Buscar

MONOGRAFIA

Prévia do material em texto

UNIVERSIDADE FEDERAL DO MARANHÃO - UFMA 
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS - CCH 
DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA – DEHIS 
 
 
 
 
 
FÁBIO DE MELO DA SILVA 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
O ESTADO ABSOLUTISTA E LUÍS XIV NOS LIVROS DIDÁTICOS DE HISTÓRIA: 
Uma análise dos livros didáticos utilizados entre 2012 e 2018 nas turmas do 1º ano do Ensino 
Médio do COLUN, em São Luís (MA) 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
SÃO LUÍS 
2018 
FÁBIO DE MELO DA SILVA 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
O ESTADO ABSOLUTISTA E LUÍS XIV NOS LIVROS DIDÁTICOS DE HISTÓRIA: 
Uma análise dos livros didáticos utilizados entre 2012 e 2018 nas turmas do 1º ano do Ensino 
Médio do COLUN, em São Luís (MA) 
 
 
Monografia apresentada ao Curso de História da 
Universidade Federal do Maranhão como pré-
requisito para obtenção do grau de Licenciatura 
em História. 
 
Orientadora: Profa. Dra. Maria Izabel Barboza de 
Morais Oliveira. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
SÃO LUÍS 
2018 
 
 
 
 
 
FÁBIO DE MELO DA SILVA 
 
 
 
 
 
 
 
O ESTADO ABSOLUTISTA E LUÍS XIV NOS LIVROS DIDÁTICOS DE HISTÓRIA: 
Uma análise dos livros didáticos utilizados entre 2012 e 2018 nas turmas do 1º ano do Ensino 
Médio do COLUN, em São Luís (MA) 
 
Monografia apresentada ao Curso de História da 
Universidade Federal do Maranhão como pré-
requisito para obtenção do grau de Licenciatura 
em História. 
 
Orientadora: Profa. Dra. Maria Izabel Barboza de 
Morais Oliveira. 
 
 
 
 
Aprovada em _____/_____/2018 
 
 
 
 
 
 
BANCA EXAMINADORA 
 
 
 
_________________________________________________________ 
Profa. Dra. Maria Izabel Barboza de Morais Oliveira – DEHIS/UFMA 
(Orientadora) 
 
 
___________________________________________ 
Prof. Dr. Alírio Cardoso – DEHIS/UFMA 
 
 
_____________________________________________ 
Prof. Ms. Nivaldo Germano dos Santos – DEHIS/UFMA 
 
 
 
AGRADECIMENTOS 
 
 
Há tantas pessoas e instituições a agradecer que espero não cometer nenhuma injustiça. 
Em primeiro lugar, agradeço a Deus Pai, Filho e Espírito Santo por me guiar até aqui 
de forma poderosa, livrando-me de situações que poderiam ter interrompido minha vida. 
Agradeço a minha família pelo cuidado, amor e confiança que investiram em mim; em especial, 
meu pai, Pedro Francisco da Silva, por me colocar no mundo e ter sido meu herói na tenra 
idade; aos meus irmãos, Fernando, Fernanda, Franklin, Pâmela, Luana, Laina e Edvys pelo 
amor, amizade, companheirismo e respeito que, na maioria das vezes, sintetizou nossa 
convivência; a meu tio Alex, já falecido, que foi um segundo pai para mim, pois nos momentos 
de enfermidade e necessidades esteve sempre ao nosso lado. Sua ausência é motivo de lágrimas. 
Agradeço ao meu avô materno, Joarês Enedino de Melo, pelo incentivo e valor que sempre me 
deu e à Sr.ª Ivanilde, por abrigar a mim e ao meu irmão no momento mais crítico de nossas 
vidas. Agradeço muito mais a minha mãe, Eunice Oliveira de Melo, por ser meu alicerce de 
vida; sem ela e Deus, nada do que sou existiria. Mesmo com todas as dificuldades que 
passamos, ela sempre nos ensinou a ver na educação a oportunidade de crescimento e a chave 
para superação da pobreza material e intelectual. 
É preciso também deixar o meu muito obrigado aos meus professores e colegas de 
classe do Ensino Básico, bem como as instituições de ensino que cuidaram da minha formação. 
Agradeço a escola José Burnet, escola onde iniciei e concluí o Ensino Fundamental menor. À 
Lídia Pereira Alves (tia Lídia), minha professora do primário, pelo carinho, cuidado e confiança 
que sempre colocou em mim e por me acudir em tantas necessidades; à professora Hosana, pelo 
conhecimento que me proporcionou e pelo amor, carinho e rigor com que me tratou. Agradeço 
aos meus amigos, Cleiton Costa e Claudjany Costa pelos momentos agradáveis que vivemos 
no José Burnet. 
 Agradeço também à escola Germano Batista, na qual tive uma breve passagem, 
cursando a 5ª série do Ensino Fundamental. Agradeço à escola Tarquínio Lopes Filho, onde 
pude concluir o Ensino Fundamental e Médio. Nesta Instituição preciso agradecer aos meus 
amigos Deyvisson Felipe, Eliel Botão, Joina Cintia, e Rayssa Costa, pela parceria, amizade e 
respeito. A Jefferson Botão, meu amigo, irmão e professor, pela amizade sólida que temos há 
anos. Agradeço também à professora Iran, Célia, Edileusa, Concita, Jorge e, em especial, a 
professora Maria José, minha professora de História da 5ª série do Ensino Fundamental. Certa 
vez, quando apresentava um trabalho de História em sua aula, ela disse que eu seria professor 
de História. Considero estas palavras como profecia. 
Quero agradecer também ao Instituto Federal do Maranhão – IFMA- Campus Monte 
Castelo, onde pude cursar o técnico em Metalurgia e Materiais, curso que não concluí por 
entender que não era o caminho profissional que desejava para a vida. Todavia, foi lá que pude 
conhecer amigos maravilhosos que faziam valer à pena, acordar às quatro da manhã para 
enfrentar aquelas salas congelantes e aquelas aulas nada empolgantes - para quem não tinha 
vocação para aulas de Química, Física e Matemática. Entre eles, Lisiane Fernanda, pela 
amizade e confiança. 
Agradeço também à Universidade Federal do Maranhão, por me capacitar e me dar a 
oportunidade de graduar em Licenciatura em História. À CAPES e ao Programa de Bolsas 
Institucional de Iniciação à Docência (PIBID), por ter “financiado” meus livros, xérox e a 
passagem paga nos coletivos. Embora a UFMA seja pública, os cursos de graduação geram 
gastos que, para alguém sem lastro financeiro como eu, atrapalham a continuidade no curso. 
Agradeço também aos professores da graduação, em especial, a Maria Izabel, que 
acompanhou praticamente todo meu percurso no curso de História, pois foi professora da 
disciplina de Moderna II, coordenadora do PIBID, Coordenadora de curso e, por último, se 
tornou minha orientadora. A Raimundo Inácio, professor de História do COLUN, 
importantíssimo na hora de escolher os livros didáticos para esta pesquisa. À professora Regina 
Helena pelo rigor e simpatia com que sempre me tratou. A ela também agradeço pelas aulas 
sempre frutíferas, indicações de leituras e pelo incentivo durante a produção do Projeto de 
Pesquisa, atividade avaliativa e determinante para obter a aprovação na disciplina de Métodos 
I, e no qual tive muita dificuldade em realizar. Agraço aos professores Marcelo Araújo, Glória 
e Lindalva M. Maciel, Josenildo, Marcos Baccega, Alírio Cardoso e João Batista Bittencourt, 
pelas excelentes aulas. Não poderia deixar de agradecer, também, ao professor Flávio Soares, 
pelas melhores aulas que já tive na vida. Ele foi determinante para que eu tivesse a certeza de 
que era essa minha vocação. 
Por fim, e não menos importante, quero deixar meu obrigado à Turma de História 
2012.1, em especial a Paula Raposo, Priscila Aguiar, Edson Luciano, Carlos Magno, Marcelo 
Ribeiro, Evandro Jr., Rodrigo Cutrim pela amizade, parceria e pelos momentos maravilhosos 
que vivemos na graduação. À Hemelita, Harrisson Douglas, Luís Lima, Antoniano, Ruanita e 
Everaldo pela bela amizade que construímos e, finalmente, a minha amiga, namorada e 
companheira de estudos, Sâmia Cristina, que nos últimos anos foi meu aconchego e porto 
seguro. A ela todo meu amor. 
 
 
RESUMO 
 
 
A presente pesquisa visa analisar de forma comparativa os livros didáticos utilizados entre 2012 
e 2018 nas turmas do 1º ano do Ensino Médio do Colégio Universitário – COLUN – localizado 
na Universidade Federal do Maranhão – Campus Bacanga, São Luís – MA. Objetivamos por 
meio da análise compreender de que forma estes manuais escolares abordam o conteúdo 
referende ao Estado Absolutista e Luís XIV, rei francês que governou a França a partir da 
metade do século XVII até o início do século XVIII. A partir de conceitos teóricos utilizados 
por Mikhail Bakhtin para analisar o processo de interação verbal, bem como a natureza social 
dos discursos,mostraremos de que forma o livro didático enquanto instrumento de interação 
verbal se transforma em produto ideológico, uma vez que, por meio de seu conteúdo propaga 
discursos, valores, concepções e olhares, sobretudo, buscando tornar hegemônicas certas 
leituras do passado. 
 
Palavras-chave: Livros didáticos de História; Monarquias Absolutistas; Luís XIV; COLUN; 
São Luís (MA) 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
RÉSUMÉ 
 
 
La présente étude vise à analyser de manière comparative les manuels utilisés entre 2012 et 
2018 dans les classes de la première année du lycée de COLUN - situé à l'Université Fédérale 
de Maranhão - Campus Bacanga, São Luís - MA. Nous visons, au moyen de l'analyse, à 
comprendre comment ces manuels abordent les contenus se référant à l'État absolutiste et à 
Louis XIV, roi français qui a dirigé la France du milieu du XVIIe siècle jusqu'au début du 
XVIIIe siècle. À partir de concepts théoriques utilisés par Mikhail Bakhtin pour analyser le 
processus d'interaction verbale, ainsi que la nature sociale des discours, nous montrerons 
comment le livre didactique comme instrument d'interaction verbale devient un produit 
idéologique, puisque, à travers son contenu propage des discours, des valeurs, des conceptions 
et des regards, cherchant surtout à rendre hégémoniques certaines lectures du passé. 
 
