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Aula 4 – Química Verde Julio C. J. Silva Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) Instituto de Ciências Exatas Depto. de Química Juiz de Fora, 2019 Química Ambiental Química Verde As atividades produtivas na área de química são normalmente de risco e potenciais causadoras de poluição A atividade química é frequentemente relacionada, direta ou indiretamente, à maioria dos chamados “desastres ambientais”, visto que trabalha com substâncias muitas vezes tóxicas e/ou inflamáveis e após um processo químico normalmente geram um “lixo tóxico” que precisa ser tratado (resíduo) ●Após um processo químico pode-se: a) encaminhar os resíduos para as estações de tratamento, onde é feito o ajuste das cargas emitidas aos parâmetros estabelecidos para os lançamentos; b) reciclar ou reutilizar os resíduos; c) incinerar os resíduos tratados. Tal abordagem é conhecida como abatimento de “fim-de- tubo” ou “ponta-de-chaminé” (end-of-pipe) Órgãos governamentais, centros de pesquisa, universidades e organizações não-governamentais monitoram o correto cumprimento desses limites ou a necessidade de revisá-los e de estabelecer limites e restrições a novas espécies Química Verde “Remediação, que, embora apresente baixa vantagem ambiental relativa se comparada com técnicas de redução na fonte, tem colaborado bastante para diminuir a velocidade de contaminação do ambiente por muitas atividades industriais” Química Verde Ao longo de tempo, vem tornando-se cada vez mais clara a necessidade do uso eficiente dos recursos Em função da redução do custo dos processos Impacto dos processos produtivos no meio ambiente e de sua sustentabilidade em médio e longo prazos 1972 – Conferência de Estocolmo (Suécia) – direito ambiental passou a ser um ramo jurídico. 1986 (CONAMA) - definiu, as responsabilidades, os critérios básicos e as diretrizes gerais para uso e implementação da Avaliação de Impacto Ambiental (AIA); Qualquer atividade modificadora do meio ambiente dependerá da elaboração do estudo do impacto ambiental (EIA) e, Respectivo relatório de impacto ambiental (RIMA), que devem ser aprovados por órgãos estaduais competentes e pelo IBAMA2 História 1987 (ONU) – Desenvolvimento sustentável; 1992 (ECO-92) - Agenda 21: compromisso com o desenvolvimento sustentável; “Desta forma, a exploração desmedida e irresponsável dos recursos naturais, bem como outras atividades antropogênicas devem ser realizadas em direção ao progresso, porém faz parte do progresso a qualidade de vida e um meio ambiente seguro.” (Agenda 21) - propõe-se a promoção de uma produção limpa juntamente com a responsabilidade empresarial. História 1990 – Busca de alternativas para minimização da geração de resíduos, em vez de tratá-los ou remediar os danos por eles causados Química verde, química limpa, química ambientalmente benigna, química autossustentável e ambientalmente amigável 1991 – nascimento da química verde (EPA - Rotas Sintéticas Alternativas para Prevenção de Poluição) História 1995 (EUA) – Prêmio: “The Presidential Green Chemistry Challenge” (PGCC); Categorias: acadêmico, pequenos negócios, rotas sintéticas alternativas, condições alternativas de reação e desenho de produtos químicos mais seguros; 1993 (Itália) - Consórcio Universitário Química para o Ambiente (INCA). História 1997 - “Green Chemistry Institute” (GCI) - Sociedade Americana de Química (“American Chemical Society, ACS”); 1997 (IUPAC - International Union for Pure and Applied Chemistry) - Conferencia em “Green Chemistry”, em Veneza; 2001 (IUPAC) - aprovou a criação do Sub-Comitê Interdivisional de “Green Chemistry” 2001 (IUPAC) - Workshop sobre Educação em “Green Chemistry”. Em 2001 (EUA), ocorreu também a Conferência CHEMRAWN XIV (“The Chemical Research Applied To World Needs”), 2000 – 2001 (IUPAC): números especiais da revista Pure and Applied Chemistry dedicados à química verde; Sociedade Real de Química Britânica (“UK Royal Society of Chemistry, RSC”) a lançou o periódico bimestral “Green Chemistry”. Química verde (Conceito): Desenho, desenvolvimento e implementação de produtos químicos e processos para reduzir ou eliminar o uso ou geração de substâncias nocivas à saúde humana e ao ambiente Tecnologia limpa (Aplicações industriais - países com indústria química bastante desenvolvida e que apresentam controle rigoroso na emissão de poluentes) Meio acadêmico (ensino e pesquisa) Química verde: Produtos e Processos relacionados: • i) Ao uso de fontes renováveis ou recicladas de matéria-prima; • ii) Ao aumento da eficiência de energia, ou a