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Ditadura Militar e Batistas na Bahia

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0 
 
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE FEIRA DE SANTANA 
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA 
ANDRÉ JOSÉ DA SILVA NETO 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
BATISTAS DE TODOS OS SANTOS: MILITÂNCIA, RESISTÊNCIA E FÉ 
ECUMÊNICA DA IGREJA BATISTA NAZARETH (1975-1988) 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
FEIRA DE SANTANA, BA 
2017 
1 
 
ANDRÉ JOSÉ DA SILVA NETO 
 
 
 
 
 
 
 
BATISTAS DE TODOS OS SANTOS: MILITÂNCIA, RESISTÊNCIA E FÉ 
ECUMÊNICA DA IGREJA BATISTA NAZARETH (1975-1988) 
 
 
 
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em 
História da Universidade Estadual de Feira de Santana como 
requisito parcial para a obtenção do grau de mestre em 
História. 
Orientadora: Profa. Dra. Elizete da Silva 
 
Banca Examinadora: 
________________________________________ 
Prof. Dra. Elizete da Silva (UEFS) 
________________________________________ 
Prof. Dr. Eurelino Teixeira Coelho Neto (UEFS) 
 
________________________________________ 
 Prof. Dr. Zózimo Antônio Passos Trabuco (UFOB) 
 
 
 
 
 
FEIRA DE SANTANA, BA 
2017 
2 
 
3 
 
Agradecimentos 
 
 Minha vida é marcada pelo favor do Sagrado. Não consigo deixar de ver sua boa mão 
sobre mim, sobre todos. É a Deus, que se manifestou de tantas formas e maneiras, a quem 
agradeço tudo que sou e tenho. 
 Agradeço profundamente à minha família: meus pais, Eneida Dantas da Silva e José 
Lopes da Silva, que se doaram por mim, sonharam comigo e estão comigo em tudo o que faço 
– amo vocês! Minhas irmãs, Sula e Renata, que me fizeram aprendiz do compartilhar a vida, 
meus tios-pais, tias-mães, pri(r)mãos e pri(r)mãs, sogra, cunhados e cunhadas (à ciranda toda), 
muito obrigado! 
 Agradeço às pessoas que caminharam comigo nestes últimos anos: colegas e 
professores do mestrado que leram os textos produzidos sugerindo adequações; à direção, 
colegas professores, funcionários e alunos do Seminário Teológico Batista do Nordeste, à 
Escola Natamusical, à liderança e irmãos da Igreja Batista da Avenida. 
 Agradeço à Igreja Batista Dois de Julho e à Igreja Batista Nazareth, nas pessoas dos 
pastores Marcos Panisset e Joel Zeferino, pela acolhida e disposição das atas e demais 
documentos. Também sou grato ao pastor Djalma Torres, pastor Ivaldo Carneiro, Manoel 
Conceição, Paulo Torres, Magdiel Geraldo da Silva, pela disponibilidade em responder às 
minhas questões. 
 Agradeço ao meu professor, Jorge Nery, que me ensinou a ver a História do 
Cristianismo e História dos Batistas de maneira crítica, humana, e me apresentou a Igreja 
Batista Nazareth, me estimulando a “correr atrás” do mestrado, me desafiando a enxergar o 
ministério além dos muros das igrejas. Muito obrigado! 
 Não existem palavras que possam traduzir minha gratidão à professora Dra. Elizete, 
que me acolheu como um de seus “perdidos” e lutou com minhas dificuldades, me 
estimulando a ir às fontes. Pró, a senhora é “A” fonte! Muito obrigado de todo coração. 
 À FAPESB, que possibilitou o estudo e produção desta dissertação, concedendo-me a 
Bolsa de Estudos. 
 À Clarice Almeida Souza da Silva, minha alegria, minha filhota, que nos momentos de 
maior tensão e prazos apertados vinha até mim exigindo atenção e, assim, recobrava as 
minhas forças e me mostrava o que realmente é importante. Papai ama muito! 
 Por fim, à minha rainha, Siméia Souza, minha esposa, companheira, cúmplice, a quem 
eu não poderei recompensar por tantos dias segurando sozinha a barra, olhando por mim e por 
nossa filha. Muito obrigado. Te amo! 
4 
 
 
 
 
Nenhuma ciência pode escapar das condições 
impostas pela constituição da mente pensante que a 
faz nascer. Mesmo a História, por todo esforço por 
exatidão, objetividade e precisão da investigação, 
não escapa à tais condições. Isto é resumido no fato 
que nós estamos constantemente obrigados a voltar 
à experiência presente. O presente continuamente 
paira ante o olhar retrospecto, porque é por ajuda de 
analogias tiradas da vida cotidiana, por mais que 
isso possa ser mentalmente consciente, que 
alcançamos a explanação causal dos eventos 
passados. (TROELTSCH, 1912, p. 1) 
 
5 
 
RESUMO 
 
Esta dissertação investiga a trajetória da Igreja Batista Nazareth, situada em Salvador – BA, 
durante o período que compreende sua fundação, em 1975 e seu afastamento do rol de igrejas 
filiadas à Convenção Batista Baiana, em 1988. Analisa as relações entre os batistas baianos e 
as instâncias de poder da Ditadura Civil-Militar na Bahia, a emergência de um setor 
progressista entre os batistas e o envolvimento desta comunidade com o Ecumenismo e a 
militância em Movimentos Sociais. A organização da Igreja Batista Nazareth resultou de um 
contexto polarizado entre progressistas e conservadores no interior da Denominação Batista 
na Bahia. A Igreja Batista Nazareth se tornou uma comunidade batista incomum no campo 
baiano, a partir de seus posicionamentos sócio-políticos divergentes e próximos de partidos 
oposicionistas e pela atuação ecumênica. 
 
Palavras-chave: Batistas, Ditadura, Ecumenismo, Movimentos Sociais, Bahia. 
 
ABSTRACT 
 
This dissertation investigates the trajectory of Nazareth Baptist Church, located in Salvador, 
Bahia, during the period of its foundation, in 1975, and its removal from the list of churches 
affiliated to the Bahian Baptist Convention, in 1988. It analyzes the relations between Bahian 
Baptists and the instances of power of the Civil-Military Dictatorship in Bahia, the emergence 
of a progressive sector among Baptists and their involvement with Ecumenism and militancy 
in Social Movements. The organization of the Nazareth Baptist Church resulted from a 
polarized context between progressive and conservative within the Batista Denomination in 
Bahia. The Nazareth Baptist Church has become an unusual Baptist community in the Bahian 
countryside, from its divergent socio-political positions and close to opposition parties and 
ecumenical action. 
 
Keywords: Baptists, Dictatorship, Ecumenism, Social Movements, Bahia. 
 
 
 
 
 
6 
 
SUMÁRIO 
 
Introdução..........................................................................................................................07 
 
Capítulo 1. A Bahia, a Fé e a Política..............................................................................23 
 
1.1 São Salvador da Bahia de Todos os Santos..............................................................23 
1.2 O Campo Religioso Soteropolitano...........................................................................25 
O Catolicismo Baiano 
O povo de Santo 
Os Protestantes na Bahia 
1.3 A Política na Bahia: o Padroado e o Clientelismo...................................................42 
 
Capítulo 2. “Somos jovens, não estamos cansados”: A origem da Igreja Batista 
Nazareth. ..........................................................................................................................46 
 
2.1 Os Batistas Brasileiros: Liberalismo, Democracia e Exclusivismo........................48 
2.2 Os Batistas na Bahia...................................................................................................65 
2.3 A União de Mocidade Batista da Igreja Batista Dois de Julho. .............................70 
2.4 “Somos jovens, não estamos cansados”.....................................................................84 
 
Capítulo 3. A Igreja Batista Nazareth: Organização, Filiação e Funcionamento.......92 
 
3.1 Anos iniciais da Igreja Batista Nazareth: Organização...........................................95 
3.2 Filiação.........................................................................................................................101 
3.3 Funcionamento............................................................................................................109 
3.4 Jequié, Recife, Nazareth: o primeiro pastor da Igreja Batista Nazareth..............117Capítulo 4. Militância, Resistência e Fé..........................................................................124 
 
4.1 Militância.....................................................................................................................125 
4.2 Resistência...................................................................................................................134 
4.3 Fé..................................................................................................................................140 
4.4 Fé Cega, Faca Amolada: a desfiliação da Igreja Batista Nazareth da Convenção 
Batista Baiana (1988) .......................................................................................................144 
 
Considerações Finais........................................................................................................151 
 
Bibliografia........................................................................................................................160 
 
Fontes.................................................................................................................................169 
 
 
 
 
 
7 
 
Introdução 
 
A presente dissertação pretende estudar a trajetória da Igreja Batista Nazareth, uma 
comunidade religiosa de tradição protestante e ligada à Denominação Batista, nascida e 
atuante num período conturbado e violento da História do Brasil, a Ditadura Civil-Militar. A 
Igreja Batista Nazareth, situada em Salvador – BA, fundada em 1975, como expressão 
protestante progressista entre os batistas baianos, desenvolveu um papel incomum na 
Denominação Batista, sendo militante pela democracia, resistindo aos apelos da Convenção 
Batista Baiana de cumplicidade com os agentes de poder e sendo aberta ao diálogo inter-
religioso, recebendo em seu templo e em suas atividades eclesiásticas pessoas e grupos dos 
mais diversos matizes religiosos. 
Tomamos a caracterização “protestante progressista” de empréstimo da obra 
Protestantismo Ecumênico e Realidade Brasileira: Evangélicos Progressistas em Feira de 
Santana, de Elizete da Silva (2010). A autora propõe que, por contraste com o protestante 
conservador, o protestante progressista é: 
 
Aquele com uma visão aberta, não necessariamente modernista em termos 
teológicos, que admite novas ideias e novas perspectivas na interpretação das 
doutrinas e nas práticas religiosas, que possibilitam um olhar e às vezes um 
engajamento na sociedade circundante. (SILVA, 2010, p. 35) 
 
