Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Universidade de São Paulo Escola de Engenharia de São Carlos Departamento de Geotecnia Mecânica dos Solos Volume II Orencio Monje Vilar Benedito de Souza Bueno São Carlos, março de 2004. Apresentação Como mais atraso do que era nossa intenção, lançamos agora o segundo volume da apostila “Mecânica dos Solos”. Os capítulos estão arranjados em uma ordem didática e compreendem parte da matéria ministrada na disciplina Maciços e Obras de Terra. Como novidade, inserem-se alguns exemplos de aplicação e uma sinopse ao final de cada capítulo. Quanto ao sistema de unidades, por estarmos em uma fase de transição, optamos por apresentar os exemplos no sistema MK*S, e, em conjunto, os valores para conversão para o Sistema Internacional. Assim, a unidade de força empregada é o kgf e, admitindo, g=10m/s2 temos 1kgf=10N e para unidade de tensão, kgf/cm2, que corresponde a 100kN/m2. Agradecemos a Maristela Zotesso e Antonio Claret Carriel, pela datilografia e desenhos, respectivamente, sobretudo porque a Universidade não tem uma forma de recompensá-los pelo excelente e dedicado trabalho, e aos alunos Ricardo Gandour pela resolução do exemplo de Método das Lamelas. São Carlos, janeiro de 1985 ADENDO Esta apostila foi escrita em 1984/1985 e encontra-se esgotada. A presente versão, colocada à disposição dos alunos on line, deve-se ao trabalho da aluna de Doutorado na área de Pós-Graduação em Geotecnia da EESC-USP, Karla Maria Wingler Rebelo. Esta versão é cópia da versão original e nela não foram incluídas revisões, nem tampouco as atualizações que se desejava incorporar. As atualizações e revisões que se fazem necessárias serão comunicadas gradualmente em classe, durante o transcorrer da disciplina SGS-401: Mecânica dos Solos. São Carlos, março de 2004 Orencio Monje Vilar ÍNDICE 12. PERCOLAÇÃO DE ÁGUA NOS SOLOS___________________________________ 1 1. Introdução____________________________________________________________ 1 2. Equação Geral do Fluxo_________________________________________________ 1 3. Resolução da Equação do Fluxo___________________________________________ 3 4. Redes de Fluxo________________________________________________________ 5 4.1. Fluxo Confinado__________________________________________________ 6 4.2. Fluxo Não Confinado______________________________________________ 7 4.3. Linha Freática____________________________________________________ 8 4.4. Situações Especiais________________________________________________ 10 4.5. Recomendações Gerais_____________________________________________ 11 5. Cálculo de Subpressões e de Forças de Percolação____________________________ 13 6. Teoria da Seção Transformada____________________________________________ 16 7. Redes de Fluxo em Meios Heterogêneos____________________________________ 17 Apêndice I- Traçado da Parábola Básica______________________________________ 20 Sinopse________________________________________________________________ 22 13. RESISTÊNCIA AO CISALHAMENTO_____________________________________ 23 1. Introdução____________________________________________________________ 23 2. Causas Físicas da Resistência dos Solos_____________________________________ 25 2.1. Introdução_______________________________________________________ 25 2.2. Teoria Adesiva do Atrito____________________________________________ 26 2.3. Esforços Normais e Resistência das Partículas de Solo____________________ 26 2.4. Coesão__________________________________________________________ 29 3. Estado Plano de Tensões. Círculo de Mohr Pólo______________________________ 30 4. Critério de Resistência de Mohr-Coulomb___________________________________ 32 5. Ensaios para a Determinação da Resistência ao Cisalhamento dos Solos___________ 33 5.1. Ensaio de Cisalhamento Direto_______________________________________ 33 5.2. Ensaio de Compressão Triaxial_______________________________________ 36 5.3. Ensaio de Compressão Simples_______________________________________ 38 5.4. Outros Tipos de Ensaios____________________________________________ 38 6. Resistência das Areias___________________________________________________ 39 6.1. Índice de Vazios Crítico____________________________________________ 41 6.2. Coesão nas Areias_________________________________________________ 