a liga é muito profissional e eu tinha a ideia de que elas eram fisicamente muito su- periores”, relata. Quando chegou, percebeu que até existia alguma desvantagem. Mas não a que imagi- nava. “Na parte física, seja na natação seja na mus- culação, eu não perco para as meninas daqui. A di- ferença que sinto é na parte psicológica”, constata. “No tênis profissional, 95% é mental” falava o norte-americano Jimmy Connors, um dos líderes no ranking das décadas de 1970 e 1980. “Se teu cére- bro pode convencer teu corpo de que ele pode fa- zer algo, sem dúvida o fará”, comentava o campeão olímpico (oito vezes!) de atletismo Carl Lewis. Marina compartilha da mesma opinião e observa que as italianas do polo aquático, por estarem acos- tumadas com “o ritmo alucinante de campeonato” da liga profissional, têm a atenção e a concentração mais afiadas. “Foi quando eu percebi que o que falta- va para nós, da seleção brasileira, era esse preparo psicológico”, diz Zablith. Pela primeira vez desde que integra a seleção brasileira, Marina e suas companhei- ras passaram a ter acompanhamento psicológico. A preparação redobrada não é a toa. A Olimpíada desse ano, com sede no Rio de Janeiro, vai receber (em meio ao caos político brasileiro, ao desvelamento dos processos relativos às empreiteiras que constru- íram as obras dos megaeventos e as mobilizações contra as remoções forçadas e a militarização) cer- ca de 10 mil atletas que disputarão medalhas de 43 modalidades. O polo aquático foi incluído no torneio olímpico no ano de 2000 e essa é a primeira vez que a equipe bra- sileira participará do maior evento esportivo do mundo. O adversário favorito, a cobrança interna, aquele movimento ou exercício que precisa acertar mas que não está saindo bem no treino, as pessoas na torcida, o desentendimento com alguém, a lesão que não sa- rou direito, o namoro, a família, a pressão de se apre- sentar no seu próprio país. Como que atletas de alto rendimento se preparam emocionalmente para essa competição que é, para a maioria dos esportes, a de maior nível em âmbito internacional? Erika Caixa de texto PSICOLOGIA DO ESPORTE Conselho Regional de Psicologia de São Paulo • 11 n º 1 8 7 • A b r i l | M a i o | J u n h o • 2 0 1 6 “Uma coisa importantíssima para mim é a questão de expor os medos. Não somos livres de medos nem de problemas, afinal somos humanas e não máquinas. Mas a partir do momento em que você aceita isso, você começa a ter controle sobre isso” Fabiana Diniz Conselho Regional de Psicologia de São Paulo12 P E R S P E C T I V A D O U S U Á R I O Concentração treinável Fabiana Carvalho Diniz, mais conhecida como Dara, é pivô da seleção brasileira de handebol des- de 1999 e também capitã de sua equipe. Já passou por clubes no Brasil, em Portugal, na Espanha e agora está na Alemanha, no Hypo Niederosterreich. Duas partidas de quartas de final do mundial de handebol. Uma em 2011 no Brasil. A outra, em 2013 na Sérvia. Na primeira Dara diagnostica, ao olhar para trás, a “falta de maturidade psicológica da equipe”: “Foi por isso que perdemos. Tínhamos um trabalho em relação a isso, mas o que conversávamos fora de quadra acho que eu não sabia usar 100% dentro de quadra, ou talvez não tenha dado a verdadeira impor- tância para esse preparo emocional”. Na opinião de Dara, “é preciso acreditar naquilo que se propõe fazer em todos os âmbitos de preparação. Com o psicológi- co não é diferente”. O jogo de quartas de final de 2013 contra a Hun- gria foi disputadíssimo, com duas prorrogações. “Fisi- camente já estávamos destruídas, cometemos erros na hora em que podíamos ter matado a partida. Mas de alguma forma a gente conseguiu não se abater muito com isso, já pensar rapidamente na seguinte bola. Tenho certeza que tem a ver com o amadureci- mento do nosso preparo mental”, recorda Dara. Des- sa vez elas levaram a medalha de ouro para casa. Marina também lembra de situações em sua tra- jetória em que o elemento psicológico foi marcante. Pouco antes do mundial de polo aquático em Xangai, em 2011, a dor no ombro estava pegando e o desem- penho no treino ia mal. “Estava mal, me colocando para baixo. Cheguei um dia no treino e fui conversar com meu técnico. Ele disse que eu tinha que entender que era uma jogadora importante, que eu precisava aparecer no jogo”, expõe Zablith: “Naquele momen- to eu não achava que eu era uma pessoa importan- te para o time. Estava mesmo precisando trabalhar minha confiança. E foi impressionante, porque bastou essa conversa para que eu mudasse de 8 para 80”. O treinamento, para Dara, é para se “desconectar do mundo” a partir do instante em que pisa na quadra. “Minha mãe e meu marido me ajudam muito porque me ‘economizam’ de informações que possivelmen- te vão me tirar do foco”, observa. “A concentração passa muito por você saber o que pode acontecer e ter em mente a linha traçada. Nada pode te desviar disso, principalmentequando vêm as adversidades”, descreve a pivô. Quando se pensa na questão psicológica para atletas, a primeira coisa que vem à cabeça são os fa- tores que afetam o rendimento esportivo. E o inverso? De que forma a dedicação ao esporte afeta a saú- de psicológica da pessoa no que diz respeito à sua vida de modo geral? “Acho que o esporte ensina mui- ta coisa que me fortalece para as questões fora dele também”, avalia a capitã da seleção de polo. “O atleta está acostumado com a vitória, mas principalmente com a derrota, o fracasso. É uma situação normal e você tem que aprender a lidar com aquilo muito rá- pido, superar, achar maneiras de melhorar. Acho que o atleta tem um olhar diferente para as coisas. E vai para a vida inteira”, assinala Marina Zablith. Expor os medos “Uma coisa importantíssima para mim e que con- verso muito com nossa psicóloga Alessandra Dutra é a questão de expor os medos. Medo de errar, medo de se lesionar, medo de perder...”, reflete a handebolis- ta. “Procuro exteriorizar para ter ajuda e ‘matar’ essa sensação. Aprendi com ela que não somos livres de medos nem de problemas, afinal somos humanas e não máquinas. Mas a partir do momento em que você aceita isso, você começa a ter controle sobre isso”, resume Dara. Quanto à expectativa para os Jogos Olímpicos, Dara fala do “foco total” e da “preparação nos aspec- tos físicos, técnicos, táticos, nutricionais e psicoló- gicos”, sendo o último para ela o grande diferencial. Apesar de já ter participado de quatro Olimpíadas, a ansiedade não diminui, ainda mais com o adicional do fator casa. A seleção brasileira feminina de handebol, atual campeã mundial, está na briga por medalha. Alexander Popov, melhor nadador da Olimpíada de 1996, declarou que “quem quer que esteja fisicamen- te bem preparado pode fazer coisas incríveis com seu corpo. Mas quem junta a um corpo em forma uma ca- beça bem cuidada é capaz de feitos excepcionais”. “O atleta está acostumado com a vitória, mas principalmente com a derrota, o fracasso. É uma situação normal e você tem que aprender a lidar com aquilo muito rápido” Marina Zablith psi • Março / abril / Maio 2014 1 A subjetividade no país do futebol nº 177 • MARÇO | ABRIL • 2014 Copa do Mundo no Brasil divide opiniões, traz à tona contradições e suscita debate sobre a fragilidade da democracia nº 178 • Março | Abril | Maio • 2014 a n to n io S co rz a / Sh u tt er st oc k. co m 2 psi • CoNSElHo rEGioNal DE PSiColoGia DE São PaUlo psi • Março / abril / Maio 2014 3 Publicação do Conselho regional de Psicologia de São Paulo, CrP SP, 6ª região Diretoria Presidenta | Elisa Zaneratto rosa Vice-presidenta | Maria Ermínia Ciliberti Secretário | luis Fernando de oliveira Saraiva Tesoureira | adriana Eiko Matsumoto Conselheiros adriana Eiko Matsumoto, alacir Villa Valle Cruces, ana Paula Porto Noronha, aristeu bertelli da Silva, bruno Simões Gonçalves, Camila de Freitas Teodoro, Dario Henrique Teóilo Schezzi, Elisa Zaneratto rosa, Gabriela Gramkow, Graça Maria de Carvalho Camara, Guilherme luz Fenerich, Gustavo de lima bernardes Sales, ilana Mountian, Janaína leslão Garcia, Joari aparecido Soares de Carvalho, Jonathas José Salathiel da Silva, José agnaldo Gomes, livia Gonsalves Toledo, luis Fernando de oliveira Saraiva, luiz Eduardo Valiengo berni, Maria das Graças Mazarin de araujo, Maria Ermínia Ciliberti, Marília Capponi, Mirnamar Pinto da Fonseca Pagliuso, Moacyr Miniussi bertolino Neto, regiane aparecida Piva, Sandra Elena Spósito, Sergio augusto Garcia Junior e Silvio Yasui. Realização KMZ Conteúdo (11) 3031-7360 Jornalista responsável Marina bueno (MT b 54.276) Reportagens Erika Mazon, Marina bueno e Svendla Chaves Arte Fajardo ranzini Design Gráico (11) 3021-2465 Foto da capa Shutterstock.com Revisão KMZ Conteúdo Impressão rettec artes Gráicas Tiragem 85.000 exemplares Sede CRP SP rua arruda alvim, 89, Jardim américa Cep 05410-020 São Paulo SP Tel. (11) 3061-9494 | fax (11) 3061-0306 E-mails atendimento | atendimento@crpsp.org.br Diretoria | direcao@crpsp.org.br informações | info@crpsp.org.br Centro de orientação | orientacao@crpsp.org.br administração | admin@crpsp.org.br Comunicação | comunicacao@crpsp.org.br Site | www.crpsp.org.br Subsedes CRP SP assis | tel. (18) 3322-6224, 3322-3932 baixada Santista e Vale do ribeira | tel. (13) 3235-2324, 3235-2441 bauru | tel. (14) 3223-3147, 3223-6020 Campinas | tel. (19) 3243-7877, 3241-8516 Grande abC | tel. (11) 4436-4000, 4427-6847 ribeirão Preto | tel. (16) 3620-1377, 3623-5658 São José do rio Preto | tel. (17) 3235-2883, 3235-5047 Sorocaba | tel. (15) 3211-6368, 3211-6370 Vale do Paraíba e litoral Norte | tel. (12) 3631-1315 UM DIA NA VIDA | CONQUISTAS E DESAFIOS DA PSICOLOGIA DO ESPORTE o campo de atuação também de psicólogas/os vem ampliando espaço e conquistando reconhecimento. 4 PERSPECTIVA DO USUÁRIO | UNIDOS PELA LOUCURA DO CARNAVAL atendidos em serviços de saúde mental que integram a ala “loucos pela X”, da escola de samba paulistana X-9, contam sua experiência. 7 ORIENTAÇÃO | CUIDADOS DEVEM SER SINGULARES, PORÉM DEFINIDOS COLETIVAMENTE Projeto Terapêutico Singular (PTS), na área de saúde, e Plano de atendimento individual (Pia), na de assistência, embasam os atendimentos. 10 SUBSEDES | “ROLEZINHOS” É TEMA DE RODA DE CONVERSA a subsede de bauru promoveu debate sobre a repressão contra a juventude; em assis, questões raciais foram foco de parcerias. 13 CAPA | EM CAMPO, A SUBJETIVIDADE! Movimentos pró e contra a realização da Copa do Mundo no brasil reletem nuances da cultura nacional. 14 MUNDO DO TRABALHO | ENTRE A SAÚDE E A SEGURANÇA Proissionais que atuam no sistema prisional têm como desaio equilibrar o papel pericial e a atenção à saúde dos detentos. 17 PSICOLOGIA E COTIDIANO | MEU FILHO VAI MAL NA ESCOLA Psicóloga e educadora orienta sobre os aspectos que envolvem a demanda apresentada por grande parte dos pais. 20 MUNDO MELHOR | PROTAGONISMO E RESISTÊNCIA a rádio comunitária Nova Paraisópolis FM comprova os benefícios da democratização da mídia. 23 QUESTÕES ÉTICAS | PROCESSOS ÉTICOS E PENALIDADES lidar com pessoas que planejam ou já tentaram o suicídio requer discernimento e imparcialidade, segundo especialista. 27 MURAL | CONHEÇA O PORTAL DO CRP SP NO YOUTUBE Seção aborda apoio do Conselho ao projeto que acaba com “autos de resistência” e à posição da oNU de considerar tortura a internação compulsória. 30 ESTANTE | TÍTULOS agora, a seção apresenta também dicas de vídeos de interesse da categoria. 31 a Copa do Mundo acontece no país do futebol e o brasil vive às voltas com uma pluralidade de pro- cessos e acontecimentos a ela relacionados. a conclu- são das grandes obras envolvendo estádios, aeroportos e outras construções foi marcada por inúmeras rever- berações, das modernizações produzidas aos efeitos nefastos a trabalhadores envolvidos e populações que vivem próximas aos locais dos jogos. a mobilização dos torcedores, estampada nas ruas, casas, nos carros e nas caras pintadas e enfeitadas, de um lado e, de ou- tro, as manifestações que questionam e denunciam o grande evento, as quais enfrentam os mecanismos legais e as opera- ções estatais que se apresentam para seu contro- le. as cidades se reorganizaram e reorganizaram- se os calendários. São inúmeros elementos que constituem esse momento his- tórico, os quais, com toda cer- teza, só podere- mos identiicar e compreender em toda a sua complexidade ao longo do tempo. Por detrás disso tudo, uma dimensão fundamental, muitas vezes pouco reconhecida ou colocada em aná- lise: a dimensão subjetiva. São afetos, sentidos, con- cepções, ações, expectativas, convicções, projetos cole- tivos e individuais, sonhos, enim. São os processos que constituem a subjetividade humana, ao lado de outros elementos que produzem esse momento histórico. a dimensão da realidade que a Psicologia busca compre- ender eanalisar e em relação à qual nossa proissão atua. Por isso, diante de todas as análises, interpreta- ções e intervenções em relação à Copa do Mundo no brasil, a Psicologia tem algo a dizer. assim como a Copa do Mundo, também a Psicologia tem algo a dizer e, portanto, contribuições possíveis em relação a inúmeros outros processos que enfren- tamos hoje na nossa sociedade: as manifestações dos jovens nos grandes shoppings das cidades, suas mo- tivações, determinações e os efeitos produzidos em diferentes parcelas da população; os processos escola- res, as expectativas e os receios em relação às crianças que não respondem às exigências do processo de es- colarização, produzindo uma tensa e imensa deman- da daqueles que “vão mal na escola”; a constituição de equipes esportivas e a relação da população com as práticas e atividades físicas; a questão racial; os pro- cessos de comunicação e as iniciativas pela democra- tização e pluralização das informações que circulam para o nosso povo. Esses são alguns dos temas trazidos nesta edição. buscamos colocar em diálogo leituras re- lativas à dimen- são subjetiva que constitui es- ses fenômenos, apontando com isso possibilida- des e referências relativas ao tra- balho das/os psi- cólogas/os. oferecemos esta publicação do CrP SP como mais um canal de orientação. Nela disponibili- zamos relexões que podem guiar o exercício pro- issional em dife- rentes situações: