Buscar

FICHAMENTO 3, 4 - ONIPRESENÇA DO MEDO - O PASSADO E AS TREVAS

Prévia do material em texto

FICHAMENTO: ONIPRESENÇA DO MEDO / O PASSADO E AS TREVAS
DELUMEAU, Jean. IN_____História do medo no Ocidente 1300-1800 – Uma cidade sitiada.
Primeira parte: OS MEDOS DA MAIORIA
1. ONIPRESENÇA DO MEDO
Como constatado no capítulo, a primeira e grande parte será falando sobre o medo do mar. O mar como objeto de dúvida, progenitor de males, bestas, assombração. A sensação do desconhecido que o mesmo trazia, bem como a força natural que a água e é tem, gerava, portanto um dos maiores (senão o maior) dos medos da época medieval. Se pudermos avaliar esmiuçando os fatos, veremos narrações importantes da literatura mundial que retratam o fator “medo do mar”. Somente em nosso texto-base, por exemplo, vemos referências de Camões, da Vinci, até mesmo Shakespeare, canções de cunho popular, entre outros. 
Por vezes, vemos a “besta-fera” mar realmente demonizado, como se fosse associado ao poderio de Satã. Não somente ao poderio, mas frequentemente relacionado ao pecado em si. É discutível, inclusive, que a relação da profundeza, da obscuridade, da força avassaladora, do inseguro desconhecer que o mar causa, e é, possam ser as causas primeiras dessa associação.
Quanto ao tocante do capítulo, é interessante salientar o contraste do novo e do antigo, da tradição e da inovação. A situação era tão delicadamente tênue que qualquer novidade, aparecimento que viesse a sair do monopólio hegemônico que as camadas mais altas tinham para controle, era colocado à margem. Inovações dentro da própria religião, feiticeiros, inovações econômicas, de modo de relação. Tudo era uma motivação (incitada na população, por assim dizer) para que se gerasse a “cultura do medo”, pondo a margem o que saia da linha de explicação convencional, que questionava, que gerava rumores.
2. O PASSADO E AS TREVAS 
2.1. Os fantasmas
Em geral, a população do período medieval tinha a crença a partir da igreja que nesta época, os fantasmas dos mortos vagavam pela terra condenados pela desgraça (peste negra e etc...) resultado de uma separação de alma e corpo nos momentos da morte, o medo de que os mortos agarrasse os vivos para o outro plano.
Tendo a Igreja como maior formadora de opinião diante da população, as crenças relacionadas à morte traziam um medo muito grande com relação às desgraças e punições da sociedade, inquisição e doenças tinham consequências no pós-vida das pessoas.
2.2. O medo da noite
O dualismo criando pela mitologia da Igreja também tinha relação com o medo trazido à sociedade, a questão do bem e o mal era comparado em varias situações, neste caso, a luz como o bem e a escuridão como o mal. A partir disto, o medo estava sempre relacionado à noite, algo podia acontecer na ausência da luz e isso criava uma rotina baseada na luz diária.
Os homens que tinham habito noturno era loucos, vagabundos e relacionados com o demônio, assim a sociedade se regia perante o medo da escuridão.
3. TIPOLOGIA DOS COMPORTAMENTOS COLETIVOS EM TEMPO DE PESTE
Na Europa, a peste permitiu a população vivenciar episódios de pânico coletivo. Principalmente, durante os quatro séculos que decorreram nos anos de 1348 a 1720. A peste que atingiu a Europa foi virulenta, ou seja, produzida por vírus, tal fato pode-se constatar pela leitura minuciosa dos textos da Alta Idade Medieval. Esta epidemia desenvolveu-se em torno da bacia do Mediterrâneo entre séculos VI e VIII obedecendo uma certa periodicidade de a cada nove a doze anos. As devastações de mortes promovidas pela mesma medrou-se pelos anos de 1348-1351, que eliminou, segundo Froissart, a terça parte do mundo.
