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• • • Transferência de Energia no Corpo OBJETIVOS DO CAPÍTULO Identificar os fosfatos de alta energia e discutir as suas contribuições para a energização do trabalho biológico Quantificar as reservas corporais de trifosfato de adenosina (ATP) e de fosfocreatina (PCr) e citar exemplos de atividades físicas nas quais cada fonte energética predomina Esboçar o transporte de elétrons-fosforilação oxidativa • • • • • • • • • • • 1. 2. Discutir o papel do oxigênio no metabolismo energético Listar as importantes funções dos carboidratos no metabolismo energético Descrever a liberação de energia celular durante o metabolismo anaeróbico Realçar as eficiências na conservação de energia do metabolismo aeróbico versus anaeróbico Discutir a dinâmica da formação de lactato e seu acúmulo no sangue durante o aumento da intensidade do exercício Descrever o papel do ciclo do ácido cítrico no metabolismo energético Esboçar as vias gerais para a liberação de energia durante o catabolismo de macronutrientes Comparar o rendimento de ATP a partir do catabolismo de uma molécula de carboidrato, gordura e proteína Discutir o papel do ciclo de Cori no metabolismo energético do exercício Delinear as interconversões entre carboidratos, gorduras e proteínas Explicar a frase: “As gorduras queimam em uma chama de carboidratos” O corpo humano precisa de um suprimento contínuo de energia química para manter numerosas funções fisiológicas complexas. A energia oriunda da oxidação do alimento não é prontamente liberada quando se atinge uma determinada temperatura, como ocorre quando materiais orgânicos são incinerados e liberam calor. O organismo, diferentemente de um motor mecânico, não consegue utilizar a energia térmica. Se o organismo requisitasse somente energia térmica, os líquidos corporais ferveriam e os tecidos queimariam em chamas. Na verdade, a dinâmica da energia humana envolve a transferência de energia por intermédio de ligações químicas. A energia potencial contida nas ligações dos carboidratos, das gorduras e das proteínas é liberada por etapas em pequenas quantidades graças à clivagem das ligações químicas. Parte dessa energia é conservada quando são formadas novas ligações durante as reações controladas por enzimas no ambiente aquoso frio das células. A energia perdida por uma molécula é transferida para a estrutura química de outras moléculas sem aparecer na forma de calor. Isso confere alta eficiência às transformações energéticas. O trabalho biológico ocorre quando compostos pobres em energia potencial são “enriquecidos” pela transferência de energia através das ligações de fosfato de alta energia. De certo modo, as células recebem toda a energia de que necessitam. A história de como o organismo mantém seu fornecimento contínuo de energia se inicia com o ATP, que é a molécula carreadora especial de energia livre. ENERGIA DAS LIGAÇÕES FOSFATO TRIFOSFATO DE ADENOSINA: MOEDA CORRENTE DA ENERGIA A energia contida nos alimentos não é transferida diretamente às células para a realização de um trabalho biológico. A energia proveniente da oxidação dos macronutrientes é recolhida e conduzida através do composto rico em energia trifosfato de adenosina (ATP). A energia potencial nessa molécula de nucleotídeo aciona todos os processos celulares que precisam de energia. Em essência, o papel de doador de energia-receptor de energia do ATP representa as duas principais atividades transformadoras de energia da célula: Extrair a energia potencial dos alimentos e conservá-la nas ligações do ATP. Extrair e transferir a energia química contida no ATP para acionar o trabalho biológico. O ATP é o agente ideal para a transferência de energia. Ele retém em suas ligações fosfato uma grande parte da energia potencial da molécula original do alimento. O ATP transfere também prontamente essa energia retida para outros compostos a fim de conferir-lhes um nível mais alto de ativação. A célula contém outros compostos de alta energia (p. ex., fosfoenolpiruvato; 1,3-difosfoglicerato; fosfocreatina), porém o ATP ainda é o mais importante. A FIGURA 6.1 mostra como o ATP é formado a partir de uma molécula de adenina e de ribose (denominada adenosina) unida a três fosfatos (trifosfato), cada um deles consistindo em átomos de fósforo e de oxigênio. As ligações que unem os dois fosfatos mais externos (simbolizadas como ) representam as ligações de alta energia, pois liberam energia útil durante a hidrólise. A energia liberada impulsiona as funções corporais, incluindo secreção glandular, digestão, síntese de tecidos, função circulatória, ação muscular e transmissão nervosa. Nos músculos estriados esqueléticos, a energia estimula locais específicos dos elementos contráteis a ativarem os motores moleculares que fazem com que as fibras musculares contraiam. Um novo composto, o difosfato de adenosina (ADP), é formado quando o ATP se combina com a água, o que é catalisado pela enzima adenosina trifosfatase (ATPase). A reação cliva a ligação fosfato mais externa do ATP para liberar um fosfato inorgânico e aproximadamente 7,3 kcal de energia livre ou –ΔG (i. e., energia disponível para o trabalho) por mol de ATP hidrolisado para ADP. O símbolo ΔG refere- se à mudança padronizada de energia livre medida em condições laboratoriais (25°C; pressão de uma atmosfera; concentrações mantidas em 1 molal para um pH = 7,0). Apesar de as condições laboratoriais padronizadas só serem conseguidas raramente no corpo, essa expressão de mudança da energia livre permite fazer comparações em diferentes condições. No ambiente intracelular, esse valor pode aproximar-se de 10 kcal/mol. A energia livre liberada na hidrólise do ATP reflete a diferença de energia entre o reagente e os produtos finais. Essa reação gera muita energia livre, o que torna o ATP um composto fosfato de alta energia. Raramente, mais energia é liberada quando outro fosfato é separado do ADP. Em algumas reações de biossíntese, o ATP doa simultaneamente seus dois fosfatos terminais para formar um novo material celular. A molécula remanescente, monofosfato de adenosina (AMP), só tem um grupo fosfato. A energia liberada durante a degradação do ATP é transferida diretamente para outras moléculas que necessitam de energia. A energia proveniente da hidrólise do ATP aciona todas as formas de trabalho biológico; assim, o ATP constitui a “moeda corrente da energia” das células. A FIGURA 6.2 ilustra o papel do ATP como moeda energética para o trabalho biológico da síntese de macronutrientes em processos anabólicos (endergônicos) e sua reconstrução subsequente a partir de ADP e o íon fosfato (Pi) por intermédio da oxidação dos macronutrientes armazenados pelos processos catabólicos ou exergônicos. O ATP é clivado quase instantaneamente sem a necessidade do oxigênio molecular. Essa capacidade de hidrolisar o ATP sem oxigênio (anaerobicamente) gera transferência rápida de energia. Os exemplos de movimentos corporais que exigem esse tipo de energia “rápida” são um “pique” (sprint)de 10 s para pegar um ônibus, o levantamento de um objeto, uma tacada de golfe, o bloqueio no voleibol ou a realização de um exercício com apoio de frente ou de flexão e extensão. Em cada caso, o metabolismo energético prossegue de forma ininterrupta, pois a energia necessária para a atividade deriva quase exclusivamente da hidrólise intramuscular do ATP. FIGURA 6.1 Estrutura do ATP, a moeda corrente energética que aciona todas as formas de trabalho biológico. O símbolo representa as ligações de alta energia. O corpo sempre procura manter um suprimento contínuo de ATP por diferentes vias metabólicas; algumas estão localizadas no citosol (citoplasma) da célula, enquanto outras operam no interior das mitocôndrias (FIGURA 6.3). Por exemplo, o citosol contém as vias para a produção de ATP a partir da degradação anaeróbica de PCr, glicose, glicerol e o arcabouço de carbono de alguns aminoácidos desaminados. Na