da construção de projetos singulares de atenção à complexidade própria dos casos que en- volvem situações de suicídio, ou ainda aos desaios de enfrentar as duras condições para construir uma atu- ação qualiicada no sistema prisional. São contribui- ções que pretendem qualiicar a prática proissional, trazendo ainda um novo elemento: a perspectiva do usuário dos serviços de Psicologia, que, entendemos, deve ser protagonista na orientação e direção das in- tervenções realizadas. Nossa expectativa é de que essa leitura contribua com a prática proissional de cada psicóloga/o de nosso Es- tado, na direção de uma atuação ética, qualiicada e comprometida com a dignidade da nossa população. XIV Plenário do Conselho Regional de Psicologia de São Paulo Shutterstock.com E d i t o r i a lÍ n d i c e 178 A psicologia e a valorização da dimensão subjetiva da realidade Erika Caixa de texto PSICOLOGIA DO ESPORTE 4 psi • CoNSElHo rEGioNal DE PSiColoGia DE São PaUlo psi • Março / abril / Maio 2014 5 alessandra Dutra orienta a central da Seleção Feminina de Handebol, ana Paula u m d i a n a v i d a Campo de trabalho é cada vez mais reconhecido no brasil, embora os avanços na área de pesquisa ainda sejam tímidos a Psicologia do Esporte foi re-conhecida como uma subá-rea da Psicologia pela ame- rican Psychological association (aPa) em 1986. No brasil, à época da instituição do título de especialista em Psicologia, ela foi regulamenta- da como especialidade. Com mui- tas associações e grupos organiza- tivos de psicológas/os que atuam e pesquisam no campo, a Psicologia do Esporte tem alcançado proje- ção cada vez mais relevante no brasil, embora muitas pessoas a relacionem mais com as Ciências do Esporte do que com a própria Psicologia. a confusão é provoca- da principalmente pelo fato de os cursos de graduação em Psicolo- gia não incluírem disciplina obri- gatória em Psicologia do Esporte, o que acontece na formação em Educação Física. alessandra Dutra, consultora, psicóloga do esporte da Seleção Fe- minina de Handebol brasileira, do Centro de Formação de Tenistas e do Centro de Formação de atletas bauer, analisa a questão. “Embora a Psicologia do Esporte possa ser uma ciência dentro das ciências do esporte, para os psicólogos é uma prática. E em uma prática existem diversas linhas a serem lidas e in- terpretadas. Por isso, acredito que a Psicologia do Esporte não seja uma disciplina acadêmica nos cursos de Psicologia, mas uma prática que pode ser estudada em outra dis- ciplina, ligada às instituições, por exemplo, ou vista como um estágio aplicado”. Também de acordo com a psicóloga, isso acaba diicultando a divulgação da área proissional na graduação e a elaboração de pesquisas sobre o tema. “Provoca um gap grande para os estudantes entre a graduação e a pós-gradua- ção. Eles só vão produzir cientiica- mente na área na pós-graduação. Em contrapartida, como no curso de graduação da Educação Física existe a disciplina Psicologia do Esporte, os educadores físicos aca- bam tendo uma noção mais ampla da Psicologia do Esporte do que o próprio estudante da Psicologia. E é aí que mora um grande problema: educadores físicos se veem mais capacitados do que a nossa pró- pria categoria, que ica um pouco amarrada. Dessa forma, outros pro- issionais se apropriam de algumas questões que são ligadas à Psicolo- gia, principalmente intervenções. Essa é a grande diiculdade que eu vejo em não termos a área mais ex- plorada nas faculdades”, diz. Prática x pesquisa Em suas várias viagens interna- cionais, acompanhando atletas em importantes competições, alessan- dra pôde perceber a maturidade da Psicologia do Esporte em diferentes locais. Sua avaliação é de que o brasil é muito rico na área prática, enquan- to outras nações estão muito mais avançadas no campo das pesquisas. “Porém há também uma lacuna en- tre os países com muitas produções cientiicas, cujos estudos nem sem- pre reletem com idelidade a rotina da área pela falta de conhecimento prático. Do outro lado, há o brasil, que possui bastante prática, mas não de- senvolve muitas pesquisas”, pondera. o reconhecimento da área nos últimos anos no País, mesmo sem grandes registros dos proissionais em anais e periódicos acadêmicos, é notável. alessandra diz que o bra- sil é um dos que mais avançam na credibilidade do trabalho da Psi- cologia com os proissionais do es- porte. “É mais fácil para um técnico ou professor de educação física se aproximar da Psicologia no brasil do que em outros países, como Es- tados Unidos, em que os técnicos exercem diversas funções. E como já temos atuações expressivas de psicólogos em esportes de alto ren- dimento, a área acaba sendo mais divulgada pela mídia e alcança re- conhecimento”, acredita. Foi com o apoio do trabalho de alessandra, em parceria com ou- tros proissionais dos campos da Conquistas e desaios da Psicologia do Esporte saúde e dos esportes, que a Seleção Feminina de Handebol brasilei- ra conquistou seu primeiro título mundial, em 2013 na Sérvia, e a me- dalha de ouro nos Jogos Sul-ameri- canos do Chile, este ano. a façanha ganhou as manchetes, divulgando direta ou indiretamente a atuação e importância de equipes interdis- ciplinares na preparação de atletas, incluindo psicólogas/os do esporte. Interdisciplinaridade Como psicóloga do esporte da Seleção Feminina de Handebol há quatro anos, alessandra Dutra diz que os resultados expressivos obtidos pelo time só foram possí- veis pela atuação de equipe inter- disciplinar. “No alto rendimento, podemos ter técnico, supervisor, assistente técnico, treinador de goleiros, preparador físico, médico, nutricionista, massoterapeuta e i- sioterapeuta. São proissionais que têm de adotar a mesma linguagem Sh u tt er st oc k. co m 6 psi • CoNSElHo rEGioNal DE PSiColoGia DE São PaUlo psi • Março / abril / Maio 2014 7 Áreas de atuação Na Psicologia do Esporte há di- ferentes rumos a seguir: alguns bastante recentes, como no caso de transição de carreira, e outros mais reconhecidos, como a atuação com atletas em esportes de alto rendi- mento. Alto rendimento: inclui progra- mas de treinamento psicológico na busca de melhor desempenho em competições dos chamados esportes de alto rendimento. as atividades desenvolvidas visam, entre outros, ao enfrentamento do estresse com- petitivo, ao controle da atenção e concentração, ao fortalecimento de habilidades de comunicação, ao de- senvolvimento de liderança e à coe-são de equipe. Qualidade de vida e bem-estar: Engloba a organização e o desenvol- vimento de atividades físicas espe- cíicas em locais como academias e nos contextos de trabalho. Reabilitação: Concentra ativida- des esportivas desenvolvidas para reabilitação física e social. Iniciação esportiva: atuação para o desenvolvimento de jovens atletas. Projetos sociais: auxilia o traba- lho de atuação psicossocial por meio de atividades esportivas. Transição de carreira: Visa apoiar atletas em transição de carreira, ou seja, que buscam recolocação prois- sional em áreas fora da esportiva. Unidos pela loucura do Carnaval em suas áreas. É um trabalho que precisa ser feito com a comissão, com as atletas e no grupo como um todo, desde a presidência da Confederação até a atleta mais no- vinha da seleção”, airma. Por isso, o primeiro passo de alessandra é fortalecer ou ajudar a desenvolver uma identidade solidiicada, para depois trabalhar desdobramentos. o resgate da história e, conse- quentemente, a formação de uma identidade forte é relevante, pois todos os proissionais devem atuar em equipe para a preparação ade- quada dos atletas. “Quem deve bri- lhar são as pessoas que serão ser- vidas, o time em si. Nossa prática tem de ter uma linha de trabalho que legitime todas as suas ações, tem que ter historicidade e lógica. E ica mais fácil quando poucos integrantes mudam no grupo, já que a ilosoia de trabalho ica for- te e as pessoas que entram enten- dem e acompanham essa ilosoia. a meta de resultados só aparece quando a meta de processo ica mais sólida”. Como um grupo pro- issional coeso e grande pode ser custoso, alessandra defende uma organização mais efetiva das/os psicólogas/os para o desenvolvi- mento de políticas públicas dirigi- das ao contexto esportivo. o trabalho da psicóloga com a Se- leção Feminina de Handebol é con- tínuo. Ela estava com a equipe em todos os eventos importantes dos últimos anos e foi uma das poucas proissionais da Psicologia na Vila olímpica em 2013 – segundo lem- bra, além dela havia somente um psicólogo francês. agora, o momen- to é de novos desaios. “a equipe de handebol saiu da fase competitiva, conquistou títulos importantes, e tenho de trabalhar a manutenção disso. É outro salto de maturidade. É gostoso, mas muito trabalho- so, pois entram novos conceitos. Uma coisa é chegar ao resultado, outra é mantê-lo.” Atendidos em serviços de saúde mental participam ativamente da confecção de fantasias e dos desiles na avenida o projeto “loucos pela X” é ex-periente tanto na confecção de fantasias carnavalescas como em mudanças positivas na vida de seus integrantes. Tudo co- meçou em 2001, no antigo ambu- latório de saúde mental do bairro Jaçanã, em São Paulo, que abrigava projeto de geração de renda em que os usuários produziam papel reciclado – uma das abordagens do tema que a escola de samba X-9 Paulistana apresentou no desile daquele ano. À convite do carnava- lesco da agremiação, lucas Pinto, os participantes do projeto compu- seram uma ala que tratava a fun- ção do papel como terapia em fan- tasias que faziam alusão a arthur bispo do rosário. assim, ajudaram na confecção do Manto da anun- ciação, obra do bispo, que continha lores de papel reciclado formando uma cruz, e ganharam a avenida. a X-9 gostou do resultado e fez outro convite: que a “loucos pela X” se tornasse ala permanente da escola e desilasse como qualquer outra, já que o espaço era de reconheci- mento, e não de privilégios. o projeto se fortaleceu enquan- to os ambulatórios de saúde men- tal eram extintos. o do Jaçanã foi desmembrado em dois serviços: um Centro de atenção Psicossocial (Caps) e um Centro de Convivência e Cooperativa (Cecco), que acolheu as atividades da “loucos pela X”. os participantes confeccionavam suas fantasias, 25% delas subsidia- das para que usuários da rede de saúde mental pudessem desilar, sendo o restante vendido para i- nanciar o trabalho. Dessa forma, passaram-se cinco carnavais no Centro de Convivência, até a dei- nição de que o projeto de geração de renda deveria ganhar autono- mia. Desde então, é autossusten- tado, ou seja, todos os seus gastos são inanciados graças à venda de parte das fantasias. a parceria com a X-9 continua, mas, no último Car- naval, foram confeccionadas fan- tasias também para outra escola. Hoje, a “loucos pela X” é um ateliê u m d i a n a v i d a p erspectiva do usuário Grupo coeso e solidário reconhece os benefícios proporcionados pelo trabalho Nossa prática tem de ter uma linha de trabalho que legitime todas as suas ações” alessandra Dutra “ V an es sa M ar qu es JOãO CARVALHAES, O PIONEIRO “o homem”. Era essa a for- ma como os jogadores da Seleção brasileira de Fute- bol de 1950 se referiam ao psicólogo João Carvalhaes, em uma demonstração de reconhecimento de seu tra- balho para a manutenção do equilíbrio e na motivação da equipe – campeã do mun- do na Suécia. Pioneiro da Psicologia do Esporte no brasil, Carvalha- es foi homenageado pela Comissão de Psicologia do Esporte do CrP SP, em maio de 2000, com a elaboração de documentário sobre sua trajetória, disponível no http://www.crpsp.org.br/ memoria/joao/videos.aspx. No vídeo, esportistas e jor- nalistas que conheceram o proissional testemunham o estranhamento com que foi recebida, no meio, a contra- tação de um psicólogo para acompanhar a Seleção brasi- leira. Carvalhaes acumulava experiência como comen- tarista de boxe, ministrante de cursos para juízes e árbitros de futebol, e acompanhante de equipes – começou no São Paulo Futebol Clube – em campeonatos internacio- nais. Com foco na formação inte- gral do atleta, o trabalho do psicólogo foi gradualmen- te conquistando respeito. assim, em 1976, quando faleceu, já havia publicado artigos, proferido palestras e participado de vários con- gressos – meios pelos quais expôs suas atividades ao grande público. 