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A escAlAdA dA pobrezA Desigualdade social se intensifica escandalosamente no Brasil por conta da pandemia da Covid-19 reAção mundiAl Brasil perde investimentos estrangeiros devido à destruição da Amazônia A intervenção de ArAs Procuradoria-Geral da República quer controlar as forças de combate à corrupção e irrita procuradores uma mobilização mundial tenta frear os arroubos do presidente. ele busca uma nova estratégia, mais apaziguadora, e passa a ser tutelado pelos militares para salvar um governo que faz água em meio às investigações, à queda de popularidade e aos erros primários de administração R $ 17 ,0 0 9 7 7 0 1 0 4 3 9 4 0 0 8 4 3 6 2 0 8 JU l/ 20 20 – AN O 4 3 – N º 26 34 AF_ISTOÉ.indd 2 01/07/2020 13:48:34 AF_ISTOÉ.indd 3 01/07/2020 13:48:35 4 fotos: GABRIEL REIs; BRunA PRAdo/GEtty ImAGEs O informativo de desigualdade social por cor e raça, do IBGE, indica que entre 2012 e 2017, houve 255 mil mortes de pessoas negras por assassinato no Brasil. Os negros têm 2,7 mais chances de morrer assassinados do que pessoas brancas. Como o senhor vê essa situação? Na Faculdade Zumbi dos Palmares temos o Observatório da População Negra que abrange vários temas e um deles é a “Há uma verdadeira limpeza étnica contra os negros” Por Fernando Lavieri O professor e empresário José Vicente, 61 anos, reitor da Faculdade Zumbi dos Palmares, atua de ma- neira destacada na valorização da educação inclusiva e equânime da população historicamente abandonada. Esse é o tema de sua vida: a condição dos negros bra- sileiros e tudo que permeia essa questão. “Em todos os espaços de poder, as pessoas negras são minoria, seja dentro do ambiente empresarial, seja nos três Poderes da República, seja em qualquer instituição pública ou privada”, disse José Vicente, em entrevista à ISTOÉ. A estrutura de comando universitário segue essa regra. José Vicente está entre os poucos reitores negros do Brasil e o único de uma instituição privada. Ex-bóia-fria, ex-policial e educador por excelência, ele discorre linearmente sobre o Brasil e os EUA explican- do quais são as razões que levaram a ações de barbárie, quase diárias, que o mundo inteiro viu pela imprensa. Para o professor, a selvageria que vitimou George Floyd, em Minneapolis, e a violência que atingiu o menino João Pedro, no Rio de Janeiro, pertencem à mesma matriz ideológica. Ao falar sobre políticas, especifica- mente a respeito do governo Bolsonaro, ele é contun- dente. “O governo já tornou público que não tem ne- nhuma disposição para resolver a questão da discriminação e do racismo. Pelo contrário, tem reser- vas”, afirma. “Com Bolsonaro não é permitido o livre pensamento. Esse é o governo da negação”. PRECONCEITO Para José Vicente, o governo Bolsonaro não está pautado para construir um novo projeto educacional para o Brasil: “Ele preza pela destruição” ISTOÉ 2634 8/7/2020 ENTREVISTA José Vicente Reitor da Faculdade Zumbi dos Palmares 5 violência contra essa população. Nós acompanhamos, debatemos e faze- mos as mais diversas ações para tentar mudar esse estado de coisas que se apresentam como genocídio pré-or- denado à população negra. É uma verdadeira limpeza étnica, já que em nenhum local do mundo se matam tantos jovens negros dessa forma. Lembra um túnel do tempo. Isso sempre foi assim. Temos que ter um discurso que denuncie o racismo e a discriminação estrutural e institucio- nal e motivar intervenções do Estado e da sociedade no sentido de terminar com essa matança. Ainda não conse- guimos criar um caminho para produ- zir soluções. No Brasil há letargia e falta mobili- zação contra o racismo? Por quê? Porque todos nós fomos vitimados pela perversidade do nosso sistema político, que nega a existência do racismo e também nega que os números que refletem a violência e a desigualdade, pontuadas pelos indicadores sociais, sejam fruto do racismo e da discriminação. Há uma negação permanente. Mas os números da discriminação saltam aos olhos. Há cem anos que os indicadores são os mesmos e em ne- nhum momento, nem à esquerda, nem à direita, na Dita- dura Militar, no milagre brasileiro, nem quando nós éramos um País atrasado, nem quando éramos a quinta economia do mundo, nós conseguimos mexer uma vírgula desses indicadores. Seja por essa desqualificação do racismo como realidade, como algo que separa e distingue pessoas, seja porque não se trata de uma prioridade da agenda política, econômica e social. Nós estamos há anos-luz do Apartheid sul-africano e do americano, mas nem assim as parcelas da sociedade, que exercem o poder, têm interesse, disposição ou determinação para intervir. Preferem o silêncio, a indi- ferença e a negação. Dizem, “o que acontece nos EUA é racismo, matar um negro com o joelho no pescoço, aqui no Brasil não é assim”. Atender essa demanda requer co- locar a mão no bolso e tirar o dinheiro de alguém, e jamais a elite brasileira vai permitir que os recursos que atendem seus interesses, suas necessidades, saiam do seu bolso para resolver esse problema. Então, o caminho é elegermos pessoas negras pa- ra o Executivo e o Legislativo? Isso vai permitir minorar o im- pacto do racismo? Não resta dúvida. Veja qual foi à res- posta da sociedade e como foi a res- posta da elite dirigente para a não presença das mulheres no ambiente político. Eles criaram uma lei em que todo o partido político tivesse 30% de mulheres. Não houve questionamen- tos ou resistência, todos compreende- ram. Há uma distorção que deslegiti- ma e desconfigura a presença e a perspectiva democrática e, por conta disso, vamos construir uma política pública, mas ninguém até hoje teve disposição e coragem para dizer que existe uma distorção maior, que não existem negros no sistema político. É um sistema perverso. Nós temos um senador negro, dez deputados federais negros, um vereador negro em São Paulo e duas deputadas estaduais negras, num País em que 54% da população é negra. Se fossemos uma República verdadeira- mente democrática, seguramente isso não seria assim. Há outro caminho? O Estado tem meios, mecanismos e obrigação de fazer, já que é para isso que ele existe: para diminuir as desigualda- des e distorções. Por exemplo, as cotas raciais em universi- dades públicas são uma ferramenta que têm capacidade de transformação. Agora falta termos a gestão universitária com negros na administração, mais professores negros, como pesquisadores na pós-graduação e no ambiente de produção de tecnologia. Precisamos de 50% de cotas em toda estru- tura. Fora disso, temos desigualdade. A violência contra a população negra está espalha- da por todo Brasil? A nossa gênese é a da violência. Nós somos um país cons- truído sob a escravização, o extermínio e o vilipendio do índio, o estupro da mulher indígena, a destruição da famí- lia indígena, depois toda a barbárie sobre o negro e a vio- lência e a brutalidade que se estabeleceu a todos aqueles que não fizessem parte da elite no poder. E essa elite vem desde então construindo sua milícia oficial, que tem como metodologia o extermínio puro e simples. A violência é o recorte. É só ver Datena e Sikêra Júnior para se ter noção de como a violência está embrenhada na vida social. O Estado terceiriza a violência formal e informal. Veja os >> “Não sei quem é mais destrutivo: Bolsonaro ou o coronavírus. Tinha que se fazer no Brasil algo parecido com o Plano Marshall para vencermos essa crise sanitária” 6 casos das milícias e da polícia na periferia, daquele menino, por exemplo, que foi abordado numa escada na favela pela polícia aqui em São Paulo. É como antigamente, quando o jovem negro não podia sair de casa sem os documentos? Ainda bem que alguém teve a coragem de filmar. Mas aqui- lo é rotina, trivial, faz parte da rotina do jovem de periferia, principalmente negro, em qualquer lugar do País. No Judi- ciário também há problemas. Nós temos 900 mil presos no Brasil,dos quais 50% não foram denunciados. Não tem Direitos Humanos, não tem Ministério Público, não tem política, não tem mídia, não tem padre, não tem um filho de Deus que consiga fazer a Justiça cumprir a lei. Porque uma pessoa só pode ser mantida presa por noventa dias, sem denúncia. E quem são esses presos? Se fosse o Sérgio (Machado) da Transpetro, ficaria com uma tornozeleira eletrônica em casa esperando a pena passar. Gostaria que o senhor analisasse a situação nos EUA e o assassinato de George Floyd. Havia um policial com o joelho em cima do pescoço do Floyd, com a mão no bolso, quase como quem vai pegar o celular para enviar uma mensagem. Mas havia mais três policiais que estavam ao lado dele, olhando aquela cena horripilante, acompanhando a morte que estava se materia- lizando, e todos continuaram na mesma posição sem nenhum tipo de constrangimento, sem preo- cupação que ali no chão havia um ser humano. Só ficaram dessa forma porque, em sua compreensão, a pes- soa negra não é um ser humano, mas sim um ser inferior. É esse sentimen- to de superioridade que embasa a polícia e grande parte dos americanos e suas instituições. Trata-se de uma justificativa para se agir dessa forma. Essa é a essência do racismo. O racismo está acima dos ensina- mentos na academia de polícia? Sim. Está no chip do indivíduo. Des- de que a pessoa vem ao mundo, que tem um passado e uma estrutura racista, é isso que ele aprende. Mas no caso dos EUA houve o for- talecimento do movimento antir- racista, o Black Lives Matter. Essa é uma diferença significativa entre Brasil e EUA. O slogan Black Lives Matter é uma nova nomenclatura