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1 PMG-NI Técnico de Procuradoria Constituição: conceito e conteúdo. Supremacia da Constituição. Princípios constitucionais. Emenda, reforma e revisão constitucional. .............................................................................. 1 Direitos e garantias fundamentais. Direitos e deveres individuais difusos e coletivos. Direitos sociais. .................................................................................................................................. 53 Direito à Saúde. Lei nº 8080/1990. .................................................................................... 77 Ações constitucionais. ................................................................................................... 105 Organização do Estado Brasileiro; divisão espacial do poder; Estado Federal; União; Estados Federados; Distrito Federal; municípios. ................................................................. 119 Poder Legislativo. Organização. .................................................................................... 142 Poder Executivo. Atribuições. ......................................................................................... 176 Poder Judiciário. Atribuições. Organização. Órgãos e competência. Supremo Tribunal Federal, Superior Tribunal de Justiça, Tribunais Regionais Federais; Tribunais de Justiça; juízes federais e estaduais. ........................................................................................................... 190 Funções essenciais à Justiça. ......................................................................................... 213 Da Administração Pública. Estruturas básicas. Servidores públicos. Princípios constitucionais. .................................................................................................................... 224 Lei Orgânica do Município de Nova Iguaçu. .................................................................... 241 Sistema Tributário Nacional: Princípios constitucionais tributários. Repartição constitucional de competências tributárias. Fundos de Participação. Limitações ao poder de tributar. ....... 289 1593291 E-book gerado especialmente para JULIA EVELYN PAIXAO MACIEL 2 Olá Concurseiro, tudo bem? Sabemos que estudar para concurso público não é tarefa fácil, mas acreditamos na sua dedicação e por isso elaboramos nossa apostila com todo cuidado e nos exatos termos do edital, para que você não estude assuntos desnecessários e nem perca tempo buscando conteúdos faltantes. Somando sua dedicação aos nossos cuidados, esperamos que você tenha uma ótima experiência de estudo e que consiga a tão almejada aprovação. Pensando em auxiliar seus estudos e aprimorar nosso material, disponibilizamos o e-mail professores@maxieduca.com.br para que possa mandar suas dúvidas, sugestões ou questionamentos sobre o conteúdo da apostila. Todos e-mails que chegam até nós, passam por uma triagem e são direcionados aos tutores da matéria em questão. Para o maior aproveitamento do Sistema de Atendimento ao Concurseiro (SAC) liste os seguintes itens: 01. Apostila (concurso e cargo); 02. Disciplina (matéria); 03. Número da página onde se encontra a dúvida; e 04. Qual a dúvida. Caso existam dúvidas em disciplinas diferentes, por favor, encaminhar em e-mails separados, pois facilita e agiliza o processo de envio para o tutor responsável, lembrando que teremos até cinco dias úteis para respondê-lo (a). Não esqueça de mandar um feedback e nos contar quando for aprovado! Bons estudos e conte sempre conosco! 1593291 E-book gerado especialmente para JULIA EVELYN PAIXAO MACIEL 1 CONSTITUIÇÃO Constituição1 deve ser entendida como a lei fundamental e suprema de um Estado, no qual contém normas referentes à estruturação do mesmo. Como por exemplo a formação dos poderes públicos, formas de governos, aquisição do poder de governar, distribuição de competências, direitos, garantias e deveres dos cidadãos. Além disso, é a Constituição que individualiza os órgãos competentes para a edição de normas jurídicas, legislativas ou administrativas. De acordo com Canotilho2, traçando o conceito ideal de constituição, se observa que todas as constituições devem: a) Ter um sistema de consagração de garantias da liberdade; b) Conter o princípio da separação dos Poderes; c) Ser escritas. Conceito de Constituição Existem várias concepções sobre o conceito de constituição, no qual podem ser tradicionais ou modernas: Concepções Tradicionais a) Concepção sociológica: enxerga as constituições como um fato social, como a soma dos fatores reais de poder de um país, resultado concreto do relacionamento entre as forças sociais. Existe uma Constituição real e uma escrita. Esta somente terá validade se coincidir com aquela. Tem como principais características: - A Constituição é vista mais como fato do que como norma, prioriza-se a perspectiva do ser e não a do dever ser; - A Constituição não está sustentada numa normatividade superior transcendente, não se baseia num direito natural, mas sim nas práticas desenvolvidas na sociedade. b) Concepção política: constituição seria uma decisão política fundamental, a qual não se apoia na justiça de suas normas, mas sim no que nela foi politicamente incluído. Existe a Constituição em si e normas ou leis constitucionais, as quais, apesar de integrarem o texto escrito, não seriam materialmente constitucionais. Faz parte da Constituição, efetivamente, a disciplina da forma de Estado, do sistema de governo, do regime de governo, da organização e divisão dos poderes e o rol de direitos individuais. As leis constitucionais são todas aquelas normas inscritas na Constituição que poderiam vir tratadas em legislação ordinária. c) Concepção jurídica: constituição é o paradigma de validade de todo o ordenamento jurídico de um Estado e instituidor de sua estrutura. Sua concepção é estritamente formal. Daqui resultou a teoria da construção escalonada do ordenamento jurídico. Constituição é norma pura, é um dever ser, não há fundamento sociológico ou político, apenas caráter normativo. Para a palavra Constituição podemos dar dois sentidos: - Jurídico-Positivo: direito positivo é norma escrita ou posta pelo homem (pirâmide das leis – princípio da compatibilidade vertical entre as normas superiores e inferiores). Logo, Constituição seria norma escrita; - Lógico-Jurídico: a norma inferior encontra seu fundamento de validade na norma que lhe for superior. A Constituição encontra o seu fundamento de validade não no direito posto, mas no plano pressuposto lógico, ou seja, em valores metajurídicos, já que seu fundamento não seria de cunho constitucional. 1 DE MORAES, Alexandre. Direito Constitucional. 33ªEdição. 2018. 2 CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito Constitucional.2016. Constituição: conceito e conteúdo. Supremacia da Constituição. Princípios constitucionais. Emenda, reforma e revisão constitucional. 1593291 E-book gerado especialmente para JULIA EVELYN PAIXAO MACIEL 2 Concepções Modernas a) Teoria da Força Normativa da Constituição: A Constituição escrita não necessariamente será resultado da vontade da parte mais forte no embate, pode ser que a Constituição escrita seja capaz de redesenhar a soma dos fatores reais de poder. Logo, ela não seria somente um resultado sociológico da sociedade, mas também, e principalmente, teria o poder de modificar o conjunto de forças, moldar a sociedade como ela é. A interpretação tem significado decisivo para a consolidação e preservação da força normativa da Constituição, com poder de moldar a realidade. Por isso que se diz que a concepção da força normativa é uma resposta à concepção sociológica, pois nesta, a concepção apenas reflete a soma dos fatores reais de poder, enquanto naquela,a Constituição efetivamente tem o condão de moldar a realidade. b) Constituição Simbólica: formulada por Marcelo Neves3, a utilização da norma constitucional como símbolo advém da intenção do legislador. Este ou queria realmente concretizar o que escrevia ou tinha a intenção somente de entregar um símbolo à sociedade. Seria, para ele, o que acontece em constituições outorgadas em regimes ditatoriais. c) Constituição Aberta: formulada por Paulo Bonavides4, para ele o objeto da constituição é sempre dinâmico. A constituição deve ser o documento dinâmico que não se enclausure em si mesmo, mas que acompanhe as modificações e necessidades da sociedade, sob pena de ficar ultrapassada e condenada à morte. Por isso que é importante que ela seja redigida com conceitos jurídicos mais abertos, com normas de caráter mais abstrato, de forma a permitir, mediante a interpretação, sua adequação à realidade. Questões 01. (PF - Delegado - CESPE/2018) A possibilidade de um direito positivo supraestatal limitar o Poder Legislativo foi uma invenção do constitucionalismo do século XVIII, inspirado pela tese de Montesquieu de que apenas poderes moderados eram compatíveis com a liberdade. Mas como seria possível restringir o poder soberano, tendo a sua autoridade sido entendida ao longo da modernidade justamente como um poder que não encontrava limites no direito positivo? Uma soberania limitada parecia uma contradição e, de fato, a exigência de poderes políticos limitados implicou redefinir o próprio conceito de soberania, que sofreu uma deflação. Considerando o texto precedente, julgue o item a seguir, a respeito de Constituição, classificações das Constituições e poder constituinte. A ideia apresentada no texto reflete a Constituição como decisão política fundamental do soberano, o que configura o sentido sociológico de Constituição. ( ) Certo ( ) Errado 02. (MPE/RR - Promotor de Justiça Substituto - CESPE/2017) Nos últimos séculos, em muitos países, várias concepções de Constituição foram elaboradas por diversos teóricos, muitas delas contraditórias entre si, o que torna o próprio conceito de Constituição essencialmente contestável. Com relação às teorias da Constituição, assinale a opção correta. (A) De acordo com a teoria substantiva de Ronald Dworkin, os princípios constitucionais são mandados de otimização que devem ser ponderados no caso concreto. (B) Para Carl Schmitt, Constituição não se confunde com leis constitucionais: o texto constitucional pode eventualmente colidir com a decisão política fundamental, que seria a Constituição propriamente dita. (C) Para Konrad Hesse, a Constituição, para ser efetiva, deve corresponder à soma dos fatores reais de poder. (D) Segundo a teoria pura de Kelsen, a interpretação de uma Constituição deve fundamentar-se essencialmente na intenção daqueles que escreveram originalmente o texto. 