 As características elencadas pela pesquisadora, uma das pioneiras neste campo de 
estudo, iniciam com a “visão aberta”. Ora, o protestantismo de missão, de clara e forte postura 
conservadora, que se instalou no Brasil tem como marca identitária o fundamentalismo, cujos 
inimigos, segundo a própria autora, “eram: a Igreja Católica, o socialismo, a filosofia moderna 
e o Espiritismo” (SILVA, 2010, p. 37). Entre os considerados “inimigos” estão duas 
expressões religiosas: a Igreja Católica e o Espiritismo. Evocando o texto do pastor Ebenézer 
Gomes Cavalcanti para fundamentar sua afirmação, Elizete da Silva aponta para a resistência 
dos batistas a qualquer tipo de união intereclesiástica (SILVA, 2010, p. 37). Desta forma, 
entendemos que o ecumenismo é uma característica do protestantismo progressista, parte de 
sua “visão aberta” e de seu engajamento na sociedade multicultural e plural também nos 
aspectos religiosos. 
A história da Igreja Batista Nazareth tangencia a trajetória de muitos indivíduos e 
grupos envolvidos nas lutas por democracia e justiça social em meio a manutenção de 
governos notavelmente autoritários, repressores, e que contavam com a simpatia de alguns 
púlpitos protestantes e, mais especificamente batistas que, à época, mostraram-se tendentes a 
8 
 
aceitar o poder dos militares. Os líderes da Denominação Batista almejavam, em primeira 
instância, a manutenção da liberdade religiosa e, posteriormente, acesso a espaços e cargos 
políticos. Destarte, a Igreja Batista Nazareth foi acusada de desvio doutrinário por abrir as 
portas ao ecumenismo – que foi íntima e propositadamente relacionado à ameaça comunista 
pelos líderes mais conservadores da Denominação Batista – sendo excluída do rol de 
membros da Convenção Batista Baiana e da Convenção Batista Brasileira, em 1988. Esta 
exclusão foi a marca da permanência da intolerância instaurada, nos anos de chumbo, contra 
grupos militantes pela democracia e aponta para a relevância social e a notoriedade da ação 
desta comunidade religiosa. 
 Na segunda metade do século XX, a América Latina vivenciou a instalação de uma 
série de governos ditatoriais passando por períodos de supressão da democracia e com os 
direitos civis e políticos minorados: Guatemala, Paraguai, em 1954; Argentina, em 1962; 
Bolívia, em 1964; República Dominicana, em 1965; Peru, em 1968, Chile e Uruguai, em 
1973. No Brasil, o totalitarismo tomou lugar em 1964 e progressivamente implantou medidas 
anti-democráticas. As influências e estímulos de setores internacionais, especialmente os 
Estados Unidos da América, com interesses políticos e econômicos na região foram 
importantes para a tomada de poder pelos golpistas. As principais forças de promoção da 
legitimidade do golpe, entre os batistas, foram o discurso anti-comunista, amplificado nos 
variados meios de comunicação, materializado com o financiamento de setores interessados 
na expansão das relações comerciais entre as Américas. O dualismo estabelecido após a 
Segunda Guerra Mundial marcou as décadas seguintes e deu o tom das manifestações 
políticas. Segundo Daniel A. Reis: 
 
É preciso recuperar a atmosfera da época, os tempos da Guerra Fria. De um 
lado, os EUA e o chamado mundo livre, ocidental e cristão. De outro, a União 
Soviética e o mundo socialista. Não havia espaço para meios-termos. A luta 
do Bem contra o Mal. Para muitos, Jango era o Mal; a ditadura, se fosse o 
caso, um Bem. No Brasil, estiveram com as Marchas a maioria dos partidos, 
lideranças empresariais, políticas e religiosas, e entidades da sociedade civil, 
como a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e a Conferência Nacional dos 
Bispos Brasileiros (CNBB), as direitas. (REIS, 2012, p.1). 
 
A participação de empresários, lideranças religiosas, políticos e de entidades da 
sociedade civil em atividades públicas de manifestação contrária aos programas de governo 
do então Presidente do Brasil, João Goulart, e após o Golpe a participação na estrutura de 
poder e governo do Estado, nos permite aceitar a designação deste período como “Ditadura 
Civil-Militar”. 
9 
 
Evocamos o conceito gramsciano de sociedade civil construído a partir de sua extensa 
análise das gêneses e funções dos grupos intelectuais. Segundo Gramsci, a Sociedade Civil 
está fixada no “plano” superestrutural: 
 
Por enquanto, podem-se fixar dois grandes ‘planos’ superestruturais: o que 
pode ser chamado de ‘sociedade civil’ (isto é, o conjunto de organismos 
designados vulgarmente como ‘privados’) e o da ‘sociedade política ou 
Estado’, planos que correspondem, respectivamente, à função de ‘hegemonia’ 
que o grupo dominante exerce em toda a sociedade e àquela de ‘domínio 
direto’ ou de comando, que se expressa no Estado e no governo ‘jurídico’. 
Estas funções são precisamente organizativas e conectivas (GRAMSCI, 2001, 
pp.20-21). 
 
Para René Dreifuss, analisando os agentes e os processos do Golpe de 1964, o termo 
“elite orgânica”, numa apropriação do termo gramsciano “intelectuais orgânicos”, se aplica 
mais acuradamente à parcela da sociedade que participou da tomada de poder em 1964: 
 
Com base no argumento de Gramsci, se não todos os tecno-empresários, 
empresários e militares ‘pelo menos uma elite entre eles tinha a capacidade de 
ser os organizadores de seus interesses e da sociedade’. Essa elite dos 
intelectuais orgânicos (doravante denominada elite orgânicado bloco 
econômico multinacional e associado) passou a constituir uma força nacional, 
cônscia de que seus ‘próprios interesses corporativos, no seu presente e futuro 
desenvolvimento, transcendem os limites corporativos, de classe puramente 
econômica e podem e devem também se tornar interesses de outros grupos 
subordinados’. (DREIFUSS, 1981, p. 161). 
 
Estes agentes organizaram os setores conservadores da sociedade estabelecendo a 
ligação com os militares através do Instituto de Pesquisa e Estudos Sociais (IPES) e do 
Instituto Brasileiro de Ação Democrática (IBAD), formando um complexo aglutinador dos 
movimentos sociais de direita, opositores de João Goulart. 
 
A elite orgânica centrada no IPES se revelaria então como o ‘amadurecimento 
da disposição para agir dentro de um programa capaz de mobilizar os homens 
de empresa’, e como um todo oferecer soluções aos problemas do país. Nesse 
processo, a elite orgânica modelaria as forças sociais burguesas em uma 
classe, processo este que culminaria com a transposição do poder privado dos 
interesses multinacionais e associados para o governo público do Brasil. Para 
isso, o bloco econômico dominante teria de vir a ser o Estado autoritário em 
que efetivamente se transformaria. (DREIFUSS, 1981, p. 162). 
 
Luciene Almeida, em sua pesquisa sobre a representação do comunismo entre os 
batistas, afirma julgar apropriado o uso do termo “golpe civil-militar” pois acredita “que o 
mesmo foi o resultado de uma articulação entre setores civis da classe dominante e os 
10 
 
militares” (ALMEIDA, 2011, p.31). Portanto, sem ignorar a extensa e importante discussão 
conceitual que envolveu muitos pesquisadores do período, sobre a inclusão ou não de “civil” 
para destacar a participação desta parcela da população, decidimos que neste trabalho 
utilizaremos “Golpe Civil-Militar”. 
O Golpe de 1964, na Bahia, principiou com a coalizão União Democrática Nacional 
(UDN) com o Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) que elegeu Antônio Lomanto Júnior ao 
Governo do Estado, em 1962. Os dois partidos possuíam orientações distintas, enquanto o 
primeiro estava ligado aos setores conservadores da sociedade civil, o segundo estava 
comprometido com as Reformas de Base. O trabalho do governador eleito era desafiador: 
 
Tratava-se de viabilizar sua administração através do estabelecimento de 
relações amistosas com a presidência da República, ao mesmo tempo, refrear 
os ânimos das forças sociais mais aguerridas tanto na confrontação ao 
presidente, quanto na luta pela aceleração das reformas de base. Do ponto de 
vista prático, naquele contexto, isto significava hipotecar apoio ao presidente 
Goulart, distanciando-se, contudo dos componentes mais reformistas de suas 
proposições governamentais, advogando, em contrapartida, uma resolução 
dos principais problemas nacionais segundo os princípios de um progressismo 
cristão, mais palatável a boa parte de seus aliados e apoiadores. (FERREIRA, 
2004, p. 87). 
 
 Quando os militares tomaram o poder, com o apoio da parcela conservadora da 
sociedade civil, o Governador da Bahia manteve a expectativa da permanência de João 
Goulart na presidência, e o jornal A Tarde – de grande prestígio na sociedade baiana – se 
apegou à legalidade institucional (FERREIRA, 2004, p. 88). Não tardou para que todo o 
estado sentisse a presença dos militares: Francisco Pinto, prefeito de Feira de Santana; José 
Fernandes Pedral Sampaio, prefeito de Vitória da Conquista; Euclides Neto, prefeito de Ipiaú; 
e o prefeito de Salvador, Virgildásio Sena, foram destituídos e/ou presos. O governador 
Lomanto Júnior, no dia 2 de abril de 1964, foi a público apoiar a “Revolução”. 
O campo religioso brasileiro, plural e multifacetado em doutrinas e religiosidades, 
como toda a sociedade civil, se dividiu também politicamente. Não que isso fosse algo 
incomum e de raízes profundas fincadas desde há muito tempo, mas o contexto estabelecido 
após Segunda Guerra Mundial fez soar notas mais graves e mais dissonantes. No 
Cristianismo, no qual a maioria absoluta dos brasileiros se abrigavam religiosamente, líderes 
católicos e protestantes, rivais tradicionais pelo status de defensores exclusivos da ortodoxia 
cristã, alinhados com os ideais conservadores, aliaram-se no enfrentamento contra o avanço 
de grupos progressistas em seus arraiais. 
 
