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Folha de São Paulo 14 06 2020

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DOMINGO, 14 DE JUNHO DE 2020ANO 100 ┆ Nº 33.310 R$ 7,00
D E S D E 1 9 2 1 UM J O R NA L A S E RV I Ç O D O B R A S I L
Mundo A12
Sonhos de
pandemia
Corrida B20
Clóvis Rossi estaria
indignado com país,
diz filha do jornalista,
morto há um ano
Ilustrada B11
Quem vai querer
consumir arte sobre
a pandemia depois
que o pior passar?
Medo e incerteza com a
crisedonovocoronavírus
assombram o sono e ge-
ramimagensinquietantes.
Judiciário vêTSE comoalvo
deBolsonaro eMourão
Vice, que assinou nota compresidente, afirma que Forças semantêmdisciplinadas
Integrantes do STF (Supre-
mo Tribunal Federal) e do
TSE(TribunalSuperiorElei-
toral)veemnoconteúdoda
notadivulgadapor JairBol-
sonaroeHamiltonMourão
na noite de sexta (12) preo-
cupação do governo como
julgamentoda chapapresi-
dencial na corte eleitoral.
Anota, assinada também
peloministrodaDefesa,ge-
neralFernandoAzevedo,diz
queasForçasArmadasnão
cumpremordensabsurdase
nãoaceitamtomadadepo-
derporjulgamentopolítico.
Para magistrados, seria
uma nova tentativa de inti-
midaçãocontraoJudiciário.
Noentanto,elespercebem
maisumaretóricabolsona-
rista do que ameaça no do-
cumento.Aavaliaçãoépar-
tilhadaporlíderesdaoposi-
ção no Congresso e até por
ex-aliados dopresidente.
Trêsgeneraisdaativadis-
seramàFolhaquereprovam
o tomdanota do governo.
A manifestação ocorreu
apósLuizFuxterescrito,em
decisão,queasForçasArma-
dasnão sãopodermodera-
dor. Mourão disse ontem
queelas “semantêmfirme-
mente disciplinadas” e que
seu papel tem sido tratado
de forma “preconceituosa”
nonoticiário. Poder A4 e A6
Extremo centrão
Índios sob ameaça
Sobre escalada fisiológi-
cadogovernoBolsonaro.
Acerca de avanço do co-
ronavírus entreospovos.
EDITORIAIS A2
ISSN 1414-5723
9 771414 572018
33310
AUDIÊNCIA/MÊS
PÁGINAS VISTAS 340.339.921
VISITANTES ÚNICOS 54.958.699
Escritórioda Johnson&Johnsonvazioemprédionazonasul deSãoPaulo; cercade70%dos6.500 funcionáriosdaempresaestão trabalhandodecasaemrazãodaCovid-19 EduardoAnizelli/Folhapress
LiliaM. Schwarcz
Com racismo não
há democracia
Queminventouoracismo
foiasociedadebranca.Ca-
beanósbrancosnosasso-
ciarmos à luta antirracis-
ta. Falta a boa parte dos
brasileiros entender que
dessaformanãohádemo-
cracia. IlustríssimaB18 e B19
Antropóloga e historiadora (USP)
Michael Kremer
ENTREVISTA
Informação
que pobre não
entende freia
a economia
Ainformaçãotransmitida
deformaincompreensível
paraosmaispobrespode
ser barreira maior ao de-
senvolvimentoeconômico
doqueafaltadetecnologia
oudeinteressedosgover-
nantes.ParaMichaelKre-
mer, Nobel de Economia
em 2019, a pandemia po-
deservirparausomais in-
tensode tecnologias sim-
ples,viacelular. MercadoA18
Esporte B15
Enfrentar o Brasil
em 1970 ajudou
peruano a jogar no
Barcelona de Cruyff
Universidade quer
incorporar avanço
da tecnologia B8 e B9
Jared Diamond
ENTREVISTA
Perigo atual
surge com
devastação,
diz cientista
Autorde “Armas,Germes
eAço”,obiogeógrafoJared
Diamond,82, pedecaute-
la na comparação da Co-
vid-19compandemiasdo
passado.Hoje,diz,operi-
gosãopatógenosquevêm
comadevastaçãoambien-
tal e o tráficode animais.
Paraele, é importantea
compreensãodequeépre-
ciso“lidarcomproblemas
emescalaglobal”. SaúdeB6
Grupo de professores
da USP vê paralelos com
o integralismo B16 e B17
Por charges críticas,
PMs interpelam Folha e
quatro chargistas A8
Falta preparo
das redes de
ensino para a
volta às aulas
Quase duas em cada dez
redes públicas no Brasil
ainda não começaram a
sepreparar para retomar
as atividades (16%) nem
têm estratégias para evi-
tar o abandono escolar
(21%),segundoestudoiné-
dito. Em 61% das redes,
não houve formação pa-
raprofessoresdesenvolve-
rematividadesadistância.
Na volta às aulas, omo-
delo adotado deverá ser
híbrido, com ensino pre-
sencial e remoto. SaúdeB1
Atrasar formação
pode custarmenos
que só interrupção
EstudodeRicardoPaesde
Barrosmostraqueainter-
rupçãodasaulasnapande-
miapodereduziroPIBem
até23%pelaperdaderen-
daqueos jovenssofrerão.
Jáseaformaçãobásicafor
atrasadaemumano,oim-
pactoseriade5%. SaúdeB2
Escritórios
vão ficarmais
vazios na vida
pós-Covid
O escritório do mundo
pós-Covid-19 vai ter pou-
cas cadeiras, muito es-
paço vazio, advertências
contrausodeelevadorese
salasdereunião,eaplica-
tivosparamonitoramen-
todepossíveiscontágios.
Grandes empresas, co-
mo Ambev e Johnson &
Johnson, querem ampli-
ar o home office mesmo
depois da pandemia por
entenderemqueosfuncio-
náriossetornammaispro-
dutivos. MercadoA15 e A16
E
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Q
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A
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INFORME PUBLICITÁRIO
co
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ac
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on
ao
ha
de
mo
cra
cia
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g.b
r
Políciamata negro
emAtlanta e gera
novos protestos
Rayshard Brooks, 27, foi
baleadoporumpolicialna
noitedesexta-feira(12), le-
vandomanifestantesato-
maremasruasdeAtlanta
naesteiradeprotestospe-
lamortedeGeorgeFloyd.
Chefe da polícia local se
demitiu ontem.MundoA14
Catarina Pignato
SEMINÁRIOS FOLHA
Prefeito de SP, Bruno Covas, é
diagnosticado com Covid-19 B7
a eee
opinião
A2 DOMINGO, 14 DE JUNHO DE 2020
UM JORNAL A S ERV I ÇO DO BRAS I L
a
Publicado desde 1921 – Propriedade da Empresa Folha daManhã S.A.
presidente Luiz Frias
diretor de redação Sérgio Dávila
superintendentes Antonio Manuel Teixeira Mendes e Judith Brito
conselho editorial Rogério Cezar de Cerqueira Leite, Marcelo Coelho,
Ana Estela de Sousa Pinto, Cláudia Collucci, Hélio Schwartsman,
Mônica Bergamo, Patrícia Campos Mello, Suzana Singer, Vinicius Mota,
Antonio Manuel Teixeira Mendes, Luiz Frias e Sérgio Dávila (secretário)
diretoria-executiva Marcelo Benez (comercial), Marcelo Machado
Gonçalves (financeiro) e Eduardo Alcaro (planejamento e novos negócios)
editoriais@grupofolha.com.br
EDITORIAIS
Extremo centrão
Índios sob ameaça
A recriação doMinistério das Co-
municações, com a indicação do
deputadofederalFábioFaria(PSD-
RN), ainda encerra mais dúvidas
que certezas. Não se conhecem
as reais intenções do presidente
da República com o movimento,
nemtampoucoqualseráoresulta-
dodochoqueentreessedesidera-
toeseuestilocaóticodegovernar.
Por um lado, o chefe de Esta-
do evitou repetir o padrão, que já
deu reiteradasmostras de fracas-
so, querdenomearmaisummili-
tar, quer de homenagear a franja
degolpistaslunáticosqueobajula.
O Planalto, por outro lado, co-
gita levar a turma de arruaceiros
que fezmá famasobaalcunhade
“gabinete do ódio” para a estru-
tura do novo ministério. O presi-
dente tambémcometeuatemeri-
dadedecolocarnapastaumpolí-
tico que tem ligação pessoal com
umgrupodecomunicação,oSBT.
Esses elementos, associados ao
temperamento mercurial, à ma-
nia de interferir emminudências
eà inapetênciaparatarefasadmi-
nistrativas de Jair Bolsonaro, dão
azoaquemapostanumfuturode
crises edesgastesparaonovomi-
nistério, como aliás ocorre com
quasetudonaatualgestãofederal.
Avaliadonumcontextomaisam-
plo, o convite ao parlamentar do
PSDvincula-se à estratégiadogo-
verno, iniciada há poucosmeses,
deabrirasportasdamáquinafede-
ral a partidos desde sempre asso-
ciados aochamado toma ládá cá.
Nenhumarazãodeprincípiofez
ogoverno,queanunciavaumano-
vaeranapolíticabrasileira,correr
paraosbraçosdosempredisponí-
vel centrão. Foi o pavor do impe-
achment,desfechoparaoqualga-
lopavaumpresidentecujaquanti-
dade de barbaridades atentatóri-
as aos pilares constitucionais era
inversamente proporcional à sua
base de apoio noCongresso.
Nodesespero, Bolsonaro e seus
acólitos mandaram às favas pro-
messasdenãofazerbarganhasno
modotradicionalcomparlamenta-
resoudeevitaraproximaçãocom
políticosquefrequentaramaspá-
ginaspoliciaiseestãopendurados
em investigações de corrupção.
Tambémenterraramnoentulho
doestelionatoeleitoralabandeira
de restringir a 15onúmerodemi-
nistérios. Comaressurgênciadas
Comunicações, eles já somam 23.
Aregressãoàmédia, forçada,do
bolsonarismonopoder,sedefato
ocorrer, não deixará de represen-
tarmaisumtriunfodasinstituições
republicanas. Elas têm mostra-
do de formaperemptória os limi-
tesdaConstituiçãoantearroubos
tresloucados deumaventureiro.
Masécedoparadizerquesecon-
solidouumnovoeixonogovernoeque ele funcionanomínimoco-
mosegurodopresidentecontraa
deposição legal. Bolsonaro carre-
gará consigoogermeda instabili-
dade enquanto estiver no cargo.
Umatragédiaempotencialsecon-
figuracomoavançodonovocoro-
navírusemterras indígenas,asso-
ciadoàinaçãodogovernoJairBol-
sonaro e à histórica precariedade
de acesso à saúdedesses povos.
Trata-se, em primeiro lugar, de
uma batalha por números, como
tem sido praxe no país durante a
pandemia. Compilados no bole-
timepidemiológico da Secretaria
EspecialdeSaúdeIndígena,doMi-
nistério da Saúde, dados oficiais
apontam até sexta-feira (12) para
97mortesporCovid-19e2.749ca-
sos confirmados em todoopaís.
Entidades indígenasdiscordam
dessequadro.Combaseemnúme-
roscoletadosdiretamentedaspo-
pulações,oComitêNacionaldeVi-
da eMemória Indígena e as orga-
nizaçõesdaArticulaçãodosPovos
Indígenas do Brasil registraram,
até quinta (11), 272óbitos.
As estatísticas oficiais padecem
deproblemasevidentescomosub-
notificaçãopor faltade testes—e
por não contabilizarem propria-
menteindígenasforadeterrasho-
mologadas,nocontextourbanoe
emáreasmaisafastadas.Urgeaper-
feiçoarosregistrosparaorientara
conduçãodapolítica pública.
Tal mapeamento, em parte, já
foi feito. Estudo do Instituo So-
cioambiental e da UFMG propôs
em abril um modelo para calcu-
lar a vulnerabilidade de povos in-
dígenasaocoronavírus.Concluiu-
sequecomunidadespertodocen-
tro de São Paulo e as de povos ia-
nomâmiemRoraimaenoAmazo-
nas são asmais ameaçadas.
