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1 FACULDADE FACI | WYDEN CURSO DE DIREITO DEIVAN CRÍSTIAN RODRIGUES DE SOUSA A FACULTATIVIDADE DA CONTRIBUIÇÃO SINDICAL: Uma análise dos reflexos à luz da garantia do Direito Fundamental à Liberdade Sindical. BELÉM-PA 2018 DEIVAN CRISTIAN RODRIGUES DE SOUSA A FACULTATIVIDADE DA CONTRIBUIÇÃO SINDICAL: Uma análise dos reflexos à luz da garantia do Direito Fundamental à Liberdade Sindical. Artigo apresentado ao curso de graduação em Direito da Faculdade Faci | Wyden, para a obtenção de nota parcial na disciplina Ordem Trabalhista, sob a orientação da Prof.ª Ms. Gláucia Kelly Cuesta da Silva. BELÉM-PA 2018 A FACULTATIVIDADE DA CONTRIBUIÇÃO SINDICAL: Uma análise dos reflexos à luz da garantia do Direito Fundamental à Liberdade Sindical. Deivan Cristian Rodrigues de Sousa RESUMO Fruto das inquietações sobre a mudança na contribuição sindical trazida pela reforma trabalhista, este artigo com o tema: A facultatividade da contribuição sindical: uma análise dos reflexos à luz da garantia do direito fundamental à liberdade sindical, tem como objetivo principal, analisar a reforma trabalhista no que diz respeito a facultatividade da contribuição sindical, na perspectiva de saber quais os possíveis impactos e/ou reflexos para a organização sindical e sua liberdade enquanto direito fundamental. Para o alcance desse objetivo, utilizou-se como metodologia a pesquisa bibliográfica com leitura de artigos, revistas e demais referencias sobre o tema. O trabalho discute a origem, definição e destinação da contribuição sindical, o direito fundamental à liberdade sindical e analisa os possíveis reflexos da facultatividade da contribuição sindical, tendo como principais conclusões os principais reflexos levantados no decorer do trabalho. Palavras-chave: Contribuição sindical, facultatividade, reflexos, liberdade, direito Discente do sétimo semestre do curso de Direto da Faculdade Faci|Wyden; Servidor Público da Universidade Federal do Pará-UFPA no cargo de Assistente em Administração, lotado no Instituto de Ciências Jurídicas - ICJ. ABSTRACT As a result of the concerns about the change in the union contribution brought by the labor reform, this article with the theme: The facultativity of the union contribution: an analysis of the reflexes in light of the guarantee of the fundamental right to freedom of association, has as main objective, to analyze the labor reform with regard to the faculties of the union contribution, with a view to knowing the possible impacts and / or consequences for the trade union organization and its freedom as a fundamental right. In order to achieve this objective, the bibliographical research was used as a methodology with reading of articles, journals and other references on the subject. The paper discusses the origin, definition and destination of the union contribution, the fundamental right to freedom of association and analyzes the possible effects of the faculties of the union contribution, having as main conclusions the main reflections raised in the course of the work. Keywords: Union contribution, faculties, reflexes, freedom, right INTRODUÇÃO A trajetória do ser humano nas sociedades é indissociável do conceito de trabalho e está no cerne do desenvolvimento das relações sociais. A contar da antiguidade quando o homem primitivo utilizava-se do trabalho como meio de satisfazer suas necessidades na luta pela sobrevivência, até a percepção das relações de trabalho contemporâneas com suas contradições, incoerências e injustiças. No Brasil historicamente de raiz escravocrata, até o início da década de 1930 as legislações que tutelavam garantias ao trabalhador eram praticamente inexistentes. Após a chamada República Velha e a ascensão da dinâmica econômica da agricultura cafeeira de São Paulo e do gado leiteiro de Minas Gerais, o controle político se concentrava nas oligarquias, sobrepujando o interesse das classes dominantes frente à classe trabalhadora, o sentido de trabalho estava na busca da produtividade decorrente de uma Revolução Industrial atrasada, mediante jornadas de trabalho exaustivas, entre outras condições extremas de vulnerabilidade do trabalhador no ambiente laboral. É nesse contexto que a organização sindical passa a surgir, com a responsabilidade de defender os interesses de uma classe explorada e sem perspectivas de direitos assegurados. O direito sindical, portanto, surgiu historicamente em momentos de extrema exploração do capital sobre o trabalho, como resposta ao alto grau exploratório, lutando e exigindo melhorias nas condições de trabalho. Por isso, a história do sindicalismo está diretamente atrelada a própria história do surgimento e desenvolvimento do direito do trabalho, o que por si só justifica a sua importância nas relações laborais. Assim, não há como se duvidar da importância dos movimentos sindicais, pois esta vai muito além de suas funções típicas como, celebração de acordos e convenções coletivas, estas organizações representam de forma ampla os interesses e direitos da categoria representada. Também, é um importante instrumento de tutela e proteção dos trabalhadores, e exercem considerável influência na atuação legislativa, contribuindo para as fontes materiais do direito. Acredita-se que somente por meio de um ser coletivo e organizado é possível proteger e reivindicar direitos da classe trabalhadora. Contudo, é importante destacar que, apesar do reconhecimento da sua importância, em uma breve perspectiva histórica, constata-se que o processo de construção e desenvolvimento dos sindicatos não ocorrem de forma tranquila, uniforme e pacífica. Proibições, repressões e criminalizações, fazem parte da história dos sindicatos, que, só conquistaram reconhecimento do direito de coalização e livre organização, na segunda metade do século XIX. Como um processo evolutivo, os sindicatos proliferam e se fortalecem. No Brasil constituiu-se preponderantemente no século XX. Hoje, com um perceptível avanço na conquista de direitos e atuação, as organizações sindicais passam por momentos de incertezas sobre suas conquistas históricas, frente as determinações expressas na LEI 13.467/2017, que trata da reforma trabalhista. Dentre