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NÚCLEO DE PÓS GRADUAÇÃO CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO Coordenação Pedagógica – IBRA DISCIPLINA CONHECIMENTO GEOGRÁFICO 2 SUMÁRIO 1 - CONHECIMENTO GEOGRÁFICO ............................................................... 3 2 - BASES EPISTEMOLÓGICAS DA GEOGRAFIA E O NOVO MAPA DO MUNDO ............................................................................ 5 3 - NOÇÕES DE TEORIA DO CONHECIMENTO, SENSO COMUM E CIÊNCIA ...................................................................... 15 3.1- EMPIRISMO.............................................................................................. 16 3.2 – RACIONALISMO ..................................................................................... 17 3.3 – REALISMO .............................................................................................. 19 3.4 – IDEALISMO ............................................................................................. 20 3.5 – DOGMATISMO ....................................................................................... 21 3.6 – CETICISMO ............................................................................................ 22 4 - O PENSAMENTO GEOGRÁFICO E SUA HISTORICIDADE A PARTIR DO SÉCULO XIX ........................................................................................ 27 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS UTILIZADAS E CONSULTADAS ............ 32 3 1. CONHECIMENTO GEOGRÁFICO De Bettio (2010, s/p) afirma que: “a Geografia estuda as relações entre o processo histórico que regula a formação das sociedades humanas e o funcionamento da natureza, através da leitura do espaço geográfico e da paisagem.” É desta forma que os Parâmetros Curriculares Nacionais iniciam a delimitação acerca das características e importância social da Geografia. Quando se observa a paisagem atual é possível desvendar inúmeras situações ocorridas naquele ambiente, tanto naturalmente como socialmente. A possibilidade de reparar as mudanças que sofreu determinada montanha e como sua formação rochosa se desenvolveu pode ser feita a partir de como ela é vista atualmente. O mesmo serve para estudar situações do meio social. O espaço no qual o homem está inserido sofre constantes mudanças, pois a evolução do ser humano se reflete no ambiente em que ele se encontra porque este modifica ou mantém as características presentes no local em que está. Sendo assim, quando se pesquisa acerca da totalidade, este estudo deve abranger o espaço topológico, isto é, o espaço vivido e percebido. Transportando tudo isto para dentro da sala de aula – Ensino Fundamental, deve-se levar em consideração a idade dos alunos de determinada série e adequar tais estudos à faixa etária em questão. O item principal deve ser o espaço geográfico, porém, lugar, paisagem e território também devem ter seus lugares na hora do ensino-aprendizado. As explicações sobre o que é território surgiram no final do século XVIII e baseavam-se que território é o espaço ocupado por alguma espécie, sendo animal ou vegetal, e nele acontecem todas as mudanças relacionadas a tal ser. Logo em seguida, outras concepções acerca disso surgiram e defendiam que um território é propriedade de determinada sociedade humana, sendo assim, dominado por um Estado. Geopoliticamente falando: “território é o espaço nacional ou área controlada por um Estado-nacional”. Não esquecendo, que a construção de um território é a partir de uma formação social. Envolvidas mais essas questões a respeito das delimitações de um território, entra em questão, novamente, o ensino aos discentes, pois, apesar das divisões e propriedades de um território, dentro de um único destes " 4 pode haver bastante divergência, ou seja, diferentes culturas, crenças, etnias, visões políticas, pensamentos, entre outros. É a partir de toda essa variedade que cada território cria sua identidade nacional. Dentro da Geografia existem as categorias que dão nome a cada especificidade, como por exemplo, território e paisagem. Este penúltimo pode ser considerado o conjunto da última, isto é, ambas as categorias citadas estão interligadas. A diferença é que paisagem, na Geografia, é considerada como uma unidade visível, que, a partir dela, podem ser representados o passado e o presente, para deixar bem claro: “A paisagem é o velho no novo e o novo no velho!” Em todos os anos escolares, desde seu princípio, o aluno deve entender sua função dentro do espaço em que se encontra inserido, além disso, deve compreender que sociedade e natureza estão intimamente ligadas e estão sempre se modificando e que ele, o estudante, faz parte desse todo. As consequências de seus atos também devem ser pensadas com reflexos regionais, nacionais e até mundiais, pois o ser humano faz parte da sociedade e da natureza. (DE BETTIO, 2010, s/p) " 5 2. BASES EPISTEMOLÓGICAS DA GEOGRAFIA E NOVO MAPA DO MUNDO - A geografia tradicional: Para Lopes (2010, s/p) baseado no que discerne Diniz Filho (2009), a Geografia Tradicional se divide em três vertentes que se expressam no determinismo ambiental, o possibilismo e a abordagem que considera a diferenciação de áreas. O pressuposto básico dessa Corrente é a ideia de que a geografia era classificada como uma ciência de síntese, ou ciência de contato entre as disciplinas que estudam a natureza e as sociedades. O autor também expõe que os temas de pesquisas principais da geografia tradicional eram as relações homem- natureza, a distribuição dos elementos físicos e humanos na superfície da Terra e as formas de integração entre esses elementos. Assim sendo, cada uma dessas vertentes acima citadas, constituía uma proposta diferente de realização da síntese geográfica, mas aquela que acaba por predominar na primeira metade do século XX foi aquela que privilegia o estudo regional, mas especificamente em sua versão possibilista. A escala regional passou a ser vista como aquela em que melhor se realiza a síntese geográfica, principalmente devido à dificuldade de se estabelecer leis gerais pelo estudo da relação homem-meio. - O positivismo lógico ou Neopositivismo: De acordo com Lopes (2010, s/p) baseado em Diniz Filho (2009), diante à descrença e crise que circundava o positivismo clássico, o neopositivismo surge entre as décadas de 1920 e 1930, passando a se tornar efetivamente influente somente a partir dos anos 1950, onde as ciências sociais como a geografia foram afetadas por seus pressupostos. Diante desse contexto, surgiu a geografia quantitativa, que tem como base a substituição do estudo das relações homem-natureza materializada na paisagem pela sugestão de que o objeto da geografia é a organização espacial, ou seja, os padrões de distribuição dos elementos físicos e humanos na superfície terrestre e as relações espaciais. Assim, Lencioni (1999) afirma que o ponto de vista do positivismo lógico percebe que deve existir clareza nos resultados de qualquer investigação, tendo de ser notória a afirmação da ocorrência de fatos empíricos, onde também se deve buscar uma linguagem comum a todas as ciências, escolhendo a matemática como linguagem comum, onde o rigor cientifico será expresso através da lógica. " 6 - A perspectiva humanista em Geografia: Conforme Lopes (2010, s/p) para Lencioni (2009), essa abordagem geográfica significou um novo trilhar da Geografia, fazendo com que o espaço deixasse de ser a referência central devido a sua dimensão abstrata. Onde o espaço vivido, aquele que é edificado socialmente a partir dapercepção das pessoas, passaria a ser a referencia mais importante a ser seguida. Mais do que isso, espaço vivido pode também ser entendido como aquele interpretado pelos indivíduos e revelador das práticas sociais. E segundo Diniz Filho (2009), essa corrente é a tendência do pensamento geográfico que estuda as experiências de indivíduos e grupos em relação ao espaço com o escopo de compreender seus comportamentos e valores. Esse modelo geográfico procura servir como ferramenta de autoconhecimento para o homem, sendo que o subsídio da Geografia