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EMERGÊNCIAS RESPIRATÓRIAS – VENTILAÇÃO ARTIFICIAL AULA 1 Prof. Cristiano Caveião Profª Thayse Gonçalves INTRODUÇÃO A emergência respiratória é um tema recorrente na prática diária de todos os profissionais da área da saúde. Assim, nessas situações, em uma parcela delas existe a necessidade da assistência ventilatória. Para tanto, é importante relembrar brevemente as estruturas anatômicas e suas funcionalidades nesse sistema TEMA 1 – MORFOFISIOLOGIA DO SISTEMA RESPIRATÓRIO 1.1 Revisão anatômica O sistema respiratório tem função vital para o corpo humano, pois, juntamente com o sistema circulatório, mantém a homeostasia do organismo. É por meio dele que as trocas gasosas acontecem, fornecendo oxigênio (O2) às células, imprescindível para as reações metabólicas, para a produção de ATP e a eliminação via expiração das excretas dessas reações, o dióxido de carbono (CO2). O sistema respiratório precisa trabalhar de forma eficaz para que o CO2 seja eliminado corretamente e para que o oxigênio seja plenamente absorvido da atmosfera, para que a circulação leve o O2 para todos os tecidos e células do corpo, mantendo assim o perfeito equilíbrio. Podemos dividi-lo em trato respiratório ou via aérea superior e inferior. O primeiro compreende nariz, faringe e laringe e tem como função conduzir os gases, aquecer o ar inspirado para que chegue aos alvéolos a uma temperatura em torno de 37º C, umidificar e filtrar o ar, mecanismo de defesa e limpeza através do epitélio ciliado e da secreção mucosa. A via aérea inferior inicia a partir da cartilagem cricóidea, no nível da 6ª vértebra cervical, com a traqueia, brônquios, bronquíolos e alvéolos. Sua função compreende a condução dos gases, da traqueia até os bronquíolos terminais, e a efetiva respiração, através da troca gasosa entre ar e sangue, chamada de zona respiratória, que compreende bronquíolos respiratórios e alvéolos. Os pulmões são dois órgãos em forma de cone, com aproximadamente 25 cm de comprimento e 700 g de peso e assimétricos entre si. O pulmão direito é maior em largura, porém, menor em altura e possui duas fissuras: oblíqua e horizontal que divide o pulmão direito em três lobos: superior, médio e inferior. O pulmão esquerdo é mais comprido e possui uma fissura, a oblíqua, que divide o pulmão em lobo superior e inferior, havendo ainda uma concavidade, que é chamada de concavidade cardíaca, para acomodação do coração. Figura 1 – Pulmões Crédito: Vecton/Shutterstock. Os vasos sanguíneos, vasos linfáticos e nervos ingressam aos pulmões em suas faces mediais no hilo pulmonar. Cada lobo é dividido em segmentos menores. Os lóbulos são supridos individualmente por um vaso linfático, uma arteríola, uma vênula e um bronquíolo terminal. Desse modo, a remoção cirúrgica de um segmento ocorre com pouco sangramento e extravasamento de ar do pulmão remanescente. Mais distalmente, a partir da 16ª geração de via aérea, os bronquíolos terminais se subdividem novamente em bronquíolos respiratórios, entre 17ª e 19ª geração, e por conseguintes ductos alveolares, 20ª a 23ª geração, representando o final da árvore traqueobrônquica. Ductos alveolares são estruturas formadas por um conjunto de alvéolos que se comunicam com o bronquíolo respiratório através dos canais de Lambert e entre si pelos poros de Kohn, permitindo a ventilação colateral. Os alvéolos, por sua vez, configuram estruturas ocas, preenchidas de ar, e são compostos por uma fina membrana de tecido elástico que permite que eles se expandam durante a inspiração e ocorra sua retração na fase expiratória. Esse tecido é formado por dois tipos celulares: células epiteliais simples pavimentosas, denominadas pneumócitos tipo I, que compõem grande parte dessa estrutura. Intercaladas, encontram-se células especializadas mais espessas, em formato cuboide e arredondada, denominadas pneumócitos tipo II, que produzem uma substância análoga a um detergente, o surfactante, substância fosfolipídica que impede o colapso alveolar e que facilita a expansão dos alvéolos durante a inspiração. Em volta dessa estrutura, separada por uma fina barreira de 0,2 µm, há a trama de capilares proveniente da circulação pulmonar. A área de superfície total dos alvéolos em contato com os capilares tem aproximadamente o tamanho de uma quadra de tênis. Graças a essa extensa área e à fina barreira entre essas duas estruturas, há possibilidade de rápida troca de grandes quantidades de oxigênio e de dióxido de carbono por difusão. Figura 2 – Via aérea inferior Crédito: Sakurra/Shutterstock. 1.2 Relação dos pulmões, músculos e caixa torácica Os pulmões localizam-se na região do tórax totalmente separado do abdômen, por um grande músculo em formato de cúpula denominado diafragma. Medialmente os pulmões são separados pelo mediastino, dividindo a caixa torácica em dois compartimentos distintos. Cada pulmão é revestido por uma fina camada serosa composta por duas lâminas, a pleura. Sua camada mais superficial reveste a parede da cavidade torácica chamada de pleura parietal. A camada mais profunda, por sua vez, reveste efetivamente os pulmões, a pleura visceral. Entre elas há um pequeno espaço, chamado de cavidade pleural, em que há uma pequena quantidade de líquido, de alguns mililitros, que, por redução de atrito, permite que elas deslizem uma sobre a outra durante a respiração. Os pulmões não possuem capacidade para realizar a insuflação de forma autônoma, por isso quem proporciona essa dinâmica são os músculos responsáveis pela respiração. Para que eles possam atuar, a caixa torácica precisa estar em perfeitas condições para que, ao realizar a expansão, o ar penetre até os alvéolos, e a ventilação ocorra. A parede do tórax é formada em sua face posterior por 12 vértebras torácicas, na face anterior pelo osso esterno e 12 costelas sendo os 7 primeiros pares verdadeiras (pois se articulam diretamente com o osso esterno), 3 pares seguintes falsas (pois articulam-se com o esterno mediante a cartilagens que os unem) e 2 últimos pares costelas flutuantes (pois não se prendem ao esterno). A inspiração acontece devido à contração dos seguintes músculos: diafragma, intercostais externos, peitoral menor e os escalenos. O diafragma é o principal responsável por essa função, pois cerca de dois terços do aumento do volume torácico ocorre graças à sua contração. Os intercostais externos, escalenos e peitoral menor participam pela elevação das costelas. Os músculos responsáveis pela expiração compreendem intercostais internos, denteado e músculos abdominais (oblíquos, reto e transverso), que, por meio de suas contrações, reduzem o arco costal. Figura 3 – Arco costal Crédito: Cono0430/Shutterstock. 