mitocôndria, os processos reativos utilizam (recolhem) a energia celular para a geração aeróbica de ATP (ver “Oxidaçãocelular”, adiante), o ciclo do ácido cítrico e a cadeia respiratória através da membrana interna (observe a seta apontando para o espaço intermembranar). ATP | Uma moeda corrente limitada As células contêm pouco ATP e, portanto, têm de ressintetizá-lo continuamente de modo a acompanhar a taxa de utilização. Apenas em condições de atividade física extrema os níveis de ATP no músculo estriado esquelético sofrem redução. Um aporte limitado de ATP proporciona um mecanismo biologicamente útil para regular o metabolismo energético. Graças a manutenção de pouco ATP, a concentração relativa de ATP (e as concentrações correspondentes de ADP, Pi e AMP) modifica- se rapidamente em resposta a redução apenas mínima no ATP. Qualquer aumento na demanda de energia rompe imediatamente o equilíbrio entre ATP, ADP e Pi. O desequilíbrio estimula a degradação de outros compostos que contêm energia armazenada para ressintetizar o ATP. Dessa maneira, o início do movimento muscular ativa rapidamente vários sistemas que aumentarão a transferência de energia. O aumento da transferência de energia depende da intensidade do movimento. A transferência de energia aumenta cerca de quatro vezes na transição da posição sentada em uma cadeira para uma caminhada lenta. Quando se passa de uma caminhada lenta para um sprint, é acelerada quase imediatamente em cerca de 120 vezes a velocidade de transferência de energia nos músculos ativos. FIGURA 6.2 Interações entre catabolismo e anabolismo. A reciclagem contínua de ATP para o trabalho biológico de síntese de macronutrientes (processos anabólicos ou endergônicos) e sua reconstrução subsequente a partir de ADP e de um íon fosfato (Pi) por intermédio da oxidação dos macronutrientes armazenados (processos catabólicos ou exergônicos). FIGURA 6.3 Várias formas de produzir ATP. O corpo mantém um aporte contínuo de ATP por intermédio de vias metabólicas diferentes: algumas estão localizadas no citosol da célula enquanto outras operam na mitocôndria. As reações que fornecem energia celular para a geração aeróbica de ATP – o ciclo do ácido cítrico e a cadeia respiratória (incluindo a betaoxidação) – ocorrem na mitocôndrias. (Adaptada com permissão de McArdle WD, Katch FI, Katch VL. Sports and Exercise Nutrition, 4th Ed. Philadelphia: Wolter Kluver Health, 2013.) Em condições normais de repouso, o corpo armazena somente 80 a 100 g de ATP em qualquer momento. Essa quantidade torna disponível a cada segundo aproximadamente 2,4 mmol de ATP por quilograma de músculo estriado esquelético, ou cerca de 1,44 × 1010 moléculas de ATP. Isso representa energia intramuscular armazenada suficiente para acionar vários segundos de atividade física de alto impacto. O ATP isoladamente não representa uma reserva significativa de energia. Isso proporciona uma vantagem, devido ao peso relativamente alto da molécula de ATP. Uma pessoa sedentária ressintetiza diariamente ATP igual a aproximadamente 75% da massa corporal. Para atletas de endurance, que geram 20 vezes o gasto energético de repouso em uma corrida de maratona com duração de 2,5 h, isso corresponde a ressíntese de 80 kg de ATP durante a corrida. Para ter-se uma ideia da enorme produção de ATP durante o período de uma vida inteira (admitindo-se um peso corporal de 80 kg e um estilo de vida relativamente sedentário durante um período de 50 anos após os 20 anos de idade), a produção total de ATP (60 kg diários durante 50 anos) será igual ao peso aproximado da decolagem de dois aviões Boeing 787 Dreamliner. FOSFOCREATINA: O RESERVATÓRIO DE ENERGIA Para superar sua limitação de armazenamento, a ressíntese de ATP prossegue ininterrupta e continuamente, a fim de suprir a energia necessária para todo o trabalho biológico do corpo. A gordura e o glicogênio representam as principais fontes de energia para manter a ressíntese de ATP quando este se torna necessário. Alguma energia para a ressíntese do ATP provém também diretamente da cisão anaeróbica de um fosfato proveniente da fosfocreatina (fosfato de creatina – PCr), outro composto fosfato intracelular de alta energia. A FIGURA 6.4 ilustra esquematicamente a liberação reversível e a utilização da energia das ligações fosfato no ATP e na PCr. O termo fosfato de alta energia descreve esses compostos. Especificidade de treinamento do sistema energético imediato O treinamento físico aumenta a quantidade de fosfatos altamente energéticos musculares. O treinamento mais efetivo utiliza repetições com duração de 6 a 10 segundos com movimentos máximos em uma atividade específica, fazendo com que a capacidade de geração rápida de energia aumente. As moléculas de PCr e de ATP compartilham uma característica semelhante; muita energia livre é liberada quando é clivada a ligação entre as moléculas de creatina e de fosfato da PCr. A seta bidirecional na Figura 6.4 indica uma reação reversível. Em outras palavras, o fosfato (P) e a creatina (Cr) voltam a unir-se para formar PCr. Isso se aplica também ao ATP: ADP mais P voltam a formar ATP. Como a PCr tem mais energia livre da hidrólise que o ATP, sua hidrólise (catalisada pela enzima creatinoquinase – 4 a 6% na membrana mitocondrial externa, 3 a 5% no sarcômero e 90% no citosol) aciona a fosforilação do ADP para ATP. As células armazenam aproximadamente 4 a 6 vezes mais PCr que ATP. A fonte de energia para o exercício breve de alto impacto Para compreender a importância dos fosfatos de alta energia intramusculares na atividade física, pense em atividades cujo êxito dependa de salvas de energia curtas e intensas. Essas atividades incluem futebol, tênis, pentatlo, golfe, vôlei, hóquei sobre grama, beisebol, halterofilismo e corte de madeira, que frequentemente exigem salvas de esforço máximo que duram até 8 s. FIGURA 6.4 ATP e PCr proporcionam fontes anaeróbicas da energia das ligações fosfato. A energia liberada pela hidrólise (divisão) de PCr reúne ADP e Pi para formar ATP. (Adaptada com permissão de McArdle WD, Katch FI, Katch VL. Sports and Exercise Nutrition. 4th Ed. Philadelphia: Wolters Kluwer Health, 2013.) Os aumentos transitórios do ADP na unidade contrátil do músculo durante o exercício desviam a reação catalisada pela creatinoquinase no sentido da hidrólise de PCr e da produção de ATP (a reação superior na Figura 6.4); a reação não necessita de oxigênio e alcança um rendimento máximo de energia em cerca de 10 s.39 Assim, a PCr funciona como um “reservatório” de ligações fosfato de alta energia. A rapidez de fosforilação de ADP ultrapassa consideravelmente a transferência de energia a partir do glicogênio muscular armazenado, por causa da elevada taxa de atividade da creatinoquinase.18 Se o esforço máximo continuar por mais de 10 s, a energia para a ressíntese do ATP tem de provir do catabolismo menos rápido dos macronutrientes armazenados. O Capítulo 23 aborda o potencial para a suplementação com creatina exógena a fim de aprimorar o desempenho no exercício de alto impacto e curta duração. A reação de adenilatoquinase representa outra reação mediada por uma única enzima para a regeneração do ATP. A reação utiliza duas moléculas de ADP para produzir uma única molécula de ATP e de AMP, da seguinte maneira: As reações catalisadas por adenilatoquinase e creatinoquinase (reação inferior na Figura 6.4) não apenas ampliam a capacidade do músculo estriado esquelético em aumentar rapidamente a produção de energia (disponibilidade de ATP), mas também produzem os subprodutos moleculares AMP, Pi e ADP que ativam os estágios iniciais do catabolismo do glicogênio e da glicose e as vias de oxidação celular (respiração) da mitocôndria. OXIDAÇÃO CELULAR A maior parte da energia para a fosforilação deriva da oxidação (“queima biológica”) dos macronutrientes dietéticos representados por carboidratos, lipídios e proteínas. Convém lembrar do Capítulo 5 que uma molécula é reduzida quando aceita