42 6.3. Ângulo de Atrito em Repouso________________________________________ 43 7. Resistência das Argilas__________________________________________________ 43 7.1. Introdução_______________________________________________________ 43 7.2. Ensaios Drenados ou Lentos_________________________________________ 44 7.3. Ensaios Adensado-Rápidos__________________________________________ 46 7.4. Ensaios não Drenados ou Rápidos____________________________________ 48 7.5. Compressão Simples_______________________________________________ 49 7.6. Resistência dos Solos Parcialmente Saturados___________________________ 51 7.7. Resistência Residual_______________________________________________ 52 7.8. Aplicação dos Resultados de Ensaios a Casos Práticos____________________ 53 7.9. Os Parâmetros de Pressão Neutra_____________________________________ 57 8. Trajetória de Tensões___________________________________________________ 58 9. Parâmetros Elásticos do Solo_____________________________________________ 61 Sinopse________________________________________________________________ 67 14. ESTABILIDADE DE TALUDES__________________________________________ 69 1. Introdução____________________________________________________________ 69 2. Tipos e Causas dos Escorregamentos_______________________________________ 70 3. Fator de Segurança_____________________________________________________ 73 4. Métodos de Estabilidade_________________________________________________ 74 4.1. Introdução_______________________________________________________ 74 4.2. Método do Talude Infinito__________________________________________ 75 4.3. Método de Culmann_______________________________________________ 77 4.4. Métodos que Admitem Superfície de Ruptura Circular____________________ 79 a) Método do Círculo de Atrito- Gráficos de Taylor_______________________ 79 b) Método das Lamelas- Fellenius e Bishop_____________________________ 83 4.5. Método das Cunhas________________________________________________ 90 4.6. Outros Métodos de Estabilidade______________________________________ 93 Sinopse________________________________________________________________ 94 15. EMPUXOS DE TERRAS________________________________________________ 95 1. Introdução____________________________________________________________ 95 2. Coeficientes de Empuxo Ativo, em Repouso e Passivo_________________________ 95 3. Coeficiente de Empuxo em Repouso_______________________________________ 98 4. Método de Rankine_____________________________________________________ 100 a) Empuxos em Maciços com Superfície Horizontal__________________________ 103 b) Empuxos em Maciços com Superfície Inclinada___________________________ 106 5. Método de Coulomb____________________________________________________ 109 6. Aspectos Gerais que Influenciam a Determinação do Empuxo___________________ 114 a) Pressão Neutra_____________________________________________________ 114 b) Sobrecargas Aplicadas à Superfície do Terreno___________________________ 115 c) Influência do Atrito entre o Solo e o Muro_______________________________ 117 d) Ponto de Aplicação do Empuxo_______________________________________ 118 e) Fendas de Tração___________________________________________________ 118 f) Determinação do Empuxo Ativo em Estruturas de Paredes Irregulares__________ 119 g) Determinação do Empuxo em Solos Estratificados_________________________ 120 7. Aplicabilidade das Teorias Clássicas_______________________________________ 120 Sinopse________________________________________________________________127 16. ESTRUTURAS DE ARRIMO_____________________________________________ 129 1. Introdução____________________________________________________________ 129 2. Tipos de Estruturas de Arrimo____________________________________________ 129 3. Estabilidade de Muros de Arrimo__________________________________________ 134 4. Escavações Ancoradas__________________________________________________ 138 5. Estabilidade das Escavações Escoradas_____________________________________ 142 5.1. Verificação da Ficha_______________________________________________ 142 5.2. Estabilidade de Fundo______________________________________________ 143 5.3. Escorregamento Geral______________________________________________ 145 5.4. Deslocamentos