Medidasdeautoproteçãoadota-
daspelaspopulações,comobarrei-
ras sanitárias, esbarramno avan-
ço do garimpo ilegal e na expan-
são da fronteira agrícola, impul-
sionadaspelaomissãodapolítica
ambientaldogovernoBolsonaro.
Outroestudodo ISAedaUFMG
mostraumcenárioalarmanteem
especialparaosianomâmi:oentra
e sai de garimpeiros em suas ter-
rascolocaemriscodeinfecçãopor
Covid-19 40%da comunidade, ou
cerca de 5.600 indígenas.
Alémdemelhores dados, faz-se
necessáriofortalecerasestruturas
dosDistritos Sanitários Especiais
Indígenas, do Ministério da Saú-
de, para atendimento específico
da doença, bem como o forneci-
mento de testes e equipamentos
adequados para suporte respira-
tório e a contratação temporária
de agentes de saúde qualificados.
Difícil alimentar algum otimis-
mo,porém,tratando-sedeumgo-
vernoque aomesmo temponega
a gravidade da pandemia e con-
duzumapolíticaanti-indigenista.
Apavorado com o impeachment, Bolsonaro abraça
o fisiologismo, mas carrega germe da instabilidade
são paulo Até o final do século 17,
europeus, inspiradosporversosdo
poeta Juvenal,usavamaexpressão
“cisne negro” para designar uma
impossibilidade. Todos os cisnes
até então avistados erambrancos.
Não foi semassombro,portanto,
que descobriram, a partir de rela-
tosdeexploradores, quehavia cis-
nes negros na Austrália. O termo
passou, então, a designar a falá-
cia lógica da generalização apres-
sada e, demaneiramenos técnica,
eventos surpreendentes.
Mais recentemente, o escritor
Nassim Taleb popularizou a no-
çãodecisnenegrocomoumacon-
tecimento raro, de enormes con-
sequências e que não foi previs-
to pelos especialistas. Exemplos
de cisnes negros incluem a dis-
solução da URSS, o surgimento
da internet e o 11 de Setembro.
ACovid-19entranessa lista?Pen-
soquenão.Taleb também.Elepre-
fere chamá-la de rinoceronte cin-
za, já que era totalmente previ-
sível. Com efeito, infectologistas
afirmavam havia décadas que era
umaquestãodetempoatéqueuma
pandemia viral nos atingisse em
cheio.Haviadúvidasemrelaçãoao
“quando”,mas não quanto ao “se”.
Háoutrosrinocerontescinza.Sa-
bemos que um dia ummegaterre-
moto vai devastar cidades da cos-
ta oeste dos EUA, mas, ainda as-
sim,milhões de pessoas vivemne-
las tranquilamente. Sabemos que,
se não usarmos antibióticos com
mais sabedoria, logo teremos um
gigantescoproblema combactéri-
asresistentes.Sabemosqueoaque-
cimento global é uma realidade.
Por que não fazemos tudo o que
estáanossoalcanceparaevitarde-
sastresprevistos?Eureceioqueoco-
nhecimentointelectual,queéoque
aciênciaécapazdeoferecer,nãose-
jaumgrandemotivador.Nossoscé-
rebros, afinal, sãopré-científicos.É
só ver que temosummedo irracio-
nal de cobras, quenãomatamqua-
seninguémemambientesurbanos,
masnãonos incomodamosempu-
laroexercícionememcomeralém
da conta, que respondem por um
bompedaçodos óbitosmodernos.
brasília Hánovedias, JairBolsona-
ro tomou umhelicóptero e percor-
reuumtrajetoque levaria50minu-
tos pela estrada. Desembarcou em
ÁguasLindasdeGoiás,sorriueinau-
gurouumhospitaldecampanhaer-
guido com verba federal. “A gente
torce para que pouca gente venha
para cá, porque é sinal de que não
precisadeatendimento”,discursou.
OgovernodesembolsouR$ 10mi-
lhões na unidade, mas o presiden-
te decidiu sabotar o projeto. Na úl-
tima semana, ele incitou seus apoi-
adoresapraticarumcrimeeinvadir
hospitaispelopaís“paramostrarse
os leitos estão ocupados ounão, se
os gastos são compatíveis ounão”.
Depois de menosprezar o coro-
navírus, insistirnumexótico“isola-
mento vertical”, forçar a barrapara
distribuir cloroquinaemaquiar es-
tatísticas, Bolsonaro passou a insi-
nuar que os governadores inflamo
númerodemortosparadesviarodi-
nheiro público gasto napandemia.
Háumasériedeinvestigaçõesso-
breessasdespesas,masopresidente
nãoestáinteressadonelas.Aintenção
é lançar novas teorias para substi-
tuiraquelasqueperderamvalidade
ou foramdesmentidas pelos fatos.
Bolsonaromudaofocododebate
paradisfarçarsuanegligência.Trata-
sedeumavariaçãodaestratégiade
“moveratrave”—metáforaquedes-
creveaalteraçãocontínuadasregras
ecritériosdeumadisputaparades-
qualificaroavançodeumopositor.
Opresidentepreviumenosde800
mortesnapandemia.Quandoosnú-
merosdispararam, ele chegoua re-
conhecer o óbvio: “Está morrendo
gente? Está”. Depois, recuou e pas-
sou a fazer campanhapara sufocar
os dados oficiais sobre as vítimas.
Naeconomia,Bolsonarotrabalhou
para minar medidas de isolamen-
to e alardeou um risco de desabas-
tecimento que não se concretizou.
Mudou a tática e alertou para uma
onda de saques que não ocorreu.
Naúltimaquinta(11),opresidente
sugeriuqueapandemiaésóopano
de fundo de uma briga pelo poder.
“Talvezoscarasestejamaproveitan-
do as pessoas que falecempara ter
algumganhopolítico”,disse.Poisé.
riode janeiro Minhabagagempara
a ilhadesertaestáficando impossí-
vel. Agora pedem que eu revele os
livros de poetas brasileiros que le-
varia para lá. Tudo bem, mas des-
de que nãome cobrempor não le-
var este ou aquele. As ilhas deser-
tas são individuais, ou não seriam
ilhas, nem desertas. E permitam-
me citar só poetas que já partiram
para seus parnasos particulares.
Falando emParnaso, iriamOlavo
Bilac, claro, e o pândego Emilio de
Menezes, de quem Oswald de An-
drade foi ingrato discípulo. Os sim-
bolistasCruzeSouzaeAlphonsusde
Guimaraens.MarioPederneiras,pi-
oneirodoversolivre,com“Histórias
domeuCasal” (1906).HermesFon-
tes, com“Apoteoses” (1908), vide as
piruetastipográficasde“ATaça”.Au-
gustodosAnjos,comseu“Eu”(1912).
Gilka Machado, a maior de todas,
com “Cristais Partidos” (1915). Raul
de Leoni, com “Luz Mediterrânea”
(1922).RibeiroCouto, com“Poeme-
tosdeTernuraeMelancolia” (1924).
RonalddeCarvalho, com“Todaa
América” (1926). Felipe d’Oliveira,
com “Lanterna Verde” (1926). Ma-
nuelBandeira,com“Libertinagem”
(1930). Raul Bopp, com “Cobra No-
rato” (1931). Murilo Mendes, com
“HistóriadoBrasil” (1932). Augusto
Frederico Schmidt, com “Canto da
Noite” (1934). E umpoeta quenun-
ca precisoupublicar: IsmaelNery.
CecíliaMeirelles,com“VagaMúsi-
ca” (1942). Drummond, com “A Ro-
sa do Povo” (1945). Vinicius deMo-
raes, com“Poemas,SonetoseBala-
das”(1946).DanteMilano,com“Po-
esias” (1948). Jorge de Lima, com
“Invenção de Orfeu” (1952). Ferrei-
ra Gullar, com “A Luta Corporal”
(1954).MarioFaustino, com“OHo-
memesuaHora”(1955).Alphonsus
deGuimaraensFilho,com“Sonetos
comDedicatória”(1956).PauloMen-
desCampos,com“ODomingoAzul
do Mar” (1958). Cassiano Ricardo,
com“Jeremias semChorar” (1964).
João Cabral de Melo Neto, com
“AEducaçãopela Pedra” (1966).
Não, a poesia não acaba aqui.
Amala é que já nãoquer fechar.Rinocerontes cinza
Movendo a trave
Poesia na ilha
-
Hélio Schwartsman
-
Bruno Boghossian
-
Ruy Castro
Existem várias formas de se
implementar um programa
de transferência de renda
quebeneficieosmaispobres.
Pode-se garantir uma renda
mínimauniversalparatodasas
famílias,ouparatodasascrian-
ças,esimultaneamenteaumen-
tar a tributação sobrea renda.
Nessecaso,aclassemédiaeos
mais ricos vão pagar maiores
impostos,mastambémvãore-
ceberoauxíliogovernamental.
Outra opção é tributar me-
nosegarantirarendamínima
apenas para osmais pobres.
Emprincípio,ambasaspro-
postasdeveriamserequivalen-
tes,afinaloqueinteressapara
cada família é o saldo líquido
entre quanto se recebedeum
lado e oque se paga de outro.
Oproblemaéquenosso sis-
tema tributário é repleto de
regras que distorcem a orga-
nização do setor produtivo.
Aumentos atabalhoados de
impostos podem ampliar a
desigualdade, comefeitos co-
laterais indesejados.
Um exemplo de distorção
é a tributação sobre o lucro.
No Brasil, confunde-se o ta-
manhodaempresa comodo
acionista. Fundos de pensão
sãoacionistasdegrandesem-
presaseo lucrofiscaldestina-
doaospensionistas é tributa-
do em 34%,mesmoque cada
umrecebaR$ 10mil pormês.
Poroutrolado,hácotistasde
pequenas empresas com ren-
damensalelevada,àsvezesaci-
madeR$ 100mil,cujos lucros,
graçasaregimesespeciais,são
tributados emcerca de 10%.
Omelhorseria,comoocorre
namaioriadospaísesrelevan-
tes, reduzira tributaçãosobre
o lucrodasempresas.Arenda
familiar, incluindoosdividen-
dos, seria tributada progres-
sivamente, descontando-se
o imposto pago na empresa.
Essaésóumadasmuitasdis-
torções, bemmais complexas
do que usualmente se supõe.
Outroexemplosãoosencargos
sobreafolha,comoacontribu-
içãoaoSistemaSquesustenta
as representações patronais.
Regras mal desenhadas e
obrigações feudais resultam
emelevadonúmerodepeque-
nasempresasedetrabalhado-
ressemcarteira,prejudicando
o emprego e a produtividade.
Sem uma cuidadosa refor-
ma tributária, aumentos do
imposto sobre a renda privi-
legiam quem se beneficia de
regras especiais e ampliam
as distorções da economia,
onerando trabalhadores e
empresas do setor formal.
Melhorcomeçartransferindo
rendasóparaosmaispobres.
Há anos, existem projetos
para aperfeiçoar políticas so-
ciaispoucoeficazesouquenão
beneficiam as famílias vulne-
ráveis. A proposta inicial do
Bolsa Família era ambiciosa,
mas houve resistências públi-
cas e seu escopo foi reduzido.
Muitopodeserfeitoparame-
lhoraraeficáciadapolíticaso-
cial,reduzirapobrezaedeses-
timularainformalidade.Osu-
cesso depende de propostas
detalhadasqueatentemparaa
complexidadedosproblemas.
Renda
mínima
-
Marcos Lisboa
Presidente do Insper, ex-secretário de
Política Econômica do Ministério da
Fazenda (2003-2005). Escreve aos domingos
Jean Galvão
Novo coronavírus tende a ter efeito devastador
entre indígenas, aindamais sob inação do governo
a eee
opinião
DOMINGO, 14 DE JUNHO DE 2020 A3
Responsabilidade
Comoem2018,quandonãoseacre-
ditavaqueBolsonarovenceria,hoje
nãosecrêqueelepossarealizarno-
vogolpemilitarnopaís(“ForçasAr-
madasnãocumpremordensabsur-
das nem aceitam julgamentos po-
líticos”,dizBolsonaro,Poder,12/6).
