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Competência Técnico Operativa em Serviço Social I Competência Técnico Operativa em Serviço Social I ISBN: 978-85-5639-167-4 1 A Dimensão Técnico-Operativa nos Processos de Trabalho ....1 2 Análise de Conjuntura ........................................................19 3 Análise Organizacional .......................................................35 4 A Atuação Social Através de Projetos: Sociais, Interventivos e de Pesquisa ........................................................................52 5 Observação no Trabalho Profissional em Serviço Social .......70 6 Acolhimento no Trabalho Profissional em Serviço Social ......99 7 Processos Grupais no Trabalho Profissional em Serviço Social ...............................................................................115 8 Visita Domiciliar no Trabalho Profissional em Serviço Social ...............................................................................129 9 A Entrevista no Cotidiano do Assistente Social ...................144 Sumário A Dimensão Técnico- Operativa nos Processos de Trabalho1 1 Assistente Social, Mestre em Serviço Social; Docente do Curso de Graduação e Pós-Graduação Serviço Social da ULBRA – unidades de Canoas e Gravataí. Simone da Fonseca Sanghi1 Capítulo 1 2 Competência Técnico Operativa em Serviço Social I A discussão sobre a dimensão técnico-operativa nos proces-sos de trabalho do assistente social se apresenta de for- ma inadiável no cenário atual, pois é uma temática complexa que perpassa o cotidiano da prática profissional e requer um constante aprimoramento sobre essa questão. O processo de trabalho operacionalizado através das suas dimensões, que encontram-se na base das diretrizes curriculares para o curso de Serviço Social, deve estar continuamente se construindo/ desconstruindo/reconstruindo, para assim não se tornar obso- leto e a-histórico. 1.1 Processo de trabalho: uma analise sobre a dimensão técnico-operativa Desde a última década do séc. XX, a intervenção profissional dos Assistentes Sociais vem tornando-se uma questão impor- tante, tanto no debate acadêmico, como na formação profis- sional, em virtude das diversas expressões da questão social e da forma que vem se manifestando na contemporaneidade e no âmbito do processo de materialização do projeto pro- fissional, que, a partir do Movimento de Reconceituação do Serviço Social (1960), buscou romper com o conservadorismo da profissão. As novas tendências de atuação dos assistentes sociais sur- gem condicionadas à diversidade de demandas enfrentadas pelos usuários, o que acaba exigindo que sejam construídas novas competências de intervenção. Ao debater as compe- tências e atribuições dos Assistentes Sociais presentes na Lei Capítulo 1 A Dimensão Técnico-Operativa nos Processos de Trabalho 3 8.662/1993, Iamamoto (2001) reafirma que tais competên- cias e atribuições não podem ser desvinculadas dos processos sócio-históricos, mas devem ser consideradas no trato das no- vas demandas profissionais e do redimensionamento do espa- ço profissional decorrentes das configurações da sociedade. As demandas profissionais e o reordenamento do espaço profissional estão marcados pelas lutas políticas travadas entre projetos societários antagônicos, o que faz com que, desde então, o Serviço Social seja visto como uma profissão inserida na divisão sócio-técnica do trabalho, ou seja, que participa do processo de produção e reprodução das relações sociais. Segundo Iamamotto (2001, p. 19): O assistente social desenvolve um tipo de trabalho espe- cializado que se realiza no âmbito de processos e rela- ções de trabalho, não podendo ser visto isoladamente, mas como resultado de dois elementos fundamentais: desempenho profissional e as circunstâncias sociais nas quais se realiza o trabalho. Ao pensar em desempenho profissional, ou seja, compe- tência, é preciso retomar a própria formação em Serviço Social desenvolvida nos mais diversos espaços univer- sitários que apresentam como característica central sua formação pautada em uma orientação curricular. Essa orientação é repassada pela Associação Brasileira de En- sino e Pesquisa em Serviço Social – ABEPSS. A ABEPSS, fundada em 1946, é uma associação cujo pa- pel tem sido o de assegurar a direção intelectual e político-pe- dagógica ao processo de formação profissional. Para tanto, 4 Competência Técnico Operativa em Serviço Social I tem mantido como objetivo central de sua ação congregar as Unidades de Ensino em torno da promoção e construção de um significado social para a formação dos assistentes sociais, imprimindo-lhe um rigor teórico-metodológico em sua relação histórica com a sociedade, como visto no capítulo anterior. Para isso, exige-se uma formação acadêmica intelectual e crítica, competente em sua área de desempenho, com capaci- dade de inserção propositiva no conjunto das relações sociais e no mercado de trabalho, além do compromisso com os va- lores e princípios norteadores do Código de Ética do Assistente Social. Esse órgão, que regulamenta a formação em Serviço So- cial, demonstra constantemente a preocupação e o compro- misso com a formação profissional na área e organiza suas diretrizes destacando um tripé de competências necessárias ao exercício e à formação profissional, que são: dimensão teó- rico-metodológica, dimensão técnico-operativa e dimensão ético-política. Neste capítulo, daremos ênfase à reflexão sobre a dimensão técnico-operativa do processo de trabalho do as- sistente social. Ao falar em dimensão técnico-operativa, estamos nos re- ferindo aos meios de trabalho adotados pelos profissionais na sua prática, ou seja, a habilidade de colocar o conhecimento em ação. Essa dimensão demonstra a operacionalidade das técnicas e instrumentos utilizados no nosso processo de traba- lho, tendo em vista que muitos desses instrumentos não são específicos do Serviço Social, no entanto, vale lembrar que a utilização dos mesmos por um assistente social tem uma co- Capítulo 1 A Dimensão Técnico-Operativa nos Processos de Trabalho 5 notação diferenciada. Exemplo: uma entrevista ou visita do- miciliar realizada por um profissional de nossa área implica conhecimentos, além, é claro, de um conjunto de habilidades específicas à sua formação. Segundo Trindade (2001, p. 21): Ao enfatizar o estudo dos instrumentos e técnicas não estamos limitando o instrumental à condição de reper- tório interventivo, a um rol de instrumentos e técnicas que seriam suficientes para a eficiência da ação. Nossa perspectiva teórica aponta a insuficiência de uma visão de instrumental técnico-operativo restrito à habilidade e ao manejo desse repertório, pois esta é uma concepção que isenta o instrumental de suas relações mais amplas, restringindo-o à sua condição de acervo técnico. Portanto, é preciso problematizar a dimensão técnico- -operativa a fim de compreender os processos interven- tivos dos assistentes sociais. Assim, para desenvolver a competência técnico-operativa, o profissional deve co- nhecê-la, apropriar-se nela, e, sobretudo, criar um con- junto de habilidades técnicas que lhe permitam desenvol- ver as ações profissionais junto à população usuária e às instituições contratantes, garantindo assim uma inserção qualificada no mercado de trabalho, que responda às demandas colocadas tanto pelos empregadores, quanto pelos usuários dos serviços e pela dinâmica da realidade social. 6 Competência Técnico Operativa em Serviço Social I Fig. 1 processo interventivo Fonte: Autora Mas ainda é comum, nos espaços acadêmicos e/ou de atuação profissional, assistentes sociais fazerem uma dicoto- mia quanto às dimensões da prática, desconhecendo, e/ou até mesmo negando a necessidade de articulação entre teoriae prática, investigação e intervenção, pesquisa e ação, ciência e técnica, as quais jamais devem ser encaradas como dimen- sões separadas. Fig. 2 Articulação das dimensões Fonte: Autora Capítulo 1 A Dimensão Técnico-Operativa nos Processos de Trabalho 7 Isso, nas palavras de Iamamotto (2001), é como ferir os princípios éticos fundamentais que norteiam a ação profissio- nal, o que já era reiterado pela ABESS1 desde 1996: É necessário atribuir maior importância às estratégias, tá- ticas e técnicas instrumentalizadoras da ação em estreita articulação com os avanços obtidos no campo teórico- -metodológico e da pesquisa. Isto porque a justificativa da escolha do instrumental, das metas visadas, assim como do conteúdo por eles veiculados, tanto depende dos resultados da análise da realidade como da inten- cionalidade e direção social imprimidas pelos sujeitos profissionais (ABESS/CEDEPSS, 1996, p. 153) Dessa forma, temos claro que toda ação humana está con- dicionada ao momento histórico em que ela é desenvolvida, pois a realidade social é complexa, heterogênea e os impactos de qualquer intervenção dependem de fatores que são exter- nos a quem quer que seja – inclusive aos assistentes sociais. Por isso, ao pensar no uso da instrumentalidade, como parte integrante das competências técnico-operativas, expressamos os objetivos que se querem alcançar, mas isso não significa que eles necessariamente serão alcançados. Segundo Iama- moto (2001, p. 22): Reconhecer as possibilidades e limitações históricas, da- das pela própria realidade social, é fundamental para que o Serviço Social não adote, por um lado, uma pos- tura fatalista (ou seja, acreditar que a realidade já está 1 ABESS – Associação Brasileira de Ensino em Serviço Social, atualmente, ABEPSS – Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social. 