03. (TJ/MG - Juiz - FUNDEP) Sobre o conceito de Constituição, assinale a alternativa CORRETA. (A) É o estatuto que regula as relações entre Estados soberanos. (B) É o conjunto de normas que regula os direitos e deveres de um povo. 3 SOUZA JÚNIOR, Luiz Lopes. A Constituição. lfg.com.br. 4 BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 8ª edição. 1593291 E-book gerado especialmente para JULIA EVELYN PAIXAO MACIEL 3 (C) É a lei fundamental e suprema de um Estado, que contém normas referentes à estruturação, à formação dos poderes públicos, direitos, garantias e deveres dos cidadãos. (D) É a norma maior de um Estado, que regula os direitos e deveres de um povo nas suas relações. Gabarito 01.Errado / 02.B / 03.C Comentários 01.Resposta: Errado A questão apresenta o sentido jurídico de Hans Kelsen, sendo, portanto, uma concepção jurídica e não sociológica. 02. Resposta: B Carl Schmitt formulou a concepção política. Nela, a Constituição propriamente dita seria uma decisão política fundamental, a qual não se apoia na justiça de suas normas, mas sim no que nela foi politicamente incluído. 03. Resposta: C Constituição é muito mais do que um documento escrito que fica no ápice do ordenamento jurídico nacional estabelecendo normas de limitação e organização do Estado, mas tem um significado intrínseco sociológico, político, cultural e econômico. Independente do conceito, percebe-se que o foco é a organização do Estado e a limitação de seu poder. Objeto O objeto da Constituição foi evoluindo de acordo com as evoluções sociais, políticas e econômicas, de modo que atualmente, podemos estruturar o objeto das Constituições da seguinte forma: - Estruturação do estado; - Organização dos Poderes e seus órgãos; - Disposição sobre o modo de aquisição de poder e a forma de seu exercício; - Limitação da atuação do poder; - Proteção aos direitos e garantias dos indivíduos; - Fixação do regime político; - Fixação e disciplina das finalidades sociais e econômicas do Estado; - Determinação dos fundamentos dos direitos econômicos, sociais e culturais do Estado. Elementos Não há consenso doutrinário sobre quais são os elementos, entretanto, a generalidade das leis fundamentais revela, em sua estrutura normativa, cinco categorias de elementos, conforme segue: 1. Orgânicos: são normas que dão estrutura ao Estado. Cuidam dos órgãos do Estado, suas funções, atribuições de poderes. Então, como exemplo, nós temos o artigo 44 da Constituição que trata das atribuições do Poder Legislativo; 2. Limitativos: assim denominados porque limitam a ação dos poderes estatais e dão a tônica do Estado de Direito, consubstanciando o elenco dos direitos e garantias fundamentais: direitos individuais e suas garantias, direitos de nacionalidade e direitos políticos e democráticos; 3. Sócio ideológicos: consubstanciados nas normas sócio ideológicas, normas que revelam o caráter de compromisso das constituições modernas entre o Estado individualista e o Estado Social, intervencionista; que tratam da intervenção do Estado na ordem econômica e social. Ao contrário das normas limitativas, que limitam o poder do Estado, as normas sócio ideológicas disciplinam a intervenção do Estado, o poder do Estado na vida privada, regulando a vida da sociedade e até mesmo desenvolvendo atividade econômica através de empresas públicas. Esse tipo de norma não costuma ser encontrada em constituições liberais; 4. De estabilização constitucional: destinam-se a dar perenidade às instituições, a dar segurança ao funcionamento das instituições; consagrados nas normas destinadas a assegurar a solução de conflitos constitucionais, a defesa da Constituição, do Estado e das instituições democráticas, premunindo os 1593291 E-book gerado especialmente para JULIA EVELYN PAIXAO MACIEL 4 meios e as técnicas contra sua alteração e infringência, a não ser nos termos nela própria estatuídos (ações concentradas de controle, intervenção, Estado de Sítio e de Defesa etc.); 5. Formais de aplicabilidade: são normas de aplicação da Constituição, vão tratar de vigência, eficácia de normas constitucionais. Vão tratar de quando a Constituição entra em vigor, o que ela revoga. Consubstanciadas nas normas que estatuem regras de aplicação das constituições, assim, o preâmbulo, o dispositivo que contém as cláusulas de promulgação e as disposições transitórias. Classificações (tipologia) Quanto ao Conteúdo a) Materiais ou substanciais: são as normas constitucionais escritas ou costumeiras, estejam ou não codificadas em um único documento, regulando a estrutura e organização do Estado e os direitos fundamentais. Elas têm conteúdo essencialmente constitucional. Todas as normas que cuidam da organização do Estado e dos Direitos Fundamentais, mesmo que não estejam na Constituição Formal, formarão a Constituição material do País. b) Formais: documento escrito, estabelecido de modo solene pelo poder constituinte originário e somente modificável por processos e formalidades especiais nela própriaestabelecidos. A CF/88 é formal, todas as suas normas têm caráter constitucional independentemente de seu conteúdo. Quanto à Forma a) Escritas ou dogmáticas: fruto de um trabalho racional ou sistemático. Pode ser codificada num único texto, ou não codificada, esparsa por textos diversos, como tem o ocorrido com nossa Constituição, que já não é mais codificada em decorrência da quantidade de normas constitucionais que se encontram apenas nas emendas. b) Não escritas: costumeiras, consuetudinárias ou históricas: é o exemplo da Constituição Inglesa, que se baseia nos costumes e na jurisprudência. Porém, pode ter textos escritos, os quais se incorporam à Constituição. Há uma ligação natural entre a Constituição histórica, que traduz a evolução do pensamento político, com a Constituição não escrita. A Constituição não escrita, na parte que é escrita, se apresenta em vários documentos, como ocorre no Reino Unido: uma parte ainda é da Carta do João Sem Terra de 1.215, que é considerado um documento constitucional; a Lei do Habeas Corpus que é de 1.689 é considerada uma Lei constitucional; a Lei que organiza o Parlamento é considerada também Lei constitucional. Quanto à Origem a) Democráticas, populares ou promulgadas: são elaboradas por representantes do povo, ou seja, são fruto de uma assembleia constituinte que foi criada para isso. No Brasil, foram desse tipo as constituições de 1891, 1934, 1946 e 1988. b) Outorgadas ou impostas: impostas verticalmente, sem participação popular, pelos detentores do poder. No Brasil, temos as constituições de 1824, 1937, 1967 e 1969. c) Pactuadas: quando o poder constituinte não está na mão de seu titular, o povo, mas há uma divisão de poderes entre ambos, sendo parte da constituição decidida pelos detentores do poder e outra parte pelo povo. d) Cesaristas ou plebiscitárias: na verdade, deveria classificar-se como referendada, já que a Constituição é submetida a um referendo após elaborada pelos constituintes. Quanto à Estabilidade a) Imutáveis: não passíveis de modificações. Nesse tipo de constituição, há rápida ruptura entre a realidade social e a norma constitucional, perdendo a efetividade. b) Rígidas: exige quórum mais rígido do que as demais normas infraconstitucionais para ser modificada. Trata-se de um dos pilares do controle de constitucionalidade, já que para se fazer o controle há de se ter a supremacia da constituição, e para se ter a supremacia, essa deve ser rígida. c) Semirrígidas: precisa de um processo mais difícil para alteração de parte de seus dispositivos e permite a mudança de outros dispositivos por um procedimento mais simples. Assim, parte é rígida e parte flexível, como ocorreu com a Constituição de 1824 no Brasil. d) Flexíveis: a lei ordinária tem a mesma natureza jurídica de emenda constitucional, não havendo divergência no processo legislativo de uma e de outra. Nas constituições flexíveis mostra-se inviável o controle de constitucionalidade. 