Então,comointerpretarasreitera-
das tentativas de se falsear a reali-
dade? E as tentativas de interferir
naPolíciaFederal, impedir investi-
gaçõessobrefakenewseintimidar
Congresso eSTF?Elepode convo-
carseguidoresa invadirhospitais?
Já não basta de crimes de respon-
sabilidade,parlamentares?
Mauricio Villela (Rio de Janeiro, RJ)
*
Ufa, até que enfim uma notícia
boa. Então vamos dar vivas à de-
mocracia!
Jesus Evangelista Almeida
(São Paulo, SP)
*
Servi no Exército de 1965 a 1966,
na ditadura, e presenciei expul-
sões. Elas ocorriam com a corpo-
ração perfilada diante do Coman-
do doBatalhão, e omilitar que se-
riaexpulsoàfrente.Umavozdeco-
mando ordenava que fosse retira-
da a fardadomilitar e vestidouni-
formede civil. A seguir, a corpora-
çãoficavadecostasparaoex-mili-
tar como ato de repúdio. Quando
Bolsonaro foi expulsodoExército,
houve isso?Agora ele, classificado
comomauelementoaoExército e
expulso,põedejoelhososmilitares.
Arnaldo Vieira da Silva (Aracaju, SE)
*
A nota de Bolsonaro, do vice e do
ministro da Defesa, os três oriun-
dosdacaserna,emproldapossibi-
lidadede intervençãomilitar, não
surpreende. O golpe de 1964 tem
defensores, ainda hoje. Nos resta
torcerpormaiormaturidadeepa-
triotismo de nossos cidadãos far-
dadosanãodaremguaridaaaven-
tureiros cujas ambições políticas,
privilégioseimpunidadequantoa
malfeitoséopanodefundodaatu-
al discussão. É a história queren-
do se repetir como farsamesmo.
Jose Hadad Neto (Rio de Janeiro, RJ)
*
Os militares brasileiros deveriam
aprendercomosparesnorte-ame-
ricanos,poisestesestãohonrando
os princípios conservadores ao se
afastaremdosarroubosautoritários
de Trump. Osmilitares brasileiros
seconsideramcomocastasuperior,
quedeve tutelar a sociedadecivil.
Geimison Falcão (Pacajus, CE)
*
Um bando de militares cheios de
medalhas nopeito, semnunca te-
remidoàguerra,sópodedarnisso.
Selene Almeida (Belém, PA)
O bispo e o vírus
Seodonode“pequenasigrejasgran-
des negócios” fosse fiel àquilo que
prega, deveria nem ter ido aohos-
pital e esperar ummilagre (“Bispo
EdirMacedorecebealtaapóstrata-
mento com cloroquina contra co-
ronavírus, dizUniversal”, Poder).
Michell A. F. deMello (Rio de Janeiro, RJ)
*
Só quatro dias de internação para
umidosode75anoscomCovid-19?
Estámaisparatretaessemilagreda
cloroquina.
Andrea Simone B Dias (Recife, PE)
Número 2
ReinoUnidotempopulaçãode66
milhões. E o Brasil, uma de 209,5
milhões. Aindaquenão concorde
comapolíticadogoverno, nas es-
ferasfederaleestadual,amanche-
te é sensacionalista (“Brasil pas-
sa ReinoUnido e se torna o 2º pa-
ís commaismortes”, Saúde, 13/6).
Wagner Evaldo Chabes (São Paulo, SP)
*
Ostrêspaíses comomaiornúme-
rodeóbitossãolideradospordois
presidentes eumpremiêquedes-
prezaramadoença.Foramcontra
a ciência e os especialistas. Nega-
cionistas. O inglês foi infectado e
voltouatrás.Oamericanoteveami-
goeasuacidadenatal infectadose
voltouatrás.MasBolsonaroconti-
nua coma tática genocida.
GustavoFelícioMoraes (Rio de Janeiro, RJ)
Estica e puxa
Sómais um tosco falando impro-
priedades,nenhumanovidadenes-
se governo (“Ramosnega riscode
golpemilitar,masmanda ‘não es-
ticar a corda’”, Poder, 13/6). Nin-
guém vai “esticar corda” da pró-
priaConstituição.Faráousodevi-
dodela para ver se aprendemres-
peitar as regras do jogo democrá-
tico. Tomemvergonha!
Jaime Alves Sobrinho
(Campina Grande, PB)
*
Oqueéesticaracorda?Eoposição?
Esse general fala peloExército?
Julio Moreira (Brasília, DF)
*
Ogeneralreconheceodesconforto
de,estandonaativa,participarde
atos políticos junto ao presidente
e dá a entender que o americano
fezocertoaopedirdesculpas.Po-
rém,elepróprionãotemamesma
humildadeedecênciaderepetiro
gesto.Apenasse limitaadizerque
vaipedirpara iràreserva.Pergun-
ta: qual adjetivo cabe a cada uma
das quatro estrelas doministro?
Marcos Paganini Mattiuzzo (Itatiba, SP)
*
Na história da República, nunca
houve um presidente tão respal-
dadopelopovo,únicafontedepo-
der,quantoBolsonaro.Temos,cus-
teoquecustar,quereagiremudar
oestablishment legadoporquase
três décadas de esquerda.
Edson Gama (Belo Horizonte, MG)
*
Peçademissão,general.Edesculpas
àpopulaçãopeloseucomentário.
Florentina Alves (São Paulo, SP)
*
Elegemoscivileficamestesmilita-
resfalandoabobrinhas,porfaltado
que fazer emseus quartéis. Haja!
Sérgio Siqueira (Divinópolis, MG)
Weintraub
Não podemos perder a capacida-
dede se indignar comcomentári-
ospreconceituosos,proferidospor
qualquerpessoa,emqualquermo-
mento, ainda que seja por chaco-
ta.Provocaasco,aindamaisquan-
dodisparadoporumministrosem
noção,quenashorasvagasproces-
sa o pai (“Weintraub fez chacota
da China. Um neto de chinês não
gostouefoiaoSTF”,Mundo, 13/6).
Ernane Barbosa dos Santos
(Campo Grande, MS)
*
Louvável atitude que deveria ser
copiadaportodos.Chegadeomis-
são! Sempre tivemos orgulho do
nossosincretismoemiscigenação.
Cintia Mesquita (Sorocaba, SP)
*
Como pode um homem que tem
ascendênciajudaicaproferirpala-
vras racistas e xenófobas? Ele es-
queceu que seu povo foi um dos
maisperseguidosao longodossé-
culos. É vergonhoso.
José Valter Cipolla Aristides
(Colombo, PR)
Racismo
Ao exigir retirada de estátuas de
genocidaseracistas,nãoestamos
apagando a história, e sim dei-
xando de celebrar pessoas e fei-
tos abomináveis.
Job Fonsêca (João Pessoa, PB)
PAINELDO LEITOR
folha.com/paineldoleitor leitor@grupofolha.com.br
Cartas para al. Barão de Limeira, 425, São Paulo, CEP 01202-900. A Folha se reserva o
direito de publicar trechos das mensagens. Informe seu nome completo e endereço
A luta contra a Covid-19 tem de-
mandado uma compatibilidade
entredisposições transitóriaseex-
cepcionaiserestriçãoou limitação
dosdireitos tomadanocontextoda
aplicaçãodoestadodeemergência.
Nãorestadúvidadequeascircuns-
tânciasatuaisafetaminevitavelmen-
te a saúde e o exercício da liberda-
de individual,demovimentoeresi-
dência, de expatriação, de reunião
eassociação,de livrepensamentoe
expressão e de iniciativa econômi-
ca. Isso coloca em confronto qua-
setodososvaloresconstitucionais.
Apretextodeproteçãoàsaúdepú-
blicaeanecessidadedereduçãoda
“curvade contágio”, as limitações a
direitos fundamentais geram séri-
as dúvidas constitucionais demol-
dequeumaaplicaçãoagressivadas
restriçõesdeliberdadescommeca-
nismosdevigilânciaostensivosnão
pode estar desassociada do estrito
universo da proteção à higidez pú-
blicacomoumtodo,comdistinção
eproporcionalidade aos valores.
De tal modo, desmedidas ações,
ao largo da realidade social, criam
umasituaçãohumanitáriacalamito-
sa,desnecessariamentecalamitosa.
Assim, políticos, jornalistas, ativis-
tas,magistradosdevemseacautelar
aousaremo“estadodeemergência”
comopropósitoúnicodedarênfase
teóricaaseusprópriosdiscursos,aca-
bandopordesorientaroscidadãos.
Emverdade,despreparamparao
realestadodenecessidadequeexige
respostasrápidas,adequadasecoor-
denadas,comexecuçãodepolíticas
públicasefetivasnadireçãodetodos
afetados pela crise, semexceção!
Asituaçãodeemergência,queim-
plicasuspensãodegarantias jurídi-
co-constitucionais destinadas a tu-
telarosdireitoshumanosporexce-
lência, prevista está emmomentos
deguerraouturbaçãopolítico-soci-
al, enãopodedesprotegeraordem
democrática e institucional.
As medidas devem ter o aval do
CongressoNacional,nomeadamente
comadecretaçãodosinstrumentos
legaisnecessáriosporquantooesta-
dode“guerra”quejustifiqueacentu-
adaslimitaçõesdedireitossomente
possuivalidadenaproporcionalida-
de, ponderação e no uso dos pode-
res necessários para quenão se co-
loqueemriscoaprópria subsistên-
ciadasociedadeedeseusmembros.
Ocritériogeralparaavaliar a ido-
neidadedas intervenções instituci-
onais emsituaçõesdeemergência
legitima-se a partir do equilíbrio
dos valores fundamentais.
Nenhuma instituição pode se
achar no exercício do poder so-
berano, vendo-se a si mesma aci-
madaConstituição. Somente sen-
do leal à lei e estando a serviço de
seu povo, com o consentimento
deste, o exercício coercitivo do
Estado justifica-se como ferra-
mentaúnicadegestãodosdireitos
políticos, civis e econômicos.
Tal exercício longe está de colo-
car em risco a democracia e deve
estabelecer a confiançadapopula-
ção nestamediante umequilíbrio
jurídico-institucional.
A restrição de direitos e a expan-
sãodedeveresencontraseupressu-
postonoEstadodemocráticodeDi-
reitoejamaisnaautocomplacência.
Com a escalada da crise política, o
general Mourão tem multiplicado
suas manifestações públicas. Sua
leituras,bemcomoatranscriçãoda
reunião ministerial de 22 de abril,
deixamtransparecer aposiçãodos
generais palacianos. Eles se empe-
nhamnadefesadogovernoporque
acreditam que, diante da anarquia
dosúltimosanos,oBrasilprecisaria
de um “freio de arrumação”, mate-
rializadoemumexperimento“con-
servador”.Moroeraocandidatoide-
al,masquisodestinoquefosseBol-
sonaro.Osmilitarespassaramopri-
meiroanosubalternosdentrodaco-
alizãogovernamental, faceaoprota-
gonismodosreacionáriosedosne-
oliberais. Em fevereiro, porém, di-
ante da realidade do fracasso, Bol-
sonaro entregoua coordenaçãodo
governo aos generais, tidos como
peritosempolíticaeadministração.
DesdeanomeaçãodeBragaNetto
paraaCasaCivil,osmilitaresacredi-
tam, portanto, ter tomado o poder
—esesentemresponsáveisporele.É
essacrençaquelevaMourãoaapre-
sentar o governo como ideologica-
mente de “centro-direita”, minimi-
zandoogolpismodaalareacionária.
Os generais reconhecem que Bol-
sonaro não passa de um demago-
go incapaz, mas precisam dele pa-
ra o “freio de arrumação”. Ele seria
um “Lula da direita”, e BragaNetto
seria Palocci. Então, quando o ge-
neral Mourão diz “deixa o cara go-
vernar”, ele está, na realidade, afir-
mando:“Deixaagentetentar”.Ées-
se“peixe”daracionalidadepolítico-
administrativaqueosgeneraisven-
demaos líderesdoCongressoeaos
ministrosdoSTF,quandoseencon-
tramaportasfechadas.Ogolpismo
não passaria de “retórica inflama-
da”paramanterabasemobilizada.