Mots-clés: Manuels d'Histoire; Monarchies absolues; Louis XIV; COLUN; São Luís (MA) 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
SUMÁRIO 
 
 
Introdução................................................................................................................................09 
 
Capítulo 1: O livro didático em debate: as trajetórias de pesquisas acerca do papel do 
livro didático em sala de aula..................................................................................................14 
 
1.1 Variedade de temas e abordagens: a necessidade de novos olhares....................................16 
 
1.2 Entre vilão e mocinho: as faces ideológicas dos livros didáticos........................................22 
 
1.3 O livro didático convertido em signo ideológico: sua capacidade de distorção da 
realidade..............................................................................................................................28 
 
Capítulo 2: Formação e dinâmica dos Estados Monárquicos: reproduções e distorções nos 
manuais didáticos de História.................................................................................................34 
 
2.1 Aparatos simbólicos e negociação entre centro e localidades: novos olhares acerca do 
Estado monárquico...................................................................................................................40 
 
2.2 O Absolutismo monárquico nos livros didáticos: a construção de imagens distorcidas sobre 
o tema.......................................................................................................................................49 
 
2.3 “O Estado Sou Eu”: Luís XIV, a máxima expressão do absolutismo.................................63 
 
2.4 Os Estados Monárquicos modernos nos manuais didáticos: hegemonia de abordagem que 
legitima o Estado Liberal contemporâneo.................................................................................68 
 
Considerações finais................................................................................................................77 
 
Referências...............................................................................................................................79 
 
Anexos......................................................................................................................................82
9 
 
 
Introdução 
 
 
A elaboração dessa pesquisa se deve a problemáticas que há muito tempo envolvem 
os manuais didáticos enquanto instrumento pedagógico de transposição didática dos conteúdos 
de certas disciplinas escolares. Pesquisadores de várias áreas, inclusive do campo 
historiográfico, vêm discutindo o papel desse objeto na escola, suas funcionalidades em sala 
de aula e, no caso da História, a sua relação com o ensino de História; ou seja, analisam o livro 
didático enquanto instrumento de propagação de narrativas históricas construídas em ambientes 
acadêmicos, fruto de teorias e metodologias específicas do lugar de produção, bem como o 
resultado interativo entre esses saberes acadêmicos e os leitores que entram em contato com 
esse conhecimento por meio do livro didático. 
Vários caminhos analíticos podem ser trilhados por aqueles que têm o livro didático 
como objeto de pesquisa, como, por exemplo, as funções que o livro tem em sala de aula. 
Análises sobre a produção, circulação e consumo desse objeto também podem ser caminhos 
trilhados, principalmente por aqueles que desejam compreender a materialidade das relações 
sociais em que o livro está inserido, como Kazumi Munakata fez e sugeriu em seu artigo O 
livro didático: alguns temas de pesquisa (2013). 
Nossa pesquisa caminhará por um viés que há algum tempo já vem sendo trabalhado 
por pesquisadores da área: as abordagens que os livros didáticos fazem de certos conteúdos 
historiográficos. Nosso intuito é percebê-los enquanto produtos ideológicos capazes de tornar 
hegemônicas certas leituras históricas, fruto de olhares específicos de um evento histórico, por 
exemplo. Esses conteúdos, inclusive, podem conter distorções da realidade, produzir 
concepções estereotipadas, olhares positivos ou negativos sobre personagens, eventos e 
períodos históricos como já mostraram Renata Figueiredo Moraes (2007), Michele Borges 
Martins e Julia Silveira Matos (2013), entre outros. 
Nosso olhar se volta para a compreensão das abordagens realizadas pelos manuais 
didáticos sobre os Estados Monárquicos europeus entre os séculos XVI e XVII, vistos como 
absolutistas e Luís XIV, rei francês que governou a França entre a metade do século XVII e 
início do século XVIII. Este é considerado pela tradição historiográfica como o principal 
representante dessa estrutura política, o que nos levou a escolhê-lo para análise. 
Esta pesquisa justifica-se por contribuir no aumento de pesquisas que analisem tal 
temática específica, uma vez que apenas dois trabalhos que abordavam o Estado Absolutista 
10 
 
foram encontrados. O primeiro de autoria de Marcello José Gomes Loureiro sob o título 
Garantindo o bom governo do rei: a construção de bases teóricas e simbó1icas para uma 
governabilidade eficaz no Estado Moderno - uma proposta de oficina em sala de aula (2007), 
por meio do qual o referido autor buscou se distanciar das abordagens já bastante comuns em 
manuais didáticos que consistem em explorar o absolutismo monárquico como um mero 
instrumento de poder de certos grupos, para discutir o que justificava teoricamente o poder do 
monarca, bem como de que forma as representações em torno da figura do monarca 
influenciavam na manutenção dessa estrutura política. 
O outro trabalho encontrado, de autoria de Débora Fernandes sob o título Literacia 
histórica nos livros didáticos: culturas históricas do absolutismo (2014), buscou analisar o 
manual didático como um potencial transmissor e legitimador de certas concepções históricas, 
chamadas por ela de “Cultura histórica”, termo cunhado por John Rüsen para mostrar que “[...] 
o modo como a história inscrita nas consciências e nas vidas dos indivíduos, é inscrita segundo 
procedimentos de controle crítico1. A partir disso, Fernandes buscou perceber como o 
absolutismo monárquico, “[...] dirigido por diferentes culturas históricas, pode ser narrado de 
diferentes formas, ao mesmo tempo em que revela a literacia histórica de seus autores e 
contextos produtivos2. 
Levando em conta que o manual didático além de instrumento didático pedagógico é 
também um instrumento ideológico, umavez que transmite valores, posicionamentos políticos, 
olhares de determinados grupos, iremos analisá-lo sob a ótica bakhtiniana, pensando-o como 
um produto de consumo que toma a forma de um signo ideológico, uma vez que em sala de 
aula ele mascara sua função: de instrumento auxiliar na transposição didática de conteúdos 
historiográficos produzidos por correntes historiográficas, passa a se configurar como discurso 
oficializado da História. Nesse sentido, o livro enquanto produto ideológico é instrumento de 
interação verbal, capaz de transmitir enunciados que fazem parte de uma corrente discursiva 
maior a qual responde. Como mostra Mikhail Bakhtin: 
 
Toda inscrição prolonga aquelas que a precederam, trava uma polêmica com 
elas, conta com as suas reações ativas da compreensão, antecipa-as. Cada 
inscrição constitui uma parte inalienável da ciência ou da literatura ou da vida 
política. Uma inscrição como toda enunciação monológica, é produzida para 
ser compreendida, é orientada para uma leitura no contexto da vida científica 
 
1 MARTINS e MATOS, Ensino de história Moderna no livro didático: representações de gênero. ANPUH. XXVII 
Simpósio Nacional de História: Conhecimento histórico e diálogo social. Natal- RN, 22 a 26 de julho de 2013, 
p.04. 
2 Ibidem, p. 124-5. 
11 
 
ou da realidade literária do momento, isto é, no contexto do processo 
ideológico do qual ela é parte integrante3. 
 
Esta pesquisa não seria possível se não fosse o Programa Institucional de Iniciação à 
Docência (PIBID), do qual fui bolsista entre os anos de 2013 e 2017. Este programa me 
possibilitou, antes mesmo do estágio obrigatório, adquirir experiência em sala de aula, em 
turmas do Ensino Fundamental e Médio de escolas públicas da Grande São Luís. Por meio do 
subprojeto As novas linguagens, fontes e tecnologias para o ensino de História – projeto do 
curso de História, coordenado pela Profa. Maria Izabel Barboza de Morais Oliveira - tivemos 
a oportunidade de inserir novas ferramentas para o aprendizado e construção do conhecimento 
histórico, como, por exemplo, o uso de imagens, músicas, vídeos, poesias, textos jornalísticos, 
peças teatrais etc., na tentativa de dinamizar mais as aulas e torná-las mais prazerosas. Ao 
mesmo tempo, foi possível perceber a realidade escolar e suas problemáticas, como, por 
exemplo, o uso do livro didático como único material de apoio pedagógico durante a aula, 
situação que víamos se repetir cotidianamente nas escolas participantes do projeto, com exceção 
do COLUN. Nesta instituição, pelo menos nas aulas do professor de História, Raimundo Inácio 
– que nos supervisionava e nos inseria em sala – havia espaço para outros recursos didáticos. O 
próprio professor promovia isto, buscando levar os alunos para além do que estava nos manuais 
didáticos. Mesmo assim, era perceptível que os alunos tinham no livro didático o referencial de 
conhecimento e por onde baseavam seus discursos e suas atividades. 
 Com exceção do COLUN, em todas as outras escolas onde estivemos era visível o 
extremo protagonismo do livro didático nas aulas. Mesmo no mundo bombardeado de 
informações que chegam pela TV e pela internet e, mesmo existindo uma série de materiais que 
podem ser utilizados na sala de aula como instrumento de auxílio pedagógico, constatamos o 
protagonismo do manual didático de História nas salas de aula. Ele era a base do planejamento, 
das aulas e de todo conhecimento produzido em sala, sendo seu discurso praticamente uma 
verdade inquestionável. 
Percebendo isso, veio a inquietação de nossa parte em analisar os conteúdos desses 
manuais escolares; ver até que ponto seu uso era salutar, como também, analisar de que forma 
ele tornava hegemônica certas leituras do passado, que muitas vezes estavam estruturadas em 
estereótipos e equívocos. 
Assim, a partir da seleção de quatro obras didáticas utilizadas entre 2012 e 2018 nas 
turmas do 1º ano do Ensino Médio do Colégio Universitário, no Campus-Bacanga, na cidade 
 