da Pranchada e Recalques Associados_____________________ 146 Sinopse________________________________________________________________ 148 BIBLIOGRAFIA__________________________________________________________ 149 (1) Mecânica dos Solos Volume II- Orencio Monje Vilar & Benedito de Souza Bueno- Departamento de Geotecnia- Escola de Engenharia de São Carlos 1 CAPÍTULO 12(1) PERCOLAÇÃO DE ÁGUA NOS SOLOS 1. INTRODUÇÃO O engenheiro se defronta rotineiramente com situações em que é necessário controlar o movimento de água através do solo e evidentemente proporcionar uma proteção contra os efeitos nocivos desse movimento. Assim, ao executar uma escavação que se estende por debaixo do nível de água ele tem que se preocupar em esgotar a água da escavação e em seguida evitar, por exemplo, que o fluxo de água subseqüente provoque a liquefação do solo do fundo da vala. Na construção de uma barragem de terra, há necessidade, dentre outras coisas, de quantificar a água que percola através da barragem e da fundação e ainda evitar que a água carregue consigo partículas do solo, o que poderia provocar “piping”. Do ponto de vista prático, a água pode ser considerada incompressível e sem nenhuma resistência ao cisalhamento, o que lhe permite, sob a ação de altas pressões, penetrar em microfissuras e poros e exercer pressões elevadas que levam enormes maciços ao colapso. Sabe-se que a água ao percolar de um ponto a outro, devido a uma diferença de carga total entre esses pontos, transfere uma parcela dessa energia às partículas sólidas do solo. Tal transferência origina as chamadas forcas de percolação, as quais são efetivas por atuarem inter-partículas e têm o mesmo sentido do fluxo de água. Um aspecto por demais importante em qualquer projeto, em que se tenha a presença da água, é a necessidade do reconhecimento do papel que os pequenos detalhes da natureza desempenham. Assim não basta apenas realizar verificações matemáticas, mas também recorrer a julgamentos criteriosos dessas particularidades, pois que elas nem sempre podem ser suficientemente quantificadas. O estudo do fluxo de água através do solo é feito, usualmente, lançando-se mão de um procedimento gráfico conhecido como rede de fluxo. O processo consiste basicamente em se desenhar dentro da região em que ocorre o fluxo, dois conjuntos de curvas conhecidas como linhas de fluxo e linhas equipotenciais. Exemplos de redes de fluxo já foram apresentadas na Figura 59 do 1o volume. A fundamentação teórica para resolução dos problemas de fluxo de água foi apresentada por Casagrande (l937), a partir das proposições pioneiras de Forchheimer. O fluxo de água através de um meio poroso é descrito por uma equação diferencial (equação de Laplace), bastante conhecida e estudada, pois que se aplica a outros fenômenos físicos, como por exemplo, o fluxo elétrico através de um meio resistivo. Normalmente o problema é tratado no plano, como de resto acontece em quase todos os problemas práticos de Mecânica dos Solos, considerando-se uma secção típica do maciço situada entre dois planos verticais e paralelos, de espessura unitária. Tal procedimento é justificado devido ao fato de que a dimensão longitudinal é bastante maior que as dimensões de secção transversal. O objetivo básico deste capitulo é fornecer as informações necessárias para a resolução da equação do fluxo através do processo gráfico das redes de fluxo. 2. EQUAÇÃO GERAL DO FLUXO As seguintes hipóteses serão obedecidas na dedução da equação do fluxo: a) solo saturado e regime de fluxo estabelecido; b) partículas sólidas e água incompressíveis e c) a estrutura do solo não é alterada pelo fluxo. Seja o elemento de solo esquematizado na Figura 12.1 2 Figura 12.1- Elemento bidimensional de solo sujeito à percolação. A vazão que entra é: dxVdzV ZX ⋅+⋅ Enquanto a que sai é: dxdz z V Vdzdx x V V ZZ X X ⋅ ⋅ ∂ ∂ ++⋅ ⋅ ∂ ∂ + Como o volume de água presente é constante, a vazão que entra é igual a que sai, de maneira que se pode chegar à seguinte expressão conhecida como Equação de Continuidade: 0 z V x V ZX = ∂ ∂ + ∂ ∂ Porém pela lei de Darcy: x hkV XX ∂ ∂ ⋅= e z hkV ZZ ∂ ∂ ⋅= O que nos fornece: 0 z h x hk 2 2 2 2 X =∂ ∂ + ∂ ∂ ⋅ Nesta equação aparecem os coeficientes de permeabilidade nas direções x e z, que normalmente são diferentes. Uma das maneiras de se chegar à equação de Laplace é admitir que o solo seja isotrópico com relação à permeabilidade, ou seja, kX = kZ. Assim, temos a Equação de Laplace. 