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1 DIREITO EMPRESARIAL II PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS TÍTULOS DE CRÉDITO INTRODUÇÃO O direito cambiário é o que tem por objeto o estudo dos títulos de crédito. Estes títulos são documentos representativos da obrigação de pagar uma determinada quantia em dinheiro, dotados de dois atributos, a executividade e a negociabilidade. Desde já cumpre ressaltar que os títulos de crédito propriamente ditos não se prestam para representar uma obrigação de fazer, não fazer ou outro tipo de obrigação de dar. Quanto aos títulos de crédito impróprios, alguns deles representam direitos diversos do recebimento de dinheiro. Exemplo: Warrant e conhecimento de depósito, representam a posse e propriedade de mercadorias depositadas em armazéns gerais. No tocante aos seus atributos, o primeiro, que é a executividade, é consagrado no art. 784, I, do CPC/2015, que o considera título executivo extrajudicial, agilizando-‐se, destarte, a cobrança do débito, mediante a supressão da fase de conhecimento do processo judicial. Quem está munido de um título de crédito pode, entretanto, optar em mover ação de cobrança. Com efeito, dispõe o art. 785 do CPC/2015: “A existência de título executivo extrajudicial não impede a parte de optar pelo processo de conhecimento, a fim de obter título executivo judicial”. No CPC anterior, o processo seria extinto sem resolução do mérito, por falta de interesse de agir. O segundo atributo, a negociabilidade, lhe é muito mais peculiar, posto que o primeiro é ostentado por outros diversos documentos. A negociabilidade é a possibilidade de se transmitir o seu domínio com facilidade, assemelhando-‐se, nesse aspecto, ao dinheiro, permitindo-‐se a concretização do elemento temporal do crédito, consistente na troca de um bem presente por um bem futuro, porquanto o sistema legal dos títulos de crédito é dotado do elemento confiança, consubstanciado no fato de o direito encontrar-‐se aparelhado para a efetivação do recebimento do valor do título. Outros documentos representativos de créditos como é o caso da sentença judicial, dos contratos e da confissão de dívida não gozam dessa simplificação de negociabilidade. Aliás, o contrato e a confissão de dívida não são sequer títulos executivos extrajudiciais, salvo se subscritos por duas testemunhas. LEGISLAÇÃO APLICÁVEL Os títulos de crédito são disciplinados pelo Código Civil (arts. 887 a 926). Essas normas, no entanto, são aplicáveis apenas supletivamente para suprir as raras lacunas da legislação especial. Com efeito, dispõe o art. 903 do CC: “Salvo disposição diversa em lei especial, regem-‐se os títulos de crédito pelo disposto neste Código”. Na verdade, letra de câmbio e a nota promissória são regidas pela Lei Uniforme de Genebra e Decreto 2.044/1908. O cheque é disciplinado pela Lei nº 7.357/1985 e a duplicata pela Lei n° 5.474/68. Quanto ao Código Civil, só é aplicado subsidiariamente, incidindo apenas nas lacunas do diploma normativo específico. Se, porém, no futuro, uma lei limitar-‐se a criar um novo título de crédito, mas sem discipliná-‐lo, o Código Civil será sua fonte normativa reguladora. CONCEITO Tornou-‐se clássico o conceito de Cesare Vivante, segundo o qual “título de crédito é o documento necessário ao exercício do direito literal e autônomo nele mencionado”. O Código Civil Brasileiro de 2002 adotou conceito similar, mas não abraçou na íntegra a Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP). Aluno Willian Erivan da Silva CPF - ###.###.###-## 2 DIREITO EMPRESARIAL II PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS definição proposta por Vivante. Com efeito, dispõe o art. 887 do Código Civil: “O título de crédito, documento necessário ao exercício do direito literal e autônomo nele contido, somente produz efeito quando preencha os requisitos da lei”. Abstraindo-‐se essa última expressão “somente produz efeitos quando preencha os requisitos legais” é o conceito de Vivante consagrado pelo direito pátrio. PRINCÍPIOS CAMBIÁRIOS Estes princípios são os postulados básicos que regem os títulos de crédito. Do conceito de Vivante, irradiam os seguintes princípios: → cartularidade; → literalidade; → autonomia. Alguns juristas ainda apontam os princípios da abstração e inoponibilidade das exceções pessoais a terceiros de boa-‐fé, mas, na verdade, são meros desdobramentos do princípio da autonomia. PRINCÍPIO DA CARTULARIDADE O título de crédito, segundo o conceito acima, é um documento necessário ao exercício do direito nele mencionado, logo é preciso apresentá-‐lo à pessoa indicada para efetuar o pagamento. Assim, o princípio da cartularidade é o que exige a exibição original do título de crédito para exercer o direito dele resultante. Na cobrança judicial, por exemplo, o original do título deve ser juntado com a petição inicial. Igualmente para fundamentar requerimento de falência com base na impontualidade. A posse do título é o pressuposto para alguém exercer o direito nele contido. Não basta, porém, a apresentação da fotocópia, ainda que autenticada, é preciso a exibição do título de crédito original, pois só assim se tem a garantia de que não houve a sua circulação. Vale ainda ressaltar que o título de crédito é documento, isto é, um papel escrito, dotado de conteúdo e identificaçãodo signatário com valor probatório. O escrito, para ser título de crédito, deve ser lançado em papel, não se admitindo gravações, filmagens e tampouco pen drive ou similar. Não existe também título de crédito oral. Sobre as exceções ao princípio da cartularidade, cumpre mencionar três. A primeira é o protesto por indicações da duplicata ou letra de câmbio, a segunda é a possibilidade de se mover ação de execução com base em fotocópia, comprovando-‐se que o original encontra-‐se apreendido em inquérito policial ou processo-‐crime, aguardando a realização da perícia. A terceira é o aceite por comunicação, isto é, lançado fora do título, que é possível na duplicata, em que a cobrança é feita por Instituição Financeira, sendo que referida comunicação que o sacado faz a Instituição Financeira é um documento passível de protesto e que ainda funciona como título executivo extrajudicial (§§1º e 2º do art.7º da Lei nº 5.474/68). PRINCÍPIO DA LITERALIDADE O direito, que por meio do título de crédito se pretende exercer, deve estar literalmente nele mencionado. Aliás, qualquer relação jurídica relacionada com o título de crédito só é levada em consideração quando nele constar expressamente. Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP). Aluno Willian Erivan da Silva CPF - ###.###.###-## 3 DIREITO EMPRESARIAL II PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS O princípio da literalidade significa que os direitos e obrigações só são regidos pelo direito cambiário quando constar expressamente no título de crédito. O aval, por exemplo, quando lançado fora do título de crédito, ainda que por escritura pública, não tem a natureza jurídica de aval, embora possa valer como fiança. A quitação lançada em documento separado, isto é, fora do título, não produz efeitos. Igualmente, o endosso em separado não surte efeito algum. Pelo princípio da literalidade só é levado em consideração o que está escrito no título de crédito, e, por consequência, as obrigações inseridas em separado a ele não se integram. Exceção a esse princípio verifica-‐se na duplicata, pois o §1º do art.9º da Lei nº 5.474/1968 admite a quitação, pelo legítimo possuidor do título, em documento separado. Outra exceção é o aceite por comunicação que o sacado da duplicata faz, em documento separado, que é entregue à Instituição Financeira (art.7º, §1º da LD). PRINCÍPIO DA AUTONOMIA O princípio da autonomia consagra a independência das relações jurídicas constantes no título de crédito. Se, por exemplo, o emitente da letra de câmbio for incapaz, ainda assim o credor poderá exigir o pagamento do devedor, isto é, do aceitante, sendo que este último, em razão do princípio da autonomia, não poderá alegar a nulidade do título pelo fato de ter sido emitido por incapaz. Assim, a nulidade de uma obrigação lançada no título não contamina as outras obrigações nele contidas, porque elas são autônomas, propiciando-‐se, destarte, que o possuidor de boa-‐fé execute um direito próprio, que, conforme salienta Fran Martins, não pode ser restringido ou destruído em virtude das relações entre os anteriores possuidores e o devedor, pois cada obrigação que deriva do título é autônoma em relação às demais. As implicações do princípio da autonomia, como bem esclarece Fábio Ulhoa Coelho, “representam a garantia efetiva de circulabilidade do título de crédito. O terceiro descontador não precisa investigar as condições em que o crédito transacionado teve origem, pois ainda que haja irregularidade, invalidade ou ineficácia na relação fundamental, ele não terá o seu direito maculado” (Curso de Direito Comercial, v. 1, p. 378, editora Saraiva). Do princípio da autonomia são extraídos outros dois subprincípios, o da abstração e o da inoponibilidade das exceções pessoais ao terceiro de boa-‐fé. O primeiro revela o desdobramento do princípio da autonomia no direito material; o segundo é a sua aplicação no campo processual. PRINCÍPIO DA ABSTRAÇÃO O princípio da abstração consagra a irrelevância da causa que deu origem ao título em relação ao terceiro de boa-‐fé para o qual este fora transferido. Se, por exemplo, um cheque obtido mediante extorsão é transferido pelo extorsionário a um terceiro de boa-‐fé, este poderá descontá-‐ lo validamente. Outro exemplo: se o vendedor de carro roubado transfere a terceiro de boa-‐fé o título de crédito que recebera em pagamento, este poderá cobrar o título do comprador que desconhecia a origem criminosa do bem adquirido. O princípio da abstração, porém, só é aplicado em relação ao terceiro, que de boa-‐fé adquiriu o título de crédito de um dos contratantes. Não é aplicado entre os contratantes, pois eles se obrigam pelo contrato, e, por consequência, o vício que o contamina é uma defesa pessoal alegável para inibir o pagamento do título de crédito. Nos exemplos acima, o contratante que fora vítima de extorsão e o que emitiu o título de crédito para comprar o carro roubado podem se recusar, perante o outro contratante, a efetuar o pagamento do título de crédito, invocando, para tanto, a Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP). Aluno Willian Erivan da Silva CPF - ###.###.###-## 4 DIREITO EMPRESARIAL IIPROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS nulidade da obrigação fundamental que originou a sua emissão. Força convir, portanto, que o princípio da abstração só entra em cena quando o título de crédito é posto em circulação, aplicando-‐se, tão somente, entre as pessoas que não contrataram entre si. Ao ser posto em circulação o título de crédito se desvincula da relação jurídica fundamental que lhe deu origem. PRINCÍPIO DA INOPONIBILIDADE DAS EXCEÇÕES PESSOAIS AOS TERCEIROS DE BOA-‐FÉ Dispõe o art. 17 da Lei Uniforme de Genebra: “As pessoas acionadas em virtude de uma letra não podem opor ao portador exceções fundadas sobre as relações pessoais delas com o sacador ou com os portadores anteriores, a menos que o portador ao adquirir a letra tenha procedido conscientemente em detrimento do devedor”. Assim, o princípio da inoponibilidade consiste na proibição de o devedor, no plano processual, alegar, em face do portador do título de crédito, as defesas pessoais que poderia sustentar contra os coobrigados anteriores. Vê-‐se assim que o terceiro de boa-‐fé, quando adquire o título de crédito, o recebe purificado, não tendo, pois, que se preocupar com os fatos modificativos ou extintivos atinentes aos direitos de seus antecessores. Se, por exemplo, a relação fundamental, isto é, que originou a emissão de um título de crédito envolvendo “A” e “B”, diz respeito à venda de um automóvel, e este apresenta algum vício redibitório, referido fato não poderá ser alegado pelo devedor ao terceiro que, de boa-‐ fé, houver adquirido o título. Em três hipóteses, no entanto, o devedor poderá alegar as exceções visando inibir o pagamento do título. A primeira refere-‐se às exceções comuns, que são defesas pertinentes à inexistência, invalidade ou inexigibilidade do título de crédito. Exemplos: falsificação, nulidade por falta de requisito essencial e prescrição do título. A segunda refere-‐se às exceções pessoais envolvendo diretamente o devedor e o portador do título. Se, por exemplo, o terceiro de boa-‐fé for cobrar o título do devedor, este poderá arguir a compensação da importância que este terceiro também lhe deve. A última verifica-‐se quando o terceiro adquire o título de crédito de má-‐fé, vale dizer, consciente do fato que poderia ser alegado em face do credor anterior. Não se exige, para a caracterização da má-‐fé, o conluio entre o terceiro adquirente e a pessoa