1.3 Controle da respiração Um adulto normal em repouso consome em torno de 200 ml de oxigênio por minuto. Durante um exercício físico, essa demanda pode aumentar em torno de 15 a 20 vezes e em atletas de resistência até 30 vezes. Esse ajuste é acionado por diversos mecanismos que combinam o esforço respiratório e a demanda metabólica. O controle respiratório obedece a dois comandos: nervoso, também chamado de centro respiratório e químico. A ação dos músculos respiratórios acontece como resultado dos impulsos nervosos que chegam à unidade motora do músculo vindos dos centros localizados no encéfalo, e o seu relaxamento acontece pela ausência desses impulsos. Esses impulsos nervosos têm origem no tronco encefálico, dividido em duas áreas, com base na localização e função: área de ritmicidade bulbar, no bulbo e área pneumotáxica, localizada na ponte. A primeira é composta de dois grupos de neurônios: o grupo respiratório dorsal (DRG) ou área inspiratória, e grupo respiratório ventral (VRG) ou área expiratória. Durante a respiração basal, neurôniosdo DRG geram impulsos para o diafragma (via nervo frênico) e para os músculos intercostais externos (via nervos intercostais). Esses impulsos são gerados em explosões de forma crescente por aproximadamente dois segundos e, em seguida, cessam por completo. Quando esses impulsos atingem as musculaturas supracitadas, acontece a contração e a inspiração. Quando os impulsos do DRG cessam, após dois segundos, esses mesmos músculos relaxam, permitindo a retração passiva da caixa torácica, com duração aproximada de três segundos. A frequência dos impulsos do DRG é controlada por células que têm função análoga ao marcapasso, gerando o ritmo básico da respiração. Essas células são chamadas de complexo pré-Bötzinger e estão localizadas no VRG. Quando há aumento da demanda respiratória por uma atividade física, por exemplo, os impulsos do DRG estimulam, além das musculaturas já citadas, o VRG, que, por sua vez, gera estímulo para contração das musculaturas acessórias e a inspiração acontecer. Na fase de expiração forçada, há também atuação do VRG, que envia impulsos às musculaturas que auxiliam a saída de ar dos pulmões. A área pneumotáxica tem função de transmitir impulsos para o DRG, no bulbo e exerce essa função tanto na fase inspiratória quanto na fase expiratória, quando falamos, exercitamos ou dormimos. O controle respiratório químico estabelece a velocidade e a intensidade com que o ciclo respiratório acontece. Devido à função do sistema respiratório, que é a de permitir as trocas gasosas, há níveis adequados de CO2 e O2 para manter a homeostasia do organismo. Os quimiorreceptores centrais, que se localizam no bulbo, respondem às alterações que ocorrem no nível de H+ e/ou de PCO2 no líquido cerebrospinal. Há também quimiorreceptores sensíveis às alterações de O2, H+ e PCO2 sanguíneo que estão localizados no interior do arco aórtico. O CO2 é um gás lipossolúvel e, devido a isso, difunde-se facilmente pela membrana plasmática celular. Ele combina-se com a água (H2O) formando o ácido carbônico (H2CO3), que, por sua vez, se decompõe rapidamente em íon H+ e bicarbonato (HCO3). Assim, qualquer alteração nos níveis de CO2 altera de modo diretamente proporcional a concentração de íons H+, que, por consequência, altera os níveis de pH. Com alterações das concentrações de PO2, PCO2 e pH, os quimiorreceptores provocam a ativação do DRG, que, como já vimos, altera a frequência respiratória com o objetivo de normalizar a concentração dessas substâncias em níveis dentro da faixa de normalidade. Vale ressaltar que a hipóxia grave deprime a atividade dos quimiorreceptores centrais e do DRG, que não respondem de forma adequada aos estímulos, promovendo a bradipneia (redução da frequência respiratória) e consequentemente a apneia (ausência de respiração) com resultado em sua grande maioria fatal. 1.4 Finalizando Neste tema foi possível relembrar a anatomia e fisiologia do sistema respiratório, suas particularidades e sua importância para a vida humana. Vimos também como esse sistema é coordenado pelo controle respiratório e as concentrações químicas por meio de impulsos aferentes e eferentes. TEMA 2 – ANAMNESES E EXAME FÍSICO: PRINCIPAIS SINAIS E SINTOMAS RELACIONADOS AO SISTEMA RESPIRATÓRIO A anamnese e o exame físico realizados de forma detalhada, contemplando o maior número de variáveis possíveis, são de suma importância para que o profissional que atuará frente a este paciente consiga elaborar um diagnóstico preciso, podendo desse modo traçar os objetivos e planos de tratamento de forma mais eficaz e assertiva. Isso se confirma, por exemplo, em avaliações do sistema respiratório, pois a maioria das patologias que acometem esse sistema são perceptíveis ao profissional de saúde no momento de realização da avaliação. O exame físico contempla a anamnese, inspeção, palpação, percussão e ausculta. Os exames complementares, em muitos casos, têm uma maior importância para diagnóstico diferencial ou mesmo para confirmar a hipótese diagnóstica. 2.1 Anamnese Uma avaliação deve sempre iniciar com dados do paciente, ou seja, a anamnese, o que inclui idade, sexo, cor de pele, profissão, entre outros. Esses tópicos citados anteriormente podem, no decorrer da avaliação, auxiliar o profissional quanto às patologias, por exemplo: há acometimentos que são mais prevalentes em determinadas faixas etárias (idosos e adultos jovens) ou problemas congênitos (atresia de esôfago). Há doenças que são mais prevalentes em determinados sexos da população, por exemplo, o lúpus eritematoso sistêmico é uma doença autoimune, difusa, com acometimento pulmonar importante e que se apresenta mais prevalente em mulheres; outro exemplo é a tuberculose com prevalência maior masculina. A atividade laboral é outro fator importantíssimo. Há muitas ocupações que expõem seus trabalhadores a determinados materiais que produzem fuligem, fumaça tóxica, poeira, sílica e, sem o uso de equipamento de proteção individual (EPIs) adequados, comprometem a longo prazo a saúde respiratória desse trabalhador, pois são substâncias que se depositam na árvore brônquica ao longo do tempo e causam diversos acometimentos respiratórios, muitas vezes irreversíveis. Outro ponto importante a ser analisado é o histórico familiar. Há diversas doenças em que a questão genética passa a ser muito relevante. Casos de doenças autoimunes, como artrite reumatoide, espondilite anquilosante, doenças cardiovasculares, doenças neurológicas. Nesse ponto da avaliação, isso também pode sinalizar ao avaliador hábitos de vida presente no círculo familiar do paciente, como exposição ao mofo, tabagismo passivo, exposição aos agrotóxicos, entre outros. Medicamentos devem compor a avaliação, uma vez que o paciente pode apresentar sinais e sintomas que podem advir de uma interação medicamentosa ou até mesmo de um efeito colateral. Nota-se que, de modo geral, quando isso ocorre, o acometimento pulmonar é difuso e acontece de forma isolada. Como exemplo, podemos citar a amiodarona, que pode causar um pneumonite intersticial crônica; inibidores da angiotensina II podem induzir à tosse; betabloqueadores podem gerar broncoespasmos em pacientes com doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC). Sinais e sintomas aparecem na avaliação do sistema respiratório com afecções bem localizadas, como dor na região torácica, tosse, expectoração, hemoptise, dispneia, sibilos, cornagem e até mesmo rouquidão. 