Afinal, Lula também nãomandava
chamar o “exército do Stédile”?
A esta altura, já podemos inferir
por que os militares relutam em
abandonar Bolsonaro. Ficam con-
trafeitos com o fato de que uma
tempestade imprevista—apande-
mia— tenha aumentado a chance
de umnaufrágio, justo quando es-
tavamno comando do navio. Pen-
samque o carismado capitão lhes
permite tocar a administração,
semausuraque aocupaçãodireta
daPresidência trariaàcorporação
militarcomoumtodo.Crendoque
Mourão teriamenos condições de
conteras “forçasanárquicas”daso-
ciedade, ainda veem o “Lula da di-
reita” comoamelhorgarantiacon-
traoLulaverdadeiro.Elesnãodes-
cartam, claro, a opção representa-
da pelo vice, mas a guardam para
o caso de a situação de Bolsonaro
se tornar insustentável. Nem por
isso admitem “desordem” das ru-
as ou pressão de juízes “ativistas”.
Infelizmente,nossosgeneraissu-
bestimamBolsonaro.Achamqueo
exploramparaseuprojeto,quando
é ele que os explora para o seu. Es-
quecemque, para o presidente, to-
dosos colaboradores sãodescartá-
veis. Ao contrário de Lula, ummo-
derado que se fazia de radical, Bol-
sonaro é um radical incapaz de ser
moderado. Assim que a tempes-
tade passar, vai se livrar de Braga
Netto, como já se livrou de Santos
Cruz, Mandetta e Moro. Mais gra-
ve, os generais não percebem que,
na utopia regressiva de Bolsonaro,
não há lugar para o Exército brasi-
leiro. O presidente sonha com um
Brasil de “povo armado”, domina-
do por novos “bandeirantes” que
exploramaterrademodopredató-
rio, lideradosporumaoligarquiade
empresários inescrupulosos. Nele,
nãohá espaço para umEstado que
assegure o interesse público, nem
para o Exército que detenha omo-
nopóliodoexercícioda força legíti-
ma. Como na Venezuela, as Forças
Armadas serão braços dasmilícias
bolsonaristas.Maisdoquedesarru-
mação,seráumfreiodedestruição.
Convido nossos militares a re-
fletirem se, sustentandoBolsona-
ro hoje, não estariam dando asas
à cobra que os engolirá amanhã.
Os generais em
seu labirinto
Autocomplacência
e Covid-19
TENDÊNCIAS/DEBATES
folha.com/tendencias debates@grupofolha.com.br
Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular
o debate dos problemas brasileiros emundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo
-
Christian Edward Cyril Lynch
Professor do Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade
do Estado do Rio de Janeiro (Iesp-Uerj)
-
Fausto De Sanctis
Desembargador federal do TRF-3 (Tribunal Regional Federal da 3ª Região) e escritor
Claudia Liz
Limitações a direitos geram dúvidas constitucionais
Infelizmente, militares subestimam Jair Bolsonaro
Temasmais comentados
na semana no site
468
279
233
De 6 a 12.jun
Total de comentários: 12.374
Comentários
Moro equipara PT
e Bolsonaro e acena
pela primeira vez a
movimentos contrários ao
presidente (Poder) 7.jun
Ministério da Saúde
deixa de informar
total de mortes e casos
de Covid-19 (Equilíbrio
e Saúde) 6.jun
Bolsonaro acusa eleitora
de falar ‘abobrinha’ e
pede que ela se retire do
Alvorada (Poder) 10.jun
a eee
poder
A4 DOMINGO,14 DE JUNHO DE 2020
Jornal filiado ao IVC
Circulação paga aos domingos de abr.2020, impresso mais digitais (IVC) 350.245 exemplares
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Bolsonaro precisa ser responsabilizado
criminalmente. Precisa pagar caro por
incentivar comportamento grotesco. Basta
DeHeni Ozi Cukier (Novo-SP), deputado estadual, sobre invasão e
vandalização de hospital no Rio umdia após incentivo do presidente
TIROTEIO
comMariana Carneiro, Guilherme Seto e Bruno Abbud
AoperaçãodaPolíciaFederalqueatingiuAlbertoBel-
tramenoParádividiuogrupodoConass,conselhopre-
sididoporeleecompostoportodosossecretárioses-
taduaisdeSaúde.Deumladoestãoaquelesqueveem
usopolíticodaPFparaintimidarcríticosdopresidente
JairBolsonaro.Elespropuseramquetodosentregassem
seuscargosouquetodossolicitassemauditoriasdostri-
bunaisdecontas.Foramvotovencido.Nemparadivul-
garnotahouveconsenso.Recuaramnestesábado(13).
Racha
modo avião O debate tem
acontecidonoWhatsApp.Bel-
trameestánogrupo,masde-
cidiu não se posicionar para
não advogar em causa pró-
pria. Os secretários que não
aceitaram colocar os cargos
àdisposiçãoeviamatéanota
com cautela têmoptado por
falarpouco.Algunsdelesnem
atendemmaisseustelefones.
mais fracos Entre os mais
enraivecidos com a ação da
PF há a avaliação de que o
presidente conseguiu o efei-
toesperado:atingiuacoesão
doConasseminousuaforça.
defrente Nasúltimassema-
nas,ogrupotevepapelimpor-
tantenapressãoparaqueoMi-
nistériodaSaúderecuasseda
decisão de restringir a divul-
gação de dados do Covid-19.
segura AoperaçãodaPFno
Pará chegou a sermarcada e
cancelada.Envolvidosnope-
dido dizem que omotivo foi
o suposto envolvimento de
Erick Vidigal, que era asses-
sordaProcuradoria-Geralda
República.Elefoialvodebus-
ca e apreensão.
tabelinha O primeiro pedi-
do demedidas foi ao Superi-
or Tribunal de Justiça no dia
22 demaio,mesma data que
oinvestigadoanunciouquese
desligariadesuasfunções.Se
tivesse permanecido, a PGR
poderia entrar nos endere-
çosdebuscas.Nomesmomo-
mento, ele tambémrenunci-
ou ao cargo na Comissão de
ÉticaPúblicadaPresidência.
resenha Antesdecomeçara
sessão virtual do STF do jul-
gamentoda açãoquequesti-
onaalegalidadedoinquérito
de fake news, na quarta (10),
oministro Luís Roberto Bar-
roso fezumaponderaçãoso-
bre o papel de Alexandre de
Moraes.DissequeoSupremo
teria que voltar a discutir no
futuro se omagistrado pode
julgar as ações do caso.
registro Naconversa,ainda
comcâmerasdesligadas,Bar-
rosolembrouqueocolegaes-
tá participandodiretamente
da produção de provas nes-
temomentonainvestigação.
sinal verde Ministros do
TCU e do STF consultados
pelo Painel dizem não ver
conflitode interessesno fato
de Fábio Faria (PSD-RN) ter
dedecidir sobredistribuição
deverbasparaemissoras,en-
tre elas o SBT. Ele é genro do
apresentador e empresário
Silvio Santos.
segueo jogo Para osmagis-
trados, como o novo minis-
tro das Comunicações não é
sóciodocanal eécasadosob
regimedeseparação totalde
bens, nãoháproblema.
deixa disso A Procuradoria
do Distrito Federal arquivou
nosúltimosdiasumadenún-
cia anônima, acompanhada
de pedido de investigação,
contra o presidente do PTB,
Roberto Jefferson.
indecoroso O procurador
Frederico Paiva afirmou no
despachoqueasdeclarações
doex-deputadosãodesprezí-
veis,masnãoconfiguramcri-
me. “A manifestação ora em
análise, embora lamentável,
desprezível e grosseira, não
constitui, sequer em tese, ilí-
cito penal”, escreveu.
no escuro Quase dois anos
semcontato comAdélio Bis-
po, um sobrinho do homem
que atacou Bolsonaro com
uma faca foi autorizado pela
direçãodaPenitenciáriaFede-
raldeCampoGrandeaescre-
ver um email de nomáximo
três linhas para o tio.
semsinal Oatendentedepiz-
zariaJeffersonOliveira,quevi-
veemCampinas,reclama,po-
rém,queaindanãoconseguiu
se comunicar como familiar
porfaltadeapoiodoadvoga-
doZanoneJúnioredaDefen-
soria Pública, que atualmen-
te defendeAdélio.
troca Odiretor-executivoda
PolíciaFederal,CarlosHenri-
queOliveira,nomeounasex-
ta (12) SimoneGuerra para o
cargo de Coordenador-Geral
deCooperaçãoInternacional.
A delegada estava na Abin e
é da confiança de Alexandre
Ramagem, que teve a nome-
açãoparadiretor-geral daPF
suspensa pelo STF.
Camila Mattoso
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R$ 7 (domingo)
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DF, SC
R$ 858
AL, BA, PE, SE, TO
R$ 1.177
Outros estados
R$ 1.460
GRUPO FOLHA
-Julia Chaib, Renato Onofre e
Ricardo Della Coletta
brasília Integrantes do STF
(Supremo Tribunal Federal)
e do TSE (Tribunal Superior
Eleitoral) veemno conteúdo
danotadivulgadaporJairBol-
sonaro na noite de sexta-fei-
ra(12)preocupaçãodogover-
nocomjulgamentodachapa
presidencialnacorteeleitoral.
Nanota,Bolsonarodizque
Forças Armadas não cum-
premordens absurdas e não
aceitamtomadadepoderpor
julgamentopolítico.
Magistradosafirmam,reser-
vadamente, tratar-sedemais
umatentativadeintimidação
contraoJudiciário.Noentan-
to, não veem ameaça no do-
cumento, avalizadopormili-
tares e pelo vice-presidente
HamiltonMourão.Acreditam
serpartedaretóricaconstru-
ídaporBolsonaro,masqueo
governoseguecumprindoas
decisões do Judiciário.
Acorteeleitoralanalisaum
processoquepodelevaràcas-
saçãodachapaeleitaem2018.
AaçãofoiabertaapósaFo-
lharevelar,duranteosegundo
turnodaseleições,quecorreli-
gionáriosdeBolsonarodispa-
raram,emmassa,centenasde
milhõesdemensagens,práti-
ca vedadapelo TSE.
O esquema foi financiado
por empresários sem a devi-
daprestaçãode contas à Jus-
tiçaEleitoral,oquepodecon-
figurar crimede caixa dois.
Na avaliação na cúpula do
Judiciário,anotadesextanão
leva a crise a outro patamar.
Segueaapostadopresidente
numa estratégia de disparar
ameaçasparademonstrarfor-
çajuntoaseussimpatizantes.
Na própria noite de sexta,
após oministro Luiz Fux, do
Supremo,terpublicadodeci-
sãoressaltandoqueasForças
Armadas não são podermo-
deradordaRepública,Bolso-
naro divulgou comunicado
também assinado por Mou-
rão e pelo ministro da Defe-
sa,FernandoAzevedo—am-
bos generais da reserva.
“AsFFAA[ForçasArmadas
do Brasil] não cumprem or-
dens absurdas, como por
exemplo a tomada de po-
der. Também não aceitam
tentativasde tomadadepo-
der por outro Poder da Re-
pública, ao arrepio das leis,
ou por conta de julgamen-
tos políticos”, afirma.
A menção a “julgamentos
políticos” é uma referência
velada tanto ao STF quanto
ao TSE. O fato de o vice-pre-
sidente ter assinado a nota,
avaliam, também é um sinal
de que há preocupação com
a cassaçãona corte eleitoral.
Tambémnasexta, ominis-
troOgFernandes,doTSE,pe-
diuparaoministroAlexandre
deMoraesinformarseaspro-
vascolhidasnoinquéritodas
fakenews,quecorrenoSupre-
mo,têmrelaçãocomasações
quepedema cassação.
Apesar do tomde ameaça,
ministros do STF lembram
que Bolsonaro já adotou re-
tórica semelhante contra a
corte e o Congresso em ou-
tras ocasiões, numa estraté-
gia de energizar seu núcleo
mais fiel de apoiadores.
No entanto, o tom belico-
so usado emoutras ocasiões
por Bolsonaro não levou ao
Planaltoasimplesmentedes-
cumpriralgumadecisãojudi-
cial,oquelevariaacriseentre
ospoderesaumnível inédito.