para algo que já existia com outros protagonistas como Martin Luther King, Rosa Parks, Angela Davis, Panteras Negras, Malcolm X, entre outros. A trajetória do negro americano foi de luta e embate nas ruas e em todos os espaços sociais, enfrentando Ku Klux Klan, com suas patrulhas incendiárias, que invadiam as casas das famílias negras e tocavam fogo. São movimentos que os participantes acreditam na justiça, com capacidade de reper- cussão mundial. O dado novo foi que dessa vez vimos que a força letal do Estado, a polícia, se colocou de joelhos para se solidarizar com o movimento e no limite com o próprio Ge- orge Floyd. Nunca imaginei essa cena, a polícia se desculpar por sua selvageria. E também foi resolutiva no sentido de fazer com que os municípios e estados mexessem no proto- colo e no orçamento da polícia para que ações do tipo não aconteçam novamente. Sem contar uma meia dúzia de está- tuas que foram para o rio. Quisera que isso acontecesse no Brasil. Aqui, 50 policiais entram na favela metralhando tudo, mesmo com gente dentro das casas, e não acontece nada. Qual é a sua analise a respeito do governo Bolsonaro, principalmente em relação ao Ministério da Educação? Essa pasta foi cooptada pelo governo Bolsonaro para fazer um recorte ideológico. Fica o tempo todo criando factóides, que é uma das marcas da gestão. O primeiro a assumir o cargo, Ricardo Vélez, era um desconhecido que estava totalmente perdido. Weintraub, não tinha capacidade e envergadura técnica para gerir o Ministério. Trans- formou-o num palanque, no qual fez a construção de um inimigo, o mar- xismo cultural, algo imaginário. E agora, o presidente tirou da cartola um novo ministro que também não tem capacidade técnica. Aliás, nem assumiu, por ter um currículo ques- tionável. Esse governo não está pau- tado para construir um novo projeto educacional para o Brasil. Ele preza pela destruição. Esse momento de pandemia acen- tua esse projeto do governo? Não sei quem é mais destrutivo: Bol- sonaro ou o coronavírus. Tinha que se fazer algo parecido com o Plano Marshall para vencermos essa crise. Mas o ministro da Economia, Pau- lo Guedes, não aprova. Ele já dis- se isso publicamente. Sim, eu sei. Paulo Guedes é um repre- fotos: GABRIEL Bouys/AfP; REPRodução ENTREVISTA/José Vicente “O dado novo foi que dessa vez a polícia se colocou de joelhos para se solidarizar com o movimento e com o próprio George Floyd. Nunca imaginei a polícia se desculpando por sua selvageria” ISTOÉ 2634 8/7/2020 7 para eliminação da discriminação racial contra os negros e todas demais pessoas no Brasil. Zumbi dos Palmares se tornou um dos personagens mais criticados no governo Bolsonaro. Como o senhor vê a atitude de Sérgio Ca- margo, presidente da Fundação que leva o nome do líder negro? O País transformou esse homem num herói nacional. Zumbi dos Palmares foi reconhecido e reverenciado pela socie- dade brasileira, através dos seus repre- sentantes no Congresso, como um herói nacional. E mais: duas mil cidades e alguns estados reconheceram o valor da luta de Zumbi dos Palmares e de- clararam o dia de sua morte como fe- riado, além de nomear ruas, praças, avenidas e escolas em sua homenagem. Como pode um desqualificado desse dizer essas coisas? O governo Bolsona- ro já tornou público que não tem ne- nhum tipo de disposição para resolver a questão da discrimi- nação e do racismo. Pelo contrário, tem reservas. O presidente exige que todos que estão no governo operem na mesma sintonia. É um governo que não permite o pensamento. No caso da Fundação Palmares, quem conhece o pai do Sergio Camargo, o Oswaldo, um dos maiores escritores brasileiros, sempre defendendo a bandeira da negritude, isso não faz qualquer sentido. A Fundação Palmares foi criada para tratar do patrimônio cultural e artístico, além de fomentar políticas públicas para a inclusão dos negros brasileiros. A gestão atual revela um desvio de finalidade. Isso só poderia acontecer nes- se governo da negação e do absurdo. Qual foi o caso de racismo que mais lhe marcou? A Faculdade Zumbi dos Palmares existe há quinze anos e todas as vezes que chego a bons hotéis para participar de seminários, debates, cerimônias, a pessoa fala: “Para aguardar a chefia você tem que estacionar o carro lá na frente”, mes- mo o meu carro sendo novo e bonito. Aí tenho que dizer: “Eu não vim aguardar a chefia. Eu sou a chefia”. Aí o cara fica todo constrangido, todo sem graça. Pois bem, após par- ticipar das atividades, ao voltar para pegar meu carro, en- quanto estou na porta aguardando, todas as pessoas que chegam colocam as chaves na minha mão. “O senhor pode pegar meu carro, por favor”. Então, preciso falar todas as vezes que não sou o manobrista e que estou, como as outras pessoas, também esperando meu carro. sentante do capitalismo rentista dessa gestão. Até por isso que o governo propôs R$ 200 de auxílio emergencial e foi preciso muita articulação política para chegar aos R$ 600. Como a crise sanitária impactou o setor empresarial universitário? Como a Zumbi dos Palmares está lidando com esse momento? A crise é forte. Estamos trabalhando remotamente, mas tivemos uma que- da de 50% na demanda, deve demorar de dois a três anos para retomarmos o antigo patamar. Se tivéssemos uma gestão mais técnica no Ministério da Educação, conseguiríamos sair dessa crise melhor. Pois ninguém tem uma resposta pronta. A solução vai se dar ao longo do processo. A educação é uma das formas de minorar o racismo. As empresas associadas à Faculdade Zumbi dos Palmares estão disponibilizando mais vagas de em- prego aos candidatos negros oriundos da instituição? O movimento cresceu e se fortaleceu. Atualmente são 60 empresas que de uma forma mais transparente têm de- monstrado interesse nesse processo de valorização do negro. Muitas delas construíram políticas importantes, mas ainda muito aquém do necessário. Essas ações podem encorajar outras empresas a participar do nosso esforço, num espaço curto de tempo. Qual a empresa que mais emprega candidatos da Zumbi dos Palamares? Só da Faculdade Zumbi dos Palmares o Bradesco tem 500 trabalhadores negros efetivados. É a empresa mais avançada nesse tema, é a empresa que mais contratou negros na história. Mas eles têm 100 mil funcionários e os negros nãorepresentam nem 10% do total. O banco pode fazer mais. No contexto das manifestações antirracistas, a Zumbi dos Palmares está lançando um manifesto. Do que se trata? Trata-se do Movimento AR - Vidas negras Importam. É uma ação nacional de mobilização e colaboração gratuita e vo- luntária, com o propósito de promover mudança e transfor- mação social, através de ações práticas, efetivas e objetivas de combate ao racismo, ao preconceito e à discriminação racial contra negros. Nosso objetivo é promover mudança e transformação nas atitudes pessoais, comunitárias e sociais “Abraham Weintraub não tinha capacidade e envergadura para gerir a educação. E, agora, o presidente tirou da cartola um novo ministro sem condições técnicas e que nem assumiu” 8 ISTOÉ 2634 8/7/2020 Cartas FUNDADOR DOMINGO ALZUGARAY (1932-2017) EDITORA Catia Alzugaray PRESIDENTE EXECUTIVO Caco Alzugaray DIRETOR EDITORIAL Carlos José Marques DIRETORES DE REDAÇÃO: Germano Oliveira DE EDIÇÃO: Antonio Carlos Prado EDITOR EXECUTIVO: Marcos Strecker EDITORES: Felipe Machado e Vicente Vilardaga REPORTAGEM: Anna França, Brian Alan, Eudes Lima, Fernando Lavieri, Jo Pasquatto e Mariana Ferrari COLUNISTAS E COLABORADORES: Bolívar Lamounier, Cristiano Noronha, Elvira Cançada, José Manuel Diogo, Luiz Fernando Prudente do Amaral, Marco Antonio Villa, Mario Vitor Rodrigues, Mentor Neto e Ricardo Amorim ARTE DIRETOR DE ARTE: Camilla Frisoni Sola EDITOR DE ARTE: Arthur Fajardo DESIGNERS: Cibele Camargo, Claudia Ranzini e Wagner Rodrigues INFOGRAFISTA: Gerson Nascimento PROJETO GRÁFICO: Marcos Marques ISTOÉ ONLINE: Diretor: Hélio Gomes Editor executivo: Edson Franco Editor: André Cardozo Reportagem: Alan Rodrigues, André Ruoco, Heitor Pires, Larissa Pereira, Leticia Sena, Rafael Ferreira e Vinicius Moreira da Silva Web Design: Alinne Souza Correa e Thais Rodrigues Ferreira Fernandes AGÊNCIA ISTOÉ: Editor: Marco Antonio Ankosqui Pesquisa: Salvador Oliveira Santos Arquivo: Eduardo A. Conceição Cruz CTI: Silvio Paulino e Wesley Rocha APOIO ADMINISTRATIVO Gerente: Maria Amélia Scarcello Secretária: Terezinha Scarparo Assistente: Cláudio Monteiro Auxiliar: Eli Alves MERCADO LEITOR E LOGÍSTICA Diretor: Edgardo A. Zabala Diretor de Vendas Pessoais: Wanderlei Quirino Gerente Geral de Venda Avulsa e Logística:Yuko Lenie Tahan Central de Atendimento ao Assinante: (11) 3618-4566 de 2ª a 6ª feira das 9h às 20h30. 