11 
 
Sobre o Tempo 
 
O período da Ditadura Civil-Militar brasileira é o tempo onde a maior parte desta 
pesquisa se encontra. Iniciado em 1964, com a destituição do presidente João Goulart, este 
período foi marcado por Atos Institucionais que cercearam as liberdades individuais dando 
amplos poderes ao Estado e conduzindo o País para os “anos de chumbo”. Caracterizando este 
período, Zachariadhes elabora um quadro bastante informativo. Segundo o autor: 
 
O período da Ditadura foi um momento de extremos. Os militares chegaram 
ao poder com apoio de amplos segmentos da população e saíram dele com 
uma oposição fortalecida e uma grande rejeição popular, depois de 
permanecerem 21 anos no poder. Foi um período de intensa repressão aos 
opositores, limitação dos direitos individuais e violação dos direitos humanos, 
mas também de crescimento econômico acelerado e grande modernização. Os 
militares ajudaram a fazer do Brasil uma das 10 maiores potências econômicas 
do mundo, mas entregaram o país aos civis com uma economia estagnada, 
uma inflação assustadora e uma dívida externa astronômica. 
(ZACHARIADHES, 2015, pp. 9-10) 
 
O apoio dos civis é uma chave importante na elaboração da conjuntura que precedeu 
o golpe de 1964. Desde 1961, com a eleição e posse de Jânio Quadros como presidente do 
Brasil, e de João Goulart como vice-presidente, a sociedade brasileira experimentou a 
instabilidade política. Jânio Quadros, da UDN, representava a ala conservadora, moralista e 
de abertura ao capital estrangeiro, João Goulart, do PTB, representava a oposição e foi 
identificado com o comunismo, ameaça aos valores prezados pelos setores conservadores. 
O recorte temporal da pesquisa, portanto, foi definido pelo interesse na parte da 
trajetória histórica da Igreja Batista Nazareth que vai da sua fundação até a sua exclusão do 
rol de igrejas filiadas à Convenção Batista Baiana. Esta comunidade foi formada em 1975, em 
plena vigência da Ditadura Civil-Militar, sendo desligada da Convenção Batista Baiana em 
1988. Portanto, nosso foco compreende um período ligado à História Nacional pela atuação 
de uma série de governos ditatoriais, passando pelas campanhas pela redemocratização e 
anistia política, encerrando-se no ano da promulgação da Constituição que vigora até hoje. 
Não é possível, portanto, elaborar a narrativa desta trajetória sem voltar e avançar 
temporalmente, aqui e ali, para colher informações que auxiliem na análise dos documentos e 
dos acontecimentos. Por isso, em algumas seções deste trabalho, haverá a necessidade de 
visitar tempos um pouco distantes para a exposição das bases do trabalho batista no Brasil e 
na Bahia, elencando suas principais crenças e diferenças dos outros grupos religiosos. 
 
12 
 
Sobre o Território 
 
A Igreja Batista Nazareth é uma igreja baiana e soteropolitana. Isso significa que, além 
da localização de sua sede ser em Salvador, sua atuação primeira (mas não exclusiva) se deu 
também neste espaço geográfico. Além disso, as influências sofridas e promovidas foram 
realizadas a partir deste campo de ação. O campo religioso está ligado também às conjunturas 
espacialmente definidas, assim como o surgimento das cidades é a condição primordial para a 
emergência das grandes religiões universais (BOURDIEU, 2007, p. 34), interagindo com as 
histórias, com as possibilidades, limitações e relações dos sujeitos. 
A cidade de Salvador é lugar e também agente de influência na cosmovisão batista 
baiana e, especificamente, da Igreja Batista Nazareth. A história da cidade,em seus diversos 
aspectos, é importante nesta pesquisa porque nos informa as condições de existência e de ação 
dos sujeitos históricos em questão. Podemos caracterizar Salvador como a 
 
(...) primeira cidade e capital do Brasil colonial, núcleo urbano fundamental do 
comércio português ao longo de três séculos de colonização, se constituindo 
no principal porto de todo o Atlântico Sul, chega ao século XXI como uma das 
mais populosas do Brasil, sede de uma das nove mais antigas regiões 
metropolitanas do país, com sua área municipal praticamente tomada pelo 
espaço urbano e exercendo o papel de uma metrópole regional com 
hinterlândia (espaço de influência) que supera o limite estadual. Não obstante 
sua importância histórica e contemporânea, a capital baiana traz na sua 
dinâmica interior graves problemas sócio-ambientais típicos de um espaço 
desigual da periferia do capitalismo mundial. (ANDRADE e BRANDÃO, 
2009, p.9). 
 
Como capital do estado da Bahia, Salvador sedia os aparatos mais importantes do 
governo estadual e recebeu, ao longo de sua história, investimentos diferenciados das demais 
cidades do estado. A sua economia, baseada no setor terciário, fez dela a cidade com a maior 
concentração de renda, mas tem como uma das faces a grande desigualdade social. Como 
cidade mais populosa, abriga um grande número de sujeitos vindos dos mais diversos cantos 
do próprio estado, do País e também estrangeiros. Pela sua formação heterogênea, a “Cidade 
da Bahia” ficou marcada também pela profusão de expressões religiosas e de cultos, 
formando um campo religioso com muitos agentes em movimento. 
Na gênese do campo religioso baiano, expressões europeias, indígenas, africanas e o 
judaísmo dos cristãos novos se encontraram e são percebidos na religiosidade popular, que em 
muitos casos congregava elementos diversos em sua prática religiosa. Assim, o catolicismo 
ibérico, posteriormente, a partir do século XIX, o anglicanismo britânico, o espiritismo 
13 
 
francês, os diversos grupos protestantes norte-americanos (presbiterianos, congregacionais, 
batistas e metodistas) e as religiões de origem ou de portadores africanos (Umbanda, 
Candomblé, Islamismo) encontram-se em solo baiano. 
Adicionados em período posterior, no século XX, o Pentecostalismo e o Neo-
Pentecostalismo, representados pelas igrejas Assembleia de Deus, Deus é Amor, O Brasil para 
Cristo, Igreja Universal do Reino de Deus, Renascer em Cristo, Igreja Internacional da Graça 
e Igreja Mundial do Poder de Deus – só para citar as mais conhecidas – compõem o cenário 
religioso baiano no período definido neste estudo. 
Embora nosso campo de análise não se aprofunde nas questões da fenomenologia 
religiosa, cabendo estudo e análise posterior, podemos perceber que a religiosidade baiana foi 
marcada pela simbiose de elementos das diversas religiões aparecendo nas expressões das 
falas, no vestuário, no gestual, nos ritos particulares, entre outros. Também é notório que, 
desde a metade do século passado, o trânsito e/ou acúmulo de adesões religiosas tem 
aumentado no Brasil, não sendo diferente na Bahia. 
 O sincretismo, o trânsito e o diálogo inter-religioso na Bahia, e mais especificamente 
em Salvador, não eram bem vistos, e muito menos acolhidos, pelos batistas mais 
conservadores. Isso resultou num acirramento das disputas por maior visibilidade no campo 
religioso que ficou evidente nas campanhas de evangelização dos anos 1960. 
A definição de “sincretismo” não é única e consensual. Há, como tantos outros 
conceitos utilizados nas pesquisas sociais e históricas, muito debate. Utilizamos o termo neste 
trabalho conforme Ferretti, que considera o sincretismo 
 
Como elemento essencial de todas as formas de religião, que está muito 
presente na religiosidade popular, nas procissões, nas comemorações dos 
santos, nas diversas formas de pagamento de promessas, nas festas populares 
em geral, como em diversos elementos da religião oficial, por exemplo no 
Catolicismo (FERRETI, 2007, p. 4). 
 
Em 1975, a poucos anos de completarem seu primeiro centenário em solo brasileiro, a 
Denominação Batista já havia galgado algum espaço social e político. Ao longo dos anos, os 
batistas baianos foram conquistando muito além da liberdade religiosa, participando na 
política estadual e municipal. 
Portanto, o contexto político que os batistas de Salvador estavam inseridos e da 
fundação da Igreja Nazareth é adjetivado como um período de supressão dos direitos civis e 
humanos, marcado pela violência física e simbólica, e pelo combate direto aos oposicionistas. 
Estas características podem ser percebidas também nos discursos e práticas dos batistas que, 
14 
 
em grande medida, receberam prestígio e favores em troca de sua submissão “às autoridades 
divinamente constituídas” (cf. I Pedro 2.13. Bíblia). 
 
Metodologia 
 
A História tem enfoques múltiplos que permitem lançar olhares para objetos que há 
tempos eram renegados ou ignorados. A análise da caminhada de um grupo religioso é hoje 
objeto e alvo de estudos acadêmicos nas mais diversas áreas do conhecimento humano. O 
foco da História, pós-Escola dos Annales, é diverso, plural. 
 
Desde 1900 alterou-se completamente a paisagem que organiza as ciências 
humanas. O debate fundamental que obscurecia o campo epistemológico para 
a geração da volta do século era o debate sobre as relações da ciência com a 
religião, a saber, o de uma contradição insuperável entre fé religiosa e 
pensamento científico. Que se trate de Durkheim, de Pareto ou de Max 
Weber, todos três têm como primeira ambição a de serem cientistas ou sábios, 
e se chocam com as ‘teologias’ que ocupam o terreno onde pretendem 
colocar-se. Por isso mesmo, seu discurso testemunha a situação que tornou 
possível escrevê-lo. Pois, querer explicar em termos científicos uma religião 
já constitui uma confissão de que esta deixou de fundamentar a sociedade, 
significa defini-la como uma representação, tratá-la como um produto cultural 
despido de todo privilégio de verdade com relação aos outros produtos. 
(JULIA, 1976, p.107). 
 
Com efeito, a abertura para pesquisas que prestigiem aspectos sócio-culturais, 
desviando o foco das elites e dos grandes nomes e privilegiando comunidades e indivíduos, é 
concretizada num amplo número de trabalhos acadêmicos publicados ao longo do século XX 
e invadindo o século XXI. A mudança de foco teve também como consequência a ampliação 
de períodos cronológicos e temas até então pouco explorados. 
 