os tantos pontos polêmicos que merecem discussão e análise, um que certamente merece ser analisado é o que trata da facultatividade da contribuição sindical, que implica na transformação da contribuição sindical de valor obrigatório em facultativo, dependente de autorização expressa e prévia do destinatário. A opção nesse trabalho pelo tema a Facultatividade da contribuição sindical: uma análise dos reflexos à luz da garantia do direito fundamental à liberdade sindical, se deu em razão da necessidade em aprofundar o entendimento sobre a questão e principalmente identificar quais os possíveis reflexos dessa mudança em relação a garantia do direito fundamental a liberdade sindical. Com essa problemática a ser estudada, o objetivo principal do presente artigo é analisar a reforma trabalhista no que diz respeito a facultatividade da contribuição sindical, na perspectiva de saber quais os impactos e/ou reflexos para a liberdade sindical enquanto direito fundamental, pois superando o debate em torno de ser contra ou favor, é necessário que se investigue analiticamente os reflexos dessa mudança à luz do processo no qual a reforma foi elaborada, Para que tal objetivo pudesse ser alcançado, utilizou-se como metodologia a pesquisa bibliográfica com leitura de artigos, revistas e demais referencias sobre o tema. A organização deste estudo se deu a partir de pontosque envolvem a referida questão, sejam eles: a origem, definição e destinação da contribuição sindical, no intuito de resgatar o contexto e as circunstâncias que levaram a classe trabalhadora a organizar-se e assegurar a instituicionalização da contribuição sindical, sua definição e destinação. Outro ponto é a facultatividade apresentada pela lei 13.467/2017 e seus possíveis impactos na organização sindical, para que se entenda melhor a questão sobre pontos de vistas diferentes, analisando-se não somente a sua defesa ou condenação, mas as intencionalidades que podem acompanhar tal proposta e os devidos reflexos à liberdade sindical. Posteriormente discute-se o direito fundamental à liberdade sindical, na intenção de esclarecer o significado da liberdade sindical enquanto direito fundamental. Finaliza-se com algumas conclusões tiradas a partir dos estudos e análise feitas. O presente tema desenvolvido neste artigo se justifica por trazer para discussão e análise a questão que, ora acredita-se ser uma das mais importantes em relação a facultatividade da contribuição sindical, que são os possíveis reflexos e impactos nas organizações sindicais, considerando o direito fundamental de liberdade. Pois, sem ignorar as demais mudanças prevista na reforma trabalhista, são estes que no momento certamente precisam ser debatidos e analisados, na perspectiva de buscar meios de avaliar a dimensão dos mesmos e trabalhar para que não se tornem mais maléficos do que ora se propõe. Portanto, acredita-se que este trabalho será de grande relevância tanto para o crescimento pessoal, como para formação acadêmica e profissional de seu elaborador, pois trata-se de um tema atual, polêmico e complexo, que exige interesse social e análise crítica permenente, principalmente daqueles que pretendem atuar na área de promoção social e garantia de direitos coletivos. 1 ORIGEM, DEFINIÇÃO E DESTINAÇÃO DA CONTRIBUIÇÃO SINDICAL Desde as suas origens no século XIX, os sindicatos foram instituídos para representar e defender os interesses dos trabalhadores de uma determinada categoria profissional ou econômica. O direito sindical brasileiro tem um processo de surgimento e desenvolvimento mais tardio se comparado com os Países europeus. As primeiras associações livres de trabalhadores igualmente livres e assalariados, mesmo não se intitulando sindicatos, surgiram nas décadas finais do século XIX, A organização sindical propriamente dita, só ocorre no século XX, fruto dos esforços da classe operária na sua luta contra o despotismo e a dominação do capital pelo processo da industrialização nacional. Durante a Era Vargas houve a concretização do sindicalismo nacional. Em 1930 foi criado o Ministério do Trabalho e em 1931 ocorreu a regulamentação da sindicalização operária e patronal. Sabe-se que em razão da sua finalidade básica, as entidades sindicais não atuam de maneira a obter lucro e não possuem fontes primarias de arrecadação, que custeiem o pleno funcionamento das suas instalações. Nesse sentido, a instituição da contribuilçao sindical pela Constituição de 1937 em seu artigo 138, significaria um ganho para a referida organização? [...] a associação profissional ou sindical é livre. Somada contribuição sindical ente , porém, o sindicato regularmente reconhecido pelo Estado tem o direito de representação legal dos que participarem da categoria de produção para que foi constuído, e de defender-lhes os direitos perante o Estado e as outras associações profissionais, estipular contratos coletivos de trabalho obrigatórios para todos os seus associados, impor-lhes contribuições e exercer em relação a eles funções de Poder Público. É necessário frisar que tais prerrogativas, por mais providenciais que pudesse parecer aos sindicatos, não estavam livres das ideologias dominantes da época, pelo contrário era coerente com o Estado autoritário e interessado em controlar as entidades sindicais. Nesse aspecto vale ressaltar a análise de Jorge Luiz Souto Maior1 sobre a origem do modelo sindical brasileiro. Afirmando que o modelo sindical brasileiro ainda hoje é associado ao anacronismo previsto na CLT de 1943, de origem facista, que atrelou sindicato ao Estado para construir “o espírito de harmonia entre patrões e operários” Essa dimenção contraditória que nega a divisão de classes certamente não condiz com a realidade da sociedade capitalista. Assim, Souto Maior, ressalta que hoje não é mais a legislação instituida por Vargas que rege a organização sindical, porém não podemos esquecer a história, ela certamente é reflexão para o presente e alerta para a construção de futuro. Em 1940, através de decreto-lei, essa contribuição foi denominada de imposto sindical e estabeleceu, entre outros, a época do recolhimento pelas empresas e indicou o percentual a ser distribuído pelos sindicatos às entidades de grau