8 psi • CoNSElHo rEGioNal DE PSiColoGia DE São PaUlo psi • Março / abril / Maio 2014 9 de Carnaval como qualquer outro, reconhecido por sua especialida- de, mas que ganhou ainda uma se- gunda vertente, além da geração de renda aos usuários da rede de saúde mental: a de promoção da inclusão no universo carnavalesco pela cultura, alegria e pela organi- zação de um campo de trocas afe- tivas. a intenção, diz Pedro Gava, um dos coordenadores do projeto, é a contínua evolução. “Se estamos fe- lizes com nosso trabalho e num lu- gar feliz, isso tem repercussões na vida, repercussões que podemos chamar de terapêuticas. Se traba- lhamos no que gostamos, investi- mos, criamos laços afetivos e soli- dários, isso repercute em alegria e bem-estar. os participantes têm claro que isso é um investimento deles. Eles se apropriaram do es- paço e do capital gerado, e isso faz deles pessoas mais potentes para a vida”, airma. Participantes Dos 13 atuais participantes do projeto, a maior parte está na “loucos pela X” desde os primeiros anos, como Nirma Sueli dos San- tos, de 57 anos. Ela conta que o iní- cio das atividades foi de hesitação. “Ficamos meio ansiosos, confusos sobre como poderíamos entrar nesse negócio de escola. Foi um corre-corre danado, surpresas, não esperávamos isso, vivíamos de medicação de controle”, diz. Com a morte da mãe, Nirma foi interna- da e, após a alta médica, ingressou na iniciativa de geração de renda. Meses depois, seu pai faleceu, po- rém, já integrada ao projeto, con- seguiu lidar melhor com a perda. Quem também comemora ganhos é Edite Celeste de Souza, de 50 anos, que já passou por in- ternação e ingestão de altas dosa- gens de remédios, mas hoje tem outra vida. “Eu vim me desenvol- vendo, aprendendo, e hoje sou uma aderecista. aqui no grupo somos como irmãos: o que um não sabe fazer, o outro ensina. É gosto- so também quando chega a hora da avenida; a gente sente a adre- nalina subindo e a alegria de saber que o mundo inteiroestá vendo. Tem psicólogos que vêm de outras cidades para brincar com a gente e icam encantados. Somos loucos entre aspas; a gente faz muita coi- sa e estamos evoluindo a cada dia. Hoje tomo medicamento, mas é um miligrama, e a doutora diz que estou ótima”, comemora. Integração “Não somos mais aquelas pes- soas deprimidas que só comem, bebem e dormem. agora, a gente vem e traz marmita, tem horá- Não somos mais aquelas pessoas deprimidas que só comem, bebem e dormem” Maria Sônia de Santana “ p erspectiva do usuário Ensaio da ala é marcado por descontração V an es sa M ar qu es me mandaram para o Centro de Convivência e eu comecei a fazer as fantasias e me senti bem. Eu i- cava muito em casa mesmo. agora eu saio mais, convivo com outras pessoas”. Orgulho e trabalho Para os participantes, a forma de enxergar o trabalho e lidar com o dinheiro também mudou. No ate- liê há carinho e descontração, mas todos sabem que o local é de tra- balho, e valorizam o dinheiro que ali recebem. Enivaldo Jesus Mar- tim, 48 anos, destaca com orgulho tudo que aprendeu. Faz questão de reforçar que o grupo apoia os novos integrantes. Para ele, “tem muito preconceito na rua e gen- te que não se interessa por esse negócio de fantasia, de Carnaval, acha que é uma besteira. Mas es- tão enganados: isso é bom para a cabeça, é uma terapia, e a gen- te ganha um dinheirinho.” Ele é o primeiro a reconhecer o papel de cada um no processo. Kátia aparecida da Silva, 43 anos, tem diiculdade em mexer com cola quente: “já treinei em casa com cola pequena, mas não deu”, diz. isso não a impediu de contribuir com a “loucos pela X”. Sua função é guardar os materiais, arrumar as mesas de trabalho, varrer, fazer suco e lavar louça. Com o que re- rio de almoço, café da tarde, tudo organizado. Às vezes icamos ir- ritados, nervosos, mas vem um e conversa, vem outro e anima. Esse trabalho é muito importante; não sou mais aquela que andava com muleta, com aparelho. Hoje sou outra grande mulher.” a airma- ção, de Maria Sônia de Santana, de 51 anos, relete o espírito dos par- ticipantes da “loucos pela X”. in- tegração e convivência são funda- mentais para eles, e citados como os grandes diferenciais do projeto. “Manter a cabeça ocupada”, “ter sobre o que conversar”, “sentir or- gulho de o mundo ver as fantasias” estão na boca de todo o grupo. Mãe e ilha, Clarice da Silva, de 58 anos, e Flávia da Silva arruda, de 31, são hoje mais próximas e, segundo dizem, amicíssimas. Flávia apren- deu a colar lantejoulas e fazer cos- teiros, decora os enredos e gosta de ser chamada de passista. Já sua mãe, que diz estar no projeto de “lambida”, por ser acompanhante, conta que a ilha melhorou 100%. ”antes a gente icava sem assunto, olhando uma para a outra. aqui foi a regulação de tudo; eu não a entendia, e ela não me entendia. agora eu sei o que está se passan- do, sei como ajudar na integração. É uma maravilha, a gente não se desgruda”, orgulha-se Clarice. alessandro andrade de lima, 38 anos, também fez amigos e mu- dou a forma de se relacionar com as pessoas. Muito tímido, ele pou- co conversava. Depois de ingressar no projeto, passou a desilar todos os anos e conta que não tem mais vergonha de fazer perguntas e bater-papo. “Para mim foi bacana porque daqui eu arrumei serviço fora também, trabalhei sete anos num banco. Depois do projeto eu não tenho mais vergonha”, reve- la. Novas convivências mudaram também a vida de Sidnei leão, 52 anos, que ingressou no ateliê de- pois da insistência de familiares: “no começo foi mais pra minha família, para minhas irmãs. Elas Para acompanhar as atividades e os eventos culturais da “loucos pela X”, acesse a página Facebook.com/loucospelax ou entre em contato no e-mail alaloucospelax@terra.com.br. cebe, ajuda a pagar contas de luz e água. E Enivaldo elogia: “Se não ti- vesse a Kátia para guardar o mate- rial, varrer aqui tudo, a gente não ia fazer, a gente não tem tempo. Ela é importante”, elogia. luis atílio Ximenes, 48 anos, é outro a elogiar o grupo que, se- gundo diz, o acolheu muito bem. Para ele, não falta orgulho pelo trabalho realizado. Com um sor- riso no rosto, conta que seu sobri- nho assistiu ao desile inteiro da X-9 Paulistana na esperança de vê-lo. “Eu botava empecilho, pen- sava nos banheiros químicos, em chuva, que eu tomava remédio... E neste Carnaval eu desilei, e gos- tei. É prazeroso ver seu trabalho se destacar na avenida, aparecer para o público, para a imprensa”, diverte-se. os ganhos e o orgulho não são somente dos participantes. a dona do espaço onde funciona o ateliê, ione Teresinha Prequero, de 60 anos, diz que a “loucos pela X” foi a melhor coisa que podia ter acontecido em sua vida. E revela, emocionada: “Eu tive um proble- ma familiar, me prostrei. o pesso- al aqui é minha família, me autoa- irmei, passei a ter mais coniança. Eles acham que eu ajudo, mas eles me ajudam muito mais. Eu estou na luta com eles, e espero que por muitos e muitos anos.” integração e convivência são valores fundamentais para os atendidos V an es sa M ar qu es ala “loucos pela X” desilou este ano com fantasias e alegorias feitas pelos integrantes do coletivo de geração de trabalho e renda 10 psi • CoNSElHo rEGioNal DE PSiColoGia DE São PaUlo psi • Março / abril / Maio 2014 11 O r i e n t a ç ã o Na área da saúde, eles são chamados de Projeto Te-rapêutico Singular (PTS); no campo da assistência social, de Plano de atendimento individual (Pia). ambos são elaborados para orientar o atendimento prestado aos usuários, devem ser construí- dos de forma coletiva e interdisci- plinar, pactuados com os sujeitos e aplicados singularmente. No en- tanto, têm suas particularidades. o psicólogo ricardo Sparapan Pena, apoiador institucional da Política Nacional de Humanização da atenção e Gestão do Serviço Único de Saúde (SUS), deine o PTS como uma estratégia de cuidado, na qual a equipe de saúde discute os casos clínicos e deine a aten- ção a ser dispensada aos usuários. Essa atenção, segundo ele, deve ser compartilhada com quem vai re- cebê-la para que não se torne uma prescrição difícil de ser alcançada. o projeto terapêutico tem de le- var em conta ainda as possibilida- Cuidados devem ser singulares, porém definidos coletivamente Projetos terapêuticos e planos de atendimento são estratégias importantes para nortear o trabalho de proissionais da saúde e assistência social Shutterstock.com des dos atendidos para cuidar de si, e buscar contribuir com ações que aumentem essas possibilida- des. “É uma estratégia para a am- pliação da clínica, pois considera o sintoma como uma expressão dos modos de viver, e não como algo isolado, que se apresenta da mes- ma forma em qualquer pessoa. É a singularidade que orienta a cons- trução das ofertas em um PTS”, re- força o proissional. Tanto que os projetos são pen- sados para os usuários que de- mandam mais atenção das equi- pes interdisciplinares. até porque, como explica Pena, em serviços de atenção básica ou de saúde da família, a procura pelas unidades é muito grande, o que exige prio- rizar os casos em que os PTS são construídos. “Um trabalhador que faz acompanhamento para diabetes, mas consegue ir às con- sultas, se medicar corretamente, negociar com a equipe uma dieta adequada, dentro de sua rotina, e manter níveis de glicemia estável não demanda PTS, pois tem con- dições de construir possibilidades de se cuidar”, exempliica. Já em serviços de referência em saúde mental, como o Caps, o ideal é que todos os usuários tenham PTS como estratégia de cuidado, “pois há situações em que o sofrimento psíquico airma a diferença como modo de existir”. o psicólogo defende que, para a elaboração dos projetos, as equi- pes devem discutir os casos, con- siderando os sintomas e inves- tigando como se expressam nos usuários e qual a história de pro- dução das queixas trazidas. Essa investigação,de acordo com Pena, deve estar articulada ao modo como as pessoas vivem, pois isso fornece as pistas para entender porque, em muitos casos, os sin- tomas não melhoram e as quei- xas se tornam constantes. “as equipes precisam entender que psicólogos, médicos, enfermei- ros, dentistas, assistentes sociais, assim como outros proissionais, por mais competentes que sejam, não têm domínio da totalidade de uma vida, o que necessariamen- te questiona os limites de seus saberes. assim, as informações acerca de um caso clínico vêm de várias direções.” Pena também é supervisor clí- nico-institucional de serviços de saúde mental e da atenção básica, como Caps, Unidades básicas de Saúde e consultório na rua. Como tal, adota o PTS e o fomenta como um conceito-ferramenta para os planos de ação das Secretarias Municipais e Estaduais de Saúde e dos coletivos ligados às redes de atenção à Saúde (raS). ainda assim, diz que não é possível clas- siicar a experiência como boa ou ruim, mas entendê-la em sua for- ça de transformação das práticas em saúde. “apostar no PTS, assim como em outras estratégias clí- nicas e de gestão, tem sido uma experiência intensa de vivenciar e interferir nas diferentes reali- dades da saúde em nosso país”, testemunha. PIA Sem foco terapêutico, o Plano de atendimento individual (Pia) é dispositivo de planejamento das ações direcionadas à superação de possíveis vulnerabilidades sociais, o que contempla diversas políticas públicas em áreas como habita- ção, saúde e educação. assim, cabe ao proissional da assistência So- cial trabalhar em rede com essas políticas e com o sistema de ga- rantia de direito, como observa a psicóloga ana Paula Souza romeu, técnica da Proteção Social Especial da Secretaria de Desenvolvimento Social do Estado de São Paulo. Ela explica que o Pia é construí- do em etapas no decorrer dos aten- dimentos, e envolve identiicação e caracterização, diagnóstico, análi- se técnica, plano de metas e acom- panhamento e avaliação. Ele é ado- tado nos trabalhos de atenção aos idosos, nos serviços de medidas socioeducativas em meio aberto, no Centro de referência Especiali- zado para População em Situação Erika Retângulo Erika Caixa de texto PSICOLOGIA FORENSE nº 184 • Agosto | Setembro • 2015 Data celebrada em 27 de agosto homenageou a categoria que, nesta edição especial, mostra onde e como faz Psicologia no dia a dia por uma sociedade mais democrática e igualitária A Psicologia 2 psi • Conselho Regional de PsiCologia de são Paulo Publicação do Conselho Regional de Psicologia de são Paulo, CRP sP, 6ª Região Diretoria Presidenta | elisa Zaneratto Rosa Vice-presidenta | adriana eiko Matsumoto secretário | guilherme luz Fenerich Tesoureira | gabriela gramkow Conselheiros alacir Villa Valle Cruces, aristeu Bertelli da silva, Bruno simões gonçalves, Camila de Freitas Teodoro, Dario Henrique Teófilo Schezzi, Graça Maria de Carvalho Camara, gustavo de lima Bernardes sales, ilana Mountian, Janaína leslão garcia, Joari aparecido soares de Carvalho, Jonathas José salathiel da silva, José agnaldo gomes, livia gonsalves Toledo, luis Fernando de oliveira saraiva, luiz eduardo Valiengo Berni, Maria das graças Mazarin de araujo, Maria ermínia Ciliberti, Marília Capponi, Mirnamar Pinto da Fonseca Pagliuso, Moacyr Miniussi Bertolino neto, Regiane aparecida Piva, sandra elena spósito, sergio augusto garcia Junior, silvio Yasui. Realização Linha Fina Jornalista responsável Milton Bellintani (MT b 18.122) Reportagens adriana Carvalho, denise Ramiro, Milton Bellintani Direção de arte Cláudio Franchini Fotos da capa Reprodução site CRP sP Revisão linha Fina Impressão Rettec Artes Gráficas Tiragem 89.300 exemplares Sede CRP SP Rua arruda alvim, 89, Jardim américa Cep 05410-020 são Paulo sP Tel. (11) 3061-9494 | fax (11) 3061-0306 E-mails atendimento | atendimento@crpsp.org.br diretoria | direcao@crpsp.org.br informações | info@crpsp.org.br Centro de orientação | orientacao@crpsp.org.br administração | admin@crpsp.org.br Comunicação | comunicacao@crpsp.org.br Site www.crpsp.org.br Subsedes CRP SP assis | tel. (18) 3322-6224, 3322-3932 Baixada santista e Vale do Ribeira tel. (13) 3235-2324, 3235-2441 Bauru | tel. (14) 3223-3147, 3223-6020 Campinas | tel. (19) 3243-7877, 3241-8516 grande aBC | tel. (11) 4436-4000, 4427-6847 Ribeirão Preto | tel. (16) 3620-1377, 3623-5658 são José do Rio Preto | tel. (17) 3235-2883, 3235-5047 sorocaba | tel. (15) 3211-6368, 3211-6370 Vale do Paraíba e litoral norte | tel. (12) 3631-1315 í n d i c e 184 PROCESSO | ACOLHIMENTO a psicóloga ana Maria e o estudante Wallace atuam em duas realidades. ela na atenção a pessoas com esclerose múltipla e ele, com usuários de crack. 4 PROCESSO | ACOMPANHAMENTO irineu atua com prevenção de perda de memória de idosos. Marcelo promove a religação dos vínculos de pessoas em condições de abandono. 8 PROCESSO | AVALIAÇÃO Armando introduziu a avaliação psicológica em um hospital para identificar níveis de estresse. lúcia analisa casos da justiça de crianças e adolescentes. 11 PROCESSO | EDUCATIVO Marcos coordena grupos de pesquisa docente na universidade. a estudante ester completa sua formação em sintonia com a professora que supervisiona estágios. 14 CAPA | PSICOLOGIA TODO DIA, EM TODO LUGAR E SEUS PROCESSO DE TRABALHO depoimentos em vídeo recebidos pelo CRP sP já somam mais de 300. Relatos estão organizados no site pelos processos da profissão e dão visibilidade às práticas psi. 16 PROCESSOS | FORMATIVO E FORMATIVO DE PSICÓLOGAS/OS Mariana e ana Cristina são professoras. uma no curso de Psicologia e a outra no de serviço social. Pablo fala de suas descobertas no estágio com Reintegração social. 20 PROCESSOS | GRUPAIS Marcella e ariadine contam sobre os benefícios da terapia grupal para promover o bem estar e a qualidade de vida das pessoas. 22 PROCESSO | ORGANIZATIVO a experiência de dreyf e eduardo passa por palcos distintos, cujo ponto em comum é colocar a Psicologia na proteção de quem tem direitos negados. 25 PROCESSOS | ORIENTAÇÃO E ACONSELHAMENTO Maria Celina atua com alunos em projeto de saúde coletiva de um Centro universitário. Ricardo com os 250 usuários de um CaPs e seus familiares. 