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Pierre Hadot - O que é a filosofia antiga_ - Primeira e segunda partes-Edições Loyola (2014)

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Titulo original:
Ou’est—ce que la philosophie antique?
© Editions Gallimard, Paris, 1995
ISBN 2-O7-032760-4
Sumdrio
Edigéoz Marcos Marcionilo
Consultoresz Mara Faury, Carlos Arthur Ribeiro
do Nascimenio e José Eduardo Q ,
Marqueg BaiQni ....................................................................... ..
At r " b'b|' 1' 10" 0 'M d
A . .
Pr::al::;c<: ° Mm MI I’ . /
' " ” ca do loso 0 e seus antecedentesReviséoz Renato da Rocha Carlos J demgao platom f
Mauricio Balthazar Leal CAPiTULO 1
Dla9'a"‘a§5°‘ Te"“a d°S S""‘°S C“s‘°d‘° A FILOSOFIA ANTES DA FILOSOFIA ....................... ..
A historia dos primeiros pensadores do Grécia
A paideia ................................................................ ..
Os sostas do século V ........................................................ ..
CAPiTULo 2
0 SURGIMENTO DA No<;A0 ma “FILOSOFAR” ................ .. 35
O testemunho de Herédoto ..................... ....... ..
A atividade loséca, orgulho de ....... ..
Edigées Loy°|a Jesuitas A noodo de sophia .............................................................. ..
Rua ‘I822, 341 — lpiranga ,
0421<s»000 S50 Paulo, SP CAPITULO 3
T 55 11 3385 8500 A FIGURA DE SOCRATES ...................................................... ..
F 55 ll 2063 4275 Agura de Socrates ................................................ .editoria|@loyo|a.com.br
vendas@|o Ola b O ndo saber socrdtico e a critica do saber so1s'tico....... . 50y . om. r
. . , - - ,www_|°yo|a_c°m_br O apelo do “indzmduo” ao “md1mduo”...:....... ..: .......... 56
T d d_ O saber de Socrates: o valor absoluto da mtenqao moraO OS OS lie! OS !'€$€TV8 OS. 6!"! LIFTT8 parte GS B O T3 PO 9 - . -se,,ep,OdUZ,-daGUt,a,,smmdaporqwquerformae,ouqua,5que, Cmdado de s1, cuuiado dos outros...................................... ..
meios (eletrénico ou mecénico, incluindo fotocopia e gravagéo) C ,
rou arquivada em qualquer sisterna ou banco de dados sem APITULO 4
permisséo escrita da Editora.
A DEFINICAO no FILOSOFO NO BANQUETE DE PLATAO..
ISBN 978-as-15-01785-0 0 Banquete de Platdo........................................................ ..
6‘ ediqéoz margo de 2014
conforme novo acordo ortografico da Lingua Portuguese i
© EDIQOES LOYOLA, Séo Paulo, Brasil, 1999 5
I 5% '.
ill-'-*7
Ems, “mm 8 <»Mwf@~-~--~-i --------- -L 72 , - ................................................. .. 189Isécrates ..................................... . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. 83
, _ , _ _ , . . _ . ..
_$‘(gIl”d(l /)(”.[(, A $601111 . . . . . . . . . . . . . . . . . . ..
_/-I_/('),g-Qu (-()|)1() ”]()([() (ff l-[dd OS EX8TCZ.(7l0S.................. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
O aristotehsmo....A...: .... ..................................... ..
(‘M'11U'~‘0 5 A academia platomca......... 206
PLATAO E A ACADEMIA____________________________________________________________ 39 0 ceticismo .............................................................. ..
A losoa coma forma de vida na Academia de Platdo ........ .. 82) iTUI 8
() prrgjeto ezlumlivo................ .......... ........... ......... .. 8%! AP A » IMPERIAL 21%
S60rule.s‘ (1 1’ildg0ms 9‘) AS ESCOLAS FILOSOFICAS NA ERA ------------------- ~-“ » - ' .......................... .. 213A intmio 10lilz'(ra
‘ Caractenstwas gem“ 21%
I 93) .... ..
‘ ~ . . _ . \ as ..... ........... ..................... .. .Iwrrrz/1,('(zr) e znvestzgagnn nu, Ar/uiernza..................... .. W» As not/as “ml . ,-
» ' - , ........... .. 217A esmlhu (12 vidu [1lat6nz'ra .................... ............ .. 10] Os memdos de .mSm0' fl Wu do mmmmno 222
Ex/1r(rz'rri0s rsj)z'rilumTs .................................................... .. 101’, A_eSmlh; (gfflda """"""""""""""""" 2270 d' I ' d Pl - Plotmo e or no .......... ......... ..
mmoosom e “mo M A esmlha de ......... .. 527
CAMTUU) 6 Os niveis d0 eu e 0s limites do disrurso jzl0s0f1rf0.. ............... .. Z35
ARISTOTELES E SUA ESCOLA ...... ............................ .. no 0 neoP'“‘°"i""° Péwblvfiniav e 11 twrgw-~--A---- -3 ----------------- -- 343
. , . ~. ‘ ' ' I T (mire (lsAforma de znda “teoretlca”...... 1 19 O ducuno lowm ‘* (1 wnmdp de harmomwwg“ ?,03 difgy-gntes nfveis da vida teorética 125 lradi§5es....: ...............
Os limites do discurso loséco _____________________________________ 13g O modo de vzda........................................................ ..
(IAPI'1‘L7I.0 7 CAPTFUL9 9
AS ESCOLAS HELENiSTICAS .................................................... .. 129 FILOSOFIA E DISCUFSQ FILOSOFICO """""""" ";""""""""""" " if
Caracteristicm gerais.......... . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. 139 Al°s°a_e a “’7"?‘§"%d“d” do dlsmrm losoco """ """"" “ Qré
0 /1m'0du Iu>lm2'slz'm.... 139 Os esptntuaxs.......... ........... ...................... .. 2:9
In]¢lun”‘”_\. (”.Z'I,ntal-Sim 141-) ................. ....
As esrolas‘/il(1s1i1‘/Ls" .......................... ........... ..... .. 148 Exemlmfs do “W” 8 Rxlwmos da_ almannu ' ' ‘ ' ' ' ' ' ' ' ‘ H 27%
Idmlid/111%‘ 4* 11Z‘’r1>r2("us.' fiurizlzzdr 1114 f’.\'('(Il/lll dz» um mod!) A Telaafo mmlgo 6 a mnwnnamo fio .............. n 296
11¢ 1/ifl(l...... ........................................................... ..... .. 15»; A ”l“§“° mm " “’”""‘ ” “ ”"7"’”‘”” do e“""""""""""" " gmIdpnlidadm. (, (1?-}c(,n,n(_(m._, U nwfmdo dp ”lsZ»n()m_m O ........... ........... .............. ........... ..
0 cl-m-smo I62 Conclusao....... ........... .. . ........... ................................ .. ‘
Pirro .................... .... 163 .F,,.(.(,l~,.a '[)(m(,
O .... ..................................... .. 169 Rupmm F (mm-nu,-dam,’
Q/rtzlifixj)/'rz1/nrrzzl P um/1, (»_§»(:()[/I,(l . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. if]! ‘fl [dude |M(;(h~a (1 Us t(,mp0_S. Hmdp,-'mS
........................ /
A sira 11 a /'r1n6'nirr1 .... ........... .. 175 CAPi'l'ULO 10
EWYIW’-Y -------- ------- -- 181 0 CRISTIANISMO COMO FILOSOFIA REVELADA ................... .O estoicismo ..... .. "----------------------------------------------------- -- 18/ O cristianismo denindo-se como losoa .......... ............. .. 333
A 1/.§‘('()l]l(l/}l7l(l!lIII("VI[(ll ......................................................... .. 187 Cristianismo e losoa antiga ------------------------------------------- --348
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CA1>_iTULo 1 1
DFSAPARECIMENTOS E REAPARECIMENTOS DA CONCEPCAO
ANTIGA DE FILOSOFIA .................................... .§ ....................... ..
Ainda uma va:
Alosoaoomoseruadateologia .................................... ll’ ..... ..3
Os artistes du razdo...................................................... ........ .. 362
' 366Apa1nanénciadacmwep¢xwdelosoaoomomododevida..
CAPITULO 12
QUFSTOES E PERSPECITVAS ................................................... .. 381
BIBLIOGRAFIA ........................................................................... .. 397
I. Re_feréncuu dos lextos cttados em ejngrq ....................... .. 397
H. Citagxies de tatos ....................... 398
Abnrviagdes ........................................................................ .. 398
m.Sele9aodete:dmooowemerwaa0crtosaspec0osda
losoa antigu ........... .................................................... .. 40
Anta dc Crista 405
Perfodo hekm'stico.......... .................... .. 407
DepoudeCnsto
O Império mmano......... 410
O Império cristdo .................................................................. .. 412
INDICE DE NOMES ................................................................. .. 415
A memona de A.-]. Voelke
Tempo vira em que para edicar-se moral-
racionalmente ter-se-a preferencialmente as
Memorabilia de Socrates '21 Bfblia, e em que se
ha de servir de Montaigne e de Horacio como
/ guias para 0 caminho que conduz a compreen-
sao do sabio e do mediador 0 mais simples e
imperecivel de todos, Socrates.
Nietzsche‘
Os antigos losofos gregos, como Epicuro,
Zenao, Socrates etc., permanecem muito mais
éis 51 verdadeira Ideia do losofo do que a
que se fez nos tempos modernos.
“Quando has de, enm, comegar a viver vir-
tuosamente?”, disse Platao a um anciao que lhe
pedia escutasse algumas ligoes sobre a virtude.
Nao se deve apenas especular, mas é necessa-
rio também, de uma vez por todas, pensar em
praticar. Mas hoje se toma por sonhador aquele
que vive de acordo com o que ensina.
1. Ver as referéncias, p. 397.
11_ W ,__,\ 0 .
Kant
E 0 desejo que gera 0 pensamento.
PlOtin0
, Qual é 0 lugar do lésofo na cidade?' E
- 0
de um escultor de homem.
Simplicio
Os resultados dc todas estas escolas e de
todas as suas experiéncias pertencem a nés. N65
no aceitamos uma receita estoica com menos
agrado porque nés jé nos apropriziramos (ie
I'€C€lt21S Cp1CLlYlSt3.S.
if Penso que jamais houve alguém que tivesse
Nietzsche
Querer 0 bem é preferivel a conhecer 3)
verdade.
Petrarca
prestado pior servigo ao género humano do
que aquele que ensinou losoa como um
oficio mercenério.
Séneca
Em geral, s6 imaginamos Platio e Aris-
tételes com grandes tnicas dc pedantes. Eram
pessoas honestas e, como as outras, rindo com
scus amigos; e, quando se divertiram em fazer
suas Leis e sua Politica, zeram-nas brincando.
Era a parte menos loséca e menos séria de
sua vida. A mais loséca consistia em viver
simples e tranquilamente.
Pascal
Se as tcorias losécas te seduzem, senta-te
e te volta para ti mesmo. Mas nio te chames
12
nao losofos.
dc losofo e som sofras se alguem t6 dfff
nome. Epicteto
1-15 cm nossos dlas professores dc losoa,
_ ,
Thoreau
Sem a vlrtude, Deus nao e senao uma
* palavra. Plotino
“Nada z hoje.” Nao vivestes entio? Pois
cssa é a ocupagao mais fundamental e ilustre.
Montaigne
‘j"""'
E O desejo que gem 0 p€nSamentQ_ jamais dc losofo e so sofras se alguém te der
Plotmo esse nome. .
Epzcteto
Qual é 0 lugar do lésofo na cidade? E o '
de um escultor dc homem. Ha em nossos dias professores dc losoa,
z lic ~ »S mp Z0 mas nao losofos. Thoreau
Os resultados de todas estas escolas e dc
todas as suas experiéncias pertencemanos. Nos Sem 3 virmde, Deus nao é 5611510 um
nao aceitamos uma receita estoica com menos
_ - » » palaVra' Plotinoagrado porque nos ja nos apropriaramos de
receltas eplcunstas.
Nietzsche “Nada z hoje.” Nao vivestes entio? Pois
essa é a ocupagao mais fundamental e ilustre.Querer 0 bem é preferivcl a conhecer 2E Montaigne
verdade.