0 z h x h 2 2 2 2 = ∂ ∂ + ∂ ∂ A situação de anisotropia (kX ≠ kZ) pode ser estudada lançando-se mão do artifício de transformar as coordenadas, de maneira a se chegar à Equação de Laplace, o que será visto no item 6. Antes de nos lançarmos à apresentação dos princípios básicos das redes de fluxo falaremos, a título de informação, das várias maneiras de resolver um problema de fluxo. 3 3. RESOLUÇÃO DA EQUAÇÃO DO FLUXO A primeira alternativa consiste em integrar diretamente a equação de fluxo, obedecendo as condições de contorno e obtendo assim uma solução analítica para o problema. Tal caminho porém, oferece o inconveniente da grande complexidade, só sendo viável para situações relativamente simples. Como variante da integração direta pode-se lançar mão de métodos numéricos, como por exemplo, o método das diferenças finitas ou mais modernamente o método dos elementos finitos. Outra alternativa compreende a utilização de modelos, como, por exemplo, que emprega a analogia elétrica ou os modelos reduzidos. Na Figura 12.2, apresenta-se um exemplo de modelo físico reduzido, que consiste em se instalar dentro de uma caixa de paredes transparentes uma secção reduzida da secção por onde percola a água. Figura 12.2- Modelo físico reduzido de percolação para dentro de uma escavação. Para o traçado das linhas de fluxo, utiliza-se corante colocado em posições determinadas no paramento de montante. Ao ocorrer o fluxo, os corantes vão tingir a água, permitindo que se distingam algumas linhas de fluxo. Paralelamente, a colocação de piezômetros dentro do modelo permite a obtenção das cargas piezométricas em diversos pontos da secção. A partir desses dados, pode-se desenhar a rede pretendida. O fluxo elétrico através de um meio resistivo também é governado pela equação de Laplace. Pode-se fazer, então, uma analogia entre a permeabilidade do solo e a condutibilidade elétrica de um meio qualquer. Monta-se uma secção com chapa condutora e aplicam-se potenciais de carga elétrica que correspondem aos potenciais de carga hidráulica. Através de medidas de queda de potencial ao longo da região onde ocorre o fluxo pode-se determinar algumas equipotenciais. As linhas de fluxo são desenhadas a partir das equipotenciais obtidas. Finalizando este item, destaquemos algumas características da equação de fluxo que nos serão úteis para o traçado das redes de fluxo. A equação de Laplace é satisfeita nas duas famílias de curvas, dadas pelas funções harmônicas conjugadas φ e ψ , as quais podem ser interpretadas fisicamente dentro daregião onde se desenvolve o fluxo. A primeira delas φ(x, z) = cte., chamada de função carga hidráulica, obedece a equação φ(x, z) = - K h + c, e a segunda ψ(x, z) = cte., chamada de função de fluxo é definida de maneira que: XVz = ∂ ψ∂ e ZVx −= ∂ ψ∂ Tubos com corante 4 A função φ(x, z) = cte., representa fisicamente, dentro da região onde ocorre o fluxo, pontos com mesma carga h. As curvas determinadas pela função φ(x, z) = cte. são chamadas de linhas equipotenciais. Por sua vez, a função ψ(x, z) = cte. representa fisicamente a trajetória da água ao longo da região onde se processa o fluxo. Dá-se o nome de linhas de fluxo às curvas determinadas pela função ψ(x, z) = cte. Seja a linha AB da Figura 12.3.a, representativa da trajetória de uma partícula do fluido passando pelo ponto P, com velocidade tangencial V: Da Figura 12.3.a tem-se: dx dz V V tg X Z ==θ ou 0dyVdxV XZ =⋅−⋅ Como z VX ∂ ψ∂ = e x VZ ∂ ψ∂ −= , resulta 0dz z dx x =⋅ ∂ ψ∂ +⋅ ∂ ψ∂ ou 0d =ψ e, portanto, ψ = cte. Figura 12.3- Trajetória de uma partícula de fluído Assim, as curvas dadas por ψ = cte. definem as trajetórias das partículas de fluxo, pois em cada ponto elas são tangentes aos vetores velocidades. Observe na Figura 12.3.b que a vazão unitária (q) por cd compreendida entre duas linhas de fluxo (ψC e ψd) é dada por ∫ ψ−ψ=ψ∫ =⋅= ψ ψ ψ ψ d c d c cdX ddzVq o que implica dizer que o fluxo entre duas linhas de fluxo (canal de fluxo) é constante. Outra importante particularidade refere-se aos coeficientes angulares das curvas determinantes das linhas de fluxo e das linhas equipotenciais. Para as curvas