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BUFULIN, Augusto Passamani; SANTOS, Katharine Maia dos; BONOMO, Aylton Breve análise sobre o vício processual da inexistência em face do novo código de processo civil

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BREVE ANÁLISE DO VÍCIO PROCESSUAL DE INEXISTÊNCIA JURÍDICA EM
FACE DO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL
Brief review of the procedural defect of legal absence in the face of the new Civil
Procedure Code
Revista de Direito Privado | vol. 68/2016 | p. 17 - 36 | Ago / 2016
DTR\2016\22993
Augusto Passamani Bufulin
Doutor e Mestre em Direito Civil pela PUC/SP. Professor Adjunto de Direito Civil do
Departamento de Direito da UFES. Juiz de Direito no Estado do Espírito Santo.
augustopassamani@terra.com.br
Aylton Bonomo Júnior
Mestrando em Direito Processual pela UFES. Juiz Federal na Seção Judiciária do Espírito
Santo. ayltonbonomo@yahoo.com.br
Katharine Maia dos Santos
Mestre em Direito Processual pela UFES. Professora concursada de Direito do Instituto
Federal do Espírito Santo (IFES). katemaia@yahoo.com.br
Área do Direito: Processual
Resumo: Examinar-se-á o vício processual de inexistência jurídica dentro do contexto do
novo Código de Processo Civil (Lei Federal 13.105/2015), enfatizando a sua previsão
legal, hipóteses de cabimento, consequências processuais, sanabilidade e meios de
impugnação adequados.
Palavras-chave: Inexistência jurídica - Análise em face do Novo Código de Processo Civil
- Admissibilidade.
Abstract: Will be examine the procedural defect of legal absence in the context of the
new Civil Procedure Code (Federal Law number 13.105/2015), stressing the legal
provision, chances of pertinence, procedural consequences, remedy and appropriate
means of refute.
Keywords: Legal absence - Review of the new face Civil Procedure Code - Admissibility.
Sumário:
1Introdução - 2Invalidades processuais - 3Inexistência Jurídica - 4Conclusão -
5Bibliografia
1 Introdução
O processo consiste no método estatal de eliminar a crise de direito material. Mas, para
que as partes possam influir efetivamente no resultado da lide, assegurando-lhes a
igualdade de tratamento e o contraditório, necessário se faz observar determinadas
regras preestabelecidas pelo legislador. E o desapego a essas regras é que gera, em
princípio, a figura processual conhecida como “vício processual”.
Diverge muito a doutrina a respeito da classificação das espécies de nulidades
existentes, podendo-se afirmar, sem dúvida, que cada doutrinador aponta sua particular
classificação.
No entanto, parcela da doutrina defende a existência de um vício de maior gravidade em
nosso direito pátrio, qual seja, o vício da inexistência jurídica, que representa o tema de
estudo desta obra.
Posta assim a questão, demonstrar-se-á o cenário histórico do vício da inexistência
jurídica, o seu conceito, as suas consequências processuais e suas possíveis hipóteses de
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ocorrência, a sua sanabilidade e meio de impugnação tecnicamente cabível para atacar
sentenças e processos que padeçam do vício de inexistência jurídica, sempre com os
olhos fitos para o texto recentemente aprovado do novo Código de Processo Civil (Lei
13.105/2015).
Ressalta-se quanto à enorme divergência doutrinária acerca da matéria enfocada, o que
torna praticamente impossível fincar conceitos e soluções uniformes para o assunto
ligado à inexistência jurídica.
De todo modo, observando a limitação metodológica desta obra, buscar-se-á, ao menos,
lançar premissas plausíveis relativas à inexistência jurídica, para que assim seja
proporcionada à comunidade jurídica uma visualização macroscópica do tema, diante da
recente aprovação do novo Código de Processo Civil (Lei 13.105/2015).
2 Invalidades processuais
2.1 As espécies de vícios do processo
Existem diversas formas por meio da qual se afigura possível classificar as invalidades
do processo civil.
VESCOVI (1999, p. 261) afirma que “quase podemos afirmar que cada processualista
tem suas ideias nesta matéria”.
Por conta disso, como não é pretensão deste trabalho esgotar o tema referente às
diversas formas de classificação dos vícios processuais, faz-se necessário discorrer
apenas sobre a classificação tradicional.
De um modo geral, a nossa doutrina acolheu a classificação esposada por Galeno
Lacerda,1 segundo o qual os vícios do ato processual agrupam cinco categorias, quais
sejam: inexistência jurídica;2 nulidade absoluta; nulidade relativa; anulabilidade e
irregularidade.
A inexistência jurídica representa o vício de maior gravidade do ato processual, podendo
a mesma (inexistência) ser fática ou jurídica.
Ensinam Grinover, Fernandes e Gomes Filho (2001, p. 20):
“São atos processuais inexistentes aqueles aos quais falta, de forma absoluta, algum dos
elementos exigidos pela lei; neles, o vício é de tal gravidade que sequer seria possível
considerá-los como atos processuais, são, na verdade, não-atos, em relação aos quais
não se cogita de invalidação, pois a inexistência constitui um problema que antecede a
qualquer consideração sobre a validade”.
O citado vício (inexistência jurídica) não fora reconhecido expressamente no novo Código
de Processo Civil (Lei 13.105/2015), não sendo utilizada essa nomenclatura
(“inexistência jurídica”) em nenhum momento, assim como não estava previsto
expressamente no Código de Processo Civil ainda vigente (Lei 5.869/1973).
A nulidade absoluta trata-se de vício de menor gravidade do que a inexistência jurídica,
situando-se logo abaixo desta. Consistem naqueles atos em que a falta de adequação ao
modelo legal pode ensejar o reconhecimento de sua inaptidão para surtir efeitos no
universo jurídico.