que lhe transferiu a cártula, pois é suficiente para a torpeza a aquisição do título com conhecimento das defesas pessoais que o devedor poderia opor contra o credor anterior. Se, no exemplo citado anteriormente, o terceiro adquirisse o título de crédito ciente do vício redibitório que maculava o automóvel, ao devedor, que havia adquirido o carro com defeito, será facultado defender-‐se mediante arguição da ocorrência de vício redibitório, opondo-‐se, destarte, ao pagamento. Outro exemplo: “A” é o devedor de um título de crédito em face de “B”, mas como este também é seu devedor não pretende efetivar o pagamento direto e sim compensar as dívidas. Diante disso, “B” resolve transferir a cártula a “C”, que apresenta a “A” para cobrança. Indaga-‐se: “A” poderá se opor ao pagamento, alegando a tal compensação? Depende. Se “C” estava de boa-‐fé, entra em cena o princípio da inoponibilidade das exceções pessoais como fator impeditivo da dita defesa. Se, ao revés, “C” procedeu de má-‐fé, tinha consciência da dívida de “B” em relação à “A”, este último poderá arguir como defesa a compensação esquivando-‐se, assim, de efetuar o pagamento direto do título. Convém ainda esclarecer que a má-‐fé, conforme se depreende da análise do art. 17 da Lei Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP). Aluno Willian Erivan da Silva CPF - ###.###.###-## 5 DIREITO EMPRESARIAL II PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS Uniforme, é analisada no tempo da aquisição do título pelo terceiro. Se este, após adquiri-‐lo de boa-‐fé, vem a tomar conhecimento das relações pessoais arguíveis perante o seu antecessor, esse fato posterior não impede a aplicação do princípio da inoponibilidade. Sobre o princípio em estudo, dispõe o art.915 do CC: “O devedor além das exceções fundadas nas relações pessoais que tiver com o portador, só poderá opor a este as exceções relativas à forma do título e ao seu conteúdo literal, à falsidade da própria assinatura, a defeito de capacidade ou de representação no momento da subscrição, e à falta de requisito necessário ao exercício da ação”. O art.916 do CC ainda acrescenta que: “As exceções, fundadas em relação do devedor com os portadores precedentes, somente poderão ser por ele opostas ao portador, se este, ao adquirir o título, tiver agido de má-‐fé”. TÍTULOS DE CRÉDITO ELETRÔNICOS Referidos títulos de crédito são os emitidos através do computador ou meio técnico equivalente. Substitui-‐se o papel pelo meio magnético. É admitido pelo §3º do art.889 do CC, desde que conste da escrituração do emitente e observe os demais quesitos legais. Atualmente, apenas a duplicata pode ser emitida de forma virtual, pois o seu aceite é presumido e a sua escrituração é obrigatória no livro de registro de duplicata.Ademais, na duplicata, o protesto pode ser por indicações, isto é, o vendedor envia ao Tabelionato de Protesto um boleto contendo os dados do título. Assim, o saque da duplicata pode ser via e-‐mail e o pagamento por transferência bancária eletrônica. Se não houver pagamento, o protesto pode ser providenciado via e-‐mail, enviando-‐se ao Cartório os dados da duplicata, pois o aceite é presumido. Vê-‐se assim que é dispensável a cártula (o papel). CLASSIFICAÇÃO DOS TÍTULOS DE CRÉDITO INTRODUÇÃO Os títulos de crédito podem ser: Ø de modelo livre e vinculado; Ø ordem ou promessa de pagamento; Ø causais, abstratos e limitados; Ø portador e nominativos; Ø próprios e impróprios; Ø típicos e atípicos. TÍTULOS DE CRÉDITO DE MODELO LIVRE E VINCULADO O título de crédito de modelo livre é o que pode adotar qualquer formato e ter os requisitos legais lançados sob qualquer tipo de papel. Ingressam nessa categoria, a letra de câmbio e a nota promissória. O título de crédito de modelo vinculado é o que deve observar o formato normativo, lançando-‐se os requisitos legais somente no tipo de papel aceito pelo legislador. É o caso do cheque e da duplicata. Com efeito, no cheque, por exemplo, a assinatura do emitente deve constar Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP). Aluno Willian Erivan da Silva CPF - ###.###.###-## 6 DIREITO EMPRESARIAL II PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS necessariamente no canto inferior direito e o papel admitido é aquele fornecido pelo banco sacado no formato retangular. A duplicata deve ser confeccionada segundo os padrões do Conselho Monetário Nacional (art. 27 da LD – Lei nº 5.474, de 18.07.1968). Atente-‐se, porém, que todos os títulos de crédito, sejam eles de modelo livre ou vinculado, devem preencher os requisitos fixados na lei, de modo que essa classificação quanto ao modelo, refere-‐se apenas ao aspecto estético da cártula. ORDEM E PROMESSA DE PAGAMENTO Quanto à estrutura, os títulos de crédito podem envolver uma ordem ou uma promessa de pagamento. Na ordem de pagamento, estruturam-‐se três partes, a saber: a parte que dá a ordem, a parte que deve cumprir a ordem e a parte que é a beneficiária da ordem. Nada obsta que uma única pessoa assuma simultaneamente o papel de duas partes. No cheque, por exemplo, que é uma ordem de pagamento, o beneficiário pode ser o próprio emitente. Na promessa de pagamento, estruturam-‐se apenas duas partes: a parte que promete efetuar o pagamento e a parte que é a beneficiária dessa promessa. A nota promissória é uma promessa de pagamento, ao passo que o cheque, a letra de câmbio e a duplicata encerram uma ordem de pagamento. TÍTULOS DE CRÉDITO CAUSAIS, ABSTRATOS E LIMITADOS Referentemente à hipótese de emissão, os títulos de crédito classificam-‐se em causais, abstratos e limitados. Os títulos causais só podem ser emitidos a partir da ocorrência de determinado fato previsto na lei, estando, pois, vinculado à sua origem. É o caso da duplicata, cuja emissão só é possível quando houver uma compra e venda mercantil ou prestação de serviço. Aludido título de crédito não pode ser utilizado para outros fins. Outro título de crédito causal é o warrant, cuja emissão só é possível para representar o contrato de depósito de mercadorias em armazéns gerais. Já os títulos de crédito abstratos ou não-‐causais podem ser emitidos a partir da prática de qualquer ato lícito. É o caso do cheque e da nota promissória. Os títulos de crédito limitados, por sua vez, são aqueles cuja emissão é vedada em algumas situações legais. É o caso da letra de câmbio, que não pode ser sacada para representar uma compra e venda mercantil ou uma prestação de serviços de empresas individuais ou coletivas, fundações ou em sociedades civis, que se dediquem à prestação de serviços. (art. 2º e §3º do art.20 da LD). Convém não confundir títulos de crédito abstratos, que se referem à liberdade de emissão, diante de qualquer fato lícito, com o princípio da abstração, aplicável a todos os títulos de crédito, inclusive aos abstratos, que se traduz na desvinculação, após a circulação, da relação jurídica fundamental que lhe deu origem. TÍTULOS DE CRÉDITO AO PORTADOR E NOMINATIVOS Quanto à circulação, isto é, à forma de serem transferidos, os títulos de crédito podem ser ao portador e nominativos. Os títulos de crédito ao portador são aqueles que não identificam o nome do credor, e, por isso, circulam-‐se com a tradição, isto é, com a mera entrega da cártula. Quem a detém presume-‐se Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP). Aluno Willian Erivan da Silva CPF - ###.