8 Competência Técnico Operativa em Serviço Social I dada e não pode ser mudada), ou por outro lado, uma postura messiânica (achar que o Serviço Social é o “mes- sias”, que é a profissão que vai transformar todas as re- lações sociais). É importante ter essa compreensão para localizarmos o lugar ocupado pelos instrumentos de tra- balho utilizados pelo Assistente Social em sua prática. Também, é preciso ter claro que a definição dos instru- mentos e técnicas de intervenção é um processo racional de intervenção, pois as mesmas não estão prontas e acabadas, necessitando constantemente da reflexão teórica e política so- bre a construção das mesmas. Para tanto, primeiro, se define “para que fazer”, para depois se definir “como fazer”. Mais uma vez, podemos aqui identificar a estreita relação entre as competências teórico-metodológica, ético-política e técnico- -operativa. Figura 3 Círculo de Competências Fonte: Autora Assim sendo, os instrumentos e técnicas de intervenção não podem ser mais importantes que os objetivos da ação profis- Capítulo 1 A Dimensão Técnico-Operativa nos Processos de Trabalho 9 sional, pois compreendemos que o assistente social não deve ter apenas a habilidade técnica de manusear um instrumento de trabalho, mas também, ter consciência da dimensão e do porquê de ele está utilizando determinado instrumento. Essa é uma forma comprometida de romper com uma prática mecâ- nica, repetitiva, burocrática, porque, afinal, mais que aplicar técnicas, o diferencial de um profissional é saber adaptar um determinado instrumento às necessidades que precisa no seu cotidiano. No entanto, pensar em competência técnico-operativa não significa só pensar em instrumentos, técnicas, mas também atentar para um conjunto de fatores que as tornam altamente imprevisíveis e sujeitas a contínuas transformações. Segundo Toso (1998, p. 42), dentre esses fatores estariam: Os tipos de demandas que requerem modalidades operativas flexíveis e personalizadas; a quantidade e a multidimensionalidade dos problemas sociais dos quais sempre emergem novas demandas e necessidades; a multiplicidade de contextos institucionais em interação com os seus constantes conflitos de competências e co- ordenação; a incerteza em relação aos recursos devido à grande variação da disponibilidade dos recursos públi- cos; e a complexidade das respostas somada à incerteza sobre seus efeitos, dado o grande número de variáveis intervenientes e da dificuldade em controlá-las. Tendo em vista esses fatores, e muitos outros que poderão constituir a prática e que não conseguimos dimensionar, pode- -se dizer que o processo interventivo não se constrói a priori, 10 Competência Técnico Operativa em Serviço Social I ao contrário, faz-se no seu próprio trajeto, e essa construção não depende só do Assistente Social, mas também dos outros sujeitos envolvidos, dentre eles, o espaço sócio-ocupacional no qual o profissional está inserido e os destinatários das ações nele desenvolvidas. Dessa forma, as ações se revestem de inúmeras caracterís- ticas que dificultam a sua própria apreensão e composição em termos de organização e produção do trabalho e do conheci- mento. Assim, de acordo com Trindade (2001, p. 22): Para efetivação de sua ação, os profissionais acionam um instrumental técnico-operativo que constitui um conjunto de instrumentos e técnicas diferente daquele utilizado na esfera da produção material, cuja base é a transformação de objetos materiais. Aqui vale destacar que não se trata de desconsiderar que o processo de produção material, visto que envolve a reprodução material e reprodução das formas de relação entre os homens. Dessa forma, reafir- mamos a compreensão de que o processo de produção, voltado à satisfação das diversas necessidades humanas, envolve tanto as atividades diretamente vinculadas à pro- dução de bens materiais, quanto aquelas voltadas à re- gulação das relações sociais, ambas articuladas devido à diversificação e complexificação das necessidades sociais. Sendo assim, ao considerarmos o processo de desenvolvi- mento de instrumentos e técnicas utilizados em nossa interven- ção prática, os instrumentos de trabalho se desenvolvem como meios materiais que possibilitam transformar o objeto, ou seja, sua aplicação requer o conhecimento das causas dos objetos Capítulo 1 A Dimensão Técnico-Operativa nos Processos de Trabalho 11 a serem transformados. Entre os instrumentos e técnicas que são mais usuais no Serviço Social, destacam-se: a observação, a entrevista e a visita domiciliar. Observação: Figura 4 Observação A observação é uma técnica na qual observar não é somen- te olhar, mas ir além. É poder observar uma série de coisas, pessoas, ações, relações e buscar seu significado, seu sentido. Conforme Minayo (2004, p. 59), esse tipo de procedimento realiza-se através do contato direto do observador com o fenô- meno observado para obter informações sobre a realidade dos atores sociais em seus próprios contextos. Através de uma observação, tem-se mais condições de compreender características do cotidiano da comunidade/ fa- mília/ instituição/ usuário que escolhe estudar ou intervir, des- velando hábitos, costumes, atitudes, os quais podem carac- terizar estratégias utilizadas pelos mesmos, dentro do espaço onde vivem. O uso da observação apresenta muitas vanta- gens, entre elas destacam-se: chegar mais perto dos sujeitos; exigir menos do observador do que outras técnicas; permitir a 12 Competência Técnico Operativa em Serviço Social I evidência de dados não constantes do roteiro de entrevistas ou de questionários; etc. Entrevista: Figura 5 entrevista É uma técnica importante que permite o desenvolvimento de uma estreita relação entre as pessoas. É um modo de co- municação no qual determinada informação é transmitida de uma pessoa à outra. (Rychardson, 1999, p. 207). O termo “entrevista” é construído a partir de duaspalavras, entre e vista. Vista refere-se ao ato de ver, ter preocupação de algo. Entre indica a relação de lugar no espaço que separa duas pessoas ou coisas. Portanto, o termo entrevista refere-se ao ato de perceber realizado entre duas pessoas. Algumas instruções podem ajudar no processo de entrevis- ta como: explicar o objetivo da entrevista; assegurar o anoni- mato do entrevistado e o sigilo das respostas; solicitar a cola- boração nas respostas, pois suas opiniões e experiências são importantes; etc. Capítulo 1 A Dimensão Técnico-Operativa nos Processos de Trabalho 13 Visita Domiciliar: Figura 6 casa A visita domiciliar no Serviço Social é compreendida como uma situação onde o Assistente Social instaura uma relação com o sujeito no seu ambiente familiar, onde ele tem a pos- sibilidade de compreender a realidade no próprio ambiente do usuário. Esse tipo de visita oferece ao técnico um maior número de possibilidades por entrar verdadeiramente na vida do usuário como um observador participante. Assim, segundo Amaro (2002), a realidade está disponível para ser interpreta- da e captada em suas verdades. É importante que o observa- dor seja capaz de encontrar a verdade daquela realidade, não a verdade que acredita ou que quer ver. Mas, como realizar uma boa visita domiciliar? Alguns au- tores consideram que em uma visita domiciliar é preciso es- tabelecer um diálogo aberto, sem jogo de perguntas e res- postas, permitindo que haja uma relação de espontaneidade sem máscaras ou rótulos, sem medos. Lembrando sempre de avaliar quem solicitou a visita; o que ela pode colaborar para o usuário; avisar a visita e marcar data e horário; evitar visitas nos horários das refeições entre outros. 14 Competência Técnico Operativa em Serviço Social I Esses instrumentos são apenas alguns dentre tantos que compõem o acervo da instrumentalidade do serviço social, e estes possuem um caráter menos instrumental e mais proces- sual, pois a aplicabilidade dos mesmos se constitui em atitu- des, posturas que visam levar os sujeitos a produzirem novas atitudes atendendo a diferentes interesses sociais. Referência comentada IAMAMOTTO, Marilda Vilela. O serviço social na contempo- raneidade: trabalho e formação profissional. 5. ed. São Paulo: Cortez, 2001. Esta obra é considerada um verdadeiro legado para o Ser- viço Social, pois incorpora temáticas e questões da agenda profissional contemporânea, dando ênfase ao debate sobre o processo de trabalho do assistente social que não pode deixar de acompanhar a própria evolução da história frente às inú- meras transformações societárias. Leitura obrigatória, independente dos espaços onde o as- sistente social atue, pois demarca o cenário contraditório em que este profissional se insere, dando destaque à reflexão ins- tigante que norteia nossa prática comprometida com a am- pliação das conquistas democráticas da sociedade brasileira. Autoestudo I – Hoje se exige uma formação acadêmica intelectual e crítica, competente em sua área de desempenho, com capacidade de inserção propositiva no conjunto das relações sociais Capítulo 1 A Dimensão Técnico-Operativa nos Processos de Trabalho 15 e no mercado de trabalho, além do compromisso com os valores e princípios norteadores do Código de Ética do As- sistente Social. De acordo com o esquema abaixo, elabore uma situação que descreva a realidade social, identifique as demandas e construa a ação do profissional. II – Complete as lacunas com a alternativa correta: 1. Conforme Minayo (2004), a observação é um tipo de pro- cedimento que se realiza através do contato ________ do observador com o __________ observado para obter ____________ sobre a ___________ dos atores sociais em seus próprios ___________. a. ()parcial/ território/ interações/ rotina/ contextos; b. ()indireto/ local/ informações/ dinâmica/ territórios; c. ()direto/ fenômeno/ informações/ realidade/ contextos. 