elétrons de um doador de elétrons. Por sua vez, a molécula que fornece o elétron é oxidada. As reações de oxidação (aquelas que doam elétrons) e as reações de redução (aquelasque aceitam elétrons) continuam acopladas e constituem o mecanismo bioquímico subjacente ao metabolismo energético. Esse processo proporciona continuamente átomos de hidrogênio provenientes do catabolismo dos macronutrientes armazenados. As mitocôndrias (que constituem as “usinas energéticas” da célula) contêm moléculas carreadoras que removem elétrons do hidrogênio (oxidação) e acabam transferindo- os para o oxigênio (redução). A síntese de ATP ocorre durante as reações de oxidação-redução (redox). Transporte de elétrons A FIGURA 6.5 ilustra o esquema geral para a oxidação do hidrogênio e o transporte concomitante de elétrons para o oxigênio. FIGURA 6.5 Esquema geral para a oxidação (remoção de elétrons) do hidrogênio e o concomitante transporte de elétrons. Nesse processo, o oxigênio é reduzido (ganho de elétrons) e ocorre a formação de água. A energia liberada aciona a síntese de ATP a partir do ADP. Durante a oxidação celular, os átomos de hidrogênio não são simplesmente liberados nos líquidos intracelulares. Na verdade, enzimas desidrogenases específicas para o substrato catalisam a liberação do hidrogênio pelo substrato nutriente. O componente coenzima da desidrogenase (habitualmente a coenzima nicotinamida adenina dinucleotídio [NAD+] que contém niacina) aceita pares de elétrons (energia) provenientes do hidrogênio. O substrato é oxidado e cede hidrogênios (elétrons), porém NAD+ ganha hidrogênio e dois elétrons, sendo reduzida para NADH; o outro hidrogênio aparece como H+ no líquido celular. A coenzima que contém riboflavina flavina adenina dinucleotídio (FAD) funciona como outro aceptor de elétrons para oxidar os fragmentos alimentares. Assim como NAD+, FAD catalisa a desidrogenação e aceita pares de elétrons. Diferentemente de NAD+, FAD transforma-se em FADH2 ao aceitar ambos os hidrogênios. NADH e FADH2 proporcionam moléculas ricas em energia, pois carreiam elétrons com alto potencial de transferência de energia. Os citocromos, uma série de carreadores de elétrons ferro-proteína dispersos nas membranas internas da mitocôndria, passam pares de elétrons carreados por NADH e FADH2. A porção correspondente ao ferro de cada citocromo existe em seu estado iônico oxidado (férrico, ou Fe3+) ou reduzido (ferroso, ou Fe2+). Ao aceitar um elétron, a porção férrica de um citocromo específico sofre redução a sua forma ferrosa. Por sua vez, o ferro ferroso doa seu elétron para o próximo citocromo, e assim sucessivamente, até o fim da linha. Nesse vai e vem entre essas duas formas de ferro, os citocromos transferem elétrons que reduzem o oxigênio para formar água. A seguir, NAD+ e FAD são reciclados para subsequente transferência de elétrons. A NADH gerada durante a glicólise é transformada novamente em NAD pelo “vai e vem” dos hidrogênios a partir de NADH e através da membrana mitocondrial. O transporte de elétrons por moléculas carreadoras específicas constitui a cadeia respiratória (ou citocromo), que é a via final comum onde os elétrons extraídos do hidrogênio passam para o oxigênio. Para cada par de átomos de hidrogênio, dois elétrons fluem pela cadeia e reduzem um átomo de oxigênio para formar uma molécula de água. Durante a passagem dos elétrons ao longo da cadeia com cinco citocromos, é liberada energia suficiente para refosforilar ADP para ATP em três dos locais. No local do último citocromo, a citocromo oxidase (citocromo aa3, com poderosa afinidade pelo oxigênio) descarrega seu elétron diretamente para o oxigênio. A FIGURA 6.6B mostra a via para a oxidação do hidrogênio, o transporte de elétrons e a transferência de energia na cadeia respiratória que libera energia livre em quantidades relativamente pequenas. Em várias das transferências de elétrons, a formação de ligações fosfato de alta energia consegue conservar energia. Cada aceptor de elétrons na cadeia respiratória tem uma afinidade progressivamente maior pelos elétrons. Em termos bioquímicos, essa afinidade pelos elétrons representa o potencial de redução de uma substância. O oxigênio, o último receptor de elétrons na cadeia de transporte, tem o maior potencial de redução. O oxigênio mitocondrial acaba acionando a cadeia respiratória e outras reações catabólicas que precisam de disponibilidade contínua de NAD+ e FAD. Fosforilação oxidativa A fosforilação oxidativa sintetiza ATP pela transferência de elétrons de NADH e FADH2 para o oxigênio. A FIGURA 6.7 ilustra como a energia gerada nas reações de transporte de elétrons bombardeia os prótons através da membrana mitocondrial interna para dentro do espaço intermembrana. O gradiente eletroquímico gerado por esse fluxo reverso de prótons através da membrana interna (observe a seta apontando para o espaço intermembrana) representa a energia potencial armazenada. Isso torna possível o mecanismo de acoplamento que une ADP e um íon fosfato para sintetizar ATP. A membrana interna da mitocôndria continua impermeável ao ATP, então o complexo proteico ATP/ADP translocase exporta a molécula de ATP recém-sintetizada. Por sua vez, ADP e Pi penetram na mitocôndria para a síntese subsequente de ATP. Os bioquímicos referem-se a essa união como acoplagem quimiosmótica, que constitui o meio endergônico primário da célula para extrair e acumular energia química nos fosfatos de alta energia. Mais de 90% da síntese do ATP ocorre na cadeia respiratória por reações oxidativas acopladas com a fosforilação. De certa maneira, a fosforilação oxidativa pode ser comparada a uma cachoeira dividida em várias cascatas separadas pela intervenção de turbinas localizadas a alturas diferentes. A FIGURA 6.6A mostra as turbinas que coletam a energia da água que cai; de maneira semelhante, a energia eletroquímica gerada durante o transporte de elétrons é represada e transferida (acoplada) ao ADP. A transferência de energia de NADH para ADP para voltar a formar ATP acontece em três locais distintos de acoplagem durante o transporte de elétrons (Figura 6.6B). A oxidação do hidrogênio e a subsequente fosforilação ocorrem da seguinte maneira: NADH + H+ + 3 ADP + 3Pi + 1/2 O2 → NAD+ + H2O + 3 ATP FIGURA 6.6 Exemplos de represamento da energia potencial. A. Na indústria, a energia da queda d’água é represada para rodar a roda d’água, que por sua vez realiza um trabalho mecânico. B. No corpo, a cadeia de transporte de elétrons remove elétrons dos hidrogênios para sua transferência final ao oxigênio. Na oxidação- redução, grande parte da energia química armazenada no átomo de hidrogênio não é dissipada em energia cinética, mas conservada no ATP. (Reimpressa com permissão de McArdle WD, Katch FI, Katch VL. Sports and Exercise Nutrition. 4th Ed. Philadelphia: Wolters Kluwer Health, 2013.) A razão de ligações fosfato formadas para átomos de oxigênio consumidos (razão P/O) reflete quantitativamente a acoplagem da produção de ATP para o transporte de elétrons. Na equação acima, observe que a razão P/O é igual a 3 para cada NADH mais H+ oxidado. Entretanto, se originalmente FADH2 doa hidrogênio, serão formadas apenas duas moléculas de ATP para cada par de hidrogênio oxidado (razão P/O = 2). Isso ocorre porque FADH2 penetra na cadeia respiratória com um nível de energia mais baixo e em um ponto além do local da primeira síntese de ATP (Figura 6.6B). Os bioquímicos ajustaram recentemente suas transposições de contabilidade no que concerne à conservação de energia na ressíntese de uma molécula de ATP nas vias aeróbicas. A energia proporcionada pela oxidação de NADH e FADH2 é responsável pela ressíntese de ADP para ATP, porém é necessária também uma quantidade adicional de energia (H+) para lançar a NADH do citoplasma na célula através da membrana mitocondrial para levar H+ até o transporte de elétron. Essa maior troca de energia decorrente do lançamento de NADH através da membrana mitocondrial reduz a produção efetiva de ATP para o metabolismo da glicose e modifica a eficiência total da produção de ATP (ver a seção “Eficiência de transporte de elétrons-fosforilação oxidativa”). A oxidação de uma única molécula de NADH produzem média apenas 2,5 moléculas de ATP. Esse valor decimal para ATP não indica a formação de meia molécula de um ATP, e sim o número médio de ATP produzido por oxidação de NADH com a energia para o transporte mitocondrial subtraída. Quando FADH2 doa hidrogênio, será formada a seguir apenas 1,5 molécula de ATP para cada par de hidrogênio oxidado. Eficiência do transporte de elétrons-fosforilação oxidativa Cada mol de ATP formado a partir de ADP conserva aproximadamente 7 kcal de energia. Como 2,5 moles de ATP são regenerados a partir de um total de 52 kcal de energia liberada para oxidar 1 mol (1 g de peso molecular) de NADH, cerca de 18 kcal (7 kcal/mol × 2,8) são conservadas como energia química. Isso representa uma eficiência relativa de 34% para represamento da energia química via transporte de elétrons-fosforilação oxidativa (18 kcal ÷ 52 kcal × 100). Levando-se em 1. 