Quando o ministro Abra-
hamWeintraub foi chamado
adepornoinquéritodasfake
news, integrantes do gover-
no chegaramadefender que
ele não comparecesse à oiti-
va.Eleacabou indo,masper-
maneceu emsilêncio.
Magistrados também ava-
liamqueo fatodeoministro
daDefesaterassinadoanota
serviucomorecadoaosquar-
téis da ativa. A nota diz que
as Forças não cumprirão or-
dens para interferir em ou-
trosPoderes.
Os recados dúbios de Bol-
sonaroestavamlevandopre-
ocupaçãoafardadosdaativa.
A avaliação dos ministros
do STF é partilhada por líde-
res da oposição no Congres-
so e por ex-aliados de Bolso-
naro.Elesargumentamqueo
comunicado tem forte com-
ponente de ameaça e de in-
timidação e afirmam que o
mais preocupante é ominis-
tro da Defesa ter endossado
odocumento.
“Uma nota sem sentido de
ser divulgada, porque ela se
prestoumais à intimidação”,
disse o líder do PSLno Sena-
do,MajorOlimpio(SP),ex-ali-
adodeBolsonaroquesecon-
verteu emdesafeto.
O senador criticou o apoio
deAzevedoedissequeemna-
da se assemelha à atitude do
generalMarkA.Milley, chefe
do Estado-Maior Conjunto
dosEUA,quepediudesculpas
Judiciário vê reaçãode
Bolsonaro como temor
de julgamentonoTSE
Para integrantes dos tribunais, nota em que presidente diz que Forças
Armadas não cumprem ordens absurdas seria tentativa de intimidação
por ter participado da cami-
nhada do presidenteDonald
Trumpemmeioamanifesta-
çõesantirracistasnopaís.Ao
sedesculpar,omilitar ressal-
touocaráterneutroedistante
dapolíticapartidáriadasFor-
ças Armadas dosEUA.
“Osmilitaresbrasileirosde-
veriamseespelharnosmilita-
resamericanosquedesauto-
rizaramas loucurasdopresi-
dente Trump”, afirmou o de-
putadoPauloTeixeira(PT-SP).
“O art. 142 da Constituição
éde redaçãominhaedo sen.
Richa. Qualquer dos 3 pode-
respoderequererasFFAAna
defesa da Constituição e da
ordem.Nada a ver com tute-
la,moderaçãoouintervenção
militar”,disseoex-presidente
FernandoHenriqueCardoso
(PSDB) noTwitter.
Fardados não dão
declarações políticas,
afirmaMourão
-Leandro Colon
brasília Ovice-presidenteda
República,HamiltonMourão,
disse neste sábado (13) à Fo-
lhaqueasForçasArmadas“se
mantêmfirmementediscipli-
nadas”equeseupapeltemsi-
dotratadodeforma“precon-
ceituosa” nonoticiário.
“Não existemmilitares far-
dadosdandodeclaraçõespo-
líticas e participando dema-
nifestações,ousejaasForças
Armadas se mantêm firme-
mente disciplinadas“, disse.
Mourão respondeu por es-
crito a um questionamento
sobreoconteúdodenotaofi-
cialassinadaporele,porBol-
sonaroepeloministrodaDe-
fesa,FernandoAzevedo.AFo-
lhaperguntouquemensagem
eles queriam passar ao citar
“julgamentos políticos”.
“Nasúltimas semanaso te-
ma papel das Forças Arma-
das surgiu no noticiário, tra-
tadode formaaté certopon-
to preconceituosa e com os
olhospostosemumpassado
quenãovoltamais.AsForças
Armadasestãoquietas,cum-
prindo sua missão constitu-
cional enesteexatomomen-
totemosgentedefendendoa
integridadedoterritórioedo
patrimônionacionalnasfron-
teiras isoladasenaOperação
VerdeBrasil 2”, disse o vice.
“
Lembro
àNação
Brasileira
que as Forças
Armadas
estão sob a
autoridade
supremado
Presidente da
República, de
acordo como
Art. 142/CF.
Asmesmas
destinam-se
à defesa da
Pátria, à
garantia dos
poderes cons-
titucionais e,
por iniciativa
de qualquer
destes, da lei
e da ordem.
As FFAAdo
Brasil não
cumprem
ordens absur-
das, comop.
ex. a tomada
de Poder.
Também
não aceitam
tentativas de
tomada de
Poder por
outro Poder
da República,
ao arrepio
das Leis, ou
por conta de
julgamentos
políticos.
Na liminar
de hoje, o
Sr.Min. Luiz
Fux, do STF,
bem reconhe-
ce o papel e a
história das
FFAA sempre
ao lado da
Democracia e
da Liberdade.
Jair Bolsonaro,
Hamilton
Mourão e
Fernando
Azevedo
em nota oficial
divulgada na
noite da última
sexta-feira (12)
AVENIDA PAULISTA TEMATO CONTRA PRESIDENTE DA REPÚBLICA
Omovimento Grupo de Ação, que se classifica como independente e apartidário, reuniu cerca de cempessoas
emperformance com retratos demortos pela ditadura, pela PolíciaMilitar e pela Covid-19 Bruno Santos/Folhapress
a eee DOMINGO, 14 DE JUNHO DE 2020 A5
ENQUANTO HOUVER
DEMOCRACIA
RACISMO
NÃO HAVERÁ
INFORME PUBLICITÁRIO
PORQUE A PRÁTICA É O CRITÉRIO DA VERDADE.
Nós, população negra organizada,mulheres negras, pessoas faveladas,
periféricas, LGBTQIA+, que professam religiões dematriz africana,
quilombolas, pretos e pretas com distintas confissões de fé, povos do campo,
das águas e da floresta, trabalhadores explorados, informais e desempregados,
emCoalizão Negra por Direitos, vimos a público exigir a erradicação do racismo
como prática genocida contra a população negra.
O Brasil é um país em dívida com a população negra – dívidas históricas e atuais.
Portanto, qualquer projeto ou articulação por democracia no país exige o firme e real
compromisso de enfrentamento ao racismo. Convocamos os setores democráticos
da sociedade brasileira, as instituições e pessoas que hoje demonstram comoção
com asmazelas do racismo e se afirmam antirracistas: sejam coerentes.
Pratiquem o que discursam. Unam-se a nós nestemanifesto,às nossas iniciativas
históricas e permanentes de resistências e às propostas que defendemos
como formade construir a democracia, organizada em nosso programa.
Essa convocação é aindamais urgente emmeio à pandemia do Covid-19,
quando sabemos que a população negra é o segmento quemais
adoece emorre, que amplia as filas de desempregados e que sente na pele
o desmantelamentodas políticas públicas sociais. Emmeio à pandemia
de Covid-19, o debate racial não podemais ser ignorado.
Nestemomento, em que diferentes setores se unem em defesa da democracia,
contra o fascismo e o autoritarismo e pelo fim do governo Bolsonaro,
é de suma importância considerar o racismo como assunto central.
“Estamos vindo a público para denunciar as péssimas condições de vida
da comunidade negra.” Este trecho, retirado domanifesto de fundação
doMovimento Negro Unificado Contra a Discriminação Racial, de julho de 1978,
é a prova de que jamais fomos ouvidos e de que sempre estivemos por nossa
própria conta. Essa é uma luta que não começa aqui, mas que sematerializou
no pensamento e na ação de homens emulheres que, em todos osmomentos
históricos em que a brutalidade foi imposta ao povo negro, levantaram suas
vozes e disseram: NÃO!
Não há democracia, cidadania e justiça social sem compromisso público
de reconhecimento domovimento negro como sujeito político que congrega
a defesa da cidadania negra no país. Não há democracia sem enfrentar
o racismo, a violência policial e o sistema judiciário que encarcera
desproporcionalmente a população negra. Não há cidadania sem garantir
redistribuição de renda, trabalho, saúde, terra, moradia, educação, cultura,
mobilidade, lazer e participação da população negra em espaços decisórios
de poder. Não há democracia sem garantias constitucionais de titulação
dos territórios quilombolas, sem respeito aomodo de vida das comunidades
tradicionais. Não há democracia com contaminação e degradação dos recursos
naturais necessários para a reprodução física e cultural. Não há democracia
sem o respeito à liberdade religiosa. Não há justiça social sem que
as necessidades e os interesses de 55,7% da população brasileira sejam
plenamente atendidas.
O racismo deve ser rechaçado em todo omundo. O brutal assassinato de George
Floyd demonstra isso, com as revoltas, manifestações e insurreições nas ruas e
exigência de justiça racial. No Brasil, nos solidarizamos com essa luta e com esses
protestos e reivindicamos justiça para todos os nossos jovens e para a população
negra. E, entre muitos que não podemos esquecer, João Pedro presente!
Em nosso passado, formamos quilombos, forjamos revoltas, lutamos
por liberdade, construímos a cultura e a história deste país. Hoje, lutamos
por uma verdadeira democracia, exercício de poder damaioria, e conclamamos
aqueles e aquelas que se indignam com as injustiças de nosso país.
132 assinaturas, uma para cada ano desde a abolição inconclusa.
1.ADJúnior; 2.AiltonKrenak;3.AnaBiatrizSantosdeSouza;4.AnaFláviaMagalhãesPinto;5.AnaPaulaXongani; 6.ÂngelaGuimarães;7.AnielleFranco;8.AntônioCarlosdeAlmeidaCastro (Kakay); 9.Antônio
Carlos dos Santos (Vovô do Ilê); 10. Antonio Pitanga; 11. Assucena Assucena; 12. Astrid Fontenelle; 13. Áurea Carolina; 14. Babalaô Ivanir dos Santos; 15. Babalorixá Adailton Moreira Costa; 16. Benedita da
Silva; 17. Bianca Santana; 18. Biko Rodrigues; 19. Caetano Veloso; 20. CamilaPitanga; 21. Celso Loducca; 22. Christian Dunker; 23. Cida Bento; 24. Conceição Evaristo; 25. Dandara Rudsan Sousa de Oliveira;
26. Danny Glover; 27. Darlah Farias; 28. Deborah Duprat; 29. Djamila Ribeiro; 30. Dom Erwin Kräutler; 31. Dorrit Harazim; 32. Douglas Belchior ; 33. Dudu Ribeiro ; 34. Edi Rock; 35. Edson Cardoso; 36.Eduardo
Viveiros de Castro; 37. Eliana Sousa Silva; 38. Eliane Brum; 39. Eliane Cruz; 40. Eliete Paraguassu; 41. Emicida; 42. Erica Malunguinho; 43. Eugênio Bucci; 44. Felipe Neto; 45. Felipe Santa Cruz; 46. Fernanda
Torres; 47. Fernando Haddad; 48. Fernando Meirelles; 49. Flávio Gomes; 50. Frei David Santos Ofm; 51. GOG - Genival Oliveira Gonçalves; 52. Grada Kilomba; 53. Gregório Duvivier; 54. Guilherme Boulos; 55.
Hédio Silva Jr.; 56. Helena Theodoro; 57. Hélio Santos; 58. Hilton Cobra; 59. Iêda Leal; 60. IyalorixáMãeMeninazinha de Oxum; 61. Jeferson De; 62. JoannaMaranhão; 63. João Pedro Stédile; 64. João Reis; 65.
Joel Zito de Araújo; 66. Juarez Ribeiro; 67. Juarez Tadeu de Paula Xavier; 68. Juca Kfouri; 69. Kabengele Munanga; 70. Kenarik Boujikian; 71. Kenia Maria; 72. Laerte Coutinho; 73. Lais Bodanzky; 74. Lázaro
Ramos; 75. Leila Regina Lopes; 76. Leonardo dos Anjos; 77. Lia Vainer Schucman; 78. Ligia Margarida Gomes; 79. Lília Moritz Schwarcz; 80. Lívia Casseres; 81. Lúcia Xavier; 82. Luiz Eduardo Soares; 83. Luiza
Pereira Batista; 84. Mãe Nilce de Iansã; 85. Marcelino Freire; 86. Maria Santiago de Lima; 87. Martinho da Vila; 88. Maurício Paixão; 89. Mel Duarte; 90. Mia Couto; 91. Milton Barbosa; 92. Milton Hatoum; 93.