Nesta espécie de vício, há transgressão à norma cogente,3 sendo que a norma colima
preservar os interesses de ordem pública no processo. Por tal razão, pode e deve o
magistrado decretar a nulidade ex officio, independentemente de provocação das partes.
Na nulidade relativa, tal como ocorre com a nulidade absoluta, o vício decorre de
infração à norma cogente, ou seja, indisponível para a parte, podendo o magistrado, de
igual sorte, decretar a nulidade de ofício (Komatsu, 1991).4-5
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Todavia, a nulidade relativa distancia-se da nulidade absoluta, pelo fato daquela dizer
respeito à violação de regras jurídicas onde se tutelam interesses das partes.
Na anulabilidade, o interesse tutelado é eminentemente privado, tal como ocorre com as
nulidades relativas; entretanto, o vício decorre de violação a normas dispositivas.
Leciona Komatsu (1991, p. 211):
“E os caracteres das anulabilidades são os seguintes: decorrem, exclusivamente, de não
incidência de regra dispositiva. A sanabilidade é a regra e a sanação decorre de simples
inação, da mera ausência de reação do interessado. Ao juiz é vedado decretá-la de
ofício. Ou o interessado as alega, no momento oportuno e através de adequada forma,
ou a convalidação se opera”.
Por fim, a irregularidade constitui o vício de menor gravidade do processo.
Consiste em “defeitos” mínimos que não interferem na validade do ato e em relação ao
qual não ocorre preclusão. Aliás, os erros materiais podem (e devem) ser corrigidos, a
qualquer tempo, de ofício.
Aragão (1995, p. 265) discorre que cuidam-se de “infrações que não comprometem o
ordenamento jurídico nem o interesse da parte; tampouco afetam a estrutura do ato a
ponto de torná-lo inábil à produção dos efeitos a que é destinado”.
3 Inexistência Jurídica
3.1 Histórico
Comentando acerca da origem da figura da inexistência jurídica, torna-se imperioso citar
Komatsu (1991, p. 155):
“A origem da teoria do ato inexistente encontra-se na França, no começo do século XIX,
sendo adotada e desenvolvida pelos juristas daquele país, especialmente por aqueles da
chamada escola da exegese. Com razão, pode-se dizer que o tema da inexistência é um
‘tema francês’, chegando Georges Lutzesco a sustentar que tal teoria “é obra
exclusivamente da doutrina francesa’. (...)
A ideia do ato inexistente faz a sua aparição no campo do direito civil, em relação ao
direito matrimonial, reforçada pela regra do direito francês,relativa às nulidades, que
estabelecia a regra ‘pas de nullité sans texte’. Frente a semelhante imitação, os autores
franceses buscaram uma saída jurídica para deixar sem efeito certos casamentos, que
feriam a moral média, como os celebrados entre pessoas do mesmo sexo, e que o
legislador francês não havia previsto como nulos, no Código Civil (LGL\2002\400).
Qualificando esses casamentos como inexistentes, os privaram de seus efeitos sem
violar a mencionada regra.
A teoria do ato inexistente, que havia surgido em relação ao casamento, começou
rapidamente a estender-se aos demais atos jurídicos importantes, aos contratos, aos
testamentos etc., até que chegou a formular-se, durante o século XIX, uma teoria geral
do ato inexistente”.
Entretanto, ao longo do tempo, a teoria do ato inexistente se enfraqueceu, a mercê da
confusão do ato inexistente com o ato viciado de nulidade absoluta, porquanto, ante o
princípio da força formal da sentença, as sentenças nulas e inexistentes passaram a ter
o mesmo tratamento.
A despeito disso, hodiernamente, a doutrina construiu premissas robustas e veementes
que distinguem, com nitidez, a inexistência jurídica da nulidade, fazendo, assim, com
que aquela (inexistência) possua fundamentos independentes.
3.2 Definição
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A doutrina, tanto a alienígena, quando a pátria, de um modo geral, não diverge
substancialmente do conceito de inexistência jurídica.
Eis abaixo, pois, a definição e os comentários realizados por alguns juristas a respeito da
matéria em exame:
Couture (1958) sustenta que o ato inexistente não é ato, mas, apenas, um fato,
desprendido de relevância jurídica. Por isso, não há necessidade de ser convalidado,
tampouco necessita ser invalidado.
Para Micheli, apud Theodoro Junior (1999), há inexistência processual quando o ato não
tenha sequer os requisitos mínimos para ser considerado como ato processual.
Segundo lição de Calamandrei, apud Bedaque (2006), a ausência de um dos elementos
de fato que a lei considera indispensáveis à configuração jurídica do ato enseja o
fenômeno da inexistência.
Theodoro Junior (1999), ao explanar e encampar a figura da inexistência jurídica, cita
Liebman, o qual nivela a inexistência com a nulidade ipsu iure.
Após reflexão sobre o tema ligado à inexistência jurídica, Komatsu (1991, p. 159) assim
arremata:
“A inexistência jurídica é a irrelevância resultante da falta de um elemento mínimo ou
constitutivo do fato com relação ao suporte fático, ficando por isso impedidas a
incidência do preceito normativo e a concretização do fato jurídico”.
Calmon de Passos (2002) define a inexistência jurídica como sendo aquele fenômeno
que não se identifica com a inexistência fática, a não ser casualmente.6 Assevera que
quando se está diante da inexistência jurídica, existiram fatos de cuja existência material
não se questiona, porém, esses fatos não têm aptidão para corresponder ao suposto
normativo.
Wambier (2007, p. 192) preleciona que “todo o problema da inexistência do ato gira em
torno da vida do ato, sendo pois, rigorosamente, anterior ao problema da validade”.
