Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
POLÍTICAS ECONÔMICAS APLICADAS AO AGRONEGÓCIO W BA 06 45 _v 1. 0 © 2018 POR EDITORA E DISTRIBUIDORA EDUCACIONAL S.A. Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta publicação poderá ser reproduzida ou transmitida de qualquer modo ou por qualquer outro meio, eletrônico ou mecânico, incluindo fotocópia, gravação ou qualquer outro tipo de sistema de armazenamento e transmissão de informação, sem prévia autorização, por escrito, da Editora e Distribuidora Educacional S.A. Presidente Rodrigo Galindo Vice-Presidente de Pós-Graduação e Educação Continuada Paulo de Tarso Pires de Moraes Conselho Acadêmico Carlos Roberto Pagani Junior Camila Braga de Oliveira Higa Carolina Yaly Danielle Leite de Lemos Oliveira Juliana Caramigo Gennarini Mariana Ricken Barbosa Priscila Pereira Silva Coordenador Mariana Ricken Barbosa Revisor Flávio Kaue Fiuza de Moura Editorial Alessandra Cristina Fahl Daniella Fernandes Haruze Manta Flávia Mello Magrini Hâmila Samai Franco dos Santos Leonardo Ramos de Oliveira Campanini Mariana de Campos Barroso Paola Andressa Machado Leal Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) Vergnhanini, Rodrigo V498p Políticas econômicas aplicadas ao agronegócio/ Rodrigo Vergnhanini. – Londrina: Editora e Distribuidora Educacional S.A. 2018. 108 p. ISBN 978-85-522-1036-8 1. Política tributária. 2. Política monetária. I. Vergnhanini, Rodrigo. II. Título. CDD 330 Responsável pela ficha catalográfica: Thamiris Mantovani CRB-8/9491 2018 Editora e Distribuidora Educacional S.A. Avenida Paris, 675 – Parque Residencial João Piza CEP: 86041-100 — Londrina — PR e-mail: editora.educacional@kroton.com.br Homepage: http://www.kroton.com.br/ mailto:editora.educacional%40kroton.com.br?subject= http://www.kroton.com.br/ Políticas Econômicas Aplicadas ao Agronegócio 3 SUMÁRIO Apresentação da disciplina 04 Tema 01 – Conceitos do agronegócio 06 Tema 02 – Competência do agronegócio brasileiro 22 Tema 03 – Fundamentos em política macroeconômica: as políticas fiscal e monetária 42 Tema 04 – Fundamentos em política macroeconômica: a política cambial 56 Tema 05 – Políticas de renda 70 Tema 06 – Política comercial externa 88 Tema 07 – Aspectos em política agrícola no Brasil 107 Tema 08 – Análise conjuntural de políticas econômicas aplicadas ao agronegócio 133 POLÍTICAS ECONÔMICAS APLICADAS AO AGRONEGÓCIO 4 Políticas Econômicas Aplicadas ao Agronegócio Apresentação da disciplina O intuito desta disciplina é apresentar elementos teóricos e práticos rela- cionados à política econômica que possam direta ou indiretamente afetar a estrutura de custos, as condições e técnicas de produção, a competitivi- dade, a rentabilidade e o próprio sistema de decisões dos agentes envol- vidos no sistema do agronegócio. São instrumentos de política econômica que influenciam o agronegócio: Política fiscal (tributação, gastos do governo, mecanismos de isenção fiscal e de incentivos fiscais); Política monetária (taxa de juros, depósitos com- pulsórios); Política cambial (câmbio valorizado versus câmbio desvaloriza- do); Política de rendas (legislação trabalhista, política de zoneamento do uso da terra, política de preços mínimos); Política comercial (de incentivo à exportação ou de restrição às importações); Políticas agrícolas (crédito rural, política de garantia de preços mínimos, seguro rural, pesquisa, ex- tensão rural, políticas específicas para certos produtos e insumos, política de uso florestal e de incentivo ao reflorestamento). A orientação das políticas macroeconômicas pode estar vinculada a di- versos objetivos, e seus efeitos se fazem sentir amplamente por toda a economia. A orientação das políticas específicas, por sua vez, é dada pelo papel que se espera de determinado setor ou complexo produtivo no crescimento ou desenvolvimento econômico do país. Por exemplo, às po- líticas agrícolas podem ser atribuídos papéis distintos, a depender do mo- mento histórico e da concepção política do governo para o setor agrícola, podendo incluir: a liberação de mão de obra, o barateamento do custo da cesta básica, a promoção das exportações de determinados produtos, a garantia da segurança alimentar, o fortalecimento da agricultura familiar ou patronal, etc. As políticas específicas podem ser utilizadas para anular ou compensar os sinais emitidos pela política macroeconômica sobre de- terminados setores; ou então para efetivamente distorcer as condições de operação do livre mercado, seja para favorecer ou para restringir de- terminadas atividades produtivas. Políticas Econômicas Aplicadas ao Agronegócio 5 É prudente adiantar que, devido à grande heterogeneidade dos setores, segmentos e firmas que compõe o agronegócio, essa disciplina não inten- ciona (e nem poderia, se assim o quisesse) desenvolver uma regra sim- ples e prontamente aplicável sobre quais seriam os sinais favoráveis e desfavoráveis da política econômica, ou então, estabelecer critérios claros para balizar uma reação “automática” do gestor do agronegócio. Ao invés, a disciplina discute aspectos da concepção, instrumentos, institucionali- dade e efeitos gerais esperados das diferentes políticas econômicas, de forma a capacitar o gestor do agronegócio para interpretar os possíveis impactos das políticas adotadas sobre a realidade mais específica do ne- gócio em que atua. Para cumprir com esse objetivo, a disciplina está dividida em oito temas. O Tema 01 começa discutindo a definição ou identificação das atividades econômicas e estruturas de apoio extramercado que formam o complexo do agronegócio. O Tema 02 apresenta algumas características econômi- cas desse sistema (composição, produto, balança comercial), destacando algumas competências e debilidades. O Tema 03 apresenta fundamentos da política fiscal e tributária e da política monetária. O Tema 04 comple- menta o anterior discutindo a política cambial. Em seguida, são discuti- das políticas econômicas que, mais comumente, são voltadas a setores específicos: o Tema 05 trata da política de renda e o Tema 06, da política comercial externa. O Tema 07 explora elementos da política agrícola no Brasil, a partir de uma perspectiva histórica. Por fim, o Tema 08 analisa a conjuntura das políticas econômicas no contexto da economia brasileira da segunda metade dos anos 2010. 6 Políticas Econômicas Aplicadas ao Agronegócio TEMA 01 CONCEITOS DO AGRONEGÓCIO Objetivos • Entender o conceito de agronegócio; • Desenvolver uma visão sistêmica sobre o agronegócio; • Identificar os agentes e elos envolvidos na cadeia do agronegócio. Políticas Econômicas Aplicadas ao Agronegócio 7 Introdução Tanto do ponto de vista acadêmico, como na formulação de política pú- blica, ou ainda na elaboração de estratégias por parte do empresário ou gestor individual que precisa planejar seus negócios e tomar decisões, é essencial a identificação de todos os elementos que fazem parte do com- plexo produtivo de interesse, incluindo a identificação dos agentes eco- nômicos, das cadeias interdependentes e as instituições e organizações relevantes. Nesse sentido, o primeiro tema da disciplina “Política Econômica Aplicada ao Agronegócio” se dedica a introduzir alguns conceitos básicos que são es- senciais à delimitação do recorte analítico do agronegócio. Primeiramente, discute-se o conceito de agronegócio e sua abrangência conceitual, dife- renciando-o de outros termos que podem ser utilizados de forma equivo- cada para referenciá-lo. Em seguida, são apresentados os diferentes elos, agentes e instituições que compõem o sistema do agronegócio. Por fim, discute-se no que consistiria uma visão sistêmica do agronegócio, explo- rando algumas implicações de sua consideração na análise do setor. 1. Aspectos do agronegócio 1.1. Conceitos básicos Em primeiro lugar, o agronegócio não deve ser entendido como sinônimo de agricultura, agropecuária ou agroindústria. Cadaum desses conceitos tem significado e contorno próprio. A seguir, esses conceitos serão apresentados, apoiando-se na Classificação Nacional de Atividades Econômicas - Versão 2.0 (IBGE, 2007), com o objeti- vo final de distinguir e delimitar a abrangência do que se refere na litera- tura como agronegócio. 8 Políticas Econômicas Aplicadas ao Agronegócio Iniciando com o conceito mais específico, a agricultura pode ser definida, em termos sintéticos, como o conjunto de atividades relacionadas ao cul- tivo de lavouras. Ela inclui a produção de lavouras temporárias (o cultivo de plantas de ciclo vegetativo de curta duração, de até um ano, como - por exemplo, a cana de açúcar, fumo, soja e outras oleaginosas etc.), horticul- tura e floricultura, produção de lavouras permanentes (cultivo de plantas perenes, isto é, de ciclo vegetativo de longa duração - por exemplo, laran- ja, uva, café, cacau e outros) e produção de sementes certificadas (seja por cultivo tradicional ou cultivo de plantas modificadas geneticamente). A agropecuária, por sua vez, é um conceito mais amplo que inclui, além das atividades agrícolas, aquelas atividades relacionadas à criação e pro- dução de animais. Portanto, incorpora-se a criação de bovinos e de outros animais de grande porte, caprinos e ovinos, suínos, aves e outros animais. O IBGE (2004) considera que a agropecuária envolve também atividades de apoio à agricultura e à pecuária; atividades de pós-colheita; caça e ser- viços relacionados; produção florestal (cultivo de espécies florestais, pro- dução de mudas, madeira sem processamento ou produtos de madeira resultantes de pequeno processamento – lenha, carvão vegetal, lascas de madeira); e a pesca e aquicultura (criação de animais aquáticos). Assim, a agropecuária pode ser considerada convergente com o conceito de setor primário da economia1. 