Quando trata-se do resto do século XIV, e, pelo menos, até o começo do XVI, a doença reapareceu quase a cada ano em lugares da Europa ocidental. O contágio, particularmente, foi severo na Inglaterra, França e Itália. Por exemplo, nesta última - descreve um cronista de Orvieto -, em 1348, aconteceu a peste geral e fora a mais forte. A segunda, em 1363. A terceira, quarta, quinta e sexta pestes ocorreram, respectivamente, em 1374, 1383, 1389, 1410. E ainda poder-se-ia ter continuado a lista no século XV. Portanto, depreende-se que como a peste era recorrente durante a Idade Média, com seus reaparecimentos provocou uma situação de nervosismo e de medo na sociedade. Tornando-se a vilã do ocidente europeu durante quase quatrocentos anos. Talvez, o que mais assustasse a população, fosse o grau de rapidez que a doença atingia as pessoas. De manhã, uma pessoa, poderia tomar café da manhã com parentes, já à noite, podia-se está morto. As pessoas só ficavam com a enfermidade entre dois ou três dias e morriam rapidamente (Jean de Venette).
A "morte negra" assolou sobretudo as cidades. Contudo, os campos não foram poupados. Um exemplo: em determinados domínios da Abadia de Winchester, onde encontrava-se 24 óbitos de camponeses em 1346, em 1347 e 1348, deparou-se com 54; e em 1349, 707 óbitos. Atingia, especialmente, os pobres, mulheres, as crianças, e dizimava povos que acabavam de enfrentar pobreza extrema. 
Sem incertezas, a história da peste bubônica está ligada, à priori, à do rato. Entretanto, inúmeras dessas epidemias teriam sido transmitidas pela pulga do homem passando de um hospedeiro a outro. Os bairros populares, onde o parasita, intensamente, marcava sua presença, o contágio devastou-se. 
Os relatos referentes à enfermidade mostram o perigo da transmissão pelo contato com os doentes. Havia um temor da transferência do mal pelas dejeções dos enfermos. E ao contrário dos "eruditos", que não criam ser o contágio possível, a crença do senso-comum era pertinente, pois realmente era preciso fugir ou isolar-se, tanto mais que a peste dava espaço frequentemente a uma complicação pneumática. Fato que, atualmente, sabe-se que a peste pulmonar é transmitida pelas gotículas de saliva. Dessa maneira, as medidas de isolamento fizeram a moléstia regredir na época da Idade Média. 
Anterior ao final do século XIX, a ciência desconhecia as causas da peste, e acabavam por atribuir a causa ao ar poluído. Algumas eram as precauções de alastramento do mal: aspersão com vinagre cartas e moedas; acender fogueiras para purificar as cidades contaminadas; desinfestação de indivíduos, roupas e casas por meio de perfumes violentos e enxofre; uso de máscaras em forma de pássaro, cujo bico tinha substâncias odoríferas. 
O medo da peste produziu uma desestruturação do meio cotidiano. A cidade contaminada rompia com a rotina, que já se habituara. Outro ponto, é que a morte foi dessacralizada: entre os séculos XIV e XVIII, os contagiados, quando mortos, eram enterrados desordenadamente em fossas coletivas e imediatamente recobertas com cal viva. 
O temor sobrevinha sobre uma cidade só de pronunciar o nome "peste". O pânico era certo. Os homens temiam os defuntos, mas também, até o ar que próprios respiravam. A cidade virara um lugar de caos. A solidão se torna método de defesa. E a piedade, já não a tem nem pelos parentes. Os habitantes distanciam-se uns dos outros por temer a contaminação. Desconfiança e silêncio eram a característica das cidades. Como sabiam que a medicina era impotente, nesse período; e que as autoridades não possuíam controle da doença, a melhor solução era fugir. Seja ricos ou pobres. 
4. MEDOS E SEDIÇÕES
Os medos sempre estavam ligados às sedições e, talvez, a causa inicial desses crimes contra o estado (na época, a Igreja Católica) fosse o medo de que algo pudesse vir a acontecer. 