Tanto os Annales quanto a História Nova inovaram de dois modos o 
tratamento da religião. Primeiramente, no tocante à noção de tempo que 
contrastava com a noção de temporalidade das abordagens anteriores da 
historiografia tradicional, mais circunscritas a um tempo breve e bem curto. A 
segunda inovação foi refazer as dimensões do objeto em cada pesquisa sobre 
a religião, por considerá-la constituída por múltiplas facetas construídas social 
e historicamente. As categorias de classificação da religião foram repensadas 
e se enfatizou sua ligação com temas como o amor, a mulher, a criança, a 
família, a morte etc. Frente aos enfoques tradicionais, a religião deixou de 
estar isolada dos outros campos de saber e perdeu nitidez, mas ganhou em 
complexidade, porque novas relações históricas vieram à tona. Tais 
abordagens, até meados dos anos noventa, eram caracterizadas pela palavra 
mentalidade, que deixou de ser freqüente na historiografia, cedendo o lugar 
para "cultura" e "imaginário". (ALBUQUERQUE, 2007) 
 
15 
 
Baseado na relação da História das Religiões com a História Cultural, incluindo as 
relações de poder e o simbolismo que o campo religioso detém, utilizaremos o pensamento de 
Chartier, que indica a abertura da pesquisa histórica ao campo da cultura e religiosidade: 
 
A resposta dos historiadores foi dupla. Puseram em prática uma estratégia de 
captação, colocando-senas primeiras linhas desbravadas por outros. Daí a 
emergência de novos objectos no seio das questões históricas: as atitudes 
perante a vida e a morte, as crenças e os comportamentos religiosos, os 
sistemas de parentesco e as relações familiares, os rituais, as formas de 
sociabilidade, as modalidades de funcionamento escolar, etc. — o que 
representava a constituição de novos territórios do historiador através da 
anexação dos territórios dos outros. (CHARTIER, 1990, p.14). 
 
Comunidades cristãs protestantes produzem e são resultados de sistematizações de 
suas crenças, externadas numa ética que ao mesmo tempo que busca a universalidade, 
identifica o grupo como “separado do mundo”. O discurso teológico dos batistas, muito 
valorizado nas expressões mais conservadoras, atua como regulador dos comportamentos dos 
fiéis, como critério de congregação de comunidades numa Denominação, como balizador da 
doutrina. Por isso, ainda deste autor, utilizamos o conceito de Representação que nos ajudou 
na análise da relação entre os discursos e as práticas com os interesses dos grupos: 
As representações do mundo social assim construídas, embora aspirem a 
universalidade de um diagnóstico fundado na razão, são sempre determinadas 
pelos interesses de grupo que as forjam. Daí, para cada caso, o necessário 
relacionamento dos discursos proferidos com a posição de quem os utiliza. 
(CHARTIER, 1990, p.17) 
Utilizamos o termo Denominação ao tratar do grupo batista, sem desprezar as 
importantes discussões acerca dos conceitos que os termos empregados a grupos religiosos 
abraçam. As definições de Igreja e Seita, trabalhadas por Marli Geralda Teixeira (1975) e 
Igreja e Denominação, expostas por Elizete da Silva (2010), nos ajudam a entender a 
dificuldade em utilizar precisamente um termo definitivo para referir aos batistas. Em linhas 
gerais, os batistas não podem ser caracterizados como uma igreja, pois não praticam e não 
consideram o batismo infantil, exigindo uma “Profissão de Fé” como prerrogativa ao batismo, 
apesar de ser uma instituição comprometida com a sociedade – o que é característico às 
Religiões. Esta forma de ingresso, visando marcar a “morte” dos sujeitos para o “mundo” e o 
nascimento para uma “nova vida”, ou seja, o batismo como cerimônia de distanciamento e 
denúncia de uma sociedade “pecaminosa”, é marca das Seitas – que não preconizam o 
envolvimento com questões seculares. Por fim, utilizamos neste trabalho conceitos: Igreja e 
Denominação. O primeiro é usado quando tratamos de comunidades locais, como elas são 
16 
 
identificadas a exemplo da Igreja Batista Dois de Julho e Igreja Batista Nazareth. Aqui e ali 
utilizamos o termo igreja para nos referir ao conjunto de membros de uma comunidade, como 
exemplo: “a igreja decidiu em assembleia ordinária o encerramento das atividades”. Quando 
tratamos do conjunto de comunidades que professam os princípios batistas, adotamos a 
nomenclatura definida pelo próprio grupo: Denominação Batista. 
O conceito de “igreja”, entre os batistas brasileiros, toma dois aspectos: a igreja local 
e a igreja universal. Marli Geralda Teixeira, ao realizar um estudo sobre a mentalidade batista 
brasileira, afirmou que para os batistas “o conceito de igreja universal é compreendido como o 
corpo de Cristo. O conjunto de todos os crentes regenerados em todas as épocas, no céu e na 
terra” e segue concluindo que a igreja universal “é invisível, é o reino espiritual de Deus, 
anterior ao Cristo histórico, existente em todos os lugares onde haja salvos e regenerados” 
(TEIXEIRA, 1983, p. 107). Este conceito de igreja universal, que preza pela indistinção das 
divisões dentro do Cristianismo, admitindo apenas a exclusividade deste para a salvação da 
humanidade, não expõe as disputas pelo monopólio do campo religioso, concretizado nas 
campanhas evangelizadoras que consideram os membros da Igreja Católica – entre outros – 
como não-cristãos e, portanto, alvos de sua pregação proselitista. O conceito de igreja local é 
apresentado por Teixeira como sendo “visível, concreta, formada de pessoas vivas e sujeita a 
uma disciplina” (TEIXEIRA, 1983, p. 107). 
Os interesses dos forjadores dos discursos religiosos são voltados, frequentemente, 
para a conservação dos membros de suas congregações sob seu controle, angariar novos 
adeptos aos seus grupos e, também, conquistar a simpatia e a legitimação da sociedade – 
especialmente se o grupo for minoritário. Daí surge a importância do conceito bourdesiano de 
campo religioso, que nos permite relacionar a ordem dos discursos e das práticas religiosas 
com a ordem social e política. Segundo Bourdieu (2007) “a Igreja contribui para a 
manutenção da ordem política” (BOURDIEU, 2007, p.70), naturalizando e inculcando, 
através da educação e dos ritos religiosos (ordem simbólica), a ideia de correspondência direta 
entre a hierarquia cósmica com a uma pretensa hierarquia eclesiástica e social (BOURDIEU, 
2007, p.71). Assim, 
 
A estrutura das relações entre o campo religioso e o campo do poder 
comanda, em cada conjuntura, a configuração da estrutura das relações 
constitutivas do campo religioso que cumpre uma função externa de 
legitimação da ordem estabelecida na medida em que a manutenção da ordem 
simbólica contribui diretamente para a manutenção da ordem política, ao 
passo que a subversão da ordem simbólica só consegue afetar a ordem política 
17 
 
quando se faz acompanhar por uma subversão política desta ordem 
(BOURDIEU, 2007, p. 69). 
 
O estudo historiográfico das religiões, especificamente de uma comunidade 
protestante, focado num tempo de atuação de forças políticas antagônicas e desproporcionais 
como o fora o período da Ditadura Civil-Militar, faz emergir questões sobre as relações 
sociais e políticas dos grupos religiosos, suas preocupações com a busca pelo protagonismo 
entre as Denominações e demais expressões religiosas, a construção de sua imagem na 
sociedade na qual está inserida. 
 
 
As Fontes 
 
Estudar o protestantismo baiano, como o brasileiro, é ter à sua frente condições ora 
favoráveis, pela tradição da escrita e preservação dos documentos que registram as decisões e 
ações das comunidades, ora desfavoráveis, pelas dificuldades de acesso a tais documentações. 
As fontes consultadas foram de diversas naturezas e períodos. 
 
Fontes manuscritas 
Documentos oficiais, a exemplo das Atas das Assembléias da Igreja Batista Dois de 
Julho e da Igreja Batista Nazareth, nos revelaram as decisões finais dos grupos envolvidos, 
após as discussões dos assuntos em plenário. Talvez prezando pela praticidade na redação e 
economia de palavras, muitas falas foram suprimidas aparecendo somente o extrato resumido 
das reuniões. 
 
Fontes Orais 
Joutard, tratando dos desafios da História Oral no século XXI afirmou que o segundo 
desafio era manter-se fiel às inspirações iniciais, a saber: “ouvir a voz dos excluídos e dos 
esquecidos; trazer à luz as realidades ‘indescritíveis’, quer dizer, aquelas que a escrita não 
consegue transmitir; testemunhar as situações de extremo abandono” (JOUTARD, 200, p. 33). 
As entrevistas nos possibilitaram o acesso às falas de personagens ligadas à trajetória 
da Igreja Batista Nazareth, da Convenção Batista Baiana e à Igreja Batista Dois de Julho que 
não foram redigidas e registradas anteriormente. Da Igreja Batista Nazareth entrevistamos o 
pastor Djalma Torres e os membros fundadores Paulo Torres, Magdiel Geraldo da Silva e 
Manoel Conceição Correia. Estes três últimos foram também membros da Igreja Batista Dois 
18 
 
de Julho e nos forneceram informações sobre aquela comunidade. Da Convenção Batista 
Baiana entrevistamos o pastor Ivaldo Carneiro, que serviu como secretário executivo da 
mesma nas décadas de 1980 e 1990. 
 