ψ(x, z) = cte. tem-se Vx Vz z x dx dz cte = ∂ψ∂ ∂ψ∂ −= =ψ As curvas φ(x, z) = cte. têm evidentemente dφ = 0 o que implica 5 0dz z dx x =⋅ ∂ φ∂ +⋅ ∂ φ∂ Z X cte V V z x dx dz −= ∂φ∂ ∂φ∂ −= =φ Tem-se então que cte cte dx dz 1 dx dz =φ =φ −= Disso resulta que a família de curvas φ(x, z)=cte., é ortogonal a ψ(x, z) = cte.. Assim as curvas da função φ interceptam as curvas da função ψ segundo ângulos retos, ou, em outras palavras, as linhas de fluxo cruzam as linhas equipotenciais segundo ângulos retos. Vale lembrar que para condições de contorno determinadas, a solução de uma equação diferencial é única. Para o caso do fluxo de água através do solo, deve-se ressaltar ainda que a solução independe do coeficiente de permeabilidade do solo; isto é, são condições determinantes apenas as condições limites do problema em questão: variando estas, varia a solução. 4. REDES DE FLUXO As redes de fluxo constituem então uma solução gráfica da Equação do Fluxo, e são formadas pelo conjunto das linhas equipotenciais e das linhas de fluxo. Denomina-se canal de fluxo a região situada entre duas linhas de fluxo. Seja o canal de fluxo apresentado na Figura 12.4.a. Figura 12.4 – Canal de fluxo Segundo a lei de Darcy, a vazão Q no canal de fluxo é dada por: AikQ ⋅⋅= onde l hi ∆= e dbA ⋅= 6 Normalmente, o problema é tratado no plano. Assim a vazão por unidade de comprimento no plano normal ao papel será: d Qq = ou l bhkq ⋅∆⋅= No traçado de uma rede de fluxo, costuma-se fazer b=l. A perda de carga entre duas equipotenciais consecutivas é constante, donde se tem a vazão num determinado canal de fluxo é constante. Ao fazer b=l, e como as linhas de fluxo são perpendiculares às equipotenciais, resulta uma figura formada por "quadrados" de lados ligeiramente curvos, como se representa na Figura 12.4.b. O traçado de uma rede de fluxo consiste basicamente em se desenhar na região de fluxo uma malha de "quadrados" formados por linhas de fluxo e equipotenciais convenientemente escolhidos dentre as infinitas linhas possíveis. O primeiro passo nesse traçado consiste em se estabelecer as condições de contorno ou limites, as quais podem ser englobadas numa situação de fluxo confinado ou de fluxo não confinado, e a direção geral do fluxo para o problema em questão. 4.1 - Fluxo Confinado A Figura 12.5 representa um problema clássico de percolação e nela nos basearemos para expor os princípios das redes de fluxo. Figura 12.5- Percolação de água através da fundação permeável de uma cortina de estacas pranchas. Este problema cai na categoria de fluxo confinado, isto é, as condições limites estão determinadas. Na Figura 12.5.a, estão representadas as condições limites formadas por duas equipotenciais, uma de 7 carga máxima e outra de carga mínima, e por duas linhas de fluxo, situação limite que em geral se repete nos problemas de fluxo confinado. A água evidentemente percolará da esquerda para a direita em função da diferença de carga total existente. A Figura 12.5.b representa a rede de fluxo, constituída de uma malha de "quadrados". Pode-se comprovar, de imediato, duas propriedades características das redes de fluxo: a) as perdas de carga são iguais entre os vários quadrados da rede; b) as vazões através dos vários canais de fluxo são iguais. Para o cálculo da vazão que escoa através do maciço onde ocorre a percolação, observemos novamente a Figura 12.5 b. Nota-se que a rede é formada por nf canais de fluxo (=linhas de fluxo menos um.) e por neq quedas de potencial (=linhas equipotenciais menos um). Através de um canal de fluxo temos: 1b l hkAikq ⋅⋅∆⋅=⋅⋅= Como construtivamente b = l hkq ∆⋅= Em nf canais de fluxo teremos fnhkQ ⋅∆⋅= A carga total disponível (H) é dissipada através das neq equipotenciais, de forma que entre duas equipotenciais consecutivas: eqn Hh =∆ Assim, a vazão total que percola, por unidade de comprimento, é: eq f n n HkQ ⋅⋅= 4.2 - Fluxo Não-Confinado Uma das situações práticas onde é maior o emprego das redes de fluxo é no caso das barragens de terra. A percolação através do maciço compactado enquadra-se no caso do fluxo não confinado, isto é, uma das condições limites não está determinada a priori. Seja a Figura 12.6. Figura 12.6- Percolação através de barragens de terra. 