Petmrca
Penso quejamais houve alguém que tivesse
prestado pior servigo ao género humano do
que aquele que ensinou losoa como um
oficio mercenario.
Seneca
Em geral, so imaginamos Platao e Aris-
tétcles com grandes tnicas de pedantes. Eram
pessoas honestas e, como as outras, rindo com
seus amigos; e, quando se divertiram em fazer
suas Leis e sua Politica, zeram-nas brincando.
Era a parte menos losoca e mcnos séria dc
sua vida. A mais losoca consistia em viver
simples e tranquilamente.
Pascal
Se as teorias losocas te seduzem, senta-te
e te Volta para ti mesmo. Mas nao te chames
12 13
)1 ._ l\ ~> ..1 \ \ *: \&§‘?'“'§v
§Prefdci0
Reete-se muito raramente sobre 0 que é em si mes-
ma a losoal. Ela é extremarnente dificil de denir.
Aos estudantes de losoa faz-se sobretudo conhecer
as losoas. Os cursos académicos de losoa pr0p6eIn
F 1 Pl " A ‘ ' 1 E ‘rcgularmente, por exemp 0, atao, rlstote es, plcuro,
os estoicos, Plotino e, depois das “trevas” da Idade Mé-
dia, demasiadamente ignoradas nos programas ociais,
Descartes, Malebranche, Espinosa, Leibniz, Kant, Hegel,
Fichte, Schelling, Bergson e alguns contemporéneos. Nos
exames, é necessério redigir uma dissertagéo em que se
demonstre conhecer bem os problemas postos pelas teorias
deste ou daquele autor. Outra dissertagéo demonstraré
a ca acidade ue se tem de reetir sobre um roblema9 P
1. Assinalamos a obra de G. Deleuze e F. Guattari, Qu’est-ce que la
lilos0phie?, Paris, 1991 [O que é a l0s0a?, tradugio de Bento Prado Jr.
e.Albcrto Alonso Muoz, Rio de Janeiro, ed. 34, 1992.], que esté muito
dlstante, em seu espfrito e método, da presente obra, e 0 pequeno livro
d6 A. Philonenko, Qu’est-ce que la philosophie? Kant Fichte, Paris, 1991, que,
1'16 u_ma maneira muito interessante, apresenta, a propésito das cartas
d¢_ Flehte e Kant, 0 problema da esséncia da losoa. Encdntrar-se-ei na
H"l0"$6/l_€s Wrterbuch der Philosophie, T. 7 (P-Q), Bile, 1989, cols. 572-927,
“Ill C<_)ns1der2ivel conjunto de estudos sobre a denigéo de losoa desde
3 Anguidade até 0s nossos dias.
| 15
-w-- 11"’
O que é a losoa antiga? PfBf5Ci0
i qualicado de “losofico”, visto que foi em geral tratado transmitida aos estudantes por conta das necessidades do
por losofos antigos ou contemporéneos. Em si, nada ha ensinO universitario. Eles tém a impressao de que todos
a dizer de novo sobre isso. Na verdade, é estudando aS 0s lésofos estudados esforgaram-se sucessivamente para
| losofias que se pode ter uma ideia da losoa. Portanto, a inventar, cada um de uma maneira original, uma nova
historia da “losoa” nao se confunde com a das losofias, wnstrugao sistematica e abstrata, destinada a explicar, de
caso se entenda por “losoas” os discursos teoricos e os uma maneira ou de outra, 0 universo; ou, pelo menos,
sistemas dos lésofos. A0 lado da historia, hzi lugar para Qaso se trate de losofos contemporaneos, que eles pro-
um estudo da vida e dos comportamentos losocos. (;11I‘a1‘3.II1 elaborar uma nova discussao sobre a linguagem.
Dessas teorias, que se poderia denominar “losoa geral”,A resente obra retende recisamente descrever em . . » -P . P p A . , . . resultam, em quase todos os sistemas, doutrinas ou criticasseus tragos gerals e comuns 0 fenomeno historico e esp1-
. . . . , da moral ue extraem as conse uéncias ara o homem, ritual que representa a losofia antlga. O leitor me dlra: gOCi€dad€ dos rindgios geréig do Sistema
' E . . t . - . . e arapor que se limitar a losoa antiga, tao distante de nos? P ’ P
. , . . . convidam, a partir disso, a fazer uma escolha de vida, aEu teria varias respostas para lhe dar. Em primeiro lugar, . _, , . . adotar uma rnaneira de comportar-se. Isso nao entra nae um dominio no qual espero ter adquirido ceffta compe- . . ,
A . , . . , perspectiva do discurso filosoco.tencia. Tambem, como disse Aristoteles, para compreender
as coisas é necessario vé-las enquanto se desenvolvem2, é Penso que essa representagao é um erro caso seja aph-
preciso apreendé-las em seu nascimento.Se agora falamos cada 21 losoa da Antiguidade. Evidentemente, nao se trata
de “filosoa” é or ue os re os inventaram a alavra de ne ar a extraordinaria ca acidade dos losofos antlgos3 P
philosophia, que signica “amor pela sabedoria”, e porque de desenvolver uma reflexao teonca sobre os problemas
a tradigao da philosophia grega foi transmitida a Idade mais sutis da teoria do conhecimento, da logica ou da sica.
Média e posteriormente aos tempos modernos. Trata-se de Contudo, essa atividade teérica deve ser situada em uma
apropriar-se do fenomeno em sua origem, sempre tendo perspectiva diferente da que corresponde a representagao
consciéncia de que a losoa é um fenorneno historico corrente que se faz da losoa. Em primeiro lugar, ao me-
que teve inicio no tempo e evoluiu até nossos dias. nos desde Socrates, a opgao por um modo de vida nao
se situa no m do‘ processo da atividade losofica, comoTenho a intengao de mostrar, em meu livro, a diferenga , . A . , . , .
. _ . uma especie de apendlce acessono, mas, bem ao contrario,profunda que existe entre a representagao que os antigos . . -
. . . - . na on em em uma com l€X1Il[CI‘3.§210 entre a reagao criticafaziam da phzlosophza e a representagao que se faz hab1tual- g ’. . . . ~ -
. . a outras atltudes existenciais, a visao global de certa maneiramente da losoa em nossos dias, pelo menos na imagem . , . K _de vlver e de ver 0 mundo, e a propria decisao volun-
2. Aristételes, Politica, I, 2, 1252 a 24 [tradugao de Roberto Leal Ferreira. tana; e essa Op§aO dmermlna ate ceno ponto a doutnna €
" Sio Paulo, Martins Fontes, 1991]. 0 modo de ensino dessa doutrina. O discurso loséco tem
~
16 17
‘ p____l— N. K,
k ' \ ~ *
O que é a losoa amiga? prefécio
8 SL181 _0g§m, PQFIQHIOZ 6m “ma @_5C01ha de vlda € em “ma giver atingido s,eu acabamento e sua perfeigao, segundo 0
opoaoex1stenc1al,e nao_o coouano. Em segundo lugar, essa esquema que E_ W611?‘ propfm 30 Qscfgvgfj
declsao e essa escolha J8.II1alS se fazem na sohdao: nunca / ~ / rs ' - 2, ~ ~ '
\ » ': tem ou nao e a sa-
. houve losoa nem losofos fora de um gmpo, de uma Olosofo mm 6 um sabw ele mm ( )
bed0ria' ele fala e mesmo quando seu discurso tem par m
1im'c0 se suprimir isso ndo impede que ele ale até 0 momenta
e antes de tudo, a uma maneira de viver, a uma escolha em We tmh“ mnduido efom dos i”5'5“"te5 /mfeitos em We
de vida, a uma opgao existencial, que exige do individuo tmh“ amclmda
\ “ma mudanga total d6 Vida’ “ma Convrso de todo O Isso é uma situagio anziloga 51 do Tmctatus l0gic0~phi-
ser, e, nalmente, a um desejo de ser e de viver de certa k,sophl~mS4 dc Wittgenstein’ no qual O discurso loséco
maneira. Essa op<;:Zio existencial implica, por seu turno, cer- do Tmcmtus deSdObra_S€ nalnwnte em uma sabedoria
8 ta visio de rnundo, e sera tarefa do discurso losoco re- senciosaq A losoa antiga admite mum) bem’ dc uma
\ velar e justicar racionalmente tanto essa opgao existencial maneira Ou de Outra 6 d€Sde 0 Banquetee de Platio’ qu€
como essa representagao do mundo. O discurso losoco » ~ » » - ~ -d0 losofo nao e um sablo, mas ela nao se COI1Sl era um
teonco nasce, dessa opgao €XlS[CI1C12ll 1n1c1al e recdduz, puro discurso que é Suspenso no momento em que: a
a mfidlda do posswel Ou por Sua form lOg1Ca 6 persuaslva’ sabedoria aparece; ela é, ao mesmo tempo e indissoluvel-
a agao que quer exercer sobre 0 lnterlocutor; ele lnclta
* mestres e disci ulos a viver realmente em conformidade - - - - - »
I P _ _ _ _ a sabedona sem _]aII121lS atlngl-la. Contudo, e verdade que
; com sua escolha 1n1c1al ou, alnda conduz de alguma Ina-
, o 1, _ d _d 1 d ’ _d 0 discurso de Platao, Astoteles ou Plotino é suspenso no
ne1ra a ap 1ca(_;a0 6 um 1 63 6 "1 3- limiar de certas experiéncias que, se nio sao a sabedoria,
_ Quero dizer que 0 discurso losoco deve ser compreen- sio uma espécie de antegozo.
‘ dido na perspectiva do modo de vida no qual ele é ao __Z_
\ mesmo tempo 0 meio e a expressao e, em consequéncia, 3- 13- W611, Legiqw 41* 1'1 Wlvsvhie, Paris, 195'j0, P- 13-
, . - 4. Tmctatus logieojzhilosophwus, 2“ ed., tradugao, apresentagio e ensaio
I q“? a losoa 6* antes de tudo’ “ma manelrfde Vlver’ mas introdutéo de Luiz I-Ienr4ique Lopes dos Santos, S50 Paulo, Edusp, 1994
esta estreitamente vinculada ao discurso losoco. Um dos [N. do T_].
temas fundamgntais deste Sgré 3 distncia que Sgpara 5. Cf. S0bI‘6 CSSC ponto G0ttfI‘i€d Gabriel, “L3 logique COIIIIIIC litté12-
? . . . . , . W. V ,,’ -losoa da Sabedona. A losoa ture De la slgmcanon de la forme lltteralre chez 1ttgenste1n_ 1n e
Nouveau Cummeree, 82-83, 1992, p. 84.
PY¢PaYat°Y10 Para 3 53-bedonl N30 53 tram de OPQT, d3 um 6. O Banquete, 6"‘ ed., tradueio, introdugio e nonas de josé Cavalcante
lado, a lggoa C()n1() um discufsg lgséco teéfico 6, dg (16 Souza, Rio de janeiro, Bertrand Brasil, 1991; O Banquete, int_r0du<;io,
Outro’ a Sabedoria Como um modo de Vida silncioso tmdueao e notas de Marla Teresa Sch1a_ppa de Azevedo, L1sboa_/Sao Paolo,
, . d . Verbo, 1973; Um Banquete, 3“ ed., selegao, lntrodugao e tradugao dc ]a1me
sera prauca o a partlr do mornento em que o dlSCUfSO Bruna, Sio Paulo, Cultrix, 1952 [N. do T.].
mente, discurso e modo de vida, que tendem, ambos para
18 19
’- \ -
comunidade, em uma palavra, de uma “escola” loséca; e, P ’ -
precisamente, uma escola losoca corresponde, nesse caso ’ f .