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Imaginem quando o seu ex-assessor, Fabrício Queiroz, agora atrás das grades, começar a delatar tudo e todos. “O laranjal de Flávio” (ISTOÉ 2633) José Jorge Silva São Paulo – SP Cartas para esta seção, com endereço, nú mero do RG e telefone, devem ser remetidas para: Diretor de Redação, ISTOÉ, Rua Wil liam Speers, 1.088, Lapa, São Paulo, CEP 05067 –900. FAX: (11) 3618–4324. As car tas poderão ser editadas em razão do seu tamanho ou para facilitar a compreensão. CORREIO ELETRÔNICO: cartas@istoe.com.br No Brasil, ser “laranjal” virou uma pro� ssão legalizada, caso não fosse todos eles estariam presos há muito tempo. Cae Pereira São Paulo — SP Precisamos de um Poder Judiciário � rme e forte para colocar os milicianos no seu devido lugar. Isabel Ferreira Zarzuela Pamplona — Espanha >> BRASIL Quanto menos esclarecido, estudado e graduado o cidadão, mais fácil de ser manipulado pelos políticos mal intencionados. “A balbúrdia na educação” (ISTOÉ 2633) Marco Adilson Galvani Bilac — SP A educação? Não tem mais como piorar, somos os últimos colocados do mundo há muito tempo. Marcelo da Mara Campo Grande — MS “O poder é mantido pela ignorância das massas”, Abraham Lincoln. Enquanto não houver mudanças, o Brasil continuará nas últimas colocações em matéria de ensino. Ubirajara Assis São Paulo — SP >> COMPORTAMENTO Para algumas pessoas, a quarentena foi férias. Mas há aqueles que cumpriram as regras e, agora, de fato, não suportam mais � car entre quatro paredes. “As pessoas vão ao campo e às praias” (ISTOÉ 2633) Maria Elizabete Santos Rio do Janeiro – RJ Aguentamos o quanto pudemos e, se for preciso, vamos nos manter no isolamento e distanciamento social. Mas é impossível não sair um pouco para respirar. Luiza Darelli São Paulo – SP Na minha opinião, se todos os cuidados e as recomendações da Organização Mundial da Saúde forem respeitados não há risco para aqueles que cumprem o distanciamento e não aguentam mais. Gilson Hermann Kroe� Porto Alegre — RS LIVE Major Olímpio Gomes SENADOR DA REPÚBLICA 7.julho • Terça ÀS 15HORAS A ATUAÇÃO DO SENADO NO COMBATE AO CORONAVÍRUS. Tema Michel Temer EX-PRESIDENTE DA REPÚBLICA 7.julho • Terça ÀS 17H A POLÍTICA BRASILEIRA EM TEMPOS DE PANDEMIA. Tema Camilo Santana GOVERNADOR DO CEARÁ 10.julho • Sexta ÀS 15HORAS COMO OS GOVERNADORES ESTÃO ENFRENTANDO A COVID-19.Tema João Amoêdo FUNDADOR DO NOVO 10.julho • Sexta ÀS 17HORAS COMO A COVID-19 AFETA A POLÍTICA BRASILEIRA.Tema Assista em: Facebook: @revistaISTOE Instagram: revistaistoe Transmissão ao vivo e simultânea nas redes sociais Twitter: @RevistaISTOE YouTube: revistaISTOE anuncio_LIVE_istoe_Major_Temer_Camilo_Amoedo.indd 2 7/1/20 11:42 AM 10 ISTOÉ 2634 8/7/2020 Editorial A nova fábula inventada pelo governo é a de que ele agora roga pela pacificação. Quer a paz, o armistício, o entendimento. Com o Congresso, o Supremo, os indigenistas, médicos, professores, quem aparecer pela fren- te. Deixou de lado o tom beligerante, a arrogância voluptu- osa do “eu que mando”. A versão mal acochambrada do “Jairzinho paz e amor” — tal qual a embalagem marqueteira do demiurgo do agreste “lulinha...”, deixa prá lá, criminoso já encarcerado no passado — tem intento e razões de ser. O mandatário de quatro costados, seguro de si por se julgar sustentado pela caserna e pelas ruas, perdeu o chão. Não se vê mais como aquela cocada toda. Dos militares ouviuque seria bom (impositivo até) baixar o tom. Da plateia de eleito- res soube, espantado, não existir qualquer apoio a aventuras ditatoriais nessas paragens. Em pesquisa que calou seus ar- roubos, 75% dos entrevis- tados disseram-se a favor da democracia, 52% não gostam nada da presença fardada no poder político e a maioria absoluta abo- mina ímpetos golpistas. Acabou o assunto. E com ele os sonhos totalitários de um capitão reformado. Mas tem mais: Bolsonaro no Planalto, filhos, apani- guados, militantes, aliados, paus mandados e opera- dores estão, por várias frentes, acuados. O presidente em pessoa enfrenta ao menos duas investigações no Supremo. Os rebentos Flávio e Carlos, idem, na Justiça Federal do Rio. Amigos de longa data, presos ou sob suspeita. Financiadores de esquemas de fake news no “gabinete do ódio”, parlamen- tares engalanados que participaram das “rachadinhas”, a tropa de ministros ideológicos que aprontam e atrapalham, gerando prejuízos sonoros, a cumbuca inteira dos seguidores, passaram da condição de pedra à vidraça. Bolsonaro virou bonzinho, baixou a bola, porque está amargando consecuti- vas derrotas e, mais grave, sob sério risco de perder o cargo e a glória antes do tempo. Emite sinais de conciliação para remendar os estragos. E olha que não foram poucos. Na co- munidade internacional, Bolsonaro encontra no momento o ambiente mais adverso possível. Com riscos de perder até o maior aliado. Donald Trump, o ídolo indomável, a referência para tantas diabruras, que pode em alguns meses não estar mais lá na cadeira de homem mais poderoso da Terra. Corre O LOBO NA PELE DE “JAIRZINHO” séria ameaça de fracassar nas eleições por falhas, digamos, decibéis abaixo das praticadas pelo líder bananeiro da parte de cá das Américas. O mundo, no último final de semana, recebeu manifestações em dezenas de países e continentes com os dizeres “Stop Bolsonaro”. Há uma revolta generaliza- da em especial com o seu descaso pelas queimadas e desma- tamentos, que sangram a Amazônia. Ninguém deseja ou aguenta mais tamanha destruição e vai punir o Brasil, talvez como cúmplice, pelo disparate do seu chefe de Estado.Um grupo de 29 instituições financeiras, entre as maiores do planeta, responsáveis por nada menos que US$ 3,7 trilhões em recursos (ou o dobro do PIB nacional) emitiram uma carta ameaçando claramente retirar seus investimentos daqui caso o País siga subindo seus índices de afrontas ambientais. Já se sabe, o tema caiu para o último lugar na hierarquia de atenções do “mito”. Mas ele quer se redimir, tomar prumo. É o que alega. Na verdade, Bolsonaro está por alguns dias comporta- do, mas não se emenda. Nem acalente esperanças! Não é da natureza dele. Quem age, coloca panos quentes e se mexe no meio de campo é a entou- rage dos ministros e asses- sores conscientes. Bolso- naro fez o que era possível e estava ao alcance do seu limite: saiu de campo. Algumas semanas sem Jair e com o “Jairzinho Paz e Amor” atuando foram, no mínimo, pedagógicas. Uma ausência que preen- cheu uma lacuna. Sem o tom histriônico e desagregador do capitão, o País pôde finalmente cuidar do que interessa. O lobo ficou na toca e movimentações producentes, como a da negociação do czar Paulo Guedes com deputados para evoluir na pauta econômica, conseguiram ganhar prioridade. Sem o presidente irascível o País evoluiu melhor. Quem diria! A ausência bem vinda. No coração do poder reina, momenta- neamente, um comandante manietado, tutelado pelas forças militares, tolhido pelo descrédito junto aos demais poderes, ignorado por tantos disparates e imprudência. Não o imagine como vítima. Jamais! Está sim na posição de réu por malfei- tos em série. Alguém em quem não se pode confiar. Não apenas pelas mentiras que professa, mas pelos atos indomá- veis e inconsequentes que executa. O lobo ainda está ali, mas vestiu, por conveniência, a pele de Jairzinho. Carlos José Marques, diretor editorial Foto: reprodução 11 Entrevista 4 Cartas 8 Brasil Confidencial 18 Semana 20 Brasil 28 Comportamento 36 Economia 52 Em Cartaz 64 Última Palavra 66 30 62 Nº 2634 – 8 de julho 2020 ISTOE.COM.BR BRASIL Ascensão e queda de Carlos Alberto Decotelli, o homem que tentou ser ministro com currículo fake COMPORTAMENTO O Brasil sempre foi pioneiro na produção de diversas vacinas e essa tradição pode se repetir em relação ao coronavírus CULTURA Devido à Covid-19, o Mahler Festival, na Holanda, comemorando os 160 anos de nascimento do compositor erudito Gustav Mahler, terá de ser online CAPA Os militares tutelam o presidente Jair Bolsonaro na tentativa de salvar o governo 22 36 Você também pode ler ISTOÉ baixando a edição em seu Smartphone e tablet CAPA: Foto: AdrIANo MACHAdo/reuterS FotoS edItorIAIS: ANderSoN prAdo; WALLACe MArtINS/FuturA preSS/FoLHApreSS; dIVuLGAção/FIo CruZ; AFp Sumário 12 Artigos ISTOÉ 2634 8/7/2020 por Felipe Machado amoso por suas garras, patas, carapaça, carne saborosa, sabe-se, agora, que o caranguejo inspira um plano de governo. Uma de suas características mais intrigantes está na troca da carapaça, quando já gasta, que o protege contra dos predadores, tal quando chafurda na lama dos manguezais ou se hospeda em conchas vazias. Anda para frente, para trás e velozmente para ambos os lados, com suas dez patas (duas da frente com garras defensivas), um crustáceo com duas hastes e seus olhos atentos e desconfiados. O governante nele se inspirando, em campanha, vem com a primeira carapaça e se exibe, com promessas e planos, quando eleito os coloca em prática. Monta um qualificado ministério e de bandeja, aprova uma esperada legislação aos inativos. Dá um enorme passo à frente! De repente, por ciumeira desmedida, imaginando que alguns de seus auxiliares estão invadindo seu objetivo (que em campanha não era), ao invés de exaltar suas escolhas, despe a primeira carapaça. Com a segunda, demite os bons, um dos grandes avalistas de seu governo e outro com competência para u sinceramente gostaria de saber detalhes sobre o Departamento de Recursos Humanos do Palácio do Planalto. Quem são? Como vivem? Do que se alimentam? E, principalmente, como é o processo de seleção para trabalhar no governo federal? Não, não estou pensando em enviar meu currículo. Quero mesmo é descobrir como, entre tantos brasileiros capacitados, essa turma consegue contratar tanta gente ruim. Parece piada, mas não é. Acredito sinceramente que eles fazem uma lista dos melhores candidatos, os mais preparados, os mais inteligentes. E depois viram a lista de cabeça para baixo, para então começar as sondagens. Prometeram ao País um ministério técnico; em vez disso, recebemos um ministério tétrico. O caso do último ministro da Educação — que foi sem ter sido — é a mais nova prova do inegável talento que o RH do governo tem para contratar pessoas erradas. Um funcionário bem educado poderia ter avisado delicadamente o senhor Decotelli que mentir no currículo é falta de educação. O presidente Bolsonaro já se gabou que tem um sistema de informação particular que funciona