Nesse mesmo diapasão, veja-se o magistério de Grinover, Fernandes e Gomes Filho
(2001, p. 20):
“São atos processuais inexistentes aqueles aos quais falta, de forma absoluta, algum dos
elementos exigidos pela lei; neles, o vício é de tal gravidade que sequer seria possível
considerá-los como atos processuais, são, na verdade, não atos, em relação aos quais
não se cogita de invalidação, pois a inexistência constitui um problema que antecede a
qualquer consideração sobre a validade”.
Consoante já salientando, o vício da inexistência jurídica não fora reconhecido
expressamente no novo Código de Processo Civil (Lei 13.105/2015), não sendo utilizada
essa nomenclatura (“inexistência jurídica”) em nenhum momento.
Entrementes, isso não significa que tal vício processual tenha sido extirpado do processo
civil brasileiro, pelas seguintes razões: a uma, porque o novo Código de Processo Civil
não vedou a figura do vício da inexistência jurídica; a duas, porque o sistema jurídico
pátrio não é formado apenas de leis formais, mas também (e sobretudo) de princípios e
regras, que dão suporte principiológico à tese da inexistência jurídica; a três, porque o
novo Código de Processo Civil encampou, ainda que implicitamente, a figura da
inexistência jurídica, admitindo que o vício de falta de citação no processo de
conhecimento seja alegado em impugnação ao cumprimento de sentença, dispensando,
assim, o ajuizamento de ação rescisória para expurgar tal vício processual do processo,
mesmo que tenha se formado a coisa julgada material (art. 525, § 1.º, I, do CPC/2015
(LGL\2015\1656)); a quatro, porque o Código de Processo Civil ainda vigente também
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não contempla, expressamente, a figura da inexistência jurídica como vício processual
autônomo, e mesmo assim é admitido tal vício pela doutrina e jurisprudência pátrias.
3.3 Consequências processuais
Fincados o conceito e a natureza do vício da inexistência jurídica, cumpre, agora,
perquirir acerca de seus efeitos processuais.
A doutrina majoritária posiciona-se no sentido de que, presente o vício de inexistência
jurídica em uma relação jurídico-processsual, inocorre coisa julgada material.7
Nesse sentido, assevera Theodoro Júnior (1999, p. 149).
“A nulidade ipso iure do processo ou sua inexistência jurídica, inutilizando a relação
jurídica processual, impede a formação da coisa julgada material, e permite, em
qualquer tempo, a reabertura de processo regular sobre a mesma lide já anteriormente
julgada, mas de forma ineficaz.”
O supracitado autor, ainda, em seu referido artigo (1999, p. 150), cita Liebman, o qual
afirma:
“(...) há, contudo, vícios maiores, vícios essenciais, que sobrevivem à coisa julgada e
afetam a sua própria existência. Nesse caso a sentença, embora se tenha formado
definitiva, é coisa vã, mera aparência e carece de efeitos no mundo jurídico”.
De igual sorte, Wambier (2007) assinala que a coisa julgada só não se constituirá em
caso de processo e sentença inexistente juridicamente.
É de opinião semelhante Komatsu (1991, p. 164):
“Nenhuma aquiescência ou decurso de prazo permitirá que ela adquira qualquer eficácia,
sendo inconcebível o seu trânsito em julgado. Mas isso não impede que o juízo do
recurso, ou qualquer outro, ocasionalmente venha a declarar a sua total ineficácia”.
Seguem essa mesma vertente: Dinamarco,8 Barbosa Moreira,9 Moniz de Aragão10 e
Calmon de Passos,11 dentre outros juristas.
Posto isso, verifica-se que não se formará a coisa julgada em processo e sentença
eivados do vício de inexistência jurídica. Aí, pois, reside o principal objetivo pelo qual se
distinguem a inexistência jurídica dos demais vícios processuais, porquanto somente os
vícios de inexistência jurídica estarão imunes à autoridade da coisa julgada.
Essa consequência (inexistência de coisa julgada) não fora reconhecida expressamente
no novo Código de Processo Civil (Lei 13.105/2015). Contudo, pode-se chegar a essa
conclusão (inexistência de coisa julgada), tendo em vista que o novo Código de Processo
Civil admite que o vício de falta de citação no processo de conhecimento seja alegado
em impugnação ao cumprimento de sentença (art. 525, § 1.º, I, do CPC/2015
(LGL\2015\1656)), dispensando, assim, o ajuizamento de ação rescisória para expurgar
tal vício processual, o que denota que não se opera a coisa julgada material em face
desse grave vício processual de ausência de citação.
3.4 Hipóteses de Inexistência Jurídica
Partindo do pressuposto que o texto sancionado do novo Código Processo Civil (Lei
13.105/2015) não apresenta óbice à figura processual da inexistência jurídica, tarefa
árdua, agora, é elencar todas as possíveis hipóteses de ocorrência da inexistência
jurídica,tendo em vista que a legislação pátria nada prevê expressamente a respeito (o
que, diferentemente, ocorre com as hipóteses que ensejam a ação rescisória), a par do
fato de cada jurista arrolar, particularmente, suas hipóteses tidas como de inexistência
jurídica.
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De todo modo, ainda assim, é possível identificar, em comum, algumas hipóteses de
inexistência indicadas pelos seguintes doutrinadores:
De la Leona Espinosa, apud Wambier (2007), aponta as seguintes hipóteses de
inexistência jurídica: i) pedido apresentado em órgão não jurisdicional; ii) ausência de
petição; iii) inexistência de citação; iv) sentença a non judice; v) sentença não assinada.
É indicado por Paulo Cunha, apud Castro Mendes (1968), as seguintes hipóteses de
inexistência: i) vícios de forma; ii) sentença a non judice; iii) sentença dúbia; iv)
sentença proferida por parte ilegítima; v) segunda sentença proferida após já existir
sentença no processo.