2. 3. conta que uma máquina a vapor transforma seu combustível em energia útil com eficiência de apenas aproximadamente 30%, o valor de 34% ou mais para o corpo humano representa uma taxa de eficiência relativamente alta. FIGURA 6.7 Mitocôndria: o local para o metabolismo da energia aeróbica. O transporte de elétrons gera um gradiente de prótons (H+) através da membrana mitocondrial interna. Isso produz um fluxo efetivo de prótons que irá proporcionar o mecanismo de acoplagem para acionar a ressíntese do ATP. PAPEL DO OXIGÊNIO NO METABOLISMO ENERGÉTICO Existem três pré-requisitos para a ressíntese contínua de ATP durante a fosforilação oxidativa acoplada. Satisfeitas as três seguintes condições, o hidrogênio e os elétrons percorrerão ininterruptamente a cadeia respiratória no sentido do oxigênio durante o metabolismo energético: Disponibilidade do agente redutor NADH (ou FADH2) nos tecidos. Presença do agente oxidante oxigênio nos tecidos. Concentração suficiente de enzimas e mitocôndrias para garantir que as reações de transferência de energia possam prosseguir na velocidade apropriada. Durante a atividade física intensa, a inadequação do aporte de oxigênio (condição 2) ou da velocidade de utilização (condição 3) cria um desequilíbrio entre a liberação de hidrogênio e sua oxidação final. Em ambos os casos, o fluxo de elétrons através da cadeia respiratória “retrocede”, e os hidrogênios acumulam-se ligados a NAD+ ou FAD. Na seção “Mais sobre o lactato”, descrevemos como o composto piruvato, um produto da degradação dos carboidratos, une-se temporariamente ao excesso de hidrogênios (elétrons) para formar lactato. A formação de lactato torna possível a continuidade do transporte de elétrons-fosforilação oxidativa que proporcionará energia como necessário. Metabolismo aeróbico refere-se às reações catabólicas geradoras de energia em que o oxigênio funciona como aceptor final de elétrons na cadeia respiratória e combina-se com o hidrogênio para formar água. Em um certo sentido, o 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 1. 2. 3. 1. 2. 3. 4. 5. 6. 1. termo aeróbico parece ser enganoso, pois o oxigênio não participa diretamente na síntese do ATP. Por outro lado, a presença de oxigênio no “final da linha” determina, em grande parte, a capacidade para a produção aeróbica de ATP e a possibilidade de manter um exercício de endurance intenso. Resumo A energia contida na estrutura molecular de carboidratos, gorduras e proteínas não é liberada subitamente no corpo a uma determinada temperatura. Pelo contrário, a energia é liberada lentamente em pequenas quantidades no transcorrer de reações complexas controladas enzimaticamente a fim de promover uma transferência e conservação de energia mais eficientes. Cerca de 40% da energia potencial nos nutrientes alimentares são transferidos para o composto de alta energia ATP. A separação da ligação fosfato terminal do ATP libera energia livre que aciona todas as formas de trabalho biológico. Isso transforma o ATP na moeda corrente da energia corporal, não obstante sua quantidade limitada de apenas cerca de 85 g. PCr interage com ADP para formar ATP; esse reservatório não aeróbico de alta energia reabastece o ATP quase instantaneamente. Fosforilação refere-se à transferência de energia via ligações fosfato na forma de ADP com creatina reciclados continuamente para ATP e PCr. Oxidação celular ocorre no revestimento interno das membranas mitocondriais e envolve a transferência de elétrons em NADH e FADH2 para o oxigênio. O transporte de elétrons-fosforilação oxidativa produz a transferência acoplada de energia química para formar ATP a partir de ADP mais um íon fosfato. Durante a ressíntese aeróbica do ATP, o oxigênio funciona como aceptor final de elétrons na cadeia respiratória a fim de combinar-se com o hidrogênio para formar água. LIBERAÇÃO DE ENERGIA PELOS MACRONUTRIENTES A liberação de energia no catabolismo dos macronutrientes tem uma finalidade essencial: fosforilar o ADP para voltar a formar o composto rico em energia ATP. A FIGURA 6.8 esboça três amplos estágios que resultam na liberação e na conservação de energia a ser utilizada pela célula para a realização do trabalho biológico: Estágio 1 envolve a digestão, a absorção e a assimilação de macromoléculas alimentares grandes, transformando-as em subunidades para serem utilizadas no metabolismo celular. Estágio 2 degrada aminoácido, glicose, ácido graxo e glicerol no citosol (citoplasma) em acetil-coenzima A (formada na mitocôndria) com produção limitada de ATP e de NADH. Estágio 3 na mitocôndria, a acetil-coenzima A é degradada em CO2 e H2O com considerável produção de ATP. As vias específicas de degradação diferem, dependendo do substrato do nutriente catabolizado. Nas seções seguintes mostramos como ocorre a ressíntese do ATP a partir da extração da energia potencial contida nos carboidratos, nas gorduras e nas proteínas. A FIGURA 6.9 esboça as seis fontes de energia que fornecem substrato para formação de ATP: Moléculas de triacilglicerol e de glicogênio armazenadas nas células musculares. Glicose sanguínea (derivada do glicogênio hepático). Ácidos graxos livres (derivados dos triacilgliceróis no fígado e nos adipócitos). Arcabouços de carbono dos aminoácidos intramusculares e derivados do fígado. Reações anaeróbicas no citosol na fase inicial da degradação da glicose ou do glicogênio (pequena quantidade de ATP). Fosforilação do ADP pela PCr sob controle enzimático por parte de creatinoquinase e de adenilatoquinase. LIBERAÇÃO DE ENERGIA PELOS CARBOIDRATOS A função primária dos carboidratos é suprir energia para o trabalho celular. Nossa discussão do metabolismo da energia proveniente dos macronutrientes começa com os carboidratos, por cinco razões: Os carboidratos proporcionam o único substrato dos macronutrientes cuja energia armazenada gera ATP sem oxigênio 2. 3. 4. 