O que é a losoa antiga? Prefacio
N510 $6 P0d@ mis OPOF T110110 (16 Vida 6 di5CUF$0, 601110 Insisto nesse ponto porque reencontraremos, no curso
se eles correspondessem respectivamente 21 przitica e a teo- deste livro, situagoes nas quais a atividade loséca conti-
ria. O discurso pode ter um aspecto prético :51 medida que mm 3 56 excrccr, ainda que 0 discurso nao possa exprimir
tende a produzir um efeito sobre 0 ouvinte ou 0 leitor. essa avidadf-)_
Quanto ao modo de vida, ele pode ser nao teorico, evi-
Nao se trata de opor e separar de um lado a losoadentemente, mas teorético, isto é, contemplativo. ’ _ ’ ,
Como modo de vlda e, de outro, um dlscurso losoco que
Para ser claro, devo especicar que entendo a palavra seri’ de algum modo, @X[efi()f Q lQ5()a, A0 Qontrério,
“discurso” no sentido losoco de “pensamento discursivo” Uawse (16 mostrar qug O disCuf§() 1()3()(j() pafcipgl do
expmsso na linguaggm escrita Ou Oral’ 6 nio no Semido’ modo de vida. Mas, em contrapartida, é necessario reco-
disseminado em nossos dias, de “maneira de falar que nhecer que a escolha de Vida do lésofo determina Seu
mvela uma altitude” (“discurso raCiSta”’ por eX€mp1O)' Em discurso. Isso nos leva a dizer que nao se pode considerar
Contrapartida’ reCusO'me 3 Confundir linguagem 6 fungio os discursos losécos realidades existentes em si e por
cognltlva. Citarei, a esse proposito, as linhas esclarecedoras Si mesmas, 6 estudar a estrutura independentemente do
7
d6 J‘ Rufé I losofo que as desenvolveu. Pode-se separar o discurso de
De fato, pode-se perfeitamente pensar e conhecer sem ling"aa- Séates da Vida C da “lone de Sécmms?
gem e talvez, para certas interpretagoes, conhecer melhor. O Uma nogao aparecerzi frequentemente nas paginas que
pensamento reconhece a propma capaczdade de denzr uma
se seguem, a de exercicios espirituaiss. Designo por esse
conduta raczonal e a faculdade de representagao mental e de termo préticas, que podem Ser de Ordem sica’ Como
abstragao. O anzmal (capaz do dzstznguzr a forma tnangu- regime alimnar; discursiva, Como O diélogo C a me_
lar ou certas combina oes de ob 'etos ensa como a man a . _ . . . ~ ~
§ J ) p_ § dltagao; ou 1ntu1t1va, como a contemplagao, mas que sao
ue nao ala ouosud- d d d
q f T 0 mu 0 que mm foi 6 um 0 ["']' todas destinadas a operar modicaeio e transformagao no
0 estudo dfnico d”"””?‘”" We nag ha _C0m?lCf§d(? mm sujeito que as pratica. O discurso do professor de losoa
ZJEEEZZO?Z;L;:§Za;i(;(f;7:g}ua6E§imb;n:) 3; Zixngzge pode, ademais, toman a forma de um exercicio espiritual,
a medlda que esse dlscurso se apresente sob uma forma
muzto zntelzgente [...]. E no homem normal as faculdades ml discipulo’ do modo Ouvinm, O
deelabom do mani estam-se as vezes mais ou menos esma- . . . - -
§ f ’ ’ leltor ou 0 lnterlocutor, possa progredlr esplntualmente
gadas pelas faculdades de expressao. As grandes descobertas . .
. . . . e transfonnar-se lntenormente.
parecem serfeztas zndependentemente da lzngaagem, a partzr
dos esquemas (patterns) elaborados no cénebro.
8. _].-P. Vernant utiliza também esse termo em Myths et pensée chez les_a Qrtcs, t. I. Paris, 1971, p. 96 [Mito e pensamento entre 0s gregos, 2“ ed., tmdugio
7. j. Rufé, De la biologie o la culture, Paris, 1976, p. 357. de Haiganuch Sarian, Rio de Janfriro, Pal e Terra, 1990, p» 1191
20 21
1
W 7
-
1954
O que é a losoa antiga?
any
Prefacio
Nossa demonstragao desenvolver-se-2i em trés etapas. a ffadi‘-55° da dir€§5O da Consciéncia greC0'r°manalO’ que
A primeira consistira em retracar a historia dos primei- reP0
ros empregos da palavra philosophia e em compreender l05°a am1ga-
0 sentido da denicao losoca dessa palavra por Platao E Tive O prazer (16 Conhecgf dois lésofos que também
quando, no Banquete, ele dene a philosophia como 0 de- estavam, Cada um de uma maneira indgpgndeme (la
sejo de sabedoria. Em seguida, procuraremos reencontrar minha, imeressados nesses pfgblgmasj 0 5aud()5() A_-J,
r as caracteristicas das diferentes losoas da Antiguidade voelkell’ Cujos estudos 5()b1‘@ 3 l()5()a C()n‘1() terapia da
Considradas em 56“ aspect‘) de mOd0 d6 Vida’ 0 que I105 glma foram publicados recentemente, e meu colega polonés
levara nalmente a estudar os tracos comuns que as unem. DOmanskil2’ Cu]-a obra sobre: a Concepgio d€ losoa na
Em um terceiro momemo’ buscaremos expor Por (lual Idade Média e no Renascimento mostra como a concepcao
razao e em que medida a losoa foi concebida a partir amiga de losoa foi ocultada, mas apenas parcialmen-
' da ldade Média como uma atividade puramente teorica. te, na Idade Média e como retornou no Renascimento,
' Por m nos perguntaremos se é possivel retornar ao ideal por exemplo em Petrarca e em Erasmo. Por outro lado,
H amigo de 1O5Oa- Para lustilr 1105535 ¥1Ym?1§5@$, I105 acredito que meu artigo intitulado “Exercices spirituels et
apoiaremos muito sobre os textos dos lésofos antigos. philosophic antique”, publicado em 1977, teve influéncia
Isso representara, penso eu, um servico aos estudantes que sobre a ideia que M. Foucault tinha de “cultura de si”“".
nem sempre tém facil acesso as fontes. Ja armei alhures as convergéncias e as divergéncias que
"e a obra do losofo estolco na perspectlva geral da
ha entre nos“.
As reflexoes que apresento ao leitor sao fruto de
longos trabalhos consagrados aos losofos e 21 losoa Devo exprimir de todo o coracao meu reconhecimcnto
antigos. Dois livros inuenciaram-me muito no curso H EI‘iC Vigne, que me propos escrever esta obra, indicou-
dessas pesquisas. Em primeiro lugar, Seelenf12hrung(Dire§d0 H16 O plano 6 teve comigo uma paciéncia exemplar. Minha
de almas), de P. Rabbowg, publicado em 1954, que expoe
as dif6I‘en[€s formas qu€ tomar essas préticas pOd€m nos 10. Ilsetraut Hadot, Seneca und die griechisch-romische Tradition der Setzlenlezl
epicuristas e nos estoicos, e que teve igualmente o mérito
de marcar a continuidade existente entre a espiritualida- 11. A.-]. Voelke, La philosophie mmme thérapie 11¢ Fame, Préface de P.
de antiga e a crista, mas talvez limitando-se demasiado Had°t- FYib°uP8/Paris» 1995-
exclusivamente aos as ectos rgtéricos dos f - ‘ 12;]. Domanskl, La phzlosofhle, theme ou mode de me. Les contravenes
lung, Berlm, 1969 (apresentada como tese de doutoral em 1965, publlcada,
sem modicagoes, um pouco mais tarde).
p e C C105 Moyen Age et du début de la Ihmazsszmce, Préface de P. Hadot, Fr1b0urg/Pans,
espirituais. Em seguida, a obra de minha mulher, que 1995
escreveu, antes de conhecer-me, um livro sobre Seneca e 13- M- Foucault, Le mm d svi, Paris, 1984, pt 57- ~
14. P. Hadot, “Réexions sur la notion de culture de soi”, in Michel
9_P‘ Rabbow, Seelmfahmng Mgthodik d”Exmitim in (M Amike’ Mnchen, fglggauli Philoophe. Rmcontre Internationalé, Paris, 9: 261-269, 10, ll lanvier
22 23
1 as
\
\
O quc é a losoa antiga?
cara colega R. Hamayon, com seus conselhos e escrims
esclareceu-me 0s problemas muito complexos apresentadog
pelo xamanismo. Que ela encontre aqui a expresség de
minha profunda gratidéoi Meus calorosos agradecimentog
1
a Sylvie Simon, Gwenaélle Aubry, Jeannie Carlier, Ilsetram .
Hadot, que releram esta obra para eliminar dela, tanto ,
quanto possivel, as incorregoes e 0s erros.
24
$
nica
Capitulo 1
Vqq losoa
antes da losoa
A historia dos primeiros pensadores da Grécia
“A losoa antes da losoa.” Efetivamente, as palavras
da famia philosophia surgiram apenas no século V a.C. e o
termo so foi denido losocamente no século IV a.C. por
Platio; contudo, Aristoteles e, com ele, toda a tradigao da
historia da losoa consideram lésofos os piimeiros lo-
sofos gregosl que apareceram no inicio do século VI, na
pcriferia da zona dc influéncia grega, nas colonias da Asia
Menor, cxatamente na cidade de Mileto: Tales, matematico
e fisico, um dos Sete Sabios, célebre por ter predito o eclip-
se do sol de 28 dc maio de 585, depois Anaximandro e
Anaximenes. Esse Inovimento de pensamento estender-se-a
1. Encontrar-se-ao os fragmentos dc suas obras em Les Présocratiques, Ed.
J.-R Dumont (citado Dumont nas notas que se seguem), Paris, Gallimard,
1988, (Bibliothéque de la Pléiade) [Os Pré-somitimx, 2’ ed., selegao de textos
e supervisio dc José Cavalcante de Souza, tradugoes dc josé Cavalcante
d8 Souza et. al, Sio Paulo, Abril Cultural, 1978 (Os Pensadores); Gcrd A.
Pornheim (org.), Os lzisofos [rré-sovrliticos, S510 Paulo, Cultrix, 1988]. Veja-se
lgllalmente, do mesmo autor, a edigao que ele estabeleceu para o pblico
estudantil, Les Iimles présocmliques, Paris, Gallimard (Folio Essais, 152).
27
_i L W
A denigao platonica do lésofo e seus antecedentes A losoa antes da losoa
a outras colonias gregas, agora para as da Sicilia e do Sul Cas” e a predominancia dc uma sobre as outras. Essa trans-
~ da Itzilia. E assim que, no século VI, Xenofanes dc Colofao farmwio radical resume-5e, alias, na palavra grega physiy,
l ernigra para Eleia, que Pitzigoras, originario da ilha de Samos que’ em sua origem, signica ao mcsmo tempo 0 inicio, o
‘ (H50 long‘? d6 Mileto)’ Xa_se em Crotona no m do SéCu' desenvolvimento e 0 resultado do processo pelo qual uma
1° VI 6 deP°i5 no Metapoma P0119‘) 3 Pouco 0 Sul da coisa se constitui. O objeto de sua caracterizagaointelectual,
Italia e a Sicilia tornar-se-ao 0 centro de uma atividade in- caractezagio qu @185 denominam investigagéor histma’
telectual extremamente viva, por exemplo com Parménides é 3 phys,-S univerSa1_
“ e Empédocles.
A As teorias racionais, em toda a tradigao losoca
T°d°5 65565 P‘fn5adf)re5 PY°P_°@m uma e?5PhCa9a°_raf1f)‘ grega, serao inuenciadas por esse esquema cosmogoni-
nal do mundo, e ISSO e uma reviravolta decisiva na histona co Original, Daremos aqui apenas o exemplo dc Platao,
1., do pensamento. ]a existiam cosmogonias antes deles, no qua’ na Sequéncia de diélogos intitulados Tl-meus, Cm,-ass
Oriontc l\/1<j:dio.e tainbém na.Grécia'ar’caica, mas elas eram e Hmwcmtgs (proj-“ado, mas substituido pdas Leis), quis,
de tipo m1t1co,1sto e_,descrev1am a.11lS[OI‘l21 do mundo como por sua V62, escrever um gmnde tratado Sobm a physis,
E , uma luta entre entldades personicadas. Eram “géneses” em toda a sua tenso’ desde a Origem do mundo 6 do
no S_enndO bfbhco (10 hvm do Gmmsz’ _hVrO das gera5Oes_’ homem até a origem de Atenas. Aqul ainda reencontrare-
destinadas a conduzir um povo a memona de seus ancestrais mos um livro das “geragoes” que leva os atenicnses 5 lem-
e a unklos as forgas Cosmlcas 6 as geragoes dos deuses‘ branga dc sua origem e dc seus ancestrais para enraiza-los
Cnafgao dO_ mundo’ Cnagao df) homem’ Cnagao do povo’ na ordem universal e no ato fundador do Deus criador.