2.1.1 Inspeção No campo da inspeção o avaliador pode avaliar a dinâmica torácica (respiração apical, abdominal, mista, paradoxal), análise da frequência respiratória (FR), os tipos de respiração e seu ritmo (hiperventilação, hipoventilação, respirações neurológicas). Nesse campo ainda é possível inspecionar a configuração torácica, que possa indicar alguma patologia ou que possa comprometer a ventilação desse indivíduo. Englobam essa configuração as escolioses importantes, nas quais o pulmão apresentará uma assimetria ventilatória. Tórax em tonel, que indica uma hiperinsuflação pulmonar comum em pacientes DPOCs e tórax instável sinalizam alguma fratura de gradil costal apresentando uma respiração paradoxal. 2.1.2 Palpação A palpação é usada no exame do tórax para a avaliação das áreas de dor e da simetria da incursão torácica (expansibilidade). De modo geral, o profissional deve palpar a região torácica a fim de encontrar pontos dolorosos e a avaliação da simetria da expansibilidade torácica por meio da palpação torácica apical e basal. 2.1.3 Percussão A percussão torácica é realizada por meio do tato e da audição do examinador com o objetivo de encontrar possíveis alterações. Um tórax normal produz vibrações lentas e um som de baixa tonalidade com maior duração, chamado de som claro pulmonar ou ressonância. Caso o paciente apresenteum aumento na quantidade de ar, como é o caso de pulmões hiperinsuflados ou com presença de pneumotórax, essa percussão se dará numa tonalidade mais baixa e com duração maior que o considerado normal, podendo ser até mesmo timpânico. Caso a quantidade de ar seja reduzida, esse som se apresentará mais alto e com tonalidade mais curta, indicando uma macicez. Esta percussão é indicativa de presença de fluido, como as consolidações. 2.1.4 Ausculta A ausculta de sons respiratórios é uma técnica de exame físico extremamente importante para avaliar o trânsito de ar que percorre o trato respiratório. Essa passagem de ar produz determinados sons que são normais do ciclo inspiratório e expiratório, chamados de murmúrio vesicular, o qual não apresenta intensidade homogênea, sendo mais audível nas bases pulmonares do que em seus ápices e com tempo inspiratório maior que o tempo expiratório. Além disso, existem variações morfológicas entre os indivíduos de modo que o tórax de pessoas obesas ou com musculatura com maior hipertrofia apresenta um ausculta pulmonar mais deficitária, por conta do aumento da espessura torácica. Quando há sons anormais na ausculta pulmonar, esses sons são denominados de ruídos adventícios. Nas vias respiratórias de maior calibre, os sons são mais altos e grosseiros, enquanto os sons nas vias respiratórias menores são mais suaves e finos. Podem se apresentar de forma contínua ou descontínua e devem ser descritos de acordo com a sua localização, período (ciclo inspiratório e expiratório) e intensidade. Os sons descontínuos incluem os estertores de modo geral (finos ou grossos). Os contínuos envolvem os roncos, sibilos e estridor. Podemos ainda ter o atrito pleural. Os estertores finos ou crepitantes surgem ao final da inspiração, possuem curta duração, são agudos e não se modificam com a tosse. Analogamente, podem ser comparados ao esfregar de cabelos ou ao fechamento de velcro. Indicam presença de líquido ou exsudato no parênquima pulmonar, sugerindo congestão pulmonar por insuficiência do ventrículo esquerdo, pneumonia ou doenças intersticiais. Os estertores grossos também são conhecidos como bolhosos, são mais difusos no tórax, possuem maior duração, apresentam som mais grave e sofrem interferência da tosse. São audíveis no início da inspiração e toda expiração. Indicam secreções viscosas e espessas na árvore brônquica, e são comumente encontrados em casos de bronquite crônica e bronquiectasias. Os roncos se apresentam como sons graves como resultado das vibrações das paredes brônquicas e dos gases quando há uma redução no lúmen dos brônquios. São mutáveis e audíveis em ambos os ciclos da respiração com uma predominância na expiração. Podem surgir por espasmos, edema da parede brônquica ou secreção aderida em brônquios de grande calibre. Surgem nos casos de asma brônquica, bronquites, bronquiectasias ou obstruções locais. Os sibilos também têm seu som produzido pelas vibrações das paredes bronquiolares e de seu conteúdo gasoso quando o brônquio apresenta redução do seu lúmen. Podem surgir na fase inspiratória indicando secreções em bronquíolos mais distais e, na fase expiratória, redução do lúmen por possível broncoespasmo. Indicam patologias como asma, bronquite ou até mesmo uma obstrução por corpo estranho ou neoplasia. O estridor é um som facilmente audível sem o uso do estetoscópio, com variação de acordo com a frequência respiratória apresentada pelo indivíduo, ou seja, menor intensidade em respirações mais calmas e mais audíveis na respiração forçada. É produzido por obstrução do fluxo aéreo em regiões de laringe ou traqueia com causas diversas como: estenose traqueal, laringites e neoplasias. A ausculta de atrito pleural surge quando há um aumento na quantidade de líquido presente entres as pleuras visceral e parietal. Apresenta um som de longa duração, grave, não altera com a tosse e produz vibração palpável, podendo distinguir-se dos estertores. É mais comumente encontrado em regiões de terço médio e bases pulmonares. 