muito bem. Não tenho certeza, mas talvez a checagem de um currículo seja uma tarefa muito complexa para eles. É sempre bom lembrar que o RH do governo já havia dado a sua contribuição para o empobrecimento intelectual do País com a escolha dos dois ministros E F anteriores, Ricardo Vélez Rodríguez e Abraham Weintraub. Sabemos que serão apenas rodapés esquecidos nos livros de história, se muito, mas o estrago que fizeram dentro e fora das salas de aula afetará o País por muito tempo. Decotelli é, no máximo, apenas mais um personagem a esquecer. Esse talento (ao contrário) para contratações não acontece apenas na Educação. Nunca na história desse País foi tão essencial ter um ministro da Saúde competente. O atual parece conhecer tanto a sua pasta quanto eu entendo de física astroquântica (não entendonada). Entre os nomes dos quais já nos livramos, meu favorito foi o secretário da Cultura que achava que era o nazista Joseph Goebbels. Inesquecível. O RH do governo criou um critério de contratação bastante original: quanto mais o candidato entende do assunto, maior será a chance de ser descartado; quanto menor for sua noção sobre o tema, mais alto será o seu cargo. Vejam o presidente da Embratur, por exemplo. Sua fluência em inglês deixaria Joel Santana envergonhado. Seu currículo, no entanto, tinha um elemento essencial para o cargo: ele sabe tocar sanfona. Alguém sabe me dizer se existe impeachment para diretor de RH? o belo Departamento De rH Do planalto o plano CaranGUeJo De GoVerno Monta um qualificado ministério e, de bandeja, aprova uma esperada legislação aos inativos. Dá um enorme passo à frente! Prometeram ao País um ministério técnico. Em vez disso, recebemos um ministério tétrico por Dilermando Cigagna Júnior A seguir: Germano Oliveira, Antonio Carlos Prado, Vicente Vilardaga, Marcos Strecker 13 A seguir: Marco Antonio Villa por Cristiano Noronha As opiniões dos colunistas não necessariamente refletem a posição da revista esde março, o Brasil parou por conta da pandemia do novo coronavírus. Chegamos ao mês de julho. Estamos entrando no quarto mês da batalha contra a Covid-19 e uma série de questões continuam sem resposta. A mais importante de todas é sobre quando teremos uma vacina. Há informações de que em a fase de ensaios clínicos já está iniciando. Quanto tempo esse processo poderá levar? Não se sabe. A imprevisibilidade trazida pela pandemia também ronda nossa economia e as contas públicas dos governos federal, estaduais e municipais. O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, estima que o PIB do Brasil este ano sofra uma queda de 6,4. Mas, considerando alguns indicadores econômicos, ele enxerga um possível “viés de melhora”. O mercado tem uma expectativa semelhante. De acordo com a última pesquisa Focus (feita pelo Banco Central com o mercado financeiro), as projeções indicam uma retração de 6,54%. Bem mais pessimistas são as previsões do Banco Mundial (-8%) e do Fundo Monetário Internacional (-9,1%). Sabe-se que o déficit na Previdência deve se agravar, embora seja difícil precisar seu tamanho. Em março, o governo fazia um cálculo de R$ 241 bilhões. Em maio, reavaliou para cima: R$ 276,5 bilhões. Já a Instituição Fiscal Independente (IFI) do Senado Federal projeta R$ 306,2 bilhões. O secretário do Tesouro, Mansueto Almeida, alerta que o déficit primário do setor público pode chegar a R$ 850 bilhões, ou 11,5% do PIB. O Brasil sairá da pandemia com dívida bruta acima de 95% do PIB, o que é elevado para países emergentes. Não sabemos quantas empresas conseguirão sobreviver à crise. Os pedidos de recuperação judicial e de falência estão crescendo e atingem principalmente as pequenas e as microempresas. Vale ressaltar que elas são responsáveis por mais de 72% dos empregos no país. A Associação Brasileira de Bares e Restaurantes acredita que o número de falências no setor será alto mesmo após o fim da quarentena, já que milhares de trabalhadores perderão o emprego e continuarão cautelosos. Outra dimensão preocupante é o desemprego. De acordo com o IFI, podemos chegar ao fim do ano com 14,2% de desempregados, em um cenário otimista. Mas o índice pode atingir 15,3%. De acordo com o IBGE, fechamos 2019 em 11,9%. A boa notícia é que para 2021 as previsões apontam para um crescimento do PIB de 3,5%. Havendo crescimento, poderemos recuperar parte dos empregos perdidos. Para tanto, o Congresso Nacional precisa continuar empenhado na agenda de reformas estruturais com o objetivo de reduzir o déficit das contas públicas e melhorar o ambiente de negócios. Sem essa agenda, a recuperação será ainda mais lenta e sacrificante para a população. E nosso futuro ficará ainda mais incerto. enfrentar momento grave, a favor do povo; os substitui por quem o obedeça cegamente, onipotência afastada pelos demitidos. Deu dois péssimos passos para trás. Seguindo o plano do caranguejo, se despe da segunda carapaça, com a terceira, anda velozmente de um lado para outro, trazendo mais companheiros de outrora, para qualquer cargo. Outros novos amigos, dentre eles dois irmãos, um seu vizinho e o outro um ministro, sem educação, que tombou tarde e zarpou para a América. Deu, então, incontáveis passos para os lados! Confia cegamente em três conchas protetoras e numeradas de um a três, em clara troca de proteções, já que também as protege. Confia em uma concha maior, só vista nos Estados Unidos, peça que não compartilha com nada à sua esquerda! Põe ministro, tira ministro a pedido, sem pedido, decreta, revoga o decreto, demite, altera a data da demissão, se irrita só de ver um jornal, mas adora mandar mensagens, lança um audacioso plano, que não saiu do papel, põe máscara, tira máscara, fica calmo e logo esbraveja, briga com poderosos de outros poderes, faz as pazes e briga novamente, a conhecida “dança do caranguejo”. Quarta carapaça: vendo as três conchas trincar, chama a seu lado seus inimigos (que dizia também o serem do povo) caminha trôpego, se enterra cada vez mais! O que o plano do caranguejo não previa, é que com estas idas e vindas, desnorteado, despreparado, inseguro, frágil, pode cair, entrar em fervura ou na panela de pressão, até perder seu poder. Pior, depois disso, suas patas (apreciadas pelos glutões), podem ser quebradas a martelo, sem precisar de foice. D nUVem De inCertezas Podemos chegar ao fim do ano com 14,2% de desempregados, em um cenário otimista, mas o índice pode atingir 15,3%. Em 2019, fechamos em 11,9% por Dilermando Cigagna Júnior A seguir: José Manuel Diogo, Ricardo Amorim, Bolívar Lamounier, Luiz Fernando Amaral, José Vicente “Eduardo quEr dErrubar sEu pai, Jair bolsonaro, para concorrEr às ElEiçõEs prEsidEnciais dE 2022” Janaína Paschoal, deputada estadual em São Paulo “o Brasil vive hoJe um colaPso. voltamos à idade média. a tragédia só aumenta, o aBandono é geral e o Panorama é de terror” milton nascimento, cantor e compositor “Há uma rElação disfuncional EntrE Estados unidos, cHina E rússia quE impEdE uma rEsposta comum à pandEmia” antonio guterres, secretário-geral da ONU “a américa latina lEvará três ou quatro anos para rEcupErar o pib antErior à pandEmia” eric Parrado, economista-chefe do Banco interamericano de desenvolvimento “O que eu mais querO é me sentir cOnfOrtável. sintO falta de sair livre e em segurança pelas ruas” Paola oliveira, atriz Frases fotos: image press agency/afp; michael tewelde/afp; reprodução instagram “infelizmente os estados unidos não seguem regras que eles mesmos criaram” hossein ghariBi, embaixador da república islâmica do irã no Brasil, sobre a violação americana da resolução do conselho de segurança da onu “As vozes estão surgindo agora. Vejo isso com a esperança de que conseguiremos uma grande conquista” naomi camPBell, modelo, ao falar das novas oportunidades de empregos para pessoas negras em todos os setores da sociedade 14 por Mariana Ferrari istoé 2634 8/7/2020 LIVE Fernando Cirne CEO DA LOCAWEB 6.julho • Segunda ÀS 17HORAS A TRANSFORMAÇÃO DIGITAL DAS PEQUENAS E MÉDIAS EMPRESAS.Tema Juliano Ohta CEO DA TELHANORTE 9.julho • Quinta ÀS 16HORAS O AQUECIMENTO DO SETOR DE MATERIAIS DE CONSTRUÇÃO. Tema Transmissão ao vivo e simultânea nas redes sociais Assista em: Facebook: @istoedinheiro Instagram: revistaistoedinheiro Twitter: @RevistaDinheiro YouTube: Istoé Dinheiro anuncio_LIVE_dinh_Fernando Cirne_Juliano Ohta.indd 1 6/29/20 6:21 PM Frases “Se a Terra adoecer nós adoecemos juntos. Não seremos saudáveis com o planeta todo quebrado” ailton KrenaK, liderança indígena e escritor “a imagEm do paísEstá muito Exposta no ExtErior, porquE os próprios brasilEiros falam mal da nação” Paulo guedes, ministro da Economia “Uma coisa é certa: a gestão de Carlos Alberto Decotelli no Ministério da Educação de Bolsonaro foi muito melhor que a Abraham Weintraub” fáBio lePique, secretário executivo da Prefeitura de São Paulo. Decotelli ficou cinco dias como ministro, mas sequer entrou em seu gabinete porque não lhe foi dada a posse “O bOicOte aO FacebOOk cOntamina a discussãO dO prOjetO de lei sObre Fake news” orlando silva, deputado federal, sobre a saída de empresas que patrocinavam essa rede social, após publicações falsas não serem bloqueadas “vou falar soBre a minha traJetória e, PrinciPalmente, a minha relação com o sistema Policial no País” érico Brás, ator, que lança um novo livro no qual conta histórias pessoais de racismo e opressão “NuNca tivemos um lugar de respeito” valentina samPaio, modelo, sobre a situação da mulher trans no Brasil nãO deveria ser um debate O usO de máscaras” Jennifer aniston, atriz, ao