superior. O Decreto-Lei 2.377/40, de 8 de julho de 1940, dipõe sobre o pagamento e arrecadação das contribuições devidas aos sindicatos pelos que participam das categorias econômicas ou profissionais representadas pelas referidas entidades. Com a finalidade de assegurar financeiramente a prestação de 1 Jurista e professor livre docente de direito do trabalho brasileiro na USP, Brasil desde 2001. É juiz titular na 3ª Vara do Trabalho de Jundiaí desde 1998, palestrante e conferencista. https://pt.wikipedia.org/wiki/Decreto-lei serviços assistenciais, como um braço da estrutura oficial do Estado. Nesse sentido, vale reiterar a carcteristica perniciosa pela qual esta seria uma forma de manter os sindicatos controlados pelo Estado. Segundo Marcelo Meleck2, (in revista eletronica, Reforma trabalhista III, 2017, p. 10) “a Constituição brasileira de 1988 privilegiou o direito sindical, fortalecendo-o e fixando garantias de sua manutenção, desenvolvimento e efetividade”. Uma das conquistas previstas foi preservação da contribuição sindical compulsória, mantendo assim a principal fonte de recursos dos sindicatos para o bom funcionamento dessas entidades. A referida contribuição instituida legalmente, foi recepcionada pelo art. 8º, IV, in fine, e art. 149 da CF/88. ART. 8º É livre a associação profissional ou sindical, observado o seguinte: IV - a assembléia geral fixará a contribuição que, em se tratando de categoria profissional, será descontada em folha, para : do sistema confederativo da representação sindical respectiva, independentemente da contribuição prevista em lei; Art, 149 – Compete exclusivamente à União instituir contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais ou econômicas, como instrumento da sua atuação nas respectivas áreas, observando o disposto nos arts, 146, III, e 150, I e II, e sem prejuízo do previsto no art. 195, § 6º, relativamente às contribuições a que alude o dispositivo. Tal garantia confere aos sindicatos o poder de impor contribuições e exercer funções delegadas do Poder público, a contribuição sindical de acordo com esse dispositivo legal, passa a ser uma obrigação de todo o trabalhador, no sentido de contribuir com a entidade de classe que regulamenta sua ação profissional. Embora nem todo trabalhador seja sindicalizado, todo assalariado faz parte de uma classe que responda por seus interesses. Assim, todos os anos, o equivalente à remuneração de um dia de seu trabalho é descontado do salário. Este valor é distribuído aos sindicatos, federações, confederações e instituições relacionados à categoria. 2 Doutor em Direito pela PUC-PR. Advogado. Professor da Universidade Positivo e membro do Núcleo Docente Estruturante, leciona as disciplinas de direito do trabalho, processual do trabalho e prática trabalhista. Professor orientador do Projeto Horizontesdo TRT 9. Professor de Direito do Trabalho no curso de Pós Graduação da Universidade Positivo e convidado da PUC, IEL, dentre outras. https://pt.wikipedia.org/wiki/Poder_p%C3%BAblico A contribuição sindical é legalmente prevista, obrigatória e garante a continuidade de atividades sindicais e iniciativas de proteção ao trabalhador e a arrecadação desses valores deve ser destinada ao custeio de todo oo sistema confederativo, nos percentuais de 60% do total aos sindicatos, 15% as federações, 5% as confederações, 10% para as centrais sindicais, indicada pelo sindicato e que atendam aos requisitos de representatividade e 10% para a “Conta Especial Emprego e Salário”, administrada pelo Ministério do Trabalho e Emprego, visto que integram os recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador, conforme artigo 589 da C.L.T. e acréscimos pelo artigo 5º da Lei nº 11.648/08. Nessa perspectiva, a referida contribuição, pela óptica tributária, deve ser considerada “contribuição parafiscal”, visto que não é destinada com exclusividade ao ente que retém a competência tributária, mas delegado os elementos da capacidade tributária ativa. Ademais, o Supremo Tribunal Federal reconhece a natureza tributária da contribuição sindical: A contribuição confederativa, instituída pela assembleia geral – CF, art. 8º, IV – distingue-se da contribuição sindical, instituida por lei, com caráter tributário – CF art. 149 – assim compulsória. A primeira é compulsória apenas para os filiados do sindicato (RE 198.092 – Rel. Min. Carlos Velloso – j. 27.08.1996 – 2ª T. – DJ de 11.10.1996). Outras destinações deste recurso estão definidas no artigo 592 da C.L.T., ressaltando a aplicação dessa receita visando a prestação de serviços relacionados à assistência jurídica, médica, hospitalar, odontológica, farmacêutica, realização de estudos econômicos e financeiros, agências de colocação, cooperativas, bibliotecas, creches, congressos e conferências, medidas de divulgação comercial e industrial no País, e no estrangeiro, bem como em outras tendentes a incentivar e aperfeiçoar a produção nacional, feiras e exposições, prevenção de acidentes do trabalho, assistência a maternidade, auxílo-funeral, colônia de férias e centros de recreação, finalidades desportivas e sociais, educação e formação profissional, bolsa de estudos, prêmios por trabalho técnicos e científicos, entre outros. Podemos assim inferrir que a contribuição sindical é um tributo pago pelos trabalhadores, que surgiu da necessidade em estruturar e agregar força e participação, pressupondo a evolução da organização sindical. Nos países capitalistas centrais demonstram uma clara linha de coerência entre o processo de democratização dessas sociedades e Estados com o reconhecimento e resguardo dos direitos e princípios da livre e autonômica associação sindical. A obrigatoriedade da referida contribuição para empregados, empresas e profissionais liberais pertencentes a categorias representadas por sindicatos, permite as organizações sindicais uma vida contábil previsível, calculável e certa, possibilitando assim a sua estruturação financeira e obviamente o seu fortalecimento, pois na prática, assegura a manutenção das estruturas de classe que o representam. Cabe aqui frisar que segundo o Ministério do Trabalho há neste momento no Brasil um total de 16720 sindicatos com registro ativo, sendo 11478 de trabalhadores e 5242 de empregadores, fora confederações, federações e centrais sindicais. Foram abertos 289 novos sindicatos no país somente em 2017. Esse quantitativo representa um recurso financeiro assegurado pela contribuição sindical muito elevado, em 2016 os sindicatos receberam R$ 3,5 bilhões dos trabalhadores. Em 2017, a soma chegou a R$ 3,54 bilhões. Certamente essa receita faz uma enorme diferença na vida e organização das referidas instituições. A estrura financeira de uma organização sindical é, sem dúvida um posto muito importante a ser considerado, pois a redução da sua receita pode afetar significativamente seus compromissos financeiros e portanto a sua manutenção. 