3 BAKHTIN, Mikhail. Marxismo e Filosofia da Linguagem. – 12ª edição – HUCITEC, 2006, p. 99. 
12 
 
de São Luís (MA), analisaremos de forma comparativa as abordagens que tais obras fazem do 
Absolutismo Monárquico e Luís XIV, buscando perceber que imagens estes livros têm pintado 
acerca da temática, à que correntes discursivas os livros didáticos têm respondido, se essas 
correntes são hegemônicas dentro desses manuais didáticos, como essas narrativas são 
construídas e de que forma essas correntes discursivas têm forjado o tema, a partir do 
intermédio dos manuais escolares. 
No primeiro capítulo, procuramos apresentar a historicidade e trajetória de pesquisas 
que tinham o livro didático enquanto objeto de análise, bem como o contexto e as problemáticas 
dessas pesquisas, apontando para o aumento significativo delas entre as décadas de 1980, 1990 
e 2000. 
Buscamos no primeiro tópico desse capítulo mostrar que embora o número de 
pesquisas sobre o livro didático estivesse aumentado, ainda era pequena a variação temática, 
resumida à denúncia do caráter ideológico dos manuais escolares. Apresentamos, todavia, o 
surgimento de novos trabalhos, embasados em novos teóricos que foram responsáveis pela 
diversificação de novas pesquisas e novos olhares sobre o livro didático Neste tópico, 
apresentamos nossa temática, bem como outros trabalhos que caminharam pelo mesmo viés e 
no qual faríamos um diálogo. 
No segundo tópico, chamamos a atenção para as discussões a respeito da face 
ideológica dos livros didáticos, argumentando em prol da legitimidade das pesquisas que ainda 
denunciam o caráter ideológico dos manuais didáticos, defendendo nossa posição em se manter 
por este viés. No terceiro tópico, passamos a analisar a natureza do manual didático. A partir 
dos conceitos teóricos de Bakhtin sobre a natureza social do discurso e do processo de interação 
verbal, passamos a analisar o livro didático enquanto instrumento de interação discursiva, sendo 
portanto produto ideológico, já que por meio de seus enunciados propaga valores, concepções, 
visões de mundo e leituras do passado. 
No segundo capítulo, procuramos apresentar os resultados de nossa análise sobre as 
abordagens que os manuais didáticos selecionados fazem sobre o Estado Absolutista e Luís 
XIV. Introduzimos o assunto apresentando, de maneira geral, como a historiografia tradicional 
construiu seus enunciados acerca da formação e consolidação dos Estados modernos e do papel 
dos monarcas nesse sistema político. 
Em contramão ao que é defendido pela historiografia tradicional, no primeiro tópico 
apresentamos novas pesquisas sobre o assunto, mostrando as revisões que as novas correntes 
de análises fizeram sobre o tema, bem como as críticas e refutações das teses tradicionais que 
se cristalizaram dentro da historiografia. No segundo e terceiro tópicos fizemos uma descrição 
13 
 
do conteúdo dos manuais didáticos acerca dos Estados Monárquicos modernos e de Luís XIV, 
mostrando como os livros didáticos têm se posicionado em meio a estas correntes discursivas 
e constatando a influência hegemônica da historiografia tradicional nos enunciados dos manuais 
didáticos. 
O último tópico visa mostrar como a reprodução hegemônica das teses tradicionais 
sobre o Estado Moderno tem um papel ideológico claro, denunciando o caráter nada inocente 
desses manuais escolares e de seus enunciados. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
14 
 
CAPÍTULO 1: O livro didático em debate: as trajetórias de pesquisas acerca do papel do 
livro didático em sala de aula 
 
Esta pesquisa é fruto de curiosidades que há tempo vêm incomodando pesquisadores 
que estudam os manuais didáticos: o papel do livro didático na escola, sua importância na sala 
de aula e sua relação com o ensinode História. 
A “natureza”, os conteúdos, as abordagens, usos e funções dos manuais didáticos, sua 
relação com políticas educacionais e com o mercado de produção e consumo vêm sendo 
analisados com afinco por vários estudiosos de vários campos educacionais, incluindo a 
historiografia. O objetivo dessas análises é, entre outras coisas, entender qual a importância 
desse objeto para a educação escolar, quais fenômenos ele tem desencadeado e quais os 
resultados disso para a formação dos estudantes e professores que entram em contato com este 
material. 
Essas preocupações com o livro didático foram evidenciadas por autores como Kazumi 
Munakata, Júlia Silveira Matos, Circe Maria Fernandes Bittencourt, entre outros. Bittencourt, 
por exemplo, em seu artigo Produção didática de história: trajetórias de pesquisas (2011), 
mostra as pesquisas acerca do conteúdo do livro didático de História, tanto no âmbito 
internacional quanto no âmbito nacional, por instituições e por pesquisadores. Neste artigo, a 
autora relata que instituições internacionais passaram a se preocupar com os conteúdos dos 
manuais de História a partir do término da Segunda Guerra Mundial. Instituições internacionais, 
como a UNESCO, empenhavam-se com o objetivo de “[...] favorecer mudanças nas produções 
escolares de diferentes países, sobretudo daqueles que haviam participado do conflito 
internacional”4. A pretensão dessas instituições, segundo a autora, era 
 
[...] auxiliar nas transformações das relações internacionais fundamentadas, 
até então, na concepção da guerra como motor da história, para uma tendência 
de promoção de paz, incentivando, nesta perspectiva, a divulgação de 
exemplos históricos de soluções dos conflitos por meio de acordos e 
negociações5. 
 
Para alcançar esses objetivos, essas instituições passaram a divulgar estudos críticos 
acerca dos conteúdos escolares nos quais, segundo a autora, “[...] eram visíveis preconceitos, 
 
4 BITTENCOURT, Maria Circe. Produção didática de história: trajetórias de pesquisas. Revista de História, São 
Paulo, n.164, jan/jun. 2011, p. 489. 
5 Ibidem, p. 489. 
15 
 
visões estereotipadas de grupos e populações”6. Os estudos, segundo ela, procuravam evitar 
que os manuais didáticos e seus conteúdos despertassem a hostilidade entre os povos7. 
O interesse pelo livro didático como objeto de pesquisa por parte de universidades e 
especialistas se darão por volta das décadas de 1970 e 1980. A partir das décadas seguintes, as 
análises sofrerão com mudanças de enfoque, o que possibilitará “[...] perceber divergências 
entre os pesquisadores quanto a responsabilidade em relação ao sucesso ou fracasso escolar”8, 
como mostrou Bittencourt. 
 No Brasil houve um crescimento nas pesquisas acadêmicas sobre o livro didático em 
programas de pós-graduação na década de 1980. Esses programas produziam diversas análises 
desse material em diversas áreas e disciplinas. A autora supracitada destaca um catálogo 
analítico publicado pela Unicamp, intitulado O que sabemos sobre o livro didático, que trouxe 
referências acerca de teses e dissertações que abordavam o assunto, além de indicações sobre 
trabalhos publicados à época. Bittencourt afirmou que nesse catálogo estavam “[...] as primeiras 
referências de um conjunto de pesquisas sobre os livros didáticos de história (LDH), assim 
como as publicações e indicações das participações em eventos”9. 
Munakata também mostrou esse crescimento nas pesquisas relacionadas ao livro 
didático na década de 1990. De acordo com ele, após a defesa da tese de Bittencourt, em 1993, 
houve um aumento expressivo dos trabalhos sobre o tema, como mostra os dados levantados 
pelo autor: 
 
Daquela época em diante, porém, o número das pesquisas sobre essa 
modalidade de material escolar não tem parado de crescer: 22 títulos em 1993 
e 1995; 29 em 1996; 26 em 1997; 63 em 1998; 79 em 1999; e 46 em 2000. O 
expressivo número referente a 1999 pode ser atribuído à realização, naquele 
ano, na Universidade do Minho (Portugal), do I Encontro Internacional sobre 
Manuais Escolares [...]10. 
 
Munakata atribui esse aumento à organização de eventos específicos sobre o tema, às 
sessões sobre o tema em grandes eventos de outras áreas e, também, a “Centros, núcleos e 
projetos de pesquisa sobre o tema [que] também foram se constituindo nos programas de pós- 
graduação das diferentes áreas (educação, letras, história, matemática, etc.)”11. Para o autor, 
 
6 BITTENCOURT, 2011, op. Cit., p.489. 
7 Ibidem, p. 489. 
8 Ibidem, p. 489-490. 
9 Ibidem, p. 490. 
10 MUNAKATA, Kazumi. O livro didático: alguns temas de pesquisas. Rev. bras. hist. educ., Campinas-SP, v. 
12, n. 3 (30), p. 179-197, set./dez. 2012, p. 181. 
11 Ibidem, p. 181. 
16 
 
isso resultou em um aumento significativo no número de trabalhos produzidos nos anos 
seguintes, principalmente no início do terceiro milênio: “o resultado disso é a surpreendente 
cifra de cerca de 800 trabalhos sobre o livro didático produzidos de 2001 a 2011”12. 
O aumento na produção de trabalhos sobre o livro didático entre a última década do 
século XX e início do século XXI também é evidenciado por Bittencourt, que também expõem 
motivos semelhantes aos que Munakata enumerou: 
 
O crescimento de pesquisas sobre o livro didático de História acentuou-se na 
última década, considerando-se dois aspectos. Um deles está associado à 
atuação de grupos organizados em projetos financiados, como o caso do 
Projeto Livres com participantes de várias instituições (USP, PUCSP, 
UFMG/Ceale, PUCMG, UFF, UFPB, Nudom do Colégio Pedro II) cabendo 
destacar, neste caso, que as pesquisas incluem a produção didática de outras 
disciplinas e o Projeto Culturas políticas e usos do passado - Memória, 
historiografia e ensino de História, do qual fazem parte grupos de diversas 
universidades do Rio de Janeiro que, dentre outros objetivos, têm promovido 
encontros e seminários com importantes contribuições sobre o atual estágio 
das investigações sobre o LDH. O levantamento das publicações mostra que 
parte significativa delas resulta de projetos, como o livro A escrita da história 
escolar - memória e historiografia cujos artigos são provenientes de 
seminários organizados no âmbito do referido Projeto Culturas políticas e usos 
do passado - Memória, historiografia e ensino de História, sediado no Rio de 
Janeiro. Um outro aspecto a ser considerado quanto ao crescimento das 
pesquisas pode ser explicado pela disseminação de cursos de pós-graduação 
em várias instituições do país, incluindo as particulares; percebe-se que, em 
tais instituições, o LDH torna-se objeto de estudos sob diversas perspectivas 
e abordagens13. 
 