1 A atividade extrativa ou de mineração está considerada, na atual classificação do IBGE, no setor secundário. PARA SABER MAIS O setor primário se soma aos macrossetores secundário (in- dústria) e terciário (serviços) na contabilização total da pro- dução anual de um país, o Produto Interno Bruto (PIB). Políticas Econômicas Aplicadas ao Agronegócio 9 Por outro lado, o termo “agroindústria” refere-se à parte da indústria (por- tanto, do “setor secundário”) que se dedica à “transformação física, quími- ca e biológica de insumos produzidos nas atividades agrícolas, pecuárias, florestais e da pesca, com a finalidade de se obterem produtos novos” (IBGE, 2007, p. 93). A agroindústria inclui a fabricação de produtos alimen- tícios (abate e fabricação de produtos de carne, fabricação e preservação do pescado, conservação de frutas, legumes e outros vegetais, fabricação de óleos e gorduras, laticínios, fabricação de alimentos para animais, fa- bricação e refino de açúcar, torrefação e moagem de café, fabricação de bebidas – vinho, cerveja, etc.), produtos de fumo, produtos têxteis (fibras, tecelagem, malha, artefatos têxteis), vestuário e acessórios, couros, calça- dos, produtos de madeira e móveis, celulose e papel. Além do processamento de insumos oriundos das atividades primárias, a agroindústria abrange, também, os setores cujo produto final se destina àquelas atividades: fabricação de combustíveis, produtos químicos (fer- tilizantes, adubos, defensivos agrícolas e desinfetantes domissanitários), produtos farmacêuticos e medicamentos para uso veterinário, fabrica- ção de tratores e máquinas e equipamentos para a agricultura e pecuária (equipamentos para irrigação, arados, adubadoras, semeadoras, colhei- tadeiras, pulverizadores, ordenhadeiras mecânicas). De forma convergente, a definição de agroindústria adotada pelo IBGE2 é a seguinte: “setores que, primordialmente, ou fornecem suprimentos dire- tamente para a agropecuária ou realizam a primeira transformação indus- trial dos bens que resultam das atividades realizadas no setor primário”. Por fim, o agronegócio pode ser considerado um conceito mais abran- gente e transversal que aqueles tratados até aqui, pois incorpora todas as atividades produtivas relacionadas à produção, processamento e dis- tribuição dos bens agropecuários, podendo envolver atividades dos três macrossetores da economia (agropecuária, indústria e serviços). Um mer- gulho na literatura específica pode ajudar a clarificar e contextualizar o surgimento desse conceito e seu recorte analítico. 2 Ver Notas Metodológicas da pesquisa de produção física do IBGE em: <https://ww2.ibge.gov.br/home/estatistica/ indicadores/industria/pimpfagro_nova/notas_metodologicas.shtm>. Acesso em: 10 maio 2018. 10 Políticas Econômicas Aplicadas ao Agronegócio 1.2. O surgimento do conceito na literatura O conceito de agribusiness surgiu em dois trabalhos do Ray Goldberg, da Universidade de Harvard, Estados Unidos, nas décadas de 1950 e 1960. Em um dos seus trabalhos seminais, Goldberg definiu o agribusiness como: “Um sistema de commodities [que] engloba todos os atores envolvidos com a produção, processamento e distribuição de um produto. Tal sis- tema inclui o mercado de insumos agrícolas, a produção agrícola, ope- rações de estocagem, processamento, atacado e varejo, demarcando um fluxo que vai dos insumos até o consumidor final. O conceito englo- ba todas as instituições que afetam a coordenação dos estágios suces- sivos do fluxo de produtos, tais como as instituições governamentais, mercados futuros e associações de comércio.” (GOLDBERG, 1968 apud ZYLBERSZTAJN, 2000, p. 5). Outros autores norte-americanos fizeram referência a essa ideia utilizan- do denominações distintas, como “sistema de alimentos e fibras”; “siste- ma de comercialização de alimentos” ou “indústrias manufatureiras de alimentos” (MENDES; JUNIOR, 2007, p. 47). No Brasil, Guimarães (1979) inspirou-se nos trabalhos originais de Goldberg para propor o conceito de “complexo agroindustrial”. Posteriormente, Muller (1989 apud RAMOS et al., 2007) recuperou esse termo e defendeu que ele se refere às atividades em que a agricultura tem conexões para trás (incluindo as indústrias que produzem insumos e máquinas para a agricultura) e para frente (as agroindústrias), além das relações de produ- ção e consumo. A Figura 1 ilustra o recorte atribuído ao agronegócio a partir de uma óti- ca macrossetorial. Como argumentado, as atividades do agronegócio in- cluem as atividades primárias da agropecuária, mas também parte da in- dústria (agroindústria) e parte do setor de serviços. Políticas Econômicas Aplicadas ao Agronegócio 11 Figura 1. Visão do agronegócio a partir da ótica macrossetorial Fonte: elaboração própria. 1.3. Elos e agentes Pode-se dizer que o agronegócio é tudo que envolve um fluxo de pro- dutos agropecuários, desde os insumos, passando pela produção, pro- cessamento, armazenagem, até a distribuição ao consumidor final. Cabe explicitar, com mais cuidado, os agentes que participam direta e indireta- mente do sistema do agronegócio. A Figura 2 apresenta a cadeia de um produto do agronegócio. É preciso atentar, contudo, que o fluxograma ilustrado, que indica um fluxo unidi- recional do produto do fornecedor de matérias-primas até o consumo fi- nal, é uma abstração. O sistema agroalimentar, na realidade, é composto por um conjunto de cadeias (filières); um sistema de sistemas, com vários pontos de intersecção (BELIK, 2007); ou assume a forma de uma rede (ne- twork) (ZYLBERSZTAJN, 2000). Com essas ressalvas, o fluxograma na Figura pode ser útil por efeitos di- dáticos, na medida em que sua representação permite ilustrar de forma simplificada o fluxo de um produto do agronegócio ao longo de seu ciclo de produção e distribuição. 12 Políticas Econômicas Aplicadas ao Agronegócio Figura 2. Cadeia de um produto do agronegócio Instituições e Organizações: Mercados Programas governamentais Integração vertical/contratual Cultura/Costumes Associações de comércio Informação Pesquisa Finanças/Crédito Cooperativas Firmas Educação/treinamento de mãode obra Consumidor Varejista Agroindústria Produtor primário Fornecedor Produtor de matéria-prima Fonte: Adaptado de Zylbersztajn (2000), Mendes e Junior (2007) e Ramos (2007). Do exposto, descreveremos os principais aspectos envolvidos no referido fluxo. • O produtor de matérias-primas é aquele que fabrica insumos (ferti- lizantes, defensivos, rações, crédito e sementes, calcário, produtos veterinários, combustíveis, implementos) ou bens de produção (tra- tores, colheitadeiras, máquinas, motores) que serão utilizados na produção primária. • O fornecedor de matérias-primas é responsável pela comercialização desses insumos e bens de produção para os produtores primários. • A produção primária envolve atividades de produção animal, lavou- ras permanentes, lavouras temporárias, horticultura, silvicultura, floricultura. Produzem matérias-primas para a agroindústria. • A agroindústria desenvolve o processamento de commodities em alimentos processados. Políticas Econômicas Aplicadas ao Agronegócio 13 • A etapa seguinte é a de distribuição e venda. O setor varejista inclui supermercados, restaurantes, lanchonetes, panificadoras, lojas de calçados e tecidos, etc. É possível, ainda, que antes de chegar ao setor varejista, os produtos passem por centrais ou plataformas de distri- buição atacadistas, que faz uma intermediação entre produtores e varejo. Além disso, o produto pode ser direcionado à exportação (mercados consumidores estrangeiros). • O elo final da cadeia é o consumidor, que demanda os produtos para satisfazer suas necessidades alimentares e nutricionais, ou relacionadas ao seu valor de uso. Além desses agentes, há instituições e organizações que afetam o am- biente em que as firmas, produtores e consumidores individuais operam. As instituições dizem respeito às regras do jogo da sociedade, explicitadas pelas leis, tradições e costumes. As organizações, por sua vez, são criadas para dar suporte ao funcionamento do sistema de agronegócios, como as empresas, universidades, cooperativas, associações de produtores etc. (ZYLBERSZTAJN, 2000). PARA SABER MAIS As empresas adaptam-se ao ambiente institucional, mas também buscam modificá-lo. Grupos econômicos e da socie- dade civil exercem pressões sobre o legislativo em busca de regras mais adequadas aos seus interesses. No caso do agro- negócio, a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) atua no Congresso Nacional do Brasil desde a Assembleia Nacional Constituinte em 1988, embora tenha mudado de siglas ao longo dos anos. A FPA reúne mais de 200 parlamentares e tem como objetivos declarados “a modernização da legisla- ção trabalhista, fundiária e tributária, além da regulamenta- ção da questão de terras indígenas e áreas quilombolas, a fim de garantir a segurança jurídica necessária à competitividade do setor” (FRENTE PARLAMENTAR DA AGROPECUÁRIA, [S.d.]). 