2 O DIREITO FUNDAMENTAL À LIBERTADADE SINDICAL A discussão sobre a facultatividade da contribuição sindical e seus possíveis impactos nessa organização, ora colocada em estudo, nos leva a pensar sobre o direito fundamental à liberdade sindical. Qual o significado de liberdade sindical? O que são direitos fundamentais? o direito de liberdade sindical, consagrado no texto constitucional, pode ser considerado direito fundamental do cidadão trabalhador? Buscar meios de responder a esses questionamentos é fundamental nesse estudo, pois demonstra a tentativa de compreender melhor o tão alardeado direito à liberdade sindical, hoje fortemente usado para justificar a drástica mudança das regras trabalhista em relação a contribuição sindical. Para entender melhor o que são direitos fundamentais é necessário buscar algumas definições que acompanham o processo histórico dos sindicatos. Estudos indicam que os mesmos surgiram inicialmente como direitos de defesa do trabalho face ao Estado, o principal violador desses direitos. Na percepção de Abrantes (2005) essa era uma concepção liberalista baseada no jusnaturalismo, uma vez que competiria ao direito positivo reconhecer e proteger os referidos direitos que seriam anteriores ao direito positivo e existiriam independentemente dele. Essa mesma concepção está presente na definição feita por José Carlos Vieira de Andrade, Segundo o mesmo, Os direitos fundamentais são, na sua dimensão natural, direitos absolutos, imutáveis e intemporais, inerente à qualidade de homem dos seus titulares, e constituem um núcleo restrito que se impõe a qualquer ordem jurídica (2009, p. 21). Desta forma, as leis, regras e normas nessa perspectiva são tidas como imutáveis, universais, atemporais e invioláveis, pois estão presentes na natureza do ser humano independente de sua vontade. Pode-se então afirmar que o Direito Natural é baseado no bom senso, sendo este pautado nos princípios da moral, ética, equidade entre todos os indivíduos e suas liberdades. Entretanto, essa concepção não acompanha a dinâmica das sociedades. Com o advento do Constitucionalismo Social, iniciado pela Constituição Francesa de 1848, seguido das Constituições Mexicana de 1917, Weimar de 1919, bem como a Constituição Brasileira 1934, foram inseridos no texto constitucional direitos trabalhistas, embora naquela época a leitura feita dos referidos direitos era como princípios programáticos, sem força normativa. Embora tenha havido o reconhecimento de direitos sociais aos cidadãos, costuma-se entender que, somente com o advento da Constituição de Weimar, de 11.08.1919, ocorreu a passagem do constitucionalismo liberal – deixando de lado aquela segundo a qual havia apenas a preocupação da autonomia do indivíduo perante o poder do Estado – para um constitucionalismo social, demonstrando a afirmação do Estado com fins de solidariedade social (AMARAL, 2007, p. 54). Segundo Abrantes, (2005) este novo estado passa a intervir nas relações econômicas entre os cidadãos, ainda que a referida intervenção atingisse a liberdade individual, "o aspecto mais importante da nova concepção de direitos fundamentais é a modificação do próprio sentido dos direitos e liberdades clássicas, a que passa a ser reconhecida uma nova dimensão e uma nova função." (p. 161) Cabe aqui reiterar que, o direito não se dissocia da evolução histórica da sociedade, sendo certo que após a Segunda Guerra iniciou-se um fenômeno de universalização dos direitos humanos, que teve seu ápice na Declaração Universal dos Direitos Humanos/1948. Simultaneamente, esses direitos humanos previstos a princípio do âmbito do direito internacional, passaram a integrar as constituições pós-guerra. Como exemplo, da Constituição Alemã de 1949, a ConstituiçãoPortuguesa de 1976, a Constituição Espanhola de 1978 e a Constituição Brasileira de 1988. Considerando-se, portanto, que os direitos sociais referentes ao trabalho estão vinculados aos direitos fundamentais, posto que o capítulo II – Dos Direitos Sociais (artigos 6º ao 11) se insere no Título II – Dos Direitos e Garantias Fundamentais (artigos 5º ao 17) da Constituição da República, o direito à associação sindical e à liberdade sindical são considerados direitos fundamentais, contudo, essa análise ainda não é suficiente para a caracterização dos direitos fundamentais, pois tratar de direitos invioláveis pressupõe compromissos e responsabilidades tanto de quem assegura esses direitos como de quem é beneficiado por eles. Como afirma o professor Amauri Cesar Alves3, “sua essência consiste, juridicamente, no fato de que os sindicatos e as ações coletivas dos trabalhadores são um poderoso instrumento de afirmação da dignidade da pessoa humana”. Para ele, Igualdade, justiça, segurança, equidade, distribuição de renda e respeito ao cidadão são valores caros à ordem constitucional vigente, e podem ser efetivados, nos planos fático e jurídico, através do Direito do Trabalho. A atuação dos sindicatos potencialmente eleva as possibilidades contratuais de emprego. É que a principal função do Direito Coletivo do Trabalho, e consequentemente dos sindicatos brasileiros, é a de criação de normas jurídicas autonomamente negociadas, que tendencialmente elevam o padrão contratual dos trabalhadores individualmente caracterizados, realizando, ainda que timidamente, distribuição de renda. Cabe, portanto, ressaltar que a organização sindical para poder assegurar direitos sociais e situar-se socialmente como direito fundamental precisa pautar-se no exercício da autonomia e da liberdade constitucionalmente previstos, mas que infelizmente nem sempre são seguidos, tanto pelos sindicatos quanto pelo estado. 