1593291 E-book gerado especialmente para JULIA EVELYN PAIXAO MACIEL 5 Quanto à Extensão a) Concisas, breves, curtas ou sintéticas: preveem somente princípios e normas gerais, não se preocupam em definir todos os aspectos da sociedade, sendo típica dos estados liberais. Geralmente tem caráter eminentemente negativo. Exemplo: Constituição norte-americana. b) Longas, analíticas ou prolixas: típicas de estado de bem-estar social, visam a garantir uma série de direitos e deveres aos indivíduos e os limites da atuação estatal, de forma bem definida. Quanto à Finalidade a) Negativas, garantias, liberais ou de texto reduzido: é aquela que na relação entre o Estado e o Indivíduo, se preocupa apenas em garantir o indivíduo contra o Estado. Por sua vez, as negativas cuidam apenas daquelas normas que não poderiam deixar de estar expressas numa Constituição. Destacam-se no período inicial da consagração dos direitos relativos às liberdades públicas e políticas nos textos constitucionais, já que impunham a omissão ou negativa de ação por parte dos países. São normalmente sintéticas. b) Dirigentes, plásticas ou programáticas: nascem com a evolução dos Estados Sociais, estabelecem programas e definem os limites e a extensão de seus direitos; são sempre analíticas. Seu principal teórico foi Canotilho. É o modelo das Constituições Sociais. Dirigente porque quando o Estado intervém na ordem econômica e social, pretende nesse aspecto dirigir as atividades da sociedade. O Estado intervém através de um gerenciamento da vida privada. A Constituição brasileira aderiu ao modelo dirigente, mas um dirigismo que já foi bastante atenuado com várias emendas constitucionais que alteraram a previsão da intervenção na ordem econômica. Na época do primeiro Governo Fernando Henrique com as privatizações de empresas. Esse movimento que foi feito na primeira metade da década de 90 até 1995/1997 foi um movimento liberalizante que tornou a nossa Constituição menos dirigente, com um Estado menos interventor. c) Constituições balanço: é a denominação que se dá à Constituição que meramente descreve e sistematiza a organização política do Estado. Destina-se a espelhar certo período político, um dado estágio das relações de poder no Estado. Quanto à Ideologia ou Objeto Ideológico a) Liberais: consolidam o pensamento liberal político e econômico. São, portanto, constituições que não pregam a intervenção do Estado na ordem econômico e social. É o Estado Mínimo, ou seja, que deve ter uma participação mínima, cuidando apenas da coisa pública, não devendo reger a sociedade, pois essa usa das suas próprias forças, o mercado tem suas próprias forças. A sociedade progride com a busca pelo lucro e isso faz com que pessoas e empresas queiram produzir mais e melhor. É a Lei do mercado. Exemplo: Constituição norte-americana. Geralmente as Constituições liberais são negativas e concisas. b) Sociais: preveem a intervenção do Estado na ordem econômico-social ao regular o mercado, quer dizer, isso faz com que o mercado seja menos livre na regulação do mercado e na redução da desigualdade. Uma característica das constituições sociais, portanto, é valorizar mecanismos de intervenção na ordem econômica, por exemplo, empresas públicas, regulação da ordem econômica também através do sistema tributário, por meio da criação de impostos com natureza extrafiscal, que são aqueles impostos que não são imaginados para arrecadar, até arrecadam, mas não é o objetivo deles, e sim, regular o mercado, como acontece no Brasil com os impostos de importação e exportação. Na ordem social, tende a valorizar no âmbito dos Direitos Fundamentais também os Direitos Sociais, o que não é muito valorizado em constituições liberais, pois nessas, no âmbito dos Direitos Fundamentais, acabam valorizando o direito de liberdade (física, religiosa, de imprensa etc.). Os Direitos Fundamentais numa Constituição Liberal basicamente se resumem aos Direitos Individuais. Já numa Constituição Social, passam a ser integrados também por Direitos Sociais (educação, saúde, previdência, assistência). c) Socialistas: mais do que intervir na ordem econômica e social, pretende planificar a sociedade. Então, ela acaba retirando da sociedade a sua liberdade de buscar o sucesso individual. O Estado não apenas planifica as suas ações no interesse público, mas se apropria dos meios de produção. Fica muito clara a diferença de abordagem dessas três diferenças de ideologia na Constituição, quando nós trabalhamos com um valor constitucional determinado, como o valor da igualdade. A igualdade numa Constituição Liberal é uma igualdade formal. O Estado não pode discriminar as pessoas, têm que tratar a todos como iguais. A visão da igualdade no Estado Social, além impedir que Estado crie situações de discriminação, o obriga a intervir na sociedade para reduzir a desigualdade. 1593291 E-book gerado especialmente para JULIA EVELYN PAIXAO MACIEL 6 A igualdadenum Estado Socialista é uma igualdade material, de resultado. Quanto ao Modo de Elaboração a) Dogmática: será sempre uma Constituição escrita, é a elaborada por um órgão constituinte, e sistematiza os dogmas ou ideias fundamentais da teoria política e do Direito dominantes no momento. b) Histórica ou costumeira: sempre uma Constituição não escrita, resulta de lenta transformação histórica, do lento evoluir das tradições, dos fatos sócio-políticos. Quanto à Dogmática a) Ortodoxa ou comprometida: é aquela comprometida com uma determinada ideologia, que não pode ser alterada pelos governos que se alternarem no Poder. b) Heterodoxa, eclética ou compromissória: aquela que permite o convívio ideológico, sem promover exclusão prévia de formas de pensamento e de ideias sociais e políticas. A Constituição brasileira é uma Constituição Social, mas ela é compromissória, aberta. Isso fica claro, quando no artigo 3º, além daquela previsão da redução de desigualdades sociais e regionais, garante a autonomia privada, livre iniciativa, que é um valor do liberalismo. Quanto à Correspondência com a Realidade ou Classificação Ontológica Esta classificação foi desenvolvida por Karl Lowenstein, é muito cobrada em concursos públicos e se dividi em: a) Normativas: são aquelas constituições que conseguem regular a vida política de um Estado, por estarem em consonância com a realidade social. b) Nominativas: são aquelas constituições que não conseguem regular a vida política de um Estado, pelo descompasso com a realidade. c) Semânticas: é a constituição elaborada como mera formalização do Poder Político dominante. É exemplo a constituição nazista. Constitucionalmente, todas as medidas adotadas durante o Reich foram legítimas. Concluindo, portanto, os entendimentos apresentados, pode-se dizer que Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 é: rígida, dogmática, programática, normativa, social, promulgada, escrita, heterodoxa e analítica. Questões 01. (CRAISA de Santo André/SP - Advogado - IMES/2016) A Constituição Federal brasileira de 1988, no que diz respeito à estabilidade ou alterabilidade pode ser classificada como: (A) semiflexível. (B) rígida. (C) plástica. (D) imutável. 02. (Câmara Municipal de Poá/SP - Procurador Jurídico - VUNESP/2016) A Constituição Federal Brasileira de 1988 pode ser classificada como (A) dogmática, outorgada e rígida. (B) histórica, promulgada e flexível. (C) dogmática, promulgada e rígida. (D) histórica, promulgada e rígida. (E) histórica, outorgada e flexível. 03. (Prefeitura de Cuiabá/MT - Auditor Fiscal Tributário da Receita Municipal - FGV/2016) Edilberto, advogado constitucionalista, idealizou um modelo constitucional com as seguintes características: a primeira parte não poderia sofrer qualquer tipo de alteração, devendo permanecer imutável; a segunda parte poderia ser alterada a partir de um processo legislativo qualificado, mais complexo que aquele inerente à legislação infraconstitucional; e a terceira parte poderia ser alterada com observância do mesmo processo legislativo afeto à legislação infraconstitucional. À luz da classificação predominante das Constituições, é correto afirmar que uma Constituição dessa natureza seria classificada como (A) rígida. 1593291 E-book gerado especialmente para JULIA EVELYN PAIXAO MACIEL 7 (B) flexível. (C) semirrígida. (D) fortalecida. (E) plástica. 04. (TRE/PI - Técnico Judiciário - CESPE/2016) As constituições classificam-se, quanto (A) à estabilidade, em imutáveis, rígidas, flexíveis ou semirrígidas. (B) à origem, em escritas ou não escritas. (C) à forma, em materiais ou formais. (D) ao conteúdo, em dogmáticas ou históricas. (E) ao modo de elaboração, em analíticas ou sintéticas. Gabarito 01.B / 02.C / 03.C / 04.A Comentários 01. Resposta: B A nossa Constituição é considerada rígida. Quanto à estabilidade as Constituições podem ser classificadas da seguinte formas: imutável, quando não passível de modificação; rígida, quando determina um procedimento especial e solene para sua modificação, não permitindo ser alterado da mesma forma que leis ordinárias; semirrígida, quando parte é rígida e parte é flexível; ou flexível, quando as leis ordinárias tem a mesma natureza jurídica de emenda constitucional. 02. Resposta: C Diante das principais formas de classificação apresentadas pela doutrina a Constituição Federal Brasileira de 1988 pode ser classificada como: rígida, dogmática, programática, normativa, social, promulgada, escrita, heterodoxa e analítica. 03. Resposta: C Uma Constituição é classificada como semirrígida quando algumas matérias exigem um processo de alteração mais dificultoso do que o exigido para alteração das leis infraconstitucionais, enquanto outras não requerem tal formalidade. São ao mesmo tempo rígidas e flexíveis. 04. Resposta: A Quando falamos em estabilidade a Constituição, segundo doutrina majoritária, pode ser classificada da seguinte maneira: imutável, rígidas, flexíveis ou semirrígidas. As demais alternativas estão incorretas, porque não correspondem ao modo de classificação correto, o qual seria: à origem (democrática, outorgadas, pactuadas e cesaristas); à forma (escritas e não escritas); ao conteúdo (materiais e formais) e ao modo de elaboração (dogmática e histórica). Supremacia Constitucional Em um sistema jurídico onde é dotado de supremacia constitucional, todas as normas constitucionais equivalem-se de hierarquia e são dotadas de supremacia formal em relação às demais normas infraconstitucionais. Essa supremacia, além de formal5, é também material e axiológica. Com fundamento em seu texto, é que devem ser lidos e interpretados todas as normas e institutos do direito infraconstitucional. A constituição é o fundamento de validade de todas as demais normas, tornando nula toda norma contrária à constituição. Como o ordenamento jurídico é um sistema e como todo sistema, precisa de ordem e unidade, ele precisa de uma base bem estruturada, que sirva de modelo para todos os demais, permitindo que todas as partes convivam de maneira harmoniosa. A ordem normativa se estrutura de forma escalonada, em diferentes níveis, revelando a constituição na posição hierárquica mais elevada do sistema, observando 5 Supremacia formal da Constituição está ligada à forma, a procedimento. Somente as Constituições rígidas possuem supremacia formal (Constituições rígidas são aquelas que demandam dificuldade para sua alteração. Não à toa, o procedimento de elaboração de lei ordinária/lei complementar é muito menos dificultoso que um procedimento de Emenda Constitucional). 