nesse empreendimento está nos conhecimentos que oferece acerca dos numerosos tipos de percepção, atitudes e valores relativos ao espaço e à natureza. - A perspectiva pós-modernista: De acordo com Lopes (2010, s/p) mediante as palavras de Diniz Filho (2009), o pós-modernismo utiliza as contribuições de varias correntes geográficas e não se constitui efetivamente uma corrente geográfica definida ou uma escola de pensamento cientifico, mediante ao seu ecletismo, sendo que ela tece uma critica alguns pontos do marxismo e do positivismo. E ainda conforme o autor anteriormente citado, as epistemologias classificáveis como pós- modernas se apresentam o foco de suas críticas é justamente a racionalidade do modelo normativo de ciência, que coloca a possibilidade de estabelecer teorias objetivas expressas numa linguagem lógica (matemática ou discursiva) e a partir da aplicação de métodos austeros. Diniz Filho (2009), afirma que o pós-modernismo não utiliza conceitos científicos operacionalizáveis para o estudo de objetos precisos, mas sim procedimentos que indicam certas percepções fundamentais que regulam as reflexões e condutas intelectuais, políticas, morais e estéticas. Já Lencioni (1999), lança a ideia de que os pós-modernistas se caracterizam por um profundo ecletismo, onde o conhecimento é produzido através da utilização da mistura das várias correntes do pensamento. - Geografia Crítica: Lopes (2010, s/p) afirma que com o intuito de promover uma critica radical ao capitalismo, alguns geógrafos objetivaram e produziram uma a " 7 Geografia Critica, onde segundo Diniz Filho (2009), os adeptos desse modelo geográfico defendem um conjunto de pressupostos afinados com esse objetivo, destacando ai a tese de que as mazelas socioespaciais e ambientais da época presente são inerentes ao desenvolvimento do capitalismo; a visão de que a geografia se diferencia das outras ciências da sociedade justamente por analisar o espaço social e as formas de apropriação da natureza; e a aversão ao princípio da neutralidade do método, em nome de uma ciência que se sugere libertadora. Citando Lencioni (1999), nota-se que essa corrente incorpora o marxismo à Geografia elegendo algumas análises geográficas tornando-as centrais, como no caso do modo de produção capitalista, as relações sociais de produção, o desenvolvimento das forças produtivas e a ênfase dada à história. (LOPES, 2010, s/p) Nesse âmbito Mazetto (2008, s/p) aponta que as mudanças no panorama mundial não se limitam às fronteiras políticas dos Estados, pois elas se aplicam com maior relevância nas relações sociais humanas. É plenamente perceptível que o capitalismo alcançou uma hegemonia nunca antes registrada na história, não somente como sistema social e econômico, mas também uma perigosa hegemonia ideológica que avança até nos meios acadêmicos. Entre as ciências sociais, a Geografia apresentou um progresso teórico bastante tardio, levando-se em consideração o desenvolvimento das correntes filosóficas que deram sustentação a todas as ciências. Durante muito tempo a ciência geográfica se apegou aos princípios positivistas, sendo que sua influência se estendeu até a primeira metade do século XX. Na fase pioneira da estruturação da Geografia deve-se registrar a contribuição libertária de precursores como Élisée Reclus e Pietr Kropotkin que, embora positivistas, adotaram algo da práxis marxista e anarquista. Contudo, o referencial teórico que prevaleceu durante a fase clássica foi o positivismo, na escola determinista de Ratzel e na possibilista de La Blache. Como essas duas escolas mantinham forte vínculo com o estado burguês capitalista em expansão colonial, houve apoio e subsídios para o seu desenvolvimento no âmbito acadêmico. Após o término da II Grande Guerra, os postulados clássicos descritivos da paisagem estavam esgotados e se procura novos paradigmas com uma Nova " 8 Geografia. Mas, essa Nova Geografia foi um positivismo revisto, agora introduzindo técnicas inovadoras, como o largo emprego de modelos matemáticos e estatísticos. Para Andrade (1987), a ação dos neopositivistas produziu trabalhos que foram de grande utilidade para o desenvolvimento do planejamento capitalista. Ao mesmo tempo, essa abordagem teórica não apresenta uma análise crítica ao modo de produção capitalista, apresentando um caráter tecnocrático com falsa neutralidade, que não incomoda os princípios da economia de mercado e a consequente injustiça social que esse modelo econômico provoca. O pensamento crítico e o humanista somente ganharam corpo nos estudos geográficos a partir a década de 60 do século passado, já que a corrente quantitativa neopositivista saiu na frente, servindo aos interesses tanto do Estado Capitalista como ao Comunista durante a Guerra Fria, dando sequência ao papel desempenhado por sua antecessora, a corrente clássica descritiva. Entretanto, as pressões sociais aumentaram significativamente na segunda metade do século XX. A disputa entre o capitalismo e o comunismo pelo domínio de vastas áreas do Mundo Subdesenvolvido, gerou guerras e conflitos periféricos que agravaram ainda mais a situação dos países mais pobres do mundo. A economia capitalista de consumo recebe um grande impulso a partir da década de 50 nos países centrais, principalmente nos EUA. Para alimentar a produção de bens de consumo em larga escala, esses países empreendem nova expansão neocolonial, com a finalidade de garantir suprimento de matérias-primas e fontes de energia para o seu desenvolvimento industrial. Mais tarde esse processo vai se sofisticando, procurando no Terceiro Mundo também mão-de-obra barata, via migrações e instalação de unidades industriais cujo funcionamento ficou inviável no país sede. (MAZETTO, 2008, s/p) Com o fim do “socialismo real”, de acordo com Mazetto (2008, s/p) no Leste Europeu no início da década de 90, o sistema capitalista passa a desfrutar de uma hegemonia inédita, podendo agora expandir seus domínios sem grandes barreiras políticas e ideológicas. O processo de globalização da economia, com base no ideário neoliberal, abranda as últimas resistências ao seu avanço. O Estado Nação independente se coloca como um obstáculo a ser vencido, na corrida do grande capital para se apoderar das economias periféricas e emergentes. Como já havia " 9 sido previsto por Perroux (1964), na economia do futuro as grandes corporações econômicas teriam um peso maior do que muitas nações. O número de adeptos do neoliberalismo se multiplica rapidamente a partir da década de 90, depois da ganhar terreno em alguns países centrais como no Reino Unido com o governo Thatcher e nos EUA com o governo Reagan. O chamado processo de “desregulamentação da economia” promete crescimento econômico e mais emprego. De fato, a taxa de desemprego cai nesses dois países e o crescimento econômico é expressivo. Mas, tudo isso a custa da concentração de renda, enfraquecimento da proteção social à população mais carente, baixos salários, combate às leis e garantias trabalhistas e o poder dos sindicatos, que foram vitórias arduamente conquistadas pelostrabalhadores em mais de um século de lutas. A privatização de empresas estatais foi outra cruzada empreendida pelos neoliberais para se apoderarem dos setores vitais e estratégicos das economias dos países europeus e emergentes. Muitos desses países tiveram suas economias desnacionalizadas ou globalizadas, com a venda de suas empresas por preços subavaliados e fraudulentos. Mesmo países centrais do capitalismo como o Reino Unido, perderam quase todas as suas empresas estratégicas, como a automobilística e de telecomunicações, para companhias estrangeiras e especuladores internacionais. Entre os emergentes, o Brasil e o México foram as maiores vítimas desse processo, abrindo o capital de suas melhores empresas para as grandes corporações transnacionais. O Chile foi outro país emergente dito bem sucedido no modelo neoliberal, sendo o primeiro a adotar os princípios dessa doutrina. Mas, esse país apresenta hoje apenas os indicadores macroeconômicos positivos, sendo um país dependente de exportação de produtos primários com