14 Políticas Econômicas Aplicadas ao Agronegócio Mendes e Junior (2007) destacam ainda os serviços associados (crédito, seguros, transporte, energia, marketing, embalagem, outros serviços, pesquisa e desenvolvimento, armazenagem) e os mecanismos de coor- denação, que regulamentam a interação e a integração dos diferentes segmentos do sistema. Por exemplo, pode-se citar governo, contratos co- merciais, mercados futuros, sindicatos, associações, mercados, joint ven- tures, integração vertical, integração horizontal, associações de comércio. EXEMPLIFICANDO O esquema representado na figura 3, extraído de Brasil (2007), ilustra o sistema de agronegócios da soja. Cada transação é indicada com uma seta e uma sigla (por exemplo, T1, T2, T3...). A indústria de insumos agrícolas produz fertilizantes, defensivos, máquinas etc. e os vende para produção agríco- la propriamente dita (T1). Em seguida, os produtores podem direcionar sua produção diretamente para esmagadoras (T2) ou então para cooperativas, tradings (vendas para mercado externo), e outros intermediários (corretores, armazenado- res etc.) (transações T3 a T7). Esses agentes podem destinar a produção para o mercado externo (T9) ou para as esmagado- ras na economia doméstica (T8). As indústrias esmagadoras, refinadoras e produtores de derivados de óleo de soja são parte da agroindústria instalada domesticamente. No pro- cesso de esmagamento da soja, parte do farelo resultante é exportada pelas indústrias (T7). O farelo de soja comercia- lizado domesticamente tem como destino as indústrias de ração (T12). Já o óleo obtido por meio do processo de esma- gamento ainda segue as etapas de degomagem e refino. O óleo que é parcialmente refinado pode ainda ser transfor- mado em margarinas, maioneses e gorduras vegetais. Esses produtos mais elaborados, incluindo o óleo de soja refinado, Políticas Econômicas Aplicadas ao Agronegócio 15 Assim, o recorte analítico do agronegócio, ao considerar a interdepen- dência entre diferentes estágios da cadeia, a coordenação das atividades de produção e distribuição, e a interação entre os agentes e o ambiente institucional, favorece uma visão sistêmica desse setor. são direcionados principalmente para o mercado interno, por meio de distribuidores atacadistas e varejistas. Esses produtos processados também podem ser direcionados às indústrias de alimentos, química e farmacêutica (T15). A tran- sação da agroindústria para os distribuidores (T17) é seguida pela transação destes com os consumidores finais (T18). Os distribuidores também recebem indiretamente outros pro- dutos de soja, por meio da indústria de rações/carnes (T14) e de outras indústrias em geral (T16). Figura 3: Delimitação do Sistema de Agronegócios da Soja Fonte: Brasil (2007, p. 67) Insumos Produção51,8 mt Indústria dos derivados do óleo Originadores Esmagadores Distribuição Sementes Salada Atacado Mercado institucional Varejo Margarina Maionese Outros Dressing T2 T1 T5 T3 T6 T9 T8 T10 T11 T12 T13 T14 T15 T16 T17 T18 T4 T7 Empresa privada 85% Cooperativa 15%Trading companies Cooperativas Mercado externo US$ 8,8 bi Mercado interno Indústria de rações Indústria de carnes Outras indústrias Armazéns gerais C-Oeste 46,6% Sul 36,9% Sudoeste 8,1% Nordeste 6,2% Norte 2,2% Fertilizantes Defensivos Máquinas Outros 16 Políticas Econômicas Aplicadas ao Agronegócio 1.4. Visão sistêmica O enfoque sistêmico do agronegócio ganhou importância na literatura especializada a partir do desenvolvimento e modernização das atividades agrícolas, que ocorreu no mundo a partir dos anos 1960. O declínio da agricultura no contexto da produção agroalimentar se ex- plica pela modernização e pela mercantilização das atividades agrárias (BELIK, 2007). Assim, partes crescentes do produto e do valor adicionado nas economias modernas passaram a ser vinculados aos setores indus- trial e de serviços, ainda que estivessem relacionados às atividades agro- pecuárias na sua origem ou destino. Por isso, a análise focada apenas na agricultura começou a perder relevância. A partir dos anos 1990, não há mais análises por setor, e sim considerando o complexo agroindustrial. A visão sistêmica é fundamental para que o estudante e o profissional te- nham em mente um panorama mais completo das variáveis que afetam o fluxo do produto do produtor ao consumidor final. Tal visão integrada facilita o processo de tomada de decisão e promove o entendimento so- bre os problemas do mundo real (MENDES; JUNIOR, 2007). Alguns elementos podem ser destacados no enfoque sistêmico: • dependência intersetorial (foco no processo produtivo enquanto uma sequencia dependente de operações); • foco sobre a sequência de transformações por que passam os produtos; • consideração das variáveis institucionais e elementos contratuais (integração vertical é importante mecanismo de coordenação sistê- mica, mas pode ser substituída por contratos); • rede de relações complexas, não lineares (network), onde cada agente terá contatos com um ou mais agentes e, a partir do desen- volvimento eaperfeiçoamento dessas relações, poderão tornar a arquitetura do SAG mais ou menos eficiente (ZYLBERSZTAJN, 2000). Políticas Econômicas Aplicadas ao Agronegócio 17 A literatura do agronegócio é enfática sobre o equívoco em se tratar cada elo econômico de forma separada e independente. O agronegócio é um conjunto de vários elos, agentes, instituições e mecanismos de coorde- nação que não devem ser considerados isoladamente; mas, ao contrário, necessitam ser vistos como parte de um complexo ou um sistema. Essa ideia, que também está presente no próprio recorte analítico dado ao conceito de agronegócio, constitui o cerne da visão sistêmica. ASSIMILE A visão sistêmica do agronegócio implica na consideração conjunta dos diferentes elos, cadeias e sistemas que con- dicionam a produção, processamento e distribuição de um bem agropecuário, dos insumos produtivos até o bem final. Assim, implica numa visão que transpassa os limites da pro- priedade rural, envolvendo atividades industriais e de servi- ços. Também envolve elementos do ambiente institucional, organizacional e serviços de apoio. O enfoque sistêmico é um recorte analítico que permite planejamento estratégico e a análise das condições de competitividade e padrões de qualidade a partir de uma ótica abrangente sobre os fatores que podem influenciar seu desempenho. LINK A Associação Brasileira do Agronegócio (ABAG), criada em 1993, é uma entidade de suporte aos elos das cadeias pro- dutivas do agronegócio. Ela publica periodicamente notí- cias, artigos, estudos e indicadores relacionados ao setor. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DO AGRONEGÓCIO. Disponível em: <http://www.abag.com.br/>. Acesso em: 11 mar. 2018. http://www.abag.com.br/ 18 Políticas Econômicas Aplicadas ao Agronegócio 2. Considerações finais • DIFERENTES CONCEITOS: é importante dissociar o agronegócio dos conceitos de agricultura, agropecuária e agroindústria. • CONCEITO DE AGRONEGÓCIO: todas as atividades produtivas relacionadas à produção, processamento e distribuição dos bens agropecuários, podendo envolver atividades dos três macrosseto- res da economia (agropecuária, indústria e serviços). • ELOS E AGENTES: cada cadeia específica percorrida por um produto agropecuário envolve diversos elos e agentes (relacionados à pro- dução e fornecimento de insumos, produção primária agropecuária, processamento, distribuição e consumo final). • VISÃO SISTÊMICA: consideração da dependência intersetorial com outras cadeias de produto, em relações complexas e não lineares, assim como do papel das instituições, organizações e serviços de apoio. Glossário • Filière: conceito da escola de economia industrial francesa, utili- zado na literatura de organização industrial, que se refere à se- quencia de atividades que transformam uma commodity em um produto pronto para o consumidor final. Em português, utiliza-se o termo “cadeia”. (ZYLBERSZTAJN, 2000) • Commodities: termo utilizado para designar um tipo de mercadoria em estado bruto ou com um grau muito pequeno de industrialização. Considere em um sistema baseado em qualquer produto do agro- negócio de seu interesse. Identifique quais são os elos e agentes re- levantes? Quais os elementos institucionais e organizacionais que devem ser considerados? Qual a vantagem de utilizar uma visão sis- têmica para elaborar as estratégias empresariais? QUESTÃO PARA REFLEXÃO Políticas Econômicas Aplicadas ao Agronegócio 19 VERIFICAÇÃO DE LEITURA TEMA 01 1. Com relação ao conceito e recorte analítico, pode-se afir- mar que o agronegócio: a) Não pode ser confundido simplesmente com atividades do setor primário, propriamente agrícolas e pecuárias. b) Compreende atividades da agroindústria e da agricultura. c) Abrange atividades agrícolas (agro) e serviços (negócios). d) Seu conceito é usualmente empregado de forma uniforme e convergente na academia e na linguagem empresarial. e) Deve ser entendido como sinônimo de agroindústria. 2. Sobre o esquema de representação do fluxo de um produ- to em “cadeia”, pode-se afirmar que: a) Tem grande aderência à realidade, pois as relações en- tre os diferentes agentes são unidirecionais e lineares. b) Deve ser compreendida como uma abstração, pois não existe. c) Precisa ser acrescida de uma visão sistêmica, que in- corpore a interdependência com outras cadeias, assim com o papel de instituições e organizações. d) Inicia-se no consumidor e termina no produtor primário. e) Possui as mesmas etapas nos casos do grão de soja (não processado) e o óleo de soja engarrafado. 3. Não pode ser considerado um agente do sistema do agronegócio: a) Floricultor. b) Fornecedor de fertilizantes. c) Fabricante de tecidos. d) Fabricante de motor para automóveis. e) Fabricante de motor para tratores. 20 Políticas Econômicas Aplicadas ao Agronegócio Referências Bibliográficas BELIK, Walter. Agroindústria e política agroindustrial no Brasil. Dimensões do Agronegócio Brasileiro: políticas, insttituições e perspectivas. Brasília: MDA, 2007. p. 141–170. BRASIL. MINISTÉRIO DA AGRICULTURA PECUÁRIA E ABASTECIMENTO. Cadeia produ- tiva da soja. Brasília: IICA : MAPA/SPA, 2007. FRENTE PARLAMENTAR DA AGROPECUÁRIA. História da FPA. Disponível em: < http:// fpagropecuaria.org.br/historia-da-fpa/>. Acesso em: 11 mar. 2018. GUIMARÃES, Alberto P. O complexo agroindustrial. A crise agrária. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979. IBGE, Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Classificação Nacional de Atividades Econômicas - versão 2.0. Rio de Janeiro: IBGE, 2007. ________. Produto Interno Bruto dos Municípios. Série de Relatórios Metodológicos., no 29. Rio de Janeiro: [s.n.], 2004. MENDES, Judas Tadeu Grassi; JUNIOR, João Bastista Padilha. Agronegócio: uma abor- dagem econômica. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2007. RAMOS, Pedro et al. Dimensões do agronegócio brasileiro: políticas, instituições e perspectivas. Brasília: MDA, 2007. ZYLBERSZTAJN, Decio. Conceitos Gerais, Evolução E Apresentação do Sistema Agroindustrial. In: ZYLBERSZTAJN, DECIO; NEVES, MARCOS FAVA (Org.). Economia e gestão dos negócios agroalimentares. São Paulo: Pioneira, 2000. p. 1–21. Gabarito – Tema 01 Questão 1 – Resposta: A O agronegócio inclui atividades do setor primário, da indústria (agroindústria) e dos serviços. Questão 2 – Resposta: C Esta é a única alternativa que relativiza o conceito de “cadeia” dentro de um contexto mais abrangente de “sistema”. Políticas Econômicas Aplicadas ao Agronegócio 21 Questão 3 – Resposta: D Pois essa atividade não envolve o primeiro processamento de insu- mos do setor agropecuário e, ademais, seu uso final também não se destina àquele setor. Políticas Econômicas Aplicadas ao Agronegócio 22 TEMA 02 COMPETÊNCIA DO AGRONEGÓCIO BRASILEIRO Objetivos • Conceituar as expressões “antes da porteira”, “dentro da porteira” e “depois da porteira”; • Apresentar dados sobre a realidade e a evolução recente do agronegócio brasileiro; • Discutir competências e debilidades do agronegócio brasileiro. Políticas Econômicas Aplicadas ao Agronegócio 23 Introdução Para se discutir o papel da política econômica sobre um setor, é neces- sário antes entender sua realidade, incluindo suas principais debilidades e competências. Por isso, a presente aula se dedica a explorar alguns as- pectos estruturais do agronegócio brasileiro. Primeiro, discute-se a sepa- ração analítica da cadeia do sistema do agronegócio em três segmentos: “antes da porteira”, “dentro da porteira” e “depois da porteira”. Essa forma de organização do sistema se associa com os conceitos desenvolvidos na aula anterior. Em seguida, são apresentadas características estruturais importantes do agronegócio brasileiro, assim como alguns dados sobre o desempenho recente desse sistema com relação a sua produção e exportação. Por fim, discute-se, de maneira sintética, as principais competências e debilidades do agronegócio, seguindo as classificações apresentadas entre segmen- tos “antes da porteira”, “dentroda porteira” e “depois da porteira”. 1. Antes, dentro e depois da porteira Em paralelo aos conceitos discutidos na aula anterior, outras expressões são comumente utilizadas para designar as diferentes etapas produtivas do agronegócio. Um exemplo bastante utilizado envolve os termos “antes da porteira”, “dentro da porteira” e “depois da porteira”. A “porteira” refere-se aos limites da propriedade rural. Portanto, por ana- logia, o termo “dentro da porteira” é utilizado para designar as atividades primárias da produção agropecuária, desde as atividades iniciais de pre- paração até a obtenção dos produtos agropecuários in natura prontos para a comercialização. “Antes da porteira” refere-se a todas as ativida- des que precedem a atividade de produção primária dentro da cadeia do agronegócio e, conforme discutimos na aula anterior, envolve a produção de insumos (matérias-primas e bens de produção). O segmento “depois 24 Políticas Econômicas Aplicadas ao Agronegócio da porteira”, por sua vez, envolve as atividades da agroindústria e os ser- viços de armazenagem e distribuição (logística), até o produto chegar ao consumidor final. Vejamos, a seguir, cada um desses três segmentos em mais detalhes. Segundo Araújo (2013), o segmento “antes da porteira” envolve os insu- mos principais, necessários à produção agropecuária em geral, incluindo: máquinas, implementos, equipamentos e complementos; água; energia; corretivos de solos (calcário agrícola, gesso agrícola e adubos); fertilizan- tes; agroquímicos; compostos orgânicos; materiais genéticos; hormônios; inoculantes; rações; sais minerais e produtos veterinários. PARA SABER MAIS Os agroquímicos são produtos químicos, que também rece- bem as denominações de agrotóxicos, defensivos agrícolas ou biocidas, e são utilizados para combate a plantas con- correntes, pragas e doenças das plantas. Os agroquímicos mais usualmente utilizados são os herbicidas (usados para o controle de plantas invasoras ou ervas daninhas), inseti- cidas (controle de insetos, como moscas, lagartas, pulgões, etc.), acaricidas (combate a ácaros), formicidas e cupincidas (combate a formigas e cupins, respectivamente), raticidas e moluscocidas (contra ratos e moluscos, respectivamente), fungicidas (controle de fungos) e bactericidas (controle de bactérias). Fonte: Araújo (2013, p. 36). O segmento “antes da porteira” é normalmente caracterizado por pou- cas e grandes empresas, em geral em relação de oligopólio ou monopó- lio, capazes de influir nos preços e quantidades dos produtos ofertados. (ARAÚJO, 2013) Políticas Econômicas Aplicadas ao Agronegócio 25 Nesse segmento, há também agentes prestadores de serviços, como aque- les relacionados a pesquisas agropecuárias; assistência técnica; elaboração de projetos; análises laboratoriais; crédito e financiamentos; vigilância e de- fesa agropecuária; proteção e defesa ambiental; incentivos fiscais; infraes- trutura; treinamento de mão de obra, entre outros. (ARAÚJO, 2013) O segmento “dentro da porteira”, por sua vez, abrange tanto a produção agrícola, ou seja, as atividades desenvolvidas no campo, necessárias ao preparo de solo, tratos culturais, colheita, transporte e armazenagem in- ternos, como também a produção pecuária (genética, alimentação e ma- nejo de rebanhos). (ARAÚJO, 2013) Algumas dificuldades podem emergir dessa classificação. Por exemplo, se as atividades “dentro da porteira” são basicamente aquelas associadas à produção dos bens agropecuários in natura, como então devem ser classi- ficadas as atividades da agroindustrialização verticalizada, ou seja, o pro- cessamento de produtos que ocorre dentro das fazendas? Esse é o caso de laticínios, do fumo em corda, açúcar, rapadura, cachaça, álcool, doces, polpas de frutos e outros, quando estes produtos já saem processados das fazendas. Segundo Araujo (2013), essas atividades devem ser consi- deradas como integrantes do segmento “depois da porteira”, pois, apesar de ocorrerem dentro dos limites da propriedade rural, constituem uma etapa posterior à agropecuária, com características bastante diferencia- das do processo de produção primária. O segmento “dentro da porteira” é caracterizado por numerosos produ- tores rurais, predominantemente pequenos, dispersos territorialmente e com pouca estrutura de representação ou organização, de forma que não têm capacidade de determinar os preços dos seus próprios produtos (no campo da economia, se diz que os produtores são “tomadores de preços” dos demais segmentos). (ARAÚJO, 2013, p. 71) Por fim, o segmento “depois da porteira” envolve atividades relaciona- das à industrialização, comercialização e serviços pós-produção. Os produtos agropecuários seguem por diversos caminhos até chegar aos 26 Políticas Econômicas Aplicadas ao Agronegócio consumidores, tanto na forma in natura como processados, beneficiados ou transformados. Os intermediários incluem atacadistas, centrais de abastecimentos e bolsas de mercadorias, pontos de venda (mercadinhos, armazéns, conveniências, sacolões), feirantes, exportadores, grandes su- permercados, etc. PARA SABER MAIS A diferença entre beneficiamento, processamento e trans- formação segundo Araújo (2013): Beneficiamento: O beneficiamento de produtos agrope- cuários significa dar-lhes um tratamento (melhorar sua for- ma de apresentação) sem alterar-lhes as características de produtos in natura. Por exemplo, nas operações de seleção, classificação, lavagem, polimento, embalagem e outras, a qualidade do produto não muda, apenas sua aparência. Processamento: Envolve cuidados especiais, que tornam os produtos mais prontamente disponíveis aos consumi- dores e garantem-lhes melhor qualidade. Por exemplo, pasteurização do leite, pré-preparo de alguns alimentos (ex: água de coco natural envasada), cortes de carne in na- tura, entre outros. Transformação: Consiste nas operações de obtenção de pro- dutos diferentes, com base em produtos in natura, processa- dos ou semitransformados. Por exemplo, produção de quei- jos e laticínios (com base do leite in natura); fabricação de cachaça (a partir do caldo de cana-de-açúcar fermentado) e obtenção de carnes processadas (bacon, salsichas, presun- tos, etc.). Políticas Econômicas Aplicadas ao Agronegócio 27 As várias intermediações nos estágios pós-produção explicam, ao menos em parte, a grande diferença entre os preços recebidos pelos produto- res e os pagos pelos consumidores finais (podendo chegar a variações superiores a 1.000%). A cada intermediação, o preço costuma ser alte- rado mesmo sem sofrer nenhum tipo de transformação, apenas com a imputação de custos comerciais e lucros dos intermediários, denominado margem de comercialização. Essa margem tende a variar de forma direta- mente proporcional ao tamanho e inversamente proporcional ao número de intermediários no mercado (ARAÚJO, 2013). EXEMPLIFICANDO A Figura 1 ilustra, simplificadamente, algumas cadeias de produtos do agronegócio, organizadas segundo as etapas “antes, dentro e depois” da porteira. Figura 1. Etapas “antes”, “dentro” e “depois” da porteira de cadeias selecionadas do agronegócio Fonte: Elaboração própria a partir de relatório CEPEA (2017). Fibras naturais óleo de algodão Açúcar Anidro Hidratado Óleo Farelo Leite Pausterizado Leite UHT Queijo Pó integral Manteiga Pluma Caroço Cana-de-Açúcar Soja em grãos Leite Cru Fertilizantes Defensivos Óleo Diesel Fertilizantes Defensivos Óleo Diesel Fertilizantes Defensivos Óleo Diesel Sementes Óleo Diesel Sal mineral Ração Medicamentos ALGODÃO CANA DE ACÚCAR SOJA BOVINO- CULTURA DE LEITE D EP O IS D A P O RT EI RA (s er vi ço s) (i nd ús tr ia ) D EN TR O D A PO RT EI RA (p ri m ár io ) A N TE S D A PO RT EI RA (in su m os ) comércio, transporte e demais serviços de distribuição 28 Políticas Econômicas Aplicadas ao Agronegócio Isso pode explicar porque parte substancial do valor global gerado ao longoda cadeia do agronegócio não ocorre dentro da porteira agrícola, mas fora dela, em especial na fase de processamento e distribuição (ARAÚJO, 2013). Segundo Mendes e Junior (2007), a partir de dados do Banco Mundial e do Harvard Business Seminar, em 2005, apenas um quinto do valor global do agronegócio mundial era gerado “dentro da porteira”, ou seja, den- tro da propriedade rural. As fases de processamento e distribuição, que equivaliam a 70% do valor total do agronegócio naquele ano, tendem a continuar crescendo mais que as demais etapas da cadeia, atingindo, de acordo com as estimativas dos autores, 80% por volta de 2025 (ver Tabela 1). Segundo os autores, as mudanças de gosto e preferências dos consu- midores e as alterações tecnológicas nos processos produtivos, especial- mente no setor “depois da porteira”, são fatores que contribuem para ex- plicar as tendências observadas e esperadas no sistema de agronegócios. (MENDES; PADILHA, 2007) Tabela 1. Dados e estimativa dos valores da produção do agronegócio mundial, por segmento. Fonte: Mendes e Padilha (2007, p. 52). 