2.2 Interpretação gasométrica Uma das principais funções fisiológicas dos sistemas corporais é manter o organismo em homeostasia. A manutenção do pH corporal é importantíssima, pois qualquer alteração nesse índice prejudica as reações celulares, como é o caso das enzimas, que são muito sensíveis a essa alteração. O sistema respiratório e o sistema renal têm importante papel nesse equilíbrio ácido-base. O pH representa uma escala para expressar a concentração de hidrogênio, e refere-se à acidez de fluidos corporais. O pH possui limites aceitáveis de compatibilidade à vida que vão de 7,0 - 7,8, entretanto, sua normalidade se dá entre 7,35 - 7,45. Os ácidos são subprodutos do metabolismo fisiológico e, ocasionalmente, de processos patológicos; são transportados pelo sangue para os pulmões e rins, onde serão eliminados. Entretanto, o transporte desse ácido em sua forma livre causaria uma grande variação no pH sanguíneo, o que seria incompatível com a vida. Desse modo, os sistemas de tamponamento intra e extracelulares ocorrem para que as reações celulares aconteçam, porém com a manutenção do pH. Iremos focar a estudar o sistema de tampão mais relevante, o bicarbonato/gás carbônico (HCO3 – CO2). O CO2 produzido pelo metabolismo celular no sangue liga-se à água, formando o ácido carbônico (CO2 + H2O à H2CO3). O ácido carbônico se dissocia em íon hidrogênio e bicarbonato. (H2CO3 à H+ + HCO3). O mesmo vale para o H+, que será tamponado pelo bicarbonato (HCO3) formando o ácido carbônico (H2CO3), que, por sua vez, se dissociará em água (H2O), em gás carbônico (CO2) e será eliminado pela ventilação pulmonar. Essa regulação independente do pH, com eliminação de PCO2 pelos pulmões e HCO3 pelos rins, é demonstrada pela equação de Henderson- Hasselback, que descreve a relação do pH com essas duas substâncias: pH= 6,1+ log HCO-3 / 0,03 x PaCO2 Equação de Henderson- Hasselback Exemplo 1: HCO3: 30 mm Eq/l PCO2: 35 mmHg pH = HCO3 / PCO2 pH: 7,55 Exemplo 2: HCO3: 23 mm Eq/l PCO2: 50 mmHg pH = HCO3 / PCO2 pH: 7,28 Essa equação tem uma grande aplicabilidade para distúrbios primários, pois, por meio dela, podemos observar que é impossível alterar uma dessas variantes sem repercussão em outra unidade. Sendo assim, se observamos o exemplo 1, podemos notar que um aumento, além dos limites de normalidade, do bicarbonato repercutirá em um aumento do pH, deixando-o mais alcalino, pois são diretamente proporcionais na equação. Entretanto, se o PCO2 se encontra aumentado, como no exemplo 2, o pH irá reduzir, ficando mais ácido. Isso acontece, pois esses componentes estão colocados na equação de modo inversamente proporcionais. Se formos utilizar esses exemplos no escopo de uma gasometria arterial, no primeiro caso o paciente apresentaria uma alcalose metabólica, pois o organismo está retendo bases, de modo que o pH está alcalinizando o pH sanguíneo em uma alcalose metabólica. No segundo exemplo, o PCO2 está aumentando, ou seja, o paciente está ventilando de modo insatisfatório, promovendo um acúmulo de gás carbônico. Assim, o pH irá se reduzir, tornando o pH sanguíneo ácido, classificando-se como uma acidose respiratória. Há casos também em que ambos os componentes tanto PCO2 quanto o HCO3 gerarão alteração no pH sanguíneo. Quando ambos contribuem para redução ou aumento do pH, dizemos que o distúrbio é misto, com HCO3 baixo e PCO2 alto no primeiro caso; e HCO3 alto e PCO2 baixo no segundo caso. Se eventualmente há um distúrbio no pH, porém com um dos componentes em desacordo com as relaçõesdescritas (direta e inversamente proporcionais), consideramos o componente que está interferindo no pH, e o outro se apresentará como um mecanismo de tentativa de compensação em uma tentativa do organismo em restabelecer o equilíbrio ácido-básico. Tabela 1 – Faixas de normalidade FATOR FAIXA DE NORMALIDADE pH 7,35-7,45 PCO2 35-45 mmHg HCO3 22-26 mm Eq/l Veja o esquema a seguir de como interpretar a gasometria. Quadro 1 – Esquema para interpretar a gasometria 1º observar o pH Apresenta-se normal? Acidose? Alcalose? 2º observar o PCO2 Está dentro dos níveis de normalidade? Hipercapnia? Hipocapnia? 3º observar o HCO3 Está dentro dos níveis de normalidade? Aumentado? Diminuído? 2.3 Finalizando Neste tema, foi possível perceber a importância de uma boa avaliação e como ela pode nos guiar para um diagnóstico, além da importância de se contemplar vários temas, para que nosso tratamento possa ser traçado de forma objetiva, correta e consequentemente eficaz. Estudamos também o equilíbrio ácido-básico em relação à gasometria. Como o corpo se organiza por meio do sistema tampão e como uma descompensação de bicarbonato ou de gás carbônico pode repercurtir na alteração do pH levando a uma acidose ou alcalose. TEMA 3 – DIFERENTES SUPORTES VENTILATÓRIOS: OXIGENIOTERAPIA, VENTILAÇÃO MECÂNICA NÃO INVASIVA (VNI) E VIA ÁEREA ARTIFICIAL O oxigênio tem sido empregado como terapêutica desde o início do século XIX, por se tratar do principal combustível das células do nosso corpo. Entretanto, seu emprego deve ser bem indicado, uma vez que esse gás é considerado um medicamento, e como tal pode apresentar efeitos adversos além de toxicidade. A indicação para esse tipo de terapêutica tem o objetivo de corrigir a hipoxemia, que nada mais é do que a falta de contração de oxigênio no sangue arterial. O oxigênio chega às nossas vias respiratórias através da inspiração, a qual é gerada por um impulso nervoso e por meio qual acontece essa entrada de ar pelas vias respiratórias por uma diferença de pressão entre os meios intra, extra e transtorácicas que existem pelo movimento muscular e de caixa torácica. Quem transporta esse gás pelo sangue é principalmente a hemoglobina, pois o oxigênio é um gás pouco diluível em soluções aquosas, como o plasma, podendo ser encontrado uma pequena concentração dissolvido nele (3ml de O2 dissolvido em 1 l de plasma), ou seja, mais de 98% do O2 é transportado dentro das hemácias, ligado à hemoglobina (Hb). A concentração de O2 pelo organismo pode ocorrer por duas formas: alterações na concentração de Hb ou alteração na mecânica ventilatória. Para verificar se o paciente está apresentando um quadro de hipoxemia, são essenciais duas análises: a oximetria de pulso e a coleta de sangue arterial. O primeiro é uma avaliação mais simplificada, com o uso do oximetria de pulso, que verificará a saturação periférica de O2 (SpO2). Essa saturação para pacientes hígidos deve estar entre os limites de 92-98%. Há exceção dos tabagistas ou pessoas com problemas obstrutivos ventilatórios, os quais podem apresentar uma SpO2 de 85- 92%. O segundo método avaliativo vem da gasometria arterial, na qual é realizada a coleta de sangue arterial para a mensuração, dentre outros gases, íons e concentração de Hb, a pressão de oxigênio presente no sangue arterial. Esse limite de normalidade é estimado entre 70 -100 mmHg. Comprovada a hipoxemia, iniciam-se as terapêuticas de oxigenioterapia suplementar. Quando o fluxo de oxigênio a ser utilizado estiver entre 1 a 4 l/min, não há a necessidade de umidificação suplementar, pois sabe-se que o risco de contaminação do sistema é maior do que o benefício que a umidificação pode propiciar. Entretanto em concentrações acima de 4 l/min há necessidade de umidificação para evitar o ressecamento das vias aéreas e secreções traqueobrônquicas. 