5. (anaerobicamente). Isso adquire importância na atividade requerendo liberação rápida de energia acima dos níveis proporcionados pelo metabolismo aeróbico. Nesse caso, o glicogênio intramuscular fornece a maior parte da energia para a ressíntese do ATP. Durante a atividade física aeróbica leve a moderada, os carboidratos proporcionam um terço das demandas energéticas do organismo. O processamento de grandes quantidades de gordura para obtenção de energia requer catabolismo mínimo dos carboidratos. A degradação aeróbica dos carboidratos para obtenção de energia ocorre mais rapidamente do que a geração de energia a partir da degradação dos ácidos graxos. Assim, a depleção das reservas de glicogênio reduz consideravelmente a produção de potência durante o exercício. No exercício aeróbico prolongado tipo corrida de maratona, com bastante frequência os atletas sentem fadiga relacionada com os nutrientes – um estado associado à depleção de glicogênio muscular e hepático (ver Capítulo 3 e 23). O sistema nervoso central necessita de um fluxo ininterrupto de carboidrato para funcionar adequadamente. O cérebro utiliza normalmente a glicose sanguínea quase exclusivamente como fonte de energia. No diabetes melito mal controlado, durante a inanição ou na baixa ingestãoprolongada de carboidratos, o cérebro adapta-se após cerca de 8 dias e passa a metabolizar gordura (na forma de cetonas) como fonte de energia alternativa. A degradação completa de um mol de glicose a dióxido de carbono e água rende um máximo de 686 kcal de energia química livre e disponível para a realização de trabalho. C6 H12O6 + 6 O2 → 6 CO2 + 6 H2O – ΔG 686 kcal · mol–1 FIGURA 6.8 Três amplos estágios da utilização dos macronutrientes no metabolismo energético. FIGURA 6.9 Fontes de energia que suprem substratos para a geração do ATP. O fígado é uma rica fonte de aminoácidos e de glicose, enquanto os adipócitos numerosas moléculas de ácidos graxos ricas em energia. Após sua liberação, a corrente sanguínea leva esses compostos até a célula muscular. A maior parte da produção de energia pelas células ocorre nas mitocôndrias. As proteínas mitocondriais realizam seus papéis de fosforilação oxidativa nas paredes membranosas internas desse elegante complexo arquitetônico. As fontes intracelulares de energia consistem nos fosfatos de alta energia ATP e PCr e nos triacilgliceróis, glicogênio e aminoácidos. A degradação completa da glicose conserva apenas parte da energia liberada na forma de ATP. Convém lembrar que a síntese de 1 mol de ATP a partir de ADP e de um íon fosfato requer 7,3 kcal de energia. A acoplagem de toda a energia proveniente da oxidação da glicose para a fosforilação teoricamente poderia formar 94 moles de ATP por mol de glicose (686 kcal ÷ 7,3 kcal/mol = 94 moles). No músculo estriado esquelético, a formação de ligações fosfato conserva apenas 34% ou 233 kcal de energia, com o restante sendo dissipado na forma de calor (ver “Eficiência do transporte de elétrons-fosforilação oxidativa). Assim sendo, a degradação de glicose gera 32 moles de ATP (233 ÷ 7,3 kcal/mol = 32 moles) com um ganho concomitante de 233 kcal de energia livre. Glicólise aeróbica versus anaeróbica Existem duas formas de degradação dos carboidratos em uma série de reações de fermentação denominadas coletivamente glicólise (“dissolução do açúcar”), ou via de Embden-Meyerhof, em homenagem aos dois químicos alemães responsáveis por sua descoberta (Otto Meyerhof [1884-1951]; 1922 Prêmio Nobel em Fisiologia ou Medicina; http://www.nobelprize.org/nobel_prizes/medicine/laureates/1922/meyerhof-bio.html e Gustav Embden [1874–1933]). Em uma forma, o lactato, formado a partir do piruvato, torna-se o produto final. Na outra forma, o piruvato continua sendo o produto final. Com o piruvato como o substrato final, o catabolismo dos carboidratos prossegue e acopla-se para degradação adicional no ciclo do ácido cítrico com subsequente produção de ATP pelo transporte de elétrons. Esse tipo de degradação do carboidrato (às vezes denominado glicólise aeróbica [com oxigênio]) é um processo relativamente lento que resulta em substancial formação de ATP. Em contrapartida, a glicólise que resulta na formação de lactato (denominada glicólise anaeróbica [sem oxigênio]) representa uma produção rápida, porém limitada, de ATP. A formação efetiva tanto de lactato quanto de piruvato depende mais das atividades glicolíticas e mitocondriais relativas que da presença de oxigênio molecular. A demanda relativa de produção rápida ou lenta de ATP determina a forma de glicólise. O processo glicolítico propriamente dito, desde o substrato inicial (glicose) até o substrato final (lactato ou piruvato), não envolve a presença de oxigênio. Concordamos com outros autores de livros-texto de fisiologia do exercício em que glicólise rápida (anaeróbica) e lenta (aeróbica) são os termos apropriados para descrever a glicólise. A degradação da glicose ocorre em dois estágios. No estágio um, a glicólise é degradada rapidamente em duas moléculas de piruvato. A transferência de energia para a fosforilação ocorre sem oxigênio (é anaeróbica). No estágio dois, o piruvato é degradado ainda mais a dióxido de carbono e água. As transferências de energia resultantes dessas reações exigem transporte de elétrons e fosforilação oxidativa concomitante (são aeróbicas). Liberação anaeróbica de energia a partir da glicose: glicólise rápida A FIGURA 6.10 ilustra o primeiro estágio da degradação da glicose na glicólise. A glicólise ocorre no meio aquoso da célula, fora da mitocôndria. Em um certo sentido, a glicólise representa uma forma mais primitiva de transferência rápida de energia altamente desenvolvida em anfíbios, répteis, peixes e mamíferos marinhos. Nos seres humanos, a capacidade da célula em termos de glicólise continua sendo crucial durante as atividades físicas com um esforço máximo por até cerca de 90 s. Na reação 1 o ATP age como doador de fosfato a fim de fosforilar a glicose 6-fosfato. Na maioria dos tecidos, isso “aprisiona” a molécula de glicose nas células. Na presença da enzima glicogênio sintase, a glicose acopla-se, ou é polimerizada, a outras moléculas de glicose para formar uma grande molécula de glicogênio (ver Figura 1.3). O fígado e as células renais, entretanto, contêm a enzima fosfatase, que cliva o fosfato a partir de glicose 6-fosfato. Isso libera a glicose da célula para ser transportada por todo o corpo. Durante o metabolismo energético, a glicose 6-fosfato é transformada em frutose 6-fosfato (reação 2). Nesse estágio, a energia ainda não foi liberada, porém alguma energia é incorporada na molécula original de glicose a expensas de uma molécula de ATP. Em um certo sentido, a fosforilação “prepara o corpo” para o metabolismo energético prosseguir. A molécula de frutose 6-fosfato ganha um fosfato adicional e transforma-se em frutose 1,6- difosfato sob o controle da fosfofrutoquinase (PFK; reação 3). O nível de atividade dessa enzima limita provavelmente a taxa da glicólise durante a atividade com um esforço máximo. A seguir, frutose 1,6-difosfato divide-se em duas moléculas fosforiladas com três cadeias de carbono (3-fosfogliceraldeído); estas sofrem decomposição adicional para piruvato em cinco reações sucessivas. As fibras musculares estriadas esqueléticas de contração rápida (tipo II) (ver Capítulo 7) contêm quantidades relativamente grandes de PFK; isso as torna perfeitamente apropriadas para a geração de energia anaeróbica através da glicólise. Metabolismo da glicose a glicogênio e do glicogênio a glicose O citoplasma das células hepáticas e musculares estriadas esqueléticas contém grânulos de glicogênio e as enzimas para a síntese do glicogênio (glicogênese) e a degradação do glicogênio (glicogenólise). Em condições normais após uma refeição, a glicose não se acumula no sangue. Pelo contrário, o excesso de glicose é incorporado de vias do metabolismo energético, é armazenado como glicogênio ou é transformado em gordura. Com uma alta atividade celular, a glicose disponível é oxidada pela via glicolítica, do ciclo do ácido cítrico e da cadeia respiratória para formar ATP. Em contrapartida, uma baixa atividade celular e/ou as reservas de glicogênio depletadas inativam enzimas glicolíticas cruciais. Isso faz com que o excesso de glicose passe a formar glicogênio. Glicogenólise descreve a clivagem da glicose a partir da molécula de glicogênio. A seguir o resíduo glicose reage com um íon fosfato para produzir glicose 6-fosfato, contornando a etapa 1 da via glicolítica. Quando o glicogênio proporciona uma molécula de glicose para a glicólise, ocorre um ganho efetivo de três ATPs em vez de dois ATPs durante a degradação da glicose. Regulação do metabolismo do glicogênio No fígado, as enzimas glicogênio fosforilase tornam-se inativas após uma refeição, enquanto a atividade de glicogênio sintase aumenta para facilitar o armazenamento da glicose obtida do