3 Mestre e doutorando em direito, PUC-MG. Professor Universitário (FPL, PUC-MG. Coordenador do DAJ da Fundação Pedro Leopoldo. Membro da Comissão de Ensino Jurídico da OAB/MG. O referido professor, nesse aspecto, refere que nem os sindicatos e nem os intérpretes do direito coletivo do trabalho, conseguiram superar totalmente o corporativismo do século passado, pois em sua interpretação retrospectiva desconsideram os avanços constitucionais amplamente proclamados, preponderando a norma infraconstitucional sobre os fundamentais expressos na CF/88. É oportuno lembrar que a liberdade sindical, além de fazer parte dos direitos fundamentais expressos na Constituição brasileira, faz parte dos princípios e normas internacionais do trabalho previstos na Constituição da Organização Internacional do Trabalho (OIT), na Declaração de Filadélfia de 1944 e na Declaração dos Princípios e Direitos Fundamentais do Trabalho de 1998. Sabe-se que as relações de trabalho, geralmente estabelecidas entre privados, denotam um contexto de desigualdade entre as partes, pois, de um lado da relação jurídica encontra-se o empregador, detentor de poder econômico e poder de direção das atividades. Do outro lado, está o empregado que em tese a parte mais frágil economicamente na relação vincula-se mediante subordinação as orientações do empregador quanto ao exercício de suas atividades. Por esse motivo, a aplicação dos direitos fundamentais as relações de trabalho se faz necessária como meio de proteção aos direitos fundamentais dos trabalhadores. A partir desses princípios e diante de uma ordem global cada vez mais dependente da transparência, da ética, da democracia e do equilíbrio nas relações econômicas e profissionais, constata-se que as antigas retóricas se enfraquecem diante das novas demandas de diálogo social, da autonomia decisória e da flexibilização na dinâmica das relações de trabalho, em função do equilíbrio entre bem comum e os interesses do capital. Tais premissas conduz a sociedade a entender que não há dúvida de que emerge um grande apelo por renovação de mentalidades e práticas, em particular no campo trabalhista. Hoje alguns grupos de trabalhadores, segmentos da sociedade e estudiosos do assunto, expressam a necessidade em rever aspectos que hoje pautam a organização e funcionamento dos sindicatos, alguns apontam a incompatibilidade entre a liberdade sindical assegurada legalmente e a cobrança de contribuição sindical compulsória. Contudo, o próprio direito à liberdade não pode ser usado para camuflar a arbitrariedade e a imposição. É importante lembrar que esse é um tema complexo que não pode se encerrar com justificativas simplistas e superficiais. Pensa-se que, frente ao cenário atual, torna-se necessário rever a atual forma de organização sindical, os possíveis abusos e transgressões de direito à liberdade que possam existir, contudo, essa mudança não pode se dar de forma unilateral, imposta. Pois diante das diferentes concepções ideológicas e relações de poder sob as quais os princípios legais, as regras e o contexto são interpretados, o discurso da atualização e da coerência, transformam-se em oportunismos para a dominação e imposição. Vale lembrar que hoje a organização sindical representa ameaça e neutralizar a força da organização e diminuir a capacidade da autonomia dessas organizações é sem dúvida favorável a quem representa o capital. Assim, podemos constatar que o direito fundamental a liberdade sindical precisa ser entendida não só do ponto de vista de quem pensa e define essa liberdade, mas também de quem necessita dela, ou seja, não basta discursar sobre os direitos fundamentais do trabalhador, constatando o que é ou deixa de ser, é preciso envolver também o próprio trabalhador no debate, na perspectiva de transformar um direito previsto legalmente em direito de fato. Segundo Maristela Basso4, torna-se necessário que se saiba que [...] a liberdade de associação para fins sindicais é um dos princípios fundamentais do direito internacional do trabalho. Em 1919, ainda durante a Conferência de Versalhes, as potências aliadas manifestaram o expresso reconhecimento do princípio da liberdade de associação na Parte XIII do Tratado de Versalhes (intitulada "Do Trabalho"), a qual deu origem à OIT, criada justamente como um dos mais importantes resultados dos esforços da Liga ou Sociedade das Nações. A referida professora refere que em 1948, os Membros da OIT adotaram a Convenção nº 87, cujo preâmbulo retoma a importância do tema, reconhecendo que a "afirmação do princípio da liberdade sindical" reside entre "os meios aptos a melhorar a condição dos trabalhadores e assegurar a paz". O artigo 2º da Convenção assim estabelece: "Os trabalhadores e os empregadores, sem distinção de qualquer espécie, terão direito de constituir, sem autorização prévia, 4 professora de direito internacional da Faculdade de Direito da USP e sócia de Nelson Wilians Advogados Associados organizações de sua escolha, bem como o direito de se filiar a essas organizações, sob a única condição de se conformar com os estatutos das mesmas". Para ela, embora o Brasil tenha participado da XXXI Sessão da Conferência Geral dos Membros da OIT em 1948 e votado por sua adoção, a Convenção nº 87 não foi ainda ratificada pelo nosso Poder Executivo, tendo sido objeto de um projeto de decreto legislativo somente quase 40 anos mais tarde (o PDC 58/1984). E nessa medida, é de se pressupor que o texto da Convenção, que teve o voto favorável do Brasil na OIT, continue a repousar nas mesas de trabalho do Congresso Nacional desde então, sem que nossos parlamentares se deem conta da importância dessa Convenção para a concretização dos direitos dos trabalhadores brasileiros. 