27 PROCESSO | TERAPÊUTICO Cássia, Carlos e Wellington atendem estudantess em espaços distintos: consultório, clínica particular e serviço público. Veja o que há de comum em seu trabalho. 30 Capa (a partir da esquerda): dreyf gonçalves, ana Cristina nassif soares, Ma- ria Celina Trevizan Costa, ariadine Beneton de Campos, Cássia Bighetti, Mariana garbin, Wellington Passos, ester aline da silva, ana Maria Canzonieri, irineu Fer- reira de souza, Marcelo Marques de oliveira, lucia Maria Rodrigues de almeida e Marcella Milano. Contracapa (a partir da esquerda): Marcos Roberto Vieira garcia, Clélia Prestes, lívia Penteado, Carlos eduardo Mendes, ana Bock, eduardo neves, Priscila leite gonçalves, Carlos eduardo Cunha, Mathilde neder, Ricardo José her- nandes, armando Ribeiro das neves neto, ana Rita de Paula, lilian suzuki. psi • agosto / setembro 2015 25 p r o c e s s o : m o b i l i z a ç ã o o psicólogo paulistano Dreyf de assis gonçalves trocou a capital pelo extremo oeste do estado em 2009, quando mudou-se para a cidade de araçatuba, a 525 km de são Paulo, para trabalhar no servi- ço de atenção à população de rua. este ano, Dreyf assumiu a coordenação do curso de Psicologia da Unip nesta ci- dade do interior paulista. Quando se graduou, em 1997, conta que tinha sérias dúvidas se consegui- ria sobreviver da profissão fazendo apenas atendimentos em consultó- rio. “Percebi que conhecia pouco so- bre as questões da profissão. Então, tomei duas decisões: iniciei o mestra- do com vistas a atuar na academia e me aproximei do sistema Conselhos, onde o debate sobre os caminhos da Psicologia e o compromisso da profis- sãocom o interesse público não soa- vam estranhos ou ameaçadores e sim mobilizadores”, conta. “Faço parte de uma geração em que a ideia de com- promisso foi posta em prática.” Nessa época, Dreyf diz lembrar de discussões que travou com colegas que entendiam que ele não estava na área por haver optado em atuar no serviço público de saúde no Centro de referência e treinamento em Dst AIDS de São Paulo, em vez de atender em consultório próprio. “sempre res- pondi que estava na Psicologia, sim, por considerar que a dimensão social do trabalho do psicólogo é insepa- rável da atuação profissional. Isso é mais evidente na saúde pública, mas também se liga ao trabalho em espa- ços privados – seja na universidade, em clínicas particulares ou no consul- tório, o compromisso com as pessoas atendidas deve ser o mesmo.” Para ele, o reconhecimento de que a Psicologia se insere em vários proces- A experiência de Dreyf gonçalves e eduardo Campos de almeida Neves passa por cenários distintos, cujo ponto em comum é colocar a Psicologia na proteção de quem tem seus direitos fundamentais desrespeitados e sofre risco de danos psicológicos Dreyf de assis gonçalves: atendimento a pessoas em situação de rua, em araçatuba tratando gente como gente Veja o vídeo de Dreyf gonçalves usando o leitor de Qr Code do celular/tablet ou clicando com o mouse na foto. Na rua ou nas Varas da Justiça, sos de atuação é também uma neces- sidade de sobrevivência institucional. “Reduzir a profissão a um único cam- po, a uma teoria, significa não enten- der a sua inserção social.” Sujeitos de direitos ainda em são Paulo, Dreyf atuou com a Rede Rua na mobilização de pessoas em situação de rua. a oNg, localizada no bairro do Brás, promove a inclusão social por meio da comuni- cação e da “busca de cidadania”, pos- sibilitando a organização dessa popu- lação na cidade. a experiência adquirida no tra- balho social na capital deu a Dreyf a segurança necessária para levar atenção psicológica às pessoas em si- tuação de rua de araçatuba. ele conta que não são diferentes das que vivem em são Paulo, assim como lá não fal- ta quem considere exagerado cuidar de quem está na rua. “a Psicologia se fortaleceu institucionalmente para fazer o enfrentamento com que não compreende que mesmo aqueles que historicamente sempre foram des- providos da cidadania são sujeitos de direitos e que ouvir essa população, conhecer suas necessidades e enten- der como legítimas as suas deman- Erika Caixa de texto PSICOLOGIA FORENSE 26 psi • CoNselho regioNal De PsiCologia De são PaUlo p r o c e s s o : m o b i l i z a ç ã o das não é concessão e sim a realização de nosso papel institucional.” Atuação no Judiciário o psicólogo eduardo Campos de almeida Neves atua desde 2010 no tribunal de Justiça de são Paulo, nas Vara de Família e Vara da Infância e Juventude na cidade de Presidente Prudente, depois de vinte anos clini- cando. ele explica que as/os psicólo- gas/os judiciárias/os não atuam na área criminal – a não ser em casos referentes à lei maria da Penha, para proteção das vítimas. Na Vara de Fa- mília ele realiza avaliações psicológi- cas, sobretudo em processos de guar- da e regulamentação de visitas. “Na prática da Psicologia neste con- texto de trabalho buscamos avaliar casos de crianças e adolescentes com denúncias de violações de direitos a partir de situações de negligência e/ ou violência física, sexual ou psicoló- gica, que são encaminhados ao Juízo pelo Conselho tutelar, ministério Pú- blico ou por órgãos da rede de atendi- mento (saúde, educação, segurança pública etc)”, explica Eduardo. “Na Vara da Infância é aberto um proces- so no qual o juiz determina que seja realizado estudo psicológico do caso em questão, com a finalidade de ela- borar um relatório/laudo – não com o objetivo de dar a sentença, mas sim fornecer subsídios para a decisão ju- dicial pelo entendimento da situação do ponto de vista psicológico e suges- tões de encaminhamentos.” Em seu trabalho, ele mobiliza todos os nós dessa rede de proteção. em um caso em que atuou, segun- do conta, uma criança foi colocada em acolhimento provisório em uma instituição pelo Juiz da Infância como medida de proteção por estar sen- do negligenciada pela mãe, que era usuária de drogas ilícitas. “Com a de- terminação pela perícia psicológica, realizamos a interação lúdica com a criança, a visita à instituição e reu- niões com os profissionais da entida- de de acolhimento e da rede. em ou- tro momento, entrevistamos a mãe buscando avaliar suas condições de exercer sua maternagem (cuidados desse filho). Com a avaliação, indica- mos a guarda provisória à avó mater- na. Contudo, o Código Civil diz que ‘o juiz não está adstrito ao laudo peri- cial’, o que significa que o relatório de estudo psicológico é uma referência, um dos recursos que o magistrado utiliza para formar seu convenci- mento acerca de um caso. assim, o juiz é soberano para acatar ou não as sugestões. Felizmente, tenho a felici- dade de trabalhar com um juiz que sempre se mostrou acessível, aberto ao diálogo e, neste caso, decidiu com base em minhas indicações”, diz ele. em 2013, eduardo Neves foi elei- to para compor a atual diretoria da associação dos assistentes sociais e Psicólogos do tribunal de Justiça de são Paulo (aasPtJ-sP). Na entidade, seu foco é a defesa dos interesses desses profissionais do Judiciário. “O trabalho das equipes técnicas do tJ- sP compreende alto grau de estresse. o volume de processos encaminha- dos para os psicólogos e assistentes sociais é elevado e, frequentemen- te, com prazos exíguos.” Segundo relata, as demandas das crianças e adolescentes frequentemente acar- retam nos profissionais sentimentos de impotência e sofrimento ético-po- litico, por atuarem em questões de alta complexidade. “outra questão relevante é a defesa de nossa autonomia pela não parti- cipação de psicólogos e assistentes sociais no chamado Depoimento es- pecial de crianças vítimas de violên- cia e exploração sexual. Neste proce- dimento, o psicólogo faz inquirição de vítimas cujo depoimento é gravado e acompanhado por circuito fechado de TV por juiz, promotor, defensor e réu, que assistem em outra sala. esta metodologia é controvertida do pon- to de vista científico, além de reviti- mizante, havendo diversos pareceres técnicos contrários de renomados pesquisadores da temática por ser voltado para a produção de prova em Vara Criminal tão somente para a res- ponsabilização do agressor e não para a proteção da criança vítima, a quem é imposto o ônus da prova.” eduardo lembra, ainda, a conquista das 30 horas das/dos psicólogas/os do TJ-SP. “Foi uma grande vitória da re- sistência, da defesa de nossos direitos profissionais por trabalho protegido e digno, assim como da luta contra a terceirização”, afirma. eduardo Neves atua no tribunal de Justiça, em Presidente Prudente Veja o vídeo de eduardo Campos de almeida Neves via leitor de Qr Code ou clicando com o mouse na foto. nº 179 • Junho | Julho | Agosto • 2014 2 psi • Conselho Regional de PsiCologia de são Paulo Publicação do Conselho Regional de Psicologia de são Paulo, CRP sP, 6ª Região Diretoria Presidenta | elisa Zaneratto Rosa Vice-presidenta | Maria ermínia Ciliberti secretário | luis Fernando de oliveira saraiva Tesoureira | adriana eiko Matsumoto Conselheiros adriana eiko Matsumoto, alacir Villa Valle Cruces, ana Paula Porto noronha, aristeu Bertelli da silva, Bruno simões gonçalves, Camila de Freitas Teodoro, Dario Henrique Teófilo Schezzi, Elisa Zaneratto Rosa, gabriela gramkow, graça Maria de Carvalho Camara, Guilherme Luz Fenerich, Gustavo de Lima Bernardes sales, ilana Mountian, Janaína leslão garcia, Joari aparecido soares de Carvalho, Jonathas José salathiel da silva, José agnaldo gomes, livia gonsalves Toledo, Luis Fernando de Oliveira Saraiva, Luiz Eduardo Valiengo Berni, Maria das Graças Mazarin de Araujo, Maria ermíniaCiliberti, Marília Capponi, Mirnamar Pinto da Fonseca Pagliuso, Moacyr Miniussi Bertolino neto, Regiane aparecida Piva, sandra elena spósito, sergio augusto garcia Junior e silvio Yasui. Realização Linha Fina Jornalista responsável Milton Bellintani (MT b 18.122) Reportagens denise Ramiro, silvia M. Bellintani, Telma Costa Arte Cláudio Franchini Foto da capa CRP sP Revisão linha Fina Impressão Rettec Artes Gráficas Tiragem 86.000 exemplares Sede CRP SP Rua arruda alvim, 89, Jardim américa Cep 05410-020 são Paulo sP Tel. (11) 3061-9494 | fax (11) 3061-0306 E-mails atendimento | atendimento@crpsp.org.br diretoria | direcao@crpsp.org.br informações | info@crpsp.org.br Centro de orientação | orientacao@crpsp.org.br administração | admin@crpsp.org.br Comunicação | comunicacao@crpsp.org.br site | www.crpsp.org.br Subsedes CRP SP assis | tel. (18) 3322-6224, 3322-3932 Baixada santista e Vale do Ribeira | tel. (13) 3235-2324, 3235-2441 Bauru | tel. (14) 3223-3147, 3223-6020 Campinas | tel. (19) 3243-7877, 3241-8516 grande aBC | tel. (11) 4436-4000, 4427-6847 Ribeirão Preto | tel. (16) 3620-1377, 3623-5658 são José do Rio Preto | tel. (17) 3235-2883, 3235-5047 sorocaba | tel. (15) 3211-6368, 3211-6370 Vale do Paraíba e litoral norte | tel. (12) 3631-1315 í n d i c e 179 UM DIA NA VIDA | CONHEÇA MAIS SOBRE A PSICOLOGIA NO JUDICIÁRIO Também denominados peritos, cabe às/os psicólogas/os subsidiarem o juiz com avaliações e análises que indiquem ações a serem tomadas em decisões processuais nas Varas de infância e Juventude e Vara de Família. 4 PERSPECTIVA DO USUÁRIO | O RENASCIMENTO DE SÃO LUIZ DO PARAITINGA Saiba como o apoio de psicólogas/os e da comunidade ajudou São Luiz do Paraitinga a renascer em tempo recorde após a forte inundação de 2010. 7 PSICOLOGIA E COTIDIANO | “ACHO QUE SOU GAY” Psicólogas/os indicam caminhos para tratar o tema orientação sexual com pessoas que questionam a sua sexualidade. 10 SUBSEDES | OFICINEIROS DO VII PRÊMIO ARTHUR BISPO DO ROSÁRIO MOSTRAM SUA ARTE Mais de 500 usuários de serviços de saúde mental do estado de são Paulo participaram de oficinas com trocas de vivências e experiências artísticas. 13 MURAL | CONHEÇA O PORTAL DO CRP SP NO YOUTUBE nova Cartilha Polular do CRP sP sobre o tema ‘Medicalização’ está disponível para ser baixada no portal do Conselho. 15 CAPA | NO DIA DA/O PSICÓLOGA/O, UM BALANÇO DAS CONQUISTAS DA PROFISSÃO Profissão sofreu influência das transformações da sociedade e ganhou relevância em temáticas como a universalização dos direitos sociais e direitos humanos. 16 MUNDO DO TRABALHO | #30H JÁ PSICOLOGIA Projeto que reduz jornada para profissionais da Psicologia é aprovado em Comissão da Câmara Federal. Leia as 30 razões por que o CRP SP apoia. 21 MUNDO MELHOR | CONQUISTA DA TERRA PRÓPRIA E PROTAGONISMO assentamento dom Tomás Balduíno, em Franco da Rocha, muda a vida de 63 famílias após mais de 10 anos de luta pela terra própria. 22 ORIENTAÇÃO | AVALIAÇÃO PSICOLÓGICA REQUER TÉCNICA E COMPROMISSO Psicologia organizacional suscita questões técnicas em relação aos processos de avaliação psicológica. 26 QUESTÕES ÉTICAS | HONORÁRIOS a maneira como se estabelece o pagamento de honorários na área clínica pode influenciar no trabalho e até na imagem profissional. 28 PROCESSOS ÉTICOS | PENALIDADES Conselho Regional apresenta reflexão a partir de processo tramitado e publica cassação de registro para o exercício profissional de psicólogo. 30 ESTANTE | TÍTULOS dicas de livros e vídeos sobre temas de interesse da categoria. 