MônicaOliveira;94.MonjaCoen;95.MunizSodré;96.NecaSetubal; 97.NiceaQuintinoAmauro;98.OdedGrajew;99.OrlandoSilva;100.OscarVilhena;101.PastorAriovaldoRamos;102.PastorHenriqueVieira;
103. PauloPaim; 104. Rafael Zulu; 105. Railda Alves; 106. Raquel Rolnik; 107. Raull Santiago; 108. ReginaAdami ; 109. RenataMartins; 110. Roger Cipó; 111. Rosilene Torquato; 112. SchumaSchumaher; 113.
SelmaDealdina; 114.SérgioVaz; 115.SilvioAlmeida; 116.SôniaGuajajara; 117.Sueli Carneiro; 118. TaísAraújo; 119. TalíriaPetrone; 120. TeresaCristina; 121. ValterHugoMãe;122. VandaMenezes ; 123.Vilma
Reis; 124. Wagner Moura; 125. Walter Casagrande Júnior; 126. Walter Salles; 127. Wania Sant'anna; 128. Zélia Amador de Deus; 129. Zélia Duncan; 130. Zezé Menezes ; 131. Zezé Motta; 132. Zezito Araújo
Emuitomais pessoas já se juntaram a essa luta. Confira todas as assinaturas na nossa plataforma:
comracismonaohademocracia.org.br. Assuma o compromisso antirracista. Assine nossoManifesto!
U M A I N I C I A T I V A D E :
a eee
poder
A6 DOMINGO, 14 DE JUNHO DE 2020
ENTREVISTA
-Felipe Bächtold
são paulo Membros das For-
çasArmadasnalinhadefrente
dogovernoJairBolsonaroer-
ram ao tentar levar para car-
gos políticos a lógica da hie-
rarquiamilitar,segundoopro-
fessor daUnB (Universidade
deBrasília)AlcidesCostaVaz.
Oacadêmicodirige aAsso-
ciação Brasileira de Estudos
deDefesa,umadasprincipais
entidadesnopaísdedebates
sobre omeiomilitar.
Vazconsideraacrescentemi-
litarizaçãodepostosdogover-
nocomoumaanomaliaenão
vêcomoomantrade“missão
dada é missão cumprida”, de
lealdade à cadeia de coman-
do,podeseremuladoadequa-
damenteemcargospolíticos.
Sobre a interpretação de
queaConstituiçãoabrebre-
cha para uma intervenção
demilitaressobreoutrosPo-
deres—hipótese rechaçada
em decisão do ministro do
Supremo Luiz Fux na sexta-
feira (12)—, o professor diz
que seria importante tam-
bém o Ministério da Defesa
condená-la.
O titulardapasta, Fernan-
do Azevedo, coassinou no-
ta com Bolsonaro, também
na sexta, afirmando que as
Forças Armadas “não cum-
premordensabsurdas”nem
aceitamtentativasde toma-
da de poder decorrentes de
“julgamentos políticos”.
*
Atéondeiráoapoiodosmili-
taresaogovernoJairBolsona-
ro? Comoinstituição,asFor-
çasArmadasnãosãogoverno.
São instrumentos de Esta-
do. Têm integrantes hoje,
principalmente da reserva,
como membros do gover-
no. Do ponto de vista insti-
tucional, achoqueodescon-
forto é crescente, pelas po-
sições queopresidente tem
assumido, pelo apoio tácito
amovimentos que não con-
dizem com o ordenamento
constitucional pós-1985.
Vinícius Loures - 21.nov.2018/Divulgação Câmara dos Deputados
AlcidesCostaVaz
Éumerrotransportar
a lógicamilitarparao
comandodeministérios
Professor da UnB à frente de entidade que pesquisa defesa diz que
militarização no governo Bolsonaro é anomalia e lembra Venezuela
Alcides Costa Vaz, 59
É professor de relações internacionais da Universidade de Brasília e tem doutorado em
sociologia pela USP. Dirige desde 2016 a Associação Brasileira de Estudos da Defesa
quase sempre exemplar.
Talvez a Comissão da Ver-
dade[criadaporDilmaRous-
seff em 2012para apurar cri-
mes da ditadura] tenha sido
um ponto que feriu susceti-
bilidades, sobretudodagera-
çãoqueviveuaqueleperíodo.
Talvez tenha reanimado
ressentimentos. E isso foi
um componente importan-
te para a tomada de posição
daqueles que acompanham
a visão do atual presidente.
Como o sr. vê a militariza-
çãodogoverno, simbolizada
sobretudopeloMinistérioda
Saúde[dirigidointerinamen-
tepelogeneraldaativaEdu-
ardo Pazuello]? É um nú-
meroque achoquenão tem
precedentes, nem mesmo
no regimemilitar. A eventu-
al participação demilitares
daativa eprincipalmenteda
reserva emórgãos governa-
mentais, exercendofunções,
emumcontextodenormali-
dadedemocráticanão seria
em si mesma uma questão.
Mas o que nós temos hoje,
diante desses números, dá
margemparasefalarnamili-
tarizaçãodaestruturagover-
namental. E isso, sim, é uma
anomalia. Nãohádúvida.
Principalmenteporserum
país que temquadros técni-
cos competentes civis. Não
há uma justificativa plausí-
vel para dizer: “Os milita-
res são mais bem qualifica-
dos tecnicamentedoqueos
civis”. É uma inverdade.
Há quadros tão qualifica-
dos,tãohonestos,tãocapazes
tambémnomeio civil.
Isso temrelaçãocomofator
da lealdade comqueoofici-
al militar age com amissão
que é dada? O ministro in-
terino da Saúde, por exem-
plo,decidiuomitirdadosde
mortes e casos da Covid-19.
A função deministro de Es-
tado é eminentemente po-
lítica. É diferente domilitar
dentrodeumacadeiade co-
mando, de exercíciode fun-
ções e cumprindo ordens.
Quandoumministro,noca-
sosendomilitar,sevêconfron-
tadonassuasconvicçõescom
a visão do presidente, o me-
lhorquefazépedirochapéu.
A funçãodecoronel,dege-
neraloucapitãonãoépolíti-
ca.Háumacadeiadecoman-
do, uma hierarquia.
Os militares dizem: “Mis-
sãodadaémissãocumprida”.
É impróprio levar essames-
ma concepção para o exer-
cício de funções políticas.
Éequívocotransportarum
critério,umvalordeumacul-
tura político-institucional
própria dos militares, onde
isso tem reconhecidamente
a sua importância, e se com-
portar da mesma forma à
frentedefunçõesdegoverno.
OministroPazuello está fa-
zendo isso? Não entraria
na nuance se está ou não.
No momento em que ele se
sentissedesconfortável, co-
moministrodeEstado, sem
encontrar espaço para suas
visões, deve sair.
Qual o saldo que fica para
as Forças Armadas com a
aproximação com o gover-
no? Hoje esse saldo vai se
traduzirmuitomais emuma
contaminação na imagem
das Forças Armadas pelo
governodoqueo contrário.
Cadavezmaisagentevêas
Forças Armadas sob o pris-
ma da incerteza. Estão atu-
andodeumaformaconsentâ-
neacomatrajetóriahistórica
desde1985ouestãovoltando
a alimentar sededepoder?
Esse relacionamento deu
ensejo a essa incerteza.
O sr. vê paralelo entre a rela-
çãodo chavismocomasFor-
ças Armadas na Venezuela e
aaproximaçãodeBolsonaro
comosmilitares? HugoChá-
vez nos seus primeiros anos
promoveu uma militariza-
ção enormena estrutura go-
vernamental. Foi uma coop-
tação em larguíssima escala.
Eu percebo que há um fe-
nômeno semelhante nes-
se sentido da procura, por
parte do presidente, desse
apoio, desse respaldo, desse
afiançamento[nosmilitares].
Issoaindadistamuitodoque
aconteceu na Venezuela.
Mas a procura desse afian-
çamentoéumfenômenoaná-
logo.NaVenezuelaeramuito
maior,masdemesmanature-
za.NocasodeChávez,elebus-
courespaldodosmilitaresco-
moumaformadeproteçãoa
simesmoe a seu regime.Há vantagens para os mili-
tares nessa associação com
o governo? Eles foram um
poucodeixadosdeladonare-
formadaPrevidênciaeestão
em uma estrutura de poder.
Há um prejuízo muito gran-
de às ForçasArmadas emre-
laçãoaprojetosestratégicos.
Hoje, a principal questão
em torno das Forças Arma-
daséapolítica.Ograndepre-
juízoéa subtraçãodessadis-
cussão em um contexto em
que omundo se torna forte-
mente inseguro, com inteli-
gência artificial, tecnologias
disruptivas.Hátodoumcon-
juntodedesenvolvimentosno
campobélico,militar,quesão
extremamentepreocupantes.
Nesteano,porumdispositi-
volegal,oMinistériodaDefe-
sadevesubmeteraoCongres-
soasatualizaçõesdenossaes-
tratégia nacional de defesa.
Vocêouviualgoaesserespei-
to?Éumexemplomuito cla-
ro, o silêncio do ministério
e doCongresso [a respeito].
É um sintoma gritante da
subtraçãodessadiscussão.Es-
tamospensandoasForçasAr-
madasporseupapelpolítico.
Umsegundodanoénocam-
popolítico.Tínhamosumati-
vo importante,acredibilida-
de das Forças Armadas. Isso
estádefinitivamentecompro-
metido? Certamente, não.
Mas está em risco, quanto
maior essa politização das
questõesmilitares.
Existeumadivisãoemrelação
acomoreagemosoficiaisda
reserva e os da ativa? Acho
muito difícil fazer essa avali-
ação.Porumaquestãodeofí-
cio, osmilitares da ativa têm
a expressão política vedada.
Militares da reserva se mos-
trammuitomaispropensosà
defesadogovernoBolsonaro.
É sabido que as Forças Ar-
madas, do ponto de vista do
pensamento, das opções e
preferênciasdeseusintegran-
tes,nãosãohomogêneas.São
umaextensãodasociedadee
certamenterefletemumaplu-
ralidadedevisão,de leituras,
de avaliações a respeito.
A tese da intervençãomilitar
pormeiodoartigo142daCons-
tituição[quefalaqueasForças
têmafunçãodegarantiraleie
aordem]podeteradesãoma-
ciça? Amanifestaçãodomi-
nistroFuxretiraessaquestão
daordemdeimportânciaque
elaganhounaargumentação.
Issoagora,defato,refluimuito
fortemente.Eunãodiria que
sejaumelementoque tenda
a instigar ou fomentar pro-
pensãopró-intervençãomili-
tarno seiodasForçasArma-
das. Pode atuar como fator
de legitimaçãopara aqueles
[militares] que já estão im-
buídos desse espírito.
Aindanessaconjuntura,oMi-
nistério da Defesa divulgou
notas reafirmando seu com-
promissoconstitucional,mas
semcondenarpedidosdein-
tervenção.Comovê? Atôni-
cadoministrodaDefesaede
liderançasmilitaresquandose
manifestamsobreessasques-
tões ajuda a perpetuar essa
incerteza, essa insegurança.
Poderiamserbemmaisas-
sertivosnessamatéria, sepo-
sicionardeumaformaclarae
inequívocacomoinstrumen-
tos de Estado contra qual-
quer forma de intervenção
que contrarie oordenamen-
to constitucional e o Estado
democrático deDireito.
Seriaumargumentoimpor-
tante demoderação junto ao
próprio presidente. Para ele
compreender que tem inte-
grantes das Forças Armadas
nasuaequipedegoverno,mas
queelastêmmuitoclaroqualé
oseulugarequaléoseupapel.
Asmanifestações sãomuito
comedidas.
O ministro da Defesa não
entraria em rota de colisão
com o presidente? Enten-
do que há um dilema. Dian-
te de um quadro de todas
as incertezas políticas, [um
posicionamento] seria um
elemento capaz de reconfi-
gurar o panorama político,
um gesto de grandeza.