reduzidos benefícios para a maioria de sua população. Segundo Santos (2000), o processo do desenvolvimento do capitalismo neoliberal passa atualmente da fase de concorrência para a fase competitiva, sendo que a concorrência pode ser saudável, pois pressupõe que existam regras estabelecidas cuja não observação significa a perda da reputação da empresa. Na fase competitiva, não há regras e tudo vale para se alcançar os melhores níveis de lucro. As pessoas são estimuladas a disputarem entre si um lugar ao sol, e se algo de errado ocorre o problema é com as pessoas e não com o sistema. Nesse " 10 ambiente de autêntico darwinismo social, as empresas procuram profissionais “agressivos” que possam maximizar os lucros em escala nunca antes atingida. A nova ideologia dominante do neoliberalismo tem origem no movimento contra a política econômica keynesiana adotada pelas economias centrais em resposta à Crise de 1929 e a consequente Grande Depressão dos anos 30, ocorrida ainda no período do liberalismo clássico. Porém, após a contribuição da “Escola Austríaca” de Hayek na década de 40, o pensamento neoliberal se reformulou, passando a combater o intervencionismo estatal na economia capitalista. Foram necessárias quatro décadas para que os princípios neoliberais fossem adotados mais intensamente por países de economia central e posteriormente pelos países emergentes. (MAZETTO, 2008, s/p) O êxito da disseminação da ideologia neoliberal, para Mazetto (2008, s/p) nos anos 80 foi largamente beneficiado com o fim do regime comunista na Rússia, e dos países do Leste Europeu resultando também em mudanças na própria consciência coletiva das massas populares que, em um primeiro momento, identificaram os fundamentos neoliberais com a liberdade e democracia. Para Claval (1979), a propagação dos fundamentos ideológicos se vale dos meios de comunicação de massa. Os valores morais do capitalismo de consumo são ampliados em escala monumental com o advento dos modernos meios de comunicação, constituindo um poderoso instrumento de conversão e dominação da população. Antes, esses métodos de propaganda ideológica, já tinham sido amplamente utilizados pelos regimes fascistas e stalinistas. Porém, nos países do capitalismo liberal, designados como democráticos, a propaganda ideológica massificada esteve quase que restrita aos EUA até a II Grande guerra. Entre os valores mais cultuados no capitalismo liberal está o direito de propriedade particular dos meios de produção mesmo que sem finalidade social, pressuposto da liberdade do mercado econômico. Então, cria- se o mito de que toda a população pode ascender socialmente, desfrutando da terra das oportunidades. Como salienta Frémont (1980), quando o espaço é afetado por profundas e brutais transformações econômicas e sociais, determinada parcela da população pode não se adaptar ao novo ambiente gerado. O impacto do capitalismo sobre comunidades tradicionais, por exemplo, pode ser avassalador, destruindo o modo de vida e os valores sociais que foram elaborados ao longo de milhares de anos. " 11 Com o novo mapa do mundo, advindo da globalização neoliberal, os geógrafos e outros cientistas sociais, parecem atordoados, não conseguindo mais ajustar seu foco de estudo. Os postulados da geografia crítica parecem anacrônicos e desacreditados diante da realidade uniforme e destoante. A geografia humanista voltada para as peculiaridades do indivíduo e do grupo social ainda não corresponde aos anseios para um espaço alienado e pasteurizado, mais útil ao sistema vigente. Entre as três principais correntes metodológicas da Geografia, a quantitativa ganha novamente espaço nas academias como um método mais confiável e suscetível de ser manipulado pela ordem estabelecida. Depois de servir aos governos capitalistas e comunistas ditatoriais e autoritários (Andrade, 1993), a corrente quantitativa neopositivista conservadora agora se coloca a serviço das forças mais reacionárias do establishment do capitalismo central. (MAZETTO, 2008, s/p) De acordo com Mazetto (2008, s/p) o mundo atual coloca um desafio às ciências sociais e a Geografia em particular. Como manter a independência acadêmica, o livre pensamento e a atuação profissional frente a uma modelo de sociedade monolítico? Como refutar o dogmatismo científico? Para uma resposta eficaz seria útil realizar pelo menos uma breve análise histórica do desenvolvimento epistemológico das ciências sociais e possivelmente se fazer uma projeção para seu futuro. - Os sinais do esgotamento do modelo neoliberal: uma nova geografia pós- moderna? Segundo Mazetto (2008, s/p) o domínio do capital financeiro sobre o produtivo, a mola mestra da fase atual do capitalismo, já apresenta evidentes sinais fissuras. A instabilidade dos mercados financeiros e as bolhas especulativas ficam cada vez mais à mostra, embora os governos dos países centrais, solidários em salvaguardar os interesses de empresas fantasmas e grandes especuladores, tentam a todo modo camuflar as rachaduras de um castelo que está ruindo. Na potência hegemônica, os EUA, onde a receita liberal sempre foi a característica mais autêntica de sua organização social, também é onde se percebe mais claramente o esgotamento dessa ordem. Primeiro, foram as fraudes de balanços financeiros de grandes empresas de telecomunicações no final da década de 90. Mas, tudo isso foi esquecido com o atentado de 11 de setembro de 2001 e a Guerra do Afeganistão e Iraque. Agora, são as grandes instituições financeiras que são vítimas de sua própria ganância e irresponsabilidade em querer aferir lucros cada vez maiores em menor " 12 tempo possível. Além disso, o próprio governo norte-americano é perdulário e tem déficit crônico há décadas. Para manter essa situação, o capitalismo norte- americano confiava no tripé constituído pelo poder militar, poder do dólar e controle das fontes de petróleo para financiar indefinidamente sua economia sem lastro. Porém, o elo mais frágil dessa corrente, o dólar, começa a esmorecer frente ao crescente poder do euro, uma moeda vinculada a economias mais sólidas e responsáveis. A era de Bretton Woods começa a chegar perto do fim e a confiança no dólar como moeda padrão fica cada vez mais abalada. Em meio à crise das hipotecas, o Banco Central Americano (Fed) rasga os preceitos neoliberais e faz fortes intervenções keynesianas no mercado financeiro tentando saná-lo. Como em 1929, fica evidente que o liberalismo econômico resulta em crises econômicas, mas não consegue resolvê-las com a “mão invisível” e sem a intervenção do Estado. Para Sodré (1998), o neoliberalismo não apresenta nada substancial de novo em relação ao velho liberalismo,apenas disfarçado em novas roupagens, ele em nada muda a velhas estruturas do Estado Burguês. Na verdade, esse sistema consagra o que existe de mais obsoleto na ordem econômica mundial: imperialismo, neocolonialismo, concentração de renda e maximização de lucros. Com todas essas transformações do mundo contemporâneo como fica a atuação dos geógrafos no Terceiro Milênio. Existe um equívoco em considerar as ideologias clássicas como ultrapassadas e que não respondem à conjuntura atual. Em verdade, nada de profundamente inovador foi criado em substituição ao marxismo, humanismo cultural e positivismo. Mesmo essas teorias foram resultados do desenvolvimento filosófico desde os clássicos gregos, passando pela Idade Média, Renascimento e Iluminismo. A Pós-modernidade carece de fundamentos filosóficos e epistemológicos para considerá-la como uma teoria socioeconômica. Em tudo, ela emana uma tentativa de conciliar a Era da Globalização com as antigas teorias sociais, não apresentando nada de novo em seu arcabouço teórico e metodológico. A expressão pós-moderna também pode ser considerada revisionista, quando tenta adaptar de forma positiva os preceitos do marxismo e humanismo para a nova sociedade pós-industrial, com uma postura conservadora fazendo concessões intoleráveis ao status quo. Para Harvey (2003), a nova condição pós- " 13 moderna da sociedade pressupõe a diversificação se seus valores que a levaria à sua fragmentação. Contudo, a