3.1 Oxigenoterapia A terapêutica de oxigenioterapia suplementar pode ocorrer por meio de sistemas de baixo e alto fluxo. O primeiro apresenta um fluxo menor que o fluxo inspiratório do paciente. Desse modo, o oxigênio suplementar ofertado mistura-se com o ar inspirado, podendo ter uma fração inspirada de oxigênio (FiO2) variável. Seu uso é recomendado para pacientes com frequência respiratória inferior a 25 irpm e com padrão respiratório estável. Podem ser utilizados os seguintes dispositivos: • Cateter nasal; • Máscara com reservatório; • Névoa úmida; • Máscara de traqueostomia. Figura 4 – Cateter nasal Crédito: Light Field Studios/Shutterstockç. Figura 5 – Máscara com reservatório Crédito: Dan Race/Shutterstock. Figura 6 – Névoa úmida Crédito: Suti Stock/Shutterstock. Figura 7 – Máscara de traqueostomia Crédito: PongMoji/Shutterstock. Os dispositivos de alto fluxo compreendem fluxos superiores ao pico de fluxo inspiratório exercido pelo paciente. O fluxo rápido (jato) do oxigênio gera uma pressão subatmosférica, e o ar ambiente é arrastado para o seu entorno. Promove uma concentração mais consistente. O dispositivo utilizado é a máscara de Venturi. Figura 8 – Máscara de Venturi Crédito: Dario Lo Presti/Shutterstock. 3.2 Ventilação mecânica não invasiva (VNI) Trata-se de uma modalidade de ventilação que se utiliza dos dispositivos de máscaras nasal, facial ou total, proporcionando um suporte pressórico ou volumétrico, que tem por objetivo auxiliar na mecânica ventilatória e otimizar as trocas gasosas, podendo evitar a intubação orotraqueal em alguns casos. Para o uso desse mecanismo, é necessário um equipamento, similar a um ventilador mecânico, que proporcionará uma ventilação positiva, com ajustes de parâmetros, inclusive de FiO2, que deverá ser sincronizado à demanda do paciente. Figura 9 – VNI Crédito: JHDT Productions/Shutterstock. 3.3 Via aérea artificial A via aérea artificial consiste na inserção de uma prótese plástica, ou seja, um tubo, por via traqueal. O objetivo desse procedimento é a manutenção da via respiratória livre, para garantir a ventilação e a oxigenação adequadas, para que complicações relacionadas à hipóxia ou hipoventilação sejam evitadas. As indicações para a intubação são: • Indicações anestésicas: no caso de anestesia geral para procedimento cirúrgico; • Desobstrução de vias aéreas altas: devido a traumas, aspiração de corpos estranhos, inalação de fumaça, hematomas e tumores; • Proteção de vias aéreas baixas: broncoaspiração ou corpo estranho; • Facilitar a aspiração traqueobrônquica: quando o paciente apresenta rebaixamento de nível de consciência (ECG ≤ 8) ou apresenta um reflexo de tosse ineficaz, com insucesso na aspiração nasotraqueal; • Permitir assistência ventilatória mecânica: em casos com indicação de auxílio ventilatório, em que não há indicação de uso de interface externa (VNI). Participam do procedimento os seguintes profissionais: médico, responsável pela intubação do paciente; fisioterapeuta, responsável pelo suporte ventilatório utilizando reanimador pulmonar, ligado à fonte de oxigênio, e máscara; técnico de enfermagem, responsável pela montagem do material e administração de medicações; enfermeiro para coordenar a equipe de técnicos e observar sinais do paciente através de monitoração. O leito deve estar com a cabeceira 0º, o paciente em decúbito dorsal, com o pescoço estendido para alinhar os eixos oral, faringeal e laringeal. Ele deve ser ventilado, a volume corrente normal, por um período mínimo de 3 minutos. As medicações diazepínicas devem ser administradas pela equipe de enfermagem, e o médico realizar a intubação utilizando o laringoscópio. Após a intubação, deve- se insuflar o cuff, verificar o posicionamento, realizar ausculta da região epigástrica e pulmonar, verificando se não há seletividade no procedimento, seguida de fixação da prótese ventilatória.O paciente então é inserido ao ventilador mecânico previamente ajustado. A radiografia de tórax deve ser realizada logo após a intubação para avaliar o correto posicionamento do tubo, que deve estar localizado entre 2 a 4 cm acima da carina. A realização de gasometria arterial também é indicada para identificar a necessidade ou não de ajustes ventilatórios mais individualizados. Figura 10 – Intubação orotraqueal Crédito: Lorena Huerta/Shutterstock. Outro tipo de via aérea artificial é a traqueostomia, normalmente realizada em procedimentos de emergência, quando houve insucesso ou inviabilidade da intubação orotraqueal, ou em pacientes que permanecem intubados e dependentes de ventilação mecânica por um período prolongado, em torno de 7 dias, com o objetivo de prevenir lesões traqueais como a traqueomalácea e a estenose de traqueia. A traqueostomia é um procedimento realizado por meio de uma incisão entre o 2º e 3º anel cartilaginoso, no qual será inserida a prótese de traqueostomia, que pode ser plástica, colocada em pacientes dependentes de VM ou metálica para ventilação espontânea. A equipe de saúde deve ser vigilante em relação à fixação dessas próteses, para manter a via aérea artificial estável, evitando extubações acidentais e de modo que a fixação não cause lesões isquêmicas secundárias da fixação. Figura 11 –Traqueostomia Crédito: Artemida-psy/Shutterstock. 3.4 Finalizando Neste terceiro tema, conhecemos um pouco sobre as vias aéreas artificiais, como é a atuação de cada profissional, da equipe multidisciplinar para este importante procedimento. Vimos, por fim, os meios de oxigenioterapia e como deve ser realizado um diagnóstico de hipoxemia e os meios que possuímos para realizar essa assistência. TEMA 4 – SUPORTE VENTILATÓRIO O suporte ventilatório que é ofertado ao paciente em qualquer situação de emergência respiratória é denominado de ventilação mecânica ou ventilação artificial. O equipamento permite ou auxilia a realização de todas as trocas gasosas, que é realizada pela respiração espontânea. 