pedir conscientização nos cuidados contra o coronavírus “é Preciso distinguir manifestações PróPrias da liBerdade de exPressão com crimes de calúnia, inJúria, difamação, ameaça, organização criminoso e delitos” augusto aras , procurador-geral da República, sobre os ataques ao STF fotos: xavier collin/image press agency/nurphoto/afp; reprodução instagram; divulgação16 por Mariana Ferrari istoé 2634 8/7/2020 A Agência Nacional do Petróleo (ANP) determinou novos padrões de qualidade para o combustível, a partir de agosto. Com isso, passa a ser obrigatória a comercialização de uma nova gasolina brasileira com mais energia e menos consumo. Porém, como uma refinaria à frente do tempo, temos orgulho de já estar produzindo e abastecendo, hoje, todos os nossos clientes com esta nova gasolina. E, ao contrário do que planeja o concorrente, não cobramos e nem cobraremos nada a mais ou a menos por isso. Porque, para a gente, oferecer mais qualidade com preço justo não é novidade. É só mais uma prova de que a nossa fórmula sempre funcionou muito bem. Na Refit ela já chegou. E, ao contrário do concorrente, não cobramos nada a mais por isso. • • refit.com.brrefit.refinaria RefitRefinaria ISTOÉ SIMPLES 20,2x26,6.indd 1ISTOÉ SIMPLES 20,2x26,6.indd 1 01/07/20 14:2401/07/20 14:24 por Germano Oliveira Colaborou: Marcos Strecker ISTOÉ 2634 8/7/202018 Brasil Confidencial ligações perigosas Um desembargador muito suspeito A Operação Favorito, que prendeu vários empresários ligados à área da Saúde do Rio de Janeiro, jogou luz sobre um empresário que ainda vai dar dor de cabeça ao governador Wilson Witzel, ao prefeito Marcelo Crivella e ao desembargador Paulo Rangel, do TJ-RJ. Trata-se de Leandro Braga Sousa. Ele é dono da LP Farma Comércio de Produtos Hospitalares e vendeu equipamentos superfaturados para as UPAs do Rio, comandando um esquema criminoso para desviar dinheiro público do governo fluminense. É também proprietário da LPS Corretora de Seguros, empresa envolvida num escândalo de desvios no Instituto Estadual do Ambiente (Inea) e que chegou a ter o desembargador Rangel como sócio. Leandro é o elo entre as três autoridades que podem ficar em maus lençóis por causa dele. O desembargador Paulo rangel deve ser investigado pelo Conselho Nacional de Justiça por ter beneficiado o senador Flávio no caso das rachadinhas. Contrariando decisões do sTF, favoreceu o filho do presidente, tirando-lhe das mãos do juiz Flávio itabaiana. rangel é investigado pelo CNJ por outra irregularidade: associação com o empresário leandro Braga sousa na lPs, a empresa suspeita de desvios no rio. Triângulo Leandro tornou-se amigo de Witzel por ser motorista do TJ-RJ. Quando Witzel assumiu o governo, Leandro indicou Claudio Dutra para a presidência do Instituto Estadual do Ambiente (Inea). Com a influência, Leandro resolvia problemas das empresas que tinham negócios com o Inea e depois sua corretora de seguros, a LPS, fechava contratos com elas. Novelo O MP está agora seguindo o fio da meada. Vai identificar quais são as empresas com quem a LPS de Leandro fazia negócios, cruzando com os contratos que elas mantinham com o Inea. Outra ligação investigada é uma sociedade de Leandro de Sousa com Maressa Crivella, nora do prefeito Marcelo Crivella. Queriam montar um banco digital para evangélicos. * O Hospital Albert Eins- tein desaconselha seus médicos a prescreve- rem a cloroquina. Diz que ela pode até matar o paciente. Mas Bolso- naro acha que o remé- dio é milagroso. Será por isso que 54% das pessoas ouvidas pelo Datafolha o consideram pouco inteligente? * Pior é o mico do Exér- cito. Seguindo as or- dens de Bolsonaro, o laboratório do Exército produziu 1,8 milhão de comprimidos de cloro- quina, o que represen- ta 18 vezes sua produ- ção anual. O que fazer com o estoque? * O aplicativo da Caixa para pagamento do be- nefício emergencial de R$ 600 é tão frágil que os falsários invadiram as contas de 100 mil pesso- as e sacaram os créditos, com um prejuízo de R$ 60 milhões. Nada funcio- na com Bolsonaro. * O novo ministro das Comunicações, Fábio Faria, quer sanear a Em- presa Brasil de Comu- nicação (EBC) antes de privatizá-la: vai contra- tar uma empresa de consultoria para redu- ção de custos. O déficit é de R$ 87 milhões. Rápidas fotos: Dikran Junior/futura Press; reProDução pResos As relações de Leandro de Sousa (no destaque) com Witzel e Crivella podem ser explosivas ReTRaTo FaLado ToMa Lá dá Cá Um novo sTF FALTANDO DOIS MESES PARA ASSUMIR A PRESIDÊNCIA DO STF, O MINISTRO LUIZ FUX ESTÁ MOSTRANDO QUE SUA GESTÃO À FRENTE DA CORTE SERÁ MARCADA PELO DIÁLOGO. ELE JÁ ESTÁ CONVERSANDO COM MILITARES E MINISTROS DO GOVERNO BOLSONARO PARA ACABAR COM A TENSÃO ENTRE OS PODERES. FUX ASSUMIRÁ NO DIA 10 DE SETEMBRO. Batendo um bolão O ministro Gilmar Mendes, do STF, surpreendeu um grupo de juristas alemães que participavam de uma live com ele ao dizer que havia sido colega do rei do futebol Edson Arantes do Nascimento, o Pelé. Os juristas quiseram saber se Mendes jogou futebol com ele, mas o juiz do Supremo foi logo avisando: “Fomos colegas de ministério no governo de FHC”. Direitos já Inspirado no movimento das Diretas Já, de 1984, o sociólogo Fernando Guimarães criou o “Direitos Já”, que realizou na sexta-feira, 26, um ato virtual em defesa da democracia, com a participação, em uma live, dos políticos mais infl uentes do País: Fernando Henrique Cardoso, Ciro Gomes, Fernando Haddad, Marina Silva e Luciano Huck, Faltou consenso Algumas outras personalidades importantes foram convidadas a participar, chegaram a concordar em apoiar o ato, mas desistiram às vésperas do evento. Foi o caso dos ex-presidentes Michel Temer e José Sarney, assim como do ministro Dias Toff oli, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF). JOICE HASSELMANN, DEPUTADA a senhora já foi amiga íntima do presidente Bolsonaro. por que rompeu com ele? Bolsonaro é um estelionato eleitoral. Ele é uma farsa. Prometeu acabar com a corrupção e provocou a demissão do Moro, que combatia o crime organizado. por que a senhora diz isso? O presidente é um burrão e grosso. Ele traiu o povo brasileiro. Sempre se cercou dos piores, desde a campanha. Basta ver que o Queiroz é seu amigo há 40 anos. Foi ele quem o indicou para o filho Flávio contratá-lo no gabinete de deputado. a senhora acha que ele deseja um retrocesso institucional? O sonho do Bolsonaro é dar o golpe. Ele tem um ato institucional pronto na gaveta. Todos os ministros sabem disso. Ele fala para todo mundo no governo. A ex-diretora de Privatizações do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) no governo de Fernando Henrique Cardoso, Elena Landau, disseem live na ISTOÉ na sexta-feira, 26, que “o governo Bolsonaro é uma calamidade, o pior do mundo” e que o ministro Paulo Guedes “não tem um programa econômico para sair da crise”. Ela acha que “o presidente não tem equilíbrio emocional para sentar na cadeira presidencial”. Para ela, o governo Bolsonaro acabou. “Paulo Guedes é um folclore, ninguém mais acredita nele” entre outros. Todos eles fazem oposição a Bolsonaro e estão apreensivos com as ameaças do presidente da República ao regime democrático, sobretudo por ele participar ostensivamente de protestos de seus aliados pedindo o fechamento do Congresso e do Supremo Tribunal Federal (STF), além de intervenção militar e a criação de um novo AI-5. apita o árbitro Essa não é a única história envolvendo Gilmar Mendes e o futebol. Santista roxo, marcou com Pelé de assistir à fi nal pela Libertadores entre o Santos e o Peñarol no Pacaembu, dia 22 de junho de 2011. Como era relator de matéria em discussão no STF, e a hora de pegar o voo para São Paulo se aproximava, suspendeu a sessão e foi para o aeroporto. fotos: kariMe XaVier/foLHaPress; CÂMara Dos DePutaDos; DiVuLGação/sCo/stf brasileiro. Sempre se cercou dos piores, desde a campanha. Basta ver que o Queiroz é seu amigo há 40 anos. Foi ele quem o indicou para o filho Flávio contratá-lo no institucional pronto na gaveta. disso. Ele fala para todo mundo 19 20 Semana ISTOÉ 2634 8/7/2020 por Antonio Carlos Prado e Mariana Ferrari Mortes e destruição na região do sul do País Um ciclone com rajadas de vento que oscilaram entre cento e trinta e cento e quarenta quilômetros por hora causaram pelo menos quinze mortes e deixaram pessoas de- saparecidas na região sul do País. Os dados foram divulgados na quinta-feira 2 pela Defesa Civil do Rio Grande do Sul, San- ta Catarina e Paraná, os três estados mais atingidos. O fenôme- no climático provou também a queda de árvores, de fios de alta tensão e de casas, e deixou cerca de vinte e três cidades CLIMA PESQUISA CresCe o Medo. MAs As PessoAs sAeM de CAsA Aumentou no Brasil o medo da contaminação pelo coronavírus. Agora, o paradoxo: encolheu a parcela das pessoas que declaram cumprir à risca a quarentena. Dados de pesquisa Datafolha: fotos: divulgação/secom/prefeitura de chapecó; alice vergueiro/folhapress; divulgação sem energia elétrica. Aproximadamente mil e trezentas pes- soas estão desabrigadas. Em Santa Catarina, mais de mil bombeiros atenderam mil e seiscentas ocorrências causadas pelo “ciclone bomba”, como vem sendo chamado, e na quata- feira 1 não se descartava o alerta de que ele chegaria à região sul — embora com ventos em menor velocidade. Frequentes nessa época do ano, ciclones desse tipo ocorrem quando uma frente fria se associa a um núcleo de baixa pressão — tanto que desde o domingo 28 avisos de ventanias e temporais vinham sendo enviados pela Marinha, destacando o risco