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O Brasil: da ditadura à redemocratização e a política social Falta de sincronia entre o tempo histórico brasileiro e os processos internacionais: enquanto os países centrais viviam a reação burguesa ao Welfare State, o Brasil vivia o milagre econômico possibilitado pelo “fordismo a brasileira” que introduziu a produção em massa de automóveis e eletrodomésticos para um consumo em massa restrito. Sendo assim, os anos de 64-70 articulam o crescimento econômico brasileiro com a necessidade de expansão do capital internacional pelo esgotamento do Welfare State, entretanto, o processo de industrialização introduzido não surgiu de um pacto social como nos esforços de guerra e colaboração entre classes dos países centrais, além disso, foi feita com base em uma redistribuição muito restrita dos ganhos de produtividade do trabalho. Entretanto, foi suficiente para ampliar o mercado nacional e para alimentar “os sonhos da casa própria, dos filhos doutores e do “Fuscão” na garagem entre os segmentos médios e de trabalhadores. No mesmo período, expandia-se de forma tecnocrática e conservadora a cobertura da política social brasileira modernizando o projeto varguista, reiterando a expansão dos direitos sociais em meio a restrições dos direitos civis e políticos. Esse é um momento de internacionalização da economia brasileira puxada pelo esgotamento da era de ouro e pela busca do capital por lugares onde houvesse mercado para os bens fordistas com algum potencial de exploração. Dessa forma, os segmentos da burguesia brasileira profundamente associados ao capital estrangeiro promoveram uma expansão econômica, não a redistribuição de riqueza, (exploração da mão de obra e concentração de capital). Nesse período o Brasil chegou a registrar taxas de crescimento entre 11% e 14%, entretanto, tal crescimento se mostrou insustentável em decorrência: Dos limites da ampliação do mercado interno de massas; Da crise internacional; Das contradições mobilizadas entre um desenvolvimento autocrático-burguês e uma massa operária. Contradições levaram a ditadura a reeditar a modernização conservadora, reconfigurando o enfrentamento às questões sociais que passam a ser enfrentadas entre repressão e assistência, tendo em vista manter a mão de obra sob controle. Em meio ao contexto de falta de liberdade, censura, prisão e tortura, o bloco militar- tecnocrático-empresarial buscou adesão e legitimação da população por meio da expansão das políticas sociais. 1965 – Criação da Fundação Nacional para o Bem-Estar do Menor – Funabem) 1966 - unificação, uniformização e centralização da previdência social no Instituto Nacional de Previdência Social (INPS), retirando o controle das previdências das mãos dos trabalhadores, tratando-as como questão técnica. 1967 – acidentes de trabalho passam a ser geridos pelo INPS; Ampliação da previdência para os trabalhadores rurais com características mais redistributivas, por não se fundar na contribuição dos trabalhadores, mas sobre uma irrisória taxação dos contratantes se levarmos em consideração o valor dos salários pagos. (Funrural); 1971 – cobertura previdenciária também alcançou as empregadas domésticas; 1973 – cobertura previdenciária alcançou os autônomos; 1974 – Renda Mensal Vitalícia para os idosos pobres, no valor de meio salário mínimo para aqueles que tiverem contribuído pelo menos um ano para a previdência. 1974 – Ministério da Previdência e Assistência Social foi criado pela incorporação da Legião Brasileira de Assistência (LBA) 1977 – Passa a fazer parte do INPS o Instituto Nacional de Assistência Médica (Inamps)* 1978 – cobertura previdenciária aos ambulantes. 1979 – 2º Código de Menores; Empresa de Processamento de Dados da Previdência Social (Dataprev). * “Nessa associação entre previdência, assistência e saúde, impôs-se uma forte medicalização da saúde, com ênfase no atendimento curativo, individual e especializado, em detrimento da saúde pública, em estreita relação com o incentivo à indústria de medicamentos e equipamentos médico-hospitalares, orientados pela lucratividade” (137). A ditadura também impulsionou uma política nacional de habitação com a criação do Banco Nacional de Habitação (BNH), tratando-se de uma estratégia tipicamente keynesiana de impulsionar a economia pelo incremento da construção civil na construção de moradias populares. Isso marcou um forte período de crescimento das empreiteiras em um contexto de nenhuma transparência e controle dos gastos públicos devido ao estado ditatorial. Tal política combinava-se com a criação de fundos de indenização aos trabalhadores (FGTS, PIS, Pasep) que representavam um mecanismo de poupança forçada para o financiamento de políticas sociais. Na mesma medida em que a ditadura buscava se legitimar pela abertura, mesmo que restrita, da saúde, da previdência e da educação, ela também abria as portas para a medicina privada, a previdência privada e a educação privada criando um sistema dual para aqueles que podem e aqueles que não podem pagar. Independente deste sistema, é importante ressaltar que milhões de pessoas permaneceram fora do complexo assistencial-industrial-tecnocrático-militar. 