2. Características e competências do agronegócio brasileiro 2.1. A produção do agronegócio brasileiro Segundo o Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (CEPEA), em 2017, o valor total do produto interno bruto (PIB) do agronegócio bra- sileiro, medido em termos correntes, foi de R$ 1,28 trilhões. Esse valor equivale a 20% do PIB brasileiro. Segmentos *Estimativas. Antes da porteira Dentro da porteira Depois da porteira total 250 480 1.270 2.000 330 630 2.040 3.000 1.074 1.855 6.835 9.764 1.184 1.315 10.653 13.152 13% 24% 64% 100% 11% 21% 68% 100% 11% 19% 70% 100% 9% 10% 81% 100% US$ bilhões % US$ bilhões % US$ bilhões % US$ bilhões % 1980 1990 2005 2025* Políticas Econômicas Aplicadas ao Agronegócio 29 Ao longo dos 20 anos compreendidos entre (1996-2016), essa participa- ção decresceu de 28% para 20%. Isso porque, enquanto o PIB agregado cresceu, em média e em termos reais, 2,4% ao ano, o agronegócio cresceu apenas 0,5% ao ano (ver Gráfico 1). Gráfico 1. PIB do agronegócio como proporção do PIB brasileiro (%), 1996-2016 Fonte: CEPEA e IBGE - Contas Nacionais A consideração do PIB do agronegócio, em termos agregados, esconde in- formações importantes sobre o desempenho dos diferentes segmentos: insumos, agropecuária, indústria e serviços. Em primeiro lugar, é importante ter em mente que o segmento “dentro da porteira”, que equivale à agropecuária, representa 26% da produção total do agronegócio brasileiro (ver Gráfico 2). Os insumos representam ape- nas 5%. A agroindústria e serviços de apoio ao agronegócio representam juntos cerca de 69% do valor total. 30 Políticas Econômicas Aplicadas ao Agronegócio Gráfico 2.Composição do PIB do agronegócio brasileiro, em 2017 FONTE: CEPEA e IBGE - Contas Nacionais Em segundo lugar, a evolução recente de cada uma dessas atividades tem seguido tendências distintas. O Gráfico 3 mostra essa diferença de de- sempenho em valores reais (a preços de 2017). Pode-se ver que os serviços do agronegócio se mantiveram praticamente estagnados, em torno de R$ 500 bilhões ao longo do período analisado. A agroindústria foi o segmento com pior desempenho, tendo sofrido uma retração real de 7,5% no período: o valor do seu produto passou de cerca de R$ 400 bilhões, na média entre 1996 e 1999, para R$ 370, na média entre 2015 e 2017. Por outro lado, foi positivo o desempenho dos insumos e principalmente das atividades agropecuárias. Estas últimas dobraram de valor ao longo do período (crescimento de 100% em termos reais), atingindo, em 2017, o valor de R$ 338 bilhões. Políticas Econômicas Aplicadas ao Agronegócio 31 Gráfico 3. PIB do agronegócio brasileiro, 1996 a 2017, em milhões de 2017 FONTE: CEPEA e IBGE - Contas Nacionais Portanto, ao longo desse período de 20 anos (1996-2016), a participação do segmento agropecuário dentro do PIB total do agronegócio brasileiro tem sido crescente (de 14% para 26%). A participação dos insumos passou de 2% para 5%; a agroindústria diminuiu de 37% para 28% e os serviços também caíram de 46% para 41%. É interessante observar que essa evolução do segmento Produção Agropecuária no Brasil não acompanhou a tendência mundial de perda sig- nificativa de participação no PIB do agronegócio. Isso revela atraso do país nos segmentos agroindustrial e distribuição, em relação ao desempenho médio mundial. (ARAÚJO, 2013, p. 154) Pode-se dizer que essa particularidade brasileira revela também o bom desempenho e competitividade do setor agropecuário mediante os de- mais segmentos do setor. O Gráfico 4 mostra como se distribui a produção de importantes cadeias do agronegócio brasileiro. Pode-se observar que algumas têm a maior parte do seu valor de produção concentrada nas etapas de produção pri- mária e serviços, como a soja e o leite. A carne também obtém maior parte do seu produto na etapa de produção primária, embora tanto as etapas da agroindústria como de serviços têm participação significativa. 600.000 500.000 400.000 300.000 200.000 100.000 - Insumos Indústria ServiçosAgropucuária 1996 1998 2000 2002 2004 2006 2008 2010 2012 2014 2016 32 Políticas Econômicas Aplicadas ao Agronegócio Outras cadeias têm grande geração de valor nas etapas de processamen- to industrial, como a cana de açúcar e o algodão. Gráfico 4. PIB do agronegócio das cadeias selecionadas, 2017 (R$ milhões) Fonte: Elaboração própria a partir de relatório CEPEA (2017). 2.2. Exportações e balança comercial do agronegócio brasileiro Do ponto de vista do comércio exterior, o desempenho do agronegócio brasileiro é bastante favorável. Como ilustrado na Tabela 2, as exporta- ções do agronegócio totalizaram quase US$ 85 bilhões em 2016, equi- valente a 46% do total das exportações brasileiras. As importações, por outro lado, são significativamente menores, cerca de US$ 13,6 bilhões, representando cerca de 10% do total importado no mesmo ano. Tabela 2. Exportações, importações e saldo da balança comercial total e do agronegócio no Brasil, 2015 e 2016, US$ milhões Fonte: Brasil (2018a). 90.000 75.000 60.000 45.000 30.000 15.000 algodão Insumos Indústria ServiçosProdução Primária cana soja carne leite 0 Total Brasil 191.134 171.449 19.685 Exportações Importações Saldo 2015 2015 20152016 2016 2016 185.235 137.552 47.683 Demais Produtos Agronegócio Participação % 102.910 88.224 158.376 13.073 (55.466) 75.151 46,2 7,6 100.301 84.935 123.924 13.628 (23.624) 71.307 45,9 9,9 Políticas Econômicas Aplicadas ao Agronegócio 33 Como resultado, a contribuição do agronegócio para o saldo comercial brasileiro é positiva e bastante expressiva: em 2016, foi de US$ 71 bilhões – valor suficiente para cobrir o déficit comercial dos demais produtos (US$ 23,6 bilhões) e ainda gerar considerável superávit na balança comercial (de US$ 47,7). Os produtos do agronegócio com maior participação na pauta de expor- tações brasileiras estão listados na Tabela 3. O complexo de soja repre- senta 30% do total; o complexo da carne, 17%; o sucroalcooleiro, 13%; e produtos florestais 12%. Tabela 3. Principais produtos do agronegócio exportados pelo Brasil em 2016 Fonte: Brasil (2018a). O resultado expressivo da balança comercial do agronegócio depende basicamente de commodities como açúcar, café, soja, frutas, etc. ou de produtos intermediários ou não acabados, como farelo de soja, sucos concentrados, frangos e carnes congelados etc. Isso significa que a maior agregação de valor ocorre fora do país. (ARAÚJO, 2013) A distribuição das exportações agropecuárias entre produtos primários e processados mudou ao longo da última década. Em 2007, essa distri- buição era semelhante ao do comércio mundial, que é caracterizado por uma maior concentração em produtos processados (69%). Entre 2007 e 34 Políticas Econômicas Aplicadas ao Agronegócio 2016, porém, a participação dos produtos primários na pautaexportado- ra brasileira subiu de 31% para 44% - de forma correspondente, a parti- cipação dos produtos agropecuários processados caiu de 69% para 56%. (BRASIL, 2018b) Isso significa que a pauta de exportações do agronegócio está se tornan- do mais primária, com elevação das exportações de grãos. Enquanto que as vendas externas brasileiras cresceram 59 % entre 2007 e 2016, as ex- portações de grãos foram de 144% no mesmo período. Destaca-se ainda a exportação de grãos de soja, que cresceu ainda mais no período: 188%. Esse desempenho está fortemente relacionado com mudanças nos mer- cados externos para os quais se destinam as exportações brasileiras. A União Europeia, que por longo tempo foi a principal importadora dos produtos da agropecuária brasileira, perdeu a liderança para a China em 2013. Em 2010, a União Europeia comprava 22,3% das exportações brasi- leiras e a China, 14,6%. Em 2016, essas cifras praticamente se inverteram: a China responde por 24,9% das vendas externas brasileiras, e a União Europeia 18,7% (BRASIL, 2018b). A mudança de participação dos parceiros comerciais no total das exporta- ções brasileiras é relevante na medida em que cada país possui diferentes composições de pautas de comércio. A China, por exemplo, tem a maior parte das suas compras concentradas em um único setor (o complexo da soja) e preferencialmente de grãos in natura. Já a União Europeia tem uma pauta mais diversificada, com demanda maior por produtos processados do agronegócio. (BRASIL, 2018b) Somente a China e a União Europeia foram responsáveis por 43,6% do to- tal das exportações agropecuárias brasileiras em 2016. Outros parceiros comerciais importantes são os Estados Unidos (cuja participação naquelas exportações foi de 5,1%), além de Japão, Rússia, Arábia Saudita, Coreia do Sul, Hong Kong e Irã (cujas participações foram próximas de 3,0% cada). (BRASIL, 2018b, p. 26) Políticas Econômicas Aplicadas ao Agronegócio 35 2.3. Competências do agronegócio brasileiro No segmento “antes da porteira”, uma importante competência do agro- negócio brasileiro é a pesquisa