de ondas marítimas ultrapassarem onze metros de altura. “Ciclone bomba”, cientificamente classificado pelos meteorologistas como “ciclone extratropical”, é aquele em que acontece uma acentuada queda de pressão atmosférica em um curto espaço de tempo — geralmente vinte e quatro horas. Essa brusca al- teração o torna extremamente destrutivo e perigoso. Em junho chegou a 47% o índice de brasileiros que afirmam ter muito medo do vírus O medo é maior entre as mulheres (53%) que entre os homens (41%) Ainda assim, caiu de 21% para 12% a porção de pessoas que diz sair de casa somente para o essencialmente necessário o que é “Ciclone bomba” Cientificamente classificado pelos meteorologistas como ciclone extratropical, o “ciclone bomba”é aquele em que ocorreu uma acentuada queda de pressão atmosférica em um curto espaço de tempo — geralmente vinte e quatro horas devAstAção Telhados e postes foram arrastados pelo vento: estado de emergência em Santa Catarina 21 nEgócIoS reinvenção de sucesso Quando a mudança na rotina é brusca demais há duas possibilidades: estagnar ou reinventar. Se grande parte dos empresários se fixasse na primeira opção, novos produtos ficariam para depois. Esse não foi o caso da arquiteta Claudia Taitelbaum, CEO da Exhimia, empresa especializada na estruturação de eventos. Na pandemia, ela tornou-se uma das mais atuantes no combate ao coronavírus. “Eu precisava me movimentar, senão ficaríamos para trás”, diz Claudia. Assim, a Exhimia deixou os eventos e passou a trilhar os negócios na produção de máscaras com protetores faciais — essenciais para a prevenção da Covid-19 — e transformou-se em referência no mercado. O site, reformulado em poucos dias, chamou a atenção do público e as vendas dispararam. “Na contramão de outras empresas, eu não demiti ninguém. Pelo contrário, contratamos novos funcionários”, diz a arquiteta. Em um mês de vendas as máscaras passaram a representar 72% do rendimento total da Exhimia, e o papel social não foi deixado de lado. Em três meses, mais de 30 mil máscaras foram doadas. Lema de Claudia: olhar o próximo com criatividade, carinho e atenção. BRASIL dezessete mil mortos receberam auxílio emergencial Inacreditável: em meio à pandemia e com milhões de desempregados no País, os R$ 600 de auxílio emergencial do governo federal foram parar nas mãos de 17 mil mortos — ou seja, 17 mil pessoas vivas e muito desonestas, receberam o recurso. A conclusão é da primeira auditoria do Tribunal de Contas da União, divulgada na quarta-feira 1. O que se deu aos mortos gira em torno de R$ 11 milhões. O montante envolvendo os pagamentos com cambalachos é de R$ 427,3 milhões (até abril). O auxílio emergencial foi prorrogado por mais dois meses (o governo não divulgou calendário). Durante a pandemia eles ascenderam. Tornaram-se parte dos serviços essenciais. Os entregadores não só pipocaram, como mais do que triplicaram em todo o País: peças fundamentais para o funcionamento da engrenagem dos aplicativos de entrega (Rappi, iFood e Uber Eats). Na quarta-feira 1 eles tomaram ruas e avenidas brasileiras na primeira paralisação da categoria. Pediam que seus direitos fossem respeitados (sejam eles físicos ou trabalhistas) e recursos para higiene pessoal. Afinal, eles comem em cima das motos, são obrigados a trabalhar aos fins de semana — caso contrário o acesso ao aplicativo é cancelado — e não recebem kits de limpeza. Em contrapartida, as empresas dizem que asseguram esses direitos. Os motoboys pararam uma vez, mas, agora, se não respeitados, eles falam que as ruas serão tomadas, novamente, pelo comboio de motos. Para traduzir o seu apoio a luta contra o racismo, a Mercedes correrá a temporada de Fórmula 1 desse ano com seus carros pintados de preto. Em nota, a equipe informou na semana passada: “vamos competir de preto, expressando o nosso compromisso público de incentivo à diversidade e de contrariedade à discriminação velocidade contra o preconceito DIREIToS cIVIS Greve em duas rodas 620 mil Benefícios, ao todo, foram pagos indevidamente, muitos deles a militares. O rombo soma R$ 427,3 milhões são PAuLo Paralisação dos entregadores de aplicativos: trabalhadores essenciais na pandemia 22 ISTOÉ 2634 8/7/2020 DERROTADO Bolsonaro muda a rota do governo diante das investigações do STF e das crises graves na saúde e na economia. Prisão de Queiroz foi a gota d’água 23 Capa/Governo ricórdia para mudar o humor presidencial, no entanto, foi a prisão de Fabrício Queiroz, amigo de décadas de Bolsonaro e ex-assessor de seu filho Flávio. Ele é acusado pelo Minis- tério Público do Rio de ser o operador de um esquema de rachadinhas liderado pelo filho na Assembleia fluminense. O escândalo, que inclui o envolvimento com milícias, levou a crise para dentro do Palácio do Planalto. Isso abateu Bolso- naro mais que qualquer adversidade enfrentada desde o início do governo. Para proteger oclã e preservar seu mandato, o presidente mudou sua estragégia. Acabaram suas aparições diárias no “cercadinho” do Palácio do Alvorada, que geravam crises diá- rias. Foi uma recomendação dos militares palacianos. A ala fardada passou a mandar mais, e o núcleo ideológico, próximo dos filhos, perdeu protagonismo. Um exemplo desse movi- os últimos dias, o Brasil está conhecen- do um novo presidente. Confrontado com as ameaças crescentes ao seu go- verno, Jair Bolsonaro não ataca mais a imprensa, não participa de atos golpis- tas, prega a harmonia com o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Congresso e demonstrou até compaixão com as vítimas da Covid-19 em uma live bizarra que incluiu o presi- dente da Embratur como sanfoneiro. O cerco se fecha a partir dos vários inquéritos que assolam o presidente, sua família e colaboradores no STF: Fake News, atos antidemo- cráticos e interferência na Polícia Federal (PF). Os extremistas que rondavam a praça dos Três Poderes pregando o fecha- mento do Congresso e do STF foram presos. O tiro de mise- foto: Mateus bonoMi/agif/afp N Para salvar seu governo, Jair Bolsonaro conteve a ala ideológica, passou a ser tutelado pelos militares e tenta se conciliar com o STF e o Congres- so. A nova estratégia inclui uma agenda de inaugurações e a transfor- mação do Bolsa Família em uma marca própria. A mudança vem após vários reveses: a prisão de Queiroz, os inquéritos no STF que ameaçam sua família, a pandemia e a recessão. Eles fortalecem movimentos pró- democracia, como o Stop Bolsonaro, que aconteceu no dia 28 em cerca de 60 cidade e 26 países e mobilizou as redes sociais. Bolsonaro AcuADO Marcos Strecker 24 ISTOÉ 2634 8/7/2020 mento é a escolha do novo ministro da Educação, que passou por critérios mais técnicos e menos doutrinários, apesar da desastrada indicação avalizada pelos militares de um ex-ofi cial da Marinha que nem esse título tinha. Outro exemplo é a pressão pela demissão dos dois ministros ideológicos que têm causado os maiores estragos na relação com investidores e parceiros comerciais: Ernesto Araújo (Itamaraty) e Ricardo Salles (Meio Ambiente). O plano é minimizar as acusações criminais e criar uma agenda positiva, imprimindo uma marca realizadora. Bolsonaro planeja recuperar a popularidade com inaugurações, que estão sendo discutidas com aliados políticos e deputados do Centrão. Uma lista com 30 rodovias, viadutos, estradas pavimentadas e pontes restauradas está sendo pre- parada pelo ministro Tarcísio Freitas (Infraestrutura). A inau- guração de um trecho da transposição do rio São Francisco no Ceará, no dia 26, já fez parte desse roteiro. Ao criar essa agenda positiva, Bolsonaro lembrou o mo- mento mais delicado do governo Lula, em meio ao escânda- lo do Mensalão. Nas cordas e com a popularidade em queda, o ex-presidente tentou desviar a atenção do primeiro mega- escândalo de corrupção da era petista. Apostou suas fi chas no Bolsa Família e criou o Programa de Aceleração do Cres- cimento (PAC), que tentou embrulhar várias obras de infra- estrutura com um discurso triunfal e uma roupagem desen- volvimentista. O resultado foram centenas de obras paradas, dívidas acumuladas e mais corrupção, como se sabe. Mas Lula conseguiu recuperar a popularidade e usou o PAC para eleger a sucessora, Dilma Rousseff . Outro pilar de sustentação também segue a cartilha petista. Será o Renda Brasil, progra- ma que deve incorporar o Bolsa Família e benefícios como o nOvA AGEnDA Inauguração no Ceará de trecho da transposição do rio São Francisco, no dia 26, repetiu a estratégia de Lula e mirou regiões em que Bolsonaro é fraco: o Norte e o Nordeste fotos: alan santos/pr; pedro ladeira/folHapress infogrÁfiCo: gerson nasCiMento OS PESADELOS DE BOLSONARO As várias frentes que tiram o sono do presidente inQuÉRiTO DAs fAKE nEWs No inquérito das Fake News, relatado no STF pelo ministro Alexandre de Moraes, a PF identificou Carlos Bolsonaro como um dos articuladores de um esquema criminoso de notícias falsas. É apontado como o mentor do chamado “gabinete do ódio”, instalado no Planalto. A PF também apura a participação do deputado federal Eduardo Bolsonaro lARAnJAl DE flÁviO A prisão de Fabrício Queiroz levou para o Planalto o escândalo das rachadinhas de Flávio Bolsonaro e a suspeita de ligação com milicianos. Uma filha de Queiroz é suspeita de ser ex-funcionária fantasma de Bolsonaro em seu gabinete na Câmara. Investigado por ligação com milicianos, Queiroz é amigo de 30 anos do presidente ATOs AnTiDEmOcRÁTicOs Após manifestações que pediam o fechamento do Congresso e a intervenção militar, o ministro Alexandre de Moraes do STF mandou instaurar