2. Segundo Rychardson (1999), a entrevista é uma _________ importante que permite o ________________ de uma 16 Competência Técnico Operativa em Serviço Social I estreita ___________ entre as pessoas. É um modo de ____________ no qual determinada ___________ é trans- mitida de uma pessoa à outra. a. () técnica / entrosamento / interação / comunicação / informação; b. () ação / aprofundamento / relação / informação / co- municação; c. () técnica / desenvolvimento / relação / comunicação / informação. 3. De acordo com Amaro (2002), ao realizar uma Visita Do- miciliar, a realidade está disponível para ser interpretada e captada em suas verdades. Isso significa que: a. () O observador deve ser capaz de encontrar a verdade daquela realidade, não a verdade que acredita ou que quer ver. b. () O observador deve encontrar uma única verdade, in- dependente de como ela se apresenta. c. () O observador deve ser capaz de não fazer pré-julga- mentos durante a visita domiciliar. 4. É imprescindível que durante a Visita Domiciliar ocorra: a. () um dialogo amigável, afinal você foi visitar o usuário; b. () um dialogo restrito, afinal você não conhece quem está visitando; c. () um diálogo aberto, sem jogo de perguntas e respostas. Capítulo 1 A Dimensão Técnico-Operativa nos Processos de Trabalho 17 5. Entre as instruções que podem ajudar no processo de entre- vista destaca-se: a. () não dar muitas informações sobre o motivo da entrevis- ta, pois isso pode atrapalhar a intervenção; b. () explicar o objetivo da entrevista; assegurar o anonima- to do entrevistado e o sigilo das respostas; c. () explicar o motivo da entrevista, sem a garantia do sigi- lo às respostas, pois você deverá usá-las na intervenção profissional. GABARITO 1. c 2. c 3. a 4. c 5. b Referências AMARO, Sarita. A visita domiciliar. Porto Alegre: AGE, 2002. BENJAMIM, Alfred. A entrevista de ajuda. São Paulo: Martins Fontes, 1994; 18 Competência Técnico Operativa em Serviço Social I IAMAMOTTO, Marilda Vilela. O serviço Social na contempo- raneidade: trabalho e formação profissional. 5. ed. São Paulo: Cortez, 2001; MINAYO, Maria Cecilia de Souza (org). Pesquisa Social: teoria, método e criatividade. 23.ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 1994 RICHARDSON, Roberto Jarry. A Pesquisa Social: métodos e técnicas. São Paulo: Atlas, 1999. TOSO, L. Intenzionalità e limite: due dimensione di un per- corso. Animazione Sociale, Milano, Gruppo Abelle, n. 28, 1998. TRINDADE, Rosa Lucia. Desvendando as determinações sócio- -historicas do instrumental técnico-operativo do serviço so- cial na articulação entre demandas sociais e projetos pro- fissionais. Temporalis n 04. Brasília: ABEPSS, 2001. Análise de Conjuntura Kelines Gomes Capítulo 2 20 Competência Técnico Operativa em Serviço Social I Este capitulo diz respeito ao processo de embasamento para a realização de uma análise de conjuntura, uma vez que se trata de um precioso instrumento de leitura de realidade no desenvolvimento da formação e prática do Assistente Social. Saber fazer a análise dos fatos e acontecimentos postos no dia a dia do profissional oportuniza uma prática que vai realmente ao encontro das necessidades e demandas sociais. 2.1 Pressupostos básicos de análise de conjuntura A sociedade brasileira vivencia uma grande mobilidade em todas suas esferas, sejam elas políticas, econômicas, cultu- rais, sociais. Segundo Castells (1999), uma revolução tec- nológica concentrada nas tecnologias de informação está remodelando a base material da sociedade em ritmo ace- lerado, isto tem transformado o cenário da vida humana. Sendo assim, não basta ficarmos informados com base na mídia escrita e falada, temos que saber fazer uma leitura da realidade que nos circunda. Para isso, é necessário termos alguns elementosque possam ajudar na identificação des- sa realidade, no entanto, é necessário fazer uma análise de conjuntura. Souza (2008, p. 7) salienta que a todo momen- to fazemos análise de conjuntura, sabendo ou não. Isso faz parte de nosso dia a dia, quando decidimos sair de casa, sair de um emprego, casar e etc. Capítulo 2 Análise de Conjuntura 21 Fig. 1 Ações cotidianas As situações que vivenciamos no cotidiano e sobre as quais temos que tomar decisões são baseadas em uma avaliação da situação vista sob a ótica de nossos interesses ou necessidades (Souza, 2008, p. 7). Para isso devemos levar em conta: Fig. 2 ciclo de análise Fonte: Autora 22 Competência Técnico Operativa em Serviço Social I O ciclo acima demarca um conjunto de conhecimentos, informações e avaliações que são importantes e nos possibili- tam a tomada de decisões (Souza, 2008). Assim a análise de conjuntura não é algo estranho à nossa rotina diária, apenas não a fazemos de forma consciente a todo instante. Porém está vinculada a conhecimentos e descobertas e está sempre rela- cionada a uma determinada visão do sentido e do rumo dos acontecimentos. A análise de conjuntura para Souza (1999, p. 8) é não somente parte da arte da política, como é em si mesma um ato político. A análise de conjuntura foi muito utilizada no final da dé- cada de 70 e de 80, apontada como fase de reestruturação dos movimentos sociais no final da ditadura militar. Diversas organizações não governamentais desenvolveram esse tipo de atividade, sendo que o IBASE (Instituto Brasileiro de Análises Socioeconômicas) de- senvolveu um método de fazer análise, a partir de seu funda- dor, o sociólogo e cientista político Herbert José de Souza, o Betinho, que resultou no livro “Como fazer análise de conjun- tura”, editado pela editora Vozes, do qual nos utilizamos para a composição deste capitulo. A análise de conjuntura é um instrumental estratégico que organiza os movimentos, pois articula o campo teórico e a ação política. Define-se como “busca de possibilidades para ação”. Nesse sentido, ela só tem validade quando realizada pelos próprios atores dos movimentos sociais. Assim, um con- sultor poderá trazer elementos ricos para o debate, mas nunca substitui a análise dos atores que estão envolvidos nos movi- mentos e instituições. Capítulo 2 Análise de Conjuntura 23 Para Alves: A análise de conjuntura quer dizer análise de conjunto. É a análise das partes que formam um todo complexo. A estrutura por sua vez é a interligação do conjunto forma- do pela reunião das partes ou elementos de uma deter- minada ordem ou organização (2008, p. 2) Para entender melhor a diferença entre conjuntura e estru- tura, partimos para o que Alves chama de perspectiva tempo- ral de análise, ao abordar que a conjuntura está relacionada a curtos ciclos voltados a economia e a política, enquanto que a estrutura dá conta de ciclos mais longos. O autor comple- menta que uma mudança estrutural requer varias mudanças conjunturais, porém as transformações radicais da conjuntura só coincidem com as transformações radicais da estrutura nos momentos revolucionários. Pode-se situar uma conjuntura em algumas escalas: indo da escala do poder local ao nível regional,nacional e mes- mo mundial. Esta escala de análise deve ser definida, pois quanto maior a escala de tempo escolhida, por exemplo, um mês, uma semana, ou um ano, maior a dificuldade de análise dos fatos e acontecimentos. O mesmo critério vale para escala de espaço que pode ser local, estadual, nacio- nal e mundial. 2.2 Categorias para análise As categorias para trabalhar a análise de conjuntura são: 24 Competência Técnico Operativa em Serviço Social I Fig. 3 Categorias para análise Fonte: Autora Cada categoria merece uma atenção especial e deve ser vista separadamente para melhor compreensão. Essas catego- rias foram utilizadas por Marx no estudo da Revolução France- sa “18 Brumários”: a) Acontecimentos: em primeiro lugar, devemos diferen- ciar fatos de acontecimentos. Fatos fazem parte da nossa sociedade, porém se tornam acontecimentos quando adquirem algum sentido especial para um país, uma pessoa. Na análise de conjuntura, é impor- tante ter clara essa distinção e principalmente distin- guir os acontecimentos por sua importância, mas isso dependerá de quem estiver analisando, pois peso e importância dependem da ótica de quem analisa. Essa identificação é fundamental para se caracterizar e analisar uma conjuntura. Capítulo 2 Análise de Conjuntura 25 b) Cenários: as ações da trama social são desenvolvidas em espaços que podem ser chamados de cenários. E esses cenários são palco de muitas lutas e conquistas sociais. Daí a importância de se identificar os cenários e os contextos em que se desenvolvem as lutas e suas particularidades. c) Atores: o ator é aquele que representa, que encara um determinado papel dentro de uma trama de relações. Os atores não estão limitados a pessoas ou grupos sociais, as instituições também são atores sociais. d) Relação de forças: os atores sociais estão em relação uns com os outros. Essas relações podem ser de con- fronto, de coexistência e estarão sempre revelando uma relação de forças, de domínio, igualdade ou de subordinação. Encontrar formas de verificação dessa relação é decisivo para a análise de conjuntura. Isso não se estabelece por um processo imutável. e) Articulação entre estrutura e conjuntura: os aconteci- mentos ocorrem a partir de situações desenvolvidas pelos atores sociais, definindo uma conjuntura, e in- teragem com as relações sociais, econômicas e políti- cas desenvolvidas em um determinado processo mais longo. Isso é chamado de articulação de conjuntura e estrutura. Para isso, é necessário perceber o conjunto de forças e problemas existentes por trás dos proble- mas. Também é necessário ver o sinal de saída para o novo. 26 Competência Técnico Operativa em Serviço Social I 2.3 Organização da análise de conjuntura Para a realização de uma análise de conjuntura é necessário considerar, além das categorias que subsidiarão essa prática, outros elementos que deverão fazer parte, pois auxiliam na leitura de realidade e na análise do contexto. Elas são: a) Marco teórico ou campo do conhecimento Esse aspecto diz respeito a um campo de conhecimento, à teoria sobre a sociedade, a história etc. Para muitos é o instru- mental de análise marxista, para outros diz respeito ao para- digma de complexidade. O marco teórico é muito importante para o processo, pois dependendo da teoria que embasa mi- nha analise é que vou fazer a análise do contexto apresentado. Para podermos ter subsidio para a análise, precisamos co- nhecer:  A formação social, cultural e político-econômica do Brasil.  