###.###-## 7 DIREITO EMPRESARIAL II PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS ser o seu legítimo proprietário. Os títulos de crédito nominativos, por sua vez, são os que identificam expressamente na cártula o nome do credor, e, sendo assim, exigem uma transferência solene, por escrito, não bastando a mera tradição. Os títulos de crédito nominativos subdividem-‐se em: a) nominativos à ordem: são os que se transferem por endosso; b) nominativos não à ordem: são os que se transferem por cessão civil de crédito. A notapromissória, a letra de câmbio e a duplicata são títulos de crédito nominativos, porquanto não podem ser sacados ao portador. O cheque, até um determinado valor (R$100,00), admite o saque ao portador, mas acima desse valor deve ser nominativo. O Código Civil de 2002, no entanto, fornece outro conceito de título nominativo. Com efeito, dispõe o art. 921 do Código Civil que “é título nominativo o emitido em favor de pessoa cujo nome conste no registro do emitente”. E, no art. 922, salienta que “transfere-‐se o título nominativo mediante termo, em registro do emitente, assinado pelo proprietário e pelo adquirente”. Este conceito não se aplica aos títulos de crédito, pois estes se transferem independentemente de qualquer registro, aplicando-‐se, tão somente, às ações nominativas das sociedades anônimas. LETRA DE CÂMBIO CONCEITO A letra de câmbio é uma ordem de pagamento, à vista ou a prazo, que o sacador dirige ao sacado para que este pague o beneficiário. Há, em regra, uma relação entre 3 (três) pessoas: a) sacador: é o que emite a Letra de Câmbio; b) sacado: é o destinatário da ordem, sendo, pois, na hipótese de aceitá-‐la, o responsável pelo pagamento; c) beneficiário ou tomador: é o credor, isto é, a pessoa a quem o pagamento deve ser efetuado. Tomemos o seguinte exemplo: “A” saca uma letra de câmbio em favor de “B” no valor de R$ 500,00 (quinhentos reais), nela ordenando que o pagamento seja efetuado por “C”. Este último, ao aceitar a ordem, passa a ser o devedor principal do título. É possível que, ao invés de três, hajam apenas duas pessoas, porquanto a Lei Uniforme permite que a letra de câmbio seja emitida em favor do próprio sacador, assumindo ele simultaneamente a posição de sacador e tomador (credor), outrossim, permite que o sacador seja o sacado, sendo que, nesse caso, a ordem de pagamento é dirigida a ele mesmo para pagar o terceiro beneficiado. Conquanto não usual no direito brasileiro, sobretudo porque a duplicata tomou-‐lhe o lugar de preferência dos empresários, a ponto de a legislação até proibir a emissão da letra de câmbio para representar a compra e venda mercantil e prestação de serviços, o certo é que o seu estudo ainda revela-‐se útil didaticamente à medida em que franqueia um estudo mais amplo acerca dos principais institutos do direito cambial. Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP). Aluno Willian Erivan da Silva CPF - ###.###.###-## 8 DIREITO EMPRESARIAL II PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS REQUISITOS É sabido que, dentre os requisitos dos atos jurídicos em geral, destacam-‐se os seguintes: a) agente capaz; b) objeto lícito; c) consentimento. A afronta a esses requisitos, no entanto, não tem o condão de anular a letra de câmbio, tendo em vista que sobre os títulos de crédito incide o princípio da autonomia das obrigações cambiais. Com efeito, de acordo com o princípio da autonomia não se pode anular a letra de câmbio pelo fato de ter sido emitida por incapaz ou conter vício de consentimento ou ainda adulteração ou falsificação de alguma assinatura. De fato dispõe o art. 7º da Lei Uniforme: “Se a letra contém assinaturas de pessoas incapazes de se obrigarem por letras, assinaturas falsas, assinatura de pessoas fictícias, ou assinaturas que por qualquer outra razão não poderiam obrigar as pessoas que assinaram a letra, ou em nome das quais ela foi assinada, as obrigações dos outros signatários nem por isso deixam de ser válidas”. Igualmente, quando o objeto for ilícito, como a dívida de jogo, a letra de câmbio não é contaminada, porque sendo ela um título abstrato não há que se perquirir, após ser posta em circulação, da causa que lhe deu origem, limitando-‐se a nulidade à relação jurídica envolvendo as partes originárias, mas sem estender esse vício aos terceiros de boa-‐fé, relativizando-‐se, assim, a importância do objeto lícito para a validade das obrigações cambiais. Do exposto se conclui que os requisitos aplicáveis aos atos jurídicos em geral não se amoldam na integridade aos títulos de crédito, pois estes possuem requisitos específicos. Referentemente à letra de câmbio, os requisitos desdobram-‐se em essenciais e facultativos. REQUISITOS ESSENCIAIS Os requisitos essenciais são aqueles necessários à constituição válida da letra, de modo que a sua falta a desconfigura como título de crédito, inviabilizando o ajuizamento da ação cambial, do endosso, do aval e de outros atos exclusivos do direito cambiário. Esses requisitos essenciais da letra de câmbio são os seguintes: a) a denominação da expressão “letra de câmbio” no texto do título, no idioma utilizado para a sua redação. Não basta que conste “letra de câmbio” como sendo o título do documento, pois a lei exige que esta expressão conste no próprio texto da cambial (exemplo: no dia 10 de janeiro de 2010, Vossa Senhoria pagará o valor contido nesta letra de câmbio etc”). Fran Martins não aceita a abreviatura “letra”, mas, em Portugal, o título é denominado também “letra”, e, por consequência, já que a língua portuguesa é a mesma, nada obsta essa forma abreviada. b) a quantia determinada que deve ser paga em dinheiro. Se houver divergênciaentre o valor numérico e o escrito por extenso, este último é o que prevalece. No Brasil, a letra de câmbio deve ser paga em real, que é a moeda de curso forçado, sendo nulo, em regra, pagamento estipulado em ouro ou outra moeda estrangeira, salvo quando o sacada por devedor ou credor que resida fora do Brasil ou quando o saque da letra decorrer de obrigação assumida no exterior. Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP). Aluno Willian Erivan da Silva CPF - ###.###.###-## 9 DIREITO EMPRESARIAL II PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS Quanto à cláusula de juros, o sacador só poderá estipular nas letras de câmbio à vista ou a certo termo de vista, fluindo da data do título, se outra data não for indicada (art. 5º da Lei Uniforme). Logo, para essa letra de câmbio não se aplica o art.890 do CC, que reputa não escritas no título a cláusula de juros. Nas letras de câmbio em dia certo ou a certo termo da data, a estipulação de juros será considerada não escrita. A taxa de juros, diante da reserva prevista no art. 13 do anexo II, não é a prevista na Lei Uniforme e sim a devida em caso de mora no pagamento de tributos devidos à Fazenda Pública. Quanto à correção monetária, por ser mera atualização do débito, incide a partir do vencimento, nos termos da Lei nº 6.899/81. Por outro lado, a cláusula à ordem encontra-‐se implícita na letra de câmbio, pois esta diz respeito ao pagamento de quantia determinada, prescindindo-‐se de menção expressa. Não obstante implícita essa cláusula à ordem, o art. 11 da Lei Uniforme admite a inserção expressa da cláusula “não à ordem”, inclusive no momento do saque, lançando mão desse artifício o sacador impede que a letra de câmbio se transmita pelo endosso. A expressão “quantia determinada” confere à letra de câmbio o caráter de ordem de pagamento incondicional, isto é, pura e simples, caso nela conste alguma condição como, por exemplo, o pagamento mediante a contraprestação da entrega da mercadoria, o título não será uma letra de câmbio, mas outro documento qualquer. Quanto à fixação do valor em índice indexador, ao tempo das extintas ORTNs, decidem-‐se que o valor do débito expresso em ORTN é determinado, pois basta uma mera conversão (RT 579/113), mas há posicionamento no sentido contrário, descaracterizando o documento como título de crédito (RT 604/188), porquanto a Lei nº 6.899/81, que é de ordem pública, só permite a correção monetária após o vencimento. c) nome do sacado, que é a pessoa que deve pagar, contra o qual a ordem é dirigida. De acordo com a Lei nº 6.268/75, ele deve ser identificado pelo número do CPF, RG, Título de Eleitor e Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS); d) nome do tomador, que é o credor, a pessoa a quem deve ser efetuado o pagamento. Vê-‐se assim que, no momento do saque, a letra de câmbio não pode ser ao portador. Conquanto o saque seja sempre nominativo, o endosso, isto é, a transferência do título, pode ser em branco, vale dizer, sem que haja necessidade de se identificar o endossatário. Se o saque for ao portador, o título não será uma letra de câmbio. Após o saque nominativo pode ocorrer o endosso em branco transmudando-‐se o título em ao portador. e) assinatura do sacador, a pessoa que dá a ordem. A assinatura por rubrica mecânica só é possível no cheque e na duplicata, sendo vedada para a letra de câmbio e nota promissória. Referentemente ao analfabeto e a pessoa que não pode assinar, para sacar uma letra de câmbio terá que constituir procurador por instrumento público, conferindo-‐lhe poderes especiais, não se admitindo a assinatura a rogo e nem por meio de impressão digital. Justificam-‐se essas cautelas porque o sacador, quando o sacado não aceita a letra, torna-‐se o devedor principal do título. f) data do saque. A letra quando é sacada é denominada de letra passada. Trata-‐se de uma terminologia às vezes usada pela Lei Uniforme. É pela data do saque que é possível aferir se o sacador era menor ou falido. REQUISITOS FACULTATIVOS Os requisitos facultativos ou supríveis são aqueles cuja ausência não desconfigura a letra de câmbio como título de crédito, pois a própria Lei Uniforme se encarrega de supri-‐los. Aludidos requisitos são os seguintes: Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP). Aluno Willian Erivan da Silva CPF - ###.###.###-## 10 DIREITO EMPRESARIAL II PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS a) lugar do saque. Se não constar o lugar do saque, a Lei Uniforme considera a letra de câmbio sacada no lugar mencionado ao lado do nome do sacador, mas se este lugar também não constar na cártula, o documento não será uma letra de câmbio, logo, pelo menos um desses dois lugares deve constar na letra de câmbio; b) lugar do pagamento. Se não constar o lugar do pagamento, a Lei Uniforme preceitua que o lugar do pagamento é aquele que consta ao lado do nome do sacado e, caso nada conste, o documento não será uma letra de câmbio, e, por isso, um desses dois lugares devem figurar na cártula. Ainda no tocante ao lugar do pagamentoquando for um lugar diverso do domicílio do sacado, o título denomina-‐se letra domiciliada. c) época do pagamento. Em faltando o tempo do pagamento, a Lei Uniforme reputa a letra de câmbio à vista, pagável tão logo seja apresentada ao devedor. Alguns autores classificam apenas a época do pagamento como requisito facultativo, porque o lugar do saque ou do pagamento ou o lugar mencionado ao lado do nome do sacador ou do sacado, respectivamente, devem constar no título, um ou outro, sob pena de o mesmo se desconstituir como título de crédito. MOMENTO DO PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS Sobre o assunto, dispõe a súmula 387 do STF: “A cambial emitida ou aceita com omissão ou em branco, pode ser completada pelo credor de boa-‐fé, antes da cobrança ou do protesto”. O art.891 do CC também reza que: “O título de crédito, incompleto ao tempo da emissão, deve ser preenchido de conformidade com os ajustes realizados”. Vê-‐se assim que é inadmissível a cobrança, a execução ou o protesto de título de crédito que não esteja devidamente preenchido. ACEITE CONCEITO O aceite é o ato cambial pelo qual o sacado de uma ordem de pagamento à prazo concorda em se obrigar a efetuar o pagamento, no vencimento do título que lhe é apresentado. O sacado, antes do aceite, não é ainda devedor da letra. Aliás, na letra de câmbio o aceite é facultativo. Mas, ao aceitá-‐la, o sacado passa a se chamar aceitante, tornando-‐se o devedor principal do título. Assim, a letra de câmbio à prazo é apresentada ao sacado duas vezes. A primeira é para o aceite, a segunda, para o pagamento. FORMA DO ACEITE É denominado “vista” ou “vista para aceite” ou apresentação o ato pelo qual o portador da letra a apresenta ao sacado para que este dê sua anuência ao pagamento. O aceite é escrito na própria letra. Exprime-‐se pela palavra “aceite” ou qualquer outra palavra equivalente como, por exemplo, a expressão “de acordo”. Vale também como aceite a simples assinatura do sacado aposta no anverso da letra. Em resumo, o aceite, no anverso, pode se expressar com a mera assinatura do sacado, mas, no verso, além dessa assinatura é preciso a inserção escrita da palavra “aceite ou outra equivalente”. Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP). Aluno Willian Erivan da Silva CPF - ###.###.###-## 11 DIREITO EMPRESARIAL II PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS EFEITOS DO ACEITE O aceite produz dois efeitos: O primeiro é meramente formal, pois consiste no fato de sacado passar a se chamar aceitante. O segundo é que o aceitante torna-‐se o devedor principal do título. Sendo assim, com o vencimento do título, o aceitante é o que deve ser cobrado em primeiro lugar. Quanto aos outros coobrigados, ostentam responsabilidade subsidiária ou indireta, de modo que cobrança só pode recair sobre eles quando houver a inadimplência do aceitante. PRAZO DE APRESENTAÇÃO PARA ACEITE Quanto ao prazo de apresentação para aceite, cumpre distinguir as seguintes modalidades de letra de câmbio: a) letra de câmbio à vista: é a que se vence com a sua apresentação ao sacado, e, por isso, nessa letra, não há aceite, porque ela é apresentada ao sacado para pagamento. A propósito o aceite é o ato típico de ordem de pagamento à prazo. Quanto a letra à vista, é pagável à apresentação. Deve ser apresentada para pagamento dentro do prazo de um ano, a contar do saque, mas o sacador pode reduzir este prazo ou estipular um outro mais longo. Estes prazos podem ainda ser encurtados pelo endossante, beneficiando-‐se, nesse caso, somente ele. Depois de expirado esses prazos o portador perde o direito de ação contra o sacador, endossantes e avalistas, mas, mantém-‐se intacto o seu direito contra o aceitante. b) letra de câmbio a certo termo da vista: é a que se vence num determinado período cujo termo inicial é a data do aceite ou do protesto. Deve ser apresentada ao aceite dentro do prazo de um ano a contar do saque, sob pena de o portador perder o direito de regresso contra o sacador, endossantes e avalistas, exceto contra o aceitante (art. 53 da Lei Uniforme). O sacador pode reduzir este prazo ou estipular outro maior; esses prazos podem ser reduzidos pelo endossante (art.22 da Lei Uniforme), mas só aproveita ao respectivo endossante (art. 53, último parágrafo, da Lei Uniforme). c) letra de câmbio a certo termo de data: é aquela cujo prazo de vencimento opera-‐se num determinado período que é contado a partir da data do saque. Deve ser apresentada para aceite até o vencimento, mas o portador só perderá o direito de regresso contra o sacador, endossantes e avalistas depois de expirados o prazo para se fazer o protesto, mantendo-‐se, no entanto, o direito de cobrar o aceitante (art. 53 da Lei Uniforme). d) letra de câmbio em data certa: é a pagável num dia fixado. Deve ser apresentada, até o vencimento, ao aceite do sacado (art. 21 da Lei Uniforme), mas o portador, tal qual na situação acima, só perderá o direito de regresso contra o sacador, endossantes e avalistas depois de expirado o prazo fixado para se fazer o protesto, mantendo-‐se, contudo, odireito de cobrar o aceitante (art. 53 da Lei Uniforme). RECUSA AO ACEITE A recusa de aceite gera o vencimento antecipado do título, autorizando-‐se, desde logo, cobrá-‐ lo dos demais coobrigados (sacador, endossantes e avalistas), liberando-‐se o sacado. A recusa de aceite deve ser comprovada por um ato formal (protesto por falta de aceite), sob Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP). Aluno Willian Erivan da Silva CPF - ###.###.###-## 12 DIREITO EMPRESARIAL II PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS pena de o portador também perder os seus direitos de ação contra os endossantes, contra o sacador e contra os outros coobrigados (art. 53 da Lei Uniforme). ACEITE LIMITADO OU PARCIAL Aceite limitativo ou parcial é aquele em que o sacado reduz, na letra, a quantia que concorda em pagar. Numa letra de câmbio de cinco mil reais, por exemplo, ele aceita apenas três mil reais. Nesse caso, o aceitante responsabiliza-‐se pelo pagamento, no vencimento normal, até o limite do valor aceito. ACEITE MODIFICATIVO No aceite modificativo, o sacado altera as condições do pagamento. Exemplo: numa letra de câmbio em data certa, o sacado aceita pagá-‐la em determinado dia, diverso do fixado. Conquanto o aceitante se vincule ao pagamento total, nos termos do seu aceite, o certo é que semelhante comportamento equivale à recusa do aceite em relação às cláusulas originais do título, provocando, por isso, o vencimento antecipado de todo o débito quanto aos demais coobrigados (sacador, endossantes e avalistas). A propósito, dispõe o art. 26 da Lei Uniforme: “O aceite é ato puro e simples, mas o sacado pode limitá-‐lo a uma parte da importância sacada. Qualquer outra modificação introduzida pelo aceite no enunciado da letra equivale a uma recusa de aceite. O aceitante fica, todavia, obrigado nos termos do seu aceite”. CLÁUSULA SEM ACEITE OU NÃO ACEITÁVEL Por meio desta cláusula, o sacador proíbe, na própria letra, que esta seja apresentada ao sacado para aceite antes do vencimento. E, com isso, evita-‐se o vencimento antecipado do título pela recusa do aceite. Referida cláusula, que faz com que a letra seja apresentada ao sacado apenas para pagamento, não pode, nos termos do art. 22 da Lei Uniforme, ser inserida em duas situações: a) letra domiciliada, isto é, pagável em domicílio de terceiro, vale dizer, em localidade diversa da do domicílio do sacado; b) letra de câmbio a certo termo de vista, que é aquela em que o termo inicial do vencimento é a data do aceite. O sacador pode também estipular que a apresentação ao aceite não poderá efetuar-‐se antes de determinada data. Esta medida é similar à cláusula sem aceite. CANCELAMENTO DO ACEITE Dispõe o art. 29, 1ª parte, da Lei Uniforme: “Se o sacado, antes da restituição da letra, riscar o aceite que tiver dado, tal aceite é considerado como recusado”. Esta norma, como se vê, autoriza o cancelamento do aceite pelo sacado, desde que este o risque antes de devolver o título ao tomador (credor), pois, após a restituição da letra, já não é mais possível cancelá-‐lo. A 2ª parte do citado art. 29 presume, até prova em contrário, que o cancelamento do aceite Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP). Aluno Willian Erivan da Silva CPF - ###.