Fontes impressas: 
As comunidades protestantes têm como hábito publicar dominicalmente um boletim 
com informações referentes às atividadesa serem desenvolvidas num determinado período, 
ou um relatório das que passaram, a ordem do culto (quais hinos e passagens bíblicas foram 
utilizados na cerimônia) e, na capa, um texto produzido pelo pastor da igreja. As pastorais, 
como são chamados estes textos, têm caráter reflexivo e doutrinário, revelando tanto as 
concepções do próprio pastor, como da comunidade que acolhe tal discurso. Acessamos 
alguns destes boletins da Igreja Batista Nazareth em seu Memorial ainda não publicado. 
 A Igreja Batista Nazareth completou 25 anos de fundação em 2000 e, como parte das 
suas comemorações, elegeu um Grupo de Trabalho para produzir uma obra que contasse sua 
história. Foram reunidos documentos, correspondências, recortes de jornais. Também foram 
realizadas entrevistas com membros fundadores, pastores da Igreja Batista Nazareth e com o 
ex-secretário-executivo da Convenção Batista Baiana, o pastor Ivaldo Carneiro, que estava no 
cargo em 1988 quando a Igreja Batista Nazareth fora excluída da Convenção. Este conjunto 
de documentos, ainda não tratados e não publicados, foram utilizados nesta pesquisa como 
fonte memorialística, considerando o seu esforço pela construção e manutenção de uma 
memória do grupo. Obviamente não se trata de uma obra que cumpra alguma metodologia 
cientifica e, por isso, mereceu uma análise cuidadosa. O material reunido não segue um 
padrão de formatação – alguns não receberam numeração de páginas e título, outros não 
apresentam a autoria, não há informação da data de produção, nem seguem uma ordem de 
aparição regular. A falta de padrão dificultou o trabalho de referência, ficando todo o material 
sob o termo Documentos da IBN. São feitas melhores referências das partes que receberam 
alguma informação adicionando-se na citação e na referência o título, a autoria ou o número 
de páginas quando houver. Estas partes são apresentadas no texto de uma maneira que 
localize mais aproximadamente o leitor ao documento citado. 
Há muitas informações importantes sobre os batistas no Brasil e na Bahia circulando 
em seus jornais confessionais: O Jornal Batista, sob responsabilidade da Convenção Batista 
Brasileira e O Batista Baiano, sob direção da Convenção Batista Baiana, são periódicos que 
fazem propaganda das atividades dos batistas no Brasil e na Bahia, respectivamente. Ao lado 
das notícias dos eventos, os jornais completam suas páginas com as formulações doutrinárias 
19 
 
e normativas, buscando formar uma mentalidade batista. Este material serve como fonte para 
a coleta e análise da interpretação batista dos acontecimentos noticiados. 
 O jornal A Tarde, de ampla circulação em Salvador e com uma linha editorial ligada 
às elites econômicas da capital baiana, apareceu em alguns momentos estampando em suas 
páginas e colunas os acontecimentos aqui estudados. Esta constatação nos permitiu perceber a 
extensão do alcance das disputas e posicionamentos das comunidades religiosas envolvidas. O 
uso desta fonte ocorreu sob a circunstância da necessidade, ou seja, conforme clara indicação 
de sua aparição e não de forma intensiva. 
 
Sobre a Historiografia 
 
A historiografia sobre o tema da relação dos protestantes com a Ditadura, bem como 
dos batistas e o mesmo período, está aumentando nos últimos anos graças ao esforço de 
pesquisadores comprometidos e engajados em grupos de pesquisas da História das Religiões. 
As dissertações e as teses de Marli Geralda Teixeira e Elizete da Silva são materiais 
fundamentais nesta pesquisa pois, além de serem algumas das primeiras obras do gênero, 
priorizaram a análise da gênese e o desenvolvimento dos batistas na Bahia. As suas pesquisas 
redundaram no interesse de outros historiadores, tendo como consequência a constante 
produção de dissertações e teses sobre o tema. Os trabalhos de Jorge Nery, Luciane Silva de 
Almeida, Charlene Brito são resultados do Programa de Pós-Graduação em História da 
Universidade Estadual de Feira de Santana (PPGH-UEFS), que sedia o Centro de Pesquisa da 
Religião (CPR), grupo de pesquisa que tem se debruçado sobre a História das Religiões das 
mais diversas tradições e origens. Os textos de Zózimo Trabuco, também participante do CPR 
e pesquisador dos batistas, foram especialmente importantes por apresentar a formação 
teológica dos pastores batistas baianos, a partir do Seminário Teológico Batista do Nordeste – 
o principal centro formador de pastores, missionários e lideranças batistas na Bahia – também 
a relação dos protestantes com as esquerdas e as minorias no período ditatorial, entre outros 
trabalhos. 
Colaboram ainda, na composição desta bibliografia, os trabalhos acadêmicos de 
Marcio Ananias, Grimaldo Zachariadhes e Vasni de Almeida: o primeiro estuda as relações 
do presbiterianismo e a Ditadura, o segundo se dedica ao estudo do catolicismo no período e o 
último pesquisador trata do grupo Metodista e sua trajetória no Brasil. Há tantos outros 
trabalhos de conclusão de cursos que enfatizam ora os grupos religiosos ora o período e que 
20 
 
contribuíram para a composição desta pesquisa e que estão relacionados como obras 
consultadas. 
 A História das Religiões tem se debruçado, nos últimos anos, sobre o tema do 
protestantismo no Brasil com muito interesse. Mas não é recente a produção de obras que 
tenham o protestantismo e, mais especificamente, os batistas como sujeitos. Propomos a 
divisão destes materiais em três categorias observando os critérios da forma de produção, 
circulação e rigor com o uso de documentos. Assim, podemos dividir os trabalhos em: 
 
1) História Apologética: visando dirimir as resistências ao protestantismo, procurava 
demonstrar a antiguidade e a ligação orgânica com o movimento de Jesus. São textos 
confessionais, sem preocupação com a coleta e tratamento de fontes históricas, resultado do 
envolvimento pessoal com a divulgação de ideias positivas acerca do sujeito. Nesta categoria 
estão as obras O Rastro de Sangue, de J.M. Carroll, e Uma Breve História dos Batistas, de 
José Reis Pereira. Ambos foram pastores batistas. O primeiro defendeu a tese da origem dos 
batistas no movimento de Jesus, registrado no Novo Testamento, sendo a continuidade 
preservada em grupos sectários da igreja majoritária. O segundo, apesar de expor outras duas 
narrativas – a da ligação espiritual com os Anabatistas e da sucessão das igrejas a partir do 
separatismo inglês – defendeu ser possível uma conjugação das teorias. Diz o autor 
 
Que é possível aproveitar alguma coisa de cada uma dessas teorias. É preciso 
ter em mente que o nome ‘Batista’ é um rótulo, uma designação cômoda, um 
apelido adotado por inimigos do povo batista, com o objetivo de melhor 
caracterizá-los. Não nos deixemos perturbar pelo nome. Lembremo-nos 
também que para Jesus Cristo essas designações humanas não têm 
importância. Para ele seus discípulos são seus filhos. Importa ao discípulo que 
seja fiel, importa ao discípulo que seja obediente. Temos, então, que examinar 
o problema histórico do ponto de vista da obediência e da fidelidade a Jesus 
Cristo. (PEREIRA, 1979, p.6) 
 
Ora, o desvio proposto pelo autor não elimina as consequências da aceitação de uma 
ou de outra tese. Defender a ideia da origem e continuidade dos batistas pelo Novo 
Testamento é tornar o grupo um representante autêntico do Cristianismo. Seguir a ideia que 
defende a ligação espiritual, ou seja, ideológica do movimento Anabatista é confirmar uma 
participação nas lutas pela implantação de um novo estado social/religioso. A terceira tese, 
que conecta os batistas ao separatismo inglês, é considerada a mais coerente pela existência de 
fontes escritas e pela possibilidade de mapear a trajetória do grupo a partir de 1609 até os dias 
21 
 
atuais numa sucessão de comunidades religiosas com o nome e esposando as principais 
características e doutrinas dos batistas. 
 Sobre este tipo de publicação, Elizete da Silva explica:A produção historiográfica apologética deve ser criticada pela sua 
confessionalidade, que impedia uma abordagem contextualizada que tomasse 
como referência a realidade brasileira. No entanto, convém reconhecer a 
importância desses primeiros trabalhos como fontes para estudos futuros e 
como registro de uma corrente historiográfica onde predominava a inspiração 
religiosa. (SILVA, 2010, p.20). 
 
Este tipo de historiografia foi gradativamente substituído por um tipo mais ocupado 
com a exposição das fontes. Ainda produzida por indivíduos ligados à Denominação Batista, 
uma historiografia menos apologética e mais preocupada com a narrativa dos acontecimentos 
toma lugar. 
 
2) História Religiosa: As obras História dos Batistas no Brasil, de A.R. Crabtree e 
História dos batistas no Brasil de 1907-1935 de A.N. Mesquita são exemplares desta 
produção. As duas obras formam um único projeto em dois volumes e tem como característica 
o olhar triunfalista, uma narrativa factual e a preocupação de demonstrar os avanços 
numéricos e territoriais dos batistas utilizando relatórios e anuários. A finalidade desta 
categoria de obras é o registro das ações da Denominação sob as benesses do divino. Assim, 
os fatos comprovados nos documentos, não escondem as dificuldades e até algum retrocesso, 
mas reputa à ação divina todas as decisões e as consequências dos acontecimentos. Leonard, 
comentando sobre esta historiografia, afirmou que: 
 
O histórico dos batistas, redigido pelo missionário A.R. Crabtree e pelo pastor 
brasileiro Antônio N. Mesquita, História dos batistas no Brasil (Rio, 1937-
1940, 2 vols.) tem pelo menos o mérito de citar, muitas vezes por extenso, 
documentos numerosos e de não esconder as dificuldades eclesiásticas que 
esta igreja experimentou. (LEONARD, 2002, p. 21). 
 