31 psi • Junho / Julho / agosTo 2014 3 n o dia 27 de agosto comemoramos 52 anos da re-gulamentação da profissão de psicóloga/o no Brasil. É momento, efetivamente, de comemora- ção para a Psicologia! aquela Psicologia construída pela/o profissional, todos os dias e nos mais diversos lugares, em resposta às demandas de uma sociedade cujo processo de transformação deixa marcas em nossa profissão. esta edição, ao mesmo tempo em que debate esse processo, o reflete. Encontramos aqui a Psicologia inseri- da nos mais variados contextos, comprometida com os princípios éticos e técnicos da profissão, pautada pelas demandas complexas de nossa sociedade e avançando como categoria organizada de trabalhadoras/es. As expe- riências e recortes aqui presentes expressam um produto importante do projeto do compromisso social que, acompanhando o processo de democrati- zação do país, foi pauta- do pela Psicologia. Hoje estamos em mui- tos lugares, ampliamos recursos de intervenção, diversificamos campos de trabalho e respon- demos a necessidades decorrentes dos direitos conquistados pela socie- dade brasileira. Queríamos trazer, nes se dia 27 de agosto, todas as experiências reali- zadas pelas/os psicólogas/os do estado de São Paulo para esta edição. Queríamos conhecer todas as suas práticas. Queríamos identificar o modo como, em cada território, de diferentes maneiras, estamos reinven- tando a Psicologia como ciência e profissão e fazendo a sua história. É para isso que lançamos o projeto “Psi- cologia, todo dia, em todo lugar. Para uma sociedade mais democrática e igualitária”. O CRP SP quer chegar mais perto do cotidiano profissio- nal das psicólogas/os e quer dar visibilidade à Psicologia que construímos em nosso estado. Para isso, mantere- mos no ar um grande portal de apresentação do trabalho da categoria no estado de são Paulo, que poderá ser locali- zado em função da região em que se desenvolve, da área a que se refere ou do processo de trabalho realizado para a intervenção profissional. Precisamos que as/os psicólo- gas/os do estado relatem suas práticas por meio de víde- os e os enviem para o Conselho. a partir desses relatos, o CRP SP vai chegar até vocês. Vamos registrar o trabalho de algumas/uns profissionais e promover debates em sua região e acerca dos desafios e conquistas dessa prá- tica profissional. Vamos, ainda, identificar, por meio da participação de estudantes de nossa área, o modo como o campo da formação tem contribuído, com suas experiên- cias diversas, para a Psicologia que precisamos construir. E vamos, finalmente, co- nhecer a perspectiva dos usuários dos nossos ser- viços e acerca do impacto da atuação da Psicologia em suas trajetórias. Teremos assim uma grande mostra de prá- ticas profissionais que, respeitando as diretri- zes éticas da profissão, se realizam a serviço de uma sociedade mais democrática e iguali- tária. uma mostra que, publicada ao longo de um ano, poderá culmi- nar, no dia 27 de agosto de 2015, em um grande painel da Psicologia que temos feito no estado. O nosso desejo é conhecer e divulgar o trabalho de cada uma/um das/os cerca de 80 mil psicó- logas/os do nosso estado. o recurso que apresentamos é um convite para cami- nharmos juntos e próximos na construção da Psicologia que queremos para o futuro de nosso país. Participem! XIV Plenário do Conselho Regional de Psicologia de São Paulo e d i t o r i a l Parabéns, psicólogas/os! Pelo compromisso com o avanço da Psicologia, pelo compromisso com a transformação da sociedade Erika Retângulo 4 psi • Conselho Regional de PsiCologia de são Paulo u m d i a n a v i d a Também denominados peritos, cabe às/os psicólogas/os subsidiarem o juiz com avaliações e análises que indiquem ações a serem tomadas em decisões processuais nas Varas de infância e Juventude e Vara de Família O papel da Psicologia no Tribunal de Justiça a relação da Psicologia com a Justiça, no contexto dos Tribunais de Justiça, se es- tabelece a partir das demandas do Poder Judiciário. a necessidade de conhecer os requisitos subjetivos envolvidos em litígios tornou ne- cessária a presença de psicólogas/os nessas instituições para subsidiar as decisões de causas em curso. A psicóloga judiciária Luciana Mat- tos é uma delas. doutoranda em serviço social, ela atua no Tribunal de Justiça de Francisco Morato – na Região Metropolitana de são Paulo – desde2011. “Meu papel é fazer um estudo psicológico dos casos a partir de conversas com as partes envolvi- das”, explica. “Essa análise é necessá- ria para o juiz avaliar, por exemplo, que decisão deve tomar em proces- sos envolvendo pais ou avós que rei- vindicam a guarda de crianças.” a atuação na Vara de Família deu a Luciana experiência para lidar com casos desse tipo. Toda criança tem di- reito de ser ouvida nessa decisão e di- zer com qual familiar quer ficar. Mas é importante que seja informada que essa decisão é do juiz, não dela, para que não arque com o peso da responsabilidade da escolha de viver com a mãe ou pai – ou avós. luciana conta que o pedido da guarda por avós é frequente. “Isso acontece por vários motivos, mas Erika Caixa de texto PSICOLOGIA FORENSE psi • Junho/ Julho / agosTo 2014 5 Tribunal de Justiça Fo to : s hu tt er st oc k o mais comum é a gravidez na ado- lescência”, diz ela. “É comum a mãe adolescente deixar a criança sob os cuidados dos avós, especialmente se for solteira. em muitos casos, com a avó paterna.” o que começa de modo consensual pode virar litígio quando a mãe muda de ideia, o que acontece depois de ela entrar na ida- de adulta. “Depois de amadurecer, ela quer reaver a guarda concedida à avó – que já pode estar viúva, se ape- gou à criança como se fosse a mãe e não quer abrir mão de estar com ela”, diz Luciana. Segundo ela, situações como essa criam um conflito para a própria criança, que se sente dividida entre o impulso de viver com a mãe, às vezes irmãos e o pai ou padrasto, e ficar com a avó que a criou. “Ela quer viver numa família como as outras, mas ao mesmo tempo cuidar da avó para que não fique sozinha”, explica. O desejo da criança é levado em conta e a família, encaminha- da para terapia no serviço público. O juiz costuma dar um prazo de seis meses antes de reunir o grupo novamente e tentar a conciliação. Quando isso não é possível, decide. “Normalmente, seguindo a reco- mendação do laudo apresentado pelo perito”, conta luciana. Para ela, ter afinidade com o assun- to é um requisito que deve nortear a escolha profissional pela área. “No Judiciário há sempre conflito. Estou na profissão há 17 anos e posso dizer com segurança: quem busca você carrega o status de sofrimento. a/o profissional tem de aprender a lidar com isso diariamente, sem levar o sentimento alheio para casa”, afir- ma. ela conta que optou pela área, depois de quase 15 anos atuando em Psicologia, após intenso contato com a Justiça em trabalhos anteriores. entre eles serviços de acolhimento – também conhecidos como abrigos – e com a Fundação Casa, autarquia ligada à secretaria de estado da Jus- tiça de são Paulo que tem como fun- ção aplicar medidas socioeducativas em adolescentes e jovens de 12 anos a 21 anos incompletos. esta relação, contudo, é composta de elementos contraditórios. É que nem sempre a demanda do Judiciá- rio pode ser respondida pela ciência psicológica a partir dos pressupos- tos éticos da profissão. Nesse sen- tido, ela acredita, discutir a psicolo- gia na interface com a Justiça, mais especificamente a atuação das/os psicólogas/os em Tribunais de Jus- tiça exige refletir sobre os avanços democráticos e os princípios éticos da profissão na realidade brasileira. Histórico e contexto no Brasil, a área teve atuação in- formal, portanto voluntária, mes- mo após o reconhecimento da pro- fissão, em 1962. No estado de São Paulo, a inclusão profissional da/o psicóloga/o jurídica/o nos quadros do Tribunal de Justiça foi feita, ain- da informalmente, por meio de trabalhos voluntários com famílias em situação de vulnerabilidade social e econômica, nos anos 1970, nos então denominados “Juiza- dos de Menores”. apenas em 1985 houve o primeiro concurso público para o cargo, que também é de- nominado perito de juiz. A/o pro- fissional participa de audiências, perícias e aplica medidas de prote- ção ou socioeducativas nas Varas de infância e Juventude e Vara de Família, e elabora laudos direciona- dos ao juiz, que determina o estudo psicossocial de crianças, adolescen- tes e seus familiares. após o processo de redemocra- tização do país e da construção e u m d i a n a v i d a Psicóloga/o e assistente social: trabalho conjunto nas perícias O juiz da Vara de Infância e Ju- ventude ou da Vara de Família, Conselho Tutelar ou Ministério Público determinam judicial- mente que seja feita uma análise psicossocial de envolvidos em um processo de guarda ou regu- lação de visitas. o estudo psicossocial é feito conjuntamente pela/o psi cóloga/o judiciária/o e pelo as- sistente social. a psicóloga/o perita/o avalia as condições psicológicas da criança, da família e se há problemas em relação a vínculos, já ponderan- do sobre alternativas no próprio estudo, dentro das possibilidades dos pais e da rede de garantias dos direitos da criança e adolescente. Perita/o e assistente técnico O perito é um profissional concursado do Tribunal de Justiça, também cha- mado de Psicóloga/o Judiciária/o, a quem cabe realizar avaliações psicoló- gicas de envolvidos em processo judicial – mediante determinação de um juiz. Sua função é emitir laudo com sugestões que possam auxiliar o juiz na tomada de decisão. o assistente técnico é uma/um psicóloga/o contra tada/o pela parte em lití- gio, para acompanhar o trabalho do perito. Tem como função emitir um lau- do que avalie a condição da criança e do contexto familiar, questionando ou reforçando aspectos presentes na perícia de modo a garantir possibilidades de um outro ponto de vista sobre o caso. Conheça a publicação Psicólogo Judiciário nas Questões de Famí- lia - A Ética própria da Psicologia: mudanças na relação Assistente Técnico e Perito, da série Cader- nos Temáticos editada pelo CRP SP, que traz artigos sobre a atu- ação da profissão nesta área e está disponível para leitura on- -line no link http://www.crpsp. org.br/portal/comunicacao/ cadernos_tematicos/10/frames/ fr_indice.aspx, e para download, em formato PdF, no endereço http://www.crpsp.org.br/portal/ comunicacao/cadernos_tema- ticos/10/frames/Psic_Judic_ Quest_Fam.pdf –, para ser lido em computador de mesa, note- book, tablet ou smartphone. implantação de políticas públicas, visando a garantia de direitos, ocor- re também uma reorganização das legislações de modo a atender as necessidades atuais do Brasil. É nes- se contexto que a aprovação do eCa – estatuto da Criança e do adoles- cente, em 1990, suscita a maior con- tribuição da psicologia no sistema de garantia de direitos da Criança e do adolescente. dessa forma tam- bém foi preciso aumentar o número de psicólogas/os judiciárias/os nos Tribunais de Justiça, por causa da expansão da demanda de ações en- volvendo a psicologia. Campo de trabalho apesar da importância do papel desempenhado pelo perito, luciana avalia que na estrutura do Judiciário o salário da psicóloga/o ainda é bai- xo, comparável ao de profissional de nível médio – entre outros motivos porque não recebe adicional de esco- laride. ela destaca que uma conquis- ta importante para as/os profissio- nais que atuam na área foi a jornada semanal de 30 horas. atualmente são cerca de 600 pro- fissionais no estado, segundo a Asso- ciação dos assistentes sociais e Psi- cólogos do Tribunal de Justiça de são Paulo (aasPTJ-sP). na capital, a/o psicóloga/o atua separadamente: ou nas Varas da infância e Juventude ou na Vara de Família. no interior, atua simultaneamente em ambas – em parceria com assistentes sociais. o concurso público é o único cami- nho para atuação nos Tribunais de Justiça como perito. Desejo da criança deve ser ouvido em situações de disputa judicial que envolvem sua guarda Fo to : s hu tt er st oc k 6 psi • Conselho Regional de PsiCologia de são Paulo nº 184 • Agosto | Setembro • 2015 Data celebrada em 27 de agosto homenageou a categoria que, nesta edição especial, mostra ondee como faz Psicologia no dia a dia por uma sociedade mais democrática e igualitária A Psicologia 2 psi • Conselho Regional de PsiCologia de são Paulo Publicação do Conselho Regional de Psicologia de são Paulo, CRP sP, 6ª Região Diretoria Presidenta | elisa Zaneratto Rosa Vice-presidenta | adriana eiko Matsumoto secretário | guilherme luz Fenerich Tesoureira | gabriela gramkow Conselheiros alacir Villa Valle Cruces, aristeu Bertelli da silva, Bruno simões gonçalves, Camila de Freitas Teodoro, Dario Henrique Teófilo Schezzi, Graça Maria de Carvalho Camara, gustavo de lima Bernardes sales, ilana Mountian, Janaína leslão garcia, Joari aparecido soares de Carvalho, Jonathas José salathiel da silva, José agnaldo gomes, livia gonsalves Toledo, luis Fernando de oliveira saraiva, luiz eduardo Valiengo Berni, Maria das graças Mazarin de araujo, Maria ermínia Ciliberti, Marília Capponi, Mirnamar Pinto da Fonseca Pagliuso, Moacyr Miniussi Bertolino neto, Regiane aparecida Piva, sandra elena spósito, sergio augusto garcia Junior, silvio Yasui. Realização Linha Fina Jornalista responsável Milton Bellintani (MT b 18.122) Reportagens adriana Carvalho, denise Ramiro, Milton Bellintani Direção de arte Cláudio Franchini Fotos da capa Reprodução site CRP sP Revisão linha Fina Impressão Rettec Artes Gráficas Tiragem 89.300 exemplares Sede CRP SP Rua arruda alvim, 89, Jardim américa Cep 05410-020 são Paulo sP Tel. (11) 3061-9494 | fax (11) 3061-0306 E-mails atendimento | atendimento@crpsp.org.br diretoria | direcao@crpsp.org.br informações | info@crpsp.org.br Centro de orientação | orientacao@crpsp.org.br administração | admin@crpsp.org.br Comunicação | comunicacao@crpsp.org.br Site www.crpsp.org.br Subsedes CRP SP assis | tel. (18) 3322-6224, 3322-3932 Baixada santista e Vale do Ribeira tel. (13) 3235-2324, 3235-2441 Bauru | tel. (14) 3223-3147, 3223-6020 Campinas | tel. (19) 3243-7877, 3241-8516 grande aBC | tel. (11) 4436-4000, 4427-6847 Ribeirão Preto | tel. (16) 3620-1377, 3623-5658 são José do Rio Preto | tel. (17) 3235-2883, 3235-5047 sorocaba | tel. (15) 3211-6368, 3211-6370 Vale do Paraíba e litoral norte | tel. (12) 3631-1315 í n d i c e 184 PROCESSO | ACOLHIMENTO a psicóloga ana Maria e o estudante Wallace atuam em duas realidades. ela na atenção a pessoas com esclerose múltipla e ele, com usuários de crack. 4 PROCESSO | ACOMPANHAMENTO irineu atua com prevenção de perda de memória de idosos. Marcelo promove a religação dos vínculos de pessoas em condições de abandono. 8 PROCESSO | AVALIAÇÃO Armando introduziu a avaliação psicológica em um hospital para identificar níveis de estresse. lúcia analisa casos da justiça de crianças e adolescentes. 11 PROCESSO | EDUCATIVO Marcos coordena grupos de pesquisa docente na universidade. a estudante ester completa sua formação em sintonia com a professora que supervisiona estágios. 14 CAPA | PSICOLOGIA TODO DIA, EM TODO LUGAR E SEUS PROCESSO DE TRABALHO depoimentos em vídeo recebidos pelo CRP sP já somam mais de 300. Relatos estão organizados no site pelos processos da profissão e dão visibilidade às práticas psi. 16 PROCESSOS | FORMATIVO E FORMATIVO DE PSICÓLOGAS/OS Mariana e ana Cristina são professoras. uma no curso de Psicologia e a outra no de serviço social. Pablo fala de suas descobertas no estágio com Reintegração social. 