Assim, notamos que da década de 1980 em diante as produções que tinham o livro 
didático de História como objeto de pesquisa passaram por um aumento expressivo, o que não 
significava, todavia, que houvesse uma variedade significativa de temas e abordagens. Essa 
variedade, como veremos, se dará apenas na passagem do século XX para o XXI. 
 
1.1 Variedade de temas e abordagens: a necessidade de novos olhares 
 
Mesmo com o crescimento de trabalhos que se voltavam para analisar os manuais 
didáticos ainda eram poucas as publicações e a variação temática desses trabalhos entre as 
décadas de 1970, 1980 e 1990. De acordo com Kazumi Munakata, até 1993, período em que 
Circe Bittencourt defendeu sua tese sobre o livro didático, Livro didático e conhecimento 
 
12 MUNAKATA, 2012, op. cit., p. 181. 
13 BITTENCOURT, 2011, op. cit., p. 494. 
17 
 
histórico: uma história do saber escolar, as publicações que analisavam esse material não 
ultrapassavam cinco dezenas e pequena também era a variedade de abordagens: “[...] os 
trabalhos acadêmicos brasileiros sobre o tema, publicados nos anos 1970e 1980, não passavam 
de quase 50 títulos. Destes, uma parcela significativa destinava-se a condenar a ideologia 
(burguesa) subjacente aos livros utilizados na escola [...]”14. 
Essa pouca variedade nas abordagens é percebida também por Bittencourt. A autora 
afirma que, entre as décadas de 1980 e 1990, as pesquisas objetivam denunciar o caráter 
ideológico dos manuais didáticos: 
 
Em uma primeira fase das análise, a tendência dos estudos pautava-se na 
concepção de ideologia em uma vertente que possibilitava a identificação de 
uma falsa ideologia – a burguesa – que se impunha nos meios de comunicação, 
das formas mais variadas, dentre eles a produção didática15. 
 
A pesquisadora também chama atenção a estudos em outras áreas da educação com 
tendências semelhantes e inspiradas em Althusser e Establet, que dissertavam sobre o papel da 
escola no mundo capitalista. A esse respeito, Bittencourt mostra o contexto e as discussões que 
estavam em voga e que influenciaram essas tendências: 
 
Muitos dos que se dedicavam análises sobre materiais didáticos estavam 
preocupados com as reformas curriculares que se iniciavam junto às lutas no 
processo de democratização do país. [...] foram promovidos debates na 
academia e em associações docentes sobre as disciplinas escolares criadas a 
partir da Lei nº 5.692/1971 exigindo-se a exclusão delas na renovação das 
propostas curriculares iniciadas em meados dos anos de 198016. 
 
Bittencourt diz que muitas das pesquisas desse contexto colocavam no centro as 
denúncias do perfil ideológico dos conteúdos das disciplinas escolares, apontando nos livros 
didáticos: 
 
[...] uma conformação de valores desejáveis por setores do poder instalados 
nos aparelhos de Estado, como o caso das disciplinas Estudos Sociais, 
Educação Moral e Cívica e Organização Social e Política do Brasil (OSPB) 
que concorriam e, por vezes, substituíam o ensino de História17. 
 
 
14 MUNAKATA, 2012, op. cit., p. 181. 
15 BITTENCOURT, 2011, op. cit., p. 495. 
16 Ibidem, p. 495-6. 
17 Ibidem, p. 496. 
18 
 
A autora apontou que as preocupações e indagações que giravam em torno do livro 
didático também se baseavam nas concepções formuladas pelo historiador francês Marc Ferro, 
que, a partir de sua obra Commenton reconte L’histoireaux enfants à traversle monde entier 
(1981), traduzida para o português em 1983 com o título Manipulação da história no ensino e 
nos meios de comunicação, “[...] apresenta um panorama amplo da difusão de uma memória 
histórica manipulada por setores do poder estatal por intermédio, sobretudo, dos livros 
escolares”18. 
Em relação à questão da variedade de temas e abordagens sobre o livro didático, 
Munakata lembra que o trabalho de Bittencourt, publicado em 1993, representou não só o 
primeiro impulso da grande produção que se seguiria, como também apresentou uma variedade 
de temas e abordagens que estavam além das denúncias ideológicas; ou seja, tal trabalho 
representou uma renovação temática sobre o objeto de análise supracitado19. O autor, inclusive, 
indica em que referenciais se baseou essa renovação: 
 
[...] essa renovação temática tinha como referência autores como Chervel, 
Goodson (1995), Choppin e Chartier, que efetivaram, desde os anos 1970, 
discussões sobre o currículo, as disciplinas escolares, a cultura escolar, a 
história cultural e a história do livro e da leitura20. 
 
 Munakata apontou que, a partir das concepções de Roger Chartier passou-se a recusar 
“um certo idealismo ingênuo que abordava o livro (didático) como um simples conjunto de 
ideias e valores que deveriam ser condenados (ou aprovados) segundo uma certa ortodoxia”21. 
 Os temas ligados à análise do livro didático podem gerar vários objetos de pesquisa. 
Desde as funções que o livro exerce na escola até aquelas ligadas “a cada momento do ciclo da 
produção, circulação, distribuição e consumo do livro didático, sempre levando em conta as 
especificidades que marcam essa mercadoria”22, como apontou Munakata, pode ser utilizado 
como objeto analítico. 
Em seu artigo, O livro didático: alguns temas de pesquisas (2012), Munakata apontou 
vários trabalhos que tinham como objeto de pesquisa as etapas do ciclo citado acima e ainda 
trabalhos que que analisaram um determinado conteúdo como, por exemplo, o trabalho de 
 
18 BITTENCOURT, 2011, op. cit., p. 497. 
19 MUNAKATA, 2012, op. cit., p. 183. 
20 Ibidem, p. 183. 
21 Ibidem, p. 183. 
22 Ibidem, p. 186. 
19 
 
Natalia Moura Leonardo (2010), que mostrou que não eram homogêneas “[...] as abordagens 
que os livros didáticos de história faziam sobre o regime militar, durante a sua vigência”23. 
Atualmente se tem produzido muitos trabalhos que têm por intenção analisar um 
determinado conteúdo que é abordado pelos manuais didáticos. Uma parcela desses trabalhos 
procurou analisar os manuais didáticos como responsáveis pela construção das imagens que 
construímos sobre o passado e o presente, sobre nossa história e as de outros povos. É o que 
vem se chamando de “Cultura histórica”, conceito utilizado pelo historiador alemão John 
Rüsen, que objetivou compreender “[...] o modo como a história inscrita nas consciências e nas 
vidas dos indivíduos, é inscrita segundo procedimentos de controle crítico24. 
Nestes trabalhos, seus autores tentaram compreender como o conhecimento produzido 
pela historiografia acadêmica, fruto de práticas sistêmicas, como mostram Matos e Martins, 
geram imagens do passado em formas de culturas históricas, nada mais sendo que construções 
de sensu comum sobre a história aprendida nos bancos escolares25. Essas imagens, inclusive, 
poderiam criar significado carregado de juízos de valores, por serem capazes de construir 
concepções positivas ou negativas sobre épocas, acontecimentos ou pessoas. 
Exemplos de trabalhos que caminham por esse viés podem ser alguns artigos 
produzidos por Matos e Martins (2013), Matos e Karolina Pereira Dias da Costa (2013) e Matos 
e Débora Fernandes (2014). Em Culturas históricas nos livros didáticos: as diferentes 
abordagens historiográficas do renascimento nos anos de 1970-80, Costa e Matos propuseram-
se a olhar como o Renascimento foi representado por livros didáticos de matrizes teóricas 
diferentes com o objetivo de “[...] perceber como suas narrativas se inscrevem em uma cultura 
histórica presente nos dias atuais”26. As autoras mostram que “[...] na produção de livros 
didáticos, diferentes culturas históricas conduzem abordagens diversas sobre o mesmo 
conteúdo histórico”27 e que, portanto, “[...] as diferentes formas de apresentação dos conteúdos 
históricos influem diretamente no processo de ensino-aprendizagem e na constituição da 
aprendizagem histórica28. Isto se deve, segundo as autoras, ao fato de que as diferentes vertentes 
 
23 MUNAKATA, 2012, op. cit., p.191. 
24 MARTINS e MATOS, Ensino de história Moderna no livro didático: representações de gênero. ANPUH. 
XXVII Simpósio Nacional de História: Conhecimento histórico e diálogo social. Natal- RN, 22 a 26 de julho de 
2013, p.04. 
25 Ibidem, p.04. 
26 MATOS, Júlia Silveira e COSTA, Karolina Pereira Dias da. Culturas históricas nos livros didáticos: as diferentes 
abordagens historiográficas do renascimento nos anos 1970-80. Revista 7 mares, nº 3, out. 2013, p. 167. 
27 Ibidem, p. 169. 
28 Ibidem, p. 169. 
20 
 
historiográficas – estas também inseridas dentro de uma cultura histórica determinada – trazem 
explicações diferentes para um mesmo fato histórico29. 
Pelo mesmo viés caminha o artigo Ensino de História Moderna no livro didático: 
representações dos gêneros de autoria de Michele Borges Martins e Julia S. Matos, no qual as 
autoras buscam “[...] refletir sobre as formas de representação dos gêneros e estereótipos 
presentes no conteúdo referentesao período que denominamos de história moderna”30, 
presentes no livro didático do 7º ano do Projeto Araribá, coleção de 2012 organizada pela 
editora Moderna. As autoras buscam perceber como o fenômeno da cultura histórica tem 
construído narrativas que contribuem para criar imagens negativas e estereotipadas sobre o 
papel da mulher na sociedade da época trabalhada e também do presente, uma vez que, 
 
[...] o livro didático é um importante veículo portador de um sistema de 
valores, de uma ideologia, de uma cultura. Várias pesquisas demonstram 
como textos e ilustrações de obras didáticas transmitem estereótipos e valores 
dos grupos dominantes, generalizando temas, como família, criança, etnia, de 
acordo com os preconceitos da sociedade burguesa31. 
 