8 Admitindo a fundação impermeável, temos como condição limite a equipotencial de carga máxima-linha AB-, a equipotencial de carga mínima -linha CD-, a linha de fluxo -AC- que limita o fluxo inferiormente. A linha de fluxo que limita o fluxo superiormente chama-se linha freática. A linha freática é uma linha de percolação particular na qual atua a pressão atmosférica e, portanto a pressão piezométrica é nula. A percolação através de barragens de terra foi estudada, entre outros, por Kozeny que propôs uma solução teórica para uma barragem com filtro horizontal a jusante, como se mostra na Figura 12.7. Figura 12.7- Solução teórica de Kozeny – Parábola básica. A solução de Kozeny admite que a rede de fluxo que se forma no problema em questão é constituída por dois conjuntos de parábolas confocais, um deles representando as equipotenciais e o outro as linhas de fluxo. Estabelecida essa solução, é possível adaptá-la para barragens com outras condições de drenagem, o que foi feito por Casagrande, a partir de ensaios em modelos e de estudos teóricos. Assim a solução de Kozeny, conhecida como parábola básica de Kozeny, encontra grande aplicação prática no traçado de redes quando o fluxo é não confinado. 4 3 - Linha Freática A linha freática apresenta uma série de propriedades e particularidades, constituindo o primeiro passo para o traçado da rede em um problema de fluxo não confinado. Para o seu traçado, a condição fundamental é determinar a parábola básica (no Apêndice I, mostra-se um processo gráfico para o traçado da parábola básica). Uma vez traçada a parábola são feitas correções, a sentimento, para corretamente locar a freática. Nessas condições deve-se observar determinadas condições quanto à entradae à saída da freática do maciço. Na Figura 12.8, apresentam-se as condições de entrada da freática no maciço. 9 Figura 12.8- Condições de entrada da freática Deve-se lembrar, como condição rotineira, que a freática sendo uma linha de fluxo deve ser perpendicular ao talude de montante (que é equipotencial) no seu ponto de entrada. Na Figura 12.9, apresentam-se diversas condições de saída da freática, devendo-se ressaltar que rotineiramente a freática é tangente ao talude de jusante (taludes menores que 900) ou tangente à vertical no ponto da saída, caso haja drenagem. Figura 12.9- Condições de saída de freática. 10 Outra condição a se observar é o ponto de saída da freática. Não havendo drenagem horizontal a jusante (como no problema de Kozeny), o ponto da saída da freática não coincide com o ponto de saída da parábola básica. Casagrande, após observações em modelos, sugeriu a seguinte relação para locar corretamente o ponto de saída da freática (Figura 12.10). Na Figura 12.11, mostram-se a parábola básica e a linha freática obtida após efetuadas as correções necessárias. Por último vejamos as condições de carga na linha freática. Como atua a pressão atmosférica resulta que a pressão piezométrica é nula, então, a carga total corresponde somente a carga de posição. Dessa forma, entre, duas equipotenciais consecutivas, a perda de carga será apenas altimétrica, tal qual se mostra na Figura 12.12. Figura 12.10- Gráfico para locar o ponto de saída da freática. Figura 12.11- Parábola básica e correções para situar a freática. Essa propriedade constitui um dado importante para o traçado da rede, pois uma vez determinada a freática, o próximo passo será dividir a perda de carga em cotas iguais, o que fornecerá os pontos de intersecção entre a freática e as equipotenciais. Evidentemente, o número de perdas de carga a escolher será um problema de tentativas e erros, até que se tenha uma solução que leve em conta os fundamentos das redes de fluxo. Figura 12.12 – Perdas de carga ao longo da freática são altimétricas. Pode-se observar ainda na Figura 12.12, que as equipotenciais são ortogonais à linha freática, o que é obvio, pois que a freática é uma linha de fluxo. 4.4 - Situações Especiais O exposto nos itens anteriores aplica-se aos casos de fluxo estabelecido. Existem algumas situações (enchimento do reservatório; chuvas intensas ou rebaixamento do nível de água do reservatório, por ocasião das épocas de seca) que apresentam redes de fluxo particulares. 