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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO Centro de Divulgação Científica e Cultural - CDCC Exposição de ciências enquanto promotora de divulgação científica. Relatório da bolsa apresentado como exigência para obtenção de menção no projeto-título, sob orientação da Prof. Dr. Antonio Aprigio da Silva Curvel. RELATÓRIO FINAL Natã Ferraz dos Santos Nº USP: 9424378 SÃO CARLOS 2018 1. Introdução A divulgação científica é algo crucial para o crescimento científico no Brasil, despertar o interesse de alunos das mais diversas idades pela ciência e suas aplicações torna-se necessário para que esta área do conhecimento se torne mais democrática e tenha uma aceitação melhor perante a população. Dentro deste contexto as universidades públicas exercem um papel de vanguarda, uma vez que toma como tripé o ensino, pesquisa e extensão, oferecendo diversas oportunidades para pessoas que não estão diretamente ligadas ao meio acadêmico. Torna-se importante principalmente para Universidade Públicas um contato direto com a população que em grande maioria se encontra alheia a espaços científicos e pouco simpatizam com a área de ciências exatas. Neste contexto espaço de divulgação científica exercem uma importante tarefa, de aproximar o grande público do conhecimento desenvolvido na Universidade além de despertar o interesse das pessoas por diferentes áreas de conhecimento, que normalmente se encontram defasadas no sistema público de ensino. Os museus vêm desenvolvendo um papel de vanguarda no ensino através de espaços não formais, ajudando a públicos de todas as idades e realidades sociais incorporarem diversos conceito de maneira fácil, experimental, participativa e duradoura. Neste aspecto, estes espaços vêm se tornando cada vez mais qualificados para o ensino e divulgação de ciências. Nos últimos anos, os museus vêm ampliando seus objetivos e se tornando cada vez mais populares, deixando para trás o velho entendimento de que espaços como estes têm como principal função expor antiguidades e coisas de épocas passadas. Nas últimas décadas desenvolveu-se diversas atividades voltadas para os mais diversos públicos, além de exposições e espaços que também são voltados para as famílias. O centro de Divulgação Cientifica e Cultural – CDCC recebe anualmente cerca de 8.000 visitantes, sendo em grande maioria alunos de escolas públicas do próprio município, porém escolas de municípios vizinhos e até de outros estados são recebidas. Os visitantes são de diferentes faixas etárias, sendo que grande parte das visitas ocorrem com alunos que se encontram no Ensino Fundamental. Ainda assim, o CDCC recebe visitas espontâneas de famílias, dentro destas os visitantes apresentam diferentes faixas etárias, e a visita ocorre com todos juntos passando pelas mesmas experiências, porém, o espaço desenvolvido, os experimentos e a condução da visita através do monitor fazem com que a visita seja divertida e educativa para toda a família. Os espaços de exposição de ciências que compõem o CDCC foram desenvolvidos de maneira bastante abrangente, de forma que os experimentos podem ser abordados de maneiras diferentes se enquadrando a escolaridade de diferentes observadores. Neste caso o monitor tem como função, além de explicar o experimento, despertar no visitante o interesse por aquele assunto e consequentemente aproximar conceitos científicos muitas vezes abstratos e mesmos que intrínsecos do dia a dia, alheios a realidade social daquelas pessoas. 2. Objetivos O objetivo deste projeto é reportar um diálogo com um observador que se encontra no Ensino Fundamental II, dentro do simples diálogo realizado em algum dos experimentos o bolsista deverá interpretar as falas do observador e através delas determinar o nível de interesse e de entendimento sobre aquele experimento, além disso será abordada os diferentes métodos e estratégias para melhorar o entendimento de um observador no início da vida escolar e que ainda não lidou com conceitos e teorias avançadas. Desta forma torna-se necessário se apropriar de situações, conceitos e linguagens que estão presentes na realidade de uma criança para que a mesma venha entender os conceitos por trás dos experimentos e consequentemente receber tais informações de maneira qualitativa, despertando o interesse pela ciência. 