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RESENHA CRÍTICA DO FILME: “ERA O HOTEL CAMBRIDGE”
FICHA TÉCNICA
Gênero: drama nacional;
Atores principais: José Dumont, Suely Franco, Carmen Silva, Isam Ahmad Issa, Thaíssa Carvalho e Paulo Américo;
Direção: Eliane Caffé;
Censura: 12 anos;
Ano de produção: 2016.
Duração: 99 minutos.
Fonte: https://diariodoturismo.com.br/filme-era-o-hotel-cambridge-tem-exibicao-gratuita/
RESUMO 
“Era o Hotel Cambridge” é uma ficção documental nacional produzido no ano de 2016, que cria uma narrativa sobre um grupo socialmente marginalizado. Protagonizada por José Dumont, Suely Franco, Carmen Silva, Isam Ahmad Issa, Thaíssa Carvalho e Paulo Américo e dirigida por Eliane Caffé, o filme trata do movimento de ocupação do Hotel Cambridge, na cidade de São Paulo, por refugiados e pessoas que perderam suas casas, pelos mais diversos motivos. 
A diretora Eliane Caffé consegue dividir o filme em duas camadas: Em uma, o edifício é tratado como componente principal da narrativa sobre militância política; em outra, ele é usado como pano de fundo para tratar das trajetórias dos refugiados (colombianos, palestinos e congoleses). Segundo Caffé (2017), “Era o Hotel Cambridge aborda um tema contemporâneo, mas ainda pouco retratado no audiovisual brasileiro: a problemática do refúgio unida às ocupações decorrentes das marginalizações sociais nas grandes cidades brasileiras”. Ela potencializa o filme com momentos fortes: Os riscos de morte daqueles que vivem num espaço ocupado à força; a ameaça de despejo pela polícia; o momento de preparação para invadir um outro prédio e a maneira como aqueles habitantes são vistos pelo senso comum que se manifesta pela internet (a exemplo da cena em que Dumont se assusta ao ver os comentários feitos no blog da ocupação). 
Além da xenofobia, a obra aborda também o preconceito que os refugiados enfrentam até mesmo com os moradores das ocupações, pois, durante uma conversa, personagens afirmam que pessoas em situação de refúgio não devem participar de movimentos políticos, e o porquê de haver a obrigação de acolher pessoas refugiadas se não há espaço nem política para os brasileiros. Nesse momento, a líder e coordenadora comunitária, Carmen Silva, retruca com a seguinte frase: “Somos todos refugiados, refugiados pela falta dos nossos direitos” (2017), enfatizando a falta de acesso dos direitos dos grupos de classe social baixa e se igualando aos refugiados quanto às necessidades de ambos. 
	