alimento. Inversamente, entre as refeições, quando as reservas de glicogênio sofrem redução, a fosforilase hepática torna-se ativa (depleção concomitante da atividade de glicogênio sintase) para manter a estabilidade na glicose sanguínea a ser utilizada pelos tecidos corporais. O músculo estriado esquelético em repouso mostra atividade maior da sintase, enquanto a atividade física fazaumentar a atividade da fosforilase, com redução concomitante da enzima sintase. A epinefrina (adrenalina), um hormônio do sistema nervoso simpático, acelera a clivagem de um componente glicose de cada vez da molécula de glicogênio pela fosforilase.7,9 A cascata de glicogenólise A ação da epinefrina foi denominada cascata da glicogenólise, pois este hormônio induz ativação progressivamente maior da fosforilase a fim de garantir uma rápida mobilização do glicogênio. A atividade da fosforilase permanece no nível mais alto durante o exercício intenso, quando a atividade simpática aumenta e os carboidratos representam a fonte ideal de energia. O fluxo simpático e o subsequente catabolismo do glicogênio diminuem consideravelmente durante o exercício de intensidade baixa a moderada, quando a oxidação mais lenta dos ácidos graxos consegue manter concentrações adequadas de ATP no músculo ativo. FIGURA 6.10 Glicólise: uma série de 10 reações químicas controladas enzimaticamente produz duas moléculas de piruvato a partir da degradação anaeróbica da glicose. O lactato é formado quando a oxidação de NADH não consegue acompanhar a sua formação na glicólise. As enzimas coloridas em amarelo/púrpura desempenham um papel regulador essencial nessas reações metabólicas. (Adaptada com permissão de McArdle WD, Katch FI, Katch VL. Sports and Exercise Nutrition. 4th Ed. Philadelphia: Wolters Kluwer Health, 2013.) Fosforilação ao nível do substrato na glicólise A maior parte da energia gerada na glicólise não resulta em ressíntese de ATP, pelo contrário, é dissipada na forma de calor. Observe que, nas reações 7 e 10 na Figura 6.10, a energia liberada pelos intermediários da glicose estimula a transferência direta dos grupos fosfato para quatro moléculas de ADP, gerando quatro moléculas de ATP. Como duas moléculas de ATP contribuem para a fosforilação inicial da molécula de glicose, a glicólise gera um ganho efetivo de duas moléculas de ATP. 1. 2. 3. Isso representa uma conservação endergônica de 14,6 kcal/mol, toda ela sem a participação do oxigênio molecular. A energia transferida do substrato para o ADP por fosforilação na glicólise rápida ocorre via ligações fosfato nas reações anaeróbicas denominadas fosforilação ao nível do substrato. A conservação de energia durante essa forma de glicólise tem eficiência de aproximadamente 30%. A glicólise rápida gera apenas cerca de 5% do ATP total durante a degradação completa da molécula de glicose em energia. Exemplos de atividades que dependem fundamentalmente do ATP gerado pela glicólise rápida incluem os piques (sprints)no final da corrida de 1,6 km, a natação nas provas de 50 ou 100 m, os exercícios no aparelho para ginástica e os piques (sprint)nas provas de atletismo de até 200 m. Regulação da glicólise Três fatores regulam a glicólise: As concentrações das quatro enzimas glicolíticas-chave: exoquinase, fosforilase, fosfofrutoquinase e piruvatoquinase. Os níveis do substrato frutose 1,6-difosfato. O oxigênio, o qual, em grandes quantidades, inibe a glicólise. Além disso, o aporte de glicose às células influencia sua utilização subsequente no metabolismo energético. A glicose fica localizada no líquido extracelular adjacente para ser transportada através da membrana plasmática da célula. Uma família de cinco proteínas, denominadas coletivamente transportadores facilitatórios da glicose, medeia esse processo de difusão facilitada. As fibras musculares estriadas esqueléticas e os adipócitos contêm um transportador que depende da insulina, conhecido como Glu T4, ou GLUT 4. Em resposta tanto à insulina quanto à atividade física (independente da insulina), esse transportador migra das vesículas existentes na célula para a membrana plasmática.33 Sua ação facilita o transporte da glicose para o interior do sarcoplasma, onde é então catabolizada para formar ATP. Outro transportador da glicose, GLUT 1, é responsável pelos níveis basais de transporte da glicose para o interior do músculo. Liberação de hidrogênio em glicólise As reações glicolíticas retiram dois pares de átomos de hidrogênio do substrato da glicose e transferem seus elétrons para NAD+ a fim de formar NADH (Figura 6.10, reação 6). Normalmente, se a cadeia respiratória processasse diretamente esses elétrons, seriam formadas 2,5 moléculas de ATP para cada molécula de NADH oxidada (razão P/O = 2,5). Nas células do coração, dos rins e do fígado, o hidrogênio extramitocondrial (NADH) aparece como NADH na mitocôndria (por um mecanismo denominado lançadeira malato-aspartato). Isso produz 2,5 moléculas de ATP a partir da oxidação de cada molécula de NADH. A mitocôndria no músculo esquelético e nas células cerebrais continua sendo impermeável ao NADH formado durante a glicólise. Consequentemente, os elétrons provenientes do NADH extramitocondrial são lançados indiretamente para dentro da mitocôndria. Essa via termina quando os elétrons passam para FAD a fim de formar FADH2 (por um mecanismo denominado lançadeira glicerol-fosfato) em um ponto abaixo da primeira formação de ATP. Assim, é formada 1,5 e não três moléculas de ATP quando a cadeia respiratória oxida o NADH citoplasmático (razão P/O = 1,5). A partir de duas moléculas de NADH formadas na glicólise, quatro moléculas de ATP são geradas aerobicamente pelo subsequente transporte de elétrons-fosforilação oxidativa acoplado no músculo esquelético. Mais sobre o lactato Existe oxigênio suficiente circundando as células durante os níveis leves a moderados do metabolismo energético. Os hidrogênios (elétrons) retirados do substrato e carreados pelo NADH são oxidados nas mitocôndrias para formar água quando se unem ao oxigênio. Em um sentido bioquímico, existe um “estado estável”, ou, com maior exatidão, um “steady state”, pois o hidrogênio é oxidado com aproximadamente a mesma velocidade com que se torna disponível. Ácido láctico vesus lactato Ácido láctico (C3H6O3) e o lactato não devem ser confundidos pois são substâncias distintas. O ácido láctico é formado durante a glicólise anaeróbica que rapidamente libera o íon hidrogênio (H+). O composto remanescente se liga ao íon de sódio ou potássio com carga elétrica positiva para formar um sal ácido denominado lactato. Em condições fisiológicas, a maior parte do ácido láctico se dissocia e se apresenta como lactato. Na atividade física extenuante, quando as demandas energéticas ultrapassam tanto o aporte de oxigênio quanto sua taxa de 1. 2. 1. 