3. Metodologia Durante as diversas visitas que ocorreram durante o decorrer do projeto, anotou-se diversos diálogos com diferentes visitantes, dentre toda a gama de diálogos, foi escolhido um, referente a um dos experimentos em exposição e em cima deste trabalhou-se de modo a entender os sinais deixados pelo visitante através de suas falas e a efetividade das abordagens utilizadas pelo monitor. Através desta análise de diálogo, pode-se definir a qualidade da aprendizagem e a efetividade das táticas usadas pelo monitor, visando uma melhor abordagem. 4. Resultados O CDCC apresenta diversos experimentos em sua área interna e externa, dentre a gama de experimentos o Gerador de Van de Graaff foi escolhido para o desenvolvimento do trabalho. O gerador desenvolvido em 1931 pelo cientista Robert Jamison Van de Graaff funciona como uma máquina eletrostática que gera altas tensões, estes eram usados para acelerar partículas, essa função caiu em desuso com o avanço técnico e científico porém, o mesmo apresenta uma ótima função didática, uma vez que consegue através do atrito concentrar cargas em sua esfera, essa carga pode ser transferida ao corpo de uma pessoa através do toque, dessa forma o corpo passa a ficar carregado de cargas iguais que buscam as extremidades do corpo, e consequentemente arrepiam o cabelo. Figura 1: Gerador de Van de Graaff expositivo localizado no Espaço de Física do Museu de Ciências CDCC - USP São Carlos. Instrumento utilizado para explicar conceitos físicos de energia estática. Fonte: Adaptada de (CDCC - USP, 2018) [6]. Para entender como se dá a relação do observador com o Gerador de Van de Graaff e como é possível melhorar o entendimento e a absorção de certos aspectos teóricos ligados ao funcionamento do mesmo foi anotado um diálogo realizado na sala de Física do CDCC com um aluno do Ensino Fundamental II. Torna-se importante ressaltar que para aproximar o visitante da linguagem científica por trás do experimento torna-se necessário abrir mão do vocabulário formal utilizado nos trabalhos acadêmicos e em apresentações feitas nas universidades uma vez que o visitante não está inserido neste meio e nem tem a base necessária para entender diversos conceitos abstratos. Segue abaixo o diálogo: (Visitante): Quero ver aquele ali, o que ele faz? (Monitor): Este é um gerador de energia, chamado de Gerador de Van de Graaff. Ele gera energia a partir do atrito entre dois materiais diferentes. Você já levou choque ao tocar em algum colega depois de descer no escorregador? (Visitante): Sim, uma vez que minha mãe me levou no parquinho. (Monitor): Entendi, você já fez o experimento de esfregar a caneta no cabelo e depois atrair papéis, ou de esfregar uma bexiga no corpo e depois grudá-la na parede? (Visitante): Não, mas quando eu chegar em casa vou fazer. (Monitor): Legal, essas coisas acontecem por conta da energia estática, esse tipo de energia pode ser gerado quando ocorre o atrito entre dois materiais diferentes, que é o que acontece quando você desce no escorregador, ou quando você esfrega a bexiga em uma roupa. Quando isso acontece você separa as cargas, um dos materiais vai ficar com muitas cargas positivas e outro com muitas cargas negativas. (Visitante): Entendi e para quer serve esse bastão na sua mão? (Monitor): Esse bastão é o fio terra, a função dele é pegar esse excesso de cargas e jogar lá em baixo da terra, por isso que vc pode colocar a mão sem levar um choque. (Visitante): Entendi, mas porqueeu levaria um choque? (Monitor): Você já ouviu alguém falar que os opostos se atraem? (Visitante): Sim, já ouvi isso na “tv”. (Monitor): Então as cargas que estão aqui nessa bola, serão atraídas pelas cargas opostas que estão em você, e a atração é tão forte que elas saem daqui em direção ao seu corpo e você acaba levando um choque, por isso antes de colocar a mão eu devo colocar o fio terra. (Visitante): Entendi, não quero levar choque. Posso “pôr a mão”? (Monitor): Sim, mas você só pode tirar a mão quando eu falar. (Visitante): Por que? (Monitor): Porquê se você sair antes, vai sair carregado e vai levar um choque. (Visitante): Nossa! meu cabelo está arrepiando, olha mãe! (Monitor): Lembra, os opostos se atraem, e os iguais se repelem, seu cabelo está cheio de cargas iguais se repelindo, por