###.###-## 13 DIREITO EMPRESARIAL II PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS considera-‐se feito antes da restituição da letra. O cancelamento é uma espécie de recusa do aceite, e, por consequência, produz o vencimento antecipado do título, e, por isso, essa norma facilita cancelamentos fraudulentos emanados do portador, mas atribuídos por presunção ao sacado, feitos com o objetivo exclusivo de provocar o vencimento extraordinário da letra. Se, porém, o sacado tiver informado por escrito o portador ou qualquer outro signatário da letra de que aceita, fica obrigado para com estes, nos termos do seu aceite, ainda que cancelado. PRAZO DE RESPIRO O prazo de respiro é o pedido pelo sacado para que a letra lhe seja apresentada uma segunda vez no dia seguinte ao da primeira apresentação. Tal ocorre quando a dúvida acomete o sacado, levando-‐o a refletir antes de aceitar a letra. O portador, diante da solicitação do prazo de respiro, que ele deve atender, não é obrigado a deixar na mão do sacado a letra apresentada ao aceite. O prazo de respiro não equivale à recusa do aceite, mas sim a reflexão para decidir se aceita ou não. Apresentada a letra de câmbio no último dia do prazo, ela deve ser reapresentada no primeiro dia útil seguinte, se houver prazo de respiro, sob pena de o portador perder o direito de regresso contra os demais coobrigados ENDOSSO CONCEITO O endosso é o ato cambiário que gera a transmissão da propriedade de um título de crédito. Endossar significa transferir a propriedade do título. Na letra de câmbio, o endosso é sempre possível, salvo quando nela o sacador houver inscrito as palavras “não à ordem” ou expressão equivalente. Em havendo, porém, a cláusula “não à ordem”, inviabiliza-‐se o endosso, devendo a transferência da titularidade da letra de câmbio operar-‐se pela via da cessão civil de crédito, conforme preceitua a segundaparte do art. 11 da Lei Uniforme. PARTES NO ENDOSSO O endossante ou endossador e o endossatário são as partes envolvidas no endosso. O primeiro é o proprietário do título de crédito, ostentando, em razão disso, a qualidade de credor da cártula. O segundo é a pessoa para a qual o título foi transferido, sendo, pois, o seu novo proprietário, assumindo também a posição de credor. É claro que só o proprietário do título de crédito desfruta de legitimidade para endossá-‐lo, porquanto ninguém pode transferir direitos que não possui, distinguindo-‐se assim do aval, que é uma garantia dada por terceiro estranho ao título. Forçoso reconhecer que, na letra de câmbio, o primeiro endossante necessariamente será o tomador, isto é, o credor em favor de quem o sacador emitiu a ordem de pagamento. Não há limite ao número de endosso. Este pode ser feito em favor de qualquer pessoa, inclusive, do próprio sacado, aceitando ou não, do sacador, ou de qualquer outro coobrigado, sendo que estas pessoas poderão endossar novamente a letra. Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP). Aluno Willian Erivan da Silva CPF - ###.###.###-## 14 DIREITO EMPRESARIAL II PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS EFEITOS O endosso gera três efeitos: O primeiro é a transferência da propriedade do título de crédito em favor do endossatário, que passa a ser o novo proprietário e o novo credor da cártula. Todavia, para que se opere a transferência da propriedade, não basta o endosso, sendo ainda exigível a tradição, isto é, a entrega do título, tendo em vista o princípio da cartularidade. Convém, desde já, chamar ainda atenção para o endosso-‐mandato e endosso-‐caução, que representam exceção a essa regra, transferindo-‐se em favor do endossatário apenas a posse do título, mantendo-‐se, no entanto, a propriedade nas mãos do endossante. O segundo é que o endossante responde pela existência do título. Se este for falso ou nulo, os endossatários posteriores terão direito à indenização. O terceiro efeito do endosso consiste em tornar os endossantes solidariamente responsáveis para com o pagamento do título (art. 47 da Lei Uniforme), respondendo pela solvência do devedor. Abre-‐se exceção ao endosso sem garantia. Com efeito, o endosso no qual se inseriu esta cláusula, revelando-‐se através da expressão “pague-‐se sem garantia”, isenta o endossante de responsabilizar-‐se pelo pagamento do título, produzindo-‐se, tão somente, o primeiro efeito, qual seja, a transferência da propriedade da cártula (art. 15 da Lei Uniforme). LOCAL DE ENDOSSO O endosso, como os demais atos cambiários, deve ser lançado no próprio título, sendo ainda assinado pelo endossante, observando-‐se, destarte, o princípio da literalidade, sendo, pois, nulo o endosso em documento separado, ainda que por escritura pública. Se não houver mais espaço, é possível colar no título uma folha de extensão, que é um anexo ou alongue que se acresce à letra de câmbio para se inserir obrigações cambiais que não caibam no título de crédito. O endosso, quando lançado no verso ou dorso do título, revela-‐se pela mera assinatura do endossante. Se, no entanto, for inserido no anverso, além da assinatura do endossante, é ainda preciso a expressão “pague-‐se” ou outra equivalente, pois a mera assinatura no anverso é tida como aval, nos termos do art. 31 da Lei Uniforme. ESPÉCIES DE ENDOSSO O endosso pode ser: a) em preto ou nominativo ou pleno: é o que identifica o nome do endossatário, revelando-‐se pela expressão “pague-‐se a fulano de tal”; b) em branco: é o que não identifica o endossatário, revelando-‐se por simples assinatura do endossante no verso do título ou no anverso pela expressão “pague-‐se” ou outra equivalente. Com o endosso em branco, transforma-‐se o título em “ao portador”, podendo, desde então, ser transferido com a mera tradição, prescindindo-‐se de um novo endosso. E, como é sabido, na transferência pela simples tradição, o transmitente, por força do princípio da literalidade, não se vincula ao pagamento do título, ao passo que na transmissão por endosso ele se torna devedor solidário. No endosso em branco continua, porém, existindo a figura do endossatário, considerando-‐se Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP). Aluno Willian Erivan da Silva CPF - ###.