Castro Mendes (1968), semelhantemente, fornece os seguintes exemplos: i) sentença
non judice; ii) falta de forma; iii) dissonância entre o decisum e a lei.
Rodriguez, apud Wambier (2007), cita os seguintes casos: i) sentença sem decisório; ii)
sentença incerta ou impossível; iii) sentença proferida por um não juiz; iv) sentença
proferida contra pessoa inexistente ou sem legitimidade para a causa; v) sentença não
assinada pelo juiz.
Cintra, Grinover e Dinamarco (2003) arrolam como hipóteses de inexistência jurídica a
sentença que não contenha parte dispositiva ou que condene o réu a uma prestação
impossível, ou qualquer ato do processo não assinado pelo seu autor.
Calmon de Passos (2002) faz menção à sentença proferida havendo impossibilidade
jurídica do pedido, a que condena alguém à morte, a prolatada contra quem não foi
parte ou contra alguém conhecido.
Marcato (2004, p. 677-678) assim escreve:
“São exemplos de ato processual inexistente: (a) decisão judicial (final ou interlocutória)
sem assinatura do juiz que a proferiu; (b) decisão prolatada por juiz promovido ou
aposentado; (c) sentença que não contenha a parte dispositiva (art. 458, II), sobre a
qual normalmente incidiria a coisa julgada (art. 468 c/c art. 469, I e II); (d) sentença
ainda não publicada; (e) petição não assinada por advogado em pleno exercício de seus
direitos profissionais (art. 36, e EA, art. 4.º) ou assinada por advogado que não recebeu
procuração (art. 37), o que substancialmente é a mesma coisa; (f) demanda proposta
por (ou em face de) pessoa inexistente; (g) decisões proferidas em processo que correu
à revelia do réu em decorrência de algum vício em sua citação (art. 741, I); (h)
sentença que condene a uma prestação materialmente impossível (por exemplo,
construir uma casa na Lua) etc.”.
Theodoro Junior (1999, p. 151) preleciona que “a res iudicata não pode aperfeiçoar no
bojo de uma relação processual absolutamente nula, por ausência de pressuposto
processual ou carência de ação”.
Arruda Alvim (2003) aduz que é possível falar-se em sentença inexistente, se esta for
proferida em processo que tenha sido constituído ausente algum pressuposto processual
de existência.12
Da mesma sorte, Wambier (2007) ensina que as sentenças inexistentes o serão em
virtude de terem sido proferidas em processo juridicamente inexistente (vício extrínseco)
ou em virtude de padecerem de vícios intrínsecos.
Essas são, portanto, as principais hipóteses de inexistência jurídica apontadas pela
doutrina, devendo, sempre, analisá-las de forma limitada e comedida, uma vez que há
que se ter em vista, sempre, o fato de que o elenco indiscriminado de hipóteses de
sentenças inexistentes esvaziaria sobremodo o sentido da garantia da coisa julgada,
direito fundamental individual previsto na Carta Magna.
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No novo Código de Processo Civil (Lei 13.105/2015), encontra-se uma hipótese de vício
de inexistência jurídica, consistente na falta de citação no processo de conhecimento,
vício este que poderá ser alegado até mesmo em impugnação ao cumprimento de
sentença (art. 525, § 1.º, I, do CPC/2015 (LGL\2015\1656)), dispensando, assim, o
ajuizamento de ação rescisória para expurgar tal vício processual do processo, o que
denota que não se opera a coisa julgada material em face desse grave vício processual
(ausência de citação).
De outro lado, quando se tratar de litisconsórcio não unitário, a sentença de mérito,
quando proferida sem a integração do contraditório, será ineficaz (e não inexistente)
apenas para os litisconsortes que não foram citados (art. 115, II, do CPC/2015
(LGL\2015\1656)).
Em outras palavras: no litisconsórcio não unitário, o vício situa-se no plano de eficácia, e
não no plano de existência, sendo essa uma opção política do legislador, que vai ao
encontro dos princípios do prejuízo, economicidade, duração razoável do processo e
aproveitamento dos atos processuais, tal como o fez em relação às sentenças que não
são congruentes com o pedido ou causa de pedir (art. 1.013, § 3.º, III, do CPC/2015
(LGL\2015\1656)).
Sobre o tema, escreve Neves (2015, p. 117):
“Nas hipóteses de litisconsórcio necessário simples, nas quais não existe necessidade de
unitariedade da decisão para todos os litisconsortes, o legislador consagra o vício da não
formação do litisconsórcio no plano da validade. E ainda assim, regulamenta uma
ineficácia parcial, que só atinge os terceiros que não foram parte do processo. Significa
que após o trânsito em julgado da decisão não haverá vício de rescindibilidade que
justifique a propositura de uma ação rescisória, cabendo ao terceiro, a qualquer
momento, propor ação judicial por não estar vinculado a decisão transitada em julgado.”
Podemos citar, também, como um vício grave da sentença judicial transitada em
julgado, comparável ao vício da inexistência jurídica pela sua gravidade e consequência,
a sentença inconstitucional.
Segundo o art. 525, § 12, do CPC/2015 (LGL\2015\1656), “(...) considera-se também
inexigível a obrigação reconhecida em título executivo judicial fundado em lei ou ato
normativo considerado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, ou fundado em
aplicação ou interpretação da lei ou do ato normativo tido pelo Supremo Tribunal Federal
como incompatível com a Constituição Federal, em controle de constitucionalidade
concentrado ou difuso”.
Nessa hipótese, a decisão do Supremo Tribunal Federal deve ser anterior ao trânsito em
julgado da decisão exequenda (art. 525, § 14, do CPC/2015 (LGL\2015\1656)), de
forma que não se opera a coisa julgada sobre esse tema, podendo ser alegada em
simples impugnação no bojo do cumprimento da sentença, dispensando-se ajuizamento
de ação rescisória, por se cuidar de um vício transrescisório.