2. utilização, a cadeia respiratória não consegue processar todo o hidrogênio ligado ao NADH. A liberação contínua de energia anaeróbica da glicólise depende da disponibilidade de NAD+ para oxidar 3-fosfogliceraldeído (ver reação 6, Figura 6.10); caso contrário, o ritmo rápido da glicólise “se esgota”. Durante a glicólise anaeróbica rápida, NAD+ “é liberado” ou regenerado quando pares de hidrogênios não oxidados “em excesso” combinam-se com o piruvato para formar lactato. A formação de lactato requer uma etapa adicional (catalisada por lactato desidrogenase) em uma reação reversível (como mostrado na FIGURA 6.11). Durante o repouso e a atividade física moderada, o lactato é formado continuamente de duas maneiras: Metabolismo energético das hemácias (não contêm mitocôndrias). Limitações impostas pela atividade enzimática nas fibras musculares estriadas esqueléticas com alta capacidade glicolítica. FIGURA 6.11 Em condições fisiológicas no músculo, o lactato é formado quando hidrogênios de NADH combinam- se temporariamente com piruvato. Isso libera NAD para aceitar outros hidrogênios gerados na glicólise. Qualquer lactato assim formado será oxidado dessa maneira nas fibras musculares estriadas esqueléticas vizinhas com ampla capacidade oxidativa ou nos tecidos mais distantes, como o coração e os músculos relacionados à respiração. O lactato também funciona como um precursor indireto do glicogênio hepático. Consequentemente, o lactato não se acumula, pois seu ritmo de remoção é igual a seu ritmo de produção. Os atletas de endurance mostram maior capacidade de eliminação (oude renovação) do lactato durante o exercício.22 Como discutido anteriormente, existe uma via direta para a síntese hepática do glicogênio a partir dos carboidratos da dieta. A síntese hepática do glicogênio ocorre também indiretamente pela conversão do precursor com três carbonos lactato para glicose. Eritrócitos e adipócitos também contêm enzimas glicolíticas, porém o músculo estriado esquelético as tem em maior quantidade. Assim, provavelmente grande parte da conversão de lactato em glicose ocorre nesse tecido. Essa via indireta, de lactato para a síntese hepática de glicogênio (particularmente após a alimentação), é conhecida como “paradoxo da glicose”. Abordaremos adiante neste capítulo o paradoxo da glicose como parte da lançadeira do lactato para explicar a formação, a disposição e a utilização do lactato no metabolismo dos carboidratos. O armazenamento temporário do hidrogênio com piruvato representa um aspecto ímpar do metabolismo energético, pois proporciona um “coletor” de prontidão para armazenamento temporário dos produtos terminais da glicólise rápida. Depois que o lactato é formado no músculo ele pode seguir dois caminhos diferentes: Difundir-se para o espaço intersticial e o sangue para ser tamponado e removido do local do metabolismo energético. Proporcionar um substrato gliconeogênico para a síntese do glicogênio. Dessa maneira, a glicólise rápida continua fornecendo energia anaeróbica para a ressíntese do ATP. Entretanto, essa via para a energia extra continua sendo temporária quando os níveis sanguíneo e muscular de lactato aumentam, e a formação de ATP não consegue acompanhar seu ritmo de utilização. O resultado final – a fadiga – instala-se de imediato e reduz o desempenho nos exercícios. Em condições anaeróbicas, a maior acidez intracelular medeia a fadiga, pela inativação de várias enzimas da transferência de energia e pela deterioração das propriedades contráteis do músculo estriado esquelético.2,6,17,23 Lactato: uma escória metabólica valiosa. O lactato não deve ser encarado como escória metabólica – uma crença comum chamada mitologia do ácido láctico. Pelo contrário, é uma fonte valiosa de energia química que se acumula com a atividade física intensa.12,13 Quando oxigênio suficiente se torna disponível durante a recuperação ou quando o ritmo diminui, NAD+ retira os hidrogênios ligados ao lactato para formar ATP por oxidação. Os arcabouços de carbono das moléculas de piruvato são formados novamente a partir do lactato durante a atividade (uma molécula de piruvato + dois hidrogênios formam uma molécula de lactato) ou são oxidados a energia, ou são sintetizados para glicose (gliconeogênese) no próprio músculo estriado esquelético ou no ciclo de Cori (FIGURA 6.12). O ciclo de Cori remove o lactato liberado pelos músculos ativos e o utiliza para reabastecer as reservas de glicogênio depletadas pela atividade física intensa.37 FIGURA 6.12 As reações bioquímicas do ciclo de Cori no fígado sintetizam glicose a partir do lactato liberado pelos músculos ativos. Esse processo gliconeogênico ajuda a manter as reservas de carboidratos. (Adaptada com permissão de McArdle WD, Katch FI, Katch VL. Sports and Exercise Nutrition. 4th Ed. Philadelphia: Wolters Kluwer Health, 2013.) Na atividade física intensa (> 80% da capacidade aeróbica) com catabolismo elevado dos carboidratos, o glicogênio nos tecidos inativos atende às necessidades do músculo estriado esquelético ativo. A renovação (turnover) ativa do glicogênio através do reservatório permutável do lactato progride à medida que os tecidos inativos lançam lactato na circulação. O lactato proporciona um precursor para sintetizar carboidratos (através do ciclo de Cori no fígado e nos rins) com a finalidade de preservar os níveis sanguíneos de glicose e de atender às demandas energéticas do exercício concomitante.3,22 Lançadeira do lactato: o lactato sanguíneo como fonte de energia. Os estudos com marcadores isotópicos mostram que o lactato produzido nas fibras musculares de contração rápida (e em outros tecidos) circula para outras fibras de contração rápida ou de contração lenta para ser transformado em piruvato. Por sua vez, o piruvato é transformado em acetil- CoA e penetra no ciclo do ácido cítrico (ver seção seguinte) para o metabolismo energético aeróbico. Esse processo de lançamento do lactato entre as células faz com que a glicogenólise que ocorre em uma célula possa suprir outras células com fonte de energia para a oxidação. Isso torna o músculo não apenas o principal local de produção de lactato, mas também um tecido primário para a remoção do lactato via oxidação.4,13,15 Glicólise aeróbica (lenta): ciclo do ácido cítrico As reações anaeróbicas da glicólise liberam apenas cerca de 5% da energia existente na molécula original de glicose. A extração da energia restante prossegue quando o piruvato é irreversivelmente transformado em acetil-CoA, que é uma forma de ácido acético. A acetil-CoA penetra no ciclo do ácido cítrico (também denominado ciclo de Krebs em homenagem ao seu descobridor, o químico Sir Hans Adolf Krebs, vencedor do Prêmio Nobel em 1953, ou ciclo do ácido tricarboxílico; http://www.nobelprize.org/nobel_prizes/medicine/laureates/1953/press.html), o segundo estágio do fracionamento dos carboidratos. Como demonstrado esquematicamente na FIGURA 6.13, o ciclo do ácido cítrico degrada o substrato de acetil- CoA em dióxido de carbono e átomos de hidrogênio nas mitocôndrias. As moléculas de coenzimas carreadoras reduzidas transferem o hidrogênio para a cadeia transportadora de elétrons. O ATP é formado quando os átomos de hidrogênio são oxidados durante o transporte de elétrons-fosforilação oxidativa. A FIGURA 6.14 mostra o piruvato preparando-se para entrar no ciclo de dez etapas do ácido cítrico enzimaticamente controlado pela associação com a coenzima A (A refere-se a ácido acético) para formar o composto com dois carbonos acetil- CoA. Os dois hidrogênios liberados transferem seus elétrons para NAD+ a fim de formar uma única molécula de dióxido de carbono, como segue: FIGURA 6.13 Metabolismo energético aeróbico. Fase 1. Nas mitocôndrias, o ciclo do ácido cítrico gera átomos de hidrogênio durante a degradação de acetil-CoA. Fase 2. Quantidades significativas de ATP são regeneradas quando esses hidrogênios são oxidados pelo processo aeróbico do transporte de elétrons-fosforilação oxidativa (cadeia de transporte de elétrons). (Adaptada com permissão de McArdle WD, Katch FI, Katch VL. Sports and Exercise Nutrition. 4th Ed. Philadelphia: Wolters Kluwer Health, 2013.) FIGURA 6.14 Fluxograma para a liberação de hidrogênio e de dióxido de carbono na mitocôndria durante a degradação de uma molécula de piruvato. Todos os valores são duplicados ao computar o ganho efetivo de hidrogênio e de dióxido de carbono, pois são formadas duas moléculas de piruvato a partir de uma molécula de glicose na glicólise. As enzimas coloridas em roxo são as enzimas reguladoras essenciais. (Reimpressa com permissão de McArdle WD, Katch FI, Katch VL. Sports and Exercise Nutrition. 4th Ed. Philadelphia: Wolters Kluwer Health, 2013.) Piruvato + NAD+ CoA → Acetil-CoA + CO2 + NADH+ + H+ 1. 2. 3. 4. 