20 PROCESSOS | GRUPAIS Marcella e ariadine contam sobre os benefícios da terapia grupal para promover o bem estar e a qualidade de vida das pessoas. 22 PROCESSO | ORGANIZATIVO a experiência de dreyf e eduardo passa por palcos distintos, cujo ponto em comum é colocar a Psicologia na proteção de quem tem direitos negados. 25 PROCESSOS | ORIENTAÇÃO E ACONSELHAMENTO Maria Celina atua com alunos em projeto de saúde coletiva de um Centro universitário. Ricardo com os 250 usuários de um CaPs e seus familiares. 27 PROCESSO | TERAPÊUTICO Cássia, Carlos e Wellington atendem estudantess em espaços distintos: consultório, clínica particular e serviço público. Veja o que há de comum em seu trabalho. 30 Capa (a partir da esquerda): dreyf gonçalves, ana Cristina nassif soares, Ma- ria Celina Trevizan Costa, ariadine Beneton de Campos, Cássia Bighetti, Mariana garbin, Wellington Passos, ester aline da silva, ana Maria Canzonieri, irineu Fer- reira de souza, Marcelo Marques de oliveira, lucia Maria Rodrigues de almeida e Marcella Milano. Contracapa (a partir da esquerda): Marcos Roberto Vieira garcia, Clélia Prestes, lívia Penteado, Carlos eduardo Mendes, ana Bock, eduardo neves, Priscila leite gonçalves, Carlos eduardo Cunha, Mathilde neder, Ricardo José her- nandes, armando Ribeiro das neves neto, ana Rita de Paula, lilian suzuki. psi • agosTo / seTeMBRo 2015 11 p r o c e s s o : a v a l i a ç ã o Q uem procura um médico ou um hospital para fazer a avaliação geral de seu estado de saúde costuma sair com uma receita para check-up que inclui inúmeras análises físicas e laboratoriais. sentiu falta de algu- ma coisa? sim, a investigação so- bre a saúde mental quase sempre é deixada de lado. Pensando nisso, o psicólogo armando Ribeiro das neves neto propôs a criação de um Programa de avaliação de es- tresse à Beneficência Portuguesa, em são Paulo, onde trabalha des- de 2000. a princípio, a avaliação foi agregada ao serviço de che- ck-up que era oferecido por um dos hospitais da instituição, o são José. desde 2012, porém, o hospital deixou de realizar check-ups. Mas o programa continuou, de forma independente. Considerado iné- dito na época de sua criação, em 2010, o objetivo não é apenas o de tratar pessoas diagnosticadas com estresse, mas principalmente identificar os primeiros sinais an- tes de ele se manifestar. “o programa seguiu um modelo que eu trouxe dos Estados Unidos e que lá é disseminado em hospitais modelo, como o de harvard, onde fiz estágio. Ele utiliza conceitos do check-up médico e permite fazer o levantamento de perfis compor- tamentais que podem sugerir a existência de um nível de estresse antes que os sintomas da doença apareçam”, explica Neto, que coor- dena o programa. o psicólogo, que possui certificação em Diagnóstico e gestão do estresse pela harvard armando neto conta que a avaliação identifica níveis de estresse antes das doenças na justiça Na saúde e Avaliação psicológica em um hospital para identificar pacientes com estresse, foi uma inovação introduzida por armando. lúcia utiliza o mesmo processo para analisar casos na Justiça envolvendo crianças e adolescentes. Conheça essas duas aplicações Veja o vídeo de armando Ribeiro das neves neto usando o leitor de QR Code do celular/tablet ou clicando com o mouse na foto. Fo to : a rq ui vo p es so al Erika Caixa de texto PSICOLOGIA HOSPITALAR 12 psi • Conselho Regional de PsiCologia de são Paulo p r o c e s s o : a v a l i a ç ã o Medical school, cursou MBa em saúde ocupacional pela unifesp. a iniciativa de neto mostra que, embora a avaliação seja um processo assimilado na rotina de psicólogas/os das mais diversas áreas, há campos em que é pouco explorado. Para ele, a avaliação de estresse é essencial porque este é um fator desencadeador de outros problemas de saúde, como aciden- te vascular cerebral, gastrite e sín- drome do intestino irritável. “devido à falta da cultura de fazer avaliações psicológicas para che- gar a um diagnóstico precoce do estresse, os pacientes só chegam ao psicólogo muito tempo depois de iniciar tratamentos medicamen- tosos ou cirúrgicos indicados por conta desses outros problemas de saúde”, afirma o psicólogo, acres- centando que é comum também que nos atendimentos convencio- nais médicos prescreverem férias como terapia. Mas, de acordo com Neto, ficar um tempo longe do tra- balho não é nem uma solução má- gica e nem curativa. antes, ressalta, é necessário fazer uma avaliação detalhada. “o diferencial do nosso Programa de avaliação deestresse é que nós fazemos a mensuração da doença para possibilitar uma recomendação mais acertada do que a pessoa deve fazer para geren- ciá-la, tornando-se mais resiliente. Afinal, algumas causas de estresse, como a correria da vida em grandes cidades, não podem ser eliminadas com férias”, afirma Neto. Desafios de um modelo novo introduzir a avaliação psicológica para identificação do estresse em um grande hospital não foi tarefa simples, segundo conta. Quando propôs o programa, muitos colegas estranharam o fato de o hospital incluir um psicólogo em função de check-up. Para ele, o papel da/do psicóloga/o como avaliador é sub- dimensionado. Mesmo na comu- nidade médica resiste a imagem desse profissional ligada apenas ao atendimento em consultório. “essa visão estereotipada e re- ducionista do papel da Psicolo- gia precisa mudar”, afirma Neto. “Afinal, corpo e mente não são dissociados.” ele enfatiza que as condições de ambos devem ser avaliadas igualmente se o objeti- vo é prevenir doenças. o psicólogo exemplifica dizendo que um usuá- rio pode se sair bem na avaliação cardiológica ou apresentar nível adequado de colesterol, mas se seu nível de estresse, ansiedade e depressão não forem investigados ele poderá manifestar em breve sintomas físicos de adoecimento. “ao incluir a avaliação psicológica no programa de check-up, fizemos outra constatação interessante: muitos pacientes tiveram contato ali, pela primeira vez, com psicólo- gos. alguns jamais haviam se con- sultado antes, porque ainda há um pensamento dominante de que ir análise psicólógica para o Judiciário de Bauru, foi o trabalho de lucia Rodrigues de almeida por vinte anos Veja o vídeo de lucia Maria Rodrigues de almeida usando o leitor de QR Code do celular/tablet ou clicando com o mouse na foto. Fo to : n ic ol e Co ra di /a rq ui vo P es so al psi • agosTo / seTeMBRo 2015 13 à/ao psicóloga/o é coisa de quem tem problema mental.” Para viabilizar o programa, neto também precisou adaptar o que aprendeu em sua experiên- cia em harvard à realidade bra- sileira. ele criou um protocolo de testes psicológicos de rápida apli- cação, que oferece indicadores sobre o nível de estresse da pes- soa. A dificuldade nesse ponto foi encontrar testes validados pelo Conselho Federal de Psicologia, já que não era possível simples- mente traduzir ou reproduzir os testes aplicados no exterior. Avaliação no campo jurídico Em Bauru, a experiência da psi- cóloga lucia Maria Rodrigues de almeida mostra outro campo im- portante em que o processo de ava- liação é utilizado. atualmente ela trabalha prestando atendimento psicossocial clínico aos funcioná- rios do Poder Judiciário da cidade e região, mas por mais de duas déca- das se dedicou à análise psicológica em processos jurídicos envolvendo crianças e adolescentes. Depois de uma breve experiên- cia com avaliação de internos para fins de progressão de pena na Pe- nitenciária 2 de Bauru, em 1994, lucia foi chamada para assumir o cargo de psicóloga no Tribunal de Justiça – para o qual havia presta- do concurso. “Foi o primeiro gran- de concurso de psicólogos para o interior do estado e minha turma foi a que iniciou esse serviço de avaliação. Foi um grande desafio, pois até então não havia clareza entre os funcionários da área de direito sobre qual seria o papel de psicólogos em um serviço jurídico”, explica. A visão de seus colegas no Tribunal, assim como acontece em outras áreas da sociedade, era a do estereótipo de psicóloga/o que atende em consultório ouvindo pa- cientes deitados em um divã. aos poucos, lucia e sua equipe mostraram que seu papel não era o de atuação clínica e sim o de avaliar os casos que chegavam às varas de Família e varas da infância e Juven- tude com a finalidade de proporcio- nar aos juízes subsídios para suas tomadas de decisão. se a situação envolvia, por exemplo, um adoles- cente que havia cometido um ato infracional, a avaliação psicológica era fundamental para mostrar ao juiz o histórico familiar e social e as circunstâncias em que isso havia acontecido. “na avaliação também apontávamos as falhas e omissões que poderiam ter acontecido por parte do estado no que diz respeito a atender os direitos desse adoles- cente à saúde, à educação, ao lazer etc. Mostrávamos como tudo isso pode ter influenciado para que o adolescente cometesse o ato infra- cional”, diz ela. Junto com o trabalho de avalia- ção, segundo lucia, abria-se tam- bém espaço para intervenções de orientação para famílias e escolas a respeito do encaminhamento que deveria ser dado às crianças e adolescentes, ou de direcioná-las para tratamento, quando necessá- rio. em outras situações, segundo a psicóloga, o trabalho assumia o ca- ráter de mediação. se o caso era so- bre pais que disputavam a guarda de um filho, os profissionais faziam a avaliação para auxiliar o juiz em sua decisão, mas também orienta- vam o casal que se separara a re- fletir sobre a situação e, muitas ve- zes, chegar a um acordo tendo em vista o interesse da criança. dessa forma procurava-se fazer com que as partes se tornassem mais flexí- veis com o objetivo de alcançar o melhor acordo para o filho, tendo sempre em mente que o ideal é conseguir que a convivência com ambos os genitores seja harmonio- sa. eventualmente podia ser indi- cada uma terapia familiar, mesmo se tratando de um casal desfeito. Crianças e adolescentes em situa- ção de acolhimento, que haviam sofrido violência de toda espécie ou sido encaminhadas para adoção também passavam pela avaliação da equipe da qual lucia fez parte. “Cada caso podia ser avaliado por muitos atores envolvidos no cui- dado com aquela criança ou ado- lescente. Fazíamos reuniões para discutir cada processo. além dos psicólogos judiciários, as institui- ções de acolhimento e responsáveis pelos CAPS, por exemplo, relatavam como estava a situação para que se pudesse chegar a um consenso de encaminhamento”, diz lucia. depois de tantos anos trabalhan- do com foco no processo de avalia- ção no Poder Judiciário, lucia con- sidera que a Psicologia tem muito a contribuir para um olhar mais humanizado da sociedade. a ava- liação psicológica cumpre o papel de ajudar a contextualizar as his- tórias, situando no mundo aquele indivíduo que, antes, representava apenas um número em um proces- so. “Esse trabalho auxiliava os ope- radores do direito a entender as condições de vida e as oportunida- des que aquelas crianças e adoles- centes haviam tido. Mostrava que elas eram de um mundo diferente daquele onde circulam os advo- gados e juízes. a Psicologia, dessa forma, ajudava a humanizar as re- lações envolvendo a Justiça.” Ao incluir a avaliação psicológica no programa de check-up, fizemos outra constatação interessante: muitos pacientes tiveram contato ali, pela primeira vez, com psicólogos” armando Ribeiro das neves neto “ Na avaliação apontávamos as falhas e omissões que poderiam ter acontecido por parte do Estado no que diz respeito a atender os direitos desse adolescente à saúde, à educação, ao lazer” lucia Rodrigues de almeida “ Erika Caixa de texto PSICOLOGIA INSTITUCIONAL Erika Caixa de texto PSICOLOGIA INSTITUCIONAL J O R N A L número 173 • abr | mai • 2013 “Ou nós formatamos ou somos formatados. Essa é a essência da estratégia.” CÉSAR ADES 50 ANOS DA PSICOLOGIA NO BRASIL p si j o rn a l d e p si c o lo g ia | c rp s p | ju n • j u l | 2 0 1 2 202 03 04 07 08 11 12 15 17 18 19 20 23 26 30 31 expedienteíndice EDITORIAL | 50 ANOS DA PSICOLOGIA NO BRASIL Muito a comemorar, muito mais a fazer” é o lema que nos tem guiado ao longo de todas as atividades relacionadas aos 50 anos da Psicologia no Brasil. PROFISSÃO | NA PERSPECTIVA DO BEM COMUM O golpe militar de 1964 impediu que a Psicologia, como proissão, voltasse sua atenção às demandas sociaisda população brasileira. Desde 1988, contudo, há um importante processo de mudança visando cada vez mais o bem comum. PROFISSÃO | PSICOLOGIA CLÍNICA: NO CONSULTÓRIO E ALÉM DELE Como a Psicologia Clínica tem se reformulado com o correr dos anos. FORMAÇÃO | NA ERA DA INCLUSÃO As mudanças do país na última década permitiram à Psicologia ampliar o seu olhar em direção às populações mais vulneráveis e demarcar a sua contribuição social, mas ao mesmo tempo exigem novos padrões de qualiicação dos proissionais. FORMAÇÃO | NEUROPSICOLOGIA: O DESAFIO DE FAZER CIÊNCIA DE QUALIDADE COM COMPROMISSO SOCIAL Em anos recentes as Neurociências têm se desenvolvido e atraído psicólogos(as) e outros (as) especialistas, criando novas possibilidades de atuação. FORMAÇÃO | UM ENCONTRO DE GERAÇÕES As psicólogas Odette de Godoy Pinheiro, 79 e Juliana Thomaz Batista, 27, falam de suas experiências e visões sobre a formação em Psicologia. INSTITUCIONAL | CRP SP: MAIS PRESENTE E PLURAL Novo modelo de gestão do CRP SP integra ações por meio da abordagem intersetorial e visa reforçar diálogo com os (as) proissionais de Psicologia, os poderes e a sociedade. INSTITUCIONAL | UM CRP DE TODOS(AS) PSICÓLOGOS(AS) A importância do processo de regionalização por meio das subsedes do CRP SP. INSTITUCIONAL | PROCEDIMENTOS ÉTICOS: 50 ANOS DE CUIDADOS Como foram constituídos os Códigos de Ética dos Psicólogos e como eles evoluíram ao longo do tempo. INSTITUCIONAL | UM CÓDIGO ATUAL E AVANÇADO O psicólogo Odair Furtado analisa os avanços alcançados com o atual Código de Ética, promulgado em 2005. COMPROMISSO COM A SOCIEDADE | NA DIRETRIZ DOS DIREITOS HUMANOS Nos últimos anos a Psicologia consolidou a sua posição em defesa dos setores mais vulneráveis da população, colocando-se na linha de frente do debate para a construção de uma sociedade que entenda a diversidade como um valor a ser respeitado e promovido. COMPROMISSO COM A SOCIEDADE | ESPAÇO PARA EXISTIR Participação como sujeito e convívio social são determinantes para o tratamento de pessoas com transtornos mentais. FUTURO | QUE PSICOLOGIA TEREMOS? Por iniciativa do professor César Ades (1943-2012), o workshop Perspectivas Estratégicas para a Psicologia reuniu proissionais das mais diversas orientações para discutir o futuro da Psicologia. PENALIDADE ÉTICA PROCESSOS ÉTICOS Psi Jornal de Psicologia CRP SP é uma publicação do Conselho Regional de Psicologia de São Paulo, CRP SP, 6ª Região Diretoria Presidente | Maria de Fátima Nassif Vice-presidente | Fernanda Bastos Lavarello Secretária | Ana Ferri de Barros Tesoureiro | Leandro Gabarra Conselheiros efetivos Ana Ferri de Barros, Carla Biancha Angelucci, Carolina Helena Almeida de Moraes Sombini, Fernanda Bastos Lavarello, Gabriela Gramkow, Graça Maria de Carvalho Camara, Janaína Leslão Garcia, Joari Aparecido Soares de Carvalho, Leandro Gabarra, Luis Fernando de Oliveira Saraiva, Maria de Fátima Nassif, Maria Orlene Daré, Mariângela Aoki, Patrícia Unger, Raphael Bataglia, Teresa Cristina Lara de Moraes Conselheiros suplentes Alacir Villa Valle Cruces, Cássio Rogério Dias Lemos Figueiredo, José Ricardo Portela, Leonardo Lopes da Silva, Lilihan Martins da Silva, Luiz Eduardo Valiengo Berni, Luiz Tadeu Pessutto, Marília Capponi, Marly Fernandes dos Santos, Rita de Cássia Oliveira Assunção, Roberta Freitas Lemos, Rosana Cathya Ragazzoni Mangini Comissão de Comunicação Coordenadora Maria de Fátima Nassif Gerente-geral Diógenes Pepe Coordenadora de Comunicação Christiane Gomes Realização Ziroldo Carolino Comunicação (11) 2579-5079 | (11) 2579-5089 Jornalista Responsável Carlos Carolino (MTb 13.559) arte Ligia Minami Revisão Célia Genovez impressão: Esdeva Empresa Gráica Tiragem 79.000 exemplares Periodicidade bimestral Sede CRP SP Rua Arruda Alvim, 89, Jardim América cep 05410-020 São Paulo SP tel. 