De outro giro, se a decisão do STF for proferida após o trânsito em julgado da decisão
exequenda, caberá ação rescisória, cujo prazo será contado do trânsito em julgado da
decisão proferida pelo STF (art. 525, § 15, do CPC/2015 (LGL\2015\1656)).
Vê-se que, nessa hipótese, o legislador ampliou, por via indireta, significativamente o
prazo da ação rescisória, fixando como marco temporal inicial do ajuizamento da ação
rescisória o trânsito em julgado da decisão proferida pelo STF, e não o trânsito em
julgado da decisão exequenda, criando, assim, uma nova hipótese material e temporal
da ação rescisória, ainda que o prazo de 02 (dois) anos permanecesse.
Essa norma é deduvidosa constitucionalidade, no tocante ao marco temporal inicial, pois
colide com os princípios constitucionais da segurança jurídica e da coisa julgada, pilares
de um Estado de Direito, já que sentenças com trânsito em julgado poderão ser
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rescindidas, mesmo que a decisão do STF que declare a inconstitucionalidade seja
proferida décadas depois, pois o prazo da ação rescisória conta-se a partir do trânsito
em julgado da decisão do STF, e não da decisão exequenda.
De todo modo, o disposto no supracitado art. 525, § 14 e 15, do CPC/2015
(LGL\2015\1656) (Lei 13.105/2015), aplica-se somente às decisões transitadas em
julgado após a sua entrada em vigor, ao passo que às decisões transitadas em julgado
anteriormente, aplica-se o disposto no art. 475-L, § 1.º, do CPC/2015 (LGL\2015\1656)
e no art. 741, parágrafo único, do CPC/1973 (LGL\1973\5) (Lei 5.869/1973).
3.5 A sanabilidade da inexistência jurídica
Como se nota, indubitável é o fato de que o vício da inexistência jurídica obsta a
formação da coisa julgada; no entanto, isso não quer dizer que tal vicio não seja
suscetível de saneamento, visto que inexiste relação obrigatória entre sanabilidade e a
natureza do vício.
Isso se justifica, pois, em virtude da atual fase processual, em que se busca, ao máximo,
“conservar” os atos processuais, para tornar o processo, de fato, efetivo, evitando-se,
com isso, desperdício de tempo e de dinheiro.
Com efeito, a tendência do processo civil é a de que todos vícios processuais sejam
passíveis de sanabilidade, devendo a declaração de nulidade apenas ser realizada de
forma excepcional, após esgotados os meios de se “consertar” o vício.
Bedaque (1990, p. 36-37) ensina que “a distinção entre nulidade absoluta e relativa, em
direito processual, é totalmente irrelevante para a questão da sanabilidade do ato
viciado (...) inadmissível relacionar a insanabilidade do ato com a nulidade absoluta”.13
O novo Código de Processo Civil (Lei 13.105/2015) caminhou nesse sentido, podendo-se
citar inúmeros dispositivos legais que apontam que a nulidade deve ser declarada
apenas em último caso, após a possibilidade de correção do vício processual, priorizando
a solução integral da lide em tempo razoável, in verbis:
“Art. 4.º As partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito,
incluída a atividade satisfativa.
Art. 277. Quando a lei prescrever determinada forma, o juiz considerará válido o ato se,
realizado de outro modo, lhe alcançar a finalidade.
Art. 282. (...).
§ 1.º O ato não será repetido nem sua falta será suprida quando não prejudicar a parte.
§ 2.º Quando puder decidir o mérito a favor da parte a quem aproveite a decretação da
nulidade, o juiz não a pronunciará nem mandará repetir o ato ou suprir-lhe a falta.
Art. 317. Antes de proferir decisão sem resolução de mérito, o juiz deverá conceder à
parte oportunidade para, se possível, corrigir o vício.
Art. 352. Verificando a existência de irregularidades ou de vícios sanáveis, o juiz
determinará sua correção em prazo nunca superior a 30 (trinta) dias.
Art. 488. Desde que possível, o juiz resolverá o mérito sempre que a decisão for
favorável à parte a quem aproveitaria eventual pronunciamento nos termos do art. 485.
Art. 938. A questão preliminar suscitada no julgamento será decidida antes do mérito,
deste não se conhecendo caso seja incompatível com a decisão.
§ 1.º Constatada a ocorrência de vício sanável, inclusive aquele que possa ser conhecido
de ofício, o relator determinará a realização ou a renovação do ato processual, no
Breve análise do vício processual de inexistência jurídica
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próprio tribunal ou em primeiro grau de jurisdição, intimadas as partes.
§ 2.º Cumprida a diligência de que trata o § 1.º, o relator, sempre que possível,
prosseguirá no julgamento do recurso.
§ 3.º Reconhecida a necessidade de produção de prova, o relator converterá o
julgamento em diligência, que se realizará no tribunal ou em primeiro grau de jurisdição,
decidindo-se o recurso após a conclusão da instrução.
§ 4.º Quando não determinadas pelo relator, as providências indicadas nos §§ 1.º e
3.º poderão ser determinadas pelo órgão competente para julgamento do recurso.
Art. 1.013. A apelação devolverá ao tribunal o conhecimento da matéria impugnada.
§ 1.º Serão, porém, objeto de apreciação e julgamento pelo tribunal todas as questões
suscitadas e discutidas no processo, ainda que não tenham sido solucionadas, desde que
relativas ao capítulo impugnado.
§ 2.º Quando o pedido ou a defesa tiver mais de um fundamento e o juiz acolher apenas
um deles, a apelação devolverá ao tribunal o conhecimento dos demais.