Citando Moraes, a preocupação das autoras com o fenômeno da cultura história é que 
este, por meios de narrativas do passado, constrói significados positivos ou negativos de 
períodos, personagens, eventos, que ao dialogar com aquilo que no imaginário social é 
considerado verossimilhante é recebido como um passado justificador do presente32. 
É, portanto, fundamental para qualquer estudo que caminhe pelo viés do fenômeno da 
cultura histórica, perceber as diferentes interpretações sobre os tempos; e, quem por quais 
meios, torna sólido determinados olhares históricos, como afirma Moraes: 
 
[...] um estudo sobre a cultura histórica deve estar atento a diferentes 
interpretações sobre o passado, o presente e o futuro, de modo a compreender 
quando, onde, quem, e através de quais instrumentos contribuiu para a 
consolidação de determinadas leituras da História33. 
 
Nosso trabalho, especificamente, busca a análise de um determinado conteúdo, 
preocupado com o fenômeno da cultura histórica. As indagações que dão sentido a este trabalho 
centram-se na forma como os livros didáticos de História dos últimos anos têm abordado o 
 
29 MATOS e COSTA, 2013, op. cit., p. 169. 
30 MARTINS e MATOS, 2013, op. cit., p. 01. 
31 BITTENCOUR, 2012, apud MARTINS e MATOS, 2013 op. cit., p. 09. 
32 MARTINS e MATOS, 2013, op. cit., p. 04. 
33 MORAES, 2007, apud MARTINS e MATOS, 2013, op. cit., p. 04. 
21 
 
absolutismo monárquico, sistema de governo que se formou a partir da consolidação dos 
Estados Modernos, e Luís XIV (1638-1715), rei francês do século XVII, considerado um dos 
reis que melhor sintetizam esse tipo de governo. 
 Trabalhar com esta temática se justifica devido aos poucos trabalhos encontrados que 
abordem o tema. Nas pesquisas realizadas foi possível encontrar apenas dois artigos que 
falavam sobre o assunto. O primeiro é o artigo Garantindo o bom governo do rei: a construção 
de bases teóricas e simbó1icas para uma governabilidade eficaz no Estado Moderno - uma 
proposta de oficina em sala de aula, de Marcello José Gomes Loureiro. Neste artigo, o autor 
propõe um roteiro de aula sobre o Estado absolutista pelo viés das “[...] negociações do poder 
central com os locais”34. Pretende, por meio da leitura de fragmentos das obras de Bossuet e 
Hobbes, principalmente, a parte iconográfica, evidenciar “[...] as dinâmicas e tentativas de 
legitimação do poder régio”35. Ele procura se afastar das já tradicionais abordagens dos livros 
didáticos sobre o Absolutismo, que veem o Estado Absoluto apenas como instrumento de poder 
de grupos sociais: 
 
Afastando-se da abordagem normalmente empregada pelos livros didáticos, 
em que o Estado Absoluto é um mero instrumento de poder de determinados 
grupos sociais, pretende-se discutir não somente a construção das alianças, 
tramas e negociações que o Estado Moderno precisou articular para construir 
suas bases de governabilidade, mas sobretudo enfatizar as justificativas 
teóricas e as formas de representação do poder real que influenciaram aqueles 
arranjos políticos36. 
 
Nessa proposta de trabalho é interessante notar a contextualização histórica feita por 
Loureiro sobre a formação e dinâmica dos Estados absolutistas sob a ótica de duas correntes 
historiográficas. De acordo com o autor, a partir da década de 1990, entrou em curso na 
historiografia mundial uma revisão das teses já tradicionais que defendiam uma forte 
centralização de poder nas mãos dos reis. O autor resume que tais revisões passaram “[...] por 
uma redução da ideia de centralização do poder absoluto nas mãos dos monarcas europeus, 
suplantada por uma constante negociação entre o centro e as localidades37. Nesse sentido, 
podemos dizer que começou a emergir uma nova concepção histórica a respeito dos Estados 
Absolutistas, capaz de gerar uma nova cultura histórica. 
 
34 LOUREIRO, Marcello Gomes. Garantindo o bom governo do rei: a construção de bases teóricas e simbó1icas 
para uma governabilidade eficaz no Estado Moderno - uma proposta de oficina em sala de aula. História & 
Ensino, Londrina, v. 13, p. 157-176, set. 2007, p. 157. 
35 Ibidem, p. 157. 
36 Ibidem, p. 157. 
37 Ibidem, p. 158. 
22 
 
Para nós, essa questão apontada por Loureiro é importante porque nos leva a tentar 
perceber se tal revisão historiográfica chegou até os atuais manuais didáticos, e se modificou a 
cultura histórica tradicional que vê os monarcas dos estados absolutistas como pessoas que 
detinham todo poder nas mãos; criaturas tão poderosas que tinham poderes ilimitados. 
Um outro trabalho que traz o Absolutismo monárquico como tema é o artigo de Débora 
Fernandes e Júlia Silveira Matos, intitulado Literacia histórica nos livros didáticos: culturas 
históricas do absolutismo. Neste artigo, Fernandes e Matos buscam pensar o papel dos manuais 
didáticos nas relações de ensino e aprendizagem estabelecidos entre docentes e discentes em 
sala de aula. As autoras objetivaram analisar o livro didático “[...] em sua potencialidade como 
transmissor e legitimador de certas culturas históricas em sala de aula”38. Resumindo, a partir 
das palavras delas, a proposta de análise consistia em: 
 
[...] analisar como os autores Alfredo Boulos Junior no livro didático História: 
sociedade e cidadania, 7º ano e Joelza Ester Domingues Rodrigues no livro 
História em documento: imagem e textos, 7º ano narraram o absolutismo, 
enquanto fenômeno político da Idade Moderna e como esse fato histórico, 
dirigido por diferentes culturas históricas, pode ser narrado de diferentes 
formas, ao mesmo tempo em que revela a literacia histórica de seus autores e 
contextos produtivos39. 
 
Fica evidente que, por meio do conceito de “cultura histórica”, as autoras citadas acima 
buscavam compreender como, através do livro didático, leituras, posicionamentos, olhares, ou 
seja, estruturas ideológicas são propagadas, uma vez que este objeto é “[...] um meio de 
veiculação ideológica, seja oficial ou ideológica”40. 
 
1.2 Entre vilão e mocinho: as faces ideológicas dos livros didáticos 
 
Como adiantamos acima, as discussões que giram em torno do livro didático têm 
construído imagens deste objeto que giram em torno desse binômio “vilão-mocinho”, em 
relação ao seu papel em sala de aula. Há quem veja no livro didático uma ferramenta pedagógica 
inocente que auxilia o professor e o aluno no processo de ensino e aprendizagem por trazer 
conteúdos complexos de forma didática, lúdica e mais acessível ao estudante. 
 
38 FERNANDES, Débora e MATOS, Júlia Silveira. Literacia histórica nos livros didáticos: culturas históricas do 
absolutismo. REVISTA de Educação Histórica - REDUH / Laboratório de Pesquisa de Educação Histórica da 
UFPR; nº.5(Jan./Abril. - 2014) . Curitiba: LAPEDUH, 2014. Disponível em: http://www.lapeduh.ufpr.br/revista 
Quadrimestral, p. 124. 
39 Ibidem, p. 124-5. 
40 MATOS, Julia Silveira. Os livros didáticos como produtos para o ensino de História: uma análise do plano 
nacional do livro didático. Historiæ, Rio Grande, 3(3), 2012, p. 168. 
23 
 
Mas há também quem critique sua utilização por uma série de razões. Umas delas é o 
problema dele se tornar, em muitas ocasiões, o único recurso didático durante as aulas, fazendo 
de sua estrutura discursiva e imagética hegemônica em sala de aula, como apontou Matos: “[...] 
quando o livro didático se torna o único ou o principal recurso, seja didático, ou de apoio 
pedagógico do professor, sua estrutura ideológica se torna hegemônica dentro de sala de aula 
na qual é utilizado”41. O perigo estaria em fazer com que posicionamentos de certos autores se 
tornem verdades indiscutíveis, mascarando o fato de o livro didático ser um produto cultural 
que transmite posicionamentos nada inocentes, já que “[...] os autores de livros ao produzirem 
suas obras expressam leituras, posicionamentos políticos, ideológicos pedagógicos [...]42”, 
como afirma Julia Silveira Matos em concordância com Ana Maria Monteiro (2009). 
Citando Monteiro, Matos concorda que no momento de produção dos manuais 
didáticos os autores “[...] selecionam e produzem saberes, habilidades, valores, visões de 
mundo, símbolos, significados, portanto culturas, de forma a organizá-los e torná-los possíveis 
de serem utilizados”43. 
Outro problema que se coloca contra os manuais didáticos é o fato de eles fazerem 
parte de políticas educacionais que estariam a serviço de um projeto de controle cultural feito 
pelo Estado: 
 
O desenvolvimento da trajetória dos manuais didáticos caminha por estradas 
diferentes dos livros em geral, [...] devido ao seu papel central enquanto 
produto e veículo de saber dentro das políticas educacionais, pois ao mesmo 
tempo em que é recurso didático, também é instrumento de normatização e 
controle44. 
 
Tal aspecto é evidenciado por Justino Magalhães, como citou Matos: “o manual 
escolar, mais que um meio de aculturação e de alteridade cultural, é fator de afirmação e de 
dominação cultural”45. Matos mostra também que “[...] é preciso analisarmos os livros didáticos 
enquanto documentos históricos marcados por ideologias próprias de cada tempo e tendências 
de governo [...]”46. 
 