agropecuária, com predomínio da atuação governamental. Entre suas realizações estão tecnologia para incorpora- ção dos cerrados e a engenharia de ponta, como engenharia genética, tecnologias agroindustriais, embalagens e outras. Entre os pontos carentes de melhorias, está a escassa pesquisa compa- tível com sustentabilidade ambiental (proteção à biodiversidade vegetal e animal); a ausência de autossuficiência em insumos tradicionais, como adubos fosfatados e potássicos, produtos veterinários, agrotóxicos, en- tre outros; os escassos financiamentos púbicos para pesquisa; o difícil acesso a financiamentos bancários; a precária infraestrutura em regiões mais distantes dos centros urbanos e política de transporte rodoviário de longas distâncias, responsáveis por elevar o “custo Brasil” e dificultar a competitividade de todo o agronegócio. (ARAÚJO, 2013, p. 155-158) No segmento “dentro da porteira”, o Brasil iniciou o século XXI como o maior produtor mundial de açúcar, de café, de laranja, de soja e de frutas em geral, segundo maior produtor de milho e de frangos e maior expor- tador de carnes (aves, suínos e bovinos). Os dados de produtividade confirmam essa alta competência da produção agropecuarista brasileira. Araújo (2013) mostra que, nos 24 anos compre- endidos entre 1989 e 2012, o Brasil praticamente dobrou sua produtivida- de das principais culturas, o que é um resultado expressivo considerando que esses dados incluem culturas tradicionais. ASSIMILE A pauta de exportações brasileiras concentrada em bens não processados está muito relacionada ao tipo de inserção internacional da economia brasileira, com destaque para o crescente papel da China no destino das exportações e seu perfil de grande demandante de commodities. 36 Políticas Econômicas Aplicadas ao Agronegócio Outra dificuldade relatada por Araújo inclui a compressão dos ganhos re- ais dos agropecuaristas, que decorre de dois fatores: por um lado, a re- dução nos preços recebidos por seus produtos (que, em parte, está asso- ciado ao baixo poder de barganha de agropecuaristas frente aos demais segmentos da cadeia do agronegócio) e, por outro, a elevação nos custos de produção. Estes custos incluem o elevado patamar dos juros de finan- ciamentos bancários, elevação da carga tributária e dos encargos sociais, elevação dos preços de insumos básicos (como fertilizantes, agrotóxicos, produtos veterinários e outros), da mão de obra, dos investimentos (má- quinas e equipamentos), etc. (ARAÚJO, 2013) A compressão dos rendimentos reais obtidos “dentro da porteira” gerou a constante busca de modernização, visando ganhos de produtividade. Estes, por sua vez, ocorreram com custo econômico e social elevado, com a exclusão de parte dos pequenos produtores e dos menos eficientes. (ARAÚJO, 2013) No segmento “depois da porteira”, destaca-se o escoamento da produção para o mercado externo de grande variedade de produtos, sendo o agro- negócio brasileiro altamente competitivo em quase todos eles. O país é altamente competente na produção para exportação de bens como soja, frutas, (uva, manga, melão e outras), carnes (frangos, suínos e bovinos), sucos concentrados (principalmente de laranja), entre outros. Ademais, como vimos, a balança comercial desses bens da agropecuária é usualmente positiva e expressiva, contribuindo para o equilíbrio das con- tas externas da economia brasileira. Por outro lado, há muitos desafios para avançar no segmento “pós-por- teira”. Em primeiro lugar, reforça-se a ideia de que a agroindustrialização é pouco expressiva no país, dado o elevado potencial da produção primá- ria. As atividades de processamento existentes ocorrem mais no segmen- to da agricultura do que na pecuária. Praticamente todos os produtos da pecuária são comercializados como commodity e é bastante escasso o emprego de alguns diferenciais para elevação dos preços, como certifica- dos de origem, diferencial de qualidade, inclusão em cotas, etc. Políticas Econômicas Aplicadas ao Agronegócio 37 Outros fatores de debilidade, já abordados nos demais segmentos, mas que também têm sua importância na etapa pós-produção, são a infraes- trutura precária e insuficiente, e o alto “custo Brasil”. (ARAÚJO, 2013) LINK O Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (CEPEA) é parte do Departamento de Economia, Administração e Sociologia da Escola Superior de Agronomia “Luiz de Queiroz” (Esalq), da Universidade de São Paulo (USP). O site do gru- po de pesquisas contém estudos, estatísticas e notícias rela- cionadas ao agronegócio brasileiro. Disponível em: <https:// www.cepea.esalq.usp.br/br>. Acesso em: 20 maio 2018. 3. Considerações finais • ANTES DA PORTEIRA: as atividades que precedem a atividade de produção primária dentro da cadeia do agronegócio. • DENTRO DA PORTEIRA: tanto a produção agrícola como a pecuária. • DEPOIS DA PORTEIRA: atividades relacionadas à industrialização, comercialização e serviços pós-produção. Pense em que medida as competências e debilidades do agronegócio brasileiro, discutidas nessa aula, decorrem da capacidade do empre- sário individual ou então se devem à estrutura e contexto econômico em que as firmas operam. A partir dessa reflexão, você conseguiria antecipar a importância e o papel das políticas econômicas aplicadas ao setor? QUESTÃO PARA REFLEXÃO https://www.cepea.esalq.usp.br/br https://www.cepea.esalq.usp.br/br 38 Políticas Econômicas Aplicadas ao Agronegócio • PRODUÇÃO DO AGRONEGÓCIO BRASILEIRO: representa cerca de 20% do PIB, dos quais quase 70% correspondem às atividades da agroindústria e dos serviços. Ao contrário da tendência mundial, tem crescido, ao longo das últimas duas décadas, a participação da agropecuária no total da produção do agronegócio. • EXPORTAÇÕES DO AGRONEGÓCIO BRASILEIRO: exportações e superávit comercial do agronegócio são muito expressivos, mas baseiam-se principalmenteem produtos não processados. • COMPETÊNCIAS DO AGRONEGÓCIO BRASILEIRO: pesquisa agro- pecuária, alta produtividade da produção agropecuarista, alta competitividade da produção e bom desempenho das exportações de alguns bens in natura ou pouco processados (como soja, frutas, carnes, sucos concentrados, etc.). • DEBILIDADES DO AGRONEGÓCIO BRASILEIRO: desarticulação e desor- ganização dos pequenos produtores no segmento agropecuário, baixo aproveitamento do potencial de agroindustrialização, infraes- trutura precária e insuficiente, alto “custo Brasil”, esforços de pesquisa insuficientes no âmbito da sustentabilidade ambiental, dificuldade de financiamento a pesquisas e de acesso ao crédito bancário. Glossário • Monopólio: controle exclusivo da produção e comercialização de um produto ou serviço por um único vendedor, podendo influen- ciar ou determinar preços e quantidades. • Oligopólio: controle da produção e comercialização de um produ- to ou serviço por parte de alguns poucos vendedores, sendo que estes podem influenciar ou determinar preços e quantidades. • In natura: termo utilizado no ramo do agronegócio para se referir a um produto no seu estado natural, ou seja, que não foi objeto de processamento industrial. Políticas Econômicas Aplicadas ao Agronegócio 39 VERIFICAÇÃO DE LEITURA TEMA 02 1. É comum a utilização da “porteira” para delimitar e designar diferentes segmentos da atividade dos agronegócios. Assinale a alternativa que emprega corretamente esse termo: a) O segmento “antes da porteira” corresponde ao setor primário da economia. b) O segmento “dentro da porteira” envolve as atividades de produção de insumos, criação de rebanhos e produ- ção de lavouras. c) A atividade de processamento que ocorre dentro da fa- zenda deve ser considerada parte do segmento “den- tro da porteira”. d) O segmento “depois da porteira” inclui os serviços ar- mazenagem e distribuição dos produtos de origem agropecuária. e) Na cadeia da bovinocultura de leite, a produção de lei- te cru pode ser considera uma atividade do segmento “depois da porteira”. 2. Sobre a evolução da participação da agropecuária no total da produção do agronegócio ao longo das últimas déca- das, é correto afirmar que: a) No mundo, a tendência é de queda nessa relação, devi- do à crescente participação do setor agropecuário em incorporar tecnologia, gerar inovações e apropriar va- lor dentro da cadeia. b) No Brasil, a tendência é de aumento, devido à crescen- te participação relativa na produção de cana de açúcar, que é especialmente centrada na geração de produto na etapa “dentro da porteira”. 40 Políticas Econômicas Aplicadas ao Agronegócio c) No mundo, a tendência é de crescimento dessa rela- ção, devido à grande capacidade dos agricultores e agropecuaristas em se apropriar de valor dentro da ca- deia frente aos demais agentes de “antes” e “depois” da porteira. d) No Brasil, a tendência é de crescimento, devido à gran- de competência relativa da produção primária e ao desempenho menos favorável da agroindústria e dos serviços vinculados ao agronegócio, sobretudo no seg- mento “depois da porteira”. e) No Brasil, a tendência é de queda, devido à compres- são dos rendimentos dos agropecuaristas. 3. Assinale abaixo uma competência do agronegócio no seg- mento “pós-porteira”: a) Exportação de produtos agropecuários básicos. b) Pesquisa em engenharia genética. c) Alto “custo Brasil”. d) Inserção no comércio internacional caracterizada por pauta de exportação intensiva em produtos com alto valor agregado. e) Produção de soja de alta produtividade. Referências bibliográficas ARAÚJO, Massilon J. Fundamentos de Agronegócios. 4a edição ed. São Paulo: Atlas, 2013. BRASIL - MINISTÉRIO DA AGRICULTURA PECUÁRIA E ABASTECIMENTO. Agrostat: es- tatísticas de comercio exterior do agronegócio brasileiro. 