§ 3.º Se o processo estiver em condições de imediato julgamento, o tribunal deve decidir
desde logo o mérito quando:
I – reformar sentença fundada no art. 485;
II – decretar a nulidade da sentença por não ser ela congruente com os limites do
pedido ou da causa de pedir;
III – constatar a omissão no exame de um dos pedidos, hipótese em que poderá
julgá-lo;
IV – decretar a nulidade de sentença por falta de fundamentação.
§ 4.º Quando reformar sentença que reconheça a decadência ou a prescrição, o tribunal,
se possível, julgará o mérito, examinando as demais questões, sem determinar o retorno
do processo ao juízo de primeiro grau”.
Tais normas jurídicas estão em sintonia com um dos cinco objetivos do Novo Código de
Processo Civil previstos na Exposição de Motivos, qual seja, o processo com o maior
rendimento possível (passagem do formalismo exacerbado para o formalismo
valorativo), emergindo daí o princípio da primazia do julgamento do mérito.
Nesse rumo de ideia, é o magistério de Wambier, Didier Jr., Talamini e Dantas (2015, p.
736)
“Outra da faceta do princípio da sanabilidade dos vícios do processo, não disciplinada
pelo art. 277 do CPC (LGL\2015\1656), é a que prevê o dever do juiz corrigir ou
determinar que sejam corrigidos vícios ligados aos requisitos de admissibilidade da
apreciação do mérito, sempre que isto for possível, como o objetivo de dar à parte
autora o que esta pediu: a apreciação da lide (art. 317). Em boa hora, deixa claro o art.
938, § 1.º, que diz dever o relator determinar a realização ou a renovação do ato
processual se houver vício insanável, mesmo se tratar de vício que deva ser conhecido
de ofício, e, sempre que possível, prosseguirá no julgado do recurso. Esse dispositivo
deixa inequívoco que vícios cognoscíveis de ofício são sanáveis, e que o NCPC segue a
diretriz geral no sentido de que o processo nasce para realizar sua vocação, que é a de
gerar sentença de mérito. (...). O art. 338 permite até mesmo a correção da
legitimidade passiva, como regra geral, em exceção ao princípio da perpertuatio
legitimationis.”
Com esse mesmo raciocínio, ensina Didier Jr. (2015, p. 407):
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“Mesmo nos casos de ausência de citação ou de citação defeituosa que gerou revelia,
vícios transrescisórios, que permitem a invalidação da decisão judicial após o prazo da
ação rescisória (art. 525, § 1.º, I, e art. 535, I, CPC (LGL\2015\1656) – ver item
adiante), há possibilidade de suprimento do defeito pelo comparecimento do réu ao
processo (art. 239, § 1.º, CPC (LGL\2015\1656))”.
Dessarte, infere-se que não há nenhum empecilho para que sejam sanados os vícios
processuais, inclusive o mais grave, qual seja, a inexistência jurídica.
3.6 Meios de Impugnação
Diverge demasiadamente a doutrina e a jurisprudência a respeito do meio de
impugnação cabível para atacar processos e sentenças eivados do vício de inexistência
jurídica.
Aliás, antes mesmo de se discutir qual o meio de impugnação cabível, mister se faz
perquirir se há, de fato, a necessidade de se lançar mão de algum instrumento
processual para declarar a inexistênciajurídica.
Antigamente, no direito romano, a sentença inexistente era nenhuma, e, em virtude
disso, não necessitava de qualquer meio de impugnação, bastando ignorá-la.
Do mesmo modo, Jauernig, apud Wambier (2007), disserta que a sentença inexistente
não representa relação jurídica alguma, cuja não existência não precisa ser reconhecida
judicialmente como tal.
Todavia, por questão de segurança jurídica, impõe-se a emissão de pronunciamento
judicial no sentido de declarar a ocorrência do vício de inexistência jurídica.
“Isto ocorre, pensamos, talvez em virtude de razões de ordem prática, ligadas à política
legislativa: parece sensato dizer-se que um pronunciamento judicial sob forma de
sentença tem menos chances de ser arbitrário do que um juízo formulado por qualquer
particular. Com isso queremos dizer merecerem as sentenças certa credibilidade por
uma série de razões, que serão adiante comentadas com mais vagar. Pode imaginar-se
o caos que surgiria se a todos fosse dado o direito de, por exemplo, deixar de cumprir
contratos, a que se vincularam, por considerá-los inexistentes, ou deixar de cumprir leis,
porque inconstitucionais” (Wambier, 2007, p. 157).
Aliás, conforme já sublinhado em linhas pretéritas, enquanto não declarada a
inexistência jurídica, o ato processual pode produzir efeitos, pois não há que se
confundir entre os planos de existência e de eficácia. Nesse panorama, pode-se falar de
atos inexistentes eficazes.
Segundo parcela da doutrina, o único meio tecnicamente adequado para extirpar do
universo jurídico as sentenças inexistentes é o da ação declaratória de inexistência
jurídica,14 que, comumente, é utilizada pela doutrina e jurisprudência pátrias como
sinônimo de querela nullitatis.15
Justifica-se, pois, o uso de tal ação, pois o escopo das ações declaratórias é a de
suprimir, do mundo jurídico, uma determinada incerteza jurídica, o que ocorre,
exatamente, quando se está diante do vício de inexistência jurídica.
Frise-se, ainda, uma questão importantíssima referente à competência, visto que a ação
declaratória é ajuizada no juízo de 1.º grau de jurisdição, diversamente do que ocorre
com a ação rescisória, que é aforada no juízo de 2.º grau.
É adepto dessa corrente Calamandrei (1977, p. 128), afirmando que:
“(...) o único meio adequado contra a sentença nula será a ação declaratória negativa de
certeza, mediante a qual, sem aportar modificação alguma no mundo jurídico, far-se-á
declarar o caráter negativo que o conteúdo da sentença trouxe consigo desde o
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momento de sua concepção”.