41 MATOS, 2012, op. cit., p. 167. 
42 MONTEIRO, 2009, apud MATOS, 2012, op. cit., p. 167-168. 
43 Ibidem, p. 167-168. 
44 MATOS, 2012, op. cit., p. 170. 
45 MAGALHÃES 2011, apud MATOS, 2012, op. cit., p. 170. 
46 Ibidem, p. 170. 
24 
 
Essas políticas educacionais se manifestam por meio do programas curriculares que 
controlam o conteúdo que os manuais escolares transmitem. Por isso é imprescindível atentar-
se para o caráter ideológico dos currículos: 
 
[...] Os currículos e programas das escolas públicas, sob qualquer forma que 
se apresentem (guias, propostas, parâmetros), são produzidos por órgãos 
oficias, que os deixam marcados com suas tintas, por mais que os documentos 
pretendam representar o conjunto dos professores e os “interesses dos alunos”. 
[...] Os currículos são responsáveis, em grande parte, pela formação e pelo 
conceito de História de todos os cidadãos alfabetizados, estabelecendo, em 
cooperação com a mídia, a existência e a memória coletiva da sociedade47. 
 
Nesse sentido, os currículos são instrumentos poderosos de intervenção estatal na 
educação escolar, pois, como mostra Kátia Abud, os currículos formam uma clientela escolar 
treinada para o exercício da cidadania nos moldes que interessa os grupos dominantes48. É por 
meio dos programas e currículos escolares que o Estado divulga as concepções científicas das 
disciplinas escolares, o desenvolvimento das ciências que as referenciam e por quais vias elas 
se transformarão em conhecimento escolar. Portanto, controla toda a informação que cada 
disciplina transmite, regulando assim o trabalho pedagógico: 
 
[...] Através dos programas divulgam-se as concepções científicas de cada 
disciplina, o estado de desenvolvimento em que as ciências de referência se 
encontram e, ainda, que direção devem tomar ao se transformar em saber 
escolar. Nesse processo, o discurso do poder se pronuncia sobre a educação e 
define seu sentido, forma, finalidade, conteúdo e estabelece, sobre cada 
disciplina, o controle da informação a ser transmitida e da formação 
pretendida. Assim, a burocracia estatal legisla, regulamenta e controla o 
trabalho pedagógico [...].49 
 
Quando analisa a face ideológica dos manuais didáticos, Bittencourt mostra como é 
difícil tentar definir esse objeto “[...] por ser obra bastante complexa, que se caracteriza pela 
interferência de vários sujeitos em sua produção, circulação e consumo”50. O mesmo 
posicionamento assume Munakata, quando afirma que antes de se olhar para as ideias e valores 
transmitidos por esse objeto pedagógico é preciso analisar a materialidade das relações sociais 
em que os livros didáticos estão implicados, ou seja, a participação de uma diversidade de 
 
47 ABUD, Kátia. Currículos de História e Políticas Públicas: os Programas de História do Brasil na Escola 
Secundaria. In: BITTENCOURT, Circe (Org.). O saber histórico na sala de aula. 9ª ed. – São Paulo: Contexto, 
2004, p. 29. 
48 Ibidem, p. 28. 
49 Ibidem, p. 28. 
50 BITTENCOURT, 2011, apud, MATOS, 2012, op. cit., p. 167. 
25 
 
especialistas de diversas modalidades de trabalhos (editores, gráficos, etc.), na produção do 
livro didático51. 
Munakata faz críticas as abordagens que denunciam o caráter ideológico dos manuais 
didáticos. Ele as considera reducionistas, por, supostamente, ignorar a mediação da 
materialidade do livro que está entre a enunciação das ideologias e sua recepção: “entre a 
enunciação das ideias e dos valores e a sua recepção, há sempre, a mediação da materialidade 
do objeto-livro, que deve ser levado em conta52, ou seja, é preciso perceber que por trás da tinta 
sobre o papel, das páginas encadernadas, os manuais didáticos passam por revisões que muitas 
vezes modificam o texto original; que tais objetos recebem acabamento editorial e gráfico para 
que possam ser distribuídos e lidos 53. Assim, fica explícito na argumentação de Munakata que, 
antes de qualquer condenação a ideias e valores propagados pelos manuais didáticos, é preciso 
antes apreender a materialidade deste objeto, que, segundo o autor, “[...] é, antes, conhecer o 
processo de produção, circulação e consumo de livros, no interior do qual seus elementos, por 
exemplo, o tamanho da página, adquire inteligibilidade”54. 
Dessa forma, o autor critica o olhar acusatório sobre o manual didático, que denuncia 
a face ideológica desse objeto, mostrando que o livro didático durante o caminho que leva ao 
mercado de consumo passa pelas mãos de vários sujeitos. Estes, coautores desse objeto, 
impossibilitariam uma tentativa de mostrar o livro como um produto ideológico produzido por 
um autor individual que queira, por meio do livro didático, propagar uma ideologia qualquer. 
Outro argumento de Munakata que queremos explicitar aqui é que, para ele, o livro é 
antes de tudo uma mercadoria feita para um mercado específico, no caso, as escolas onde serão 
utilizados. Seria, portanto, a escola e não a sociedade exterior à escola, que determinaria o uso 
desse material em sala de aula: “o livro didático, portanto, deve se adequar a esse mercado 
específico. Isso significa que a escola, tomada como mercado, determina usos específicos do 
livro (didático), também mediados pela sua materialidade”55. 
Munakata defende em seus argumentos duas questões controvérsias. Primeiro que é a 
escola e não a sociedade que cria um espaço e uma temporalidade para os usos dos manuais 
didáticos, e que a escola não se reduz em reflexo da sociedade que está inserida; que ela 
inaugura práticas culturais que nascem dentro dela e lhe são específicas: “a escola institui um 
espaço e uma temporalidade que não se reduz, como espelho ou reflexo, à sociedade que a51 MUNAKATA, 2012, op. cit., p. 184. 
52 Ibidem, p. 183-184. 
53 Ibidem, p.184. 
54 Ibidem, p. 184. 
55 Ibidem, p. 185. 
26 
 
contém, mas inaugura práticas e cultura que lhe são específicas. O livro didático, portanto, deve 
se adequar a esse mercado específico”56. Ou seja, é a escola que determina os usos e funções 
que o livro didático adquirirá. 
As ideias lançadas pelo autor supracitado tendem a redimir os livros didáticos de uma 
culpa que vem recaindo sobre eles há algum tempo: a responsabilidade pelo fracasso escolar 
dos alunos. Todavia, cabe aqui alguns parênteses sobre as ideias levantadas pelo autor. 
Mesmo a escola produzindo usos e funções para o livro didático em sala, esse objeto 
não deixa de ter uma determinação anterior de um mercado de produção específico que molda 
seu produto de acordo com estudos prévios de suas possibilidades de forma de uso. O livro 
didático não deixa de ser um produto da sociedade de consumo; ele não é um recurso 
pedagógico inocente no qual a escola lhe dá função, como argumenta Matos57. 
A escola e a prática escolar também não deixam de refletir aspectos macros da 
realidade social na qual está inserida. Isso pode ser evidenciado, por exemplo, no próprio uso 
que se faz do livro didático em sala de aula; ele é muitas vezes o único recurso pedagógico da 
aula, seja pela falta de outros recursos pedagógicos, seja pela má formação dos professores que 
se apoiam nos manuais didáticos para planejar suas aulas. Isto tudo contribuindo para que o 
conteúdo do livro didático se torne a verdade dos fatos em sala de aula. 
A escola sendo um espaço de construção crítica do conhecimento pode ser 
responsabilizada sozinha por essa forma de utilização do manual didático? Tal aspecto não 
mostra uma falha do Estado, por exemplo, na formação de professores? 
A própria existência de um livro didático em sala de aula também é uma forma de 
selecionar o que pode ser ensinado ou não, o que é verdadeiro e o que é falso. O livro funciona 
como um instrumento de controle estatal, que tenta levar um certo tipo de conhecimento 
imposto como verdadeiro e oficial. O próprio Munakata admite que há interferências do Estado 
no processo de distribuição dos manuais didáticos, os quais são impedidos de chegarem ao 
consumidor final sem antes passarem por um crivo oficial do Estado: 
 
No Brasil, o Programa Nacional do Livro didático, instituído em 1985, faz a 
mediação entre as editoras e o público-alvo (docentes e discentes das escolas 
públicas) e, a partir de 1996, quando se instituiu o sistema de avaliação prévia 
dos livros, intervém diretamente na oferta de livros, estabelecendo-lhes 
critérios pelos quais possam ser apresentados à escolhas dos professores58. 
 