A história de luta dos movimentos sociais. Cabe pontuar que não devemos cair no engessamento dos pensadores e das teorias. Cada realidade tem sua particulari- dade e toda práxis tem que captar essa particularidade, evitan- do assim reproduções de modelos estéreis. Há três momentos em uma análise de conjuntura: 1. descrição 2. análise 3. síntese Capítulo 2 Análise de Conjuntura 27 b) Informação Esse aspecto também é central, pois dependemos do tipo de informações sobre vários campos da realidade para poder- mos alicerçar a análise. Nesse sentido, é importante ter fontes de informação sobre pessoas, dados, fatos e acontecimentos, sempre estar atento ao movimento realizado nos diversos con- textos. c) Definição de escala de tempo e espaço na análise É importante termos uma base de definição para a realiza- ção da análise de conjuntura que pode ser um semestre, um mês, um ano. Porém a escala de tempo e o espaço em que se processa a análise nos auxiliam a perceber o contexto: quantomaiores as escalas de tempo e espaço mais complexa torna-se a análise. d) Totalidade Toda análise implica ver o contexto de forma global, multi- dimensional (econômica, social, política, religiosa) e processu- al, pois através desses pontos de vista vai nos apontando como são estabelecidas as forças que se organizam nos contextos aos quais iremos analisar. A análise de conjuntura deve levar em conta as articula- ções e dimensões locais, regionais, nacionais e internacionais dos fenômenos, dos acontecimentos, dos atores e das forças sociais que estão imbricadas nos contextos que estamos ana- lisando (Souza, 2008, p. 16). Também cabe pontuar que isso tudo depende de cada situação, relação ou posição inserida em contextos mais amplos ou mais permanentes. 28 Competência Técnico Operativa em Serviço Social I Segundo Souza, a análise de conjuntura de modo geral é uma análise interessada em produzir um tipo de intervenção política; é um elemento fundamental na organização da polí- tica, na definição das estratégias e táticas das diversas forças sociais em luta (2008, p. 17). Nesse sentido devemos levar em conta em toda análise a imprevisibilidade em relação à ação política: sua existência, seus efeitos e suas causas, conforme salienta o autor acima. Outra questão importante a ser ponderada e que vem sen- do pontuada por Souza (2008) são as categorias estratégia e tática, instrumentos úteis para perceber a ação dos diferentes atores sociais envolvidos nesse processo. Para Faleiros (1997, p. 81), as estratégias e táticas não são o resultado de uma opção, não se fazem guerras conforme a vontade de cada um. As guerras são resultado de forças em presença, de recursos disponíveis e mobilizáveis e de interesses e objetivos a atingir em um determinado tempo. A estratégia se refere a objetivos a atingir em um período mais longo, enquanto a tática se refere a objetivos particulares em período mais curto, mas está sem- pre vinculada à estratégia. 2.4 Roteiro para analise de conjuntura a) Coleta de dados  Atenção aos fatos, noticias e acontecimentos.  Anotação dos dados e informações. Capítulo 2 Análise de Conjuntura 29  Organização das informações. b) Acontecimentos  Após a coleta dos dados, separar o que é fato e o que é acontecimento.  Hierarquizar os acontecimentos mais importantes.  Identificar o sentido dos acontecimentos.  Verificar o efeito dos acontecimentos.  Considerar que os acontecimentos apontam mudanças. c) Atores  Listar os atores envolvidos.  Realizar sua classificação: - indivíduos - instituições - grupos - classes sociais d) Cenários  Cenários abertos – ruas, espaços públicos e populares etc.  Cenário fechado – gabinetes, câmara congresso etc.  Cenário subordinado – a lógica dos movimentos popu- lares, oposição.  Cenário dominante – a lógica do poder. 30 Competência Técnico Operativa em Serviço Social I e) Clima  Em que clima se desenvolvem as relações: - tenso - conflituoso - tranquilo - empolgação - subordinação - partilha f) Relações de força  Poder de influência dos atores.  Relações estabelecidas pelos atores: - aliança - conflito - outros  Identificação da articulação entre os atores – estabeleci- mento de aliança (quem com quem). g) Projeção de tendências A projeção de tendências é o objetivo da análise institucio- nal, mas para isso é importante estar alicerçado em uma boa análise do contexto e das forças em presença da realidade social estudada. Assim duas perguntas são necessárias: Capítulo 2 Análise de Conjuntura 31  Há possibilidade de mudanças?  Há perspectivas de cada ator diante das mudanças? Para o desenvolvimento de uma boa análise de conjuntura é importante levar em consideração: - uma boa análise; - não misturar nossos desejos com a realidade dos fatos; - ver os diversos aspectos da realidade, a multidimensiona- lidade dos fenômenos sociais; - perceber os diferentes contextos (econômico, político, so- cial, cultural); - levar em conta as ideologias que circundam os aconte- cimentos, as relações globalizadas, no contexto interna- cional; - perceber o aparato jurídico e repressivo em que se esta- belecem os parâmetros dos contextos sociais. Referência Comentada SOUZA, Herbert José de. Como se faz análise de conjuntura. Petrópolis, RJ: Vozes, 2008. Nesta obra Betinho nos apresenta subsídios para a realiza- ção de uma análise de conjuntura, apontando seus passos e fundamentando a importância de estarmos embasados para olhar a realidade a partir de seus fatos e compreender como estes viram acontecimentos, denotando a relevância de estar- 32 Competência Técnico Operativa em Serviço Social I mos atentos para os movimentos sociais, sua organização e cenários que compõem esse processo. Evidencia a década de 80 como um marco importante na análise de conjuntura por ter sido muito utilizada pelos movimentos sociais que estavam se reestruturando no final da ditadura militar. Autoestudo I. Procure realizar uma análise de conjuntura levando em con- ta o roteiro apresentado. Utilize cada passo para a reali- zação da análise e anote em um caderninho todo o seu desenvolvimento. A seguir, debata com colegas em sala de aula como foi à realização desse exercício e quais suas contribuições para a construção do conhecimento da rea- lidade. II. Assinale “C” para as respostas certas e “E” para aquelas que estiverem erradas. 1. () As situações que vivenciamos no cotidiano e sobre as quais temos que tomar decisões são baseadas em uma avaliação da situação vista sob a ótica de nossos interesses ou necessidades. 2. () A análise de conjuntura foi muito utilizada no final da década de 70 e de 80, apontada como fase de reestruturação dos movimentos sociais no final da di- tadura militar. 3. () A análise de conjuntura não é um instrumental es- tratégico que organiza os movimentos, pois articula o campo teórico e a ação política. Capítulo 2 Análise de Conjuntura 33 4. () Alves (2008) salienta uma mudança estrutural que não requer várias mudanças conjunturais, porém as transformações radicais da conjuntura só coincidem com as transformações radicais da estrutura nos mo- mentos revolucionários 5. () Souza (2008) refere que as categorias estratégia e tática são instrumentos úteis para perceber a ação dos diferentes atores sociais envolvidos nesse processo. 6. () Para podermos ter subsídio para a análise, precisa- mos conhecer a formação social, cultural e político- -econômica do Brasil e a história de luta dos movi- mentos sociais. 7. () A Informação é um aspecto central, pois depende- mos do tipo de informações sobre vários campos da realidade para podermos alicerçar a análise. GABARITO: 1. C – 2. C – 3. E – 4. E – 5. C – 6. C – 7. C Referências ALVES, José Eustáquio Diniz. Análise de conjuntura: teoria e método. Rio de Janeiro: UFRJ 2008. CASTELLS, Manuel. A sociedade em rede. A era da informa- ção: economia, sociedade e cultura. v. 1 São Paulo: Paz e Terra, 1999. FALEIROS, Vicente de Paula. Saber profissional e poder institu- cional. São Paulo: Cortez, 1997. 34 Competência Técnico Operativa em Serviço Social I GENNARI, Emilio. Dicas para uma análise de conjuntura. 