Não discrepa desse entendimento Theodoro Junior (1999, p. 60-61):
“Mas, por meio de simples ação declaratória podem ser atingidas as sentenças proferidas
em processo a que tenha faltado ‘pressuposto processual de existência’, ou em ‘ação’
julgada pelo mérito, apesar da falta de uma ou algumas de suas condições.
(...).
A sentença nula iupso iure ou inexistente não é objeto da ação rescisória, justamente
porque a ação do art. 485 pressupõe a coisa julgada, que, por seu turno reclama o
pressuposto de um processo válido”.
Filiam-se à corrente da ação declaratória Talamani,16 Komatsu,17 Barbosa Moreira,18
Teixeira,19 Wambier e Medina.20
Partindo da premissa que a ação declaratória é o meio de impugnação cabível para
atacar a inexistência jurídica, fica afastada, por via reflexa, o uso da ação rescisória, já
que, em tese, não é possível conceber dois caminhos para levar a um mesmo lugar.
Com efeito, consoante se constata da natureza da ação rescisória, esta tem por fim
rescindir a autoridade da coisa julgada. Ora, em se tratando de vício de inexistência
jurídica, não se opera a coisa julgada material; logo, não há nada para ser rescindido em
caso de inexistência jurídica!
Nesse mesmo diapasão, adotando a ação declaratória como meio de impugnação da
inexistência jurídica, já se manifestou o Excelso STF (RT 588/244), em sessão plenária,
textualmente:
“Ação declaratória de nulidade de sentença por ser nula a citação do réu revel na ação
em que ela foi proferida. Para a hipótese prevista no art. 741, I, do atual CPC
(LGL\2015\1656) – que é a falta ou nulidade de citação, havendo revelia –, persiste, no
direito positivo brasileiro, a querela nullitatis, o que implica dizer que a nulidade da
sentença, nesse caso, pode ser declarada em ação declaratória de nulidade,
independentemente do prazo para a propositura da ação rescisória, que, em rigor, não é
cabível para essa hipótese”.
De igual modo, é torrencial a jurisprudência do C. STJ: REsp 331.850, DJ 06.05.2002;
REsp 1105944/SC, 2.ª T., j. 14.12.2010, rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe
08.02.2011.
Cabe destacar, ainda, que o provimento jurisdicional declaratório de inexistência jurídica
poderá ser realizado incidentalmente em uma relação jurídico-processual distinta, não
havendo a necessidade, portanto, de que se ajuíze uma ação autônoma. Acontece que,
nesse caso, os efeitos da declaração não surtirão efeitos extraprocessualmente, já que,
para tanto, mister se faz o aforamento de uma ação autônoma de declaração.
Conforme já salientado anteriormente, o novo Código de Processo Civil não previu
expressamente a figura da inexistência jurídica, razão pela qual também não fora
previsto a figura processual da ação declaratória de inexistência jurídica para expurgar
tal vício processual, o que não impede o seu ajuizamento, por ausência de vedação legal
e ser meio processual útil e adequado para impugnar o vício em questão.
Tem-se admitido, também, a ação rescisória como instrumento processual hábil para
impugnar a inexistência jurídica.
Todavia, a doutrina tem criticado, veementemente, o uso da ação rescisória, haja vista
que no caso de inexistência jurídica não há nada a ser rescindido, pois não se forma a
coisa julgada material.21
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De toda sorte, em virtude da imprecisão técnica do que vem a ser “inexistência jurídica”
e “nulidade”, a jurisprudência já se manifestou no sentido de ser cabível, também, o
ajuizamento de ação rescisória para impugnar a inexistência jurídica, mais
especificamente, o defeito processual relativo à ausência de citação.
Por fim, é possível suscitar a questão da inexistência jurídica até mesmo em processo de
execução, independentemente de propositura de embargos ou impugnação, através de
exceção (rectius: objeção, pois se trata de matéria de ordem pública) de
pré-executividade.
4 Conclusão
Do exposto, verifica-se a existência, em nosso direito pátrio, da figura processual da
inexistência jurídica, espécie de vício processual mais grave existente no processo, vício
este que ainda persiste no plano jurídico, mesmo após a aprovação do novo Código de
Processo Civil (Lei 13.105/2015).
Como se viu, a inexistência jurídica, em razão de sua natureza, tem o condão de impedir
a formação da coisa julgada material, podendo tal vício, em virtude disso, ser alegado a
qualquer tempo; no entanto, isso não quer dizer que o vício de inexistência não possa
ser sanado, haja vista que, hodiernamente, a tendência é a de que devem ser
preservados, na medida do possível, os atos processuais, sendo essa (sanabilidade) a
diretriz do novo Código de Processo Civil (Lei 13.105/2015).
Ressalta-se a importância de se distinguir a inexistência jurídica dos demais vícios
processuais, isto no plano extraprocessual, uma vez que apenas os vícios de inexistência
jurídica não estão sujeitos ao manto da coisa julgada.
Impende observar que, segundo a melhor técnica, o único instrumento processual
adequado para extirpar do universo jurídico as sentenças inexistentes é o da ação
declaratória de inexistênciajurídica, tendo em vista que o objetivo das ações
declaratórias é a de suprimir, do mundo jurídico, uma determinada incerteza jurídica.
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2 Roque Komatsu (Da invalidade no processo civil. São Paulo: Ed. RT, 1991) assevera
que o fenômeno da inexistência jurídica não se enquadra na categoria da invalidade, por
se situarem em planos diferentes.