Lal e o O1T)_]€tO das cosmogonlas. Como bern mostrou G. - - - ~ - - - _ ~Platao, alem do mais, nao dissimula ISSO. ele propoe, no
Naai ’embOra Os pnmelms pensa Ores gregos Su smuam Timeu, o que denomina um mito verossimil, ao introduzir
essa narragao mitica por uma teoria racional do mundo, a gura mitica do Demiurgo pmduz O mundo
C165 consen/am O €Sqll€IIl3 [€I'1’l21I'lO qll€ CSITUILIFZIVZ. 3.S COS- mmplando Modelo €teI_nO S50 Id€iaS7. N0
. ,. 1 _ . . d
mogomas mmcas E es pmpoem uma teona da Ongem O X das Lezs, Platao Ja nao se satlsfaz em propor uma nar-
mundo do homem e da cidade. Essa teoria é racional ~ H .’ raqao mitica; ele quer fundar sua cosmogonia sobre uma
porque procura explicar o mundo nao por uma luta entre
os elementos, mas por uma luta entre as realidades “fisi- 4 Herécmo Fmgmmm 35 Dumom P 154- Plaréo Fédon 96 a 7E 5. Tinwu, tradugao dc Carlos Alberto Nunes, Belém, Editora da Uni-
2. Biblia: tmdu§d0 ecuménim, Sao Paulo, Edigoes Loyola, 1994; ha trans- Widade Federal do Para, 1986.
criagao dc Haroldo de Campos do Génesis: Bere’shith: a cena da migem (e outms 6- Critias, tradugao de Carlos Alberto Nunes, Belém, Editora da Uni-
estudos de poética biblica), transcriagoes por Haroldo dc Campos, S210 Paulo, Vidade Federal do Para, 1986. '
Perspectiva, 1993 (Signos, 16). 7. Cf. P. Hadot, “Physique et poésie dans le Timée de Platon”, in Revue
3. G. Naddaf, L'm'igine et llolution du concept grec de phusis, Leviston/ 41¢ Théologie at dz Philosophie, 115: 113-133, 1983. G. Naddaf, L’0n'gine et
Queenston/Lampcter, The Edwin Mellen Press, 1992. 5559051415071--., pp- 341-442.
1'
A denigao platonica do loso 0 e seus antecedentes A losoa antes da losoa' f
demonstraqao rigorosa apoiada em argumentos aceitziveis dz Grécia homérica, a edueagao dos jovens fora a grande
por todos. Nesse esforgo racional, retorna explicitamente upacio da dasse dos nobms, daqu61es que possuem
a noeao de physis, concebida como “natureza-processo” app’ A, isto é’ a exceléncia necesséria pela nobreza de
pelos primeiros pensadores gregos, insistindo por sua
parte, no carater primordial e original desse processo.
‘ Mas, para Plataos, o primordial e original é 0 movimento Q _ ~ - » - d
e processo que se gera a si mesmo, que é automotor, isto . _ _ . - . . 12
, . . , . , . Yeégnls, que sao uma compilagao de preceitos morals .e, a alma. O esquema evolucionlsta e substituldo, assim, - ,
por um esquema criacionistaz 0 universo jzi nao nasce do
automatismo da physis, mas da racionalidade da alma, e a
alma, como principio piimeiro, anterior a tudo, identica- ; ’
ll se a physis.
A paideia mesmo cuidado em formar os futuros cidadaos por meio
Pode-se falar também de losoa antes da losoa a ¢$Pil‘il0- M35 avid?! d@m0Cf5IiCa engendra lllts P610 P0d@T1
proposito de outra corrente do pensamento grego pré- énecessario saber persuadir 0/povo, fazé-lo tomar essa ou
socratico: rero-me as praticas e teorias que se reportam aquela decisao na assembleia. E, portanto, necessario, caso
a uma exigéncia fundamental da mentalidade grega, 0 sequeira tornar-se um chefe do povo, adquirir a habilidade
desejo de formar e de educarg, o cuidado daquilo que os dg linguaggm, E 3 @553 ngcessidadg que 11;; (16 responder
10gregos denominavam paideia . Desde os distantes tempos mmovimemo $()ff5ti(j()_
s. cf. id., ibid., pp. 442»5ss.
9- sob"? 0 inicio da educalilo IT10Ta1 C11“C 05 gregosi Cf- 1- Hadol» 1&5], e o capitulo “The Origins of Higher Education at Athens", in ]. P.
Smgw---r PP- 1038, e» da mesma autorai “The sPlri[ual Guide”, in Clam”! I-1§I1Ch, Aristotle’s School. A Study of a Greek Educational Institution, University
Mediterranean Spirituality. Egyptian, Greek, Roman, org. A. H. Armstrong, New uffgjifomia press, 1972, pp_ 32_58_
York, Cmssroadi 1986, PP- 436'459- ~ Cf. W. Jaeger, Paideia..., pp. 29 ss. [pp. 17 ss. da tradueao brasilei-
10. Para a Grécia arcaica e Atenas até 0 m do século V, consulte-se W. quc mostra mum, hem a diferema emre 3 educacio (do 31-istocmtay
laeger» Paid@ia- La fmmatm" '1‘? lhomw g"“= Paris’ 1964 [Paidem A fmmamo (2Q%§9l‘me 0 ideal de sua casta) e a cultura (do homem tal qual ele deveria l
’ gngue", que se tornara, mais tarde, com os losofos, a
vgrfude, isto é, a nobreza da alma. Podemos fazer uma
“km dessa educagao anstocratica gragas aos poemas e
- E553 educagao e dada pelos adultos no proprio grupo
gbeial. Prepara—se nele para adquirir as qualidades: forga
figica coragem, senso de dever e de honra que convém
guerreiros e se encarnam nos grandes ancestrais di-
vinos que se tomam por modelo. A partir do século V,
{om 0 desenvolvimento da democracia, as cidades terao 0
dc, exercicios corporais, ginastica e musica, e por meio do
giidade, trad. de Mario Leonidas Casanova, S510 Paulo/Brasia, EPU/INL,
do homem grego, tradugao de Artur M. Parreira, Sao Paulo/Brasilia, Martins sq’; ’;¢g-undo a 1OsOa)_ l
Fontes/AEditora Universidade de Brasia, 1986]. Espera-se que se traduza para 12. Cf. W. Jaeger, Paideia..., pp. 236-248 [N. do T.: pp. 160-172. Para l
o frances o segundo tomo dessa obra, que trata dessa vez de Socrates e de \m.q~4du§5o de poemas de Teégnis, cf_ puma gmga E la,”-nu, Sdegio, new I
Platiol 6 foi Publicada em Berlim em 1955- Veja-Se wmbém H--I- Marrow *=indu<;a<> de Péricles Eugenio da Silva Ramos. sac Paulo, Editora Cultrix,
Histoire de l’éducati0n dans l’Antiquite, Paris, 1950 [Histdrla da edueagdo na Anti— l%4 (lgssicos Cu1m'X)]_
30 31
A denigao iplatonica do lésofo e seus antecedentes .1 A l0S0a 11l€S da 10SOa
Os sostas do século V msponde a uma necessidade. O desenvolvimento da vida
dcmo¢fé,Ca exige que os cidadaos, sobretudo os que que-
Com 0 desenvolvimento da democracia ateniense no I-cm chegar ao poder, possuam uma habilidade perfeita
século V, toda a atividade intelectual que se disseminara nas da Palavra. Até entao, 0s jovens eram formados segundo
»
1 A Acolonias gregas da jonia, da Asia Menor e do Sul da Italia a_a1gté, pela synousia, isto é, pela frequentagao do mundo
xa-se em Atenas. Pensadores, professores e sabios auem adulto“, sem distingao. Os sostas, ao contrario, inventam
para essa cidade, introduzindo modos de pensamento ainda a ¢du¢agio em ambiente articial, 0 que se tornara uma
pouco conhecidos ali, e que sao mais ou menos bem aco- (135 caracteristicas de nossa civilizagao“. Eles sao os pro-
lhidos. Por exernplo, 0 fato de Anaxagoras”, proveniente ssionais do ensino, antes de tudo pedagogos, ainda que
da jonia, ter sido acusado de ateismo e precisar exilar-se seja necesszirio reconhecer a notavel originalidade de um
mostra bem que o espirito de investigagao que se desenvol- P1-Qtégoras, dc um Gorgias ou de um Antifonte, por exem-
n A ’ ,
Vera nas colonias gregas da Asia Menor era profundamente plo. Por um salario, eles ensinavam a seus alunos receitas
insolito para os atenienses. Os farnosos “sostas” do século que lhes permitissem persuadir os ouvintes, defender, corn
V sao muitas vezes estrangeiros. Protagoras e Prodico sao a mesma habilidade, o pro e 0 contra (antilogia). Platao
provenientes da ]6nia; Gorgias, do Sul da Italia. O mo- e Aristoteles acusaram-nos de ser comerciantes do saber,
vimento de pensamento que eles representam mostra-se ncgociantes no atacado e no varejo“. Eles, por outro lado,
ao mesmo tempo como uma continuidade e como uma ensinam nao so a técnica do discurso que persuade, mas
ruptura em relagao a0 que 0s precede. Continuidade 51 também tudo 0 que pode servir para atingir a dimensao
medida que 0 método de argumentagao de Parménides, da visio que sempre seduz um auditorio, isto é, a cultura
Zenao de Eleia ou Melisso volta a ser encontrado nos geral, pois trata-se la também tanto de ciéncia, geometria
paradoxos sofisticos, continuidade também it medida que on astronomia como de historia, sociologia ou teoria do di-
os sostas visam reunir todo saber cientico ou historico reito. Eles nao fundam escolas permanentes, mas propoem,
acumulado pelos pensadores anteriores a eles. Mas tam-
bém ruptura, pOI'q1lC, (163 um 13110, €l€S Sl.1bIIl€t€II1 CSSC i 14. Sobre a synousia, cf. Platio, Defesa de Sécmtes, 19 e [Defesa de
Saba. anterior a uma critica radical’ insistindo’ Cada um srates,4“ edigao, traduqao dc jaime Bruna, S510 Paulo, Nova Cultural,
- 1987 (Os Pensad0res)]
a sua manelra’ no Conlto que Opoe 3‘ natur€Za (physls) " 15. Encontrar-se-io os fragmentos dos sostas nos Les Présocratiques
e as C0nVen§6e5 humanas (n6m0i)a 6 Porqu, de outro (613110 p. 27, n. 1), pp. 981-1178 e em J.-P. Dumont, Les sojzhister. Fragments
lado, sua atividade é especialmente dirigida a formagao da “'*§'fwig"¢1g&Y, Paris, 1969- $<>br<-I OS Svsws, ¢f- C» Rome-yer-Dherbey, Les
Juventude, tendo em vista o éxito na politica. Seu ensino ‘::?:a";’s,P;‘ggé;1g2?I;lag§f,RE;“r;;:;e€:‘lg:‘)Z“g0il‘?'’;$_'€‘g€;;:?"g iii
_______ J_Iil!otle’s School, pp. 38-46; B. Cassin, L’Effet sophistique, Paris, 1995.
13. Sobre os conflitos entre os losofos e a cidade, cf. a antiga mas " 16- Platio, S0Sll1, 222 8 — 224 d lsvsilli 32 @diC50> lradllo 6 110135
sempre util obra de P. Decharme, La critique des traditions religieuses chez lav kl‘-Tfge Paleikat e joio Cruz Costa. Sio Paulo, Nova Cultural, 1987 (Os
Cress, Paris, 1904, P¥il$ldores)]; Aristételes, Refutayies Sofisticas, 165 a 22.
32 O as
1.2%;
, O
1 \
,, _!_!;
. - . . , ;~'-;1'!5,i*.‘A demgao platonlca do losofo e seus antecedentes
, A
mediante retribuigao, séries de cursos e, para atrair os 0u- 3 ,
vintes, fazem sua prépria publicidade dando conferéncias . ,
pblicas, por ocasiao das quais eles provam seu saber e H Capltulo '2
habilidade. Eles sao professores ambulantes que beneciam A
com sua técnica nao sé Atenas, mas ainda outras cidades.