2008 Disponível em: http://www.sindutemg.org.br/docs/ educqtqq/roteiroanaconj. Consultado em 10/01/2010. SOARES, Laura Tavares. A charanga do ajuste fiscal e da fo- calização do gasto social. Caderno Especial, n16 – Análise de Conjuntura. Rio de Janeiro: ADUFRJ, 2005. SOUZA, Herbert José de. Como se faz análise de conjuntura. Petrópolis, RJ: Vozes, 2008. Site www.sindutemg.org.br/docs/educqtqq/roteiroanaconj WWW.outrobrasil.net Análise Organizacional1 1 AssistenteSocial, Especialista na Administração e Planejamento de projetos e Res- ponsabilidade Social e Sustenbalidade. Captadora de Recursos junto a Prefeitura Municipal de Novo Hamburgo. Docente do Curso de Serviço Social da Universida- de Luterana do Brasil -Ulbra. Capítulo 3 Rúbia Geane Goetz1 36 Competência Técnico Operativa em Serviço Social I A partir do estudo da análise de conjuntura, partiremos para a análise organizacional, um importante instrumento utili- zado na prática do assistente social. Conhecer a organização onde estamos inserimos, decifrar seus fluxos, normas, regras, relações entre outros fatores é requisito para o planejamento do processo de trabalho a ser realizado. Realizaremos inicial- mente uma breve contextualização sobre as peculiaridades da análise organizacional, contemplando especialmente os ele- mentos que a diferenciam da institucional. 3.1 Instituição e organização: peculiaridades importantes. Embora no cotidiano, seja comum o uso das duas categoriais como referência a um estabelecimento social, ambas possuem diferenças que necessariamente precisam ser reconhecidas pe- los profissionais de serviço social no desenvolvimento de seu processo de trabalho. Capítulo 3 Análise Organizacional 37 Instituição(ões) Organização(ões) É tudo aquilo (conceitos, regras, normas, leis, costumes, etc) que fundamenta a organização da vida em sociedade. “São entidades abstratas, por mais que possam estar registra- das em escritos ou conservadas em tradições” (BAREMBLITT, 2002, 27) Apresentam-se por áreas, por exemplo: saúde, educação, assistência social entre outras. São imateriais e inacessíveis diretamente. Uma instituição (assistência social) pode compreender várias organizações (ministérios, secretarias,departamentos). • È a materialização, a expressão concreta das instituições na reali- dade social. • São as formas materiais de grandes ou pequenos conjun- tos de opções (regras, normas, princípios, valores, etc) que as instituições distribuem, enunciam e definem. • Uma organização compreende unidades menores, os estabele- cimentos. • Estabelecimentos são unidades locais de materialização de uma organização. Exemplo: Centros de Referência da Assistência So- cial, Serviços de Fortalecimento de Vínculos, Serviços de Acolhi- mento Institucional. Aqui ainda serão considerados os equipa- mentos materiais e estratégicos, os agentes e as práticas. Dessa forma é importante compreender, que “as instituições não teriam vida, não teriam realidade social senão através das organizações. Mas as organizações não teriam sentido, não teriam objetivo, não teriam direção se não estivessem informa- das como estão, pelas instituições” (BAREMBLITT, 2002, 27) apud Scheunemann,2014. 38 Competência Técnico Operativa em Serviço Social I Na análise institucional o foco está nos conceitos, regras, nor- mas, leis, costumes, etc que fundamentam a organização. Em sendo a organização a expressão material e concreta da ins- tituição, na análise organizacional, o foco está na forma, no processo, na matéria e no significado das relações, grupos, ins- tâncias e elementos que compõem uma organização ou estabe- lecimento (Scheunemann,2014). Com base nestes aspectos, trataremos neste capítulo da análise organizacional, destacando suas particularidades e apresentando passos metodológicos importantes implicados na sua realização. Fig.1 Processo de Conhecimento As instituições compreendem um sistema complexo de re- lações interpessoais e estruturais, que apresenta determinantes explícitos expressos na documentação, nas regras e normas, no fluxo do processo de trabalho e no organograma orga- nizacional, e determinantes implícitos – que se expressam na comunicação, nas disputas internas de poder que determinam as forças impulsoras (aquelas alinhadas com os interesses da Capítulo 3 Análise Organizacional 39 instituição) e as forças restritivas (as que influenciam negativa- mente para o alcance dos interesses da instituição). Realizar o processo de conhecimento destes fatores é muito importante, tanto na construção do agir do assistente social, quanto dos demais profissionais vinculados a organização. Contudo, o processo de conhecimento da realidade da organização não se esgota na identificação do processo, da matéria e do significado das relações, grupos, instâncias e ele- mentos que compõem, exigindo o reconhecimento de outros aspectos do cotidiano e da dinâmica organizacional. Nesse sentido, as contribuições de Barenblitt (1996), no âmbito das relações de poder e saber, são ferramentas que nos permitem avançar na compreensão da realidade organizacional. Assim, uma organização é conjunto de pessoas com re- cursos, objetivos definidos, normas e ordem hierárquica es- tabelecidas, para a satisfação de necessidades, a produção ou venda de bens ou serviços, a transmissão de cultura, a ge- ração de trabalho, a criação, a conservação e transmissão de conhecimentos, para a conquista e defesa de direitos, etc (Scheunemann,2014). Segundo Faleiros (1997, p. 46) se o instituinte pode se transformar em instituído, pela regulação da relação de forças e de hegemonia, também o instituído pode se transformar em instituinte, em uma correlação de novos blocos históricos de poder refletindo, na conjuntura, a dinâmica estrutural e recolocando as relações sujeitos/ estrutura. 40 Competência Técnico Operativa em Serviço Social I Instituínte Instituído Práticas e/ou movimentos in- ternos e externos que mobilizam e pressionam a organização para mudanças. Movimento de romper com o instituído, através da produção de uma nova ordem, de uma nova utopia; do surgimento e/ou con- solidação de movimentos, grupos ou sujeitos que questionam as prá- ticas instituídas. É um processo produtivo-dese- jante, de característica dinâmica. São os elementos da realidade que estão postos: regras, normas. Também considerado o instituí- do é o resultado do processo pro- dutivo-desejante. Tem característica estática e es- tável. Sobre estes aspectos é importante dizer que não significa que o instituinte seja bom e o instituído seja ruim, ainda que por suas particularidades o instituído tenha uma disposição a não mudar e o instituinte surge como uma atividade inventiva e de constante transformação. Dessa forma, não teria sentido este fluxo de forças se o instituinte não se materializasse no instituído e por outro lado, o instituído não estivesse perma- nentemente aberto a força do instituinte. Não há nada que seja mais temido e mais odiado pelo siste- ma social, porque os movimentos instituintes têm esse intuito: que os coletivos presidam a definição de problema,a oferta de soluções, a colocação dos limites do que é possível e do que é impossível,o que normalmente é feito pelas instituições, organi- zações e saberes dominantes. Baremblitt (1996) Capítulo 3 Análise Organizacional 41 Nas organizações se realizam um conjunto de práticas e de articulação das relações sociais que se legitimam em nome de um determinado objeto socialmente reconhecido pela mesma. Esse objeto aponta inúmeras demandas, ou seja, necessida- des sociais produzidas a partir das condições historicamen- te delimitadas. Como exemplos de demandas institucionais destacam-se: ações na área da saúde do trabalhador; de preparação para geração de trabalho e renda; de formação em tecnologias etc. O assistente social atua na perspectiva de reconhecer não só as demandas da organização, mas, sobre- tudo, as demandas trazidas pelos usuários atendidos por ela. Articular as demandas organizações as demandas dos usuá- rios é um grande desafio da profissão, pois nem sempre estas demandas tem coerência. Além das demandas,também encontramos nas organiza- ções as ofertas, que são produzidas pelos agentes institucio- nais que direcionam o que “acham” importante para a popu- lação-alvo. Ao inverso disso, nas instituições que incentivam a participação democrática de seus usuários, as ofertas acabam se aproximando mais das demandas sociais concretas, como, por exemplo, quando um projeto social é criado na instituição a partir das demandas dos usuários, ou seja, um grupo de adolescente solicita oficinas de hip hop como uma forma de desenvolver a cultura local e a inclusão social. Entre as características comuns nas instituições/organiza- ções podemos citar que a grande maioria sofre determinações externas do Estado e da sociedade, apesar de possuírem de- terminações internas próprias, particulares, que são produzi- das historicamente. As organizações também se configuram 42 Competência Técnico Operativa em Serviço Social I por serem um lugar de conflitos e contradições, ou seja, a instituição/organização não é apenas um lugar de realização racional de uma função social, a funcionalidade convive com outros aspectos não racionais que são contraditórios e gera- dores de conflitos. Entre esses aspectos irracionais estão os atravessamentos que a própria instituição/organização impõe a fim de manter a função de preservar a reprodução do sistema instituído. Aqui se incluem práticas e mecanismos utilizados para mediar os conflitos organizacionais, isto é, a forma de enfrentamento da organização para tudo aquilo que “desorganiza” sua rotina, ou lhe gera algum tipo de ameaça à manutenção da ordem estabelecida pela mesma. Outra característica importante nas instituições/organiza- ções é a forma como se estabelece a comunicação institucio- nal que diz respeito a como são comunicadas as determina- ções, os resultados, os objetivos (demandas e ofertas) para o âmbito interno e externo da instituição. Compreende a co- municação aquilo que é “oficial” (pronunciamento