 O mérito de não esconder as dificuldades enfrentadas pelos batistas não torna a obra 
um espécime fidedigno e isento de críticas. Pelo contrário, a divulgação das dificuldades e de 
numerosa documentação sem a análise conjuntural e dos interesses dos sujeitos participes dos 
fatos narrados pode sugerir uma fuga à soberana vontade divina, espécie de bunker que 
protege os discursos das críticas e das oposições. Os documentos apresentados nestas obras 
servem, em primeiro lugar, como testemunhas do historiador e não como fontes sobre as quais 
a descrição e a análise das trajetórias se sustentam. 
22 
 
 Em momento posterior, houve um crescente interesse de pesquisadores brasileiros no 
fenômeno religioso, suas influências na sociedade e o efeito das configurações sócio-políticas 
no campo religioso, buscando elaborar uma metodologia apropriada e ajustada à cada 
disciplina: 
 
Recentemente, o estudo do sagrado e suas interfaces tem tido um interesse 
crescente por parte dos estudiosos. Ao mesmo tempo, tem ensejado discussões 
teóricas e metodológicas proveitosas que buscam clarear aspectos relevantes, 
como o debate epistemológico sobre o estatuto científico da religião. Por 
exemplo, o debate sobre um campo específico de trabalho que possa definir se 
falamos de uma Ciência da Religião ou de Ciências da Religião, no plural, 
agregando vários saberes científicos, conforme a contribuição de Floriano e 
Prandi (1999). (SILVA, 2010, p. 15) 
 
Este debate acerca dos conceitos teóricos e metodológicos permitiu a emergência de 
uma História das Religiões, que dialoga com a História Cultural. 
 
3) História do Protestantismo: desenvolvida a partir do século XIX, demonstrando 
interdisciplinarmente as interfaces entre as religiões e as religiosidades com a Sociologia, a 
Economia e a História, aportou no Brasil na segunda metade do século XX com o francês 
Émille Leonard. 
 Em sua obra O Protestantismo Brasileiro: Estudo de Eclesiologia e História Social, 
Leonard contribuiu inaugurando uma produção historiográfica crítica. Ele, de origem 
reformada, realizou uma pesquisa com o propósito expresso de tentar “Um estudo de 
eclesiologia e de história social religiosa. Ciências ainda incertas e tão recentes que poucos 
exemplos se encontrariam, pelo menos se tomarmos estes termos no sentido restrito e preciso 
de que aqui nos servimos”. (LEONARD, 2002, p. 19). Esta pesquisa apontou caminhos e 
métodos que serviram às gerações posteriores sendo o autor e a obra citados regularmente 
como referências nos trabalhos acadêmicos dedicados à História do Protestantismo. 
 Graças aos programas de pós-graduação em História, juntamente com o acesso às 
Universidades por maior parcela da população e um crescente interesse no protestantismo, as 
pesquisas têm sido publicadas em formato de livro, facilitando o acesso e a divulgação de 
seus resultados. 
 A lista de obras desta categoria incluem História Documental do Protestantismo no 
Brasil, de Duncan Reiley (2003); a já citada Protestantismo Ecumênico e Realidade 
Brasileira, de Elizete da Silva (2010); além de inúmeras coletâneas de artigos reunidos em 
livros como Ditadura na Bahia (2009); História, Cultura e Poder (2010); Fiel é a Palavra 
23 
 
(2011); Cultura, Sociedade & Política (2014); e mais especificamente sobre os batistas, Os 
Batistas: controvérsias e vocação para a intolerância (2012). A Seara e os Ceifeiros: 
Educação teológica, narrativas de conversão e identidade batista (1960-1990) (2014) e À 
Direita de Deus, À Esquerda do povo: protestantismos, esquerdas e minorias (1974-1994) 
(2016), ambos de Zózimo Trabuco. 
Hodiernamente, pela facilidade de acesso à rede mundial de computadores, muitos 
artigos e comunicações publicados em revistas digitais e em anais dos encontros de 
historiadores estão disponibilizados. Revistas ligadas à programas de graduação e pós-
graduação de Faculdades e Universidades se constituiu em um avanço e uma preocupação. O 
avanço se deu pela possibilidade de se criar um largo banco de artigos acadêmicos, 
promovendo a circulação de pesquisas por todo o espaço virtual. A preocupação se 
estabeleceu pela insegurança na qualidade das informações que são veiculadas. Assim, se faz 
necessária a pesquisa e a crítica sobre o hospedeiro de tal artigo, bem como a qualificação 
do(s) autor(es) dos materiais acessados. 
 
Sobre a Dissertação 
 
Esta dissertação está dividida em quatro capítulos. No primeiro capítulo, intitulado A 
Bahia, a Fé e a Política, desenvolvemos uma análise sucinta da formação do campo religioso 
e político baiano e soteropolitano. Destacamos o catolicismo baiano, como detentor do maior 
número de adeptos no Brasil, e com características especificas na Bahia; utilizamos a 
descrição genérica de Povo de Santo ao tratar de várias expressões religiosas de origem 
africana, importante segmento religioso na formação da cultura religiosa na Bahia, e no 
Brasil; o protestantismo aparece representado pelos anglicanos, luteranos, metodistas, 
presbiterianos e assembleianos, com ênfase no século XX. Registramos a presença do 
Espiritismo, Islamismo e Judaísmo, a título de citação, sem entrar em pormenorizações, tendo 
em vista a objetividade do tema proposto. 
 No segundo capítulo o foco está na Igreja Batista Nazareth. Analisamos a 
Denominação Batista, sua inserção no Brasil e na Bahia, suas características fundamentais 
atreladas a um tipo de liberalismo, democracia e exclusivismo. Desta Denominação surgiu o 
grupo que formou o núcleo fundador da Igreja Batista Nazareth. Tratamos de sua atuação na 
Igreja Batista Dois de Julho e dos acontecimentos relevantes que os impeliram à sair e 
organizar a Igreja Batista Nazareth, em 1975. 
24 
 
 No terceiro capítulo abordamos a trajetória da Igreja Batista Nazareth. Daremos 
atenção aos fatos que estão relacionados à saída dos jovens da Igreja Batista Dois de Julho, os 
procedimentos para a formação de uma nova comunidade batista, a organização da Igreja 
Batista Nazareth, o procedimentos para sua filiação à Convenção Batista Baiana, a estrutura 
eclesiástica adotada e sua formade funcionamento. 
O quarto capítulo tem como foco a prática ecumênica, as ações e o envolvimento com 
os Movimentos Sociais no período final da Ditadura Civil-Militar no Brasil. Analisamos a 
expulsão da Igreja Batista Nazareth do rol de igrejas filiadas à Convenção Batista Baiana, em 
1988, como resquícios do autoritarismo do período totalitário da História do Brasil e do anti-
ecumenismo, sempre presente entre os batistas. 
Por fim, à guisa de considerações finais, descrevemos os resultados alcançados nesta 
pesquisa, que demonstrou ter sido a Igreja Batista Nazareth uma expressão protestante 
progressista entre os batistas baianos. 
25 
 
Capítulo 1. A Bahia, a Fé e a Política 
 
A relação entre política e religião pode ser encontrada, em maior ou menor grau de 
mútua interferência nas sociedades, em vários períodos da história da humanidade. Isso se dá 
por que o poder simbólico dos rituais e dos agentes religiosos apresentam também força de 
capital político (BOURDIEU, 2007, p 30). Os agentes religiosos, detentores do saber fazer e 
saber dizer teológicos, podem tanto legitimar uma ação ou posição política, dando sacralidade 
à ela, quanto condená-la e, assim, atestá-la como danosa e malévola à sociedade. Por outro 
lado, a divinização, o culto e a devoção a indivíduos detentores dos poderes políticos não é 
algo impossível, nem mesmo raro. 
 É importante, neste estudo, escrever algumas linhas sobre a relação da cidade, com o 
campo religioso e campo político voltando, em caso de necessidade, a tempos anteriores ao 
focalizado na pesquisa a fim de encontrar indícios de uma gênese das características 
encontradas na trajetória do sujeito de estudo. 
 
1.1 São Salvador da Bahia de Todos os Santos 
 
A escolha da Salvador, como ponto de partida da inserção da Denominação Batista 
entre os brasileiros, obedeceu critérios geográficos e políticos claros e objetivos. Salvador era 
a capital da então Província da Bahia e tem a importância de ter sido a primeira Capital do 
Brasil. Além das questões políticas, Salvador tinha, e ainda tem, uma grande população 
sendo, então, um alvo preferencial na consecução de novos adeptos. 
Não é o objetivo desta pesquisa a História da fundação e do crescimento de Salvador1, 
mas é preciso apontar elementos que julgamos importantes na contextualização do nosso 
sujeito. A história da ocupação e urbanização de Salvador coloca a capital baiana como uma 
das principais capitais brasileiras, e entre os batistas brasileiros, como a base de operações 
para a expansão do grupo em todo o Brasil. 
Por ter sido por longo tempo a sede do Governo Geral a época do Brasil Colonial, e 
primeira capital do Brasil, a cidade de Salvador recebeu aparelhos urbanísticos e de Estado 
diferenciados de outras localidades. Além disso, a população soteropolitana foi ao longo dos 
séculos sendo formada tendo como base o entrelaçamento de grupos étnicos de origens já 
 
1 Para o estudo da História de Salvador, indicamos os trabalhos consultados: Geografia de Salvador, de 
Adriano B. Andrade e Paulo Roberto Baqueiro, publicado pela EDUFBA (2009); Ideais de civilização e cenas 
anti-civilidade em um contexto de modernização urbana Salvador, 1912-1916, dissertação de mestrado de 
Rinaldo Leite (UFBA, 1996); O perfil da mobilidade urbana em Salvador (1975-2012): a cidade dividida, 
tese de doutorado de Francisco Ulisses Santos Rocha (UFBA, 2014). 
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tradicionalmente conhecidas: os povos pré-cabralinos (Tupinambás, em sua maioria), os 
povos africanos escravizados e os colonizadores portugueses. 
Os holandeses ocuparam a Bahia no século XVII mas, permanecendo menos que meio 
século em solo nordestino, não chegaram à estabelecerem-se como um grupo constituinte da 
gênese populacional da Bahia. No século XIX, com a abertura dos portos brasileiros às nações 
amigas de Portugal, ingleses e norte-americanos se estabeleceram em todo o País e, também, 
na Bahia. A presença destes elementos influenciou na trajetória sócio-política e econômica de 
Salvador e também houve reflexos na cultura e, mais especificamente, no campo religioso. 
 A pluralidade de expressões de fé é uma das marcas identitárias mais fortes do Brasil. 
Em todo o território nacional, as religiões e as religiosidades se multiplicaram ao longo dos 
séculos, tomando formas e expressões próprias e distintas do momento anterior aos contatos 
estabelecidos pela união de seus agentes. Esta simbiose e conectividades das práticas 
religiosas de matrizes diferentes, características de povos multiétnicos, formam um quadro 
difícil de mapear a partir das tradições originais. Também é complexa a identificação, mesmo 
que autodeclarada, a que religião ou culto os indivíduos estão ligados: 
 