11 No caso do enchimento do reservatório, a saturação do maciço é gradativa. Por conseguinte, a linha de fluxo superior, que delimita o fluxo, vai passando por situações intermediárias até se estabelecer o fluxo permanente. Chuvas intensas tendem a alterar os limites de saturação provocando fluxo na região da crista da barragem e no talude de jusante. Por último, talvez a mais importante dessas situações especiais, pois é uma condição crítica para análise de estabilidade da barragem: o rebaixamento rápido do reservatório. Neste caso, forma-se uma nova rede com as linhas de fluxo partindo da freática, conforme se mostra na Figura 12.13. Figura 12.13- Rebaixamento rápido do nível de água do reservatório 4.5 - Recomendações Gerais Pode parecer ao principiante que a melhor solução será obtida por quem tiver maiores pendores artísticos. Na verdade obedecendo às condições teóricas anteriormente estabelecidas, está-se obedecendo às condições da equação do fluxo. Isto conduzirá então a uma solução única, que independe da habilidade artística de quem procura resolver o problema. A seguir enumeram-se vários lembretes e recomendações para o correto traçado de uma rede de fluxo: a) usar todas as oportunidades possíveis para estudar a aparência de Redes de Fluxo bem feitas. Tratar depois de repeti-las, sem ter em mãos o modelo, até obter desenhos satisfatórios; b) usualmente, é suficiente traçar a rede com um número de canais de fluxo entre 3 e 5. O uso de muitos canais dificulta o traçado e desvia a atenção de aspectos essenciais; c) ao principiar o traçado, lembrar que as linhas de fluxo e as equipotenciais deverão ser normais entre si, e que se procura obter uma Figura formada por "quadrados" (é possível resolver o problema desenhando figuras retangulares, porém é muito mais difícil); d) deve-se observar sempre a aparência da rede em conjunto, sem tratar de corrigir detalhes antes que toda ela esteja aproximadamente bem traçada; e) freqüentemente, há partes das Redes de Fluxo em que as linhas de fluxo devem ser aproximadamente retas e paralelas. Nestes casos os canais são mais ou menos do mesmo tamanho e os quadrados vão resultar muito parecidos. O traçado da rede pode ser facilitado se começar por essa zona; f) um erro comum nos principiantes é de desenhar transições muito bruscas entre as partes retas e as partes curvas das diferentes linhas. Deve-se ter presente que as transições devem ser sempre suaves e de forma parabólica ou elíptica; o tamanho dos diferentes quadrados deve ir mudando, também, gradualmente; g) as superfícies de entrada são sempre equipotenciais, por conseguinte as linhas de fluxo devem ser normais a elas; o mesmo ocorre com superfícies de saída horizontais. Porém, superfícies de saída (em contacto com o ar) não horizontais não são nem linhas de fluxo e nem equipotenciais: os quadrados limitados por essas superfícies podem ser incompletos; h) em geral, a primeira adoção de linhas de fluxo pode não conduzir a uma rede integral de quadrados. Pode ocorrer, ao final da rede, que entre duas equipotenciais sucessivas a perda de carga seja uma fração da perda entre as equipotenciais vizinhas anteriores (formam-se retângulos ao invés de quadrados). Geralmente, isto não é prejudicial e esta última fileira pode ser levada em conta no cálculo, observando-se a fração da perda de carga que resultou (relação entre os lados do retângulo). 12 O mesmo tipo de abordagem pode ser aplicado aos canais de fluxo, bastando considerar a parcela da vazão correspondente. Se, por razões de apresentação, se deseja traçar uma malha integral de quadrados, torna-se necessário modificar o número de canais de fluxo, ou por interpelação, ou recomeçando. i) certas condições limites podem ocasionar a intersecção de uma linha de fluxo com uma equipotencial a ângulos maiores que 90o. Tem-se então uma condição particularmente crítica onde a velocidade do fluxo pode provocar erosão e arraste. Tais situações devem ser evitadas ou deve-se providenciar proteção para que tais erosões não ocorram. A Figura 12.14 esquematiza alguns erros mais comuns nos traçados de redes, as correções necessárias e a rede completa. Figura 12.14 – Erros comuns em redes de percolação A Figura 12.15 apresenta várias redes de fluxo, a partir dos quais o aluno poderá principiar a seguir a recomendação a. 13 Figura 12.15- Exemplos de redes de fluxos 5. CÁLCULO DE SUBPRESSÕES E DE FORÇAS DE PERCOLAÇÃO Uma vez determinada a rede de fluxo num maciço, pode-se determinar as pressões neutras devidas à percolação. Em determinadas situações, como por exemplo, sob estruturas de concreto, essas pressões atuarão na base da estrutura exercendo uma força contrária à força normal, o que pode conduzir a estrutura a uma situação instável. Seja a Figura 12.16. A barragem vertedouro aí esquematizada está sujeita à percolação pela sua fundação. Figura 12.16- Rede de fluxo pela fundação de uma barragem vertedouro de concreto e diagrama de subpressões. 