utilização de menos energia para produzir a mesma ou maior quantidade de produto; • iii) A evitar o uso de substâncias persistentes, bioacumulativas e tóxicas. Química verde: Áreas de atuação: • i) Uso de reagentes alternativos e renováveis, com o objetivo central de diminuir os reagentes tóxicos e não biodegradáveis no ambiente; • ii) Uso reagentes inócuos durante o processo de síntese para evitar perdas indesejáveis, aumentando o rendimento da produção; • iii) Na mudança de solventes tóxicos por outros solventes alternativos; • iv) No melhoramento dos processos naturais, tais como biosínteses, biocatálises; • v) No desenvolvimento de compostos seguros, isto é, com baixa toxicidade; • vi) No desenvolvimento de condições reacionais para se obter maior rendimento e menor geração de subprodutos e, por final, • vii) Na minimização do consumo de energia. Química Verde REDUÇÃO Materiais Energia Toxicidade Fontes não-renováveis Risco Resíduos Versão esquematizada daquilo que a química verde pretende conseguir Química Verde Para aplicar esses conceitos na prática, é preciso primeiro ter uma visão geral de como é um processo químico industrial, cujo esquema é apresentado abaixo: PROCESSO QUÍMICO Energia Subprodutos Produto Resíduos Solventes Reagentes Materiais de partida Química Verde Materiais de partida (as matérias-primas) são convertidos Por meio do processo químico (sequência de reações químicas e operações unitárias se separação, secagem, transporte, mistura, resfriamento ou aquecimento, necessárias para às transformações pretendidas) Produto de interesse (Por meio da adição de reagentes e solventes e do uso de energia) Com a geração simultânea de subprodutos e de resíduos Química Verde ●Atuação da química verde nesse processo genérico: a) Materiais de partida e produtos – Reduzindo quantidades e periculosidade, aumentando degradabilidade e eficiência, usando materiais renováveis; b) Reagentes e solventes – Reduzindo quantidades e periculosidade, reciclando-os e reutilizando-os, usando materiais alternativos ou eliminando seu uso. c) Energia – Otimizando seu uso (por intermédio de processos otimizados, equipamentos eficientes, redução de etapas), ou usando formas mais eficientes; d) Subprodutos – Aumentando a seletividade e a eficiência das reações. Química Verde e) Resíduos – Eliminando etapas do processo, aumentando eficiência e seletividade das reações, reduzindo periculosidade, reciclando e reutilizando. f) Processo químico – Reduzindo o número de etapas (de reações químicas e de operações unitárias necessárias), otimizando condições, usando equipamentos eficientes, reduzindo periculosidade e riscos inerentes. Os 12 princípios da química Verde 10 – Evitar produção de resíduos; 20 – Maximizar a economia de átomos; 30 – Reduzir toxicidade; 40 – Desenvolver produtos seguros e eficientes; 50 – Eliminar/melhorar solventes e auxiliares de reação; 60 – Otimizar uso deenergia; 70 – Usar fontes renováveis; 80 – Evitar derivados e múltiplas etapas; 90 – Usar catalisadores; 100 – Desenvolver produtos degradáveis; 110 – Monitorar/controlar processos em tempo real; 120 – Desenvolver processos seguros. Resumem-se à busca da redução de rejeitos, do uso de materiais e energia, do risco, da periculosidade e do custo de processos químicos. Os 12 princípios da química Verde ●Primeiro Princípio: Prevenir a formação de resíduos (no lugar de seu tratamento) “ Evitar a produção do resíduo é melhor do que tratá-lo ou “limpá-lo” após sua geração”. A avaliação da quantidade de resíduos gerados num determinado processo e a decisão sobre qual processo é menos impactante, pode não ser uma tarefa simples. Uma das maneiras de avaliar a quantidade de resíduos gerados por um processo é o fator de eficiência (fator E), proposto inicialmente por Roger Sheldom. Os 12 princípios da química Verde E = massa resíduos (Kg)/massa produto (Kg) ●Razão entre a massa de resíduos total e a massa de produto obtido num dado processo: quantos quilogramas de resíduos totais são gerados na produção de 1Kg de um produto de interesse. Devem ser considerados no cálculo dos resíduos as massas de : solvente utilizados (mesmo que sejam reciclados posteriormente), fases estacionárias para cromatografia, reagentes em excesso, efluentes líquidos e emissões gasosas geradas, catalisadores que precisem ser neutralizados ou não possam ser reaproveitados, agentes de secagem, resíduos de destilações, adsorventes, etc. Os 12 princípios da química Verde ●Além de tentar reduzir o número de reações numa sequência reacional, é necessário reduzir o número de operações unitárias