investigação. Apoiadores de Bolsonaro, incluindo deputados e empresários, foram alvos de busca e apreensão, e integrantes de grupo que fez protestos foram presos inTERfERÊnciA nA Pf Aberto a pedido da PGR, um inquérito da PF investiga a tentativa de interferência de Bolsonaro na corporação. O presidente tentou nomear para a direção-geral Alexandre Ramagem, próximo da sua família, mas o ministro Alexandre de Moraes suspendeu a indicação. A suspeita de interferência na PF foi levantada por Sergio Moro Capa/Governo 25 abono salarial e o seguro-defeso. O caminho foi apontado pelo auxílio emergencial preparado às pressas na pandemia, de R$ 600 mensais. Ele acaba de ser estendido porque o presidente percebeu o seu potencial político. Agora, Bolso- naro quer criar o seu próprio Bolsa Família. Além de dar uma face social ao governo, o programa pode dar frutos eleitorais exatamente na região em que o bolsonarismo é mais fraco e o petismo ainda impera — no Nordeste e no Norte. Os miliTAREs E O cEnTRÃO O terceiro suporte do novo governo é o Centrão. A corrida pelo apoio desses partidos fi siológicos e sedentos de cargos tem se acelerado sob a coordenação do general Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo). Também sinalizando com uma distensão, Ramos, que era o único militar da ativa entre os ministros palacianos, anunciou que passará à reserva. Com isso, diminui o fantasma da interferência do Exército, sem contar a ameaça de um golpe, feita várias vezes pelo presi- dente, de forma não muito velada. “Os militares já devem estar refl etindo sobre a vantagem de continuar ou não no governo. Demoraram muito para limpar seu nome, saíram de forma desgastada da ditadura. Se as evidências compro- varem o conhecimento do presidente sobre as falcatruas do fi lho, a probabilidade maior é Bolsonaro ser abandonado por eles”, afi rma o cientista político Carlos Pereira, da FGV. Essa mudança de rota era previsível, segundo Pereira. Ele acha que a estratégia do confronto com o Congresso e as instituições, inclusive com a imprensa, só poderia gerar benefícios no curto prazo. Há uma extensa literatura políti- ca sobre o assunto nos EUA. No decorrer do tempo, esse BAnDEiRA BRAncA Bolsonaro anuncia a prorrogação do auxílio emergencial, que vai se incorporar ao Bolsa Família, e faz um gesto de conciliação a Rodrigo Maia (esq.) e Davi Alcolumbre PAnDEmiA Com cerca de 1,5 milhão de contaminados e mais de 60 mil óbitos, o Brasil virou um dos principais focos da Covid-19 no mundo. Bolsonaro atacou o isolamento social, criticou os governadores e prefeitos, mandou o Exército distribuir cloroquina, uma droga já descartada em vários países, e forçou a saída de dois ministros da Saúde. O Ministério está sem titular desde 15 de maio cRisE EcOnÔmicA O Brasil entrou em recessão no primeiro trimestre deste ano, segundo a FGV. O Ministério da Economia acha que o PIB em 2020 vai cair 4,7%. O FMI acha que o tombo será de 9,1%. A pandemia aniquilou 7,8 milhões de postos de trabalho e, pela primeira vez, menos da metade das pessoas em idade para trabalhar está empregada. O governo vai ter dificuldades para tirar o País da crise QuEimADAs nA AmAZÔniA O Ministério do Meio Ambiente relaxou a fiscalização e a escalada dasqueimadas em 2019 virou notícia no mundo. Este ano, a Amazônia já tem as três primeiras semanas de junho com maior números de focos de incêndio desde 2007. A crise afugenta os investidores e ameaça o acordo Mercosul- União Europeia imAGEm inTERnAciOnAl A pandemia, a questão ambiental e a ameaça à democracia levaram Bolsonaro para os jornais internacionais, como o “New York Times”. O “Washington Post” elegeu Bolsonaro como o pior líder a tratar com a pandemia. Artigo do “Financial Times” diz que “ o populismo está levando o Brasil ao desastre” 26 ISTOÉ 2634 8/7/2020 Capa/Governo método de ação só poderia gerar passivos, animosidades e ressentimentos. “Bolsonaro viu o tamanho da conta, que ameaça sua própria sobrevivência. De uma forma tardia, buscou apoio junto ao Centrão. Mas fez isso de uma forma frágil, para se salvar do impeachment. Queiroz sinaliza mui- ta vulnerabilidade. O presidente está fraco e precisa do su- porte do Congresso”, diz. O presidente reuniu uma base de apoio de cerca de 30% da população por meio de um dis- curso radical, polarizado. Só que ao fazer isso se desgastou com as instituições. Para diminuir a tensão, buscou uma coalizão. Mas, com as investigações avançando, esse roteiro pode ser acidentado. Vai ser difícil manter o apoio da socie- dade e do Congresso, e o Centrão vai aumentar a fatura pelo apoio. Há uma tempestade perfeita se formando. Além da crise de saúde com a pandemia, que já provocou mais de 60 mil óbitos e 1,5 milhão de infectados, a crise econômica vai cobrar um preço enorme para a sociedade. “Bolsonaro tenta sobreviver em uma situa- ção gravíssima”, afirma Pereira. A nova fase do governo pode ainda deri- var para o populismo econômico e compro- meter o ajuste fiscal. O teto de gastos, aprovado no governo Michel Temer, que tem garantido os juros baixos e discipli- nado a inflação, está na mira daqueles que tentam reviver a expansão via gastos públicos — como a ala militar do gover- no, que já tentou emplacar o Pró-Brasil, uma nova versão do PAC. O País entrou em recessão no primeiro trimestre deste ano, segundo a FGV, e ela pode ser a maior da história. O Ministério da Economia acha que o PIB vai cair 4,7% em 2020. O FMI estima que o tombo será de 9,1%. A pandemia aniqui- lou 7,8 milhões de postos de trabalho e, pela primeira vez, menos da metade das pessoas em idade para trabalhar está empregada, diz o IBGE. Com a dívida pública se aproximan- do de 100% do PIB, o governo vai ter dificuldades cada vez maiores para reativar a economia. Ao buscar a harmonia com os outros Poderes, o presiden- te tem se esforçado de uma forma inédita. A renovação do O ato Stop Bolsonaro ocorreu em 26 países. Na Esplanada dos Ministérios, mil cruzes homenagearam as vítimas da pandemia no domingo, 28 27 auxílio emergencial foi simbólica. Ocorreu em uma cerimônia organi- zada no Palácio do Pla- nalto na terça-feira, 30, marcada pelo aceno de paz aos pre- sidentes da Câmara, Rodrigo Maia, e do Senado, Davi Alco- lumbre. “É uma satisfação tê-los aqui. É um sinal que juntos nós podemos fazer muito pela nossa pátria”, declarou. Apro- veitou para convidá-los a integrar sua nova agenda. “Tive o prazer de estar em Araguari e, ao retornar, pousamos em um pequeno vilarejo de forma inopinada. Tinha umas 30 casinhas lá e vimos muita gente humilde”, acrescentou. Vai precisar fazer muito mais para desanuviar o ambiente carregado por um ano e meio de ataques às instituições. Para criar pontes com o STF, André Mendonça (Justiça e Segurança), Jorge Oliveira (Secretaria-Geral) e José Levi (Advocacia-Geral) já tinham sido despachados a São Paulo a fim de dialogar com o ministro Alexandre de Moraes, que é o relator dos inqué- ritos das Fake News e dos atos antidemocráticos. A visita foi mal recebida por outros ministros, que interpretaram o ges- to como uma má sinalização institucional — a interlocução entre o Executivo e o Judiciário deveria ter acontecido com o presidente do STF, Dias Toffoli. Os limiTEs DA nOvA fAsE Bolsonaro está sendo obrigado a se reinventar. Já perdeu a imagem anticorrupção desde que descartou Sergio Moro e, ao que tudo indica, tentou interferir na PF para usá-la em defesa de seus filhos e amigos e como instrumento de perseguição de adversários. Agora avança para desmanchar a estrutura da Lava Jato, por meio das ações do PGR que procuram controlar as grandes investigações anticorrupção. As investidas serviram para mobilizar sua base radical, mas também tiveram um efeito bumerangue. Fizeram avançar os inquéritos que o fus- tigam. As apurações do inquérito das Fake News agora serão compartilhadas com o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que pode usá-las nos pedidos de impugnação da chapa Bolsonaro- Mourão, pelo suposto uso massivo de propaganda ilegal em redes sociais em 2018. É uma ame- aça que não existia. O presidente finalmente percebeu o risco de sua trajetória de confronto. A escalada da crise levou o man- datário a procurar um caminho de harmonia contra a sua própria na- tureza. Toda a sua carreira foi fun- dada nos ataques e na polarização. Ele nunca cogitou ter um papel conciliador, nem procurou governar para todos os brasileiros, indepen- dentemente das opções políticas. “Tudo era um blefe”, aposta Pereira. “As instituições são fortes e não correm riscos. Isso não quer dizer que ele não tente um golpe. Mas querer não é poder. Se insistir, quem vai perder é ele. O retrato atual não é positivo para o governo, e pode ficar muito pior.” fotos: sergio liMa/afp; divulgação; reprodução PluRiPARTiDÁRiO Live do movimento Direitos Já! reuniu mais de 100 personalidades de diversas tendências e partidos, no dia 26: em defesa da democracia “Se as evidências comprovarem o conhecimento do presidente sobre as falcatruas do filho, a probabilidade maior é Jair Bolsonaro ser abandonado pelos militares. Ele tenta sobreviver em uma situação gravíssima” Carlos Pereira, cientista político da FGV 28 ISTOÉ 2634 8/7/2020 fotos: pedro ladeira/folhapress; divulgação cnj; evaristo sá/afp; reprodução Brasil/Ministério Público A Procuradoria-Geral da República quer interferir no trabalho da força-tarefa da Lava Jato e os procuradores suspeitam que a gestão de Augusto Aras deseje ter o controle absoluto sobre as investigações com o objetivo de esvaziá-las: quatro