1593291 E-book gerado especialmente para JULIA EVELYN PAIXAO MACIEL 8 a prevalência dos valores permanentes da constituição sobre a vontade circunstancial das maiorias legislativas. É importante destacar que a supremacia da constituição se irradia sobre todas as pessoas, públicas ou privadas, submetidas à ordem jurídica nela fundada. Questão 01. (TJ/MG - Juiz - FUNDEP) Sobre a supremacia da Constituição da República, assinale a alternativa CORRETA. (A) A supremacia está no fato de o controle da constitucionalidade das leis só ser exercido pelo Supremo Tribunal Federal. (B) A supremacia está na obrigatoriedade de submissão das leis aos princípios que norteiam o Estado por ela instituído. (C) A supremacia está no fato de a interpretação da constituição não depender da observância dos princípios que a norteiam. (D) A supremacia está no fato de que os princípios e fundamentos da constituição se resumam na declaração de soberania. Gabarito 01. B Comentário 01. Resposta: B A Constituição Federal e os demais atos normativos que compõem o denominado bloco de constitucionalidade, notadamente, emendas constitucionais e tratados internacionais de direitos humanos aprovados com quórum especial após a Emenda Constitucional nº45/2004, estão no topo do ordenamento jurídico. Sendo assim, todos os atos abaixo deles devem guardar uma estrita compatibilidade, sob pena de serem inconstitucionais. Por isso, estes atos que estão abaixo na pirâmide, se sujeitam a controle de constitucionalidade. PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS Ao longo da história, diversos princípios foram criados para nortear e estruturar o Estado de Direito. Tais princípios são encontrados em Constituições existentes no mundo inteiro, porque elas são as grandes responsáveis por definir a estrutura básica, fundamentos e bases para determinado sistema. Conseguimos identificar ainda que os princípios que temos atualmente foram fortemente influenciados pelas Revoluções Francesa e Americana. No Brasil, desde o século XIX, havia certa resistência na elaboração de uma Constituição Brasileira, visto que, o país era comandado por um rei que tinha suas regras próprias. Os princípios constitucionais são as regras mestras dentro do sistema positivo, devem ser identificados dentro da Constituição de cada Estado as estruturas básicas, os fundamentos e alicerces desse sistema. São as principais normas fundamentais de conduta de um indivíduo mediante às leis já impostas, além de exigências básicas ou fundamentos para tratar uma determinada situação e podem até ser classificados como a base do próprio Direito. A Constituição Federal de 1988 é o livro que está hierarquicamente acima de todos os outros, em nível de legislação no Brasil. A Constituição é a lei fundamental e os princípios constitucionais são o que protegem os atributos fundamentais da ordem jurídica. Os princípios constitucionais podem ser divididos em princípios constitucionais políticos e jurídicos. Os conceitos irão variar de acordo com as concepções de cada autor que escreve sobre esse assunto. Para José Joaquim Gomes Canotilho os princípios são de duas ordens: a) Princípios Político-Constitucionais: Também conhecidos como Princípios Fundamentais ou Princípios Estruturantes do Estado Constitucional, segundo os livros de Direito, são os princípios que estabelecem a forma, estrutura e governo do Estado, etc. É constituído pelas decisões políticas alicerçadas em normas do sistema constitucional. Exemplo: Princípios Fundamentais do Estado Brasileiro. 1593291 E-book gerado especialmente para JULIA EVELYN PAIXAO MACIEL 9 Os princípios fundamentais do Estado Brasileiro fazem parte dos princípios constitucionais e estão presentes dentro da Constituição Federal de 1888, dos artigos 1º a 4º que são: federativo, democrático de direito, separação dos poderes, presidencialista, soberania, cidadania, dignidade da pessoa humana, a livre iniciativa e os valores sociais do trabalho, o pluralismo político. Além deles, há também outros princípios que tratam da organização do Estado Brasileiro. b) Princípios Jurídico-Constitucionais: São os princípios constitucionais gerais informadores da ordem jurídica nacional. Em regra, são princípios derivados dos princípios políticos-constitucionais, o que gera alguns desdobramentos como: o princípio da supremacia da Constituição Federal, o princípio da legalidade, o princípio da isonomia, o princípio da igualdade, do juiz natural, das garantias constitucionais do processo, etc. Vejamos quais são os princípios: 1- Princípio da efetividade. Segundo esse princípio, o intérprete deve buscar a interpretação que dê a máxima efetividade e concretude aos direitos e garantias constitucionais fundamentais, conforme art. 5º, §1º da CF/88, por força do princípio da efetividade das normas constitucionais. Também é conhecido como “princípio da eficiência ou princípio da interpretação efetiva”, poderá ser formulado da seguinte maneira: a uma norma constitucional deve ser atribuída o sentido que maior eficácia lhe dê. É um princípio operativo em relação a todas e quaisquer normas constitucionais, e embora sua origem esteja ligada à tese da atualidade das normas programáticas (Thomas), é hoje sobretudo invocado no âmbito dos direitos fundamentais (em caso de dúvidas deve preferir-se a interpretação que reconheça maior eficácia aos direitos fundamentais). No âmbito do princípio da efetividade é importante fazermos referência à jurisdicização. Você deve se familiarizar com essa expressão, pois muita usada nas decisões do Supremo Tribunal Federal. A Jurisdicização refere-se ao fenômeno correspondente à interferência do próprio direito na vida das pessoas. A pretensão de organizar a sociedade e prever toda solução através da codificação do direito refere-se à jurisdicização; modernamente, a juridicização da sociedade é ligada ao dogma da plenitude do ordenamento jurídico e aos movimentos de codificação do direito. Entretanto, a juridicização da sociedade conflita com a ideia de autonomia da vontade, uma vez que o direito (legislado) é heterônomo, ou seja, é ditado e imposto independentemente da vontade de seus destinatários. Contemporaneamente, a excessiva regulamentação estatal das relações entre particulares vem sendo atacada como sendo uma forma de “colonização da sociedade pelo direito”, indicando que o direito estaria invadindo a vida e sufocando os indivíduos, obrigando as pessoas a seguirem um padrão valorativo previamente ditado pelas autoridades constituídas. Considerando que a lei (direito legislado) cada vez mais vem perdendo a sua autoridade e, sobretudo, a sua legitimidade, o fenômeno da juridicização é visto com desconfiança, já que é uma ameaça à emancipação plena dos indivíduos. Ninguém mais quer ser escravo da lei6. Deve ser observado que, em sociedades onde é influente a juridicização da sociedade o judiciário pode se tornar, indevidamente, uma espécie de superego da sociedade, considerando que qualquer aspecto da vida social poderá ser submetido ao crivo de juízes não-eleitos pelo povo, cujas decisões são mais difíceis de serem controladas por mecanismos democráticos de discussão, mesmo que a premissa seja a interpretação pela máxima eficácia das normas constitucionais ante as circunstâncias de cada caso. 2- Princípio da proibição do retrocesso social. O princípio da proibição do retrocesso social, também chamado de efeito cliquet, caracteriza-se como um limite às restrições impostas aos direitos fundamentais, de maneira a prevenir que “um direito fundamental prestacional legislativamente regulamentado e, como tal, dotado de preciosos contornos e nítido conteúdo, venha a sofrer alterações futuras que reduzam o significado que lhe foi atribuído pela norma ordinária anterior. O Supremo Tribunal Federal já se manifestou a respeito da legitimação do princípio do não retrocesso social, no sentido de que o princípio da proibição do retrocesso impede, em tema de direitos fundamentais de caráter social, que sejam desconstituídas as conquistas já alcançadas pelo cidadão ou pela formação social em que ele vive. 6 http://direitosfundamentais.net/2009/10/21/superjudicializacao-versus-superjuridicizacao/ 1593291 E-book gerado especialmente para JULIA EVELYN PAIXAO MACIEL 10 Em consequência desse princípio, o Estado, após haver reconhecido os direitos prestacionais, assume o dever não só de torná-los efetivos, mas, também, se obriga, sob pena de transgressão ao texto constitucional, a preservá-los, abstendo-se de frustrar - mediante supressão total ou parcial - os direitos sociais já concretizados. 3- Princípio da proporcionalidade. O princípio da proporcionalidade diz respeito à compatibilidade quantitativa entre meios e fins, ou seja, permite a análise da equivalência de quantidade entre causa e efeito, meio e fim, ato e consequência, vedando atos que, apesar de se utilizarem dos meios corretos, abusam na quantificação destes. 