Assim a areté, a exceléncia, dessa vez concebida como O 31/Wglmemo
t‘ ' d ' ' d h 1 ~compe encla que eve permlur esempen ar um pape na dd O dg “fdO80fa',”
cidade, pode tornar-se objeto de aprendizado, se 0 sujeito nO§a
que a aprende tern as atitudes apropriadas e se as exerce
satisfatoriamente.
O testemunho de Herédoto
I I quase certo que 0s pré-socraticos dos séculos VII e VI
I , A
a,.C., Xenofanes ou Parmenides por exernplo, e mesmo pro-
vavehnente — apesar de certos testemunhos amigos porém
muito discutiveis —, Pitagoras‘ e Her2iclit02, nao conheceram
o_,adjetiv0 phil0s0ph0s nem 0 verbo philosophein (losofar)
tmhpouco, com mais forte razao, a palavra philosophia. Essas
palavras, com efeito, segundo toda ver0ssimilhan<_;a, sé apa-
I I. Hi opiniées divergentes sobre esse assuntoz R. ]0ly, Le lhéme [Jhil0—
des genres de vie dam l’/Intiquité classique, Bruxelles, 1956; W. Burkert,
“Platon oder Pythagoras? Zum Ursprung des Wortes ‘Phil0s0phie”’, in Her-
mes, 88: I59-177, I960; C. de Vogel, Pythagoras and Early 1-’ythag0ream'sm,
Aasen, 1966, pp. 15 e 96-102. Concordo com W. Burkert que 0 caso relatado
por Heraclido do Ponto (cf. Diégenes Laércio, I 12 [Vidas e doutrinas dos
iitofos ilustres, 2“ ed., traduqao, introdueao e notas de Mario da Gama
K917’, Bmsia, Ed. Universidade de Brasia, 1997]; Cicero, Tusculzmas, V,
8;jimb1ico, Vida de Pitzigaras, 58) é uma projeqao sobre Pitzigoras da nogao
plamica de philosophia. ’
2. Heraclito, B 35, Dumont, p. 134, e a nota de J.-P. Dumont, p. 1236,
qm emite dvidas sobre a autenticidade da palavra “lésofo”; do mesmo
"1060 Diels-Kranz, Die Vorsokratiker, t. I, Dublin/Zurich, 1969, p. 159.
34 35
_L nu» e_- .
A denicao platonica do lésofo e seus antecedentes O surgimento da nogio de “los0far"
i 1 » /
1 .
receram no seculo V, no seculo de Pericles, no ql13.iAl€f1&g Ciao pgfgllnta a Solon qual é, para ele, 0 homem mais
brilha ao mesmo tempo por sua preponderancia politica fem; E ele respondera que ninguém pode ser considera-
e por seu esplendor intelectual, a época de Séfocles, de do feliz antes de ter visto ovm de sua vida.
Euri ides dos sostas a é oca também em ue or exe - . A .p ’ ’ P 9 ’ P m I-Ierédoto revela a existencia de uma palavra que talvezplo, o historiador Herodoto, originario da Asia Menor, no .
. " ¢5tiVCSSC na moda anteriormente mas que, em todo caso,decorrer de suas numerosas via ens assa a viver na ce1e- J3 ,
g ’ p - ha um futuro, na Atenas do seculo V, a Atenas da de-
bre cidade. E Lalvez sea recisamente em sua obra ue se an .
encontra a primeira rfieiiigao a uma atividade “1os(33ca” mocmda 6 dos SOstaS' De manelra geral’ desde Homem’
, , . , . avms com ostas em hil0— serviam ara desi nar aHerodoto narra o encontro lendano de Solon, o legislador as p, P . P g
_ di5pOS1(;2lO de alguem que encontra seu interesse, seu prazer,de Atenas (seculos VII-VI), um dos que sao denominados os _ . . ~ 1 . .
sua razao de viver, na dedlcacao a essa ou aquela atividadezSete Sabios, com Creso, o rei da Lidia. Este, orgulhoso de seu . » .phop , por exemplo e 0 prazer e 0 proveito que se temosza ,poder e de suas riquezas, dirige-se a Solon nestes termosgz . , , _ , _ _
ao beber, phzl0—tzmza e a propensao para angariar honras,
Meu cam ateniense, a noticia de tua sabedoria (sophiés) P P5510-Sophia sera, portanto, o interesse pela s0phz'a5.
de tuas viagens chegou até n0's. Ndo ignoro absolutamente »
que, por amar a sabedoria (philosopheon ), percarreste muitos
paises, por causa de tea desgjo de conhecer. A atividade losoca, orgulho de Atenas
Vislumbra-se aqui 0 que representavam naquele momen-
to a sabedoria e a losoa. As viagens que Solon realizou
t'hamco h ,d " ta " 'd' . . , ,In mo m Con aer a qu_mr Vas ,eXp6nenCla, (1 cultura que florescia em sua cidade. Na Ora§a0 funebre
reahdade e dos homens, descobrir a um so tempo paises , . 6 . , . .que Tucidldes o faz pronunciar em memoria dos pri-
e cos umes 1 eren es. serve-se a esse respei o quan o
TSSO S6 assemelha ao que OS Pre_S_OCr_ancO,s Caractfinzané 15. Sobre a palavra philoxophia, veja-se também E. A. Havelock, Preface
intelectualmente como uma hzstona, 1sto e, uma 1nvesu- l0Hut0,Cambrid e,Mass.,1963, .280-283 [Preaci0aPlatdo, tradugao de
~ 1A I . ' g, . .
ga<;ao4. Essa experiencia pode fazer daquele que a possui 55"“ D°bYa"Z1<Y, Campmass PEIPIWS’ 1995, PP- 295299]? W- Burkl
- . . . . > amgo citado, p. 35, nota 1), p. 172.
um bom Julz nag Colsas da Vlda humana' E15 por que 6. Tucidides, A Guerra do Peloponeso, II, 40, 1 [Histéria da Guerra do
Os atenienses do século V eram orgulhosos dessa
atividade intelectual, desse interesse pela ciéncia e pela
éi Pdmso, 3“ ed., traducio, imroducao e notas de Mario da Gama Kuiy,
3. Herodoto, Histdrias, I, 30 [tradugao de]. Brito Broca, Sao Paulo/Rio Blimi, Editora Universidade de Brasia, 1987; A Gwrm 110 Pelvpmwsv, Livr0
de _]aneir0/Porto Alegre, W. M. Jackson, s.d. (Classicos ]acks0n).]. I’ m'7°d11€5°, lPdu§5~0 9 110915 de Anna Lia Alnaral £16 Almdda P1"=1d0, tese
4. Cf. acima, p. 29; se Heraclito fala efetivamente de lésofos em seu fie Dlltorado em Letras. S50 PHHIO, USP, 1972; Oliv F11"¢bT¢ £18 Péfivllfs,
fragmento 35 (cf. p. 35, nona 2), observe-se, emio, que ele vincula losoa m E‘°‘I'4é'"7ill grvga If llliiml, $616950, lI"P1duC510, introduio 6 "0135 liminares
6 inve§[ig3_Q§i()_ dc Jaim Bmna, sao Paulo, Ediouro, s.d., pp. 9-15].
S6 37i in-_ ‘mi.
‘ democracia. 1:1 nao sio apenas as personalidades de ex
r
- 5-‘F
ii)“
1“
4J>')\~_‘-
A denigao platonica do lésofo e seus antecedentes ta‘ O surgimento da noeio de “losofar”
meiros soldados que tombaram na guerra do Peloponeso, ofgémdo geus digcursgs a propésito temas sem vinculagio
Péricles, 0 homem de Estado ateniense, faz nestes termos um problema particular, jurfdicg O11 Politico, mas
o eloglo do modo de vida que se pratlca em Atenas: rklavam Sua Culmra g@ra1_
“Sornos amantes da beleza sem extravagancias e l0sofa~
A
mos sem indoléncia”. Os dois verbos empregados sao
compostos de philo-: philokalem e philosophein. Aqui, logo A nogo de Sophia
notamos, é simplesmente proclamado 0 triunfo da
.
I
palavras philo-sophos e philo-sophein supoem outra
cegao ou os nobres que conseguem alcangar a exceléncia a d6 wphia’ mas antes é n€C€SS5riO reconhewr que
(areté), mas todos os cidadaos podem atingir esse m, Mgépoca nio existia denigio loséca dgssa nOg0_
na rnedida em que amam a beleza ou se entregam ao
amor da sophia. No inicio do século V, 0 orador Isocrates, ,§~;§;f}Para denir sophia, os intérpretes modernos sempre
em seu Panegz'n'co7,retomara 0 mesmo tema: foi Atenas entre a nogio de saber e a de sabedoria. () sophés
que revelou ao mundo a losoa. que sabe muitas coisas, que viu muitas coisas, que
muito ou 0 que sabe se conduzir bem na vida e
H, Essa atividade engloba tudo 0 que se refere a cultura ’
- » - ~ ' P ario re etir tudo isso no cursointelectual e geral: as especulagoes dos pre-socratlcos, as sem Sempre new“ p.. . . . , . , . ' " '- ; 1'-ciencias nascentes, a teona da llnguagern, a tecnica retonca, 1 ~r_ Obra’ as duas nogoes ‘Mao longe de exdulr S3 av?
a arte de persuadir. As vezes ela se refere mais precisamen- fro saber 6’ nalmente’ um Sabepfazer’ e O ver a elm
te a arte de argumentagao, e é 0 que se supoe por uma 'faZ€r e um sabepfazer 0 bem'
alusao do sosta Ctorglas em seu Elogio deljlelenaf. Ela, diz gesdg Homero, as palavms Sophia e sophés foram em_
ele‘, nao e responsavel por seu ato, pols fol ll'1d1lZlCl2l a agir das nos Contextos mais diversos’ a pmpésito d6 C0n_
3.581%] p.Or mus? da volrade dOs deuses’ O_u sob pressao dc ill?‘ e de inclinaeoes que, aparentemente, nao tém nada
‘ , ,
V10, e~ncla’ 0? émda peha forga de persuasaoj Ou enm pol ; com as dos “losofos”‘°. Na llzada, Homero“ fala dopaixao. E distlngue tres formas de persuasao pela l1ngua- gas‘, -t d Palas Atena Se
. . “ . que, graeas aos precel os e ,gem, uma conslsnndo nos combates dos dlscursos dos rs, , . ,, , . . - , . in: -1 . sa az em toda so hza lsto e em todo saber-fazer. Delosofos”9. Trata-se, sem duvlda, de dlscussoes publlcas nas g p ’ ’
quais os sostas enfrentavam-se para Inostrar seu talento;
B. Gladlgow, Sophia und Kosmos, Hlldeshelm, 1965; G. B. Kerferd,ii ‘ jlilmage of the Wise Man in Greece in the Period before Plato”, in
7~ Isécralei Panegincoi § 47- of Man, Mélanges Verbeke, Louvain, 1976, pp. 18-28.
8. Elogio de Helena, Tradugao de Maria Cecilia Coelho, in Maria Cecilia “ Mada, 15, 411 [traducio de Carlos Alberto Nunes, S50 Paulo,
Coelho, Gérgias; 1/erdade e constmgdo discursiva, dissertaeio de Inestrado em ll 0, s_ d_; MHNIS_ A ira dc Aqui1es_ Canto 1 da Mada dc Homero, tra.
Fi10$03, S50 PM110, USP, 1997, PP- 3339- .,<~ de Haroldo de Campos e Trajano Vieira, transcrigao visual de _]osé
9- Ibid-» 13- Q.-1 I Aguilar, S50 Paulo, Nova Alexandria, 1994].
ss 39
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A d€1“1Il1§210 platonica do losofo e seus antecedentes Tiff-N O surgimento da nogio de “losofar"
_ 3.
um saber-fazer musical.
12. Homero, A Hermes, I, 511.
’ 14. Solon, Elegias, I, 52.
I Ajulgar por esses dois exemplos, pode-se perguntar legi~
Da mesma maneira, sophié é empregada por Solon“ no < I
u século VII a.C. para designar a atividade poética, que é
\ I fruto, sempre ao mesmo tempo, de um longo exercfcio 0
da inspiragao das Musas. Essa poténcia da palavra poética, ~14. '. . . -
. . _ . . rcglstros aparentemente multo dlferentes, 0 da dlscussao
1ns lrada elas Musas ue d tld t '1 . . . . - .