de chefias; propaganda/divulgação para a sociedade; comunicados in- ternos) e também o que é “informal” (fofocas; articulações; boatos; enfrentamentos). A comunicação institucional pode se efetivar de duas for- mas: uma forma pode ser resultado de processos autoritários – verticalizados, ou seja, decisão de chefias, diretorias, poder público – sem a participação dos trabalhadores e usuários da mesma. Outra forma se dá através de processos participativos, que se realizam incluindo trabalhadores e população, alvos nas decisões da instituição. Capítulo 3 Análise Organizacional 43 3.2 A análise organizacional Basicamente há dois grandes grupos de organizações: as or- ganizações da sociedade civil (agrupamentos de cidadãos como igrejas, partidos políticos, ONGs, sindicatos, clubes, es- colas, associações em geral etc.) e as organizações estatais (do âmbito do Estado, para desenvolver algum tipo de política, programa ou projeto social dirigido pelo governo e financiado com recursos públicos). Diante disso, para realizar uma análise organizacional, é preciso situar a organização em um contexto mais amplo, cha- mado macro – identificando quais as relações existentes com as demais instituições e com a sociedade que essa instituição apresenta. Também é preciso um constante processo de au- toanálise, pois, muitas vezes, ficamos “viciados” perante a vi- são institucional que adquirimos em um primeiro momento, o que reitera a necessidade de uma problematização constante dos entraves identificados, sem perder de vista o imperativo de ações concretas para enfrentá-los. Sendo assim, de acordo com Baremblitt, (1996, p. 297), análise institucional é “o estudo das relações sociais com ên- fase na instituição, lugar este de contradições e de conflito, a partir das determinações internas, visando assim suas transfor- mações”. A análise organizacional é uma ferramenta, um instrumen- to utilizado que nos possibilita conhecer a realidade em que estamos trabalhando, a organização e o funcionamento das relações sociais, das relações de poder existentes na institui- 44 Competência Técnico Operativa em Serviço Social I ção. É uma leitura da organização que nos possibilitará um melhor entendimento da mesma e possível transformação na- quele espaço. No que se refere aos aspectos metodológicos, existem ele- mentos comuns que não podem deixar de estar contemplados na análise, como: • Exista a interdisciplinaridade. • Não existe neutralidade na análise nem na transfor- mação da realidade. • Existe uma permanente crítica ao movimento da análise. • As relações sociais são articuladas, complexas, de causas múltiplas. Assim, teremos elementos permanentes de interconexão da análise Organizacional: Entre as finalidades da análise organizacional estão: Capítulo 3 Análise Organizacional 45 • Conhecer a realidade da instituição, fazer um Raio-X da orga- nização, a fim de ter um rumo na intervenção. • Subsidiar o planejamento da ação identificando as necessida- des da Organização e dos usuários. • Identificar possibilidades e limites da ação. • Atuar com menor margem de erro. • Estabelecer prioridades e criar estratégias para a ação profis- sional. • Identificar a política organizacional, a demanda atendida, os recursos existentes. • Traçar linhas de trabalho. • Possibilitar a implementação de programas, projetos, que es- tejam adequados com a realidade organizacional. Em seguida apresentaremos um roteiro de análise organi- zacional destacando uma amostra dos principais elementos a serem destacados, contudo, outros aspectos relativos a organi- zação podem se fazer presentes para subsidiar o planejamento das ações dos profissionais, especialmente do assistente social. 3.3 Roteiro de análise organizacional: 1 IDENTIFICAÇÃO DO ESPAÇO INSTITUCIONAL 1.1 Nome da Instituição: 1.2 Endereço Completo: 46 Competência Técnico Operativa em Serviço Social I 1.3 Contato telefônico e e-mail: 1.4 Responsável: 1.5 Missão: 1.6 Visão: 2 DESCRIÇÃO DA INSTITUIÇÃO Descrever brevemente o tipo de atendimento oferecido na ins- tituição, caracterizando sua razão de existir. Procure responder “o que é” e “para que existe” essa instituição. Descrever e explicar a natureza da instituição (Instituição Pública, Instituição Privada ou Organização do Terceiro Setor – não governamental). 3 BREVE HISTÓRICO DA INSTITUIÇÃO Desenvolver um texto referindo os elementos do contexto so- cial que influenciou a criação da instituição (motivação da ori- gem); principais mudanças ocorridas ao longo da história da instituição que repercutem no atendimento atual e na forma de organização instituicional. No que tange a atualidade, busque destacar se a instituição possui um Planejamento Instituicional formalizado em um documento, como, por exemplo: estatuto, legislação, contrato social. 4 OBJETIVO DA INSTITUIÇÃO Mencionar quais são os objetivos da instituição de acordo com a pesquisa nos documentos e no contato com os pro- Capítulo 3 Análise Organizacional 47 fissionais desse campo de estágio, bem como destacar se houveram mudanças ao longo do tempo. Destaque se os ob- jetivos estão formalizados em algum documento (conforme o item anterior) ou se são informais. Apresentar uma reflexão sobre a adequação destes objetivos, analisando criticamente o alcance deles. Nesta reflexão é importante apresentar uma análise crí- tica sobre tais objetivos, destacando a relação destes com a demanda atendida, o foco do trabalho desenvolvido pela instituição, a viabilidade de atingi-los a partir dos recursos disponíveis. 5 POLÍTICA(S) SOCIAL(S) QUE ESSE CAMPO DE ESTÁGIO SE RELACIONA Destacar qual ou quais as políticas que se destacam no cam- po de estágio, bem como a relação dessa para a garantia de direitos dos usuários,tais como: políticas no âmbito da saúde, educação, assistência social, habitação, entre outras. 6 PÚBLICO-ALVO ATENDIDO Descrever as características do público atendido no campo de estágio, por exemplo: idade, sexo, escolaridade, número de membros que compõem a família, fonte de renda, quais os serviços que o usuário acessa, entre outros. Identificar as ex- pressões da questão social que estão relacionadas ao público- -alvo (exemplo: crianças em situação de rua). 48 Competência Técnico Operativa em Serviço Social I 7 PROGRAMAS E PROJETOS QUE DESENVOLVE: Apresentar as ações que são desenvolvidas na instituição e a média de atendimento em cada uma dessas. Apresente os programas e projetos desenvolvidos na instituição, e uma re- flexão crítica sobre estes, que aponte como estes projetos são elaborados nestes espaços para a garantia dos direitos dos usuários. Além disso, procure demonstrar a relação entre estes programas e projetos com as políticas sociais identificadas no item 5 desta análise. 8 ATRAVESSAMENTOS, DIFICULDADES E POTENCIALIDADES Descrever por meio de um texto crítico e reflexivo os fatores que incidem na insituição como atravessamentos/dificultado- res, facilitadores/possibilidades do contexto institucional (de- senvolvimento do trabalho, dos planos, programas e projetos e relações interprofissionais), identificados na organização. 9 O SERVIÇO SOCIAL NA INSTITUIÇÃO Delinear uma retrospectiva sobre a trajetória do Serviço Social na instituição. Apontar o contexto do surgimento do Serviço Social na instituição; mudanças ocorridas no trabalho do as- sistente social ao longo do tempo; constituição da profissão (número de assistentes sociais, formas de contratação, carga horária, recursos materiais e estruturais). Destaque o papel do assistente social na instituição (qual a função da profissão dentro da instituição?). Descreva sobre Capítulo 3 Análise Organizacional 49 participação e reconhecimento do assistente social na insti- tuição a partir da sua análise, identificando a imagem que o profissional possui neste espaço sócio-ocuapcional. 10 PLANEJAMENTO DO TRABALHO Relatar as estratégias utilizadas pelo assistente social para pla- nejar e realizar o seu trabalho (reunião de equipes, planeja- mento das atividades desenvolvidas) 11 DEMANDAS PARA O SERVIÇO SOCIAL Expor quais as principais demandas no campo de estágio que competem ao assistente social, contextualizando os limites, avanços e retrocessos. Neste item você deve contemplar as demandas em duas dimensões: demandas institucionais (que são exigidas pela instituição para serviço social) e demandas da população usuária (solicitadas pelos usuários para o pro- fissional). 12 ATRIBUIÇÕES DO PROFISSIONAL ASSISTENTE SOCIAL Destacar as atividades pertinentes ao trabalho do assistente social. Analise o que faz o assistente social na instituição (con- textualize os instrumentos e a intenção que há na articulação destes instrumentos). Descrever detalhadamente a rotina pro- fissional, deixando clara as atividades desenvolvidas. 50 Competência Técnico Operativa em Serviço Social I 13 LIMITES E POSSIBILIDADES (anseios profissionais). Referir os limites e possibilidades observados, a partir da sua análise, no trabalho desenvolvido pelo assistente social na ins- tituição. Identificar os atravessamentos que dificultam a execu- ção do trabalho do assistente social, bem como as carac- terísticas positivas que facilitam o desenvolvimento do mesmo. 