pseudo teoria pós-moderna se embriaga com os aspectos exteriores da última fase do capitalismo tardio (Mandel, 1995), não tocando no cerne da questão social que é o modo de produção e distribuição da riqueza no sistema capitalista. O avanço do processo produtivo na economia de alta tecnologia é considerado como revolucionário, quando na verdade ele não está mudando nada na essência, apenas intensificando o processo de acumulação de capital, cada vez mais concentrado em poucos países e corporações. Outro tema abordado é a imagem da mercadoria. Hoje, se vende não só a mercadoria, mas também sua imagem. Mas, a propaganda que constrói a imagem é a verdadeira alma do negócio capitalista, e isso já vem se desenvolvendo há mais de um século. A geografia da pós-modernidade me parece pobre em fundamentos epistemológicos. Ao mesmo tempo em que mantém distância do positivismo quando tenta dar relevância aos aspectos culturais da sociedade, dele se aproxima quando apresenta uma indisfarçável aceitação do processo de globalização do capitalismo, como sendo uma característica do sistema-mundo, natural como o próprio nascer do sol a cada manhã. Há que se rejeitar essa postura conformista e colaboracionista com o poder do capital. A Geografia como todas as ciências sociais, deve ser um instrumento a mais para transformar a sociedade e não compactuar de forma complacente com o poder. A sociedade atual não clama mais por mudanças, o efeito devastador da mídia eletrônica, aparelho ideológico do sistema, conseguiu convencer as pessoas de que o único caminho a ser seguido é este que está estabelecido. O filósofo Lipovetsky (2004), de forma prudente, prefere utilizar a expressão hipermodernidade para definir os tempos atuais. Para o autor, a sociedade atual não ultrapassou a Era da Modernidade somente porque sofisticou as formas de acumulação do capital. A era hipermoderna está dominada pelo hiperconsumo, tudo se faz para obter os bens de consumo, sendo que a própria pessoa humana se torna uma mercadoria. O “fetiche da mercadoria” é sucedido pelo “fetiche da marca”, o que importa é conquistar os bens que o sistema elegeu como sinônimo de alegria, felicidade e bem estar. Neste processo não há lugar para todos e os excluídos da festa do consumo " 14 são tratados como parias da sociedade, incapazes de serem felizes em um mundo repleto de oportunidades para tal façanha. As massas desfavorecidas da hipermodernidade se revoltam, mas de maneira anárquica e sem coesão de propósitos. A luta é de ímpeto individual e fútil, com violência gratuita e sem causa, não se procura mudanças na organização social, apenas se ajustar aos seus padrões de consumo mesmo que por métodos ilícitos, gerando as sociedades do medo. A sociedade sem medo para Tuan (2005) ainda pode ser encontrada nas comunidades primitivas de nativos americanos, africanos e asiáticos. Nelas, o espírito comunitário está ainda forte e presente. Apesar de contar com parcos recursos materiais e tecnológicos, a comunidade se sente segura devido aos fortes vínculos coletivistas entre os indivíduos. Para sua reprodução, a última fase do capitalismo tardio necessita da fragmentação social e majorar o individualismo e o consumismo. Os geógrafos têm um importante papel no estudo e interpretação da sociedade contemporânea, bem como na contestação da ordem estabelecida se assim o julgar melhor. Finalmente, não devem abrir mão da independência acadêmica e da militância política na qualidade de cidadãos livres e engajados nos movimentos sociais. (MAZETTO, 2008, s/p) " 15 3. NOÇÕES DE TEORIA DO CONHECIMENTO, SENSO COMUM E CIÊNCIA Para Santos (s/d, s/p) a necessidade de procurar explicar o mundo dando-lhe um sentido e descobrindo-lhe as leis ocultas é tão antiga como o próprio Homem, que tem recorrido para isso quer ao auxílio da magia, do mito e da religião, quer, mais recentemente, à contribuição da ciência e da tecnologia. Mas é, sobretudo, nos últimos séculos da nossa História, que se tem dado a importância crescente aos domínios do conhecimento e da ciência. E se é certo que a preocupação com este tipo de questões remonta já à Grécia antiga, é, porém a partir do séc. XVIII que a palavra ciência adquire um sentido mais preciso e mais próximo daquele que hoje lhe damos. É também, sobretudo a partir desta época que as implicações da atividade científica na nossa vida quotidiana se têm tornado tão evidentes, que não lhe podemos ficar indiferentes. O que é o conhecimento científico, como se adquire, o que temos implícito quando dizemos que conhecemos determinado assunto, em que consiste a prática científica, que relação existe entre o conhecimento científico e o mundo real, quais as consequências práticas e éticas das descobertas científicas, são alguns dos problemas com que nos deparamos frequentemente. (...) A teoria do conhecimento se interessa pela investigação da natureza, fontes e validade do conhecimento. Entre as questões principais que ela tenta responder estão as seguintes. O que é o conhecimento? Como nós o alcançamos? Podemos conseguir meios para defendê-lo contra o desafio cético? Essas questões são, implicitamente, tão velhas quanto à filosofia. Mas, primordialmente na era moderna, a partir do século XVII em diante - como resultado do trabalho de Descartes (1596- 1650) e Locke (1632-1704) em associação com a emergência da ciência moderna – é que ela tem ocupado um plano central na filosofia. Basicamente é conceituada como o estudo de assuntos que outras ciências não conseguem responder e se divide em quatro partes, sendo que três delas possuem correntes que tentam explica-las: I - O conhecimento como problema, II - Origem do Conhecimento e III - Essência do Conhecimento e IV - Possibilidade do Conhecimento. - O Conhecimento Quanto à Origem: a polêmica racionalismo-empirismo tem sido uma das mais persistentes ao longo da história da filosofia, e encontra eco ainda hoje em diversas posições de epistemólogos ou filósofos da ciência. Abundam, ao " 16 longo da linha constituída nos seus extremos pelo racionalismo e pelo empirismo radicais, as posições intermédias, as tentativas de conciliação e de superação, como veremos aseguir. (SANTOS, s/d, s/p) 3.1 EMPIRISMO De acordo com Santos (s/d, s/p) “o empirismo pode ser definido como a asserção de que todo conhecimento sintético é baseado na experiência.” (RUSSEL). Conceitua-se empirismo, como a corrente de pensamento que sustenta que a experiência sensorial é a origem única ou fundamental do conhecimento. Originário da Grécia Antiga, o empirismo foi reformulado através do tempo na Idade Média e Moderna, assumindo várias manifestações e atitudes, tornando-se notável as distinções e divergências existentes. Porém, é notório que existem características fundamentais, sem as quais se perde a essência do empirismo e a qual, todos os autores conservam que é a tese de que todo e qualquer conhecimento sintético haure sua origem na experiência e só é válido quando verificado por fatos metodicamente observados, ou se reduz a verdades já fundadas no processo de pesquisa dos dados do real, embora, sua validade lógica possa transcender o plano dos fatos observados. Como já foi dito anteriormente, existe no empirismo divergência de pensamentos, e é exatamente esse aspecto que abordaremos a seguir. São três, as linhas empíricas, sendo elas: a integral, a moderada e a científica. O empirismo integral reduz todos os conhecimentos – inclusive os matemáticos – à fonte empírica, àquilo que é produto de contato direto e imediato com a experiência. Quando a redução é feita à mera experiência sensível, temos o sensismo (ou sensualismo). É o caso de John Stuart Mill, que na obra Sistema da Lógica diz que todos os conhecimentos científicos resultam de processos indutivos, não constituindo exceção as verdades matemáticas, que seriam resultado de generalizações a partir de dados da experiência. Ele apresenta a indução como único método científico e afirma que nela resolvem-se tanto o silogismo quanto os axiomas matemáticos. O empirismo moderado, também denominado genético-psicológico, explica que a origem temporal