3 Roque Komatsu (op. cit.) faz a distinção entre normas cogentes e dispositivas.
Segundo ele, são cogentes “aquelas normas jurídicas que devem aplicar-se quando seus
pressupostos se deem sem que as partes possam influir sobre eles de maneira alguma”,
cabendo ao magistrado apreciar de ofício a observância destas regras. (Idem, p. 145).
De outro lado, são normas dispositivas “aquelas normas de conduta que deixam aos
destinatários o direito de dispor de maneira diversa. Não o fazendo, sujeitam-se ao que
a norma determina” (Idem, p. 146).
4 Discorda desse entendimento Ada Pellegrini Grinover, Cândido Rangel Dinamarco e
Antônio Carlos Araújo Cintra (Teoria geral do processo. 19. ed. São Paulo: Malheiros,
2003) segundo os quais a decretação de nulidade dependerá, necessariamente, de
provocação da parte interessada.
5 Teresa Arruda Alvim Wambier (Nulidades do processo e da sentença. 6. ed. São Paulo:
Ed. RT, 2007. p. 164) escreve que “a circunstância de o juiz poder manifestar-se de
ofício a respeito de uma série de matérias é típica do regime das nulidades absolutas,
como se verá, de outro lado não se pode dizer que ele esteja ‘manifestando-se de ofício’
e que sempre se trate de uma nulidade relativa...”. E conclui: “há, efetivamente,
matérias examináveis de ofício, que não são de ordem pública” (Idem, p. 165).
6 José Roberto dos Santos Bedaque (Efetividade do processo e técnica processual. São
Paulo: Malheiros, 2006. p. 457-458) nota que “no âmbito do direito processual, todavia,
parece ser irrelevante a diferença entre inexistência fática e jurídica. Em ambos os
casos, o vício verificado no procedimento somente comprometerá os atos subsequentes
se houver prejuízo. Se não, deve ser reconhecida a irrelevância da falha”.
7 Teresa Arruda Alvim Wambier (op. cit., p. 198) lembra que não se podem confundir os
planos de existência e de eficácia. Nesse lanço, “os atos inexistentes podem ser eficazes,
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tanto quanto os nulos e os anuláveis, teoricamente. Nada impede, por exemplo, que seja
movida ação de execução fundada em sentença inexistente, e se realize penhora e atos
de alienação do domínio”. Enfim, uma coisa é existir faticamente, podendo,
eventualmente, até produzir efeitos; outra é existir juridicamente.
8 DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de direito processual civil. 3. ed. São Paulo:
Malheiros, 2003. vol. 2.
9 BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Comentários ao Código de Processo Civil. 5. ed. Rio
de Janeiro: Forense, 1985. vol. 5.
10 MONIZ DE ARAGÃO, Egas Dirceu. Comentários ao Código de Processo Civil. 8. ed. Rio
de Janeiro: Forense, 1995.
11 CALMON DE PASSOS, José Joaquim. A nulidade no processo civil. Salvador: Imprensa
oficial da Bahia, 1959.
12 Thereza Alvim, apud Teresa Arruda Alvim Wambier (Nulidades do processo e da
sentença cit.), sustentaque as sentenças proferidas, apesar de ausente um pressuposto
processual negativo, também seriam consideradas inexistentes, pois, em última análise,
a situação da segunda sentença prolatada, ajuizada a despeito de haver coisa julgada ou
litispendência, equivaleria, na verdade, à falta de condição da ação de interesse de agir.
13 Essa distinção apenas ganha importância extraprocessualmente, pois são distintos o
tempo e o meio para atacar o vício processual, assim como endoprocessualmente, no
que diz respeito à decretação da nulidade ex officio.
14 Ação esta imprescritível, pois, segundo a doutrina mais abalizada, as ações
declaratórias são imprescritíveis, o que se coaduna, perfeitamente, com a natureza do
vício de inexistência jurídica, pois esta impede a formação da coisa julgada material,
podendo, portanto, ser apreciada tal matéria a qualquer tempo.
15 A querela nullitatis nasceu da fusão de dois princípios fundamentais diversos: do
princípio germânico da validade formal da sentença, segundo o qual os errores in
procedendo consideram-se de igual gravidade, e são atacáveis através de um único meio
de impugnação, e do princípio romano segundo o qual distingue-se a nulidade da
injustiça do julgado. Nesse contexto, a querela nullitatis consistia num meio de ataque
contra a sentença originada de errores in procedendo, ao passo que a appellatio
destinava-se à alegação de errores in judicando. A querela nullitatis não era recurso,
nem ação, mas invocação do officium iudicis, pois, no direito romano, os errores in
procedendo eram considerados como vícios de inexistência jurídica, sem necessidade de
algum meio de ataque. Ulteriormente, no Direito Intermédio, distinguiu-se entre querela
sanabilis, vícios sanáveis em virtude do decurso do tempo, e querela insanabilis,
destinada a atacar sentenças eivadas de vícios mais graves, não sujeitos a prazo algum.
Com o tempo, como a querela sanabilis devia ser proposta no prazo da appellatio,
acabou-se havendo fusão entre esses dois remédios. Sobre o assunto, consultar Roque
Komatsu (op. cit.).
16 TALAMANI, Eduardo. Coisa julgada e sua revisão. 7. ed. São Paulo: Ed. RT, 2002.
17 KOMATSU, Roque, op. cit.
18 BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Comentários ao Código de Processo Civil cit., 5. ed.,
vol. 5.
19 TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo. Prazos e nulidades em processo civil. 2. ed. Rio de
Janeiro: Forense, 1990.
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20 ARRUDA ALVIM WAMBIER, Teresa e MEDINA, José Miguel Garcia. O dogma da coisa
julgada: hipóteses de relativização. São Paulo: Ed. RT, 2003.
21 A rigor, nessa hipótese ventilada, faltaria à ação rescisória uma das condições da
ação, ligada ao interesse de agir.
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