Seria uma forma de dar ao
presidente um parâmetro
claro a suas ações. Porque is-
sohojeéumobjetodeincerte-
zamuitograndenanossaso-
ciedade.Voltamosaconviver
comoespectrodeumainter-
vençãomilitareissovem,mui-
tasvezes,trazidocomaspala-
vrasoupelasatitudesexplíci-
tas ou tácitas dopresidente.
Seria um “papel modera-
dor” muito interessante das
Forças Armadas, moderar
nestemomentoopresidente.
Éumasituaçãoopostaàque
opaís vivia após aditadura,
de comandantes militares
muito discretos, de convi-
vência comministrosdaDe-
fesadeposiçõesdivergentes.
A convivência dosmilitares
com os governos do PT foi
-Igor Gielow
são paulo A nota em que o
presidente Jair Bolsonaro, o
vice Hamilton Mourão e o
ministro Fernando Azevedo
(Defesa)dizemqueasForças
Armadasnãocumprirão “or-
densabsurdas”foireprovada
porsetoresdacúpulamilitar
e pelo seu alvo, os ministros
doSupremoTribunalFederal.
Otextofoielaboradonanoi-
tedesexta (13), apósominis-
troLuizFuxconcederumade-
cisãoprovisóriadelimitando
a interpretaçãodoartigo 142
daConstituição,queregulao
empregodosmilitares.
Anotadesextadiztambém
queasForçasnãotolerariam
“julgamentospolíticos”, uma
referência nem tão velada à
ação de cassação da chapa
Bolsonaro-MourãonoTribu-
nal Superior Eleitoral.
AFolhaconversoucomofi-
ciais-generaisdaativadostrês
ramos armados. Enquanto
muitos consideramqueo Ju-
diciário tem exagerado em
suasdecisões, e todos ressal-
temqueossignatáriosdano-
tasãoseussuperioreshierár-
quicos, o tom foi reprovado.
Não que haja aprovação às
colocaçõesdeFux,considera-
das igualmente hiperbólicas
nasconversasentrefardados.
Mas, para um almirante, a
nota coloca as Forças Arma-
das como um poder mode-
radoracimada lei, oquenão
temamparo constitucional.
EmgruposdeWhatsAppde
oficiais,acríticamaiscomum
era a de que as Forças foram
colocadas como uma exten-
sãodobolsonarismo.
Jáhaviairritaçãopelaentre-
vista queogeneral LuizEdu-
ardo Ramos (Secretaria de
Governo) havia concedido à
revistaVeja, naqual ele falou
em tom ameaçador contra a
oposiçãoaomesmotempoem
que se apresentava como re-
presentante das Forças.
Ramos, já no centro de in-
satisfaçõesquandofoicogita-
doporBolsonaroparasubsti-
tuirocomandanteEdsonPu-
jol,aomesmotempocedeua
pressõesedecidiupassaràre-
serva—irá deixar o interino
da Saúde, Eduardo Pazuello,
comoúltimogeneraldaativa
noprimeiro escalão.
Comefeito,Mourãotentou
modularanota,dizendoque
nãohá indisciplina na ativa.
Hárelatosdivergentesacer-
cadeumaconsultadoPlanal-
to aos comandantes de For-
ças sobre o tom da nota. Se-
gundo a assessoria do gene-
ral Azevedo, os chefes mili-
tares não participam dema-
nifestações políticas.
JáentreministrosdoSupre-
mo, o tom variou de desâni-
mo a irritação. O desaponta-
mento veio do fato de que o
Planalto ensaiava a normali-
zaçãonarelaçãocomacorte,
que está em processo de vo-
tação que deverá manter vi-
vo o inquérito das fake news
—queatingeobolsonarismo.
A principal sinalização foi
dadaacercadoministroAbra-
hamWeintraub (Educação),
que na reunião ministerial
de 22 de abril disse que que-
ria ver os integrantes do Su-
premo,aquemchamoudeva-
gabundos, na cadeia.
Nasúltimassemanas,emis-
sáriosfizeramchegaraminis-
tros da corte que o Planalto
estariadispostoa rifarWein-
traubcomopuniçãopelafala.
Emvezdisso,oministroen-
volveu-seemnovapolêmica,
com a rejeitadamedida pro-
visóriaqueprevianomeação
de reitores de universidades
federais nesta semana.
Aesseempoderamentoso-
mou-seanotadesexta.Alimi-
nardeFuxhavia sidoalvode
contestação interna por par-
te de alguns ministros, que
viramnelaumcerto truísmo
ao reafirmar o que já está na
Constituição e pela vacuida-
de do objeto: é uma decisão
retórica, na prática.
Mashásimbolismosinesca-
páveis, e aí entraa contrarie-
dade geral. Fux será o próxi-
mopresidenteda corte, a to-
mar posse emsetembro.
Assim,oataquediretoaFux
setornou,porextensão,mais
umaafrontaàcorteporparte
deBolsonaro,quejáparticipa
deatospedindoofechamen-
to doórgãomáximodo Judi-
ciário e doCongresso.
A assinatura conjunta com
Mourãofoivistacomoumre-
cibodeambospelofatodese-
remobjetodaaçãonoTSE.Já
a presençadeAzevedo refor-
çouumsentimentoque vem
seconsolidandonaclassepo-
lítica:Bolsonarotemusadoas
Forças Armadas como escu-
dopor extrema fragilidade.
Assim, a banalização das
ameaças, que assustammui-
tos devido ao passado inter-
vencionista das Forças, tem
sido vista pelo decrescente
valor de face. Preocupamais
o Supremo a eventual perda
de controle nas ruas sob ins-
piraçãodopresidente.
Chocou a sugestão do pre-
sidenteparaquehospitaisse-
jam invadidos para provar a
hipótese de que governado-
res estão inflando politica-
mentenúmerosdaCovid-19.
E o eventual apoio de polici-
aismilitaresàagendadeBol-
sonaro.
As consultas que começa-
ramnanoitedesextaprosse-
guemneste sábado nomun-
do político, dado que Bolso-
naro conseguiu elevar ainda
mais o patamar de suas pro-vocações institucionais,mas
pororaoclimaémaisdeob-
servaçãodecenáriodoquede
reações exacerbadas.
Nota é reprovada pormilitares da ativa eministros do STF
a eee
poder
DOMINGO, 14 DE JUNHO DE 2020 A7
OMBUDSMAN folha.com/ombudsmanombudsman@grupofolha.com.br Ombudsman temmandato de um ano, com possibilidade de renovação, para criticar o jornal,ouvir os leitores e comentar, aos domingos, o noticiário damídia. Tel.: 0800-015-9000; fax:(11) 3224-3895
No início de junho, o senador
americano pelo estado do Ar-
kansas, Tom Cotton, assinou
um artigo na página de opi-
niãodo jornal americanoThe
NewYorkTimes pedindoa in-
tervençãodasForçasArmadas
para conter os protestos con-
tra a morte de George Floyd,
homemnegroassassinadopor
um policial branco.
O artigo recebeu quase
2.400 comentários,muitos de-
les negativos. Alémdisso, par-
te da Redação reagiu formal-
mente, comuma carta ao jor-
nal assinada por cerca demil
funcionários, segundocontou
o colunista de mídia do New
York Times, Ben Smith.
O texto não foi excluído da
plataforma digital, mas ga-
nhou uma nota explicativa.
A crise interna culminou na
saída do editor de opinião
do periódico, James Bennet.
Em editorial publicado na
quinta-feira (11), aFolhadeci-
diusepronunciarsobreocaso.
Ressaltou que o artigo do
senador se “encaixava perfei-
tamente nos cânones do li-
vre debate” e que, dados os
seusdefeitos, o textoacabaria
por oferecermuniçãoparaos
adversários. Disse aindaque,
ante os protestos e seus des-
dobramentos, o New York Ti-
mes prestava um “desserviço
à liberdade de expressão”.
Não acredito que o caso se
esgotenospontosdestacados
pelo editorial da Folha.
De fato, a defesa da liber-
dade de expressão é incon-
testável, e um jornal que bus-
ca ser plural e relevante pre-
cisa dar voz a diferentes po-
sições—sobretudo àquelas
com as quais não concorda.
Alémdisso, o senador repu-
blicano não só ocupa um car-
go de imensa representativi-
dade (e, portanto, suas ideias,
teoricamente, têm relevância
paraumjornal e seus leitores)
como tambémé livreparade-
fender o que lhe vier à cabeça
—aindaquesejamandarmili-
tarespartirparacimadopovo.
No entanto, é preciso levar
outros aspectos em conside-
ração para entender melhor
o desfecho do ocorrido.
Da parte dos profissionais
do New York Times, eles ale-
garam que pedir tropas nas
ruas colocaria em risco o
trabalho jornalístico, sobre-
tudo de profissionais negros.
Vale lembrar do repórter da
CNN preso ao vivo pela polí-
cia sem justificativaplausível.
Já o publisher do jornal, A.
G. Sulzberger, disse que não
poderia continuar com Ben-
net à frente da seção de opi-
nião por ter havido falhas no
processo de edição.
Bennet admitiu à Redação
do jornal que não leu o texto
que publicou. Independente-
mente do teor do artigo, co-
mo é possível publicar algo
que não foi lido?
A ideia de que as Forças Ar-
madas são instituição do Es-
tado e não de governo parece
ser levadaasériopelosameri-
canos, a ponto de a principal
autoridade militar do país, o
generalMarkMilley, ter vindo
apúblicopedir desculpaspor
ter passado essa impressão.
Portanto, o conteúdo do
texto contraria uma ideia
cara à democracia america-
na. O senador, porém, pode-
ria ter ido além e sugerido
bombardear os manifestan-
tes. O editor não saberia, pois
não leu o artigo, abdicando
da sua própria função.
Outroponto importantenes-
saequaçãoéqueadefesada li-
berdadedeexpressão,que,ob-
viamente, deveprevalecer, en-
cobre uma falsa ideia de que
as páginas dos jornais aco-
lhemtudo—equeosprocessos
jornalísticos são infalíveis.
Sabemos que isso não é ver-
dade.
Quem consegue ter acesso
às páginas de opinião de um
jornal de grande circulação?
O episódiomostra que não
houve umadiscussão sobre a
relevância do texto do sena-
dor, mas algo mais próximo
a uma carteirada de um po-
lítico importante, que pare-
ce ter usado um dos jornais
mais influentes domundo co-
mo se fosse uma de suas con-
tas nas redes sociais.
No editorial emque a Folha
critica o New York Times,
mais alguns pontos chama-
ram a atenção.
A Folha diz que talvez exis-
taumfatorgeracionalnomo-
vimento da Redação do jor-
nalamericano,pois “amaioria
dosprofissionaishoje ematu-
ação se formou num período
emque a liberdade de expres-
são jamais esteve ameaçada”.
Não é bem assim. Segundo
Ben Smith, o colunista de mí-
diado jornal,as redaçõesame-
ricanas vêm contratando re-
pórteres negros ao longo dos
anos sobacondição tácitade
não falarem sobre racismo.
O editorial da Folha afir-
ma que “momentos de emo-
ções à flor da pele não raro
descambam para atos obs-
curantistas”. Podem resultar
em avanços também.
É possível começar refletin-
do sobre quem são as pesso-
as que frequentam commais
assiduidade os espaços no-
bres dos jornais. Se o crité-
rio usado para isso for diver-
sidade, é preciso dizer que
ainda estamos mal.
Porfim,aFolhadiz ser “tris-
te que jornalistas, emparticu-
lar, não compreendamovalor
de publicar ideias que con-
trariem frontalmente as su-
as próprias”. Está aí algo do
qual não é possível discordar.
-
Flavia Lima
A defesa da liberdade de expressão e a falsa ideia de que jornais acolhem tudo
Erro doNewYork Times?
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Neste momento
em que estamos
ficando mais em
casa, passamos
a prestar mais
atenção no lixo
que geramos.
Essa produção de
resíduos sempre
existiu, mas a
convivência
nunca foi tão
próxima”
Claudia Leite,
gerente de Valor
Compartilhado e
Comunicação Corporativa
da Nespresso Brasil
Lixo é o que
não serve.
Resíduo volta
para a cadeia
e a gente
reúsa. Alumínio,
papelão, plástico,
vidro, isso tudo
é super
valorizado.