4- Princípio da razoabilidade. A ideia de razoabilidade tem sua origem relacionada à garantia do due process of law, prevista na Carta Magna de 1215, documento pelo qual os barões ingleses asseguraram uma série de direitosfeudais contra o despótico Rei João Sem Terra. Na Inglaterra, fala-se em princípio da irrazoabilidade, termo utilizado pela primeira vez no Wednesbury Case7, de 1948. No Brasil, o princípio da razoabilidade, assim como o da proporcionalidade, não se encontra expressamente previsto na Constituição Federal. O princípio, contudo, não está afastado do sistema constitucional pátrio, tendo em vista que é possível auferi-lo implicitamente de alguns princípios constitucionais, como o do devido processo legal, previsto no artigo 5°, incisos LIV, da Constituição Federal. A razoabilidade, como princípio geral de interpretação que impede a consumação de atos, fatos e comportamentos inaceitáveis, penetra e constitui uma exigência, não apenas do devido processo legal, mas de todos os princípios e garantias constitucionais autonomamente assegurados pela ordem constitucional brasileira. 5- O princípio da supremacia da Constituição. Fundamental no limiar das argumentações acerca do controle de constitucionalidade é a ideia de “supremacia da Constituição”, que pode ser formal ou material. A supremacia material da Constituição relaciona-se ao conteúdo, isto é, decorre do fato de estabelecer a Constituição os fundamentos do Estado, a atribuição de competências aos Poderes Públicos, bem como o asseguramento dos direitos fundamentais. Não por acaso, estas três matérias são chamadas “matérias constitucionais” propriamente ditas (ou matérias tipicamente constitucionais): estrutura de Estado, organização dos Poderes e direitos fundamentais. Toda Constituição possui supremacia material, seja ela rígida, semirrígida ou flexível. Já a supremacia formal da Constituição está ligada à forma, a procedimento. Somente as Constituições rígidas possuem supremacia formal (Constituições rígidas são aquelas que demandam dificuldade para sua alteração. Não à toa, o procedimento de elaboração de lei ordinária/lei complementar é muito menos dificultoso que um procedimento de Emenda Constitucional). 6- O princípio do respeito ao conteúdo essencial dos direitos fundamentais. Conforme visto, no sistema constitucional brasileiro, verificou-se a dinâmica de limites e restrições aos direitos fundamentais. No entanto, a atividade limitadora e restritiva do Estado deve ser, igualmente, uma atividade limitada, de modo que a ação limitadora e restritiva se dê na medida estritamente necessária e indispensável à própria concretização e preservação de tais direitos e demais bens constitucionalmente protegidos. Assim, existem os chamados “limites dos limites”, que demarcam o campo de atuação da atividade do legislador, quando estes limitam e restringem os direitos fundamentais. No Brasil não há normatização expressa referente ao regime jurídico aplicável às limitações e restrições aos direitos fundamentais, sendo que a proteção aos direitos fundamentais decorre do caráter supremo e vinculante das disposições de direitos fundamentais e do princípio do Estado Democrático de Direito, previsto no caput do artigo 1º da Constituição Federal, em que se reflete a “necessidade constante de conciliação entre os direitos dos particulares e a soberania do ente estatal”. Ademais, o princípio da dignidade da pessoa humana, expressamente anunciado pelo artigo 1º, inciso III da CF/88, firma-se como o princípio reitor da dinâmica em que os direitos fundamentais encontram-se, 7 Cf. PIMENTA OLIVEIRA, op. cit., pp. 73-77. O Sunday Entertainments Act, de 1932, previa a outorga de autorização de funcionamento de cinemas aos domingos, de modo que a autoridade podia estabelecer, ao seu critério, condições julgadas corretas e adequadas. Em litígio entre a Associated Provincial Picture Houses e a Wednesbury Corporation, discutiu-se a irrazoabilidade de permissão de funcionamento outorgada sob a condição de que não seriam admitidos menores de 15 anos, acompanhados ou não de adultos, o que supostamente obrigaria os pais a permanecerem em casa aos domingos para tomar conta de seus filhos menores de 15 anos. 1593291 E-book gerado especialmente para JULIA EVELYN PAIXAO MACIEL 11 podendo ser concluído que qualquer limitação ou restrição a direitos fundamentais nunca poderá afetar desvantajosamente a dignidade da pessoa humana. Podemos apontar como limites aos limites dos direitos fundamentais: a necessidade de respeito ao núcleo essencial desses direitos e a obrigatoriedade de adequação ao princípio da proporcionalidade. Princípios Estruturantes da Ordem Constitucional Brasileira a) Rigidez constitucional: advém da classificação da estabilidade da Constituição, elaborada por Lord James Bryce (1901). Bryce reconheceu que a classificação tradicional entre constituição escrita e não escrita era muito falha, já que não representava a verdade. Nossa Constituição está deixando de ser uma constituição escrita codificada para se tornar uma constituição escrita esparsa, já que boa parte dos textos das emendas não entra no texto consolidado, assim como as emendas constitucionais que versam sobre direitos humanos aprovadas pelo rito legislativo de emenda. A classificação é falha também pois sempre temos elementos não escritos que fazem parte da constituição, como o previsto no art. 5º, § 2º, que versa sobre a interpretação e extensão dos direitos fundamentais. Logo, a constituição escrita contém também elementos não escritos, enquanto a não escrita contém também elementos escritos. Bryce chamou de constituição rígida aquela que pode ser formalmente alterada por processo diferente da lei ordinária (mais rígido), enquanto a flexível, por processo igual. A importância dessa classificação para o controle se dá porque, se o processo legislativo para emenda à lei é o mesmo, não há diferença entre lei e norma constitucional, confundindo-se ambas. Logo, toda lei pode contrariar e alterar a constituição, sem se poder falar em inconstitucionalidade. b) Supremacia da Constituição: a constituição possui nível hierárquico superior a todas as demais normas sem caráter constitucional, não podendo estas contrariá-las. Ela é o fundamento do ordenamento jurídico, aquilo que Kelsen chamava da gründnorm, encontrando-se no topo da pirâmide. c) Controle de constitucionalidade: é o mecanismo que serve para complementar nosso sistema constitucional, pois serve para retirar do ordenamento a lei incompatível com a constituição. O controle de constitucionalidade tem três funções: - Política: controle do exercício do Poder manifestado pela elaboração de leis. - Legislativa negativa: quando o Poder Judiciário declara a inconstitucionalidade das normas, está causando a retirada de leis do ordenamento. - Contra majoritária: o exercício do controle se impõe contra a vontade da maioria, já que as leis foram elaboradas pela vontade indireta do povo, teoricamente. A ideia de controle de constitucionalidade nasceu com esses propósitos; adquiriu, entretanto, outras dimensões hoje em dia, já que pode ser feito o controle para reafirmar uma lei (ADC), para dar plena efetividade à Constituição, suprindo a omissão dos poderes constituídos (ADPO e MI) e para reafirmar os preceitos fundamentais (ADPF). Questões 01. (DPU - Defensor Público Federal - CESPE) Julgue os itens subsequentes. Aplica-se aos direitos sociais, econômicos e culturais o princípio da proibição do retrocesso. ( ) Certo ( ) Errado 02. (TRT - 9ª REGIÃO (PR)) Analise o seguinte texto: "Por este princípio, que não é expresso mas decorre do sistema jurídico-constitucional, entende-se que uma lei, ao regulamentar um mandamento constitucional, instituir determinado direito, ele se incorpora ao patrimônio jurídico da cidadania e não pode ser arbitrariamente suprimido. (...) O que se veda é o ataque à efetividade da norma, que foi alcançada a partir da sua regulamentação. Assim, por exemplo, se o legislador infraconstitucional deu concretude a uma norma programática ou tornou viável o exercício de um direito que dependiade sua intermediação, não poderá simplesmente revogar o ato legislativo, fazendo a situação voltar ao estado de omissão legislativa anterior." (BARROSO, Luís Roberto. O direito constitucional e a efetividade de suas normas. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 158/159) O princípio de que trata o texto acima é o seguinte: (A) Princípio da efetividade normativa. (B) Princípio da legalidade. (C) Princípio da programaticidade. 1593291 E-book gerado especialmente para JULIA EVELYN PAIXAO MACIEL 12 (D) Princípio da vedação do retrocesso. (E) Princípio da não omissão legislativa. 03. (MS CONCURSOS) O princípio de hermenêutica constitucional segundo o qual “a uma norma constitucional deve ser atribuído o sentido que lhe conceda mais ampla efetividade social” corresponde ao: (A) Princípio do efeito integrador. (B) Princípio da eficiência. (C) Princípio da justeza. (D) Princípio da unidade da constituição. (E) Princípio da harmonização. Gabarito 01. Certo / 02. D / 03. B Comentários 01.Resposta: Certo. O Supremo Tribunal Federal já se manifestou a respeito da legitimação do princípio do não retrocesso social, no sentido de que o princípio da proibição do retrocesso impede, em tema de direitos fundamentais de caráter social, que sejam desconstituídas as conquistas já alcançadas pelo cidadão ou pela formação social em que ele vive. 02. Resposta: D. Consta no Art. 7º da CF que “São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:” A dignidade da pessoa humana é como fundamento constitucional, logo, surge o chamado “princípio do não-retrocesso social”. 