associadas (purificações, separações, etc), de modo a minimizar os resíduos. Indústria Produção anual (ton.) Fator E Refino de Petróleo 106 - 108 < 0,1 Química Fina 102 - 104 5 a 50 Farmacêutica 10 - 102 25 a 100 A partir do momento em que se investe em tecnologias mais limpas de produção, não há necessidade de investimentos pesados no tratamento de resíduos, que nem sempre resolve satisfatoriamente o problema. Os 12 princípios da química Verde ●Segundo Princípio: Economia de Átomos “ Deve-se procurar desenhar metodologias sintéticas que possam maximizar a incorporação de todos os materiais de partida no produto final” Em vez de gerar subprodutos ou produtos secundários Pode ser medida pela eficiência atômica: determinada por meio da fração da massa dos reagentes que foi incorporada ao produto de interesse. Os 12 princípios da química Verde EA(%) = ap x MMp (aRi x MMRi) x 100% EA = % eficiência atômica; MMp = massa molar do produto; ap = coeficiente estequiométrico do produto na reação: MMRi = massa molar do reagente i; aRi = coeficiente estequiométrico do reagente i na reação Devemos somar as MMs de todos os reagentes utilizandos A eficiência atômica é uma medida da eficiência estequiométrica de uma reação Quantidade mínima que será necessariamente gerada toda vez que a reação for realizada, resultado de sua estequiometria Idealmente, o objetivo é utilizar reações químicas que incorporem a massa total de reagentes no produto desejado, fazendo com que o resíduo estequiométrico seja zero. Os 12 princípios da química Verde Os 12 princípios da química Verde Espécie Fórmula Molecular Massa Molar (g/mol) MM Reagentes Óleo Vegetal (1mol) C57H98O6 879,38 1.017,59 Etanol (3 mols) C2H6O 46,07 Produto Biodiesel (3mols) C20H36O2 308,50 925,5 EA(%) 90,9% Resultado: aproximadamente 10% dos átomos dos reagentes originais são perdidos em subprodutos (glicerina), apenas considerando a estequiometria da reação Não leva em consideração outros resíduos gerados (por exemplo, o catalisador básico e o ácido usados para a sua neutralização, o excesso de etanol, etc. Perdas de material original e os resíduos gerados podem ser bem maiores. Exercício: Em um laboratório de síntese orgânica, por exemplo, os estudantes devem calcular o rendimento teórico, com base no reagente limitante e, então, calcular o rendimento experimental da sua reação através da razão entre o rendimento obtido/rendimento teórico X 100. Tomemos como exemplo uma reação clássica de substituição nucleofílica, como a preparação de n-bromobutano a partir do n-butanol promovida por um ácido forte. Calcule %EA teórica e experimental da reação. Os 12 princípios da química Verde ●Terceiro Princípio: Reduzir a toxicidade (de reagentes e produtos) Métodos sintéticos e processos devem ser planejados de modo a gerar apenas substâncias que tenham pouca ou nenhuma toxicidade em organismos vivos ou efeito no meio ambiente. ●Quarto Princípio: Desenvolver produtos seguros e eficientes Produtos que tenham baixa ou nenhuma toxicidade, causem baixo ou nenhum dano ao serem introduzidos no meio ambiente e tenham uma baixa persistência, ou seja, elevada degradabilidade. Exemplo: síntese de pesticida baseado em materiais renováveis (é obtido por fermentação) que apresenta um modo de ação que atinge especificamente os insetos sensíveis, com baixa toxicidade ao homem. Os 12 princípios da química Verde CONFIRMTM, um inseticida da família das diacil-hidrazinas, eficaz no controle de lagartas lepdópteras, que atacam diversas lavouras em todo o mundo. A “EPA” classificou o CONFIRMTM como um inseticida de risco reduzido, que não traz prejuízo a outras formas de vida além daquela para a qual foi desenvolvido. SEA-NINE® (agente biocida) – antilimo para emprego na proteção de cascos de navio (4,5-dicloro-2-n-octil-4-isotiazolina-3-ona (DCOI)) Degrada rapidamente em produtos não tóxicos à vida marinha (meia-vida inferior a 1 h na água do mar) Biocida tradicional - óxido de tributilestanho, considerado mutagênico e persistente (meia vida superior a 6 meses na água do mar). Quinto Princípio: Eliminar ou tornar seguros solventes e outros auxiliares de reação Deve-se eliminar por completo, reduzir o uso (por meio de otimização, reuso ou reciclagem) e/ou periculosidade de solventes e outros auxiliares de reação. Porém, muitas reações utilizam grandes quantidades de solventes orgânicos, que são frequentemente tóxicos e nem sempre sua reutilização é viável economicamente. Muitas vezes estes solventes são descartados na água, no ar e no solo, poluindo o ambiente. Solventes verdes, como fluidos super críticos (particularmente CO2, a 31,1 oC e 73,8 atm), líquidos iônicos à temperatura ambiente e água (a água próxima do estado super crítico possui características semelhantes às da acetona, em termos de capacidade de dissolução e solvatação). Alternativamente, as reações também podem ser efetuadas na ausência de solvente, o que também é bastante desejável quando se busca a redução de resíduos. Os 12 princípios da química Verde ●Sexto Princípio: Otimizar o uso de energia O uso de energia deve ser feito da forma mais eficiente possível, quer seja através da otimização de processos (processos catalisados, feitos a temperaturas mais baixas e pressões menores), do uso de equipamentos mais eficientes ou de formas mais eficazes de energia (usar microondas no lugar de aquecimento por calor, por exemplo) A energia causa impacto ambiental para ser produzida Tanto em termos de geração de resíduos quanto de diminuição de recursos (danos históricos) Redução de seu uso irá diminuir os resíduos e impactos do processo Os 12 princípios da química Verde Sétimo Princípio: Usar fontes renováveis de matérias- primas Os recursos renováveis devem sempre ter preferência na escolha de matérias-primas e reagentes, de modo a possibilitar maior sustentabilidade do processo. Embora não sejam efetivamente biomassas, CO2 e metano são considerados renováveis, porque podem ser obtidostanto por métodos sintéticos como naturais. Glucose de milho Os 12 princípios da química Verde Oitavo Princípio: Evitar derivação desnecessária O uso de grupos protetores ou o acréscimo de etapas por meio da produção de derivados devem ser evitados. É essencial o desenvolvimento de catalisadores mais efetivos, que promova maior seletividade das reações Idealmente, uma síntese deve levar à molécula desejada a partir de: Materiais de partida de baixo custo, Facilmente obtidos, Fonte renovável, Uma única etapa, Simples e ambientalmente aceitável, Que se processe rapidamente e em rendimento quantitativo. Além disso, o produto precisa ser separado da mistura da reação com 100% de pureza. Obviamente, esta situação ainda é muito difícil de se conseguir. Entretanto, deve-se buscar esta situação ideal, evitando etapas desnecessárias, como a derivatização excessiva ●Nono Princípio: Catálise (catalisadores são preferíveis a reagentes) Catalisadores efetivamente reaproveitáveis, preferencialmente heterogêneos (em virtude da maior facilidade de separação) são preferíveis a reações feitas sem catálise (mais lentas e com maior consumo de energia) ou a catalisadores que acabam sendo consumidos no processo durante a reação. Exemplo: na obtenção do biodiesel, o catalisador básico utilizado (NaOH ou um alcoolato de sódio ou potássio) precisa ser neutralizado com ácido sulfúrico após a transesterificação Gerando um volume maior de resíduos (a base e o ácido consumidos, além do sal formado) Síntese do ácido adípico - utilizado na fabricação do nylon-6,6, presente em fibras de carpete, tapeçaria, reforço de pneus, partes de automóveis, etc. Os 12 princípios da química Verde ●Décimo Princípio: Desenvolver produtos degradáveis após o término de sua vida útil Os produtos devem ser desenvolvidos para serem ativos e estáveis durante sua vida útil, mas sofrerem degradação rápida no ambiente após o término dessa vida útil É necessário controlar o tempo de persistência de um novo material no ambiente, por meio de produtos mais degradáveis ●Décimo Primeiro Princípio: Monitorar/controlar processos em tempo real O monitoramento e o controle de processos químicos em tempo real, que utilizem técnicas analíticas e algoritmos computacionais adequados, é essencial para a otimização desses processos Evitando, assim, geração de subprodutos indesejáveis, desperdício de energia, materiais e outros elementos. Décimo Segundo Princípio: Desenvolver processos intrinsecamente seguros Processos químicos devem ser desenvolvidos com o objetivo de reduzir seu risco inerente, de modo a evitar danos extensivos caso haja um acidente ou problema com o processo. Isso inclui: -O uso de reagentes e solventes seguros, com menor periculosidade e toxicidade; -Pressões e temperaturas aceitáveis, bem controladas; -Equipamento adequado e projetado para o fim específico a que se destina; -Mecanismos de controle e monitoramento do processo, de modo que falhas ou problemas sejam detectados antes que causem maiores consequências; Caso ocorra acidente ou falha no processo, as consequências são limitadas pela própria baixa periculosidade do material, evitando tragédias. Filosofia...
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