###.###-## 15 DIREITO EMPRESARIAL II PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS como tal o portador do título. Não obstante o endosso em branco autorizar a transferência do título pela simples tradição, transformando-‐o em “ao portador”, o certo é que, por força do art. 1º da Lei nº 8.021/90, no momento do pagamento, é obrigatória a identificação do beneficiado, inserindo-‐se o seu nome no espaço em branco em que se lançou o endosso. Essa prática já era possível, nos termos do art. 14 da Lei Uniforme, mas tornou-‐se obrigatória com a Lei nº 8.021/90, funcionando como um mecanismo de controle fiscal. Assim, antes do pagamento, o endosso em branco deve ser convertido em endosso em preto. ENDOSSO PARCIAL O endosso parcial é o que transfere apenas uma parcela do valor do título de crédito. O endosso parcial é nulo (art. 12da Lei Uniforme). Por consequência, não se opera a transferência da propriedade do título. Aliás, não gera efeito algum. ENDOSSO CONDICIONAL O endosso condicional é o que está subordinado a uma condição. Sobre o assunto, dispõe o art. 12 da Lei Uniforme: “O endosso deve ser puro e simples. Qualquer condição a que ele seja subordinado considera-‐ se como não-‐escrita”. Referido endosso é válido, gerando, pois, a transferência do título de crédito, mantendo-‐se o ato puro e simples, reputando-‐se não-‐escrita a condição, distinguindo-‐se, com nitidez, do endosso parcial, pois este é fulminado com nulidade. Se, por exemplo, num título de dez mil reais é lançado o endosso de “pague-‐se cinco mil reais”, o ato se reveste de nulidade absoluta, pois este endosso é parcial, mantendo-‐se o endossante como sendo o proprietário da cártula. Se, ao revés, se inserisse, no mesmo título um endosso condicional (exemplo: pague-‐se mediante a entrega da mercadoria), o ato seria válido, transferindo-‐se a propriedade do título, podendo se exigir o pagamento, independentemente da contra-‐entrega da mercadoria. ENDOSSO IMPRÓPRIO O endosso impróprio é o que transfere ao endossatário apenas a posse do título de crédito, cuja propriedade é mantida em poder do endossante. São duas as modalidades de endosso impróprio: a) endosso-‐mandato ou por procuração; b) endosso-‐caução. ENDOSSO-‐MANDATO O endosso-‐mandato é o que institui o portador da cártula como sendo o mandatário do proprietário do título de crédito, autorizando-‐o a efetuar a cobrança em nome deste. Referido endosso nada mais é que um simples mandato, e, por isso, não se reveste de efeito translativo da propriedade do título. O endossatário por mandato também poderá praticar o endosso-‐mandato, apenas este endosso, o que equivale a um substabelecimento. Quanto ao valor do título, após recebê-‐lo, deverá entregar-‐lhe ao endossante. Os devedores do título só podem se opor ao Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP). Aluno Willian Erivan da Silva CPF - ###.###.###-## 16 DIREITO EMPRESARIAL II PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS pagamento, invocando as defesas que eram oponíveis ao endossante. ENDOSSO-‐CAUÇÃO O endosso-‐caução é o que propicia a posse do título, como penhor, em favor do credor do endossante. Tomo, por exemplo, dinheiro emprestado de um amigo, entregando-‐lhe, como caução, uma letra de câmbio, que me será devolvida quando eu efetivar o pagamento do débito. Aludido endosso é exteriorizado quando se contém no título a menção de expressões do tipo “pague-‐se por caução”, “valor em garantia”, “valor em penhor” ou qualquer outra que implique uma caução. DISTINÇÃO ENTRE ENDOSSO E A CESSÃO CIVIL DE CRÉDITO Endosso é o ato cambiário que opera a transferência de um título de crédito à ordem. O endosso produz três efeitos: 1. transferência da titularidade do crédito do endossante para o endossatário; 2. o endossante responde pela existência do título; 3. o endossante se vincula ao pagamento do título, isto é, pela solvência do devedor, salvo se o endosso contiver a cláusula “sem garantia”. Na cessão de crédito, ao revés, o cedente não responde pelo pagamento do título, isto é, pela solvência do devedor. Enquanto o cedente só responde pela existência do título perante o cessionário, o endossante responde pela existência do título perante os demais endossatários subsequentes. A cessão de crédito deve ser comunicada ao devedor; o endosso não. O devedor não pode arguir contra o endossatário as defesas pessoais atinentes aos outros coobrigados do título, por força do princípio da autonomia e independência das obrigações cambiais. Em contrapartida, o devedor pode arguir contra o cessionário, quando notificado, as defesas pessoais pertinentes ao cedente. Finalmente, há dois tipos de endosso, que produzem efeitos de cessão civil de crédito, porque o endossante não responde pela solvência do devedor. O primeiro é o endosso de título “não à ordem”; o segundo é o endosso tardio ou póstumo, que é o realizado após o protesto do título ou após o decurso do prazo do protesto. ENDOSSO TARDIO OU PÓSTUMO OU IMPRÓPRIO O endosso tardio ou póstumo é o feito após o título já ter sido protestado por falta de pagamento, ou feito depois de expirado o prazo fixado para se fazer o protesto. AVAL CONCEITO Aval é o ato cambiário pelo qual uma pessoa garante o pagamento do título de crédito em favor de outro coobrigado. Esta garantia é dada por um terceiro ou mesmo por signatário da letra de câmbio (art. 3º da Vedada a transmissão e reprodução deste material (art. 184 CP). Aluno Willian Erivan da Silva CPF - ###.###.###-## 17 DIREITO EMPRESARIAL II PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS Lei Uniforme). Vê-‐se assim que pessoas já coobrigadas, como o sacador, aceitante e endossantes, podem avalizar o título, mas, em regra, não se visualiza utilidade prática em semelhantes avais, porquanto elas já são, por força de lei, devedoras solidárias da cártula; referidos avais só não serão inócuos quando forem em benefício de um coobrigado mais próximo, porque daí o avalista poderá ser cobrado com antecedência. Tal ocorre, por exemplo, quando o
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