4.1 Principal indicação baseada na dispneia A insuficiência respiratória aguda (IRA) é a causa mais comum de internação em serviços de terapia intensiva. Por ser um sinal genérico, pode representar o agravamento de alguma doença crônica, complicação de algum procedimento cirúrgico ou um distúrbio ventilatório. O diagnóstico clínico baseia- se na presença de dispneia referida pelo paciente, associada a sinais e sintomas de hipoxemia ou hipercapnia, que devem ser comprovadas por meio de exame de gasometria arterial. Pacientes com esse distúrbio apresentam alguns sinais e sintomas genéricos, como: dispneia, uso de musculatura acessória, confusão mental, cianose. Entretanto, juntamente com o exame laboratorial e a possível doença de base, é possível chegar a um diagnóstico clínico de IRA. A dispneia é o relato mais comum e refere-se ao desconforto referido pelo paciente ao respirar, como é experienciada e descrita de diferentes formas pelos pacientes, dependendo da causa. Há três tipos de insuficiência respiratória: hipoxêmica ou tipo I (referente à redução de oxigênio), hipercápnica ou tipo II (referente ao aumento da concentração de CO2 na corrente sanguínea), ou mista (combinando sinais de hipoxemia e hipercapnia). A primeira normalmente está vinculada a alterações nas trocas gasosas, por disfunções no parênquima pulmonar, com atelectasias, pneumonia, síndrome do desconforto respiratório agudo (SDRA), disfunção cardíaca. A IRA tipo II está vinculada a distúrbios ventilatórios, como asma, e a mista associa ambas descompensações, como é o caso de pacientes com exacerbação da doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC). 4.2 Ventilação mecânica: conceitos básicos A ventilação mecânica é um sistema que gera pressões positivas, no qual o ar gerado pelo aparelho (Figura 12) é introduzido às vias respiratórias através de um fluxo, vencendo a impedância do sistema respiratório. A fase expiratória acontece de forma passiva por meio da abertura da válvula expiratória, na qual a pressão positiva alveolar e a retração elásticas dos pulmões insuflados empurram o ar para o ambiente externo. O ciclo respiratório é composto por quatro fases. Quadro 2 – Fases do ciclo respiratório A ventilação mecânica tem como indicação principal a desproporção entre o esforço respiratório do paciente e a demanda da ventilação pulmonar, devido a uma fadiga muscular, mecânica respiratória alterada ou alteração de estimulação do centro respiratório. Pode ser indicada para supressão respiratória no caso de anestesia geral para procedimento cirúrgico, apneia, correções associadas à hipoxemia ou à hipercapnia, ao repouso de musculatura respiratória, entre outros. Alguns ajustes são comuns a praticamente todas as modalidades ventilatórias: Primeira fase • Chamada de disparo, acontece no início da inspiração. • Esse disparo pode ser gerado pelo próprio ventilador, através da sua programação, ou pelo paciente, se houver ajuste de sensibilidade para que o mesmo consiga disparar o ventilador. Segunda fase • Fase inspiratória propriamente dita, na qual o ventilador mecânico, através da abertura da sua válvula inspiratória, gerará o fluxo positivo. • Nesta fase também temos a pausa inspiratória, que pode ser ajustado em algumas modalidades, e surge após o fechamento da válvula inspiratória e antes da abertura da válvula expiratória, e tem como objetivo a acomodação do ar no sistema. Terceira fase • Chamada de ciclagem e acontece entre o final da inspiração e início da expiração. • Diferentes comandos podem determinar a ciclagem em um ventilador mecânico como tempo inspiratório, volume corrente, pressão inspiratória, que será entregue ao paciente. Quarta fase • Chamada de expiração, a qual permite a saída passiva do ar através da abertura da válvula exalatória, e sua duração é maior que o tempo inspiratório. Quadro 3 – Ajustes nas modalidades ventilatórias Figura 12 – Ventilador mecânico Crédito: AlexLMX/Shutterstock. Deve ser ajustada de modo individualizado indo ao encontro da demanda do paciente. Entretanto, segundo as Diretrizes de Ventilação Mecânica, a frequência respiratória deve estar no intervalo de 12 a 16 irpm, com fluxo inspiratório ou tempo inspiratório visando manter inicialmente a relação I:E em 1:2 a 1:3. Frequência respiratória •De modo geral, o ajuste inicial deve ser em torno de 50-60%, de modo que o paciente mantenha saturação arterial entre o intervalo de 93 a 97 %.Fração inspirada de oxigênio (FIO2) •Manutenção de uma pressão supra-atmosférica ao final da expiração. Segundo as Diretrizes a PEEP deve ser ajustada inicialmente entre 3 a 5 cm H2O. Pressão expiratória final positiva (PEEP) 4.2.1 Ventilação mecânica: repercussão cardiovascular e interação hemodinâmica O sistema cardiorrespiratório, para seu perfeito funcionamento, necessita do equilíbrio entre a função cardiovascular e a função pulmonar. Essa interdependência entre coração e pulmões é denominada interação cardiopulmonar (ICP). Esse equilíbrio cardiopulmonar pode ser alterado por condições patológicas ou pelo uso de ventilação mecânica, que, por sua vez, está associado a modificações fisiológicas importantes que veremos a seguir. A respiração espontânea ocorre por diferença de pressão entre o ambiente externo e a cavidade torácica (pressão intrapleural e intratorácica), utilizando pressões negativas. Entretanto a ventilação mecânica acontece em versão totalmente antifisiológica, gerando pressão positiva para que aconteça a ventilação pulmonar, e gerando repercussões principalmente no sistema cardiovascular com mudanças no retorno venoso, aumento da resistência vascular pulmonar, compressãodireita do pericárdio e interdependência ventricular. Durante a inspiração fisiológica, a pressão de átrio direito diminui, pois é diretamente afetada pela pressão intratorácica, e a pressão intra-abdominal aumenta devido ao movimento durante a inspiração realizada pelo diafragma. Por sua vez, o gradiente pressórico gerado entre as veias extratorácicas (veias cavas) e a redução da pressão do átrio direito promovem o aumento do retorno venoso, sendo este o principal determinante do débito cardíaco (DC). No entanto, quando essa inspiração acontece por meio de ventilação mecânica, ou seja, positiva, ocorre um aumento da pressão intratorácica e consequentemente do átrio direito, levando a uma redução do retorno venoso, que, assim, reduzirá o volume diastólico final do ventrículo esquerdo, promovendo redução do DC. Essa redução do retorno venoso tem seus danos potencializados quando associados à hipovolemia, ao choque séptico e à hiperinsuflação dinâmica. Em relação ao ventrículo direito, não existe comprovação de que a ventilação mecânica, isoladamente, comprometa a contratilidade ventricular direita, porém, quando há dilatação do ventrículo direito devido às altas pressões intratorácicas, sobrecarga volêmica ou aumento da resistência vascular pulmonar, esse comprometimento pode acontecer incompetência ou dilatação da válvula tricúspide, e desvio septal, comprimindo o ventrículo esquerdo, com o consequente prejuízo ao débito cardíaco. Durante a ventilação mecânica, o ventrículo esquerdo comporta-se similarmente ao ventrículo direito, ou seja, alterações na pré-carga do ventrículo direito repercutirão em alterações de enchimento ventricular esquerdo (pré-carga ventrículo esquerdo), por meio da redução do retorno venoso, da elevação da pós- carga do ventrículo direito (pelo aumento da resistência vascular pulmonar), desvio do septo interventricular para a esquerda, do aumento da pressão pleural justacardíaca, causada pela hiperexpansão pulmonar. Todas essas repercussões podem ser amenizadas, com correção volêmica, escolha do modo de ventilação mais adequado, juntamente ajustado com adequação de PEEP, redução da resistência vascular pulmonar e sistêmica com o emprego de drogas vasoativas e até mesmo medicações inotrópicas. 