dos conhecimentos parte da experiência, mas não reduz a " 17 ela a validez do conhecimento, o qual pode ser não empiricamente valido (como nos casos dos juízos analíticos). Uma das obras baseadas nessa linha é a de John Locke Ensaios sobre o Entendimento Humano, na qual ele explica que as sensações são ponto de partida de tudo aquilo que se conhece. Todas as ideias são elaborações de elementos que os sentidos recebem em contato com a realidade. Como já foi dito, para os moderados há verdades universalmente validas, como as matemáticas, cuja validez não assenta na experiência, e sim no pensamento. Na doutrina de Locke, existe a admissão de uma esfera de validade lógica a priori e, portanto não empírica, no que concerne aos juízos matemáticos. Por fim, há o empirismo científico, que admite como válido, o conhecimento oriundo da experiência ou verificado experimentalmente, atribuindo aos juízos analíticos significações de ordem formal enquadradas no domínio das fórmulas lógicas. Esta tendência está longe de alcançar a almejada “unanimidade cientifica”. (SANTOS, s/d, s/p) 3.2 RACIONALISMO De acordo com Santos (s/d, s/p) é a corrente que assevera o papel preponderante da razão no processo cognoscitivo, pois, os fatos não são fontes de todos os conhecimentos e não nos oferecem condições de “certeza”. Um dos grandes representantes do racionalismo, Gottfried Leibniz, afirma em sua obra Novos Ensaios sobre o Entendimento Humano, que nem todas as verdades são verdades de fato; ao lado delas, existem as verdades de razão, que são aquelas inerentes ao próprio pensamento humano e dotadas de universalidade e certeza (como por exemplo, os princípios de identidade e de razão suficiente), enquanto as verdades de fato são contingentes e particulares, implicando sempre a possibilidade de correção, sendo válidas dentro de limites determinados. Ainda retratando o pensamento racionalista, encontramos Renée Descartes, adepto do inatismo, que afirma que somos todos possuidores, enquanto seres pensantes, de uma série de princípios evidentes, ideias natas, que servem de fundamento lógico a todos os elementos com que nos enriquecem a percepção e a representação, ou seja, para ele, o racionalismo se preocupa com a ideia fundante que a razão por si mesma logra atingir. Esses dois pensadores podem ser " 18 classificados como representantes do racionalismo ontológico, que consiste em entender a realidade como racional, ou em racionalizar o real, de maneira que a explicação conceitual mais simples se tenha em conta da mais simples e segura explicação da realidade. Existe também uma outra linha racionalista, originada de Aristóteles, denominada intelectualismo, que reconhece a existência de “verdades de razão” e, além disso, atribui à inteligência função positiva no ato de conhecer, ou seja, a razão não contém em si mesma, verdades universais como ideias natas, mas as atinge à vista dos fatos particulares que o intelecto coordena. Concluindo: o intelecto extrai os conceitos ínsitos no real, operando sobre as imagens que o real oferece. Hessen, um dos adeptos do intelectualismo, lembra que há nele uma concepção metafísica da realidade como condição de sua gnosiologia, que é conceber a realidade como algo de racional, contendo no particularismo contingente de seus elementos, as verdades universais que o intelecto “lê” e “extrai”, realizando- se uma adequação plena entre o entendimento e a realidade, no que esta tem de essencial. Por fim, devemos citar uma ramificação do racionalismo que alguns autores consideram autônoma, que é o Criticismo. O criticismo é o estudo metódico prévio do ato de conhecer e dos modos de conhecimento, ou seja, uma disposição metódica do espírito no sentido de situar, preliminarmente o problema do conhecimento em função da relação “sujeito-objeto”, indagando as suas condições e pressupostos. Ele aceita e recusa certas afirmações do empirismo e racionalismo, por isso, muitos autores acreditam em sua autonomia. Entretanto, devemos entender tal posição como uma análise crítica e profunda dos pressupostos do conhecimento. Seu maior representante, Immanuel Kant, tem como marca a determinação a priori das condições lógicas das ciências. Ele declara que o conhecimento não pode prescindir da experiência, a qual fornece o material cognoscível e nesse ponto coincide com o empirismo. Porém, sustenta também que o conhecimento de base empírica não pode prescindir de elementos racionais, tanto que só adquire validade universal quando os dados sensoriais são ordenados pela razão. Segundo palavras do próprio autor, “os conceitos sem as intuições são vazios; as intuições sem os " 19 conceitos são cegas”. Para ele, o conhecimento é sempre uma subordinação do real à medida do humano. Conclui-se então, que pela ótica do criticismo, o conhecimento implica sempre numa contribuição positiva e construtora por parte do sujeito cognoscente em razão de algo que está no espírito, anteriormente à experiência do ponto de vista gnosiológico. (SANTOS, s/d, s/p) - O conhecimento quanto à Essência: Para Santos (s/d, s/p) nessa parte do estudo, analisaremos o ponto da Teoria do Conhecimento em que há mais divergências, sendo estas fundamentais pra o pleno conhecimento do assunto, que é o realismo e o idealismo. 3.3 REALISMO Sabendo que a palavra realismo vem do latim res (coisa), podemos conceituar essa corrente como a orientação ou atitude espiritual que implica uma preeminência do objeto, dada a sua afirmação fundamental de que nós conhecemos coisas. Em outras palavras, é a independência ontológica da realidade, ou seja, o sujeito em função do objeto. O realismo é subdividido em três espécies. O realismo ingênuo,o tradicional e o crítico. O realismo ingênuo, também conhecido como pré-filosófico, é aquele em que o homem aceita a identidade de seu conhecimento com as coisas que sua mente menciona, sem formular qualquer questionamento a respeito de tal coisa. É a atitude do homem comum, que conhece as coisas e as concebem tais e quais aparecem. Já o realismo tradicional é aquele em que há uma indagação a respeito dos fundamentos, há uma procura em demonstrar se as teses são verdadeiras, surgindo uma atitude propriamente filosófica, seguindo a linha aristotélica. Por último, podemos citar o realismo científico, que é a linha do realismo que acentua a verificação de seus pressupostos concluindo pela funcionalidade sujeito- objeto e distinguindo as camadas conhecíveis do real como a participação - não apenas criadora - do espírito no processo gnosiológico. Para os seguidores desse pensamento, conhecer é sempre conhecer algo posto fora de nós, mas que, se há " 20 conhecimento de algo, não nos é possível verificar se o objeto - que nossa subjetividade compreende - corresponde ou não ao objeto tal qual é em si mesmo. Há, portanto, no realismo, uma tese ou doutrina fundamental de que existe uma correlação ou uma adequação da inteligência a “algo” como objeto do conhecimento, de maneira que nós conhecemos quando a nossa sensibilidade e inteligência se conformam a algo de exterior a nós. De acordo com o modo de compreender-se essa “referibilidade a algo”, bifurca-se o realismo em tradicional e o crítico, que são as duas linhas pertinentes à filosofia. (SANTOS, s/d, s/p) 3.4 IDEALISMO Conforme (Santos, s/d, s/p) surgiu na Grécia Antiga com Platão, denominado de idealismo transcendente, onde as ideias ou arquétipos ideais representam a realidade verdadeira, da qual seriam as realidades sensíveis, meras copias imperfeitas, sem validade em si mesmas, mas sim enquanto participam do ser essencial. O idealismo de Platão reduz o real ao ideal, resolvendo o ser em ideia, pois como ele já dizia, as ideias são o sol que ilumina e torna visíveis as coisas. Alguns autores entendem que a doutrina platônica poderia ser vista como uma forma de realismo, pois para eles, o idealismo “verdadeiro” é aquele desenvolvido a partir de Descartes. O que interessa à Teoria do Conhecimento é o idealismo imanentista, que afirma que as coisas não existem por si mesmas, mas na medida e enquanto são representadas ou pensadas, de maneira que só