	Então, sabendo do fato de que os medos viriam a ser um ponto zero em revoltas durante a Idade Média, enumera-se três principais medos:
Medo de morrer de fome;
Medo de instabilidade econômica e juros;
Medo de rumores.
O medo da fome era enorme. A alimentação na Europa era bastante complicada – pode-se analisar isto a partir do solo europeu que não facilitava a plantação de alguns alimentos essenciais para a sobrevivência humana. Além desta dificuldade na produção, havia, também, uma enorme exploração agrícola. Os camponeses tinham que sustentar a si próprios e sustentar aqueles que produziam (exploradores)e diversas vezes esta exploração tornava altamente dificuldade a subsistência camponesa. 
Devido aos enormes problemas, começa-se a observar alguns sacrifícios enormes para alimentar-se e manter-se vivo, por exemplo, fazer de alimentos alguns animais mortos (o que veio a causar a morte de vários seres humanos, pois geralmente estes animais possuíam doenças e vermes) e, em casos mais extremos, o canibalismo foi uma saída para a sobrevivência. 
Dentre os alimentos básicos para a sobrevivência, aquele que mais causou revoltas foi o pão. O aumento do preço dos cereais era revoltante e aqueles revoltosos sempre buscavam um responsável para o fato que, geralmente, era algum comerciante local. 
Interligado ao medo da fome, o medo do fisco era bastante comum. Impostos sempre prejudicaram bastante as classes mais pobres, afinal, a aquisição de algo se torna mais difícil com altos impostos. 
Comparando a Inglaterra e a França, observa-se dois fatos extremamente distintos em relação aos impostos cobrados pelo estado. No primeiro país, a classe pobre foi praticamente isenta de impostos, ou seja, não se encontra nenhum registro de movimento sedicioso. Porém, no segundo, onde havia sim impostos às classes mais baixas, as revoltas foram inúmeras e era grande a quantidade de pessoas na miséria. 
Dentro os principais medos, os medos dos rumores também causaram algumas revoltas no medievo. Talvez pela falta de meios de comunicações como temos hoje, diversos boatos deram origem a movimentos sediciosos. Esses rumores geralmente partiam de locais onde havia muita concentração de pessoas, por exemplo, na igreja ou nos cabarés – cabarés estes que eram mantidos pela própria igreja, mas condenados por ela em seus discursos. 
Como um penúltimo ponto é necessário citar a presença das mulheres e dos padres nos movimentos de sedições e em movimentos de iconoclastia.
Inicialmente vemos as mulheres sempre à frente desses movimentos. Elas tinham medo antes dos próprios homens, tinham medo da falta de pão, do aumento dos impostos, de ladrões, de rumores; elas eram as primeiras a sentirem-se ameaçadas e assim tomavam as decisões sempre antes dos homens. Um exemplo claro disso é o medo (como citado) da falta de pão. Talvez por um instinto biológico – materno – as mulheres tinham medo de que seus filhos morressem de fome e por isso eram as primeiras a fazer parte dos protestos.
Por fim, os padres que tinham contato com o povo também estavam ligados à revoltas – principalmente ligadas às imagens utilizadas pela igreja – estes lideravam a multidão e lutavam, muitas vezes, por uma revolução social.
Resumo
A partir da introdução o autor parte para uma forma mais dialética do assunto tema de sua obra, o medo. Procurando contra por as manifestações políticas, sociais e econômicas ao caráter do receio e o medo do outro; entenda que o outro citado é sempre o estrangeiro e tudo que for desconhecido, tanto natural quando místico. Temos assim capítulos estruturados em uma cadeia genérica de manifestações do medo, e por sua vez subdivididos sessões que procuram esmiuçar mais profundamente e detalhadamente cada um dos capítulos que compõe. Isso é a constante nas mais de seiscentas páginas que compõem o livro.