03. Resposta: B. Segundo esse princípio, o intérprete deve buscar a interpretação que dê a máxima efetividade e concretude aos direitos e garantias constitucionais fundamentais, conforme art. 5º, §1º da CF/88, por força do princípio da efetividade das normas constitucionais. O PRINCÍPIO DA EFETIVIDADE E A JURISDICIZAÇÃO DA CONSTITUIÇÃO O intérprete deve buscar a interpretação que dê a máxima efetividade e concretude aos direitos e garantias constitucionais fundamentais, conforme art. 5º, §1º da CF/88, por força do princípio da efetividade das normas constitucionais. “A ideia de efetividade, conquanto de desenvolvimento relativamente recente, traduz a mais notável preocupação do constitucionalismo nos últimos tempos. Ligada ao fenômeno da juridicização da Constituição, e ao reconhecimento e incremento de sua força normativa, a efetividade merece capítulo obrigatório na interpretação constitucional. Os grandes autores da atualidade referem-se à necessidade de dar preferência, nos problemas constitucionais, aos pontos de vista que levem as normas a obter máxima eficácia ante as circunstâncias de cada caso”8. “Esse princípio, também designado de por princípio da eficiência ou princípio da interpretação efetiva, pode ser formulado da seguinte maneira: a uma norma constitucional deve ser atribuído o sentido que maior eficácia lhe dê. É um princípio operativo em relação a todas e quaisquer normas constitucionais, e embora sua origem esteja ligada à tese da actualidade das normas programáticas (Thoma), é hoje sobretudo invocado no âmbito dos direitos fundamentais (em caso de dúvidas deve preferir-se a interpretação que reconheça maior eficácia aos direitos fundamentais)” A Jurisdicização refere-se ao fenômeno correspondente à interferência do próprio direito na vida das pessoas. A pretensão de organizar a sociedade e prever toda solução através da codificação do direito refere-se à jurisdicização; modernamente, a juridicização da sociedade é ligada ao dogma da plenitude do ordenamento jurídico e aos movimentos de codificação do direito. 8 BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e Aplicação da Constituição. Saraiva. 6ª ed., p. 246. 1593291 E-book gerado especialmente para JULIA EVELYN PAIXAO MACIEL 13 A juridicização da sociedade é conflitante com a ideia de autonomia da vontade, uma vez que o direito (legislado) é heterônomo, ou seja, é ditado e imposto independentemente da vontade de seus destinatários. Contemporaneamente, a excessiva regulamentação estatal das relações entre particulares vem sendo atacada como sendo uma forma de “colonização da sociedade pelo direito”, indicando que o direito estaria invadindo a vida e sufocando os indivíduos, obrigando as pessoas a seguirem um padrão valorativo previamente ditado pelas autoridades constituídas. Considerando que a lei (direito legislado) cada vez mais vem perdendo a sua autoridade e, sobretudo, a sua legitimidade, o fenômeno da juridicização é visto com desconfiança, já que é uma ameaça à emancipação plena dos indivíduos. Ninguém mais quer ser escravo da lei9. Deve ser observado que, em sociedades onde é influente a juridicização da sociedade o judiciário pode se tornar, indevidamente, uma espécie de superego da sociedade, considerando que qualquer aspecto da vida social poderá ser submetido ao crivo de juízes não-eleitos pelo povo, cujas decisões são mais difíceis de serem controladas por mecanismos democráticos de discussão, mesmo que a premissa seja a interpretação pela máxima eficácia das normas constitucionais ante as circunstâncias de cada caso. Princípio da Legalidade É um dos mais importantes princípios consagrados no ordenamento jurídico brasileiro, consiste no fato de que o administrador somente poderá fazer o que a lei permite. É importante demonstrar a diferenciação entre o princípio da legalidade estabelecido ao administrado e ao administrador. Como já explicitado para o administrador, o princípio da legalidade estabelece que ele somente poderá agir dentro dos parâmetros legais, conforme os ditames estabelecidos pela lei. Já, o princípio da legalidade visto sob a ótica do administrado, explicita que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa, senão em virtude lei. Esta interpretação encontra abalizamento no artigo 5º, II, da Constituição Federal de 1988. Princípio da Isonomia Art. 5º, caput, CF: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e os estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade (...)” Do Princípio da Isonomia (Igualdade), considerada “pressuposto político de toda sociedade organizada”, deriva-se o Princípio da Isonomia Processual, que Nelson Nery Júnior conceitua como “o direito que têm os litigantes de receberem idêntico tratamento pelo juiz”. Ou seja, ambas as partes devem gozar das mesmas faculdades e oportunidades processuais oferecidas, conforme se vê mais claramente no artigo 139, I, do Novo Código de Processo Civil. No entanto, a própria lei especifica desigualdades. Novamente cita-se Nelson Nery Júnior, de que tratar as partes isonomicamente é tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na exata proporção de suas igualdades e desigualdades, a “igualdade substancial dos litigantes”. Assim, temos o artigo 4º do Código do Consumidor, reconhecendo a fragilidade deste perante o fornecedor, o artigo 188 do Código de Processo Civil, onde o Ministério Público e a Fazenda Pública terão um prazo quatro vezes maior para contestar e duas vezes maior para recorrer num litígio. O princípio da proibição do retrocesso social. O princípio da proibição do retrocesso social caracteriza-se como um limite às restrições impostas aos direitos fundamentais, de maneira a prevenir que “um direito fundamental prestacional legislativamente regulamentado e, como tal, dotado de preciosos contornos e nítido conteúdo, venha a sofrer alterações futuras que reduzam o significado que lhe foi atribuído pela norma ordinária anterior. O Princípio de proibição de retrocesso social, ou efeito cliquet, tem na nomenclatura como origem francesa, onde a jurisprudência do Conselho Constitucional reconhece que o princípio da vedação doretrocesso (chamando “efeito cliquet”) se aplica inclusive em relação aos direitos de liberdade, no sentido de que não é possível a revogação total de uma lei que protege as liberdades fundamentais sem a substituir por outra que ofereça garantias com eficácia equivalente. O Supremo Tribunal Federal já se manifestou a respeito da legitimação do princípio do não retrocesso social, no sentido de que o princípio da proibição do retrocesso impede, em tema de direitos fundamentais 9 http://direitosfundamentais.net/2009/10/21/superjudicializacao-versus-superjuridicizacao/ 1593291 E-book gerado especialmente para JULIA EVELYN PAIXAO MACIEL 14 de caráter social, que sejam desconstituídas as conquistas já alcançadas pelo cidadão ou pela formação social em que ele vive. - A cláusula que veda o retrocesso em matéria de direitos a prestações positivas do Estado (como o direito à educação, o direito à saúde ou o direito à segurança pública, v. g.) traduz, no processo de efetivação desses direitos fundamentais individuais ou coletivos, obstáculo a que os níveis de concretização de tais prerrogativas, uma vez atingidos, venham a ser ulteriormente reduzidos ou suprimidos pelo Estado. Em consequência desse princípio, o Estado, após haver reconhecido os direitos prestacionais, assume o dever não só de torná-los efetivos, mas, também, se obriga, sob pena de transgressão ao texto constitucional, a preservá-los, abstendo-se de frustrar - mediante supressão total ou parcial - os direitos sociais já concretizados. O PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE: CONCEITO, ORIGEM, CONTEÚDO, ELEMENTOS E SUBPRINCÍPIOS. Princípio da proporcionalidade O vocábulo “proporcional” deriva do latim proportio, que se refere principalmente à divisão em partes iguais ou correspondentes a uma dada razão. É umbilicalmente ligado à ideia de quantidade, de justa medida, de equilíbrio. Começou a ser utilizado na Ciência Jurídica moderna por influência do direito germânico, notadamente da jurisprudência do Bundesverfassungsgericht (Tribunal Constitucional Federal Alemão), que, na resolução de casos concretos, formulou uma verdadeira teoria sobre o princípio.10 Por meio desse princípio, é possível analisar a legitimidade das restrições a direitos fundamentais, para verificar se respeitam a justa medida, a proporção entre causa e efeito, entre meio e fim. São tradicionalmente apontados como elementos da proporcionalidade, em atenção à teoria formulada no Direito alemão: a adequação, a necessidade (exigibilidade) e a proporcionalidade em sentido estrito. Os dois primeiros, como já explicado, correspondem à idoneidade do meio para atingir o fim (adequação) e à imprescindibilidade de sua utilização (necessidade). O terceiro se relaciona mais diretamente à estimação da quantidade da utilização do meio e da mensuração do fim: serve para investigar se o ato não utilizou o meio de forma exagerada ou insuficiente. Aborda, portanto, o equilíbrio quantitativo entre causa e efeito, meio e fim, ato e consequência jurídica. Em suma: o princípio da proporcionalidade diz respeito à compatibilidade quantitativa entre meios e fins, ou seja, permite a análise da equivalência de quantidade entre causa e efeito, meio e fim, ato e consequência, vedando atos que, apesar de se utilizarem dos meios corretos, abusam na quantificação destes. Não sem razão, é também chamado de "princípio da proibição do excesso". E, na feliz formulação de Jellinek, corresponde à máxima de que "não se abatem pardais com tiros de canhão". Por outro lado, a proporcionalidade significa não só a necessidade de limitar a restrição de direitos fundamentais (proporcionalidade em sentido negativo), como também a obrigação do Estado de proteger de forma eficiente os bens jurídicos mais caros à sociedade (proporcionalidade positiva). O Ministro Gilmar Mendes, em voto proferido na ADIn nº 3.112, assim resume as diversas feições do princípio da proporcionalidade: “Os direitos fundamentais não podem ser considerados apenas como proibições de intervenção (Eingriffsverbote), expressando também um postulado de proteção (Schutzgebote). Utilizando-se