se conhece aquilo que se insere no domínio de nosso espírito e não as coisas como tais, ou seja, há uma tendência a subordinar tudo à formas espirituais ou esquemas. No idealismo, que é a compreensão do real como idealidade (o que equivale dizer a realidade como espírito), o homem cria um objeto com os elementos de sua subjetividade, sem que algo preexista ao objeto (no sentindo gnosiológico). Sintetizando, o idealismo é a doutrina ou corrente de pensamento que subordina ou reduz o conhecimento à representação ou ao processo do pensamento mesmo, por entender que a verdade das coisas está menos nelas do que em nós, em nossa consciência ou em nossa mente, no fato de serem “percebidas” ou “pensadas”. Dentro dessa concepção existem duas orientações idealistas. Uma é a " 21 do idealismo psicológico ou conscienciológico, onde o que se conhece não são as coisas e sim a imagem delas. Podemos conceituá-lo como aquele em que a realidade é cognoscível se e enquanto se projeta no plano da consciência, revelando-se como momento ou conteúdo de nossa vida interior. Também chamado de idealismo subjetivo, este diz que o homem não conhece as coisas, e sim a representação que a nossa consciência forma em razão delas. Seus representantes são Hume, Locke e Berkeley. A outra é a orientação idealista de natureza lógica, que parte da afirmação de que só conhecemos o que se converte em pensamento, ou é conteúdo de pensamento. Ou seja, o ser não é outra coisa senão ideia. Seu maior representante, Hegel, diz em uma de suas obras que nós só conhecemos aquilo que elevamos ao plano do pensamento, de maneira que só há realidade como realidade espiritual. Resumindo: na atitude psicológica, ser é ser percebido e na atitude lógica, ser é ser pensado. - Possibilidade do Conhecimento: Essa parte da teoria do conhecimento é responsável por solucionar a seguinte questão: qual a possibilidade do conhecimento? Para que seja possível respondê-la, muitos autores recorrem a duas importantes posições: o dogmatismo e o ceticismo, os quais veremos abaixo. (SANTOS, s/d, s/p) 3.5 DOGMATISMO É a corrente que se julga em condições de afirmar a possibilidade de conhecer verdades universais quanto ao ser, à existência e à conduta, transcendendo o campo das puras relações fenomenais e sem limites impostos a priori à razão. Existem duas espécies de dogmatismo: o total e o parcial. O primeiro é aquele em que a afirmação da possibilidade de se alcançar a verdade ultima é feita tanto no plano da especulação, quanto no da vida pratica ou da Ética. Esse dogmatismo intransigente, quase não é adotado, devido à rigorosidade de adequação do pensamento. Porém, encontramos em Hegel a expressão máxima desse tipo de dogmatismo, pois, existe em suas obras uma identificação absoluta entre pensamento e realidade. Como o próprio autor diz “o " 22 pensamento, na medida em que é, é a coisa em si, e a coisa em si, na medida em que é, é o pensamento puro”. Já o parcial, adotado em maior extensão, tem um sentido mais atenuado, na intenção de afirmar-se a possibilidade de se atingir o absoluto em dadas circunstâncias e modos quando não sob certo prisma. Ou seja, é a crença no poder da razão ou da intuição como instrumentos de acesso ao real em si. Alguns dogmáticos parciais se julgam aptos para afirmar a verdade absoluta no plano da ação. Entretanto, outros somente admitem tais verdades no plano especulativo. Daí origina-se a distinção entre dogmatismo teórico e dogmatismo ético. O dogmatismo ético tem como adeptos Hume e Kant, que duvidavam da possibilidade de atingir as verdades últimas enquanto sujeito pensante (homo theoreticus) e afirmavam as razões primordiais de agir, estabelecendo as bases de sua Ética ou de sua Moral. Por conseguinte, temos como adepto do dogmatismo teórico, Blaise Pascal, que não duvidava de seus cálculos matemáticos e da exatidão das ciências enquanto ciências, mas era assaltado por duvidas no plano do agir ou da conduta humana. (SANTOS, s/d, s/p) 3.6 CETICISMO Consiste, segundo Santos (s/d, s/p) numa atitude dubitativa ou uma provisoriedade constante, mesmo a respeito de opiniões emitidas no âmbito das relações empíricas. Essa atitude nunca é abandonada pelo ceticismo, mesmo quando são enunciados juízos sobre algo de maneira provisória, sujeitos a refutação à luz de sucessivos testes. Ou seja, o ceticismo se distingue das outras correntes por causa de sua posição de reserva e de desconfiança em relação às coisas. Há no ceticismo – assim como no dogmatismo – uma distinção entre absoluto e parcial, ressaltando que este último não será discutido nesse trabalho. O ceticismo absoluto é oriundo da Grécia e também denominado pirronismo. Prega a necessidade da suspensão do juízo, dada a impossibilidade de qualquer conhecimento certo. Ele envolve tanto as verdades metafísicas (da realidade em si mesma), quanto as relativas ao fundo dos fenômenos. Segundo essa corrente, o " 23 homem não pode pretender nenhum conhecimento por não haver adequação possível entre o sujeito cognoscente e o objeto conhecido. Ou seja, para os céticos absolutos, não há outra solução para o homem senão a atitude de não formularproblemas, dada a equivalência fatal de todas as respostas. Um dos representantes do ceticismo de maior destaque na filosofia moderna é Comte. (SANTOS, s/d, s/p) Já para Stigar (2008, s/p) as novas formas de conhecimento impõe uma realidade cientifica volátil e por isso mesmo muito confusa. Por isso a autor percorre o conceito de ciência desde os filósofos modernos ate chegar às definições contemporâneas. Segundo Marilena Chauí é necessário fazer uma distinção entre o conceito de senso comum e de ciência, mostrando as peculiaridades do senso comum e da conduta cientifica. A sociedade moderna possui muitas dificuldades em entender o conceito de ciência devido a confusão feita com os três paradigmas existentes. O conceito clássico ou racionalista, o conceito empirista e o conceito construtivista. Dentro deste, cenário Chauí entende que a razão sofre com a crescente conduta instrumental, a reflexão sede lugar a prática tornando a razão fragmentada e dissolvida. Com isso, as opiniões do senso comum podem apenas servir de ponto de partida, mas não se enquadram no modelo cientifico. Com efeito, a ciência é diferente de uma opinião do senso comum porque o cientista adota um rigor extremo em suas investigações e por isso é chamada de Ciência. Chauí caracteriza o senso comum como uma visão aproximada das coisas, uma aparência, enquanto isto o cientista procura descobrir como funcionam as coisas e como as coisas são enquanto existem no mundo físico ou do movimento. Assim, a concepção de tempo espaço se modifica com relação ao paradigma adotado pelo cientista. A autora entende que o trabalho científico é rigoroso e sistemático, enquanto o senso comum aceita a magia e outras analogias possíveis como formas de conhecimento. “o objetivo cientifico é uma representação intelectual universal, necessária e verdadeira das coisas representadas, e corresponde à própria realidade, porque esta é racional e inteligível em si mesma.” (CHAUI, 2003, p. 221, apud STIGAR, 2008, s/p). Assim, para Stigar (2008, s/p) na experiência empírica o cientista busca verificar a sua teoria para poder avalizar seu pensamento. Portanto, comprovar a teoria e não criar outra. A autora percorre os conceitos de ciência adotados por " 24 Granger, Kuhn para discutir as contradições existentes entre as diferentes formas de conceber a atividade científica. Desta maneira, as concepções adotadas ditam a forma de ciência que será perseguida pelos pesquisadores. Finalmente Chauí entende que as novas tecnologias representam uma constante mudança no paradigma de ciência adoto na comunidade internacional. Com efeito, é incumbência do filosofo da ciência procurar repensar constantemente essas definições. Portanto, a genética e as novas formas de conhecimento cientifico levam em si um desafio ético que depende de uma reflexão racional e filosófica profunda, a filosofia moderna nuca esteve presente de maneira tão viva, pois “saber é poder” como postulo Bacon. No nível superficial