14 RELAÇÃO INTERDISCIPLINAR/ MULTIDISCIPLINAR Expor como se dá a relação de trabalho entre o assistente social e os demais profissionais que compõem a equipe na instituição. Procure analisar aspectos teóricos (divergências e congruências), relação técnica (no próprio atendimento) e éti- cos, buscando compreender como os diferentes profissionais interagem no atendimento direto ao usuário, bem como na gestão do serviço. Referência comentada FALEIROS, Vicente de Paula. Saber profissional e poder institu- cional. São Paulo: Cortez,1997. Faleiros apresenta nesta obra a relação existente entre o saber profissional e o poder político existente nas instituições. Pontua que o saber profissional e o poder institucional são formas históricas da relação entre classe e forças sociais, além da relação entre Sociedade e Estado. O saber é uma forma de enfrentar desafios da natureza como de confrontar ou estimu- Capítulo 3 Análise Organizacional 51 lar conflitos, de justificar ou criticar aquilo que é imposto pela ordem social, de articular a transformação da sociedade. Referências BARENBLITT, Gregório. Compêndio de análise institucional e outras correntes: teoria e prática. Rio de Janeiro: Rosa dos Ventos,1996. FALEIROS, Vicente de Paula. Saber profissional e poder institu- cional. São Paulo: Cortez,1997. SCHEUNEMANN,Arno V. Fundamentos Teórico-Metodológi- cos Contemporâneos I. Ulbra: 2014. A Atuação Social Através de Projetos: Sociais, Interventivos e de Pesquisa1 A Atuação Social Através de Projetos: Sociais... 1 Assistente Social, Especialista na Administração e Planejamento de projetos e Res- ponsabilidade Social e Sustenbalidade. Captadora de Recursos junto a Prefeitura Municipal de Novo Hamburgo. Docente do Curso de Serviço Social da Universida- de Luterana do Brasil -Ulbra. Rúbia Geane Goetz1 Capítulo 4 Capítulo 4 A Atuação Social Através de Projetos: Sociais... 53 A forma de atuação profissional do serviço social está con-dicionada a construção e execução de seu processo de trabalho. Este modo de fazer particular está alicerçado nas competências teórico-metodológicas, ético-políticas e técnico- -operativas. Neste capítulo trataremos especialmente da atuação social por meio de projetos,os quais viabilizam a conjugação entre a racionalidade e o foco nos resultados fomentando processos de- mocráticos e participativos. Desse modo,, estaremos aqui falan- do sobre: projetos sociais, interventivos e projetos de pesquisa. 4.1 Gestão Os projetos estão ligados ao processo de gestão no agir pro- fissional, para tanto se faz necessário ter claro o conceito de gestão e como ela se operacionaliza no nosso processo de trabalho. Hoje muito ouvimos falar em gestão (do latim gestione – ato de gerir, gerenciar, administração) nas diferentes áreas do conhecimento, trazendo teorias da administração e do plane- jamento que nos permitem entender um pouco mais do fazer administrar algo ou algum serviço. Na nossa prática profis- sional não é diferente, também nos utilizamos da gestão para planejar, dirigir e organizar nosso agir profissional. Gestão – política de gerenciamento por meio de técnicas várias, entre elas a administração e o planejamento, com fim de controlar a relação recursos, objetivos e serviço produzido(BARBOSA, 2004). 54 Competência Técnico Operativa em Serviço Social I As demandas que se apresentam no cotidiano do assistente social exigem um conjunto de competências técnico-operati- vas, que envolvem formas de pensar e agir – nunca só o fazer! (BARBOSA, 2004). A instrumentalidade do Serviço Social, en- tão, se associa às dimensões teórico-metodológica e ético-po- lítica, como evidenciam as discussões e o projeto final da re- visão curricular da ABEPSS. Para isso, o planejamento integra a instrumentalidade do Serviço Social desde os primórdios da profissão, realiza-se a partir de um processo de aproximações da situação apresentada, das demandas e do desvelamento do objeto de intervenção. Baptista, salienta: O desencadeamento desse processo particular de plane- jamento se faz a partir do reconhecimento da necessidade de uma ação sistemática perante questões ligadas a pressões ou estímulos determinados por situações que, em um momento histórico, colocam desafios por respostasmais complexas do que aquelas construídas no imediato da prática. (2000, p. 27) Esse processo realizado na nossa prática profissional é continuo e dinâmico e leva ao movimento de REFLEXÃO – DECISÃO – AÇÃO –REFLEXÃO. A cada situação apresentada esse movimento é reconstituído para que possamos captar a realidade que se apresenta cada dia no nosso cotidiano pro- fissional. Sendo assim, é importante estarmos constantemente atentos para a construção e reconstrução de nosso objeto de intervenção. Portanto, a prática profissional é apenas um dos elementos constitutivos do processo de trabalho, sendo necessário tam- bém haver a matéria-prima/ objeto e os instrumentais sobre Capítulo 4 A Atuação Social Através de Projetos: Sociais... 55 os quais irão incidir a ação transformadora pelo assistente social. Assim, neste processo é importante o reconhecimen- to das dimensões do agir profissional – teórico-metodológica, técnico-operativa, ético-política. Assim, é importante que o profissional conheça a realidade na qual irá intervir, aliando o processo de conhecimento e a relação teórica, como argu- menta Iamamoto: Um dos maiores desafios que o Assistente Social vive no presente é desenvolver sua capacidade de decifrar a rea- lidade e construir propostas de trabalho criativas e capa- zes de preservar e efetivar direitos, a partir de demandas emergentes no cotidiano. Enfim, ser um profissional pro- positivo e não só executivo (2008, p. 20). Dessa forma, as ações dos profissionais devem estar alicer- çadas em uma boa leitura da realidade, aliada a criatividade e a postura propositiva, para que possam fomentar o acesso a direitos sociais, exercício pleno da cidadania, promovendo espaços de participação, informação e empoderamento dos sujeitos, os quais podem ser consolidados por meio de pro- jetos e ações que garantam o alcance de resultados exitosos. 4.2 Elaboração de projetos sociais e projetos de intervenção. Um projeto social esta atrelado a uma ideia e ou necessidade social, que demanda a construção de ações que viabilizem a transformação de uma determinada realidade. Para Armani, 56 Competência Técnico Operativa em Serviço Social I “os projetos ainda são a melhor solução para organizar ações sociais, pois estas capturam a realidade complexa em peque- nas partes, tornando-as mais compreensíveis, planejáveis, ma- nejáveis”((2008, p. 18). O projeto de intervenção, por sua vez, é o planejamento e a sistematização da ação do profissional, aqui especialmente do assistente social. Ou seja, todo projeto social que contem- pla a ação do serviço social, demanda ao profissional também a elaboração do projeto de intervenção, onde será destacada, planejada e organizada o seu fazer profissional. Para que pos- samos compreender melhor estas diferenças, destacaremos a partir daqui detalhamentos de cada metodologia. Antes, porém, é importantes destacar algumas questões que devem ser respondidas tanto nos projetos sociais, como nos projetos de intervenção: •O QUÊ – título, apresentação (Título do Projeto, nome da Institui- ção, nome do Proponente, duração Prevista) • POR QUE – justificativa. • PARA QUÊ – objetivos. • COMO – metodologia. • QUANDO – cronograma. Avaliação. Resultados esperados. Referências Bibliográficas Alguns elementos importantes carecem ser observados an- tes da elaboração dos projetos sociais e de intervenção: Capítulo 4 A Atuação Social Através de Projetos: Sociais... 57 58 Competência Técnico Operativa em Serviço Social I Objetivos do projeto social: Objetivos do projeto de intervenção: Capítulo 4 A Atuação Social Através de Projetos: Sociais... 59 Metodologia do projeto social: Metodologia do projeto de intervenção: 60 Competência Técnico Operativa em Serviço Social I Perceba que a ênfase no projeto de intervenção será sem- pre a atuação do serviço social descrevendo sua atuação e apresentando seu processo de trabalho de forma detalhada, enquanto que no projeto social, sua atuação se destaca de forma mais ampla. Ambos os projetos devem ainda destacar os recursos en- volvidos em sua execução, os mesmos são divididos em: RE- CURSOS HUMANOS, RECURSOS MATERIAIS e RECURSOS FINANCEIROS. Seguem alguns exemplos de como estes ele- mentos podem ser apresentados. Capítulo 4 A Atuação Social Através de Projetos: Sociais... 61 O Cronograma ou calendário de atividades, como tam- bém pode ser denominado, também um elemento importante a ser apresentado na apresentação dos projetos sociais ou de intervenção. Nele devem sem descritas as atividades que serão realizadas ao longo do projeto e o período em que as mes- mas ocorrerão. O detalhamento pode ser semanal ou mensal. Com base na construção do projeto realizado anteriormente, segue exemplo. 62 Competência Técnico Operativa em Serviço Social I Os projetos devem ainda destacar de forma clara e obje- tiva, quais as metas visam atingir, ou seja, que resultados as ações estão buscando. As metas ou resultados devem estar relacionados diretamente aos objetivos propostos. Capítulo 4 A Atuação Social Através de Projetos: Sociais... 63 Outro item de suma importância a ser apresentado é a avaliação, pois é neste tópico, que serão apresentados os meios como as ações serão verificadas e quais os indicadores serão utilizados neste processo. Normalmente a avaliação é centrada nas seguintes questões: • EFICIÊNCIA – incorre sobre a ação desenvolvida, objetivan- do reestruturá-la para melhorar o resultado imediato; • Eficácia – incorre na adequação da ação aos objetivos e metas pensados no planejamento inicial; • EFETIVIDADE – incorre sobre o impacto da ação planejada, sendo o âmbito mais amplo da avaliação. A avaliação pode ocorrer em 04 níveis: • Avaliação de gestão (avalia a forma como as decisões foram tomadas); • Avaliação de objetivos e metas (buscam verificar se os mes- mos foram atingidos); • Avaliação comparativa (contexto inicial e contexto final da prática); • Avaliação de custo benefício (no que se refere ao investimen- to e o impacto da ação). A avaliação dos projetos e ainda do produto da prática do assistente social sugere a construção de um conjunto de indi- cadores que possam dar visibilidade a seu trabalho. Como se constroem indicadores sociais? 