 
56 MUNAKATA, 2012, op. cit., p. 185 
57 MATOS, 2012, op. cit., p. 168. 
58 MUNAKATA, 1997, apud, MUNAKATA, 2012, op. cit., p. 188. 
27 
 
O contexto escolar pode mesmo dar diversos usos ao livro didático: ele pode ser lido 
em alta voz ou de forma silenciosa, pode ser rabiscado, copiado, ser transportado pelo aluno 
para sua residência em mochilas pesadas sobre as costas. Mas o que permanece em todos os 
contextos escolares nacionais, como várias pesquisas demonstram, é o protagonismo dos 
manuais didáticos em sala de aula e a interferência do Estado na seleção destes, determinando 
“[...] quais manuais escolares poderão ser distribuídos e, assim, utilizados pelas instituições de 
ensino públicas”59. Como mostram Matos e Adriana Kivanski Senna, o crivo do Estado 
interfere “[...] nas formas como os conhecimentos das disciplinas escolares são apresentados”60. 
Portanto, quando se analisa a face ideológica dos manuais didáticos, não se está 
ignorando a materialidade das relações sociais implicadas nos livros, nem mesmo os diversos 
usos que estes podem ter em sala de aula, mas alertando para a possibilidade dos manuais 
didáticos se passarem por ferramentas pedagógicas ingênuas, que auxiliariam de forma 
maravilhosa a construção de conhecimentos “puros” e ‘verdadeiros” sobre a História, por 
exemplo; ou mesmo que de forma ingênua se leve a pensar que tal ferramenta pedagógica é 
utilizada pelo Estado para a melhoria da educação, no intuito de levar os estudantes à tomada 
de consciência da realidade em que vivem, valorizando a cidadania, a igualdade, a tolerância e 
o convívio pacífico entre os povos. Se assim fosse, não existiriam tantos trabalhos denunciando 
o caráter nada inocente desse objeto pedagógico. Logicamente, os manuais escolares não são 
os únicos responsáveis pelo fracasso escolar; mas, eles como instrumentos ideológicos, 
protagonistas em sala de aula, contribuem para a limitação do conhecimento, pois o saber 
transmitido se limita em suas páginas. 
O que se propõe nesse trabalho é perceber como através das páginas dos manuais 
didáticos é possível perceber correntes discursivas que se tornam hegemônicas; como tais 
discursos podem mascarar, distorcer a realidade, uma vez que não há discurso inocente: todos 
são ideológicos, todos propagam valores, ideias visões de mundo. 
Mesmo com todas as controvérsias que se impõem sobre o uso do livro didático, não 
podemos deixar de compreender sua importância para a educação escolar, uma vez que muitas 
vezes ele é o único recurso de professores e alunos desprovidos de outros meios como 
bibliotecas ou internet61. Além disso, como afirma Bittencourt, os manuais didáticos fazem 
parte de uma tradição escolar que os colocam como os mais usados instrumentos de trabalho a 
 
59 MATOS, Júlia Silveira e SENNA, Adriana Kivanski. Estado, editoras e ensino: o papel da política na produção, 
avaliação e distribuição dos livros didáticos de história no brasil (1938-2012), 2012, p. 2. 
60 Ibidem, p. 2. 
61 Ibidem, p. 167. 
28 
 
pelo menos 200 anos62 e que “[...] continua sendo o material didático referencial de professores, 
pais e alunos que, [...], consideram-no referencial básico para o estudo [...]”63. Tal compreensão 
leva-nos a entendermos o porquê deste papel de destaque que o livro didático tem no ambiente 
escolar, ao mesmo tempo nos serve de alerta para percebermos que por trás desse papel de “bom 
moço” o livro didático pode esconder facetas nada inocentes. 
 
1.3 O livro didático convertido em signo ideológico: sua capacidade de distorção da 
realidade 
 
Este trabalho, justificado também pela preocupação com o papel ideológico do livro 
didático enquanto propagador de certas leituras e olhares sobre o passado, formadores de 
culturas históricas sobre o absolutismo monárquico – culturas estas que podem estar pintando 
de forma estereotipada ou mesmo distorcida, tal fenômeno político e seus personagens – , busca 
entender como os manuais didáticos têm abordado o processo de formação e consolidação das 
monarquias absolutistas, bem como do papel de Luís XIV, considerado o principal 
representante do absolutismo monárquico europeu do século XVII. 
Buscamos analisar que fatores são destacados pelas obras selecionadas para a 
consolidação dos Estados Absolutistas. Procuramos entender, também, de que forma os 
manuais didáticos mostram a pessoa e o reinado de Luís XIV enquanto representante do 
absolutismo monárquico, tentando compreender como as ações e discursos de Luís XIV, 
enquanto rei, têm sido utilizados pelos livros didáticos para representá-lo e, por fim, tentaremos 
compreender como os manuais didáticos apresentam ideias, teorias e estratégias que 
legitimavam o poder de Luís XIV e contribuíam para sua imagem de rei absoluto. 
 Em nossa pesquisa, utilizaremos como referencial teórico alguns conceitos de 
Bakhtin, como “signo ideológico”, “enunciação” e “auditório social do discurso”, bem como 
suas teorias sobre a linguagem, principalmente sua defesa da natureza social da linguagem, 
sendo a fala, ou seja, a enunciação, um produto social.Para Bakhtin, a fala ou mesmo o resultado enunciativo dela, não pode ser considerado 
apenas como um produto individual, explicado sob uma ótica interna do sujeito, ao contrário: 
 
Na realidade, o ato da fala, ou mais exatamente, seu produto, a enunciação, 
não pode de forma alguma ser considerado como individual no sentido estrito 
 
62 BITTENCOURT, 2011, apud MATOS, 2012, op. cit., p. 166. 
63 Ibidem, p. 167. 
29 
 
do termo; não pode ser explicado a partir das condições psicofisiológias do 
sujeito falante. A enunciação é de natureza social64. 
 
 Bakhtin defende, portanto, que a natureza social da enunciação se dá pelo fato dela 
ser um produto de interação de dois indivíduos: o locutor e o interlocutor, ou seja, todo 
enunciado tem um destinatário, um interlocutor potencial: “[...] a enunciação é o produto da 
interação de dois indivíduos socialmente organizados e, mesmo que não haja um interlocutor 
real, este pode ser substituído pelo representante médio do grupo social ao qual pertence o 
locutor65. Nesse sentido, toda a atividade mental de um indivíduo, realizada em forma de 
enunciação, é endereçada a um auditório social definido, como mostra o autor: “o mundo 
interior e a reflexão de cada indivíduo tem um auditório social próprio bem estabelecido, em 
cuja atmosfera se constroem suas deduções interiores, suas motivações, apreciações, etc.”66. 
De acordo com Marina Yaguello, Bakhtin defende que “a comunicação verbal, 
inseparável das outras formas de comunicação, implica conflitos, relações de dominação e de 
resistência à hierarquia, utilização da língua pela classe dominante para reforçar seu poder 
etc.”67. Para Bakhtin, a enunciação é uma estrutura sócio-ideológica, onde 
 
[...] cada palavra se apresenta como uma arena em miniatura onde se 
entrecruzam e lutam os valores sociais de orientação contraditória. A palavra 
revela-se, no momento de sua expressão, como o produto da interação viva 
das forças sociais68. 
 
A análise da comunicação verbal realizada por Bakhtin nos serve na medida em que 
concordamos com ele sobre o papel do livro, ou seja, a fala de forma impressa - no nosso caso, 
o livro didático - como sendo um instrumento de comunicação verbal, de discussões ativas em 
forma de diálogo, capaz de gerar querelas e outros textos a seu respeito, como mostra o autor: 
 
O livro, isto é, o ato da fala impresso, constitui igualmente um elemento da 
comunicação verbal. Ele é objeto de discussões ativas sob forma de diálogos 
e, além disso, é feito para ser apreendido de maneira ativa, para ser estudado 
a fundo, comentado e criticado no quadro do discurso interior, sem contar as 
reações impressas, institucionalizadas, que se encontram nas diferentes 
esferas da comunicação verbal (críticas, resenhas, que exercem influência 
sobre os trabalhos posteriores, etc.)69. 
 
 
64 BAKHTIN, 2006, op. cit., p. 111. 
65 Ibidem, p. 114. 
66 Ibidem, p. 115. 
67 YAGUELLO, Marina. Introdução. In: BAKHTIN, 2006, op. cit., p. 7. 
68 BAKHTIN, 2006, op. cit., p. 58. 
69 Ibidem, p. 118. 
30 
 
Como temos mostrado durante esse trabalho, o livro didático vem sendo motivo de 
discussões há bastante tempo, o que gerou diversos trabalhos sobre o tema, comprovando a 
citação de Bakhtin acima. 
Outra característica levantada pelo autor que complementa a já anterior mencionada, 
e que também nos serve como embasamento teórico, é o fato de o livro sempre responder a 
alguma coisa, seja concordando, seja refutando ou mesmo reproduzindo discussões 
ideológicas maiores, como define Bakhtin: 
 
[...] o ato da fala sob a forma de livro é sempre orientado em função das 
intervenções anteriores na mesma esfera de atividade, tanto as do próprio autor 
com as de outros autores: ele decorre portanto da situação particular de um 
problema científico ou de um estilo de produção literária. Assim, o discurso 
escrito é de certa maneira parte integrante de uma discussão ideológica em 
grande escala: ele responde a alguma coisa, refuta, confirma, antecipa as 
respostas e objeções potenciais, procura apoio, etc.70 
 
Ou seja, o livro didático, e seu locutor, sempre está dialogado com correntes de 
pensamentos, se embasando sobre elas na tentativa de convencer seu “auditório social”, que no 
caso são os docentes e discentes que entram em contato com o livro didático. 
Em outra passagem, Bakhtin mostra que toda enunciação, seja ela oral ou inscrita, é 
um elo de uma cadeia comunicativa, feita com o objetivo de ser compreendida e orientada para 
uma leitura do contexto do qual ela faz parte: 
 
Toda inscrição prolonga aquelas que a precederam, trava uma polêmica com 
elas, conta com as suas reações ativas da compreensão, antecipa-as. Cada 
inscrição constitui uma parte inalienável da ciência ou da literatura ou da vida 
política. Uma inscrição como toda enunciação monológica, é produzida para 
ser compreendida, é orientada para uma leitura no contexto da vida científica 
ou da realidade literária do momento, isto é, no contexto do processo 
ideológico do qual ela é parte integrante71. 
 