P P q ao seu Sen O aos awn 60- 'uri'dico- olitica' os re1s decldem a usuga e oem m amentos da vida humana, aparece mais claramente em J p ' J P
Hesiodo, no inicio do século VII. Se nao utiliza literalmen-
te a palavra sophia, ele exprime com muita for(_;a o conteu- 1 .. 1 - - ~ M7
maneira analoga, 0 hino homérico A Hermes”, apés ter lingua e sobre os labios daquele que elas escolheram
» narrado a invengao da lira, acrescenta que 0 proprio deug ‘gwrvalho suave, um doce mel:
modela 0 instrumento de uma sophia além da arte da lira, '
'*§*T9das as gentes 0 olham decidir as sentengas
a saber, a siringe. Trata-se aqui, portanto de uma arte de
’ ’ reta justiga e ele, rme, falando na dgom.
palavras do poeta também mudam os coragoes:
.
| ‘I timamente se, tanto no caso do fabricante de navios como é quem as Mums
’ no do musico, a palavra sophia nao designa, de preferéncia, do“ de 5”“ I706“ a Um-_
I atividades e praticas que sao submetidas a medida e a regra” mm a”$5tia_ "0 am-mo feaémfmdo
e supoem um ensino e uma aprendizagem mas, por outro am’ m”m_ 0 _“'m§a‘f € Se 0 “mtf”
'5 ‘ . lado, exigem também 0 concurso de um deus, uma graea 3”'”0 dds Mums hmem a glfma d0$_ amigos '
. divina, que revela ao artesao ou ao artista os segredos do I ll‘ as vmmmsos Dem“ We tem 0 Ohmpo’
. - _ . , . h i dol fabrlcagao e ajuda-os no 6X€I'ClClO de sua arte logo esquece Os [mam 8 de nm “ma a §
' lembm, 0s desviamm 0s dons das Deusas.
ddivvalor psicagogico do discurso e da importancia capital
“abilidade da palavral Palavra que opera em dois
_ disltérdia, e o do encanto poético: os poetas, com seus
Cantos, mudam o coragao dos homens. Mnemosyne, mae
daseMusas, e obl1v1o de males e pausa de algoes . Nesse
do da sabedona poetlca. Testemunha bastante lnteressante, encanto, pOde_se descobrir um esbogo do que Seréo mais
pois poe em paralelo a sophia do poeta e a do rei‘5. Sao tarde os exercicios espirituais losécos, sejam eles da
3.5 MUSHS qI1C 1I1SplI'IIl O I'€l S€I1S21IO. AS MUSZIS V€f[€l'Il SO- ordem do disCuI_SO Ou da contemplagéo‘ Porquanto nao
' é §0mente pela beleza dos cantos e das historias que nar-
12. ]. Bollack, “Une histoire de sophié’ (C. r. dc Gladigow, ver-se p. 39. Q"? ‘1“° as Musas falem esquecer OS males’ mas Porque
nota 10), in Revue des études grecques, t. 81, 1968, p. 551. —-_i
16. Cf. G. Romeyer-Dherbey, Les Sophistex, pp. 4549; P. Lain Entralgo,
15. Hesiodo, Teogonia, 80-103 [N. do T.: Teogonia. A origem dos deusea, 77'! Therapy of the Word in Clasxical Antiquity, New Haven, 1970 (c. r. de F.
2“ edigio, estudo e tradugio dc jaa Torrano, Sio Paulo, Iluminuras, 1991 Klldlien, in Gnomon, 1973, pp. 410-412).
(Biblioteca Polen). Vali-me dessa Lradugio para todas as cita<;6es.]. 17. Hesiodo, Teogonia, 55.
40 41
I * \ . “W
“gs aparece aqui a ideia, fundamental na Antiguidade, 1
"‘* » A 1
A denigio platonica do lésofo e seus antecedentes O surgimento da noeo de “losofar”
fazem os poetas e aquele que escuta ascender a uma visao V5-.5e a riqueza e variedade dos componentes da nogao
césmica. Se “elas a Zeus pai hineando alegram 0 grande dc saphm E165 se reencontram na representago lendéria e
espirito”"‘, é porque cantam para ele e fazem-no ver “o Pub; Q, de resto, histérica que se fez da gura dos Sete
que é, o que serzi e 0 que foi”, e é precisamente isso que ggosn, Cujos mgog jg Se encontram cm alguns poetas do
M cantarzi o proprio Hesiodo em sua Teogonia. Uma sentenga Sémlo V1’ 6 depois em Herédom C em Plauio, Tales de
l eplcunsta atribulda a Metrodoro, disclpulo de Epicuro, Mae“) (m do Século \/11_\/1) possuiy antes (16 tudo, um
dirzi; “Lembra-te de que, nascido mortal e com uma vida sabaque podeamos qualicar de cknticoz prevé O edip_
‘HM limitada, subiste, gragas 51 ciéncia da natureza, ao innito -do S01 de 23 dg maig de 585, arma que 3 Terra fgpgu-
do apagolf do wmpo’ 6 que “Ste O que 6’ O quf: sgm C $3, sabre a agua; mas ele tem igualmente um saber técnicoz77 "'o que foi ‘. E, antes dos epicuristas, Platao ja dissera que me atbui 0 desvio do curso d€ um do. nm C16 de_
I 7
a alma’ a quem permnce a elevagao de pensamento C J m0l1$trapossuirperspicaciapolitica: procurasalvar os gregoscontemplaqilo da totalidade, nao considera a morte uma daJanka, pr0pOndO_1h6S formar uma federag5O_ D6 Pitacos
colsa a temer‘°. _ _ , - -
q det=M1t1lene (seculo VII) atestou-se apenas uma atlvldade
A sophia pode, por outro lado, também designar a po1itica.S6londeAtenas (séculoVII-VI) étambém,javirn0s,
1 habilidade com a qual se sabe conduzir com outrem, ha- um“ homem politico, cuja benéca legislagao deixa uma
bilidade que pode chegar até a astcia e a dissimulagao. lembranga, mas é também um poeta que exprime
POT eXemP1°> na ¢0mPi13<;510 (16 $¢I1¥¢11<;?15 que Codica 1* enfseus versos seu ideal ético e polftico. Quon de Esparta,
educagao aristocratica escrita por Teognis no século VI a.C. périgndro (16 Qorintg, Bias de P;-iene (Q5 tfég do inicio do
6 dirigida a Cimos’ enC°ntra‘5e 0 Conselhomz VI) sao igualmente homens politicos, célebres por
Cimos, apresenta a cada um dos teus amigos um aspecto lcis que’ edimram Ou POT was auvldadesOmtona
dzferente de ti mesmo. Matiza-te conforme 0s sentimentos de e ZI“d3C1ar1a' A5 mdlcagoes Concgmemes a Cleobulo de
cada um. Um dia te ligues a um e depois procum a propésito 55° as mais inCeYta55 Sabemos Somnte que Se H16
mudar dg pg'r_§()naggm_ Pgrquantg a habilidade (sophié) ,1 certo nflmero de poemas. Atribuem-se aos Sete Sabios
melhor mesmo do que uma grande exceléncia (areté). m5Xim3$, “H3565 bf@V6$ 6 YI1@m0f5V€i$”, dil P13951023,ii lfiilkunciadas por cada um deles no rnomento em que,
13- ibid» 37- ' em Delfos, quiseram oferecer a Apolo, em seu
. . E icuro. Lettres, maximes, sentences, traduit et commenté ar .-F. - / ~ - -Balaudé) Pang 1994, 210 (semenca 10)“ P J as prlmlclas de sua sabedona e dedlcaram-lhe
20. Platio, A Repdblica, VI, 486 a [A Repwiblica, 2“ ed., tradutgio de
Carlos Alberto Nunes e introdueio de Benedito Nunes, Belém, Editora da B. Snell, Leben und Meinungen der Sieben Weisen, Mnchen, 1952.
Universidade Federal do Para, 1988; A Repziblica, 2“ ed., tradugao de ]ac(> Platio, Prvtdgomx, 343 a-b [Pmnigoras, tradugao, estudo introdutorio
Guinsburg, S510 Paulo, Difel, 1973]. de Eleazar Magalhaes Teixeira, Fortaleza, Edigoes Universidade
21. Teognis, Poemas elegiacos, I072 e 213. do Cearzi, 1986].L .'[ 1‘ i-
42 43
’
‘»1*->"".;'j}'
M W
I I A definigio platonica do lésofo e seus antecedentes O surgimento d H0050 d6 “10$°faP"
I (
as inscrigoes que todo mundo repete: “Conhece-te a ti Quanto aos sostas, eles serao atraldos por conta de
I mesmo”, “Nada em demasia”. Efetivamente, uma lista de Sm, int€I1§5° d6 ensinar aos jovens 3 SOPIWI M6“ Oflcio,. . ,. . -- -' ' _“' '”2maxlmas que se d1z ser obra dos Sete Sab1os fol gravada , d1z1a 0 €p1ta0 de Traslmaco e a sophza . Para os
préximo ao templo de Delfos, e 0 costume de inscrevé-las svwls’ a Palavra Sophia Slgmca’ em pnmelm lugar’ um
‘ para que fossem hdas por todos os que passassem nas d1fe- saber-fazer na v1da pol1t1ca, mas rmphca tambem todos
‘ I rentes cidades gregas foi disseminado. E assim que se des~ 0$j¢°mP°nente5 que émrevlfnos’ notadameme 3 Cultum
. - . - ' f tcobr1u em 1966, em A1 Khanun, na frontelra do atual aenca’ ao menos na mhda em quc C13 az par 6 da
' Afeganistao, nessa época, perto de uma escavagio feita em Cultura germ"
uma cidade de um antigo reino grego, 0 Bactriano, uma
estela mutilada que, como mostrou L. Robert, continha
I originalmente uma série completa de cento e quarenta
maximas délcas. Foi C1earco2‘*, discfpulo de Aristoteles, que
- ~‘ as fez gravar no século III a.C. Vé-se aqui a importancia
P ‘ que o povo grego atribuia a educagao moral25.
N
‘ I ‘ A partir do século VI, outro componente sera acrescido
a noeio de sophia, com 0 desenvolvimento das ciéncias “exa-
tas”, a medicina, a aritmética, a geometria, a astronomia.
_]2i nio ha somente “especialistas” (sophoi) no dominio das
artes ou da politica, mas também no dominio cientico.
Por outro lado, desde Tales de Mileto, uma reflexao cada
vez mais especica desenvolveu-se no dominio do que os
gregos denominavam physis, isto é, 0 fenomeno de brota-
gio dos seres vivos, do homem, mas também do universo,
reexao que esteve desde entao, muitas vezes, intimamente
misturada a arrazoados éticos, como em Heraclito, por V
exemplo, ou sobretudo em Demécrito.
24; L. Robert, “De Delphes :3 l’Oxus. Inscriptions grecques nouvelles
de la Bactriane”, in Académie des inscriptions et belles-lettres, Comptes rmdw. ~'
1968, pp. 416-457. ‘*4
25. cf. 1. Hadot, “The Spiritual Guide”, pp. 441444. 26- Trasimaw, A VIII, Dumom» P- 107?-
44 45
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Capitulo 3
» .
gum de Socrates
5 ~
QA gura dc Socrates teve influéncia decisiva sobre a
uma verdadeira tomada de consciencia da situa-
paradoxal do losofo no meio dos homens. Por essa
devemos nos deter longarnente nio no Socrates
Hiitoco, dicilmente cognoscivel, mas na gura mitica
d@l;,36crates tal qual apresentada pela primeira gcragito
déseus discipulos.
. 1
H dafinigio do “losofo” que Platio propos em seu diétlogo
N .
A gura de Socrates
Comparou-se muitas vezes Socrates ajesusl. Entre outras
Zllalogias, é verdade que eles‘ tiveram imensa influéncia
lllitrica, embora tenharn exercido sua atividade em um
Ciaqo e um tempo limitados em relagéo :31 histéria do
Hlnndo: urna pequena cidade ou um pequeno pais, e te-
llliiim tido um nmero muito pequeno de discipulos. Os‘L
‘ 1- Th. Derman, Socrate etjésm, Paris, 1944. Sobrc Socrates, cf. F. Wolff,
swmlt, Paris, 1985 [Sr5c"rates: 0 snrriso da razdo, 4’ ed., tradugio dc Franklin
L¢.0p0ldo e Silva. S50 Paulo, Editora Brasiliense, 1987 (Encanto Radical).];
E- Martens, Die Sache dex Sokmtes, Stuttgart, 1992.