4.2.2 Condutas para a prevenção da pneumonia associada à ventilação mecânica (PAV) A pneumonia associada à ventilação mecânica (PAV) tem seu desenvolvimento em 48 horas a partir da submissão do paciente à ventilação mecânica, sendo considerada também até 48 horas pós-extubação. Seu mecanismo mais comum está relacionado à perda da proteção das vias aéreas, favorecendo o crescimento de micro-organismos tanto exógenos quanto endógenos. Isso ocorre porque há um desequilíbrio entre o mecanismo de defesa do paciente e o agente microbiano que, devido ao seu tamanho inóculo ou virulência, se deposita no trato respiratório inferior, gerando o processo infeccioso. Pacientes que são intubados perdem a barreira original que existe entre a orofaringe e a traqueia e apresentam ainda uma diminuição ou perda do reflexo de tosse, devido à administração de sedativos, ao nível de consciência ou até mesmo à submissão do paciente ao respirador artificial. A PAV é a infecção hospitalar com maior prevalência com índice em torno de 46%. Os micro-organismos mais frequentemente identificados são: bacilos Gram-negativos (25%), Skaphylococtus aureus (20%), Pseudomonas aeruginosa (20%), Haemophilus influenzae (10%). É importante salientar que há uma incidência prevalente em relação à infecção polimicrobiana com índice de 13 a 58%. O diagnóstico de PAV é dado pela tríade: evidências clínicas como febre e secreção purulenta e fétida, coleta de exames laboratoriais como hemograma e coleta de secreção, e evidências radiológicas com presença de novos infiltrados. A pneumonia associada à ventilação mecânica (PAV) está relacionada ao aumento da morbidade e mortalidade, tempo de internação e elevação de custos hospitalares. Por sua incidência e suas implicações, devem ser adotadas medidas preventivas para se evitarem as infecções do trato respiratório relacionadas à assistência à saúde. Muitos hospitais já possuem em suas rotinas um Bundle, ou seja, um conjunto de medidas para se prevenir ou diminuir a incidência de PAVs visando medidas de cunho multidisciplinar. No Quadro 4, seguem alguns exemplos para prevenção da PAV: Quadro 4 – Exemplos para prevenção da PAV Cabeceira elevada em torno de 30º a 45º É uma das principais recomendações para evitar a broncoaspiração, principalmente nos pacientes que estiverem recebendo nutrição enteral Higiene oral com clorexidina 0,12% A higienização adequada da cavidade oral do paciente submetido à ventilação mecânica é imprescindível, pois nesses casos há diminuição da produção salivar e impossibilidade de mastigação, favorecendo aparecimento de biofilme dental, que pode ser um importante reservatório para patógenos com possibilidade de broncoaspiração Pressão do cuff entre 20-30 cm H2O ou 25-35 mmHg controle efetivo da pressão do cuff da cânula endotraqueal, pois assegura a vedação da traqueia impedindo microaspirações para trato respiratório inferior Aspiração de secreções supraglóticas A presença do tubo orotraqueal facilita a colonização bacteriana devido ao acúmulo de secreção acima do balonete (espaço subglótico), aumento o risco de broncoaspiração Despertar diário Por meio da suspensão de sedação e avaliação no nível de consciência do paciente para que possa evoluir para um possível desmame da ventilação artificial e retirada da prótese ventilatória Prevenção de úlceras pépticas Um possível sangramento no trato digestivo pode alterar o pH, propiciando o crescimento de micro-organismos e possibilidade de refluxo, aumento a chance de uma broncoaspiração 4.2.3 Análise gráfica das curvas ventilatórias (pressão, fluxo e volume) A análise das curvas ventilatórias mostra ao profissional de saúde detalhes sobre o modo ventilatório ao qual o paciente está sendo submetido, as interações paciente/ventilador e o comportamento mecânico do sistema respiratório como um todo. A correta interpretação desses dados e de como realizar os possíveis ajustes necessários se faz uma atribuição de grande valia para propiciar o conforto ao paciente, evitar lesões que possam agravar seu quadro patológico, otimizar a ventilação e até mesmo observar uma possível evolução. As curvas de pressão apresentam sua variável normal de acordo com a modalidade ventilatória, porém, à medida que o fluxo de ar entra no trato respiratório, a pressão inspiratória vai se elevando, pois é necessária para vencer dois componentes: um resistivo (devido à resistência ao fluxo de ar passando pelas vias aéreas) e outro elástico (decorrente da distensão dos pulmões e da parede torácica). Esses dois componentes são demonstrados por meio da pressão de pico (Ppico) e pressão de platô (Pplatô), respectivamente. Durante a ventilação espontânea ou assistida, na inspiração, devido à contração da musculatura respiratória, ocorre uma queda da pressão nos alvéolos/vias aéreas para que seja gerado o fluxo inspiratório, nesse caso representado por uma pressão negativa no gráfico. Na expiração, como a pressão no sistema está elevada, a abertura da válvula expiratória promoverá a saída passiva do volume inspirado no ciclo. A curva de pressão na fase expiratória irá decair até o momento em que atingir a peep ajustada, ou seja, se a peep ajustada for de 5 cmH2O, a linha da expiração irá decair até atingir o nível demarcado em 5 cmH2O de peep, não atingindo a baseline do gráfico de pressão. As curvas de fluxo iniciam-se a partir de um determinado intervalo de tempo que pode ser ajustado de acordo com a modalidade ventilatória. Elaobedece ainda à frequência respiratória e consequentemente à relação entre tempo inspiratório e expiratório. O fluxo vai definir o tempo que a válvula inspiratória permanecerá aberta, de acordo com o parâmetro ajustado de cada modalidade. Após o início do ciclo (disparo), o fluxo aumenta até atingir um valor prefixado, chamado de pico de fluxo. O fluxo inspiratório encerra-se quando há o fechamento da válvula inspiratória, iniciando a expiração. No caso das modalidades espontâneas, quem regula a fase