procuradores já pediram demissão em protesto Rebelião na PGR Germano Oliveira Lava Jato A ação de Aras e Lindora foi entendida pelos procuradores como uma tentativa de quebra de sigilo de processos 29 nunciaram a emissária de Aras à Corregedoria Nacional do Ministério Público Federal. Para eles, Lindora não foi ao Para- ná em busca de compartilhamento de dados, mas para obter informações globais sobre o estágio das investigações e acessar o acervo da força-tarefa no Estado, que foi palco do início do combate à corrupção na Petrobras, levando vários políticos à prisão, entre eles Lula. Entenderam que os dados que ela queria representaria uma quebra no sigilo de processos. Paralelamente aos protestos dos colegas do Paraná, os quatro procuradores da Lava Jato do DF pediram desligamento das funções. A primeira a pedir para sair foi a procuradora Maria Clara Noleto, que deixou a PGR no começo do mês. Na semana passada, após a incursão fracassada de Lindora a Curitiba, outros três procuradores pediram demissão coletiva: Hebert Reis Mes- quita, Luana Vargas Macedo e Victor Riccely Lins Santos. Como a operação tem sete integrantes, apenas três procuradores liga- dos a Lindora e Aras permanecem na ativa, enfraquecendo os trabalhos. No Paraná, segundo Deltan Dallagnol, o trabalho continua normal. “Só queremos que nos deixem trabalhar sem interferências externas”, disse o coordenador da força-tarefa à ISTOÉ. Outro que não se conteve em criticar a ação de Aras foi o ex-ministro Moro: “Aparentemente, pretende-se investigar a Operação Lava Jato em Curitiba. Não há nada para esconder, emboraessa intenção cause estranheza. Registro minha solida- riedade aos procuradores competentes que preferiram deixar seus postos em Brasília”, comentou Moro. A verdade é que desde que Aras assumiu a PGR ele transformou-se em um de- fensor ferrenho dos interesses de Bolsonaro e desestruturar a Lava Jato parece ser um dos objetivos do governo. m tempos de gestão polêmica de Augusto Aras, a Procu- radoria-Geral da República (PGR) vive momentos de tensão. O PGR e os subprocuradores que o apoiam ten- tam, a todo custo, interferir nas operações que investigam os principais crimes de corrupção no País, como a Lava Jato no Pa- raná, Rio de Janeiro e São Paulo, além da Green� eld, que apura desvios em fundos de pensão, em Brasília. Para os demais procu- radores, por trás da iniciativa há um claro interesse de enfraque- cer o combate ao crime organizado, fazer uma devassa sobre as apurações já realizadas e ter o controle total sobre futuras inves- tigações. A administração controlada por Aras deseja, assim, criar a Unidade Nacional de Combate à Corrupção e ao Crime Organi- zado (Unac) para centralizar as forças-tarefas e, com isso, poder decidir o que deve e não deve ser priorizado nas operações. Pro- curadores do Paraná, por exemplo, acreditam que um dos obje- tivos do projeto é levantar processos em que o ex-juiz Sergio Moro atuou, como forma de vasculhar se ele cometeu algum deslize. Já outros quatro, dos sete procuradores da Lava Jato em Brasília, simplesmente rebelaram-se e pediram demissão de seus cargos, desestruturando a força-tarefa no Distrito Federal. QUEBRa Do SIGILo Na Lava Jato A proposta da criação da Unac não é de hoje, mas o que detonou a crise na PGR foi a visita, na quinta-feira, 25, da subprocuradora Lindora Araújo à procuradoria regional do Paraná. Ela quis ter acesso a processos movidos pela Lava Jato de Curitiba, muitos deles com sentenças do ex-juiz Sergio Moro, e pediu até mesmo gravações de ligações telefônicas de procuradores feitas durante as investigações. Os procuradores da Lava Jato, coordenados por Deltan Dallagnol, que tem um bom relacionamento com Moro, consideraram ilegal a ação de Lindora, que é ligada a Aras. Como se sabe, Aras é próximo de Bolsonaro e mandou investigar se Moro cometeu supostos crimes de denunciação caluniosa quando revelou que o pre- sidente desejava interferir na Polícia Federal. Percebendo que a atuação da subprocuradora poderia ser uma manobra de intervenção na Lava Jato, os procuradores paranaenses de- E DELtaN ”Queremos trabalhar sem interferências externas” vICtoR RICCELY Integrante da força-tarefa da Lava Jato, foi nomeado Procurador Regional Eleitoral LUaNa vaRGaS MaCEDo Mestre em Direito pela Universidade Harvard, é procuradora desde 2012 HEBERt REIS MESQUIta O procurador da Lava Jato no Distrito Federal toca 119 processos junto ao TRF-1 MaRIa CLaRa NoLEto Ela deixou a força-tarefa da Lava Jato de Brasília no começo do mês de junho OS PROCURADORES REBELDES 30 ISTOÉ 2633 1/7/2020 Brasil/Educação Mentiras, mentiras, mentiras. Elas resumem a ascensão e queda de Carlos Alberto Decotelli no Ministério da Educação e comprovam a incompetência de Jair Bolsonaro para preencher cargos de vital importância para o País O HOMEM QUE QUIS SER MINISTRO Mariana Ferrari ILUSTRAÇÃO: GERSON NASCIMENTO; FOTO: ANDERSON PRADO MINISTRO FAROLEIRO Decotelli foi vítima de sua própria mitomania: lorota tem limite 31 professor catedrático da USP. As mentiras compulsivas de Decotelli são assombro- sas. Ele se disse oficial da Marinha: a Marinha negou. Ele se disse mestre pela FGV: não o é porque copiou trechos de outras dissertações. Ele se disse professor da mesma FGV. Corte: a faculdade des- mentiu, só que dessa vez foi ela que faltou com a verdade. Decotelli exibiu seis prê- mios entregues a ele pela FGV como professor. A versão de Decotelli recebeu o abalizado endosso até de Elizabeth Guedes, irmã do ministro da Economia, Paulo Guedes. Ou seja: nisso ele foi sin- cero. O rosário do ex-ministro, porém, continuou. Ele se disse doutor pela Uni- versidade Nacional de Rosario, na Argen- tina: sequer chegou a fazer a defesa oral. Ele se disse pós-doutor pela Bergische Universität Wuppertal, na Alemanha: não o é porque foi desmentido pela própria instituição. “É algo da cultura brasileira querer obter ganhos e vanta- gens sem fazer o menor esforço, apode- rar-se de algo que não se criou ou iludir o próximo”, diz o neuropsicólogo pela USP, Mauricio Daher Filho. SAÍDA RELÂMPAGO Diversos movimentos negros estão considerando que o presidente só deixou de nomear Donatelli porque ele é, justa- mente, negro. Ou seja: Bolsonaro, segun- do eles, comete um ato racista porque não exonerou, por exemplo, Ricardo Salles, branco e ministro do Meio Am- biente, nem Damares Alves, branca e ministra dos Direitos Humanos, da Mu- lher e da Família. Salles se declarou mestre em Direito Público pelos EUA. É pura inverdade. Quanto a Damares, ela foi motivo até de críticas por religiosos: ão é comum, mas acontece de o autor de uma tese de mestrado ou doutorado es- quecer de colocar entre aspas uma citação ou se confundir em referên- cias – teses geralmente são calhamaços e a bibliogra� a é in� ndável. Isso é uma coisa. Outra coisa, e bem diferente, é o que vem ocorrendo no País com políticos e ministros copiando descaradamente obras intelectuais sem mencionar a auto- ria. Mais descaradamente, ainda, mentem sobre títulos acadêmicos que teriam conquistados nas mais prestigiadas uni- versidades do mundo sem sequer terem passado pela porta. Todos recorrem à igual desculpa: não � z por interesse. Há um histórico ensinamento: “o desinteres- se encobre diversos falsos personagens, inclusive o do interesse”. A frase que se acaba de citar, aspeada, é do duque fran- cês La Rochefoucauld. Se tivesse sido utilizada por Carlos Alberto Decotelli viria sem aspas e sem o nome do verdadeiro autor. “Existem diversos códigos de con- duta, ética e boas práticas cientí� cas que pesquisadores têm de seguir”, diz o reitor da Unicamp, Marcelo Knobel. Foi assim que, mentindo, Decotelli deixou o Ministério da Educação na terça- feira 30 sem sequer acomodar-se em seu gabinte — virou ex antes da posse (o nome mais cotado agora é o do reitor do ITA, Anderson Correia). Decotelli saiu, mas a nós � ca a perplexidade: como alguém pode assumir uma pasta mentindo na própria área de sua atuação? Para quem seria ministro da Educação, mentir no campo educacional é doido e doído de- mais. E vale lembrar que dois ex-minis- tros, Ricardo Vélez Rodrigues e Abraham Weintraub, também tinham currículos pouco ortodoxos no quesito veracidade. “A escolha das mentiras no currículo mostra uma falta de percepção do mun- do. É muito fácil descobrir enganações acadêmicas”, diz Mozart Neves Ramos, N “Está na cultura brasileira querer obter ganhos sem fazer esforço e apoderar-se de algo que não criou” Mauricio Daher Filho, neuropsicólogo e especialista em terapia cognitiva pela USP “Existem diversos códigos de conduta, ética e boas práticas científicas que pesquisadores têm de seguir” Marcelo Knobel, reitor da Unicamp disse ser mestre em direito constitucio- nal, direito da família e em educação. Quando apanhada na mentira, declarou que “quem lê a bíblia é sempre mestre”. Na mesma linha, pode-se indagar por que Dima Rousse� não perdeu a diplomação de presidente da República ao falsear que era doutora pela Unicamp? Por que o governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel, segue no cargo, mesmo tendo mentido que cursou parte dos créditos de seu doutorado em Harvard sem o menor escrúpulo? Na verdade, o fato de esses personagens não terem sido puni- dos não signi� ca que a impunidade deva seguir. O que os movimentos antirracistas pleiteiam é equidade de tratamento. Antes que se diga que Bolsonaro foi iludido por Decotelli, é preciso lembrar de outra atitude desabonadora do ago- ra
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