47
1 1
1 1
1.
;
.
1
A denicao platonica do losofo e seus antecedentes A gura de Socrates
dois nao escreveram nada, mas possunnos sobre eles teste- e5n5,‘esc0laSZ com elas aparece 0 conceito, a ideia de lo-
munhas “ocu1ares”: sobre Socrates as Memrmiveif’ de Xeno- eoncebida, nos 0 verernos, como um discurso vin-
fonte, os dialogos de Platao; sobre Jesus os Evangelhosg, e, wjado a um modo cle vida e como um modo de vida
mesmo assim, é muito dificil para nos denir com certeza vimulado a um discurso.
0 ue foram 0 esus historico e 0 Socrates historico. A 63 1,-A ~ . , . . . ,
q ‘I P 'w‘j_'Ta,1vez tlvessemos outra 1de1a de quem fo1 Socrates se
sua morte seus discl ulos“ fundaram escolas ara difund' ~ t .
’ P P H ajbras produzldas em todas as escolas fundadas por seus
sua mensagem, mas as escolas fundadas pelos “socraticos” ;..,Q\, . . . .
. . . dmupulos tlvessem sobrevrvrdo e, especralmente, se toda a
parecem multo mars dlferentes umas das outras do que os _¢:- I ., “ , . ,, -
. . . . . . . . tura dos dlalo os socraucos , ue oern em cena
cr1st1an1smos prrmrtrvos, 0 que nos permrte decrfrar a com- . g . q P . .
. . . .- . Séerates dlalogando com seus mterlocutores, [1V€SS€ sldo
plexldade da atltude socratlca. Socrates 1nsp1rou, ao mesmo . , / , .
‘ da ate nos. E necessarro lembrar em todo caso
tempo, Antlstenes — o fundador da escola c1n1ca, que dado fundamental dos diélo de’ Plato en“;
preconizava a tensao e a austeridade e deveria influenciar ql-793,0 d (1.510 uais Sécrats desem ena
. . . . 1 n ,
profundamente o estolclsmo —- e Arlstlpo — fundador da nagao e g . q - , . P. q -
escola de Cirene para quem a arte de viver consistia em scmpre’ 0 papel de lmermgador’ nao 6 mvengao de Platao’
tirar o melhor artido ossivel das situa oes ue e a r mas que seus famosos diélogos pertencem a um género’ 0s e- , . . . .
P P _ Q q p drilogo “socratrco”, que for verdadelra moda entre os d1s-
sentavam concretamente, que nao desdenhava o repouso ,,;, , a . , .
deveria também inuéncia Consi cap!‘110s dc Socrates. O sucesso dessa forma lrterana per-
. . ’. ’ . . . mite vislumbrar a impressao extraordinziria que a gura
deravel sobre o eprcurlsmo —; rnas ele 1nsp1rou 1gualmen- d ,9-1, d , b A b
- , 'S0cra es ro uzru so re seus con em oraneos e so re-
te Euclldes — fundador da escola de Megara, celebre por e p P
. , . , . . , - . tudo sobre seus disci ulos e a maneira ela ual conduzia
sua dlaletlca. Um unlco de seus drsclpulos, Platao, tr1un- p ’ . - p q .,
suas conversas com seus concrdadaos. No caso dos dralogos
fou na historia seja or ue soube conferir a seus diélo os
. , ’ P .q , . . g Socratlcos redlgldos por Platao, a onglnahdade dessa forma
um rmperecrvel valor l1terar1o, seja antes porque a escola . ; . . . . - . . .
hterana conslste menos na utrlrzagao de um drscurso d1v1-
que fundou sobreviveu durante séculos, salvando assim . _ . . . , .
-, dldO em questoes e respostas (vrsto que o drscurso d1alet1-
seus dlalogos e desenvolvendo ou mesmo deformando sua _ , ,
C0 cxlstla bem antes de Socrates) do que no papel de
doutrina. Em todo caso, urn ponto parece comum a todas - , _
petsonagem central asslnalado a Socrates. Drsso resulta
~ . .
2. Ditos e feitos memoniveis dz Sdcmtes, 4“ ed., traducio de L)ero Rangel relagao multo parncular entrs O autor 6 Sua Obra’ dc
de Andrade,S50 Paulo, Nova Cultural, 1987 (Os Pensadores). V
3. A Biblia dejerusalém. S50 Paulo, Edicoes Paulinas, 1991; Biblia - ml» ' 5» Aristoteles, Poética, 1447 b 10 [Poétisa, 4“ ed., traducao, comentarios
ducdo ecuménica. S50 Paulo, Edigoes Loyola, 1994; Biblia — traducdo ecumé1!i- e i3¥diC€-5 analitico 6 0n0m€i5tiCO d6 Eud0rO d€ SOLIZK, $510 Pu10, NOVB C111-
ca. Versao completa em CD-ROM. S510 Paulo: Loyola Multimidia, 1997. mm, 1987 (Os Pensadores); Poética, in A Poética Cl1ixsica., 6“ ed., tradugéo
4. Leia-se em F. Wolff, Somzte, pp. 112-128, “ljalbum cle famille", que d¢]&i!ne Bruna, Sao Paulo, Cultrix, 1995]. Cf. C. W. Muller, Die Kurzdialoge
caracteriza excelentemente as diferentes personagens. ¢i¢TA1>pendix Platonica, Munich, 1975, pp. 17 ss.
48 49
,
.
I‘
, 9’
1 A denicao platonica do lésofo e seus antecedentes A gura dc Socrates
um lado, e entre 0 autor e Socrates, de outro. O autor si_ mcedente, possuem a sabedoria, isto é, 0 saber-fazer, ho-
mula nao intervir em sua obra, visto que se contenta apa~ dc Estado, poetas, artesaos, para descobrir alguém
) rentemente em reproduzir um debate que opos duas teses qugf'fOSS€ mais sabio que ele. Percebe entao que todas as
adversas: pode-se, quando muito, supor que ele prefere a que acreditam tudo saber nao sabem nada. Disso
2 * tese que faz Socrates defender. Ele toma, de alguma ma- que é 0 mais sabio porque nao cré saber 0 que nao
neira, a mascara de Socrates. Tal é a situacao que se en~ 8% O que 0 oraculo quis dizer é, portanto, que 0 mais
contra nos dialogos de Platao. _]amais 0 “eu” de Platao dos humanos é “quem compreendeu que sua sabe-
. 1 aparece. O autor nao intervém sequer para dizer que foi verdadeiramente desprovida do minimo va1or”7. Tal
S I ele que compos 0 dialogo, e nao se poe em cena na dis- sc;;§,- precisamente, a denicao platonica do losofo no
k cussao entre os interlocutores. Contudo, evidentemente, intitulado Banqueta o lésofo nada sabe, porém é
nao especica o que remete a Socrates e 0 que remete a qjmciente de seu nao saber.
S <16 Qpglp oraculo de Delfos, isto é, em ltima instancia, peloarte socratica e a arte l ton" . ' ' 1 , ,
P p P a lea Socrates aparem’ asslm’ dégs Apolo, sera fazer que os outros homens tomem cons-
» < deinddéveig toda histéria da losga Q ‘ reahzar essarmssao, Socrates aglra como ‘quem nada
' ' sabe, isto é, com lngenuldade. E a famosa 1ron1a socratlcaz
a ignorancia dissimulada, 0 ar candido com o qual, por
eagemplo, ele investigou para saber se havia alguém mais
sabio’ que ele. Como diz uma personagem da Repziblicas:
$4
O no saber socratico e a critica do saber sofistico
Na Defesa de Sécmtes, na qual Platio reconstitui, £1 sua a habitual ironia de Sécmtes.’ Eu ja sabia e predissera
rnaneira, 0 discurso que Socrates pronuncia diante de seus - "ii! esses jovens que ndo quererias respond", que $im"lm'ill5
juizes por ocasiao do processo ern que foi condenado, ele 1i'ff"'ign0rzincia, que tudo farias para ndo responder as perguntas
narra que um de seus amigos, Querefonte, perguntara ao te fossem apresentadas!
oraculo de Delfos se existia al em mais sabio s has e P . _ , , .
, , . gu . _ ( ) qu, porque, nas drscussoes, Socrates e sempre o 1nter-Socrates, e o oraculo tena respondldo que nao. Socrates se do? “é ele confessa nada Saber” nota
questiona, entio, sobre 0 que o oraculo quis dizer, lancan- . ' 9 “q, . . ’ ,, -
. . ~ . ~ Awloteles . Socrates, depreclando-se a s1 mesmo — d1zdo-se em uma longa mvestlgacao Junto as pessoas que, se-
ndo a tradi ao re a e de fala 'gu <; g g quem mos no cap1tulo Id" ibid” 23 b_
4 3. Platio, Reptiblica, I, 337 a.
6. Platao, Defesa, 20-23. 9- Aristoteles, Rzfutaqes sofisticas, 183 b 8.
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'~ WA denicio platonica do losofo e seus antecedentes A gura de Ségfateg\ -ls.‘-5,
Cicem _’ “"50 Permit‘? que sells int@T10Cut0res digam Socrates chega atrasado pois permaneceu a meditar,
senao 0 que ele quer refutar: assim, pensando em uma em pé, “ocupando seu espirito consigo mesmo”.
coisa e dizendo outra, tinha prazer em usar habitualmente 61¢ faz sua emrada na Sala, Agatio, que é 0
essa dissimulacao que os gregos denominavam ‘ir0nia’”“’. kgviio, convida-o a sentar-se perto dele, “a m dc que
Na verdade, nao se trafa de uma atitude articial, de um Conmto desfrute eu da sgbia ideia que te Qcorfeu
parti pris de dissimulacao, mas de uma especie de humor
que recusa levar totalmente a sério tantos os outros como
' ffrente de casa”. “Seria born, Agatao” — responde ;
—, “se dessa natureza fosse a sabedorla que do r
3 Si mesmor Porquff, Precisamente’ md° O (1116 é human‘), Q ;§%§*cheio escorresse ao mais vazio”. O que ele quer dizer
mesmo tudo 0 que é losoco é coisa bem pouco assegu’ ‘ 0 saber nao é um objeto fabricado, um contedo
rada de que nao se pode ter muito orgulho. A missao dr’
1 transmissive] diretamente pela escritura ou por
Socrates é fazer que os homens tomem consciéncia de seu
nao saber. Trata-se aqui de uma revolucao na concepcao
& importa qual discurso.
de saber. Sem duvida, Socrates pode dirigir-se a estranhos, Quando Sécrates Pretend‘? Saber “ma nica Coisa’ 0“
e 0 faz com prazer, dizendo-lhes que tém apenas um saber Que nada Sabe, é Porque 81‘? “C1153 11 C0I1<3@P<;510 ml"
Qgnvencional, que 56 agem gob 3 inuéncia (16 pr(—)(;()n- (16 $211361". S611 Il'1é[OdO l0S6CO COIlS1S[ll"é I150 €IIl
ceitos sem fundamento reetido, para mostrar-lhes quc um saber, 0 que exigiria responder as questoes dos
seu pretenso saber nao repousa sobre nada. Mas ele se dipcipulos, mas, ao contnirio, em interrogaros discipulos, pois
dirige sobretudo aos que estao persuadidos, por sua cul- e'k;.mesmo nao tem nada a dizer-lhes, nada a ensinar-lhes
tura, de possuir “o” saber. Até Socrates, houve dois tipos defcontedo teorico dc saber. A ironia socratica consiste
de personagens desse género: de um lado os aristocratas cmsimular aprender alguma coisa de seu interlocutor, para
do saber, isto e, os mestres de sabedoria ou de verdade. le!va+lo a descobrir que nao conhece nada no domlnio do
como Parménides, Empédocles ou Heraclito, que opu- que pretende ser sabio.
nham suas teorias a ignorancia da multidao; de outro
’ Mas essa critica do saber aparentemente negativa, temos democratas do saber, que pretendiam poder vender _ _ _ ’dupla slgnlcacao De um lado supoe que o saber e ao saber a todo mundo: os sostas. Para Socrates, o saber
1 _ ' ’_ , . . - , . Vérdade, como J21 vislumbramos, devem ser engendradosnao e um COl1_]llIl[O de proposlcoes e formulas feltas que . _
P610 propno lndlviduo Por ISSO Socrates arma no Teetetolgse pode escrever ou vender; como mostra o inicio do Bém-
A ' ’ ’que se contenta, na discussao com outrem, em desempe-
nhar o a el dc arteiro. Ele mesmo nao sabe nada e nao10. Cicero, Ldsulo, 5, 15. Sobre a ironia socrzitica, cf. R. Schaerer, “L0 P p P
mécanisme de l‘ironie dans ses rapports avec la dialectique”, in Rwue dw A
métaphysique et de morale, 48: 181-209, 1941; V. jankélévitch, L’Irom'e. Paris.