de ciclagem é o próprio paciente. A expiração ideal é aquela em que a linha retorna à baseline ao final da expiração e antes de novo disparo. Caso isso não aconteça, há indicação de que o paciente está mantendo uma peep maior que a ajustada previamente, gerando o que chamamos de autopeep, a qual causa a hiperinsuflação dinâmica pulmonar, extremamente prejudicial principalmente em pacientes obstrutivos, como portadores de DPOC. As curvas de volume iniciam-se na inspiração de forma ascendente até atingir o pico, sendo este referente ao volume que foi previamente ajustado, ou ao volume recebido ao se atingir a pressão inspiratória previamente ajustada, ou ao volume final da inspiração que o paciente realizou ao final dessa fase. Em seguida, a curva inicia a queda, até o volume total expirado, atingindo a baseline do gráfico. Caso haja algum tipo de vazamento, desconexão do circuito ou aprisionamento aéreo, essa curva expiratória será interrompida antes de chegar à base do gráfico, seguida por uma nova fase inspiratória. Figura 13 – Curvas ventilatórias CréditO: Box Lab/Shutterstock. 4.3 Modos convencionais de ventilação mecânica: VCV/A, PCV/A, SIMV, PSV, CPAP A submissão de um paciente à ventilação mecânica (VM) tem como objetivo promover o alívio, de modo parcial ou total, do trabalho respiratório realizado, ou ainda manter a função ventilatória adequada em caso de inviabilidade desta por parte do paciente. Considera-se trabalho respiratório a energia necessária para movimentar determinado volume de gás através das vias respiratórias com adequada expansibilidade pulmonar, possibilitando as trocas gasosas promovida nos alvéolos. A VM é realizada por meio de ciclos ventilatórios, que contemplam duas fases: fase inspiratória e fase expiratória. A primeira inicia-se com a abertura da válvula inspiratória, também chamada de válvula de fluxo, na qual a máquina gerará um fluxo de ar, com determinada pressão, necessária para vencer o atrito nas vias respiratórias e expandir os pulmões por um tempo previamente ajustado, o qual seja suficiente para realização das trocas gasosas de forma efetiva. A fase expiratória inicia-se com a abertura da válvula exalatória. Assim, por retração elástica, o ar deixa o trato respiratório de forma passiva. Os modos ventilatórios definem como os ciclos serão iniciados, mantidos e finalizados. Um ciclo ventilatório inclui tanto a fase inspiratória quanto a fase expiratória, no entanto as classificações dos ciclos e dos modos são baseadas na fase inspiratória. Há uma diversidade de modos ventilatórios. Vamos abordar os modos básicos que são os seguintes (Figura 14): Figura 14 – Modos ventilatórios básicos 4.3.1 Assistocontroladas As modalidades assistocontroladas, tanto a volume quanto à pressão, referem-se a ciclos respiratórios controlados, ou seja, se dão pelo ventilador mecânico, no qual são ajustados à frequência respiratória, à pressão inspiratória ou ao volume desejado, ao fluxo e ao tempo inspiratório. Entretanto, o paciente tem a possibilidade de disparar um ciclo respiratório entre os ciclos realizados pelo aparelho, realizando, porém, o ciclo mandatório. As indicações para essa modalidade são tanto para pacientes totalmente dependentes da máquina, como é o caso de pacientes em estado de coma ou efeito anestésico, quanto pacientes que apresentam um drive ventilatório, porém ainda sem competência para realizar o ciclo completo. Quanto às modalidades Ventilação Assistocontrolada a volume (VCV/A) Ventilação Assistocontrolada à pressão (PCV/A) Ventilação mandatória intermitente sincronizada (SIMV) Pressão de suporte ventilatório (PSV) Pressão contínua positiva nas vias aéreas (CPAP) pressão ou volume, não há superioridade de uma em relação à outra. Vale aquela com a qual o profissional está mais familiarizado, ou com melhor adaptação do paciente. 4.3.2 Ventilação intermitente A ventilação intermitente, chamada de SIMV (synchronized inspiratory mandatory ventilation), pode ser ajustada tanto a volume quanto à pressão. Nessas duas modalidades, há janelas nas quais o paciente consegue realizar ciclos espontâneos. Esse tipo de ventilação é comumente utilizado com o objetivo de melhorar a interação paciente-ventilador, contudo, não é indicado que o paciente permaneça por longos períodos nessa modalidade, pois há uma acomodação do paciente à máquina, dificultando o desmame, principalmente em pacientes mais comprometidos. 4.3.3 Pressão de suporte ventilatório A modalidade de PSV (pressão de suporte ventilatório) foi idealizada com o objetivo de evoluir o paciente para um início de desmame e uma possível extubação. O paciente precisa disparar o ventilador para que então a máquina o auxilie durante a inspiração. Para isso acontecer, o ajuste de sensibilidade do ventilador precisa ser suficiente para que o paciente consiga vencê-lo sem grande esforço, porém, não tão sensível a ponto de a ventilação autodisparar. Outro ajuste importante é a própria pressão de suporte, na qual quanto mais alto esse valor estiver, maior será a assistência que o paciente estará necessitando para completar o ciclo inspiratório. Há ainda o ajuste de peep, que é sempre somado à pressão de suporte, oferecendo assim mais um auxílio ao paciente. 4.3.4 Continuous positive airway pressure Na modalidade CPAP (continuous positive airway pressure), o respirador está programado para somente permitir ciclos espontâneos, mantendo a pressão contínua positiva nas vias aéreas. Nessa situação, os ciclos apresentarão redução da via aérea na inspiração, e o aumento acontecerá na fase expiratória, de modo a simular a nossa respiração fisiológica. O único parâmetro ajustável além da FIO2 é a peep pelo fato de o paciente estar acoplado ao ventilador, no qual os circuitos e válvulas geram resistências. 4.4 Finalizando Estudamos os conceitos básicos da assistência ventilatória mecânica, compreendendo como a dinâmica desse equipamento é tão vital para pacientes que necessitam de um suporte mais invasivo, e quais são os ajustes comuns a todas as modalidades. Por fim, também conhecemos como a pressão positiva gerada por esse aparelho gera repercussões no sistema cardiovascular e cardiorrespiratório. REFERÊNCIAS BARBAS, C. S. V.; ÍSOLA, A. M.; FARIAS, A. M. C. et al. Diretrizes brasileiras de ventilação mecânica. Brasília: Associação de Medicina Intensiva Brasileira (AMIB) e Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia (SBPT), 2013. CARVALHO, C. R. R. de; TOUFEN JUNIOR, C.; FRANCA, S. A. Ventilação mecânica: princípios, análise gráfica e modalidades ventilatórias. Jornal Brasileiro de Pneumologia, v. 33, suppl.2, 2007. 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