5. Radicais livres são formados durante o metabolismo aeróbico A passagem de elétrons pela cadeia transportadora de elétrons algumas vezes produz radicais livres, que são átomos, moléculas ou íons com um elétron desemparelhado em sua camada eletrônica mais externa, fazendo com que eles sejam altamente reativos. Esses radicais livres reativos se ligam rapidamente a outras moléculas e promovem danos às moléculas com as quais eles se combinam. A formação de radicais livres nos músculos estriados esqueléticos, por exemplo, pode contribuir para a fadiga muscular ou a dor e, até mesmo, para uma possível redução no potencial metabólico. A porção acetil de acetil-CoA combina-se com oxaloacetato para formar citrato (o mesmo composto do ácido cítrico com seis carbonos encontrado nas frutas cítricas), que a seguir prossegue através do ciclodo ácido cítrico. Esse ciclo continua operando, pois retém a molécula oxaloacetato original para combinar-se com um novo fragmento acetil que penetra no ciclo. Cada molécula de acetil-CoA que penetra no ciclo do ácido cítrico libera duas moléculas de dióxido de carbono e quatro pares de átomos de hidrogênio. Uma molécula de ATP é regenerada também diretamente por fosforilação ao nível do substrato pelas reações do ciclo do ácido cítrico (reações 7-8, Figura 6.14). Como resumido na parte inferior da Figura 6.14, a formação de duas moléculas de acetil-CoA a partir de duas moléculas de piruvato produzidas na glicólise libera quatro hidrogênios, enquanto o ciclo do ácido cítrico libera 16 hidrogênios. A função primária do ciclo do ácido cítrico gera elétrons (H1) que serão transferidos na cadeia respiratória para NAD+ e FAD. O oxigênio não participa diretamente nas reações do ciclo do ácido cítrico. A energia química existente no piruvato é transferida para o ADP pelo processo de transporte de elétrons-fosforilação oxidativa. Com uma quantidade suficiente de oxigênio, incluindo enzimas e substrato, NAD+ e FAD se regeneram, e o metabolismo do ciclo do ácido cítrico prossegue sem qualquer dificuldade. O ciclo do ácido cítrico, o transporte de elétrons e a fosforilação oxidativa representam os três componentes do metabolismo aeróbico. Transferência total de energia pelo catabolismo da glicose A FIGURA 6.15 resume as vias para a transferência de energia durante o catabolismo da glicose no músculo estriado esquelético. Dois ATP (ganho efetivo) são formados pela fosforilação ao nível do substrato na glicólise; de maneira semelhante, dois ATP emergem da degradação de acetil-CoA no ciclo do ácido cítrico. Os 24 átomos de hidrogênio liberados podem ser assim explicados: Quatro hidrogênios extramitocondriais (dois NADH) gerados na glicólise produzem cinco ATP durante a fosforilação oxidativa. Quatro hidrogênios (dois NADH) liberados na mitocôndria quando o piruvato é degrado para acetil-CoA produzem cinco ATP. Os trifosfatos de guanosina (GTP; uma molécula semelhante ao ATP) são produzidos no ciclo do ácido cítrico por meio da fosforilação ao nível do substrato. Doze dos 16 hidrogênios (6 NADH) liberados no ciclo do ácido cítrico produzem 15 ATP (6 NADH × 2,5 ATP por NADH = 15 ATP). Quatro hidrogênios que se unem ao FAD (dois FADH2) no ciclo do ácido cítrico produzem três ATP. O fracionamento completo da glicose produz um total de 34 ATP. Levando-se em conta que dois ATP são fosforilados inicialmente para glicose, 32 moléculas de ATP representam a produção efetiva de ATP a partir do catabolismo da glicose no músculo esquelético. Quatro moléculas de ATP são formadas diretamente pela fosforilação ao nível do substrato (glicólise e ciclo do ácido cítrico), enquanto 28 moléculas de ATP são geradas durante a fosforilação oxidativa. Alguns compêndios citam uma produção efetiva de 36 a 38 ATP a partir do catabolismo da glicose. A disparidade depende de qual é o sistema de lançamento (glicerol-fosfato ou malato-aspartato) que transporta NADH + H+ para dentro da mitocôndria e da produção de ATP por oxidação de H utilizada nos cálculos. Convém ajustar os valores teóricos para a produção de ATP no metabolismo energético, em vista da informação bioquímica sugerindo que pode estar havendo uma superestimativa, pois somente 30 a 32 ATP penetram realmente no citoplasma da célula. A diferenciação entre produção teórica versus real de ATP pode resultar do custo energético adicional a ser pago para transportar o ATP para fora da mitocôndria.10 O que regula o metabolismo energético? Normalmente a transferência de elétrons e a subsequente liberação de energia estão acopladas intimamente com a fosforilação do ADP. Sem disponibilidade de ADP a ser fosforilado para ATP, em geral os elétrons não percorrem a cadeia respiratória para se unirem ao oxigênio. Os metabólitos que inibem ou ativam as enzimas em pontos essenciais de controle nas vias oxidativas modulam o controle regulador da glicólise e do ciclo do ácido cítrico.14,16,28,31 Cada via contém pelo menos uma enzima considerada limitante da velocidade, pois a enzima controla a velocidade global das reações dessa via. A concentração celular de ADP exerce o maior efeito sobre as enzimas limitantes da velocidade que controlam o metabolismo energético dos macronutrientes. Esse mecanismo para o controle respiratório faz sentido, pois qualquer aumento na quantidade de ADP assinala a necessidade de fornecer energia para restaurar os níveis deprimidos de ATP. Inversamente, os altos níveis celulares de ATP indicam uma necessidade de energia relativamente baixa. De uma perspectiva mais ampla, as concentrações de ADP funcionam como um mecanismo de feedback (retroalimentação) celular destinado a manter uma constância relativa (homeostasia) no nível de moeda corrente energética exigido para a realização do trabalho biológico. Outros moduladores que limitam a velocidade incluem os níveis celulares de fosfato, o AMP cíclico, a proteinoquinase ativada por AMP (AMPK), o cálcio, NAD+, o citrato e o pH. Mais especificamente, ATP e NADH funcionam como inibidores enzimáticos, enquanto o cálcio intracelular, ADP e NAD+ funcionam como ativadores. Esse feedback químico torna possível o ajuste metabólico rápido para as necessidades energéticas das células. Na célula em repouso, a concentração de ATP ultrapassa consideravelmente a concentração de ADP em aproximadamente 500:1. Uma queda na razão ATP/ADP e na razão NADH/NAD+ intramitocondrial, como ocorre com o início do exercício, assinala a necessidade de um maior metabolismo dos nutrientes armazenados. Em contrapartida, os níveis relativamente baixos de metabolismo energético mantêm as altas razões de ATP/ADP e de NADH/NAD+, o que deprime o ritmo do metabolismo energético.1 1. 2. FIGURA 6.15 Rendimento efetivo de 32 ATP pela transferência de energia durante a oxidação completa de uma molécula de glicose na glicólise, no ciclo do ácido cítrico e no transporte de elétrons. (Adaptada com permissão de McArdle WD, Katch FI, Katch VL. Sports and Exercise Nutrition. 4th Ed. Philadelphia: Wolters Kluwer Health, 2013.) Efeitos independentes. Nenhum regulador químico isolado domina a produção mitocondrial de ATP. Experiências in vitro (ambiente artificial fora do organismo vivo) e in vivo (no organismo vivo) mostram que as mudanças em cada um desses compostos alteram independentemente a velocidade da fosforilação oxidativa. Todos eles exercem efeitos reguladores, cada um contribuindo de maneira diferente em conformidade com as demandas energéticas, as condições celulares e o tecido específico envolvido. LIBERAÇÃO DE ENERGIA PELAS GORDURAS A gordura armazenada representa a mais abundante fonte corporal de energia potencial. Em relação aos carboidratos e às proteínas, a gordura armazenada proporciona uma quantidade quase ilimitada de energia. As reservas de energia provenientes das gorduras em um homem adulto jovem típico provêm de duas fontes principais: Entre 60.000 e 100.000 kcal (energia suficiente para acionar cerca de 25 a 40 corridas de maratona) dos triacilgliceróis existentes nas células adiposas (adipócitos) estão distribuídas pelo corpo (ver Capítulo 28). Cerca de 3.000 kcal dos triacilgliceróis intramusculares (12 mmol/kg de músculo). Em contrapartida, as reservas energéticas de carboidratos em geral correspondem a menos de 2.000 kcal.
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