Sabendo da estrutura usada e do tema, prepara-se para um conteúdo que pode lhe surpreender e instigar muita curiosidade. O autor se pauta firmemente em relatos históricos, em documentos da igreja e cartas escritas nas variadas épocas. Curiosos relatos são a principal atração dos fatos relatados. Notamos contudo um texto especifico, garimpado para aflorar toda e qualquer história de medo, e julgando em camuflado ou manifesto e iniciando o relato logo no primeiro capítulo sobre o medo que ele, o autor, julga sendo o mais límpido sem falcas aparências, sendo assim ele atribui ao mar e vem com ricos meandros e curtos debates de épocas sobre este medo e mesmo para os bravos que o desbravavam, o medo seria o limite da ousadia e a distinção de uma tendência ‘Nobre coragem” ou de um plebeu aterrorizado. Percorrendo os mistérios ele vai desembocando de forma muito natural e até relativa nós próximos temas, ou melhor, nós próximos tipos de medo. Fantasmas tem todo um conteúdo especial logo depois do mar e anterior ao medo da noite.
As trevas têm importância grande na parte do medo e englobam uma gama de outros menos consigo. Aqui nota-se muitos medos geradores de tantas lendas que temos na época contemporânea nasceram lá nos séculos XV e XVI, como o curioso relato documentado por padres, e principalmente estes sobre animais, no caso lobos, que invadiam as cidades e devoravam as pessoas sem ao menos rasgares as roupas, uma ligação direta aos atuais lobisomens do nosso atual folclore literário e popular. Ligando as trevas, temos a peste, com a peste bubônica acompanha um grupo de doenças que foram epidêmicas em mais diversos momentos do ocidente.
O medo entra por uma parte mais voltada ao físico e a carne quando se aborda o tema das sedições. Os padres e as mulheres são temas abordados em especial, as sedições dos camponeses são relatadas e dialogadas com os relatos abordados, mas os fatos mais interessantes são o medo em volta da figura feminina, muito bem abordado revelando informações inusitadas e curiosas. As mulheres são chamadas, em uma parte do texto, de “metade subversiva da humanidade”, isto passa bem a ideia dos perigos que o feminino trazia. Não por coincidência que as bruxas e as feiticeiras eram por definição mulheres, o número de homens que eram acusados e julgados por tais práticas sempre foi, infinitamente menor.
Seguindo na segunda parte do livro, temos os medos culturais e suas abordagens diversas, como se a própria cultura incentivasse o medo. A parte escatológica é fundamental nesta parte do argumento, abordando os medos que são guardados no coração que dos individuo independente da religião do indivíduo. O satã, judeus, pagãos, a morte, e todo tipo de medo ou receio que habita no coração do ser onde a única saída é a palavra de Deus. Mas um fator interessante é que somente Deus poderia resguardar seus “filhos” do poder do mau, já que o próprio Deus é incapaz de extirpar satã e todo o mau do mundo.
Feitiçaria não tarda a chegar, apesar de que todo o livro vai se pautando, principalmente quando envolvem as trevas e os lobos, em insinuar à frequente influência das forças da bruxaria e de feitiçaria no transcorrer do tempo. Interessante quanto citar bruxarias e feitiçaria é lembrar que inúmeras superstições e “simpatias” tem sua origem em costumes pagãos, tanto de outras religiões diversas quanto especificamente da religião judaica. A perseguição das práticas de bruxarias, e quaisquer costumes não cristãos, foram veementemente combatidos e a inquisição teve mão forte contra tais práticas. Mais para o final do livro, podemos encontrar uma tabela do número de execuções e a região que ocorreram no decorrer de algumas décadas. Muito importante dizer, que as “marés” de execuções costumavam mudar ao gosto de temporadas, como podemos perceber no texto. Sendo assim poderíamos até mesmo detectar possíveis crises religiosas ou adventos de outros problemas, sejam de ordem popular, de ordem nobre ou de demanda econômica, sempre tendo como “norte” este crescimento da ação religiosa de tempos em tempos.

Continue navegando