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Trata-se de uma área que oferece oportunidades também para os(as) psicólogos(as). “As Neurociências têm possibilitado a compreensão do funcionamento do cérebro e da cognição de uma forma jamais vista”, airma Elizeu Macedo, mestre e doutor em Psicologia Experimental pela Universidade de São Paulo e professor do Programa de Pós- Graduação em Distúrbios do Desenvolvimento, da Universidade Presbiteriana Mackenzie. Segundo ele, esse avanço se deve, em parte, à natureza multidisciplinar desse ramo da ciência, que vem atraindo de biólogos(as) e geneticistas até ilósofos(as) e teólogos(as). “O conhecimento produzido por pesquisadores e clínicos com diferentes abordagens teóricas e recursos metodológicos tem permitido uma compreensão aprofundada e abrangente da arquitetura cognitiva”, airma Elizeu. A Psicologia tem contribuído para isso. “O psicólogo tem um olhar que permite contemplar aspectos de comportamento, aspectos sociais e também bases neurobiológicas”, diz Elizeu. “No caso de uma criança com diiculdades de aprendizagem, por exemplo, você pode pensar a situação levando em consideração aspectos neurobiológicos ao lado de fatores sociais, afetivos e emocionais”. Atualmente as Neurociências são divididas em seis níveis de análise. O primeiro é o molecular, no qual se estuda o papel dos neurotransmissores (na consolidação da memória, por exemplo). Um segundo nível é o celular, que identiica os diferentes tipos de células nervosas e seu modo de funcionamento. No terceiro nível, sistêmico, entra a análise do conjunto de neurônios que formam estruturas complexas relacionadas com funções especíicas como a visão ou o movimento voluntário. O quarto nível é o comportamental, no qual se analisam os sistemas neurais que produzem comportamentos integrados, por exemplo, identiicando áreas do cérebro que podem estar comprometidas em doenças neurodegenerativas. Num quinto nível estão as neurociências cognitivas, que estudam as relações entre mecanismos neurais e atividades mentais superiores do der humano, como consciência, imaginação e linguagem. No sexto e último nível se encontra a neurociência social, que analisa como o cérebro funciona em diferentes situações de interação social. Segundo Elizeu, estudos nesta última área ajudam a entender, por exemplo, a formação de vínculo entre mãe e ilho a partir do estudo de estruturas neurais relacionadas com o reconhecimento da voz e do rosto da mãe. “Além disso, temas como empatia, preconceito, tomada de decisão, dentre outros, estão sendo estudados a partir de uma abordagem neurocientíica”, diz. 11 Erika Caixa de texto NEUROPSICOLOGIA Erika Caixa de texto PSICOLOGIA ORGANIZACIONAL Conselho Regional de Psicologia de São Paulo • 2 n º 1 8 3 • F e v e r e i r o | M a r ç o | A b r i l • 2 0 1 5 nº 185 • Outubro | Novembro | Dezembro • 2015 20 PsicOlOgia e cOtiDiaNONeurocientista carl Hart lança novo olhar sobre a questão das drogas 9 MuNDO MelHOrrefugiados: papel da Psicologia em tempos de guerra e intolerância 4 OrieNtaçãOAvaliação psicológica para obtenção da cNH Conselho Regional de Psicologia de São Paulo2 s u m á r i o 4 6 913 16 20 23 25 26 28 30 CAPA | CAmPANHA EsTADuAL DE DirEiTos HumANos “Violência de Estado ontem e hoje: Da exclusão ao extermínio”, tema da campanha lançada pelo CrP sP, propõe articular ações em defesa da vida. QuEsTÕEs ÉTiCAs | ATENDimENTo NÃo EVENTuAL Psicólogas/os e advogados discutem o dilema ético do atendimento de crianças e adolescentes em sofrimento sem envolver os responsáveis, sob a ótica do Código de Ética das/os Psicólogas/os, o ECA e outras leis. oriENTAÇÃo | PsiCÓLoGAs/os QuE ATuAm Como PEriTos EXAmiNADorEs Psicóloga mostra como a Psicologia pode ajudar a melhorar as condições do trânsito a partir do aprimoramento do processo que avalia os candidatos a obter a CNH. PErsPECTiVA Do usuário | CoNViVENDo Com A DEFiCiÊNCiA Como a conquista da autonomia, a aceitação e o apoio da família podem ajudar a encontrar caminhos para lidar com a deficiência. PsiCoLoGiA E CoTiDiANo | ENTrEVisTA Com CArL HArT Neurocientista, referência mundial sobre a temática das políticas de drogas, fala sobre dependência, preconceito, segregação, descriminalização e de como um olhar humanizador pode resgatar pessoas da segregação social. mATÉriA EsPECiAL | DEsPAToLoGiZAÇÃo DA sEXuALiDADE os desafios para que a resolução 001/99 do CFP, que estabelece normas profissionais relacionadas com o tema da orientação sexual, seja aceita e efetivamente cumprida. ProCEssos ÉTiCos | VArA DA iNFâNCiA E JuVENTuDE Debate sobre a laicidade/religiosidade no âmbito da Psicologia. um DiA NA ViDA | A PsiCoLoGiA E As TrANsFormAÇÕEs soCiAis Psicólogo conta sua experiência em serviços públicos e oNGs dedicados à saúde mental. Ele defende o papel da Psicologia na luta por direitos sociais. muNDo mELHor | rEFuGiADos No BrAsiL Psicólogas/os que atuam no acolhimento de solicitantes de asilo por motivos políticos, religiosos e de orientação sexual debatem o papel da Psicologia em tempos de guerra e intolerância. EsTANTE | DirEiTos HumANos No CiNEmA E Nos LiVros seleção de filmes e livros traz reflexões sobre preconceito, violência e violação de direitos humanos. suBsEDEs | CoNFErÊNCiAs muNiCiPAis, EsTADuAL E NACioNAL Conquistas e desafios do suAs no ano em que a política pública completa dez anos Publicação do Conselho regional de Psicologia de são Paulo, CrP sP, 6ª região Diretoria Presidenta | Elisa Zaneratto Rosa Vice-presidenta | Adriana Eiko Matsumoto secretário | José Agnaldo Gomes Tesoureiro | Guilherme Luz Fenerich Conselheiros Alacir Villa Valle Cruces, Aristeu Bertelli da Silva, Bruno Simões Gonçalves, Camila de Freitas Teodoro, Dario Henrique Teófilo Schezzi, Gabriela Gramkow, Graça Maria de Carvalho Camara, Gustavo de Lima Bernardes Sales, Ilana Mountian, Janaína Leslão Garcia, Joari Aparecido Soares de Carvalho, Livia Gonsalves Toledo, Luis Fernando de Oliveira Saraiva, Luiz Eduardo Valiengo Berni, Maria das Graças Mazarin de Araujo, Maria Ermínia Ciliberti, Marília Capponi, Mirnamar Pinto da Fonseca Pagliuso, Moacyr Miniussi Bertolino Neto, Regiane Aparecida Piva, Sandra Elena Spósito, Sergio Augusto Garcia Junior, Silvio Yasui realização Linha Fina Jornalista responsável Denise Ramiro (MTB 18581) Edição Milton Bellintani reportagens Adriana Carvalho, Denise Ramiro, Milton Bellintani Direção de arte Cláudio Franchini Fotos da capa Reprodução site CRP SP revisão Linha Fina impressão Rettec Artes Gráficas Tiragem 89.300 exemplares sede CrP sP Rua Arruda Alvim, 89, Jardim América Cep 05410-020 São Paulo SP Tel. (11) 3061-9494 | fax (11) 3061-0306 E-mails Atendimento | atendimento@crpsp.org.br Diretoria | direcao@crpsp.org.br informações | info@crpsp.org.br Centro de orientação | orientacao@crpsp.org.br Administração | admin@crpsp.org.br Comunicação | comunicacao@crpsp.org.br site www.crpsp.org.br subsedes CrP sP Assis | tel. (18) 3322-6224, 3322-3932 Baixada santista e Vale do ribeira tel. (13) 3235-2324, 3235-2441 Bauru | tel. (14) 3223-3147, 3223-6020 Campinas | tel. (19) 3243-7877, 3241-8516 Grande ABC | tel. (11) 4436-4000, 4427-6847 ribeirão Preto | tel. (16) 3620-1377, 3623-5658 são José do rio Preto | tel. (17) 3235-2883, 3235-5047 sorocaba | tel. (15) 3211-6368, 3211-6370 Vale do Paraíba e Litoral Norte | tel. (12) 3631-1315 Conselho Regional de Psicologia de São Paulo4 o r i e n ta ç ã o Psicologia para um trânsito humanizado Especialista em avaliação psicológica dos candidatos a obter habilitação mostra a importância do papel profissional, as conquistas e os desafios da função de perito examinador a Psicologia passou a exercer papel importante para melhorar as condições do trânsito a partir do apri- moramento do processo que avalia os candidatos a ob- ter a Carteira Nacional de Habilitação (CNH), que resultou de uma ação conjunta do Conselho Nacional de Trânsito (Contran) e do Conselho Federal de Psicologia (CFP). Há sete anos, o Contran determinou, por meio da Resolução nº 283/2008, que os testes aplicados aos candidatos se- jam realizados apenas por psicólogas/os com especiali- zação em Psicologia do Trânsito. Como desdobramento disso, o CFP aprovou normas e procedimentos para a avaliação psicológica dos candidatos à CNH e conduto- res de veículos automotores (Resolução nº 007/2009). A atuação de psicólogas/os no processo acontece em três situações: obtenção da habilitação, adição de categoria – por exemplo, mudança da classificação B, de condutor amador, para C, de condutor profissional – e renovação para habilitação em casos de atividades remuneradas com o veículo. A avaliação psicológica segue o roteiro proposto pelo CFP e é aplicada da mesma forma para todos os pú- blicos. Primeiro, o candidato passa por entrevista indi- vidual com uma/um psicóloga/o. A entrevista, extensa, visa obter o máximo de informações sobre os traços de personalidade e da rotina do candidato, como forma de avaliar que tipo de pessoa será autorizada a conduzir. Então, a/o psicóloga/o atua para que a pessoa se sinta mais à vontade antes de fazer os testes escritos, resolvendo eventuais dúvidas que ela manifeste. Essa etapa avalia a personalidade, os tipos de atenção do candidato, seu raciocínio e capacidade de estabelecer relações interpessoais. Erika Caixa de texto PSICOLOGIA DO TRÂNSITO Conselho Regional de Psicologia de São Paulo • 5 n º 1 8 5 • O u t u b r o | N o v e m b r o | D e z e m b r o • 2 0 1 5 Fo to : P a n A m e ri ca n H e a lt h O rg a n iz a ti o n -P A H O / F lic kr C re a ti ve C o m m o n s A terceira fase do processo compreende a elabora- ção do laudo psicológico sobre os resultados obtidos na entrevista e nos testes, de forma objetiva. Em segui- da, obrigatoriamente, acontece a entrevista devolutiva. Segundo Daniela Bianchi, psicóloga clínica e docente do Ensino Superior em São José do Rio Preto e Catandu- va, é na entrevista devolutiva que se atua para orientar a pessoa em relação aos resultados que apresentou, mostrando a importância da avaliação psicológica para o trânsito. Se no resultado se detectam indícios de de- pressão ou ansiedade, é necessário fazer o encaminha- mento clínico do candidato. “A gente pede licença para entrar no psiquismo dessa pessoa. Nada mais justo do que devolver quais foram os resultados dela”, explica. Antes das resoluções do Contran e do Conselho Fe- deral, a entrevista individual não existia e a devolutiva não era obrigatória. Além dessa exigência, a orientação do CFP também determina que o laudo da avaliação fi- que arquivado por cinco anos na clínica. Depois de passar sete anos atuando como perita exa- minadora no trânsito em Catanduva, Daniela ingressou no mestrado na área de Saúde e Educação na Universi- dade de Ribeirão Preto, focado na questão do trânsito. Sua pesquisa “Análise da Qualidade do Serviço de Avalia- ção Psicológica para o Trânsito sob a Ótica do Candidato à Obtenção de Habilitação” foi apresentada no início de 2015. A inspiração pelo tema veio de suas descobertas durante o período em que atuoucomo profissional na área. “Sentia nos candidatos que estavam insatisfeitos com as avaliações anteriores. Durante as entrevistas que aplicava, as pessoas queriam saber para o que serve a avaliação psicológica”, conta. A proposta da pesquisa era descobrir se a avaliação psicológica consegue pro- mover a essa população um serviço de qualidade ou não. Situações especiais A avaliação é igual em casos em que os candidatos possuem algum tipo de limitação física ou sensorial. Da- niela cita como exemplo o caso de duas pessoas com deficiência auditiva que avaliou e foram consideradas aptas a conduzir. Ela explica que em situações como essas, se necessário, pode-se incluir um intérprete de Língua Brasileira de Sinais (Libras), que fará a interme- diação com a/o psicóloga/o. “De diferente no processo, apenas que essa avaliação requer um pouco mais de atenção e um tempo maior para a entrevista.” Apesar de as resoluções do Contran e do CFP terem a proposição de incentivar a responsabilidade das/dos psicólogas/os