isso ele levanta. (Visitante): Entendi, posso tirar a mão agora? (Monitor): Sim. A partir do diálogo realizado é possível extrair diversas informações sobre a aprendizagem do observador, este tipo de análise é possível baseando-se no estudo sobre diálogos de aprendizagem realizado por Allen (2002), segundo o estudo, os diálogos de aprendizagem podem ser encaixados em categorias que são: ● Conversa perceptiva: diálogos que estimulam o visitante a observar de maneira construtiva o espaço a seu redor. ● Conversa conceitual: diálogos que visam capturar interpretações cognitivas do que está sendo visualizado. ● Conversa conectiva: diálogos que relacionam o que está sendo apresentado ao visitante a sua vida pregressa. ● Conversa estratégica: diálogos que visam explicar de maneira clara ao visitante a forma correta de participar e interagir com a exposição. ● Conversa afetiva: diálogos que tem por objetivo extrair informações afetivas do visitante para com a exposição. Fica clara que na maior parte do tempo utilizou-se da conversa conectiva, essa categoria de diálogo de aprendizagem não se faz presente em todos os experimentos presentes na exposição porém, quando se trata do Gerador de Van de Graaff ela se torna necessário abrir mão de uma simples explicação teórica principalmente quando o observador é apenas uma criança, os conceitos teóricos se tornam extremamente abstratos para uma criança, tornando o diálogo em algo não qualitativo. Portanto, para que haja algum acúmulo pedagógico é necessário incluir a realidade do experimento na vida daquela criança de forma que se consiga conectar e aproximar os fenômenos físicos presentes na exposição a vida do observador. Desta forma ocorre uma reflexão maior por parte do observador que consegue de maneira rápida associar o experimento e sua imensa carga teórica a sua vida pregressa. Fatos como levar um choque ao tocar em um colega, ou colar uma bexiga na parede são marcantes na vida de uma criança, mais marcantes ainda são os questionamentos sobre estes fenômenos e como eles acontecem, se utilizar desta curiosidade para explicar como funciona um gerador de energia se mostra uma boa técnica pois enraíza a explicação na mente do observador. Para além disto é possível encontrar em alguns momentos as conversas estratégicas, essas se fazem necessárias para melhorar a experiência do visitante, no caso do gerador de Van de Graaff, existe um pequeno risco do participante receber algumas pequenas descargas elétricas em função da atração entre as cargas, este acontecimento acaba amedrontando os visitantes fazendo com que sua participação ocorre de maneira tensa e temerosa, isto acaba diminuindo a absorção de conhecimento do mesmo uma vez que sua concentração está totalmente depositada em seu receio de se machucar. É importante ressaltar que cada experimento dentro da exposição apresenta suas peculiaridades, de forma que o diálogo de aprendizagem que foi amplamente utilizado para se abordar o Gerador de Van de Graaff não necessariamente será utilizado nos demais experimentos. Desta forma, não é possível estabelecer qual dos diálogos é mais favorável para abordar os tópicos do CDCC, para além disto é preciso entender que a realidade social, material e a idade do visitante acaba moldando a visita, portanto, estes aspectos são fundamentais na escolha do diálogo de aprendizagem. 5. Análise Durante o desenvolver do projeto diversas mudanças na abordagem foram lapidadas, é possível dizer que o processo pode ser dividido em três etapas, a primeira se dá como um período de aprendizagem onde o monitor recém chegado aprende na teoria e na prática como funcionam os experimentos dispostos na exposição, ao fim desta etapa o monitor já tem total domínio dos conceitos que envolvem cada experimento e de como manipulá-los. A segunda etapa é introduzida assim que o monitor domina os experimentos mas ainda está evoluindo em sua abordagem aos visitantes, isso ocorre pois como citado anteriormente o CDCC recebe visitantes de todas as faixas etárias e com as mais variadas realidades socioeconômicas, de forma que a vida pregressa de cada visitante tem papel fundamental na visita, e cabe ao monitor entender a relação entre a realidade dos visitantes e o bom progresso das visitas, portanto a segunda etapa vai além de possuir total domínio