pode-se dizer que a nova Ciência da Natureza ou Filosofia Natural possui três características: 1) Passagem da ciência especulativa para a ativa, na continuidade do projeto renascentista de dominação da Natureza e cuja fórmula se encontra em Francis Bacon: “Saber é Poder”; 2) Passagem da explicação qualitativa e finalística dos naturais para a explicação quantitativa e mecanicista; isto é, abandono das concepções aristotélico-medievais sobre as diferenças qualitativas entre as coisas como fonte de explicação de suas operações (leve, pesado, natural, artificial, grande, pequeno, localizado no baixo ou no alto) e da ideia de que os fenômenos naturais ocorrem porque causas finais ou finalidades os provocam a acontecer. Tais concepções são substituídas por relações mecânicas de causa e efeito segundo leis necessárias e universais, válidas para todos os fenômenos independentemente das qualidades que os diferenciam para nossos cinco sentidos (peso, cor, sabor, textura, odor, tamanho) e sem qualquer finalidade, oculta ou manifesta; 3) Conservação da explicação finalística apenas no plano da metafísica: a liberdade da vontade divina e humana e a inteligência divina e humana, embora incomensuráveis, se realizam tendo em vista fins (o filósofo Hobbes suprimirá boa parte das finalidades no campo da moral, dando-lhe fisionomia mecanicista também, e o filósofo Espinosa suprimirá a finalidade na metafísica e na ética, criticando-a como superstição e ignorância das verdadeiras causas das ações). É essa a ideia que se exprime na famosa frase de Galileu que abre a modernidade científico- filosófica: “a filosofia está escrita neste vasto livro, constantemente aberto diante de " 25 nossos olhos (quero dizer, o universo) e só podemos compreendê-lo se primeiro aprendermos a conhecer a língua, os caracteres nos quais está escrito. Ora, ele está escrito em linguagem matemática e seus caracteres são o triângulo e o círculo e outras figuras geométricas, sem as quais é impossível compreender uma só palavra”. (STIGAR, 2008, s/p) Para Stigar (2008, s/p) a mecânica como nova ciência da Natureza. Isto é, a ideia de que todos os fenômenos naturais são corpos constituídos por partículas dotadas de grandeza, figura e movimento determinados. Que seu conhecimento é o estabelecimento das leis necessárias do movimento e do repouso que conservam ou modificam a grandeza e a figura das coisas por nós percebidas porque conservam ou alteram a grandeza e a figura das partículas. Por outro lado, a ideia de que estas leis são mecânicas, isto é, leis de causa e efeito cujo modelo é o movimento local (o contato direto entre partículas) e o movimento à distância (isto é, a ação e a reação dos corpos pela mediação de outros ou, questão controversa que dividirá os sábios, pela ação do vácuo). Fisiologia, anatomia, medicina, óptica, paixões, ideias, astronomia, física, tudo será tratado segundo esse novo modelo mecânico. E é a perfeita possibilidade de tudo conhecer por essa via que permite a intervenção técnica sobre a natureza física e humana e a construção dos instrumentos, cujo ideal é autônomo e cujo modelo é o relógio. A destruição, vinda do Renascimento, da ideia greco-romana e cristã de Cosmos, isto é, do mundo como ordem fixa, segundo hierarquias de perfeição, dotado de centro e de limites conhecíveis, cíclico no tempo e limitado no espaço. Em seu lugar, surge o Universo Infinito, aberto no tempo e no espaço, sem começo, sem fim, sem limite e que levará o filósofo Pascal à célebre fórmula da “esfera cuja circunferência está em toda parte e o centro em nenhuma”. Não apenas o heliocentrismo é possível a partir dessa ideia, mas com ela dois novos fenômenos ocorrem: em primeiro lugar, a perda do centro, que levará os pensadores a uma indagação que, de acordo com o historiador da filosofia Michel Serres, é essencial e prévia à própria possibilidade do conhecimento, qual seja, indagam se é possível encontrar um outro centro, ou um ponto fixo a partir do qual seja possível pensar e agir (os filósofos falam na busca do ponto de Arquimedes para o pensamento); em " 26 segundo lugar, uma nova elaboração do conceito de ordem e que, segundo Michel Foucault, será a motivação principal na elaboração moderna do método para conhecer (sem ordem não há conhecimento possível, e a primeira coisa a ordenar será a própria faculdade de conhecer); A geometrização do espaço. Este era na física aristotélico-tomista, um espaço topológico e topográfico (isto é, constituído por lugares - topoi - que determinavam a forma de um fenômeno natural, sua importância, seu sentido), o mundo estando dividido em hierarquias de perfeição conforme tais lugares. Agora, o espaço se torna neutro, homogêneo, mensurável, calculável, sem hierarquias e semvalores, sem qualidades. (STIGAR, 2008, s/p) " 27 4. O PENSAMENTO GEOGRÁFICO E SUA HISTORICIDADE A PARTIR DO SÉCULO XIX De acordo com Souza, et al (2009, p. 3) a Geografia Tradicional também conhecida como Geografia Clássica surgiu no século XIX, inicialmente na Alemanha e na França, difundindo-se aos demais países, tendo como precursores Alexandre Von Humboldt e Carl Ritter. Nesta corrente surgem as primeiras definições do que seria a Geografia e qual seria seu objeto de análise, já que no momento de sua sistematização não havia clareza quanto ao objeto de estudo, a Geografia era tida como a ciência “do tudo” ou a ciência “da superfície terrestre”. Segundo Hettner (1939) caberia à Geografia “a análise das influências e interações entre o homem e o meio”, Albert Demageon (1942) conceitua a Geografia como “o estudo dos grupos humanos nas suas relações com o meio geográfico” e para Martonne (1951) a “Geografia moderna encara a distribuição à superfície do globo dos fenômenos físicos, biológicos e humanos, as causas dessa distribuição e as relações locais desses fenômenos”. A Geografia Tradicional foi fortemente marcada pela existência de dicotomias, como a Geografia Física e Geografia Humana, Geografia Geral e Geografia Regional. Caberia a Geografia Física ocupar-se com o estudo do quadro natural e à Geografia Humana preocupava-se com a distribuição dos aspectos originados pelas atividades humanas, nesta relação dicotômica a Geografia Física obteve a imagem de ser mais consolidada que a Geografia Humana, devido ao próprio desenvolvimento das ciências naturais, Em virtude do aparato metodológico mais eficiente das ciências físicas e da esplêndida concatenação teórica elaborada por William Morris Davis, a Geografia Física rapidamente ganhou a imagem de ser a parte cientificamente mais bem consolidada e executada. (...) Destituída de aparato teórico e explicativo para as atividades humanas, assim como a imprecisão dos procedimentos metodológicos, a Geografia Humana sempre se debatia na procura de justificar o seu gabarito científico, e em estabelecer sua definição e finalidades como ciência (CHRISTOFOLETTI, 1985, p. 13, apud SOUZA, ET AL, 2009, p. 3). Outra dicotomia, de acordo com Souza, et al (2009, p. 4) existente nesta corrente refere-se à Geografia Geral e a Geografia Regional. A primeira objetivando " 28 estudar a distribuição dos fenômenos da superfície terrestre analisava cada categoria do fenômeno de maneira autônoma, resultando na subdivisão da Geografia (geomorfologia, hidrografia, climatologia, etc.), já a Geografia Regional procurava estudar as unidades componentes da diversidade areal da superfície terrestre. A Geografia Regional muito valorizada nesta corrente era tida como a mais complexa expressão do método geográfico, assim caberia ao geógrafo descrever as características de dada região, A Geografia Regional procurava estudar as unidades componentes da diversidade areal da superfície terrestre. Em cada lugar, área ou região a combinação e a interação das diversas categorias de fenômenos refletiam- se na elaboração de uma paisagem distinta, que surgia de modo objetivo e concreto. O estudo das regiões e das áreas favoreceu a expansão da perspectiva regional ou corológica, que teve como êmulo e padrão as clássicas monografias da escola francesa. Preocupados em compreender as características