2018a. Disponível em: <http://sistemasweb.agricultura.gov.br/pages/AGROSTAT.html>. . Intercâmbio Comercial do Agronegócio : principais mercados de desti- no. Brasília: [s.n.], 2018b. http://sistemasweb.agricultura.gov.br/pages/AGROSTAT.html Políticas Econômicas Aplicadas ao Agronegócio 41 CENTRO DE ESTUDOS AVANÇADOS EM ECONOMIA APLICADA - ESALQ/USP. PIB Cadeias do Agronegócio. Piracicaba: [s.n.], 2017. MENDES, Judas Tadeu Grassi; JUNIOR, João Bastista Padilha. Agronegócio: uma abor- dagem econômica. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2007. Gabarito – Tema 02 Questão 1 – Resposta: D Tanto os serviços de armazenagem como de distribuição de bens agropecuários podem são classificados como “depois da porteira”. Questão 2 – Resposta: D A alternativa A não explica corretamente o porquê da relação de- crescente no mundo. A alternativa B está errada, pois a produção de cana de açúcar gera mais produto na etapa da agroindústria do que na produção primária (conforme ilustrado no Gráfico 4). A letra C está errada, pois a tendência no mundo é de decrescimento da re- lação. A letra E está errada, pois, no Brasil, a tendência é de aumento na relação. Questão 3 – Resposta: A Única alternativa que expressa um ponto forte do segmento “pós- -porteira”, mais especificamente relacionado ao escoamento da pro- dução para consumo final ou processamento em mercados externos. Políticas Econômicas Aplicadas ao Agronegócio 42 TEMA 03 FUNDAMENTOS EM POLÍTICA MACROECONÔMICA: AS POLÍTICAS FISCAL E MONETÁRIA Objetivos • Introduzir definições, objetivos e instrumentos das políticas macroeconômicas fiscal e monetária; • Discutir os canais pelos quais essas políticas macroe- conômicas afetam os sinais recebidos pelos agentes econômicos; • Inferir como essas medidas de política macroeconô- mica podem afetar os agentes participantes da cadeia do agronegócio. Políticas Econômicas Aplicadas ao Agronegócio 43 Introdução As políticas macroeconômicas têm grande impacto sobre as condições gerais da produção, uma vez que determinam ou influem fortemente na formação dos preços básicos da economia. Além de afetarem os preços relativos, influenciam também a formação dos custos básicos de produ- ção, a rentabilidade de diferentes setores, as opções tecnológicas, a dis- ponibilidade de recursos, o grau de proteção efetiva, o custo de oportu- nidade na alocação de recursos, a estrutura da distribuição de renda, o aquecimento do mercado interno e o ritmo de crescimento, assim como as expectativas futuras dos agentes. A política fiscal também afeta a dis- ponibilidade e qualidade da infraestrutura. Portanto, argumenta-se que a concepção e orientação das políticas ma- croeconômicas têm grande influência sobre os parâmetros básicos que condicionam e orientam as decisões dos produtores, sua capacidade de implementá-las e os resultados auferidos. Os principais instrumentos de regulação macroeconômica são: i) a política fiscal e tributária; ii) a política monetária; e iii) a política cambial. A seguir, iremos discutir as duas primeiras modalidades de política econômica, en- quanto que a última será tema da próxima aula. 1. Política fiscal e tributária A política fiscal envolve medidas sobre arrecadação (tributação) e gastos do setor público. Ela será expansionista ou contracionista a depender de seus efeitos serem de estímulo ou de inibição das decisões de gastos no setor privado. Em termos correntes e informais, diz-se que uma política fiscal é expan- sionista quando há ampliação nos gastos (correntes ou de investimento) ou então quando há redução nos volumes arrecadados por tributação. 44 Políticas Econômicas Aplicadas ao Agronegócio Em termos mais rigorosos, contudo, a política fiscal somente é conside- rada expansionista quando há ampliação do déficit (ou redução do saldo) público - portanto, quando há uma mudança, em termos líquidos, na con- ta do governo. 1.1. Arrecadação fiscal e política tributária A principal fonte de arrecadação de recursos fiscais é pela tributação. São três os tipos de tributo: • Taxas: exigências financeiras pelo governo relacionadas à oferta de certosserviços fundamentais ou ao exercício do poder de polí- cia. Assim, implica uma relação direta entre benefício e despesa, e entre contribuinte e poder público. Ou seja, o contribuinte faz um pagamento ao poder público em troca de um benefício direto. Exemplos: Taxa de Iluminação Pública, Taxa de Coleta de Lixo, Taxa de Licenciamento de Veículos. • Contribuições: tributos destinados a custear serviços públicos rece- bidos diretamente pelo contribuinte. A contribuição difere da taxa na medida em que a última refere-se a serviços imediatos pres- tados pelo setor público, enquanto que a contribuição refere-se a serviços prestados no futuro ou no passado. Existem dois tipos de contribuições: contribuições sociais, que custeiam a assistência médico-hospitalar e de aposentadoria do contribuinte, e contribui- ções de melhoria, que se referem a melhorias de infraestrutura. • Impostos: tributo que tem como fato gerador um fenômeno eco- nômico independente de qualquer atividade estatal. Cobra-se uma parcela das transações econômicas para custear a produção de bens e serviços oferecidos a toda a coletividade (BACHA, 2004, p. 34). Há impostos diretos e indiretos. Os impostos diretos são aqueles que inci- dem sobre a renda ou sobre o patrimônio dos indivíduos ou firmas. Como exemplos, podem ser citados o Imposto de Renda sobre Pessoa Física Políticas Econômicas Aplicadas ao Agronegócio 45 (IRPF) e sobre Pessoa Jurídica (IRPJ), Imposto sobre Propriedade Territorial Rural (ITR), o Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) e o Imposto so- bre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA). Os impostos indiretos são aqueles cobrados nas transações econômi- cas e repassados aos preços de bens e serviços, como o Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços de Transportes e Comunicações (ICMS) e o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). Segundo dados do Ministério da Fazenda, em 2014, a carga tributária do setor público consolidado (que considera os três entes federativos: muni- cípios, estados e união) era composta em 51% de impostos, 44% de contri- buições e 3% de taxas (além de 2% de outras modalidades de tributação). Os principais impostos incidentes sobre as atividades agropecuárias são o ICMS, o ITR e o IR (BACHA, 2004, p. 35). 1.2. Gastos fiscais Os gastos do governo são tidos como os instrumentos mais eficazes para afetar a atividade econômica. Isso porque, ao aumentar os gastos, por exemplo, o governo está entrando diretamente no mercado e aumentan- do suas compras de bens e serviços; ou está, via pagamento do funciona- lismo, estimulando indiretamente o aumento de gastos. Fazem parte dos gastos do governo: investimentos públicos e gastos cor- rentes. Os últimos incluem gastos com previdência social, assistência so- cial, educação, saúde, trabalho e emprego, políticas de habitação e sane- amento, além de toda a burocracia das administrações estatais. A política fiscal tem flexibilidade limitada. Como regra, as alterações na área fiscal, tanto gastos como impostos, têm que ser planejados no ano anterior e aprovados pelos respectivos poderes legislativos, em muitos casos, com um ano de antecedência. Ademais, certos limites mínimos e máximos de despesas nos orçamentos estão definidos por leis, sendo o maior exemplo a Constituição Federal de 1988. 46 Políticas Econômicas Aplicadas ao Agronegócio O regime fiscal vigente no Brasil desde 1999 também acaba limitando a flexibilidade da política fiscal. Tal regime consiste no anúncio de uma meta anual e positiva de superávit primário. Portanto, dada a arrecadação pre- vista para o período, os gastos devem se ajustar de forma a garantir a meta almejada. PARA SABER MAIS A Lei de Responsabilidade Fiscal sancionada em 2000, por FHC, determina que o presidente, governadores e prefeitos tenham compromisso com orçamento e com metas, que devem ser apresentadas e aprovadas pelo respectivo Poder Legislativo. Também estabelece limites para gastos com pessoal e para o aumento da dívida pública. A LRF também foi um mecanismo para ajudar no cumprimento das metas de superávit primário e, desta forma, apoiar o funcionamento do regime fiscal ado- tado em 1999. Fonte: Ministério do Planejamento. 1.3. Quais seriam as medidas da política fiscal e tributária que poderiam beneficiar o produtor do agronegócio? • Isenção fiscal: quando há a desobrigação do pagamento de certos impostos. Ex: isenção do pagamento do Imposto de Renda, do ICMS e do IPI nas operações de exportação de produtos agrícolas, visan- do reduzir o valor exportado. Vejamos um exemplo de como a isenção fiscal pode beneficiar o produ- tor. Suponha que o preço ao consumidor seja definido pelas condições de mercado, e que o produtor seja apenas “tomador de preços”, sendo incapaz de repassar variações de custos para os preços finais. Nesse caso, qual seria o efeito de uma redução da alíquota de imposto? A taxa líquida de imposto é aplicada ao preço bruto cobrado do consumidor, e aumenta o preço líquido recebido pelo produtor. Políticas Econômicas Aplicadas ao Agronegócio 47 • Incentivo fiscal: quando o Imposto de Renda pago por certa empre- sa ou pessoa física em uma região retorna a essa pessoa, desde que a mesma aporte esse recurso em investimentos realizados em outra região ou atividade (BACHA, 2004). Esse recurso é utilizado atualmente para estimular o desenvolvimento regional. • Investimentos públicos em infraestrutura e outros bens públicos, que podem reduzir o “custo Brasil”. Além dos tópicos destacados acima, a política fiscal também afeta o setor através de vários canais, entre os quais: a política de preços e tarifas de serviços públicos; subsídios; estrutura de gastos do setor público (além dos investimentos, gastos correntes, apoio à pesquisa tecnológica e difu- são de tecnologia, etc.); utilização de políticas de rendas. A política fiscal é um lócus de conflito pela apropriação dos recursos fis- cais disponíveis. A alocação desses recursos responde a procedimentos e pressões de caráter político, que podem (ou não) entrar em contradição com as prioridades definidas tecnicamente e com o manejo da política setorial em função dos objetivos e estratégias traçadas para o desenvol- vimento do setor. É nesse sentido que atuam os lobbies dos diferentes setores da economia que buscam influenciar o processo orçamentário e a formulação das políticas econômicas e setoriais. (BUAINAIN, 2007) EXEMPLIFICANDO Supondo uma alíquota inicial de 5% e o preço ao consumidor final de R$ 100, o produtor receberia, em termos líquidos, R$ 95. Se a alíquota de imposto baixar para 2%, o preço recebido pelo produtor se eleva para R$ 98. Portanto, quando varia a alíquota de impostos, é possível alterar o preço recebido pelo produtor, mantendo-se fixo o preço cobrado do consumidor. 