64 Competência Técnico Operativa em Serviço Social I Segundo Armani(2001:65-66) os indicadores podem ser desdobrados em 4 tipos:  de impacto (apontam resultados em longo prazo,requerem um tempo posterior a execução do pro- jeto para ser mensurado);  de efetividade (sinalizam os efeitos que os resultados das ações causam para os beneficiários do projeto);  de desempenho (demonstram se o produto planejado foi alcançado,pode ser associado às metas);  operacionais (indicam se os recursos previstos foram disponibilizados na quantidade e tempo conforme pla- nejamento). Conforme o autor, cada indicar possuir relação direta com um elemento do projeto. Como exemplo desta relação, seguiremos utilizando o con- texto do projeto anteriormente apresentado. Capítulo 4 A Atuação Social Através de Projetos: Sociais... 65 6.3 Projetos de pesquisa Por último, mas não menos importante, abordaremos também o projeto de pesquisa, documento também utilizado pelo as- sistente social na busca e consequente produção do conheci- mento científico. “O assistente social pesquisador, que objetiva o rigor te- órico exigido pela ciência autêntica, deve perquirir ‘as intrincadas conexões do real’. Investigar e, em consequ- ência, tornar cientificamente aceito o trabalho, no âmbi- to acadêmico, é o princípio fundamental no caminho da probidade teórica do pesquisador. Ele deve levar consi- go, no percurso da pesquisa, as seguintes características: honestidade,paciência, criatividade, criticidade, audá- cia, humildade, diligência e, principalmente, a ética na 66 Competência Técnico Operativa em Serviço Social I pesquisa, para tornar-se um sujeito que indaga sobre o real, tendo por finalidade contribuir à ‘humanidade so- cial’ com suas inquietações e construções teóricas, e não apenas saciar a fome voraz de títulos exigidos pela ‘Uni- versidade Moderna!(Lara, 2007). Assim, tanto na intervenção quanto na formação profissio- nal, a pesquisa é um elemento fundamental para o Serviço Social, sendo exigência na sua realização o aprofundamento teórico-metodológico como recurso para a investigação da vida social, bem como, o compromisso do pesquisador em Serviço Social com o processo investigativo. As diretrizes curriculares do curso de Serviço Social si- tuam a profissão inserida no conjunto das relações de produção e reprodução da vida social, sendo de cará- ter interventiva e que atua no âmbito da questão social. Essa aproximação da profissão com a realidade social não é simplesmente um epifenômeno. Por tal questão, acreditamos que os objetos de estudos do Serviço Social, necessariamente, partem de uma realidade concreta que é determinada socialmente, ou seja, estabelece as suas mediações em uma sociedade que se produz e repro- duz por meio de suas contradições inconciliáveis (Lara, 2007). Portanto, cabe destacar que o projeto de pesquisa dife- rencia-se dos projetos de intervenção e social, uma vez que este tem como função principal a produção de conhecimento de uma determinada realidade e ou fenômeno social e não a ação (intervenção) propriamente dita. É real e direta a relação Capítulo 4 A Atuação Social Através de Projetos: Sociais... 67 entre os resultados das pesquisas científicas e a elaboração de projetos de intervenção, uma vez que, em muitos casos são as pesquisas que “trazem a tona” demandas de atendimento para o serviço social. Referência comentada BAPTISTA, M. V. Planejamento Social: intencionalidade e instru- mentação. 2. ed. São Paulo: Veras, 2000. Myriam Veras Baptista, nesta obra, aborda o planejamen- to como processo técnico-político, mostrando seus elementos constitutivos desde a construção do objeto, estudo de situa- ções, passando pela identificação de prioridades, identifi- cação de objetivos, entre outros. Assim, apresenta ao leitor conteúdos importantes para analisar a trajetória e tomada de decisões que subsidiarão uma prática consistente. Referências ARMANI,Domingos.Como elaborar projetos?:guia prático para elaboração e gestão de projetos sociais. Porto Alegre:Tomo Editorial,2004.96p.-(Coleção Amencar) BAPTISTA, M. V. Planejamento Social: intencionalidade e instru- mentação. 2. ed. São Paulo: Veras, 2000. BARBOSA, Rosangela Nair de Carvalho. As diretrizes curricula- res e a temática da gestão (administração e planejamento) na formação profissional do assistente social. TEMPORALIS, Porto Alegre, n.8,ano IV, jul–dez 2004. 68 Competência Técnico Operativa em Serviço Social I CARDOSO, A L. Indicadores sociais e políticas públicas: algu- mas notas críticas. Proposta, Rio de Janeiro, n. 77, p. 42- 53, jun-ago 1998. CÉSAR, Monica de Jesus. Serviço Social e reestruturação industrial:requisições, competências e condições de traba- lho profissional. In:MOTA, Ana Elizabete (org.) A nova fábri- ca de consensos. São Paulo:Cortez, 1998. GENTILLI, Raquel de Matos Lopes. Representações e práticas:identidade e processo de trabalho no serviço so- cial. 2. ed. Revista.São Paulo: Veras, 2006. GOMES, Kelines.Competência técnico-operativa em serviço social / Kelines Gomes, Simone da Fonseca Sanghi, Maria Suzete Muller Lopes. – Canoas: Ed.ULBRA, 2010. 128p. IAMAMOTO, M. V. O serviço social na contemporaneidade: trabalho e formação profissional. 2. ed. São Paulo: Cortez, 1999. JANNUZZI, Paulo de Martino. Indicadores sociais no Brasil: conceitos,fontes de dados e aplicações. Campinas: Alínea, 2001. LARA, Ricardo.Pesquisa e Serviço Social: da concepção bur- guesa de ciências sociais à perspectiva ontológica. Rev. Katálysis vol.10 no.spe Florianópolis 2007.Disponível em: http://www.scielo.br.Acesso em 09 de maio de 2014. MACIEL,Ana Lúcia Suárez. A questão da avaliação na práti- ca do Serviço Social.Material elaborado para fins didáticos Capítulo 4 A Atuação Social Através de Projetos: Sociais... 69 exclusivos para uso interno no Curso de Serviço Social da Ulbra. _______,Curso sobre Elaboração de Projetos Sociais,Canoas:2001. Material elaborado para fins didáti- cos exclusivos para uso interno no Curso de Serviço Social da Ulbra. MARTINELLI, Maria Lúcia; ON, Maria Lúcia Rodrigues, MUCHAIL,Salma Tannus (org.). O uno e o múltiplo nas re- lações entre as áreas do saber. 2. ed. São Paulo: Cortez, 1998. RAICHELIS, R. e RICO, E. de M (Orgs.). Gestão social: uma questão em debate. São Paulo: EDUC, 1999. SILVEIRA, Sandra. Administração e planejamento em servi- ço social II. Cadernos Universitários, n 135. Canoas: Ul- bra,2003. Observação no Trabalho Profissional em Serviço Social Capítulo 5 Arno Vorpagel Scheunemann Capítulo 5 Observação no Trabalho Profissional em Serviço Social 71 Introdução. O objeto deste capítulo é a observação profissional no Servi- ço Social. Na primeira parte, pensaremos a respeito de seus fundamentos. Na segunda, apresentaremos uma tipologia de observações. Na terceira, traremos subsídios para o planeja- mento, a execução e relatório da observação. 1 Pensando os Fundamentos da Observação 1.1 Fundamentos etimológicos Observar vem do latim observare, composto por “ob” = so- bre, + servare = guardar, vigiar, zelar, servir. Assim, observar compreende vigiar com atenção sobre alguém ou algo, espiar, “ficar de olho” como um servo para lhe ser fiel. Na língua alemã, observação é “Beobachtung”, composta por “Be”, “ob”, “achtung”. “Achtung” significa atenção, res- peito, estima. O verbo “achten” significa respeitar, estimar. Em formas compostas como “achten auf”, significa prestar atenção, vigiar, reparar em. “Beachten”, por sua vez significa obedecer, respeitar, observar, seguir, ater-se a, levar em conta. “Beobachter” significa observador, vigia, cuidador, zelador. “Be” tem o sentido de trazer para perto de si, trazer para ao redor de si, encontrar-se com algo. Vejamos isso na palavra “betreffen”. “Treffen” significa acertar (o alvo). “Betreffen” sig- nifica “encontrar”. Claro que, dependendo do contexto, tem outro significado. “Be” também tem o sentido de intensidade, 72 Competência Técnico Operativa em Serviço Social I de exagero. Por exemplo, na frase “Schmier Dir die Hände an”, “schmier” significa lubrificar. Traduzindo a frase temos “Lubri- fica tuas mãos”. Lubrificar no sentido de passar um creme ou óleo. Se substituirmos o “an” final, acrescentando um “be” a frase fica “Beschmier Dir die Hände”. A frase passa a significar “Lambuza tuas mãos”. Lambuzar tem o sentido de exagerar, de exceder-se naquilo que faz ou desfruta. Este sentido, o “be” de “beobachten” expressa que a atenção é “exagerada” (mui- to além de um simples olhar ou reparar). Assim como uma mão lambuzada não deixa dúvidas de que ela foi lubrificada, a ação de “beobachten” (observar) não deixa dúvidas de ob- servação foi completa, em todos os detalhes. Poderíamos dizer que o(a) observador(a) se lambuzou com o que foi observado. Quem vê o(a) observador(a) não em dúvidas de que ele(a) está observando. Por sua vez, “ob” significa “se”. Este “se” pode ser de con- dicionalidade, tipo, “se você fizer isso...”, ou, de dúvida, tipo, “se é que é verdade que isso realmente aconteceu”. Ao mesmo tempo, pode ser de imposição, tipo “se querem ou não, será feito”. Por outro lado, “ob” no meio de uma palavra (como é o caso de “beobachten”)
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