O sincretismo caracteriza-se pela mistura entre duas religiões, ou ainda, 
a prática simultânea de duas ou mais religiões. Para fins estatísticos, o 
sincretismo religioso coloca-se como um problema de difícil solução, 
pois os questionários censitários costumam realizar a pergunta tendo 
em vista a opção por uma das respostas do questionário. Do mesmo 
modo, quando o entrevistado responde, ele pode ter em mente apenas a 
religião à qual julga pertencer por algum critério subjetivo, como laço 
familiar, status sócio-econômico, ou ainda preconceito religioso. Deste 
modo, nos dados oficiais algumas religiões/grupos religiosos aparecem 
sub-representados, como as religiões afro-brasileiras, sobretudo a 
umbanda e o candomblé. (DIAS e LIMA, 2012, pp. 313-314) 
 
A formação do Campo Religioso brasileiro é análoga, de certa maneira, à gênese do 
Campo Religioso soteropolitano: o xamanismo naturalista dos povos pré-cabralinos, o 
catolicismo do colonizador português, os orixás dos africanos escravizados, o protestantismo 
dos anglo-americanos, além de judeus e islâmicos que também habitaram e habitam a Bahia. 
 Para a nossa pesquisa, analisaremos o catolicismo, como igreja majoritária, sem uma 
preocupação com as suas diversas manifestações e devoções, por isso não pluralizaremos o 
termo; a religião de matriz africana, o candomblé, perseguido por católicos e protestantes após 
a proclamação da República, servirá como representante das diversas tradições de mesma 
27 
 
raiz; e, para não deixar de citar, outras expressões com número de adeptos ainda pequeno em 
relação às outras: espiritismo e islamismo e o judaísmo. 
 Por força das interações ocorridas em solo nacional, nenhuma das expressões 
religiosas permaneceu inalterada. Em solo brasileiro, a trajetória existencial dos indivíduos, a 
totalidade de suas experiências, bem como o distanciamento dos centros de normatização 
religiosa – quer seja Roma, Londres ou qualquer outro – possibilitaram uma transmutação das 
religiosidades, agregando ritos, linguagens, imagens e devoções. As práticas religiosas 
superavam a sistematização doutrinária, a limitação espacial e as limitações do corpo clerical: 
 
Fica patente que as relações de caráter religioso não estavam subordinadas aos 
limites paroquiais e sim às possibilidades concretas de deslocamento do povo. 
A prática anulava a jurisdição canônica. O sentido de pertença a uma 
comunidade ideal, espacialmente determinada, não tinha vigência para o povo 
que recorria ao presbítero mais próximo, como a um despachante do sagrado. 
Não recebia assistência por quem de ofício, nem socorro da caridade pastoral 
dos párocos confinantes. Ficava entregue a si mesmo, à espera do missionário 
visitador. (SILVA, 1982, p. 17). 
 
Tomando contornos específicos, entendemos que o catolicismo português aqui se 
transformou no catolicismo baiano. Outras religiões também foram atingidas pelo mesmo 
processo de apropriação teológica, doutrinária e prática, apresentando contornos mais 
específicos, ressignificações e representações. Assim, conforme Chartier: 
 
Fundada sobre o primado da liberdade do sujeito,pensado como livre de toda 
e qualquer determinação, e privilegiando a oferta de idéias e aparte refletida 
da ação, uma tal posição obstina-se numa dupla importância: ignora as 
exigências não sabidas pelos indivíduos e que no entanto regulam — aquém 
dos pensamentos claros e muitas vezes apesar deles — as representações e as 
ações; supõe uma eficácia própria às idéias e aos discursos, separados das 
formas que os comunicam, destacados das práticas que, ao se apropriarem 
deles, os investem de significações plurais e concorrentes. (CHARTIER, 
1991, p. 188) 
 
O campo religioso baiano foi marcado por inserções de religiões e religiosidades, 
apropriadas e ressignficadas ao longo do tempo e por muitos sujeitos. 
 
1.2 O Campo Religioso Soteropolitano 
 
 As possibilidades de experiências religiosas em Salvador eram variadas. As mais 
conhecidas são as do catolicismo, do candomblé, do espiritismo e do protestantismo. 
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Traçaremos linhas superficiais apenas com o intuito de fazer conhecer as inserções destes 
grupos no espaço geográfico em questão e, destarte, iluminar o quadro onde o nosso sujeito se 
situa. Não entendemos ser possível falar de uma comunidade de fé sem antes assentá-la em 
um contexto de diálogo e debate com outras comunidades que dividem o mesmo espaço e 
disputam a atenção e privilégio de uma mesma população. 
 
O Catolicismo Baiano 
 
 O processo de colonização portuguesa e espanhola seguiu um padrão: onde chegava 
um navio ibérico, chegava a Igreja Católica. Assim, o Brasil em 1500 não somente recebeu 
em suas praias conquistadores portugueses, mas também o clero católico. 
 
Ligados a Deus, os homens do tempo sentiam-se dependentes dos 
eclesiásticos, mediadores entre eles e a divindade. Imprescindível, portanto, a 
presença deles nas embarcações que zarpavam para terras de infiéis para as 
aventuras atlânticas das descobertas. A armada cabralina, por exemplo, trouxe 
um capelão-mor: frei Henrique Soares, chefe de sete frades de São Francisco. 
Esta vinculação dos homens à Igreja tornava impossível o laicismo. (MELO, 
2010, p. 16) 
 
 A conquista de terras ultramarinas era tanto uma expansão política e econômica da 
coroa portuguesa, quanto uma expansão do catolicismo. De toda sorte, as expansões 
interligadas por projetos de poder resultaram no enriquecimento das duas instituições: mais 
terras e mais glória ao rei de Portugal e à Santa Sé. Mas, a vantagem de Roma era maior pois 
podia se servir dos préstimos das coroas ibéricas e, desse modo, conquistar todo o sul global. 
O projeto de expansão territorial das monarquias europeias era travestido, por força de uma 
mentalidade religiosa – resquícios de um medievo marcado pelas lutas contra os infiéis 
mouros-muçulmanos –, por um discurso de evangelização de toda a orbe. Assim, 
 
O rei, padroeiro e administrador da ordem de Cristo, por mercê do papado, 
tinha o dever de organizar a vida eclesiástica do Brasil, zelar pelo seu bom 
funcionamento e pela manutenção da cristandade de seus súditos. Dever de 
consciência para D. João III, já que os reis portugueses tinham como 
obrigação inerente o apostolado ultramarino. (MELO, 2010, p. 17). 
 
 Assim, ao chegar ao Novo Mundo, as naus portuguesas iniciavam não somente o 
processo de ocupação, mas também de catolização dos povos pré-cabralinos. As ações da 
coroa portuguesa, combinados com as ações eclesiásticas católicas, tinham como objetivo 
final a liderança política na Europa numa combinação onde o enriquecimento do Estado era, 
29 
 
consequentemente, o enriquecimento da Igreja. A benção da Igreja para as navegações e 
colonizações ultramarinas eram uma garantia de legitimidade diante da cristandade europeia, 
assim sendo, tanto Portugal, quanto a Espanha, foram autorizados e abençoados na empreitada 
no além-mar. 
 
Paralelamente, também a monarquia espanhola receberia do papado, através 
de outra série de bulas e breves, entre as quais se destaca a Universalis 
Ecclesiae de 1508, o direito de patronato sobre as suas conquistas. 
Preocupados com as questões europeias, os papas do século XVI, mesmo após 
o Concílio de Trento, abandonaram aos reis ibéricos a missão religiosa no 
ultramar, concedendo-lhes enormes privilégios que, no século seguinte, o 
papado tentaria em vão recuperar. (LIMA, 2014, p. 47) 
 
É desta relação e troca de benefícios que nasce o Padroado, instrumento muito 
importante na construção da mentalidade brasileira tanto em questões políticas, quanto 
religiosas. Segundo Solange Alves, o Padroado confirmou ainda mais a liderança da Igreja no 
Brasil nas mãos dos monarcas portugueses (ALVES, 2003, p.30). 
 A oficialização da Igreja Católica em solo brasileiro data de 1551, por ocasião da 
instalação do primeiro bispado, na Bahia. A partir de então, a organização, manutenção e 
expansão do catolicismo passou a ter sede e representantes da Santa Sé no Brasil, regendo os 
oficiais das paróquias e intermediando comunicações com Roma. O Padroado, no entanto, 
permitiu que a coroa portuguesa tivesse acesso às decisões importantes do âmbito da Igreja 
em seus domínios, nomeando e confirmando clérigos e suas movimentações, atestando e 
fazendo cumprir decisões da Igreja em solo sulamericano, receber e administrar os recursos 
financeiros e patrimoniais da Igreja (SANTIROCCHI, 2013; PINTO, 2013). 
 Em solo americano, as decisões régias e papais eram atendidas sem interferência e, 
pelo poder simbólico conferido ao Rei, a palavra da coroa era recebida como sendo a vontade 
divina. Em duas ocasiões esta conexão direta foi interrompida por força das invasões francesa 
e holandesa nos séculos XVI e XVII. O segundo momento de abalo na relação Igreja-Estado 
ocorreu já no século XIX, com o episódio denominado de “Questão Religiosa”, no século 
XIX, quando o bispo de Olinda, D. Vital, e o bispo do Pará, D. Antônio Macêdo Costa, 
resolveram interditar todos os maçons, esposa e filhos impedindo-os de participar dos 
sacramentos. Sobre o último, COSTA (2016) afirmou que 
 
Seu ultramontanismo religioso conduziu-o a uma participação ativa na 
Questão Religiosa (1872-1875), junto com D. Vital Maria Gonçalves de 
Oliveira, bispo de Olinda. Neste processo ocorreu a interdição de irmandades 
com participação maçônica pelos bispos, detenção e condenação à prisão de 
30 
 
ambos e finalmente anistia deles pelo imperador devido à determinação de 
Caxias, chefe de um gabinete conservador. (COSTA, 2016, p. 9) 
 
Ao lado do Padroado, o catolicismo brasileiro do século XIX foi também marcado 
pela organização de irmandades e confrarias, associações religiosas geridas por leigos com a 
finalidade de promover a sociabilidade, a caridade e a devoção. 
 