3. A FACULTATIVIDADE APRESENTADA PELA LEI 13.467/2017 E SEUS POSSÍVEIS IMPACTOS NAORGANIZAÇÃO SINDICAL O debate realizado por vários setores da sociedade em torno da mudança trazida pela reforma trabalhista que extingue a obrigatoriedade e aponta a facultatividade da contribuição sindical gera desconfiança, polêmicas e muitas controvérsias. Atualmente convivemos com opiniões favoráveis e contrárias, certamente revestidas de argumentos ideológicos e políticos. De uma lado, boa parte da doutrina brasileira argumenta que a contribuição não deveria ser compulsória porque representa uma contradição antidemocrática, herdada pelo sistema corporativista autoritário. Por outro lado, o relator da reforma afirma que esse fato contribuiria para acabar com os sindicatos de fachada, e tornando-a facultativa fortaleceria a estrutura sindical brasileira (Revista eletronica, Reforma trabalhista III, 2017, p. 15) Porém, nosso desafio aqui não é reforçar a polêmica, nem tão pouco tomar partido, visto que essa discussão é complexa, pois não envolve tão somente a obrigatoriedade ou a facultatividade de um imposto, mas envolve ideologias, relação de poder e, principalmente, o jogo de interesses econômicos e políticos, característicos do capitalismo que, historicamente, perpassam a relação entre trabalho e capital. Nesse sentido, o presente trabalho, sem poder fugir totalmente dessas implicações, centra a sua discussão sobre quais os possíveis impactos que a mudança que desobriga o trabalhador da contribuição sindical poderá trazer para a referida organização. Para tal é importante considerar o contexto no qual essa nova regra passa a ser estabelecida, pois acreditamos que antes de adentrar nessa questão, e assim compreender se as mudanças objetivam enfraquecer ou fortalecer o movimento sindical, torna-se necessário algumas reflexões sobre o processo de elaboração da reforma trabalhista, visto que esta traz outras mudanças que articuladas interferem fortemente na condição do trabalhador e na forma que se organiza. A facultatividade não pode ser analisada fora do conjunto das reformas previstas pela lei 13.467/2017. Uma das questões que certamente precisam ser analisados são os argumentos presentes no relatório apresentado pelo relator da comissão especial destinada a proferir parecer ao projeto de Lei n. 6.787/16, referente a reforma trabalhista, pois segundo a revista eletronica, Reforma trabalhista III, o mesmo... [...] é permeado de contradições, inverdades, senso comum, analogias sem responsabilidade científica, e visa tão somente tentar legitimar ou defender um projeto imposto exclusivamente pelo setor produtivo, sem ter havido o necessário debate ou pelo menos de ter amadurecido tão importante reforma. Foi uma reforma baseada em premissas totalmente equivocadas, como a de que “a necessidade de trazer as leis trabalhistas para o mundo real” , de que “a legislação trabalhista vigente hoje é um instrumento de exclusão [...] (MELECK, 2017, p. 15) É importante ressaltar que a referida reforma não é fruto de um amplo processo de debate e interação social, próprio das sociedades que se constituem democráticas. Vale destacar que tal proposta não representa a participação e portanto a vontade dos trabalhadores, ao contrário retira conquistas históricas e põe em risco a relação capital e trabalho, como afirma a juiza Valdete Souto severo², pois para ela representa a “tentativa de destruição da força coletiva dos trabalhadore e do sindicato” , uma vez que “a negociação coletiva é o modo como o capital e o trabalho estabelecem as regras de convivência pacífica”. Nesse sentido, podemos afirmar que a facultatividade prevista na referida lei certamente não está desprovida de intencionalidades e interesses em enfraquecer a organização sindical, haja visto que essa não é a primeira vez em que há intenção em por fim na obrigatoriedade da contribuição sindical. Durante o governo do presidente Fernando Collor de Mello houve a tentativa, sem sucesso, de sua extinção por meio da Medida Provisória nº 215, de 30 de agosto de 1990. No mesmo sentido, em 2004 no Fórum Nacional do Trabalho (FNT), onde foi aprovada a extinção da contribuição sindical em detrimento a criação da Contribuição de Negociação Coletiva, entretanto o Congresso Nacional não aprovou o projeto de reforma sindical do FNT. Por outro lado, não há como não atentar para as incoerências e até abusos exitentes dentro das organizações sindicais, pois como toda organização humana não está livre dos jogos de interesse, contradições e abusos de poder. No entanto, a questão que promove maiores inquietações não é apenas as mudanças nas regras do jogo, mas a forma como essa se dá e, principalmente a total intervenção do estado na organização sindical que, por sua natureza deveria ser autônoma, não podendo portanto estar ausente de um debate tão importante para a sua manutenção, como a questão da facultatividade da contribuição sindical prevista tanto na CLT como na CF/88. Portanto, não é de se ignorar que o fim da obrigatoriedade de recolhimento da contribuição sindical, tanto para as empresas quanto para os empregados é uma das mais polêmicas alterações trazidas pela Lei 13.467/2017 ( Reforma Trabalhista). Trata-se de drástica mudança, transformando a contribuição sindical de valor obrigatório em facultativo, dependente de autorização prévia e expressamente dos que participarem de uma determinada categoria econômica ou profissional, ou de uma profissão liberal. O desconto da contribuição sindical está condicionado à autorização prévia e expressa dos que participem de uma determinada categoria econômica ou profissional, ou de uma profissão liberal, em favor do sindicato representativo da mesma categoria (Lei 13.467/2017, Art. 579). Transformar a contribuição sindical de valor obrigatório em facultativo, dependente de autorização expressa e prévia do destinatário traz uma mudança profunda na receita sindical, pois valores devidos por toda a categoria só poderão ser cobrados se houver concordância efetiva dos integrantes da categoria. Á luz de tal mudança pode-se então inferrir que os impactos para as organizações certamente serão muitos, pois toda mudança exige a desconstrução de concepções e práticas já estruturadas e cristalizadas, para que novas ações, posturas e comportamentgos sejam edificados, demandando tempo e trabalho. A mudança em si é importante e necessária para companhar a dinâmica e a evolução da sociedade, contudo, o que precisa-se discutir sobre a questão, não é tão somente a mudança que ora se propõe, mas a maneira como essa está formatada, assim