Assim, entendemos que dentro do processo de comunicação verbal realizado pela fala, 
pelos enunciados, o livro didático enquanto instrumento de interação verbal, assim como a 
palavra, se comporta como um signo ideológico. 
Bakhtin denomina de “signo ideológico” todo produto que é ideológico, ou seja, tudo 
aquilo que carrega um significado, remetendo-se a algo que lhe é exterior72. Dessa forma, assim 
como a palavra é um fenômeno ideológico, pois materializa por meio da comunicação o 
 
70 BAKHTIN, 2006, op. cit., p. 118. 
71 Ibidem, p. 91. 
72 Ibidem, p. 29. 
31 
 
contexto ideológico do qual emerge, sensível às relações sociais de sua realidade de produção73, 
o livro didático enquanto instrumento de interação verbal inscrito também pode ser convertido 
em signo ideológico. Como produto ideológico ele veicula ideologias, reflete uma realidade 
social, a distorce, mascara, assim como os enunciados em geral. 
Poderão nos perguntar: o livro não é diferente das palavras por ter um corpo físico, por 
ser um produto de consumo? Todavia, como mostra Bakhtin, qualquer produto de consumo 
pode se transformar em signo ideológico através de sua função simbólica: “é o caso por 
exemplo, da foice e do martelo como emblemas da União Soviética. A foice e o martelo 
possuem, aqui, um sentido puramente ideológico”74. 
Assim como a foice e o martelo se remetem ao comunismo e a luta das classes 
trabalhadoras, exaltadas no emblema da URSS, da mesma forma o livro didático em sala de 
aula simboliza o discurso científico oficial, que depois do crivo do Estado chegou ao seu 
consumidor final com o objetivo de levar o conhecimento sobre, por exemplo, os eventos 
históricos, no caso de um livro didático de História. 
Bakhtin defende que todo objeto, seja ele natural, tecnológico ou de consumo torna-se 
signo quando adquire um sentido que ultrapassa suas funções particulares: “os signos também 
são objetos naturais, específicos, e, como vimos, todo produto natural, tecnológico ou de 
consumo pode tornar-se signo e adquirir, assim, um sentido que ultrapasse suas próprias 
particularidades”75. 
O livro didático torna-se signo ideológico por adquirir, assim, um sentido que 
ultrapassa a sua particularidade, enquanto produto de consumo, que é ser um manual didático 
com assuntos resumidos sobre alguns temas, com um recorte específico sobre um determinado 
assunto, forjado por teorias, métodos, olhares específicos do lugar de produção do qual ele veio. 
Enquanto signo ideológico “oficializado”, ele não existe apenas como parte de uma realidade: 
“ele pode distorcer essa realidade, ser-lhe fiel, ou apreendê-la de um ponto de vista específico, 
etc.”76. 
Nessa perspectiva iremos, a partir da análisedo conteúdo sobre o Absolutismo 
Monárquico, perceber como os manuais didáticos selecionados têm atuado como instrumento 
de comunicação verbal, buscando perceber quem são os locutores desses livros, em quais 
correntes discursivas eles se inserem, ou seja, a que tipo de fazer historiográfico apoiam seus 
 
73 BAKHTIN, 2006, op. cit., p. 34. 
74 Ibidem, p. 22. 
75 Ibidem, p. 30. 
76 Ibidem, p. 22. 
32 
 
discursos, constroem suas narrativas; analisar se os livros didáticos de História corroboram para 
a manutenção de discursos hegemônicos sobre o Estado Absolutista ou se há espaço para várias 
vertentes historiográficas, expor seu olhar sobre este fato, e também perceber se tais olhares 
vêm distorcendo, estereotipando esse conteúdo. 
As obras selecionadas fazem parte de coletâneas que foram utilizadas no Colégio 
Universitário (COLUN), situado dentro da Universidade Federal do Maranhão, Campus do 
Bacanga, São Luís -MA. A escolha dos livros contou com a ajuda do professor de História do 
1º ano do Ensino Médio, Prof. Dr. Raimundo Inácio. Seguindo suas sugestões, resolvemos fazer 
um recorte temporal entre 2012 e 2018, buscando analisar todos os quatro livros usados durante 
esse período. A escolha por analisar os livros utilizados por esta instituição se deu primeiro pela 
facilidade de adquiri-los, uma vez que fazíamos parte do Programa Institucional de Bolsas de 
Iniciação à Docência (PIBID), implantado na escola. Segundo, por esta ser uma instituição de 
ensino renomada, no que se refere ao Ensino Básico, e que assiste a estudantes não só da capital, 
São Luís, mas de toda a região metropolitana. Terceiro, porque durante nossa estadia no PIBID 
foi possível perceber que nas diversas escolas em que o programa se instalara, os livros 
didáticos eram protagonistas nas aulas, usados pelos docentes como materiais de pesquisa e 
apoio pedagógico. Embora no COLUN – pelo menos nas aulas de História - houvesse espaço 
para outras ferramentas pedagógicas, era possível perceber certo destaque no uso dos livros 
didáticos pelos alunos, que os viam como detentor da verdade histórica. 
O primeiro livro que escolhemos para análise faz parte da coletânea Conexões com a 
História, volume 1: das origens do homem à conquista do Novo Mundo, lançado pela editora 
Moderna em 2010, e sob autoria de Alexandre Alves e Letícia Fagundes de Oliveira. Este livro 
fez parte do ciclo de 2012 a 2014, período que foi utilizado em sala de aula. No mesmo ciclo, 
por conta do número insuficiente do primeiro livro para contemplar a demanda da escola, foi 
utilizado também o volume 1 da coletânea História: das cavernas ao terceiro milênio: das 
origens da humanidade à Reforma Religiosa na Europa. Também da editora Moderna, este 
livro foi produzido em 2010, sendo esta a 2ª edição da coletânea. A obra está sob a autoria de 
Patrícia Ramos Braick e Myriam Becho Mota. A terceira coletânea que iremos analisar é 
História em Movimento: dos primeiros humanos ao Estado Moderno. Lançado pela editora 
Ática em 2015, a coletânea estava em sua 2ª edição. A autoria da obra ficou por conta de Gislane 
Azevedo e Reinaldo Seriacopi. Esta obra esteve no ciclo 2015 a 2017. Por último, a coleção 
que será utilizada esse ano que faz parte da coletânea Por dentro da História, volume 1, lançado 
pela editora Escala Educacional e produzido em 2016. Esta é a 4ª edição desta obra que vem 
33 
 
através da autoria de Pedro Santiago, Célia Cerqueira e Maria Aparecida Pontes. Todas as obras 
mencionadas são de editoras com sede em São Paulo. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
34 
 
CAPÍTULO 2 - Formação e dinâmica dos Estados Monárquicos: reproduções e distorções 
nos manuais didáticos de História 
 
De maneira geral, a historiografia tradicional descreve os Estados Monárquicos do 
período moderno como organismos político-administrativos centralizados e resultantes de 
disputas entre camadas sociais que buscavam se impor. Os monarcas aproveitando-se das 
disputas e utilizando-se de instrumentos jurídicos, burocráticos, técnicos, tributários, políticos, 
militares e econômicos centralizaram o poder em suas mãos. 
Esta historiografia situa a formação e consolidação das monarquias centralizadas da 
Europa Ocidental, entre os séculos XII e XV. Alguns autores recuam um século enquanto outros 
avançam em um. De qualquer forma, no século XVI, estas monarquias já estariam centralizadas 
e caminhando para sua forma mais evoluída: o Estado Absolutista: um tipo de organismo 
político-administrativo em que o monarca detinha grandes poderes. 
Essas monarquias, no caso Portugal, Espanha, Inglaterra e, principalmente, a França, 
teriam se formado em um período de turbulência na Europa, onde crises de toda natureza 
assolavam a região e onde conflitos entre grupos sociais levaram ao fortalecimento do poder do 
rei. Alguns autores veem o rei como árbitro desses conflitos, hora a favor de um grupo hora a 
favor de outro grupo, objetivando se manter firme no poder. Já outros autores defendem sua 
participação efetiva no conflito por meio de alianças com grupos específicos de forma contínua. 
 Friedrich Engels, por exemplo, embora não fosse historiador de ofício, influenciou, 
juntamente com Karl Marx, na consolidação de uma visão histórica que defende o Estado 
Absolutista como fruto de disputas entre camadas sociais. Engels analisa o Estado Absolutista 
como resultante de equilíbrio de classe: 
 
Excepcionalmente, contudo, há períodos em que as classes em luta se 
equilibram (Gleichgewicht halten), de modo, que o poder do Estado, pretenso 
mediador, adquire momentaneamente um certo grau de autonomia em relação 
a elas. Assim aconteceu com a monarquia absoluta dos séculos XVII e XVIII, 
que manteve o equilíbrio (gegeneinander balanciert) entre a nobreza e a classe 
dos burgueses77. 
 
De acordo com P. Anderson, “a classificação do absolutismo como um mecanismo de 
equilíbrio político entre a nobreza e a burguesia desliza, com frequência, para a sua designação 
implícita ou explícita fundamentalmente como um tipo de Estado burguês enquanto tal”78. Ele 
 
77 ENGELS, 1968, apud ANDERSON, 2004, op. cit., p. 15. 
78 ANDERSON, Perry. Linhagens do Estado absolutista. Tradução: João Roberto Martins Filho. São Paulo: 
Brasiliense 2004, p. 16. 
35 
 
explica que, embora Engels afirme que o Estado monárquico absolutista fosse fruto de um 
equilíbrio de classe, também deixou implícito que o período em que fora estabelecido pode ser 
visto como o tempo em que “a nobreza feudal foi levada a compreender que o período da sua 
dominação política e social chegara ao fim”79. 
Marx, por sua vez, via as monarquias absolutas como burguesas por serem sustentadas 
por estruturas típicas dessa camada social: 
 
O poder do Estado centralizado, com os seus órgãos onipresentes: exército 
permanente, polícia, burocracia, clero e magistratura – órgãos forjados 
segundo o plano de uma divisão do trabalho sistemática e hierárquica – tem a 
sua origem nos tempos da monarquia absoluta, quando serviu à sociedade da 
classe média nascente, como arma poderosa nas suas lutas contra o 
feudalismo80. 
 
Perry Anderson, historiador marxista, segue seus mestres (Engels e Marx) no que tange 
analisar as monarquias europeias do período Moderno como sendo estruturas de governo 
centralizadas, fruto de disputas de camadas sociais, fincadas sob as mesmas estruturas citadas 
por Marx. Mas discorda tanto da ideia desse Estado ser de natureza equilibrista quanto de ser 
um tipo burguês. Em sua visão, o Estado Absolutista era feudal-aristocrático, ou seja, a nobreza 
continuava tendo o domínio político: 
 
As monarquias absolutas introduziram os exércitos regulares, uma burocracia 
permanente, o sistema tributário nacional, a codificação do direito e

Continue navegando