da expressão de Canaris, pode-se dizer que os direitos fundamentais expressam não apenas uma proibi ção do excesso (Übermassverbote), mas também podem ser traduzidos como proibições de proteção deficiente ou imperativos de tutela (Untermassverbote). (...) levando-se em conta o dever de proteção e a proibição de uma proteção deficiente ou insuficiente (Untermassverbote), cumpriria ao legislador estatuir o sistema de proteção constitucional-penal adequado. Em muitos casos, a eleição da forma penal pode conter-se no âmbito daquilo que se costuma chamar de discrição legislativa, tendo em vista desenvolvimentos históricos, circunstâncias específicas ou opções ligadas a um certo experimentalismo institucional. A ordem constitucional confere ao legislador certas margens de ação, para decidir sobre quais medidas devem ser adotadas para a proteção penal eficiente dos bens jurídicos fundamentais. (...) a consideração dos direitos fundamentais como imperativos de tutela (Canaris) imprime ao princípio da proporcionalidade uma estrutura diferenciada. O ato não será adequado quando não proteja o direito fundamental de maneira ótima; não será necessário na hipótese de existirem medidas alternativas que favoreçam ainda mais a realização do direito fundamental; e violará o subprincípio da 10 TEORIA GERAL DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS PROF. JOÃO TRINDADE CAVALCANTE FILHO. http://www.stf.jus.br/repositorio/cms/portaltvjustica/portaltvjusticanoticia/anexo/joao_trindadade__teoria_geral_dos_direitos_fundamentais.pdf 1593291 E-book gerado especialmente para JULIA EVELYN PAIXAO MACIEL 15 proporcionalidade em sentido estrito se o grau de satisfação do fim legislativo é inferior ao grau em que não se realiza o direito fundamental de proteção”. O PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE: CONCEITO, ORIGEM E CONTEÚDO. A razoabilidade possui importante papel no ordenamento jurídico, pois serve para afastar leis e atos normativos irrazoáveis e fornecer elementos de exclusão do momento, do meio de atuação, da dispensa de tratamento igual ou desigual ou de finalidade não compatível com o senso comum. Ao contrário da proporcionalidade, a razoabilidade não possui subprincípios, sendo, portanto, menos sistemática.11 Para o jusfilósofo norte-americano Herbert L. Hart, a razoabilidade é uma virtude judicial que representa um elemento moral da interpretação jurídica e revela a preocupação do intérprete-aplicador do direito com o desenvolvimento de um princípio geral que produza uma aceitação razoável da decisão. O desenvolvimento da razoabilidade é uma textura aberta das normas jurídicas, o que deixa um amplo campo de ação aos juízes, os quais não estão limitados à alternativa entre uma eleição arbitrária, por um lado, e a dedução mecânica, a partir de regras predeterminadas, por outro.12 A ideia de razoabilidade tem sua origem relacionada à garantia do due process of law, prevista na Carta Magna de 1215, documento pelo qual os barões ingleses asseguraram uma série de direitos feudais contra o despótico Rei João Sem Terra. Na Inglaterra, fala-se em princípio da irrazoabilidade, termo utilizado pela primeira vez no Wednesbury Case13, de 1948. O princípio da irrazoabilidade encontra função ímpar no direito inglês, caracteristicamente um direito jurisprudencial, no qual a common law tem preponderância sobre os textos legislativos, os quais são fontes formais e secundárias do direito. Como alicerce da estrutura jurisprudencial, vigora a regra do precedente (stare decisis), segundo a qual os princípios elaborados pelas decisões judiciárias devem ser obrigatoriamente seguidos pelos julgamentos posteriores, com o objetivo de assegurar a coesão da jurisprudência. O princípio da razoabilidade também encontra expressiva aplicação nos Estados Unidos; os tribunais norte-americanos invocavam o institutodo due process of law para avaliar a constitucionalidade de leis estaduais e leis do Congresso, a partir da chamada rule of reason, significando que uma lei, para ser considerada razoável, deveria ser considerada sensata, digna de aplauso e compreensível aos intérpretes. A questão problemática refere-se ao fato de que este critério de razoabilidade era aferido a partir dos critérios econômicos e sociais da Suprema Corte e se, segundo tais critérios, a lei parecesse razoável, era considerada compatível com o processo legal regular. Podemos identificar três grandes fases na utilização da razoabilidade. Na primeira fase, que se afirmou com a Primeira Guerra Mundial e o desenvolvimento ulterior do intervencionismo econômico e social, a razoabilidade emergiu timidamente. Na segunda, que perdurou da Segunda Guerra Mundial até a década de 60, o princípio passou por um período de minimização. Na terceira fase, iniciada nos anos 60, surgiu um novo ativismo judicial, que desenvolveu a noção do controle da razoabilidade das decisões tomadas no exercício de competências discricionárias. A razoabilidade, então, passou a suscitar novo interesse e a conhecer uma estabilização em sua aplicação. No Brasil, o princípio da razoabilidade, assim como o da proporcionalidade, não se encontra expressamente previsto na Constituição Federal. O princípio, contudo, não está afastado do sistema constitucional pátrio, tendo em vista que é possível auferi-lo implicitamente de alguns princípios 11 Silva, Ana Paula Caldin da Aplicação dos princípios da razoabilidade e da Proporcionalidade na jurisprudência tributária brasileira / Ana Paula Caldin da Silva. – São Paulo, 2010. 102 f.; 30 cm. 12 HART, Herbert L. O Conceito de Direito. Trad. A. Ribeiro Mendes, Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, 2007, p. 137-149. 13 Cf. PIMENTA OLIVEIRA, op. cit., pp. 73-77. O Sunday Entertainments Act, de 1932, previa a outorga de autorização de funcionamento de cinemas aos domingos, de modo que a autoridade podia estabelecer, ao seu critério, condições julgadas corretas e adequadas. Em litígio entre a Associated Provincial Picture Houses e a Wednesbury Corporation, discutiu-se a irrazoabilidade de permissão de funcionamento outorgada sob a condição de que não seriam admitidos menores de 15 anos, acompanhados ou não de adultos, o que supostamente obrigaria os pais a permanecerem em casa aos domingos para tomar conta de seus filhos menores de 15 anos. 1593291 E-book gerado especialmente para JULIA EVELYN PAIXAO MACIEL 16 constitucionais, como o do devido processo legal, previsto no artigo 5°, incisos LIV, da Constituição Federal. A razoabilidade, como princípio geral de interpretação que impede a consumação de atos, fatos e comportamentos inaceitáveis, penetra e constitui uma exigência, não apenas do devido processo legal, mas de todos os princípios e garantias constitucionais autonomamente assegurados pela ordem constitucional brasileira. Princípio do contraditório e ampla defesa Contraditório O princípio do contraditório é uma garantia fundamental da justiça, consubstanciada no brocardo romano audiatur et altera pars (ouça-se a parte contrária). A Carta Política de 1988 consagrou em seu artigo 5°, inciso LV, que "aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes". No Processo Penal, diferente do que ocorre no âmbito civil, a efetiva contrariedade à acusação é imperativa para o atingimento dos objetivos jurisdicionais, objetivo só possível com a absoluta paridade de armas conferida às partes. O réu, pelo princípio do contraditório, tem o direito de conhecer a acusação a ele imputada e de contrariá-la, evitando que venha a ser condenado sem ser ouvido. Trata-se da exteriorização da ampla defesa, impondo uma condução dialética do processo, pois "a todo ato produzido caberá igual direito da outra parte de opor-se-lhe ou de dar-lhe a versão que lhe convenha, ou, ainda, de fornecer uma interpretação jurídica diversa daquela feita pelo autor". Percebe-se, portanto, que o princípio do contraditório é uma garantia constitucional que assegura a ampla defesa do acusado, proporcionando a este o exercício pleno de seu direito de defesa. Merecem destaque as palavras de J. Canuto Mendes de Almeida que, sobre o tema, ensina, nestes termos: "A verdade atingida pela justiça pública não pode e não deve valer em juízo sem que haja oportunidade de defesa do indiciado. É preciso que seja o julgamento precedido de atos inequívocos de comunicação ao réu: de que vai acusado; dos termos precisos dessa acusação; e de seus fundamentos de fato (provas) e de direito. Necessário também é que essa comunicação seja feita a tempo de possibilitar a contrariedade: nisso está o prazo para conhecimento exato dos fundamentos probatórios e legais da imputação e para oposição da contrariedade e seus fundamentos de fato (provas) e de direito." Júlio Fabrini Mirabete e Fernando da Costa Tourinho Filho lecionam do princípio do contraditório decorrem duas importantes regras: a da igualdade processual e a da liberdade processual. Pela primeira, as partes acusadora e acusada estão num mesmo plano e, por conseguinte, têm os mesmos direitos; pela segunda, o acusado tem a faculdade, entre outras, de nomear o advogado que bem entender, de apresentar provas lícitas que julgar as mais convenientes e de formular ou não reperguntas às testemunhas. Scarance Fernandes alerta sobre a diferença existente entre o contraditório e a igualdade processual. Nestes termos: "O contraditório põe uma parte em confronto com a outra, exigindo que tenha ela ciência dos atos da parte contrária, com possibilidade de contrariá-los. O princípio da igualdade, por outro lado, coloca as duas partes em posição de similitude perante o Estado e, no processo, perante o juiz. Não se confunde com o contraditório, nem o abrange. Apenas se relacionam, pois ao se garantir a ambos os contendores o contraditório também se assegura tratamento igualitário." Neste diapasão, o princípio do contraditório também encontra guarida na obrigatoriedade do caráter imparcial do órgão jurisdicional. De fato, "o juiz, por força de seu dever de imparcialidade, coloca-se entre as partes, mas equidistantes delas: ouvindo uma, não pode deixar de ouvir a outra; somente assim se dará a ambas a possibilidade de expor suas razões, de apresentar suas provas, de influir sobre o convencimento do juiz". Do exposto, tem-se que a necessidade de informação e a possibilidade de reação são elementos essenciais do contraditório, que deverá ser exercido de forma plena – durante todo o desenrolar da causa - e efetiva – proporcionando condições reais de contrariedade dos atos praticados pela parte ex adverso (do lado contrário). 