como os impactos que trará as organizações sindicais. Podemos assim inferir que a mudança, como está evidenciada nesse contexto, trará reflexos negativos, e por que não dizer retrocessos, pois, ao não passar pelo viés do debate com os envolvidos, caracteriza imposição, arbitrariedade, exigindo das organizações sindicais “adequar-se” a um modelo que pode ter sido pensado para frear a participação e a contribuição financeira dos trabalhadores e empresas, pressupondo enfraquecimento e desmobilização. Um ponto importante a ressaltar neste tema diz respeito a estrutura administrativa e a atuação dos vários sindicatos profissionais e patronais, pois essas são bastante complexas, e seus compromissos financeiros são proporcionais a sua receita, o que ocorre há muitas décadas. Desse modo, acreditamos que a retirada da contribuição sindical obrigatória de imediato, tanto num grande sindicato quanto numa entidade de tamanho e representação menores, causará abalos financeiros e consequentemente uma certa fragilidade em sua organização e estrutura. Acrescentando a essa questão a possibilidade dos sindicatos desviarem ou perderem o foco das suas reais finalidades, para buscar meios de assegurar a autorização da contribuição sindical dos trabalhadores e/ou outras formas de arrecadação financeira.Muitos analistas ao tratarem a questão tendem a levantar seus pontos de vista de forma bem antagônicas. Para uns será benéfico a facultatividade, como para Paulo Sérgio João, professor da Pontifícia Universidade Católica dde São paulo, da Fundação Getúlio Vargas e advogado. O mesmo ressalta que “os efeitos da extinção da contribuição sindical obrigatória poderiam contaminar o controle da unicidade; a estrutura sindical; negociações coletivas e litigiosodade em enquadramanto sindical”. Tais questões sob análise do referido professor trariam consequências positivas, como a perda atual do monopólio de representação dos sindicatos, perda da unicidade e do monopólio da cúpula sindical para dar espaço a pluralidade de representações e expressão de diferentes correntes ideológicas, as assembléias tenderiam a ser mais consistentes, participativas e com maior legitimidade, o enquadramento sindical seria dispensável e desapareceriam as discussões perante o Judiciário Trabalhista. Essas considerações revelam a preocupação com o modelo de proteção trabalhista. Os mais péssimistas sobre a questão referem que as consequências da abrupta extinção da contribuição sindical, trará demissões em massa de trabalhadores, redução de salários, corte de benefícios, fechamento de sub sedes, venda de ativos, extinção de serviços prestados aos trabalhadores, entre outras providências para contenção de gastos. Não é demais ressaltar que os sindicatos são associações de pessoas que ao terem como principal objetivo buscar melhorias das condições detrabalho e de vida de integrantes, precisam de receita financeira para custear suas ações. Para Maurício Goldinho Delgado5 A diretriz dessa jurisprudência trabalhista dominante, entretanto — ao reverso do que sustenta — não prestigia os princípios da liberdade sindical e da autonomia dos sindicatos. Ao contrário, aponta restrição incomum no contexto do sindicalismo dos países ocidentais com experiência democrática mais consolidada, não sendo também harmônica à compreensão jurídica da OIT acerca do financiamento autônomo das entidades sindicais por suas próprias bases representadas. Além disso, não se ajusta à lógica do sistema constitucional brasileiro e à melhor interpretação dos princípios da liberdade e autonomia sindicais na estrutura da Constituição da República. É que, pelo sistema constitucional trabalhista do Brasil, a negociação coletiva sindical favorece todos os trabalhadores integrantes da correspondente base sindical, independentemente de serem (ou não) filiados ao respectivo sindicato profissional. Dessa maneira, torna-se proporcional, equânime e justo (além de manifestamente legal: texto expresso do art. 513, “e”, da CLT) que esses trabalhadores também contribuam para a dinâmica da negociação coletiva trabalhista, mediante a cota de solidariedade estabelecida no instrumento coletivo de trabalho” (Direito Coletivo do Trabalho, 6ª Ed. p. 114, LTR Editora, São Paulo, maio/2015 ). De outro lado, aqueles que se posicionam a favor, discursam sobre a defesa da liberdade sindical e a autonomia para decidir sobre a forma de sustentação financeira do sindicato, princípios já previsto em outros dispositivos legais. Mas para outros, tal mudanças precisa ser vista com estranheza e preocupação. Para Pedro Paulo Teixeira Manaus, ministro aposentado do TST e professor da faculdade de Direito da PUC-SP, a extinção da obrigatoriedade da contribuição sindical, “afetará, sem dúvida, os compromissos financeiros que hoje têm as entidades sindicais permitindo supor, pela mudança brusca, considerável número de desempregados, diante da inexistência de recursos para pagamento de 5 Jurista brasileiro e Ministro do Tribunal Superior do Trabalho (TST) desde 2007 https://pt.wikipedia.org/wiki/Jurista https://pt.wikipedia.org/wiki/Brasil https://pt.wikipedia.org/wiki/Tribunal_Superior_do_Trabalho salários”. Ou seja, nessa ponto de vista o fim da obrigatoriedade, na forma como se apresenta, pressupõe o desmonte de uma estrutura consolidada financeiramente e quantitativamente. Entre opiniões e análises permeadas de justificativas importantes e passíveis de reflexão, cabe aqueles que se dedicam a buscar a justiça e o direito num contexto de democracia em seu sentido pleno, fomentar a discussão, e, acima de tudo, buscar no cerne da questão compreender que, para além de uma nova forma de organização dos sindicatos ora imposto pelo estado, está em jogo as formas de assegurar e manter direitos e deveres dos trabalhadores, bem como a busca em se estabelecer regras claras e coerentes para o equilíbrio necessário da relação trabalhador e capital. Diante do exposto torna-se necessário que haja análises mais profundas e posicionamentos consistentes sobre o possível enfraquecimento da representação sindical causada pela mudança na referida contribuição, com responsabidade e coerência. É importante destacar o que está disposto na nota