regionais, o geógrafo desenvolveu habilidade descritiva, exercendo a caracterização já estabelecida por La Blache, em 1923. (CHRISTOFOLETTI, 1985, p.14) Quanto aos procedimentos metodológicos destaca-se a importância do trabalho empírico e da habilidade descritiva, além do papel de síntese atribuído à Geografia, onde esta reuniria as informações obtidas pelas demais ciências, resultando na visão totalizadora da região, como aponta CHRISTOFOLETTI (1985): “(...) à Geografia, considerando a totalidade, correspondia o trabalho de síntese, reunindo e coordenando todas as informações a fim de salientar a visão global e totalizadora”. A Nova Geografia também conhecida como Geografia Teorética Quantitativa surgiu durante a década de 50, impulsionada pelas transformações ocasionadas pela Segunda Guerra Mundial nos setores científico, tecnológico, social e econômico. Esta corrente buscou superar as dicotomias existentes na Geografia Tradicional e os procedimentos metodológicos da Geografia Regional. Baseada no positivismo lógico busca ser objetiva e imparcial, por meio de um rigor maior na aplicação da metodologia científica. Diferentemente do que se propunha na Geografia Tradicional onde a Geografia era tida como uma ciência singular, devendo possuir métodos próprios, na Nova Geografia os métodos científicos são comuns a todas as ciências, “(...) há " 29 métodos científicos para a pesquisa geográfica, mas não métodos geográficos de pesquisa Christofoletti (1985, p. 16)”, assim toda pesquisa científica seguiria o mesmo conjunto de procedimentos, o que difere na pesquisa é o objeto de estudo, no caso da Geografia o das organizações espaciais, Em cada ciência, o que a diferencia das demais é o seu objeto. Cada ciência contribui para a compreensão da ordem e da estrutura existentes, e o setor da Geografia é o das organizações espaciais. A abordagem da geografia científica está baseada na observação empírica, verificação de seus enunciados e na importância de isolar aos fatos de seus valores. Ao separar os valores atribuídos aos fatos dos próprios fatos, a ciência procura ser objetiva e imparcial (CHRISTOFOLETTI, 1985, p.16, apud SOUZA, ET AL, p. 4). De acordo ainda com Souza, et al (2009, p. 4) faz parte dos procedimentos metodológicos da Nova Geografia a observação empírica, a quantificação dos fatos, a criação e verificação de hipóteses, a proposição de predições baseadas nas teorias e leis científicas, grande importância é dada ao critério da refutabilidade, (...) considerando-se certas hipóteses e determinadas condições, o resultado do trabalho geográfico deve ser capaz de prever o estado futuro dos sistemas de organização espacial e contribuir de modo efetivo para alcançar o estado condizente e apto para as necessidades humanas. Os enunciados geográficos assumem validade em função da sua verificação e teste (CHRISTOFOLETTI, 1985, p.17). Outra característica marcante na Nova Geografia é o amplo uso das técnicas matemáticas e estatísticas para analisar os dados coletados e as distribuições espaciais, tanto que acabou sendo denominada de Geografia Quantitativa. Em oposição à Nova Geografia, sobretudo procurando substituir os preceitos da metodologia científica positivista empregada surgiram outras correntes do pensamento geográfico, sendo as de maior destaque a Geografia Humanística e a Geografia Radical. A Geografia Humanística tem como base os trabalhos realizados por Yi-Fu Tuan, Anne Buttimer, Edward Relph e Mercer e Powell, e possui a fenomenologia existencial como a filosofia subjacente. Embora possuindo raízes mais antigas, em Kant e em Hegel, os significados contemporâneos da fenomenologia são atribuídos à filosofia de Edmund Husserl (1859-1939). Tendo a fenomenologia como filosofia A " 30 Geografia Humanística procura valorizar a percepção do indivíduo por meio de suas experiências, (...) preocupando-se em verificar a apreensão das essências, pela percepção e intuição das pessoas, a fenomenologia utiliza como fundamental a experiência vivida e adquirida pelo indivíduo. Desta maneira, contrapõe-se às observações de base empírica, pois não se interessa pelo objeto nem pelo sujeito (CHRISTOFOLETTI, 1985, p.22). Os geógrafoshumanistas defendem a necessidade de valorizar a experiência do indivíduo ou do grupo na busca da compreensão da sua forma de sentir das pessoas em relação aos seus lugares, “(...) para cada indivíduo, para cada grupo humano, existe uma visão do mundo, que se expressa através das suas atitudes e valores para com o quadro ambiente. É o contexto pelo qual a pessoa valoriza e organiza o seu espaço e o seu mundo, e nele se relaciona”. (CHRISTOFOLETTI, 1985, p. 22, apud SOUZA, ET AL, 2009, p. 5) As noções de espaço e lugar conforme Souza, et al (2009, p. 5) surgem como muito importantes para esta tendência geográfica. O lugar é aquele em que o indivíduo se encontra ambientado no qual está integrado. Ele faz parte do seu mundo, dos seus sentimentos e afeiçoes; é o “centro de significância ou um foco de ação emocional do homem”. O lugar não é toda e qualquer localidade, mas aquela que tem significância afetiva para uma pessoa ou grupo de pessoas. Em 1974, ao tentar estruturar o setor de estudos relacionados com a percepção, atitudes e valores ambientais, Yi-Fu Tuan propôs o termo Topofilia definindo-o como “o elo afetivo entre a pessoa e o lugar ou quadro físico”. A Geografia Crítica parte do mesmo pressuposto da corrente humanística quanto à crítica empregada em relação à Nova Geografia, no entanto baseia-se em outro método filosófico, o materialismo histórico e dialético, e também possui uma característica marcante: a preocupação em ser crítica e atuante. Iniciou-se na década de 1960 em virtude do ambiente contestatório nos Estados Unidos, em função da guerra do Vietnã. Existem vários adjetivos para caracterizar esta corrente como marxista, crítica e radical, Christofoletti (1985) coloca como a mais abrangente a denominação Geografia Radical, por designar tudo o que seja de tendência esquerdista e postura contestatória. O pensamento crítico na geografia significou, principalmente, uma aproximação com os movimentos sociais, principalmente na " 31 busca da ampliação dos direitos civis e sociais, como o acesso a educação de boa qualidade, a moradia, pelo acesso à terra, o combate à pobreza, entre outras temáticas. A Geografia Crítica difere também da Nova Geografia quanto à forma como estuda os fenômenos espaciais, busca a superação quanto ao estudo dos padrões espaciais, buscando analisar em primeiro os processos sociais associando-os com os espaciais, para isso interessa-se pelos modos de produção, pois as formações espaciais estão estreitamente relacionadas com o modo de produção, A Geografia Radical interessa-se pela análise dos modos de produção e das formações socioeconômicas. Isto porque o marxismo considera como fundamental os modos de produção, enquanto as formações espaciais (ou formações econômicas e sociais) são as resultantes. As atividades dos modos de produção constroem e geram formações diferentes. (CHRISTOFOLETTI, 1985, p. 27, apud SOUZA, ET AL, 2009, p. 6) Vários são os trabalhos desenvolvidos nesta corrente, o de David Harvey intitulado Social Justice and the City, 1973, foi um marco por representar a primeira tentativa de apresentar uma síntese e um marco teórico para análise do espaço urbano. Na França o movimento de Geografia Radical possui Yves Lacoste, como grande nome, no Brasil muitos autores atuam nesta linha a exemplo de Milton Santos com sua obra Por uma Geografia, 1979, propõe uma transformação na forma de se pensar e fazer a Geografia. (SOUZA, ET AL, 2009, p. 6) " 32 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS UTILIZADAS E CONSULTADAS ALVES, R. Filosofia da Ciência. Introdução ao Jogo e a suas Regras. 7ª edição. São Paulo: Edições Loyola, 2003. ANDRADE, C. de. Caminhos e (Des) caminhos da Geografia. São Paulo: Editora Papirus. 1989. ANDRADE, C. Geografia Ciência da Sociedade. Uma Introdução à Análise do Pensamento Geográfico. Recife: Editora Atlas, 1987. 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