CURIOSIDADES
O cenário onde se passa o filme é o Hotel Cambridge, construído no final da década de 1950. Esse hotel luxuoso, situado em São Paulo, acomodou muitos artistas até o ano de 2002, quando decretou falência. Em 2010, por dívidas de IPTU, foi desapropriado pela prefeitura e se tornou uma moradia popular (PENERARI, 2018). A mistura de ficção e a realidade e o hibridismo são características marcantes da diretora Eliane Caffé em um conjunto de filmes. 
O longa-metragem foi indicado a cinco prêmios, entre eles, o Grande Prêmio do Cinema Brasileiro de melhor direção, que com uma grande sacada, conseguiu passar a realidade para a obra, misturando atores (profissionais) e integrantes reais da ocupação do Hotel (não profissionais). O filme foi uma criação coletiva, por meio de um processo colaborativo entre a Aurora Filmes, um grupo de estudantes de arquitetura da Escola da Cidade e o MSTC – Movimentos dos Sem Tetos do Centro. 
Além disso é uma mesclagem do cinema com a arquitetura, pois a diretora de artes, Clara Caffé, convidou 21 alunos da Escola da Cidade e, também, professor assistente de uma instituição de ensino para desenvolver a arte do filme. 
CRÍTICA
Além de tornar o filme atual, ele traz uma abordagem do tema com uma crítica social fortificada e relevante, já que o Brasil está mergulhado em crise política, e as ocupações de diferentes espaços estão sendo tomadas por movimentos diversos. Só em 2018, São Paulo atendeu 6,6 mil refugiados (MELLO, 2019) e, apesar de tão próximo, não é dada a devida atenção para as dificuldades que essas pessoas sofrem ao chegar no Brasil. A dificuldade do acolhimento dos refugiados no país se destaca, sendo permanentemente atualizada, já que esses não conseguem se inserir socialmente, dificultando sua sobrevivência. O sistema não garante cidadania e existência digna para incontáveis brasileiros e estrangeiros. A partir disso, é fundamental enxergar no filme, o registro de resistência que desmitifica os preconceitos que rodeiam os moradores de ocupações, que vêm para o país com a intenção de tentar reconstruir a vida e acabam se expondo à tensões sociais, choques culturais, violência policial e estatal, preconceito e xenofobia. 
É difícil separar o que é ficção do que é realidade, porque toda a trama gira em torno da história desses antigos moradores. A obra traz uma reflexão para o espectador da realidade de muitas pessoas e da importância da moradia na formação identitária. Com uma boa progressão dos fatos, a história é clara e detalhada nos temas abordados, tanto dos refugiados, quanto da precariedade de políticas que atendam a todos. A história do filme está aliada ao conhecimento e experiências próprias, os atores e não atores trazem uma veracidade muito forte para as telas, que é passada para o expectador de uma forma muito fácil e natural através de um roteiro claro e objetivo. 
Fora isso, o filme influencia o pensamento sobre a violação dos Direitos Humanos, já que os refugiados não têm acesso ao que está previsto na Constituição. Essa violação de Direitos Humanos é sempre o critério a ser utilizado para se determinar a necessidade de proteção internacional. Portanto, após um momento de extremo desespero de diversas nações, o regime de direitos humanos e dos refugiados foram criados (REIS; MENEZES, 2014). Tanto o regime dos direitos humanos, quanto o dos refugiados, foram consolidados depois de um grande marco histórico e cultural, a Segunda Guerra Mundial, com objetivo de oferecer dignidade às pessoas que tiveram que recomeçar suas vidas após serem obrigadas a se afastar de suas famílias, casas e histórias. A relação entre refúgio e direitos humanos pode ser compreendida a partir da fala do escritor Piovesan (2001, p. 37):
A proteção internacional dos refugiados se opera mediante uma estrutura de direitos individuais e responsabilidade estatal que deriva da mesma base filosófica que a proteção internacional dos direitos humanos. O Direito Internacional dos Direitos Humanos é a fonte dos princípios de proteção dos refugiados e ao mesmo tempo complementa tal proteção. 
O regime de proteção aos refugiados tem objetivo de visar a segurança e a dignidade das pessoas, para que não aconteça novamente o que viveram no passado ou, se acontecesse, houvesse uma possibilidade para que as vítimas escapassem de tal situação de desrespeito. 
Em vista disso, o longa tem por objetivo chocar o público, condenar ações e extinguir o preconceito quanto à questão dos refugiados. É possível concluir, por meio de dados e informações apresentados pela palestrante Maria Luisa Santos, que o Brasil é cercado de ignorância e que quando se trata de ocupar o seu espaço, a população do país não é acolhedora. O resultado disso são os conflitos e a exclusão dos estrangeiros quanto aos seus direitos expostos na Constituição Federal[footnoteRef:1]. Além disso, é necessário entender a diferença entre migrantes e refugiados. O termo migrantes corresponde à mobilidade espacial da população, trocar o local de moradia (emigrante – saída; imigrante – entrada); já o termo refugiado é representado por qualquer pessoa que — por consequência de acontecimentos, como perseguição, religião, raça, nacionalidade, questões políticas ou guerra — são obrigados a deixar seu país natal[footnoteRef:2]. [1: Comunicação oral cedida pela Professora Maria Luiza Santos, da Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC), no dia 11 de novembro de 2019, em palestra prestada aos alunos do 3º ano do Colégio Vitória.] [2: Idem.] 
Logo, não é necessário ter um conhecimento sobre o assunto abordado no filme muito aprofundado,porque a ficção documental é explicativa o suficiente para entender a situação precária dos refugiados e, certamente, você se interessará pelo tema depois de assisti-lo.
REFERÊNCIAS
ERA O HOTEL Cambridge. Direção: Leonardo Vieira. São Paulo: Vitrine Filmes, 2016. 1 vídeo (93 min). Publicado pelo canal Leonardo Vieira. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=hPUK0qh61zQ. Acesso em: 11 nov. 2019.
MELLO, Daniel. Estudo revela que capital paulista atendeu 6,6 mil refugiados em 2018. Agência Brasil, Brasília, 23 out. 2019. Disponível em: http://agenciabrasil.ebc.com.br/direitos-humanos/noticia/2019-10/estudo-revela-que-capital-paulista-atendeu-66-mil-refugiados-e. Acesso em: 16 nov. 2019.
NOS ANOS 50, era o Hotel Cambridgde. Hoje, é a moradia de 150 famílias. Ittc, São Paulo, 25 ago. 2017. Disponível em: http://ittc.org.br/era-o-hotel-cambridge-hoje-moradia-de-150-familias. Acesso em: 14 nov. 2019.
PANERARI, Vanessa. Era o Hotel Cambridge e o (não) pertencimento. Francamente Querida, São Paulo, 18 jul. 2018. Disponível em: http://www.francamentequerida.com.br/era-o-hotel-cambridge. Acesso em: 14 nov. 2019.
 
REIS, Rosana Rosa; MENEZES, Thais Silva. Direitos humanos e refúgio: uma análise sobre o momento anterior à determinação do status de refugiado. Rev. Soiciol. Polit., Curitiba, v. 22, n. 49, p. 61-83, mar. 2014. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-44782014000100004. Acesso em: 18 nov. 2019.

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