técnica 05/2017 do Ministério Público do Trabalho sobre o tema, [...] a extinção da contribuição sindical deve ser acompanhada da apresentação de alternativas de financiamento às entidades sindicais, como a contribuição assintencia, figura completamente compatível com o modelo de liberdade sindical proposto pela OIT, conforme estabelecido no verbete nª 363 do comitê da liberdade sindical Não se pode ignorar que a organização sindical é, sem dúvida, um instrumento valioso de fortalecimento da democracia e de equilíbrio necessário entre as forças antagônicas da sociedade, aqui representadas por empregados e patrões, portanto se existe atualmente a ameaça clara de seu possível enfraquecimento é preciso que algo urgente possa ser feito. Nesse contexto, há uma importante consideração a ser feita, trata-se da discussão sobre a liberdade sindical, ora usada para implementar mudanças na organização sindical, que, certamente vai de encontro ao seu sentido pleno. Vale aqui destacar o despacho do ministro relator do Supremo Tribunal Federal, Édson Fachin, Na ADI 5794 MC/DF A liberdade de associação deve, nessa dimensão, ser harmonizada com o direito de uma categoria ser defendida por um sindicato único, de modo que admitir a facultatividade da contribuição sindical, cuja concepção constituinte tem sido históricamente da obrigatoriedade, pode, ao menos, em tese, importar um esmaecimento dos meios necessários à consecução dos objetivos constitucionais impostos a estas entidades, dentre os quais destacam-se a defesa dos direitos e interesse coletivos ou individuais da categoria ( artigo 8º, III, da CRFB), a participação obrigatória nas negociações coletivas de trabalho (artigo, 8º, VI, da CRFB), a denúncia de irregularidades ou ilegalidades perante o Tribunal de Contas da União (artigo 74, §2º, da CRFB), e o ajuizamento de ações diretas e ações mandamentais coletivas perante a jurisdição constitucional (artigo 5º, LXX, e 103, IX, da CRFB). Acredita-se que é, também, por meio de posicionamentos críticos e fundamentados, com o acima exposto, que um tema tão complexo e polêmico como o que está sendo posto em análise, poderá encontrar meios cabíveis para superar os reflexos negativos mensionados neste trabalho. 3 CONCLUSÃO Ao encerrar-se a análise proposta neste trabalho, sem portanto, esgotar debate sobre o tema, concluimos que o objetivo principal aqui proposto foi alcançado a medida que se conseguiu pontuar alguns reflexos e impactos que a facultatividade da contribuição sindical pode trazer aos sindicatos à luz do direito à liberdade sindical. Independente de posicionamentos favoráveis ou contrários, pôde-se constatar que um dos reflexos é a necessidade dos sindicatos encararem o desafio da mudança, pois sendo os reflexos negativos ou positivos, caberá as organizações sindicais repensarem suas estruturas, em especial afinanceira, no sentido de buscarem alternativas para desenvolver uma nova forma para a contribuição sindical, que, ao deixar de ser obrigatória, exigirá da referida organização, metodologias capazes de não transformar essa mudança em enfraquecimento da mesma, como possivelmente esta foi imposta. No decorrer das análises procurou-se contextualizar a forma como a reforma trabalhista e as mudanças abruptas nela expressas, foram colocadas e justificadas, o que contribuiu para constatar-se que outro reflexo possível de ocorrer é o retrocesso quanto a autonomia sindical, aqui, ameaçada pela falta de participação dos trabalhadores nessa discussão e na tomada de decisão que envolve aspectos fundamentais para a vida do trabalhador e sua organização, para a garantia de direitos. É incontestável que, apesar dos discursos que associam a facultatividade sindical com a necessidade de se garantir a liberdade sindical, o fim da obrigatoriedade acompanhada de outras mudanças nos direitos trabalhistas, configuram-se em retirada de conquistas históricas e põe em risco a relação capital e trabalho, podendo ocasionar a destruição da força coletiva dos trabalhadores e do sindicato, bem como das regras de convivência equilibradas. Concluiu-se ainda que a estrutura administrativa e a atuação dos vários sindicatos profissionais e patronais, são bastante complexas, e seus compromissos financeiros são proporcionais a sua receita, o que ocorre há muitas décadas. Desse modo, outro impacto que certamente os atingirá com a retirada da contribuição sindical obrigatória, de imediato, tanto num grande sindicato quanto numa entidade de tamanho e representação menores, serão os abalos financeiros e consequentemente uma certa fragilidade em sua organização e estrutura. Bem como o possível desvio ou perda de foco em relação a principal razão da existencia da organização sindical, a garantia dos direitos fundamentais do trabalahador. Contudo, vale ressaltar que a retirada da obrigatoriedade da contribuição sindical, mesmo podendo ter intencionalidades que afetam o verdadeiro direito à liberdade sindical, não deve ser compreendido como a sua inexistência. O que está sendo proposto a ser mudado é a forma de recolhimento dessa contribuição que prevê autorização prévia, portanto, a contribuição continua sendo o meio de manter financeiramente e porque não dizer participativamente o sindicato, porém isso ocorrendo exigirá novas estratégias e metodologias de arrecadação. É importante que as organizações não se ausentem do debate e nem da busca por alternativas sobre essa questão, pois é também diante dos grandes desafios e crises que se pode reinventar, cabendo aos sindicatos, por meio das assembleias buscar soluções econômicas e sociais, como ato coletivo e soberano da categoria . 4 REFERÊNCIAS ABRANTES, José João. Contrato de trabalho e direitos fundamentais. Coimbra, 2005. AMARAL, Júlio Ricardo de Paula. Aplicação dos direitos fundamentais no âmbito das relações de direito do trabalho. Ed. LTR, 2007. ALVES, Amauri Cesar Alves. A eficácia dos direitos fundamentais no âmbito das relações trabalhistas. Artigo publicado na “Revista LTr.”, ano 75, outubro de 2011, págs. 1209 a 1218. ANDRADE, José Carlos Vieira. Os direitos fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976. 4. ed. Almedina, 2009.
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