Reciclar é
uma ação
econômica”
Flávia Lemes,
Fundadora da Casa
Causa e Embaixadora
do Instituto Lixo
Zero Brasil
Live debate impacto nos hábitos de consumo,
aumento da produção de lixo em casa e
responsabilidade de empresas e de consumidores
Isolamento aumenta
preocupação com
sustentabilidade
A
pandemia de Covid-19
teve impacto nos há-
bitos de consumo da
população. Sustentabilidade,
meio ambiente e responsabi-
lidade social ganharam ainda
mais importância neste perío-
do de distanciamento. As pes-
soas passaram a gerarmais lixo
emcasaeaprestarmaisatenção
nele porque a convivência nun-
cafoi tãopróxima.Duaspergun-
tassetornarammais frequentes:
comoserumconsumidorcons-
cienteemtemposdepandemiae
qual o papel das empresas nes-
se cenário?
“A gente começou a olhar
muito mais para esse lixo que
estava sendo gerado dentro da
nossa casa. Nosso olhar sem-
pre foi de quevocê coloca o lixo
para fora e ele desaparece.Mas
não é assim. É um ciclo, e nos-
sa responsabilidade é enorme
em pensar nele até o fim”, diz
Claudia Leite, gerente de Va-
lor Compartilhado e Comuni-
cação Corporativa da Nespresso
Brasil, que participou de uma li-
ve que debateu o assunto.
Essa convivência mais próxi-
ma com o lixo produzido em casa
pode fazer com que as pessoas se
tornem mais conscientes de que
precisamdarumdestinoadequa-
do a ele. “Imagine se a gente não
tivessecoletaseletivaounenhuma
coleta e precisasse conviver com
tudo aquilo que a gente consome.
Muitoscomeçaramaperceberque
poderiamfazerumacoisadiferen-
te e iniciaram a coleta seletiva. O
reciclar é uma das operações que
a gente tem de fazer. Muita gente
agora está se questionando sobre
comomudar, oqueparardecom-
prar, como fazer isso, quais mar-
cas escolher na hora da compra.
Tem um processo muito impor-
tante de mudança do consumi-
dor”, diz Flávia Lemes, fundadora
da Casa Causa e embaixadora do
Instituto Lixo Zero Brasil.
As empresas tambémtêmum
papel importanteneste processo.
A Nespresso, por exemplo, tem
todo um trabalho voltado para a
cadeia produtiva, que vai desde a
preocupação com o trabalhador
do campo até a fabricação de su-
as cápsulas e a coleta de resídu-
os. Como parte desse trabalho, a
empresa desenvolveu uma car-
tilha voltada aos produtores de
café com orientações básicas de
como se preparar para este mo-
mento de pandemia. Esse mate-
rial também foi usado em divul-gaçãono rádio. “Mapeamosquais
eram as principais cidades onde
se cultiva café no Brasil. Porque
não era só para falar com quem
trabalhava comaNespresso,mas
também com as famílias, com as
pessoas que estão naquelas cida-
des”, diz Claudia.
Emseumodelo denegócios, a
Nespresso faladiretamente como
consumidor. Toda a base de con-
sumidores foi orientada a guar-
dar as cápsulas utilizadas. “Esse
material não é lixo.O alumínio da
cápsula é 100% reciclável. E, em
maio, anunciamos que as nossas
cápsulas passam a ser feitas com
80% de alumínio reciclado. Até o
final de 2021 será alumínio reci-
clado em 100% da linha domés-
tica”, afirma a executiva.
“Lixo é o que não serve, resí-
duo volta para a cadeia e a gente
reusa. Alumínio, papelão, plásti-
co, vidro, isso tudo é super valo-
rizado. Reciclar é uma ação eco-
nômica”, conclui Flávia.
Veja (folha.com/no1988754)
a íntegra da live produzida pelo
Estúdio Folha e patrocinada pe-
la Nespresso.
80%
do alumínio usado na
confecção das cápsulas de
café da Nespresso vêm de
reciclagem
74%
das ruas de São Paulo são
atendidas pelo caminhão
de coleta seletiva, e esse
serviço não parou pois é
considerado essencial
APRESENTA
a eee
poder
A8 DOMINGO, 14 DE JUNHO DE 2020
-FernandaMena
são paulo A Folha e os car-
tunistas Laerte, JoãoMonta-
naro, Alberto Benett e Clau-
dio Mor estão sendo inter-
pelados na Justiça pela pu-
blicaçãodecincochargescrí-
ticas à violência policial no
Brasil emdezembrode 2019.
Seis meses depois, a Asso-
ciação de Oficiais Militares
do Estado de São Paulo em
Defesa da PolíciaMilitar, De-
fenda PM, entrou na Justiça
compedidodeesclarecimen-
tocriminalparaqueoGrupo
Folha e os artistas explicas-
sem as charges, considera-
daspelaentidadecomo“cons-
trangedoras” a ela e a seus
cerca de 2.000 associados.
Fundada em 2016, a asso-
ciação é reconhecida entre
seus pares por abrigar uma
ala mais conservadora e ra-
dical da Polícia Militar, hoje
associada aobolsonarismo.
Seu presidente, o coronel
Elias Miler da Silva, é asses-
sorparlamentardosenador
Major Olímpio (PSL-SP).
O pedido de esclarecimen-
to criminal é uma espécie de
prelúdio de uma ação penal
e, como tal, é indissociável
decontornosintimidatórios.
“Considerei a interpela-
ção impertinente, autoritá-
ria e despida de lógica”, afir-
ma o advogado Luís Fran-
cisco de Carvalho Filho,
que representa o jornal. “A
intenção de quem faz isso
é intimidar a imprensa.”
Entre as perguntas colo-
cadas na peça da Defenda
PM estão dúvidas sobre os
desenhos se referirem a al-
gumepisódio específico, so-
bre a existência de intenção
de desqualificar profissio-
nalmente integrantes das
forças policiais e sobre ha-
ver algum tipo de arrepen-
dimento por parte de seus
autores sobre as obras.
Paraochargista JoãoMon-
tanaro, 24, as questões “pa-
recem fruto de uma falta de
interpretação visual”. E, pa-
ra além disso, são “sintoma
de toda essa atmosfera que
estamos vivendo”.
“Nuncativedelidarcomal-
go deste tipo. Achei que po-
deria ser algo sério. Mas de-
pois me pareceu algo extre-
mamente esdrúxulo”, avalia
ele,cujacharge,àépoca,pro-
vocou reações de entidades
depoliciais emredessociais.
“Explicarchargeéumacoi-
sa deprimente”, desabafa o
cartunista Alberto Benett,
46. “Se estamos contando
umahistóriapormeiodeum
desenho, explicá-lo é matar
a ideia e sua interpretação.”
Benett compara a situação
da interpelação a sua pró-
pria charge interpelada, que
retrata uma senhora horro-
rizada com um desenho pu-
blicadonumjornalquecobre
um corpo estirado no chão,
potencialmentealvodaação
depoliciais. “É comoseode-
senho fosse mais chocante
queo fato que ele retrata.”
Por charges críticas, entidadedePMs
interpela aFolha equatro cartunistas
Cartuns foram publicados em 2019 após ação policial que deixou novemortos em Paraisópolis
As cinco charges questio-
nadas pela Defenda PM fo-
ram elaboradas no rescal-
do da ação da PM de São
Paulo em um baile funk na
favela de Paraisópolis que
provocou a morte de nove
jovens no dia 1º de dezem-
bro do ano passado.
Duas delas fazem referên-
ciaacenasdaquelamadruga-
daregistradasemvídeosque
viralizaramaoexporematru-
culência de alguns policiais.
“O chargista reage a uma
ação. A gente não inventa
notícias, mas se baseia ne-
las e expressa críticas. En-
tão, eu vejo esse caso como
uma tentativa de censura”,
diz ClaudioMor, 40.
AviolênciapolicialnoBrasil
éumfenômenosistêmicoque
extrapola qualquer episódio
específico.Emcincoanos, as
mortes decorrentes de inter-
venções policiais cresceram
181%, e levantamentos apon-
taramquemaisde70%dessas
vítimas sãopessoas negras.
Em 2018, os estados doRio
de Janeiro e de São Paulo ti-
nham as mais altas propor-
ções de mortes provocadas
porpoliciaisemcomparação
com o total de homicídios:
23%e 20%respectivamente.
Em2020,mesmodianteda
quedadosíndicesdecrimina-
lidadeduranteapandemiado
coronavírus,a letalidadepro-
vocada por policiais milita-
res e civis de São Paulo cres-
ceu 31% entre janeiro e abril
em comparação com omes-
moperíodode2019, segundo
levantamentodoFórumBra-
sileirode SegurançaPública.
“Os exemplos de excessos
policiais no Brasil são mui-
to numerosos, evidentes e
têm se intensificado. A lin-
guagemdohumor temode-
verde ir emcimadisso”, ava-
lia a cartunistaLaerte. “Apo-
lícia brasileira é conhecida
mundialmente pela trucu-
lência epela letalidade. Por-
tantonenhumadessas char-
ges têmcomomotivaçãobir-
ras ou implicâncias. São lin-
guagens humorísticas, mas
necessariamenteagressivas,
amplamente calçadas em
fatos, fotos e exemplos.”
Para ela, o gesto do pedi-
do de esclarecimento “está
sintonizado comomomen-
todecrescimentodeumasi-
tuaçãoautoritárianoBrasil”.
Laerte cita a exclusão de
indicadoresdeviolênciapo-
licial praticadanoBrasil em
2019dorelatórioanualdogo-
verno federal sobredireitos
humanos. “Se instalou um
clima de desinformação e
censura que émuito sério.”
Benett enxerga o caso co-
mo “prelúdio de uma perse-
guição mais acirrada contra
aimprensaeojornalismocrí-
tico—algoqueépartedacul-
turadestegoverno[federal]”.
“Nãoénormalqueumpre-
sidentepeçaparaaspessoas
cancelarem assinaturas de
um jornal ou que empresas
deixem de anunciar em su-
as páginas. Assim como ele
pede para pessoas invadi-
rem hospitais, daqui a pou-
co as pessoas podem achar
quedeveminvadirRedações.”
A Defenda PM foi questi-
onada pela reportagem da
Folhasobreasmotivaçõespa-
raopedidodeesclarecimen-
tocriminalseismesesdepois
dapublicaçãodascharges,so-
breopotencial intimidatório
damedida,comprometendo
a liberdadede imprensa ede
expressão,esobreocompor-
tamentoideológicodaentida-
de.Aassociaçãonãoquisres-
ponderaosquestionamentos.
Ainda que tenha afirmado,
emnota,que“nãoseenvolve,
institucionalmente,emques-
tõespartidáriasoudecaráter
eleitoral”,seupresidente,oco-
ronelMilerdaSilva, chegoua
gravar vídeos pedindo votos
paraMajorOlímpioeJairBol-
sonaroduranteaseleições.
Amesma nota afirma que
aentidade “nãoapoia, emite
juízo de opinião ou crítica
aos poderes constituídos,
aos representantes eleitos”,
a página principal de seu si-
te estampa em letras garra-
fais: “Governador JoãoDoria.
Despreparado para SP. Des-
preparado para o Brasil”.
Charge da cartunista Laerte publicada na edição de 3 de dezembro de 2019 da Folha, três dias após ação policial
durante umbaile funk na favela de Paraisópolis, em São Paulo, resultar emnovemortes Laerte
Charge do cartunista ClaudioMor publicada na edição de 6 de dezembro de 2019 da Folha abordou o abuso policial
na esteira ação da PolíciaMilitar paulista emParaisópolis Claudio Mor
Em charge publicada na edição de 12 de dezembro de 2019 da Folha, o cartunista Benett ironiza a repercussão
dos cartuns frente à violência policial registrada emParaisópolis dias antes Benett
O cartunista JoãoMontanaro, em charge publicada na edição de 9 de dezembro de 2019 da Folha, faz alusão ao racismo;
amaioria dos nove jovensmortos na ação policial emParaisópolis era negra João Montanaro
“
Considerei
a interpelação
impertinente,
autoritária e
despida de lógica.
A intenção de
quem faz isso
é intimidar
a imprensa
Luís

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