na atuação como peritos examinadores, a avaliação psicológica não acontece em todos os casos. Foi o que Daniela apurou em sua pesquisa acadêmica. Após entrevistar 245 candidatos à obtenção da habilita- ção em Catanduva, ela descobriu que em 62% dos ca- sos as pessoas não receberam a devolutiva. Ela achou preocupante ainda o fato de que nem sempre são as/os psicólogas/os que passam as instruções sobre os testes aos candidatos – mesmo sendo obrigatório – e que em 30% dos casos não foi a/o psicóloga/o que fez a avalia- ção psicológica dos candidatos. Desafios Daniela lembra que quando começou a trabalhar como perita examinadora de trânsito não sabia das dificuldades que encontraria. A começar pelas pressões tanto por par- te dos Centros de Formação de Condutores, que pedem rapidez no procedimento, quanto da própria população, que muitas vezes demonstra desinteresse pelo serviço. “A representação social da/do psicóloga/o do trânsito ainda é negativa”, diz Daniela. Segundo ela, não é possível fazer uma avaliação psicológica bem feita em menos de uma hora e meia. “O importante é não ceder às pressões e não perder o foco no candidato.” Para Daniela, ser um bom perito examinador depende de mostrar aos candidatos a importância da avaliação e de ser atencioso. Também é fundamental ser solícito para responder as dúvidas quantas vezes for necessá- rio e, no momento da entrevista, ter um espaço privado para conversar com a pessoa de forma aberta e, assim, acolher as suas respostas. “O acolhimento é feito com olhar de acolhimento, no sentido de transmitir que esta- mos compreendendo o que a pessoa está dizendo, sem fazer julgamento precipitado sobre o candidato.” nº 179 • Junho | Julho | Agosto • 2014 2 psi • Conselho Regional de PsiCologia de são Paulo Publicação do Conselho Regional de Psicologia de são Paulo, CRP sP, 6ª Região Diretoria Presidenta | elisa Zaneratto Rosa Vice-presidenta | Maria ermínia Ciliberti secretário | luis Fernando de oliveira saraiva Tesoureira | adriana eiko Matsumoto Conselheiros adriana eiko Matsumoto, alacir Villa Valle Cruces, ana Paula Porto noronha, aristeu Bertelli da silva, Bruno simões gonçalves, Camila de Freitas Teodoro, Dario Henrique Teófilo Schezzi, Elisa Zaneratto Rosa, gabriela gramkow, graça Maria de Carvalho Camara, Guilherme Luz Fenerich, Gustavo de Lima Bernardes sales, ilana Mountian, Janaína leslão garcia, Joari aparecido soares de Carvalho, Jonathas José salathiel da silva, José agnaldo gomes, livia gonsalves Toledo, Luis Fernando de Oliveira Saraiva, Luiz Eduardo Valiengo Berni, Maria das Graças Mazarin de Araujo, Maria ermínia Ciliberti, Marília Capponi, Mirnamar Pinto da Fonseca Pagliuso, Moacyr Miniussi Bertolino neto, Regiane aparecida Piva, sandra elena spósito, sergio augusto garcia Junior e silvio Yasui. Realização Linha Fina Jornalista responsável Milton Bellintani (MT b 18.122) Reportagens denise Ramiro, silvia M. Bellintani, Telma Costa Arte Cláudio Franchini Foto da capa CRP sP Revisão linha Fina Impressão Rettec Artes Gráficas Tiragem 86.000 exemplares Sede CRP SP Rua arruda alvim, 89, Jardim américa Cep 05410-020 são Paulo sP Tel. (11) 3061-9494 | fax (11) 3061-0306 E-mails atendimento | atendimento@crpsp.org.br diretoria | direcao@crpsp.org.br informações | info@crpsp.org.br Centro de orientação | orientacao@crpsp.org.br administração | admin@crpsp.org.br Comunicação | comunicacao@crpsp.org.br site | www.crpsp.org.br Subsedes CRP SP assis | tel. (18) 3322-6224, 3322-3932 Baixada santista e Vale do Ribeira | tel. (13) 3235-2324, 3235-2441 Bauru | tel. (14) 3223-3147, 3223-6020 Campinas | tel. (19) 3243-7877, 3241-8516 grande aBC | tel. (11) 4436-4000, 4427-6847 Ribeirão Preto | tel. (16) 3620-1377, 3623-5658 são José do Rio Preto | tel. (17) 3235-2883, 3235-5047 sorocaba | tel. (15) 3211-6368, 3211-6370 Vale do Paraíba e litoral norte | tel. (12) 3631-1315 í n d i c e 179 UM DIA NA VIDA | CONHEÇA MAIS SOBRE A PSICOLOGIA NO JUDICIÁRIO Também denominados peritos, cabe às/os psicólogas/os subsidiarem o juiz com avaliações e análises que indiquem ações a serem tomadas em decisões processuais nas Varas de infância e Juventude e Vara de Família. 4 PERSPECTIVA DO USUÁRIO | O RENASCIMENTO DE SÃO LUIZ DO PARAITINGA Saiba como o apoio de psicólogas/os e da comunidade ajudou São Luiz do Paraitinga a renascer em tempo recorde após a forte inundação de 2010. 7 PSICOLOGIA E COTIDIANO | “ACHO QUE SOU GAY” Psicólogas/os indicam caminhos para tratar o tema orientação sexual com pessoas que questionam a sua sexualidade. 10 SUBSEDES | OFICINEIROS DO VII PRÊMIO ARTHUR BISPO DO ROSÁRIO MOSTRAM SUA ARTE Mais de 500 usuários de serviços de saúde mental do estado de são Paulo participaram de oficinas com trocas de vivências e experiências artísticas. 13 MURAL | CONHEÇA O PORTAL DO CRP SP NO YOUTUBE nova Cartilha Polular do CRP sP sobre o tema ‘Medicalização’ está disponível para ser baixada no portal do Conselho. 15 CAPA | NO DIA DA/O PSICÓLOGA/O, UM BALANÇO DAS CONQUISTAS DA PROFISSÃO Profissão sofreu influência das transformações da sociedade e ganhou relevância em temáticas como a universalização dos direitos sociais e direitos humanos. 16 MUNDO DO TRABALHO | #30H JÁ PSICOLOGIA Projeto que reduz jornada para profissionais da Psicologia é aprovado em Comissão da Câmara Federal. Leia as 30 razões por que o CRP SP apoia. 21 MUNDO MELHOR | CONQUISTA DA TERRA PRÓPRIA E PROTAGONISMO assentamento dom Tomás Balduíno, em Franco da Rocha, muda a vida de 63 famílias após mais de 10 anos de luta pela terra própria. 22 ORIENTAÇÃO | AVALIAÇÃO PSICOLÓGICA REQUER TÉCNICA E COMPROMISSO Psicologia organizacional suscita questões técnicas em relação aos processos de avaliação psicológica. 26 QUESTÕES ÉTICAS | HONORÁRIOS a maneira como se estabelece o pagamento de honorários na área clínica pode influenciar no trabalho e até na imagem profissional. 28 PROCESSOS ÉTICOS | PENALIDADES Conselho Regional apresenta reflexão a partir de processo tramitado e publica cassação de registro para o exercício profissional de psicólogo. 30 ESTANTE | TÍTULOS dicas de livros e vídeos sobre temas de interesse da categoria. 31 0 r i e n t a ç ã o a avaliação psicológica é um recurso comum no mundo do trabalho, utilizada em processos de seleção, de orientação profissional e de carreira, e, ainda, na preparação para a aposentado- ria. geralmente, ela motiva as/os profissionais da Psicologia que a empregam a se especializar em te- mas organizacionais. No segmento empresarial, em que o conceito de “vestir a camisa da empresa” mui- tas vezes é entendido como fidelida- de absoluta à corporação, colocando outros valores em segundo plano, é preciso ter clareza quanto ao com- promisso assumido com a profissão e as pessoas envolvidas com os ser- viços da Psicologia para que objeti- vos de carreira não acarretem em desvios de conduta e falhas éticas. entretanto, esse tipo de avaliaçãonão é aplicada exclusivamente em empresas, como lembra o psicólogo e professor Mário Lázaro Camargo, do departamento de Psicologia da Unesp de Bauru (SP). “Esse tipo de demanda também pode vir de situ- ações como avaliação médica para orientar tratamentos e preparação de pacientes em fase pré e pós-ope- ratória (cirurgia bariátrica, de prósta- ta oncológica e redesignação sexual, entre outras), avaliação por questões relativas ao contexto escolar/acadê- mico, na identificação de problemas de aprendizagem ou socialização, e em situações jurídicas como ava- liação psicológica de postulantes à adoção, crianças e adolescentes em Psicologia organizacional suscita questões técnicas e éticas em relação aos processos de avaliação psicológica Avaliação psicológica exige e compromisso com avaliado conhecimento de ferramentas conflitos com a Lei ou instituciona- lizados e, em alguns casos, acusados de responsabilidades por crimes. Uso exclusivo Rodolfo ambiel, professor do Pro- grama de Pós-graduação stricto sen- su em Psicologia da universidade são Francisco, explica que no campo empresarial esses instrumentos são ferramentas técnicas de uso exclusi- vo das/os psicólogas/os, cuja credi- bilidade está baseada em extensas pesquisas científicas que atestam sua validade e precisão. ele adverte que, como ferramentas, cabe à/ao profissional selecionar aquele que se adequa ao objetivo da avaliação. “A/o psicóloga/o deve ser capaz de ler os manuais técnicos dos instru- mentos e extrair dali as informações a respeito de sua qualidade técnica, alcance e limitações”, afirma. o sistema de avaliação dos Tes- 26 psi • Conselho Regional de PsiCologia de são Paulo Erika Caixa de texto PSICOLOGIA ORGANIZACIONAL O que diz o CRP SP o CRP sP, por meio da Comissão de Orientação e Fiscalização (COF), for- mada por conselheiros, gestores e psi- cólogas/os convidadas/os, é um ins- trumento permanente à disposição da categoria para resolver dúvidas e salvaguardar o exercício profissional segundo o compromisso da psicolo- gia e o Código de Ética da profissão. Sobre o assunto, ela define que ape- nas a/o psicóloga/o pode fazer uso de instrumentos e técnicas psicológicas. Isso significa que ela/e não poderá di- vulgar, ensinar, ceder, dar, emprestar ou vender instrumentos ou técnicas psicológicas que permitam ou faci- litem o exercício ilegal da profissão (artigo 18 do Código de Ética). no que se refere à avaliação psicológi- ca, a CoF indica que se deve também verificar se não existem dificuldades específicas da pessoa para realizar o teste, sejam elas físicas ou psíquicas; utilizar o teste dentro dos padrões referidos por seu manual e cuidar da adequação do ambiente, do espaço fí- sico, do vestuário dos aplicadores e de outros estímulos que possam interfe- rir na aplicação. no site do CRP sP é possível consul- tar a Resolução n.º 007/2003 do CFP, que apresenta o Manual de elabo- ração de documentos escritos e de- talha o que deve constar em quatro documentos: declaração, atestado psicológico, relatório ou laudo psi- cológico e parecer psicológico. acesse: http://www.crpsp.org.br/ portal/orientacao/resolucoes_cfp/ fr_cfp_007-03.aspx. tes Psicológicos (satepsi) apresenta uma lista com os testes validados para utilização por profissionais da área, os que receberam parecer desfavorável e, finalmente, aqueles que ainda estão em avaliação. “No Brasil, só se pode utilizar na práti- ca testes psicológicos com parecer favorável, sendo que qualquer ação diferente desta constitui falta éti- ca”, diz Ambiel. “É importante ter clareza de que só o fato de um teste estar favorável no satepsi não sig- nifica que deva ser usado sem res- salvas. Como qualquer ferramenta, qualquer teste tem limitações que, independentemente da avaliação formal, devem ser consideradas pelo profissional de acordo com sua necessidade.” o satepsi está disponível para consulta no site do Conselho Fe- deral de Psicologia – http://satepsi. cfp.org.br – e também na página da internet do Conselho Regional de Psicologia de são Paulo: www.crpsp. org.br, no menu orientação / Tes- tes Psicológicos. Devolutiva Mário Lázaro Camargo ressalta que a/o psicóloga/o que realizará a avaliação deve incluir em seu pla- nejamento a elaboração de um re- latório, ou laudo psicológico, para apresentar os resultados ao sujeito da avaliação. “Lamentavelmente, poucos profissionais realizam esta etapa do processo de avaliação psi- cológica, apresentando resultados ao solicitante – o empregador, mui- tas vezes – mas não ao principal in- teressado, que é o avaliado. Muitos desconhecem ter direito ao resulta- do de sua avaliação e, por isso, mui- tas vezes nem o solicitam”, explica. Mais que um dever ético, a entrega da devolutiva é um fundamento da própria atividade. O que talvez ainda não esteja claro para profissionais que ensaiam os primeiros passos na psicologia organizacional é a quem oferecer esse retorno: à pessoa ava- liada ou ao empregador. Rodolfo Ambiel afirma que não pode haver dúvida quanto a isso. “Nosso Código de Ética é bastante claro quanto ao sigilo em relação às informações confidenciais das pes- soas. Mesmo que o empregador seja o solicitante, a devolutiva deve ser oferecida na íntegra para a pessoa avaliada e as informações que serão passadas para o solicitante são ape- nas as estritamente necessárias para o desenvolvimento do trabalho.” Camargo também é enfático nes- se sentido. “Estamos diante de um contexto lamentavelmente bastan- te viciado por práticas inadequa- das, tanto das empresas quanto de profissionais que se permitiram – e ainda se permitem – empregar mal a técnica.” ele destaca que mesmo o solicitante da avaliação psicológica sendo uma empresa, a pessoa avalia- da tem o direito de livre acesso aos re- sultados de sua avaliação psicológica, assim como também tem o direito de se negar a participar da avaliação. “Dizer não à participação é como uma desistência no processo. O direi- to a não participação não é respeita- do nem por instituições públicas em seus processos seletivos/concursos. Mas não deveria ser assim.” Guarda de material a responsabilidade de guardar o material produzido na avalia- ção psicológica também suscita malentendidos. Mário Camargo explica que a/o profissional da psicologia que faz a avaliação é responsável pela guarda do mate- rial resultante do processo ou pro- cessos de avaliação. “Estando em seu espaço privado de trabalho (uma clínica ou consultório, por exemplo) ou no contexto de uma organização de trabalho onde é empregado (empresa, por exem- plo), deve, para exercer sua pro- fissão e atribuições funcionais, solicitar e construir um espaço adequado e reservado tanto para o desenvolvimento de suas ativi- dades de avaliação e devolutiva quanto para a guarda protegida e sigilosa dos materiais utilizados. Vale lembrar que estas orienta- ções são (ou deveriam ser) parte integrante do processo formativo das/os psicólogas/os e presença textual esclarecedora em nosso Código de Ética Profissional.” o tempo de preservação do ma- terial na avaliação também deve ser observado pela/o psicóloga/o que a aplica. “Todo o material deve ser guardado por, no míni- mo, cinco anos. a Resolução CFP 07/2003 traz detalhes sobre esse processo”, diz Ambiel. psi • Junho/ Julho / agosTo 2014 27