1593291 E-book gerado especialmente para JULIA EVELYN PAIXAO MACIEL 17 Nesse sentido, afirmam Cintra, Grinover e Dinamarco que o contraditório não admite exceções e que, em virtude de sua natureza constitucional, deve ser substancialmente observado e não apenas formalmente, devendo as normas que o desrespeitem serem consideradas inconstitucionais. No Processo Civil, o princípio do contraditório também deve ser respeitado. Entretanto, e aqui se faz diferente, enquanto que no Processo Penal a contrariedade deve ser plena e efetiva, na seara civil basta que ao réu seja ofertada a oportunidade de reação proporcionada pela citação, garantindo ao réu o direito de, se quiser, participar do processo e responder aos atos da parte contrária. Isso porque, enquanto que no Processo Civil tramitam, em regra, litígios sobre direitos disponíveis e o juiz pode satisfazer-se com a verdade formal, no âmbito penal, os direitos em jogo são indisponíveis e predomina o incessante desejo de o órgão jurisdicional descobrir a verdade real. No primeiro, o réu tem o ônus de se defender, no segundo, tem o dever.Tendo em vista esta diferença, alguns doutrinadores preferem referir-se ao princípio do contraditório no Processo Civil como princípio da bilateralidade da audiência. Acerca da aplicabilidade ou não do princípio do contraditório na fase pré-processual há diferentes posicionamentos na doutrina. Scarance e Tourinho Filho entendem que a Constituição Federal, em seu artigo 5°, inciso LV, ao mencionar a necessidade do contraditório nos processos judiciais e administrativos, não abrangeu o Inquérito Policial, uma vez que este não pode ser considerado um processo administrativo e nem mesmo um procedimento, pois "falta-lhe característica essencial do procedimento, ou seja, a formação de atos que devam obedecer a uma sequência predeterminada pela lei, em que, após a prática de um ato, passa- se à do seguinte até o último da série, numa ordem a ser necessariamente observada". Ademais, ensina Tourinho Filho que o sobredito dispositivo constitucional faz menção a litigantes e na fase da investigação pré-processual não há litigante. Ressalta o insigne doutrinador que a expressão processo administrativo contida na Lei Maior não se refere ao Inquérito Policial, mas ao processo instaurado pela Administração Pública para apuração de ilícitos administrativos, pois, nestes casos, há possibilidade de aplicação de uma sanção. Prossegue argumentando que "em face da possibilidade de inflição de ‘pena’, é natural deva haver o contraditório e a ampla defesa, porquanto não seria justo a punição de alguém sem o direito de defesa", e que, em se tratando de Inquérito Policial, nenhuma pena pode ser imposta ao indiciado. Saliente-se que, de fato, a Autoridade Policial não acusa, apenas investiga. Rogério Lauria Tucci, em contrapartida, sustenta que, para maior garantia da liberdade e melhor atuação da defesa, há a necessidade de uma contraditoriedade efetiva e real em todas as fases da persecução, inclusive na fase pré-processual. Justifica-se o autor com o instituto denominado contraditório posticipato ou diferido, onde não há "violação à garantia da bilateralidade da audiência, que, firme, se vê apenas diferida para momento ulterior à pronunciação de ato decisório liminar, prosseguindo- se regularmente no procedimento instaurado". Assim sendo, as medidas cautelares restritivas de ordem patrimonial ou pessoal (exame de corpo de delito, perícia, exame do local do crime, prisão provisória, fiança) seriam submetidas ao crivo do contraditório posteriormente, no processo, permitindo-se ao agora acusado contestar as providências cautelares tomadas pela Autoridade Policial, bem como a prova pericial realizada no Inquérito Policial. Fala-se, portanto, em contraditório diferido ou postergado, pois, como esclarece Greco Filho, a "Constituição não exige, nem jamais exigiu, que o contraditório fosse prévio ou concomitante ao ato". Tourinho Filho reconhece que o indiciado pode ser privado de sua liberdade em casos de flagrante, prisão temporária ou preventiva, mas para essas situações, afirma o autor, deve o investigado valer-se do emprego do remédio heroico do habeas corpus, prosseguindo em sua tese da inadmissibilidade do contraditório na fase investigatória. Ampla Defesa O Estado tem o dever de proporcionar a todo acusado condições para o pleno exercício de seu direito de defesa, possibilitando-o trazer ao processo os elementos que julgar necessários ao esclarecimento da verdade. Esta defesa há de ser completa, abrangendo não apenas a defesa pessoal (autodefesa) e a defesa técnica (efetuada por profissional detentor do direito postulatório), mas também a facilitação do acesso à justiça, por exemplo, mediante a prestação, pelo Estado, de assistência jurídica integral e gratuita aos necessitados. Vicente Grego Filho afirma que a ampla defesa é constituída a partir dos seguintes fundamentos: a) ter conhecimento claro da imputação; b) poder apresentar alegações contra a acusação; c) poder acompanhar a prova produzida e fazer contraprova; d) ter defesa técnica por advogado, cuja função, aliás, agora, é essencial à Administração da Justiça (art. 133 da CF/88); e e) poder recorrer da decisão desfavorável". 1593291 E-book gerado especialmente para JULIA EVELYN PAIXAO MACIEL 18 Com bastante razão e proficiência, afirma o douto estudioso que a ampla defesa é o cerne ao redor do qual se desenvolve o Processo Penal. Não se trata de mero direito, mas de uma dupla garantia: do acusado e do justo processo. É uma condição legitimante da própria jurisdição. Scarance Fernandes assevera que, embora estejam inegavelmente relacionados, não há relação de primazia ou derivação entre os princípios da ampla defesa e do contraditório, sendo ambos decorrentes da garantia constitucionalmente assegurada do devido processo legal. Convém salientar que o princípio constitucional da ampla defesa, expressamente previsto no artigo 5°, inciso LV, da Constituição Federal, não se confunde com a plenitude de defesa, instituto consagrado no artigo 5°, inciso XXXVIII, letra "a", da Carta Magna de 1988. Este, na verdade, encontra-se dentro do princípio maior da ampla defesa, consubstanciando-se na garantia da apreciação de todas as teses e argumentos despendidos aos jurados e também ao magistrado. O princípio da ampla defesa tem reflexos importantes dentro do Direito Processual Penal, norteando a aplicação das regras infraconstitucionais visando ao fiel respeito e salvaguarda dos preceitos fundamentais assegurados pela Constituição Federal. Neste diapasão, alguns dispositivos do nosso Código de Processo Penal de 1941 carecem ser analisados e relidos sob a nova ótica da Lei Maior, a fim de que as garantias da Constituição Cidadã sejam plenamente exercitadas. Assim, tem entendido a jurisprudência que, para a garantia da ampla defesa, o profissional constituído pelo réu deve ser sempre intimado para a realização de todos os atos processuais, contrariando a regra do artigo 501 do CPP. De igual forma, devem ser intimados acusador, réu e defensor para efeitos de trânsito em julgado da sentença condenatória, pouco importando, no caso do acusado, se este se encontra preso ou não. Isso revela uma clara e necessária releitura do artigo 392 do mesmo diploma legal. Ainda em face do princípio da ampla defesa, o sigilo previsto no artigo 20 do CPP não pode ser oposto ao advogado do suspeito e a regra do artigo 21, que permitia a incomunicabilidade do indiciado, encontra-se revogada. Questão afeta à defesa e que é bastante controvertida na jurisprudência é a possibilidade ou não de nulidade decorrente da falta de requisição de acusados presos para os atos de instrução. Predomina o posicionamento de que é possível a arguição de nulidade relativa do processo se ficar provado o prejuízo para a defesa, uma vez que, nesse caso, entende-se que o exercício da autodefesa não teria sido efetivo. Outra controvérsia envolvendo a influência do princípio da ampla defesa no Código de Processo Penal diz respeito a possibilidade ou não de se seguir o processo sem as alegações finais, razões ou contrarrazões de apelação quando o defensor, muito embora regularmente intimado, deixa de oferecê- las no prazo legal. Sobre a ausência de alegações finais, concluiu o STJ tratar-se de peça essencial da defesa e, portanto, não apresentada pelo advogado constituído, deve o Juiz, antes de prolatar a sentença, nomear defensor para fazê-lo (RHC 1682-SP). No tocante às contrarrazões, o STF decidiu que a não apresentação das mesmas em recurso do Ministério Público, havendo risco de ser agravada a situação do réu, constitui violação ao princípio do contraditório e da ampla defesa (HC 71.234-RS). Importante inovação na garantia do direito de defesa foi trazida ao ordenamento jurídico pátrio pela Lei n° 9.271, de 17/04/1996, que alterou o Código de Processo Penal, dando nova redação aos artigos 366 e 368. Em síntese, a alteração do referido dispositivo representou o fim da visão tradicional de que o acusado poderia
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