1964; ver Lambém G. W. F. Hegel, Lecons sur l’hist0ire dz la philosophie, T. ll.
Paris, 1971, pp. 286 ss.
52 i
11. Banquete, 174 d—175 d.
12. Teeteto, traducao de Carlos Alberto Nunes, Belém, Editora Univer-
dade Federal do Para, 1988.
53L
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\ ;*i"~.
' ¢ 137E‘ '
321'?”
A denieio platonica do losofo e seus antecedentes A gllf (16 Séfls
\ ensina nada”, mas contenta-se em questionar, e silo suas
s wisténgia passada. Quando se chega lzi, Sécrates ndo te
questoes, suas interrogagoes, que auxiliam seus interlocu~ Mxa partir antes de ter, bem a fundo e de uma be{a ma-
tores a parir “sua” verdade. Essa irnagem nos perrnite en- Mira, subm€iid0 tudo d [Nova de seu exame [...] E para
tender bem que é na alma que se encontra o saber e que mim uma alegriafrequentd-lo. Eu mio vejo nenhum mal que
' ao individuo cabe descobri-la, até que ele descubra, gracas me fa§a recordar 0 bem ou 0 mal que eu tenha feito ou
‘ a Socrates, que seu saber era vazio. Na perspectiva de seu _ ainda faea. Aquele que faz isso seni necessariamentemais
proprio pensamento, Platao exprimirzi miticamente essa ‘prudent? 110 T63"? de Sud Vida-
‘ ideia dizendo que todo conhecimento é reminiscéncia de
’ - 1 Socrates leva seus interlocutores a examinar-se, a tomar
l1I1'l21 VISHO qLl€ 21 HIIIIH. [CV6 CH1 UII121 €X1S[€l’lC13. 3.I'lI€I"lOl". C6!-l‘s¢iénCia de Si meSmOS' Como ¢<umtaviO>»15’ fustiga sens
interlocutores com questoes que os poem em questao, que QM Q4contrano, a perspecnva e musto dlferente. As questoes de Osaobrigam a prestar awngio a Si mesmos, a {Omar Cuidado ' J,‘
- Socrates nio conduzem seu lnterlocutor a saber alguma ».-esi mesmoswz ,_
coisa e a chegar a conclusoes que se possam formular sob g
a forma de proposieoes sobre este ou aquele objeto. () Meu cam, tu, um atmiense da cidade mais importante e mais
dialogo socratico chega, ao contrario, a uma aporia, in _ Ivliilmdll P0’ 5"” “mum 9 P0dm0> "do '56 P8195 de Cuidam‘
impossibilidade de concluir e de formular um saber. Ou, l1dlI"mT 0 maxim" de ”'fI“@/"13: lm“ 5 h-0"m”'a$> 9 de "do
_ antes, é porque 0 interlocutor descobrirzi quao ilusorio é impartares nem cogitares da mzdo, da verdade e de melhwar
seu saber que ele descobriré ao mesmo tempo sua verdade, qwmw "Wis a mil aim”?
isto é que passando do saber a si mesmo principiara a
’ ’ ’ Trata-se bem menos de questionar o saber aparente,
pops‘: a S1 mesmo gm qu€Sta0' Duo de Outro modo’ no que se acredita possuir do que de se questionar a si mesmo ’' ’ £6 ’ ' 95 ' "' / '
1 dlalogo socrauco , a verdadelra questao que esta em Jogo abs valores qu€ dirigem nossa prépria Vida_ NO m das
nao e zsso de que se fala, mas aquele que fdld, Como O dlz contas, apos ter dialogado com Socrates, seu interlocutor
‘ Niclas’ personagn de Plataow j5'7£l§0 sabe muito bem por que age. Ele toma consciéncia
Ndo sabes que aquele que se aproxima muito perto de Sécmtes Comradiées de seu discurso 6 de 51135 PT6P1"ia5 C011‘
e entm em dieilogo com ele, mesmo que tenha comegado, no iI1I@fI1i1$- E V6111 3 Sabf, 601110 S6¢F3t@5, (1116 nada
inicio, a falar com ele de outm coisa, ele ndo se crmstmngr M35, f3Z6nd0 i5-$0, $011191 dislilncia em Y@1a§510 3 Si
em ser conduzido em circulo por esse discurso, até que seja desdobra-se, uma parte de si mesmo identicand0-
a necessdrio dar mzdo de si mesmo tanto quanta da maneim agora em diante, c0In Sécratt-IS HO 2lCOrd0 II1tu0
pela qual se vive presentemente e daquela que viz/eu sun QR este exige de seu interlocutor em cada etapada discus-‘L
13. [bid., 150 d. I5, Defesa, 30 e.
14. Laques, 187 e 6. 16- Ibid-» 29 (1-6-
, i-**.1';1./g a
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Sera necessario aprender a recordar-se. Para Socrates, ao .
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* A denicao platonica do losofo e seus antecedentes w A gura de Socrates
‘ \ .
sao. Opera-se nele uma tomada de consciéncia de si; ele isso que dzi a entender Alcibiades no m do
se poe a s1 mesmo em questao. . E no elogio a Socrates pronunciado por Alcibiades
O verdadeiro problema nao e, portanto, saber isso on
,4
aquilo, mas ser desta ou daquela maneira": . , . . . , .
~' "<3 personalidade unica e inclassicavel. Exlstem nor-
Y
, ~ , ‘rqgurge, pela primeira vez parece, na histona, a repre-
‘ho do Individuo, caro a Kierkegaard, do Individuo
Eu que, negligenciando 0 de que cuida toda gente — rique diz Alcibiades“, diferentes tipos nos quais se
N .
‘ zas, negocios, pastas militares, tribunas e funges jniblicas, ‘ dispor os individuos; por exemplo, 0 “grande ge-
\J conchavos e lutas que ocorrem na polztzca, cozsas em que me .~ ,' nobre e COFPUOSO”, como Aqulles, nos tempos home-
considero de fato por demais pundomrroso para me imiscuiv" ~f,, como Brasidas, 0 chefe espartano, entre os contem-
sem me perder [...] Eu que me entreguei d procum de cada eos; ou ainda o tipo “homem de Estado, eloquente
um de vo's em particulm; a m de proporcionar-lhes 0 que dente”: Nestor no tempo de Homero, Péricles em
declaro 0 maior dos beneficios, tentcmdo persuadir cada um dias. Mas Socrates é impossivel de classicar. Nao
de vos a cuidar menos do que é seu que de si proprio pam e compara-lo a nenhum outro homem, quanto mais
1/2'1" a ser quanto melhor e mais sensato. enos e aos satiros. Ele é dtopos". estranho, extravagan- c,\J.\"-~'~
A ‘<4
»“"‘“i"‘*’ inclassicavel es uisito No Teeteto dira de siEsse apelo ao “ser”, Socrates o exerce nao somentc “ ’ ’ _<~-.~*~».\ ’ -
t i ,por suas interrogacoes, sua ironia, mas tambem e sobre
tudo por sua maneira de ser, seu modo de vida, seu ser
1“: aporia (perplexidade)”“’.
L0" Eu sou totalmente esquisito (atopos) e nao crio ”$
mesmo. Asa personalidade Linica tem algo de fascinante, exer-
a espécie de atracao magica. Seus discursos losocos
.',x. »
\‘ modem o coracao como uma vibora e provocam na alma,1, . , - , .O apelo do “individuo” ao “individuo” _1,.‘v§=»§§§1\lc1b1ades, um estado de possessao, um delmo e uma
-t fiaguez losoca, isto é, uma subversio total2°. E ne-
~ \ Y Q J
1 Hm \ I
Filosofar nao é mais, como queriam os sostas, adquirir .'o insistir ainda nesse ponto”. Socrates age de ma-
um saber, ou um saber-fazer, uma sophia, mas é por-se a si iI‘f8Ci0I1l S0bf6 aqueles que 0 Ouvm, P613 @m0<}50
mesmo em questao, pois experimenta-se o sentimento de ,~§.pf0VOCa, pelo amor que inspira. lim um dialogo escri-
nao ser o que se deveria ser. Tal sera a denicao de lo- I‘ UII1 di$CfPl110 <16 S6CI‘aI6$, Esquines d6 Esfews,
sofo, do homem que deseja a sabedoria, no Banquete de ’_;- S diz, a proposito de Alcibiades, que, se ele, $6CfI¢$,
Platao. E esse sentimento provém do fato de que se encon-
trou uma personalidade, Socrates, que, apenas por sua t B¢mq1wlv,2?l 6-d-
- - . Y’ ,-19. Deteto, 149 a.presenca, obnga aquele que se aproxima dele a por-se em é;ih,;-5; Blmqum, 215 C e 218 b_
17. Ibid., 36 c.
"$21. Cf. A. M. loppolo, Opinions 2 scienza, Napoli, Bibliopolis, 1976,
, 4
-1
56 i V; 57
>
4
\
~.
4
L
:‘L<_ ,\
 .
,<';"vv? I
‘ >
A denicao platonica do lésofo e seus antecedentes A gura de Sécrates
ridiculos25:
233 nota 1
~
\
A A ' nao é capaz de ensinar algo de (itil a Alcibiades (0 que nag wigidas p0f Xenofonwwi d6 que, Para aPr¢nd@Y O Ocio
. é surpreendente, dado que Socrates nada sabe), ele cré ao dggpateiro, de carpinteiro, de ferreiro ou de estribeiro,
menos poder toma-lo melhor, gracas ao amor que expenl We procurar um mestre,, e mesmo para domar cava-
f menta por ele e a medida que vive com ele”. No Tkages, “*3 bois, mas que, quando se trata da justica, nao se
if I i_ dialogo falsamente atribuido a Platao, mas escrito entre 369 deggprocurar um mestre. No texto de Xenofonte, Hipias,
5' e 345 a.C.23, provavelmente enquanto Platao ainda era vivo, 9-jpsm, recorda a Socrates que elc sempre repete as
um discipulo diz a Socrates que, mesmo sem ter recebido mamas palavras sobre as mesmas coisas. E Socrates ad-
qualquer ensinamento de Socrates, ele pode progredir pelo mite, com evidente prazer, que é isso que lhe permite
l simples fato de estar no mesmo lugar que 0 inestre 6 dc seu interlocutor dizer que ele, Hipias, ao contrario,
poder toca-lo. O Alcibiades do Bzmqiwte lhe diz e 0 repcte, os se_!'§‘5fQI‘(;8 para sempre dizer algo de novo, mesmo que
encantos de Socrates tém uni efeito perturbador sobre elem: da justica. Socrates bem que gostaria de saber 0
De tal modo me sentia que me parecia ndo ser possivel UiUPY .I“_I.‘P‘as pode dlzer de “°Y°_S°bre um tema que nao l
em condicées coma as minhas[ ] Pois me frrrca ele a admzl ¢¢"F“?‘ mud,“ nunca’ mas H_1P1aS reCusa_Se 3' reSpO_n(,1f:r
tir que, embom sendo eu mesmo deciente em muitos pontos
ainda, de mim mesmo rrw descuido.
Isso néio signica que Socrates seja mais eloquente e A SH” mum We Z°_’""“~‘ dos Outms’ mmNmg‘_md0,e mfut‘md0
antes que Socrates lhe permitisse conhecer sua opiniao
sobre a justica:
sempre semjamazs querer prestar contas a nmguem nem sobre
‘ brilhante que os outros. Bem ao contrario, diz Alcibiades, a it ’
primeira impressao seus discursos parecem completamentc H nada expor tua opinido.
»
»
i_ A0 que Socrates responds:
' P015 El” ll“ de besms de “”ga> de fmeirosi de 5aPa'5@1'T0$»

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