dos experimentos, nesta o monitor compreende qual é a melhor maneira de abordagem cada visitante visando sempre uma visita sadia, interessante e que desperte ainda mais o interesse dos visitantes. A terceira etapa se inicia quando o monitor está munido da capacidade de operar os experimentos e de abordar corretamente os diferentes tipos de visitantes, nesta etapa se inicia a busca por uma visita mais crítica e qualitativa, tentando expor o máximo de informações dos experimentos e sempre que possível relacionando os conceitos abordados no experimentos com situações cotidianas ou que fazem parte da vida dos visitantes mesmo que indiretamente. Nesta etapa a visita deixa de ser algo parecido como uma entrevista onde o visitante somente faz as perguntas e o monitor responde pois, o monitor tem total capacidade de estabelecer um diálogo onde as perguntas surgirão dos dois sentidos (monitor-visitante/visitante-monitor), e o diálogo estabelecido facilitará o entendimento do visitante e ajudará o monitor na elaboração de sua retórica, visando sempre oferecer o melhor aproveitamento possível para o visitante. 6. Conclusões Ao longo do projeto foi possível perceber a importância que o diálogo estabelecido entre o monitor e o visitante é algo crucial para a construção de uma visita com o máximo de aproveitamento. Apesar da importância de se estabelecer qual dos tipos de diálogo de aprendizagem foram utilizados para se explicar o Gerador de Van de Graaff fica claro que é impossível de se estabelecer um padrão de apresentação a ser totalmente seguido uma vez que no decorrer da visita são encontradas diversas variáveis importantíssimas como a idade do visitante e sua escolaridade, sua condição socioeconômica e até mesmo sua experiências pessoais. Portanto, é possível concluir que a visita a um espaço de difusão científica como o CDCC funciona de maneira orgânica, e é crucial que haja uma interação construtiva entre o monitor e o visitante, mesmo que todos os visitantes se limitassem a uma mesma faixa etária, fatores como a escolaridade, e a condição social de cada visitante modificam a absorção de conhecimento de cada um porém, o uso de diálogos de aprendizagem e a categorização dos diálogos apresentam um papel importante para auxiliar o monitor fazendo com que o mesmo elabore estratégias didáticas com o intuito de aproximar o experimento e o conhecimento científico da realidade de cada visitante. De certa forma, para que haja um bom aproveitamento por parte do visitante é necessário que o monitor se apresenta de maneira informal, conduzindo a visita nos moldes de uma conversa descontraída, extraindo informações sobre a vida e o cotidiano do visitante para introduziros diálogos e conceitos de maneira qualitativa e permanente. 7. Referências [1] Allen, S. (2002): Looking for Learning in Visitor Talk: A Methodological Exploration, en: Leinhardt, G., K. Crowley, and K. Knutson, (Eds.), Learning Conversations in Museums, Nueva Jersey, LEA Publishers, p. 259-301. [2] AS PERGUNTAS NAS VISITAS ORIENTADAS A MUSEUS, EXPOSIÇÕES ITINERANTES E FEIRAS DE CIÊNCIAS. Maringa, Paraná: [s.n.], 2016. Disponível em: <http://www.sbenbio.org.br/wordpress/wp-content/uploads/renbio- 9/pdfs/2631.pdf>. Acesso em: 05 jul. 2018. [3] BERTHONI RIBEIRO LEITE, FRANKLIN. MONTAGEM DO GERADOR DE VAN DE GRAAFF PARA O USO EM ATIVIDADES EXPERIMENTAIS NO ENSINO DE FÍSICA. 2015. 25 p. Dissertação (Licenciatura em ciências exatas) - FACULDADE UnB DE PLANALTINA, Universidade de Brasilia, Planaltina, 2015. [4] CAJAS, FERNANDO. ALFABETIZACIÓN CIENTÍFICA Y TECNOLÓGICA: LA TRANSPOSICIÓN DIDÁCTICA DEL CONOCIMIENTO TECNOLÓGICO. 2001. 12 p. Dissertação (ENSEÑANZA DE LAS CIENCIAS) - (American Association for the Advancement of Science, AAAS, Washington DC, 2001. [5] RODRIGUES, Luciana Cantarino; BARRERA, Sylvia Domingos. Auto-eficácia e desempenho escolar em alunos do ensino fundamental. Psicol. pesq., Juiz de Fora, v. 1, n. 2, p. 41-53, dez. 2007. Disponível em <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1982- 12472007000200006&lng=pt&nrm=iso>. acessos em 05 ago. 2018 [6] CDCC - USP (São Carlos) (Comp.). Exposição de Ciências: Espaço de Física. Adapatada. Disponível em: <http://cdcc.usp.br/exposicoes/index.html>. Acesso em: 06 ago. 2018.
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