48 Políticas Econômicas Aplicadas ao Agronegócio 2. Política monetária A política monetária diz respeito às medidas do governo destinadas ao controle da liquidez, da estabilidade e das condições gerais de financia- mento na economia. Um instrumento muito comum de política monetária envolve a manipu- lação da taxa básica de juros da economia, a taxa SELIC, que serve de referência para as demais taxas de juros da economia. O governo opera no mercado primário de reservas bancárias (mercado interbancário) para perseguir sua meta para a taxa SELIC. Esta última é denominada “básica”, pois é o preço pago pelos bancos para obter financiamento em última ins- tância, cobrindo eventuais desequilíbrios de caixa. Assim, o governo ajus- ta o “preço do aluguel” do dinheiro (ou da moeda) dentro da economia, podendo torná-lo mais caro, e desta forma reduzindo a atividade econô- mica; ou mais barato, estimulando-a. Por isso, quando o governo opera de forma a elevar a taxa de juros, diz-se que a política monetária é con- tracionista. Quando o governo reduz a taxa de juros, a política monetária tem viés expansionista. Vale ressaltar que a política monetária é de uso exclusivodo governo federal e é executado pelo Banco Central do Brasil. O mecanismo que permite o controle da liquidez na economia segue a seguinte racionalidade. Considera-se, simplificadamente, que os agentes econômicos podem alocar sua riqueza financeira em duas formas alter- nativas: títulos ou moeda. Os títulos geram rendimentos, que (também para efeitos de simplificação) equivalem ao valor da taxa de juros básica da economia. Porém, esses ativos detêm menor liquidez quando com- parados à moeda. Isso significa que eles “demoram mais” para serem convertidos em capacidade de poder de compra e, portanto, em bens de consumo ou de investimento. Ademais, essa conversão pode incorrer em perdas. Por outro lado, a moeda, embora não gere rendimentos (poden- do inclusive incorrer em perdas reais, decorrentes de uma inflação positi- va, por exemplo), constitui um ativo de elevada liquidez - ou seja, de alta e imediata aceitação nas transações. Políticas Econômicas Aplicadas ao Agronegócio 49 Segundo a teoria monetária, a decisão sobre a quantidade de moeda ou de títulos que os agentes escolhem manter depende então da taxa de juros – que, ao definir a taxa de remuneração para o detentor de títulos, estabelece também o custo de oportunidade de reter a riqueza na forma líquida (em moeda). Assim, quanto maior é a taxa de juros, maior será a demanda por títulos. Consequentemente, a demanda por moeda relacio- na-se negativamente com a taxa de juros. Por isso, a autoridade monetária, ao afetar a taxa de juros básica da eco- nomia, está também afetando a posse da riqueza em sua forma líquida, que é essencial para as decisões de gasto na economia, seja com relação ao consumo ou ao investimento. Contudo, nem sempre uma política monetária expansionista, que pro- move a redução das taxas de juros básicas da economia, transmite-se efetivamente para uma redução das taxas de juros ao consumidor ou ao produtor que demandam empréstimos. Os bancos comerciais são inter- mediários no repasse de recursos entre os agentes econômicos. Eles co- bram um spread sobre a taxa de juros de captação para cobrir suas des- pesas operacionais e remunerar o risco que ele incorre na operação de concessão de empréstimo (o chamado “risco de crédito”). Diante de uma redução na taxa SELIC (que, em tese, reduz o custo de captação dos ban- cos comerciais), estes últimos podem apenas decidir aumentar o spread e, consequentemente, manter inalterado o custo do crédito para o toma- dor final. Assim, a política monetária torna-se ineficaz no seu objetivo de ampliar a liquidez na economia. Há, contudo, outras formas de fazer política monetária que não envolvem a manipulação da taxa básica SELIC. Uma alternativa é mudar os reque- rimentos dos depósitos compulsórios que os bancos comerciais devem manter no caixa da autoridade monetária. O intuito desse tipo de regula- ção, definida pelo Banco Central, é de impedir que os bancos comerciais emprestem de forma irresponsável e fiquem suscetíveis a eventuais corri- das bancárias que os tornariam insolventes. Uma política de redução nas reservas compulsórias tende a, para dado montante de depósitos à vista, elevar o volume de recursos disponível para empréstimos. 50 Políticas Econômicas Aplicadas ao Agronegócio Vale ressaltar, por fim, que a política monetária nem sempre está a servi- ço de estimular a demanda e as condições de liquidez e de financiamen- to na economia. No Brasil, o Banco Central do Brasil tem como principal atribuição estatutária o controle da inflação. Dentro da lógica do regime de metas de inflação, a taxa de juros básica da economia é utilizada como o único instrumento de combate à alta dos preços. Portanto, a flexibilida- de da política monetária convencional, pautada na manipulação da taxa SELIC, possui flexibilidade e autonomia limitadas, pois se mantém restrita às expectativas em relação ao cumprimento da meta de inflação. PARA SABER MAIS As metas para a taxa SELIC são realizadas nas reuniões do Comitê de Política Monetária (Copom), composto pelo presi- dente e diretores do Banco Central do Brasil, a cada 45 dias. As competências do Copom são definir a meta da Taxa SELIC e divulgar o Relatório de Inflação. Além disso, após cada reu- nião, são divulgadas as atas das reuniões do Copom, que contêm análises técnicas de conjuntura abrangendo infla- ção, nível de atividade, evolução dos agregados monetários, finanças públicas, balanço de pagamentos, economia inter- nacional, mercado de câmbio, reservas internacionais, mer- cado monetário, operações de mercado aberto e expectati- vas gerais para variáveis macroeconômicas. A avaliação do cenário macroeconômico é orientada a avaliar a prospectiva da inflação e embasar a deliberação sobre a meta da taxa SELIC. Fonte: Banco Central do Brasil. LINK Você pode conhecer outros aspectos e se informar a res- peito de Atas do Copom no site do Banco Central do Brasil. Disponível em: <https://www.bcb.gov.br/?ATACOPOM>. Acesso em: 25 jun. 2018. https://www.bcb.gov.br/?ATACOPOM Políticas Econômicas Aplicadas ao Agronegócio 51 Quais seriam as medidas de política monetária que poderiam benefi- ciar o produtor do agronegócio? • Redução das taxas básicas de juros que de fato se traduzissem em redução das taxas de juros dos empréstimos ao setor (redução do custo do crédito). • Redução das reservas compulsórias que afetassem positivamente a disponibilidade de recursos para empréstimos ao setor. Ambas as medidas, além de afetarem o custo dos empréstimos (portan- to, relacionado às condições de produção), podem também resultar num efeito positivo indireto sobre o setor, ao estimular a demanda no merca- do doméstico e ampliar o mercado consumidor para seus produtos finais e intermediários. ASSIMILE Quando as políticas fiscal e monetária são expansionistas, elas têm o efeito de elevar a demanda agregada da economia. Indiretamente, portanto, elas promovem a expansão das ven- da daquelas firmas que ofertam seus produtos no mercado doméstico, influenciando positivamente suas receitas e lucros. Reflita sobre as formas com que as políticas macroeconômicas fiscal e monetária podem estimular o setor do agronegócio. Quais são as possíveis desvantagens do uso dessas políticas quando o governo deseja, paralelamente, conter a demanda agregada por motivos de combate à inflação? Tendo esse caso hipotético em mente, reflita so- bre quais poderiam ser as vantagens de políticas econômicas especí- ficas aos setores do agronegócio. QUESTÃO PARA REFLEXÃO 52 Políticas Econômicas Aplicadas ao Agronegócio 3. Considerações finais • As POLÍTICAS MACROECONÔMICAS influem sobre os preços relativos, os custos de produção, a rentabilidade dos setores e as expectativas futuras dos agentes. Por isso, sua orientação (que pode ser mais ou menos expansionista/contracionista) tem grande influência sobre as decisões de produção, de investimento e de consumo na eco- nomia. As principais modalidades de política macroeconômica são: política fiscal e tributária, política monetária e política cambial. • POLÍTICA FISCAL E TRIBUTÁRIA: isenções (desonerações), incentivos (subsídios) e gastos fiscais são formas distintas de estímulo/regu- lação setorial. Os setores a serem favorecidos por essas políticas dependem do projeto perseguido pelo Estado, mas também pela disputa dos grupos de pressão dentro do orçamento público. A capacidade de ampliar ou reduzir gastos públicos não é absoluta e, além da rigidez legal de parte da estrutura de gastos, está condicio- nada pelo regime fiscal vigente às expectativas de arrecadação fiscal para o ano-calendário. • POLÍTICA MONETÁRIA: manipulação da taxa básica de juros (SELIC) ou mudanças nos requerimentos mínimos de reservas têm o intui- to de controlar a liquidez, a estabilidade e as condições gerais de financiamento na economia. A flexibilidade da política monetária está normalmente sujeita ao objetivo de estabilização inflacionária. • EFEITOS SOBRE O PRODUTOR DO AGRONEGÓCIO: os efeitos
Compartilhar