1974 – começa a se sentir os sinais de esgotamento do projeto tecnocrático e modernizador- conservador do regime militar em decorrência dos impasses da economia internacional e os limites do próprio mercado, marcando os anos de transição para a abertura lenta e gradual. Este processo de transição para a democracia será marcado pelas orientações conservadoras neoliberais como uma adesão tardia à brasileira. Transição para a democracia controlada pelas elites para evitar a radicalização popular devido ao conteúdo de demandas represadas e do aprofundamento das questões sociais que se deram ao longo dos anos de chumbo. Uma transição sem mudanças de poder em uma sociedade que já dava indícios de que não dividiriam os incrementos do milagre econômico, além de perceber os sinais da crise que se avizinhava. 1980 – Década perdida do ponto de vista econômico, mas período de conquistas democráticas em função das lutas sociais e da constituição de 1988. “Na entrada dos anos 1980, tem-se um aprofundamento das dificuldades de formulação de políticas econômicas de impacto nos investimentos e na redistribuição de renda, não só no Brasil, mas no conjunto da América Latina” (138). O endividamento dos países periféricos que aderiram a oferta de crédito do momento expansionista do capital foi severo sendo marcado pela disparada das taxas de juros de praticamente nulas ou negativas em 1980, para um salto de 19% em 1981, chegando a 1982 a 27,5%, comportamento resultante das políticas econômicas norte-americanas em busca da hegemonia do dólar. Isso fez com que houvesse uma explosiva transferência de divisas dos países endividados associado a baixas taxas de exportação de matérias-primas devido ao desaquecimento da produção nos países centrais. O endividamento ainda gerou uma queda nos investimentos do Estado no setor público, o que corroeu suas estruturas e dificultou o ingresso do país na terceira revolução industrial. Entretanto, quanto a dívida, vale ressaltar que a mesma foi contraída em sua maior parte pelo setor privado e por pressões do Fundo Monetário Internacional (FMI), porém, de forma surpreendente, 70% da dívida contraída se tornou estatal no Brasil, o que criou uma contradição: intensa geração de receita de exportações do setor privado e intenso endividamento do setor público. Ao governo só restou cortar gastos públicos, imprimir dinheiro (inflação) e vender títulos da Dívida Pública. Como consequência o país viveu uma explosão inflacionária que saltou de 91% em 1981 para 217,9% em 1985, além disso, também devemos destacar: Empobrecimento generalizado da população; Crise dos serviços sociaispúblicos no período mais crítico para a população; Desemprego; Agudização da informalidade da economia; Favorecimento da produção para exportação em detrimento das necessidades internas. Em decorrência dos eventos, é de se compreender a deslegitimação da população pobre e mediana (aqueles que de fato foram afetados) frente ao regime militar. Se a década de 80 resultou no colapso financeiro da América Latina devido a crise por endividamento, ela foi vivida e sentida nos países centrais que faziam sua passagem para a terceira revolução industrial de forma bastante efusiva, com grandes benefícios as economias centrais, mas as custas das economias periféricas. A crise na América Latina leva a proliferação de planos de reajustamento tanto quanto a falência do Estado e sua incapacidade para cumprir os gastos públicos abre o caminho histórico para o neoliberalismo. Entretanto, os anos 80 foram marcados pelas forças de redemocratização (deslegitimização da ditadura), o que levou as ações constituintes somadas às demandas sociais. Como pauta temos: Reafirmação das pautas democráticas; Impugnação das desigualdades; Afirmação dos direitos sociais; Reafirmação de uma soberania nacional frente as ingerências do FMI; Direitos trabalhistas; Reforma agrária. Se por um lado temos a expansão das lutas sociais, também encontramos nesta época as mudanças em direção a uma nova agenda neoliberal, fazendo da constituinte um processo duro de conflitos e mobilizações tensionando os campos de força. Apesar de prevaleceram os avanços sociais como os direitos sociais, com destaque para a seguridade social, os direitos humanos e políticos que fizeram com que a constituição levasse o nome de “constituição cidadã”, Behring & Boschetti (2012, p.142) afirmam que ela foi estabelecida a partir de acordos realizados pelo “Centrão”. Ao citar Nogueira (1988, p.160), a autora que a constituição expressou “a tendência societal (e particularmente das elites políticas de entrar no futuro com os olhos no passado ou, mais ainda, de fazer história de costas para o futuro”. Dessa forma, a década de 80 foi marcada por um longo período de abertura gradual, por uma forte crise econômica e pelas disputas entre os interesses neoliberais e sociais em torno da constituição. Lutas que se proliferam em torno de diversas áreas como a saúde, a assistência, a educação e as políticas para crianças e adolescentes.
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