As irmandades tiveram sua fase áurea no período colonial e continuaram 
atuantes durante o império. O que unia os irmãos era a vivência laica da fé 
cristã, expressa na exterioridade cênica, no “teatro das representações 
edificantes” (...) Além do desenvolvimento da fé cristã, as associações leigas 
promoviam a sociabilidade, a ajuda mútua e a assistência espiritual e material 
durante a vida e na hora da morte (funeral, sepultamento na capela, nos 
carneiros ou no cemitério próprio e, ainda, pensões para a viúva e os órfãos). 
(COUTO, 2013, p. 86) 
 
 A formação das irmandades e das confrarias no Brasil obedeceu a critérios sociais e 
étnicos. Em Salvador, estavam divididas entre portugueses, brancos brasileiros, negros e 
negras de diversas nações, pardos (COUTO, 2013, p. 85-86). As diferenças étnicas e sociais 
foram importantes não somente na formação de uma identidade étnica-religiosa, mas também 
na formação da religiosidade. Falando sobre o catolicismo brasileiro, Rodrigo Franklin de 
Sousa afirma 
 
O catolicismo brasileiro é plural e diverso, amplo, sincrético, heterogêneo, 
plástico. As suas várias vertentes podem ser tidas como um verdadeiro 
mosaico de experiências e vivências de espiritualidade,que absorvem e 
moldam elementos próprios da tradição católica assim como de outras 
tradições (SOUSA, 2013, p. 286). 
 
 Os cultos e as festas católicas em Salvador e região foram marcados pela mistura de 
tradições e costumes. Os sons e gestos africanos e indígenas, elementos exógenos ao 
catolicismo europeu, foram intercambiados à tradição cultural portuguesa formando um 
catolicismo propriamente baiano. Com a instauração da República e, consequentemente, com 
a extinção do Padroado, a Igreja Católica passou a combater as práticas sincréticas e, por 
outro lado, o poder civil passou a praticar políticas públicas de amparo social. 
 
O clero, na tentativa de reforma, passou a encarar as manifestações exteriores 
da fé e religiosidade baiana, mesclada com elementos africanos, como ameaça 
à hierarquia e desvio da ortodoxia. Com o fim do padroado e a separação 
entre Igreja e Estado, foi cortado o vínculo entre as irmandades e o poder 
civil. Os políticos baianos passaram a criar hospitais e outras associações de 
socorro à população. Consideravam importante transformar Salvador numa 
31 
 
capital moderna e civilizada, desapegada dos valores tradicionais. (COUTO, 
2013, p. 88) 
 
 A Proclamação da República exigiu da Igreja Católica uma nova postura. Perdido o 
privilégio do exclusivismo, a Igreja Católica viu a abertura aos cultos não-católicos e as 
expressões sincréticas do catolicismo como uma ameaça. O prestígio social ainda era 
expressivo, garantindo a sua influência em vários setores da vida pública, mas o crescimento 
do liberalismo entre o clero católico, dos protestantes e de outros grupos religiosos 
preocupava a liderança da Igreja Católica no Brasil. Com isso, a Igreja Católica iniciou um 
projeto de retomada de espaços perdidos, numa recatolização do Brasil: 
 
Com as ações dos membros da Igreja, buscava-se que os ensinamentos 
católicos voltassem a ser um dos elementos indispensáveis da sociedade no 
início do século XX. Os projetos de politização do clero e recatolização da 
sociedade também colaboraram com a formação de um grupo de fiéis 
comprometidos com o combate ao pensamento moderno, defensores dos 
valores cristãos e das ideias dos eclesiásticos. A nova cristandade deveria 
atuar em diversos espaços, como os centros acadêmicos, as organizações que 
representavam os trabalhadores e/ou os núcleos culturais, para que as 
propostas da Igreja Católica atingissem os vários setores da sociedade. 
(MOURA, 2016, pp. 25-26). 
 
 Um dos alvos principais da crítica e combate dos católicos foram os cultos e as 
influências da cultura africana na sociedade brasileira. Era entendido que o reestabelecimento 
do auge do catolicismo brasileiro passava pela eliminação dos elementos estranhos à 
ortodoxia católica do seio e da mentalidade das práticas e do ideário dos fiéis, reformando 
costumes, condenando associações, politizando o clero, demonizando e perseguindo outras 
expressões religiosas. 
 
Dentro da reforma dos costumes, encontramos as críticas aos cultos de origem 
africana e indígena. Acreditava-se que era preciso retomar os valores e 
dogmas do catolicismo, pois, apesar dos esforços dos primeiros religiosos, “a 
religião no Brasil não se definiu, não se integralizou”, como afirmava o 
editorial do jornal Diário de Notícias em 9 de dezembro de 1912, ao tratar do 
tema “A nossa educação religiosa”. Para tal fim, deveria haver uma aliança 
entre a Igreja, o Estado e a Imprensa. Seria necessário, ainda, fazer uma tenaz 
campanha contra a “má orientação cívica e religiosa” do povo baiano. 
Identificava a origem do problema na colonização, quando os portugueses, de 
“sangue impuro com mescla de sangue mouro”, juntou-se com “os caboclos 
de vida errante, dados à prática de fetichismo, indolentes, inadaptáveis à 
civilização”. Outras vertentes do cristianismo (como o protestantismo) ou 
outras religiões (espiritismo e islamismo), também eram consideradas 
prejudiciais à sociedade baiana. (COUTO, 2013, p. 90) 
 
32 
 
 De fato, no período republicano, a Igreja Católica absorve golpes fortes e precisou ser 
mais incisiva em sua participação na sociedade. 
 
A atuação das lideranças católicas colaborou para a inauguração do conceito 
de homo ecclesiae na primeira metade do século XX, defensor da ordem 
social, da autoridade, da contrarrevolução, do nacionalismo e da restauração 
de uma moral, todos com base nos ensinamentos cristãos. Tal proposta 
também se estruturava na necessidade da organização de uma neocristandade, 
atuante a partir dos ensinamentos eclesiásticos e de combate às doutrinas 
contrárias ao pensamento da Igreja Católica. (MOURA, 2016, p. 28) 
 
 A participação do clero católico na vida política brasileira ultrapassou a barreira do 
período de vigência do Padroado unindo-se aos setores mais conservadores da sociedade civil, 
após a Revolução de 1930: 
 
Analogamente ao que ocorreu na Itália, a Igreja Católica brasileira implantava 
o modelo de igreja da Neocristandade, só que agora mais estruturado, 
norteado pelos princípios de ordem e autoridade imbuído de novo ideário 
cruzadista (contra os perigos do comunismo). Aliou-se como era de se esperar 
às hostes conservadoras e retrógradas da sociedade civil e política do País, 
implantando uma disputa contra diversos setores dessas mesmas sociedades. 
Assim foi o embate sobre a política educacional que o novo governo deveria 
gerir (o debate entre escolanovistas x conservadores), sobre o ensino religioso 
as questões sobre a família (proibição do divórcio) e a perseguição nem 
sempre velada a outras religiões. Essas foram, ao nosso ver, as lutas mais 
significativas que a Igreja Católica brasileira empreendeu nesse período da 
história do Brasil para continuar a influenciar a sociedade brasileira (ALVES, 
2003, p. 48) 
 
 O conservadorismo, o combate à ameaça comunista, a perseguição às religiões e 
religiosidades divergentes são marcas permanentes do catolicismo brasileiro no século XX. 
As exceções são pontuais e posteriores à década de 60, quando do surgimento e propagação 
da Teologia da Libertação. Interessante notar que as características elencadas são 
compartilhadas com os protestantes, especialmente os batistas. Tanto o conservadorismo, o 
combate à ameaça comunista e a perseguição às demais expressões religiosas são marcas dos 
batistas brasileiros neste período. 
 
O Povo de Santo 
 
 No Brasil, a influência dos escravizados africanos na religiosidade se deu pari passu à 
inserção do catolicismo e o avanço do processo colonizador. Se com os navios ibéricos 
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chegavam comerciantes, oficiais das coroas, degredados e aventureiros, nos navios negreiros 
chegavam não apenas mão-de-obra escrava, mas também diversas culturas africanas. 
 Forçados ao trabalho compulsório e tratados como meros instrumentos de produção, 
os africanos sofreram também com os cerceamentos e proibições de seus usos e costumes, ou 
seja, foram separados de sua terra, seu povo e impedidos de externar sua cultura – que fora 
por muito tempo definida pelas elites como sendo inferior, primitiva e supersticiosa. A 
ausência de um livro sagrado, base para ritos e explicações teológicas, numa visão 
eurocêntrica e cristã, é o fundamento para a dificuldade de considerar os cultos de matrizes 
africanas como Religião: 
 
Uma das consequências desse postulado da primazia da strate discursive é 
expressa pelo fato de que as religiões desprovidas de um corpus escrito são 
qualificadas como primitivas e se veem frequentemente recusar o nome de 
religião. Conforme escrevem especialistas das religiões monoteístas, elas são 
tão somente crenças e práticas mágicas. Apenas os antropólogos veem aí 
religiões, na medida em que são capazes de não considerar os valores de sua 
própria sociedade como critérios de análise. (Leenhard, 2012, p.3) 
 
 Considerando as definições já apresentadas de Religião e a Religiosidade, ambas

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