14 Para determinar as subpressões atuantes em sua base basta considerar a rede de fluxo e determinar as cargas em diversas posições. Fixemos a referência de nível na superfície impermeável. A perda de carga devida à percolação é h, que será dissipada entre neq equipotenciais, ou seja, entre duas equipotenciaisconsecutivas dissipa-se h/neq = ∆h. No ponto 0 a carga total disponível é H0 = z0 + h = u0/yw + z0, ou, de outra forma, a carga piezométrica é u0/Yw =h. No ponto l como houve uma perda de carga, teremos: hhzhHzuH 001 W 1 1 ∆−+=∆−=+γ = hh)hh()zz(u 10 W 1 ∆−=∆−+−= γ (no caso, z0 = z1) O raciocínio pode ser estendido aos outros pontos de forma a se obter o diagrama de subpressões ao longo da base da barragem. O problema pode ser resolvido também graficamente. Para tanto basta dividir a perda de carga em parcelas iguais, correspondentes ao número de queda de equipotenciais, e transformá-las em cotas tal qual se representa na Figura 12.16. No ponto 1, por exemplo, a carga de pressão corresponderá à distância vertical entre o ponto e o número de quedas de equipotencial (um no caso). No ponto 5 a mesma situação se repete, bastando observar que ocorreram quatro perdas de carga. Observar que as cargas de posição consideradas positivas acima da RN. A demonstração do processo gráfico fica por conta do leitor. Importante notar que, mesmo que o ponto onde se deseja determinar a pressão neutra não se situe sobre uma equipotencial da rede traçada, os processos aqui descritos também se aplicam. A rigor a rede traçada representa apenas algumas equipotenciais e algumas linhas de fluxo, porém sobre qualquer ponto sempre "passará" uma equipotencial. Seja o ponto P situado entro a 4ª e 5ª equipotenciais. Estimando que a perda de carga até ele seja 4,5 ∆h pode-se determinar, tanto analítica quanto graficamente, a carga de pressão sobre ele: 4 W 4 04 z u h5,4HH + γ =∆⋅−= h5,4h u W 4 ∆⋅−= γ )zzehH( 040 == O exposto anteriormente também se aplica à percolação através de barragens ou taludes naturais. Seja a Figura 12.17. Figura 12.17- Encosta natural sujeita à percolação 15 A carga de pressão no ponto l será dada pela diferença de cotas entre esse ponto e o ponto A, intersecção da equipotencial que passa pelo ponto l com a freática. Os pontos l e A situam-se sobre a mesma equipotencial, portanto, têm a mesma carga total. O mesmo raciocínio se aplica, por exemplo, ao ponto 4, bastando considerar a equipotencial correspondente. Por último, deve-se lembrar que o diagrama de subpressões obtido seja na base de uma estrutura impermeável ou ao longo de uma superfície de ruptura de um talude, tem como resultante um empuxo correspondente à área do diagrama e atua no centro geométrico do diagrama. Outra informação importante obtida a partir da rede de fluxo é a força de percolação. Como já visto no Capítulo VII - 1° Volume, as forças de percolação são originárias da transferência de energia que se processa quando do fluxo de água através do solo. Essas forças são efetivas, têm a dimensão de um peso específico e são tangentes às linhas de fluxo. Na Figura 12.18 o elemento hachurado tem lado a. O gradiente que atua é i = ∆h/a e a perda de carga entre duas equipotenciais consecutivas é ∆h = h/ne, onde ne - número de quedas de equipotencial. Figura 12.18- Determinação da força de percolação a partir da rede de fluxo. Na face de entrada do elemento hachurado atua a pressão: We hn1au γ⋅∆⋅⋅⋅= a.l - área do elemento hachurado n - número de quedas de equipotencial a contar de jusante. Na face de saída a pressão será: ( ) wS h1n1au γ⋅∆⋅−⋅⋅= Isso origina uma pressão u wseu hauu γ⋅∆⋅=−=∆ ou w 2 u a ha γ⋅∆⋅=∆ Como ∆h/a = i e a2 é o volume do elemento, essa diferença de pressões origina uma força de percolação por unidade de volume igual a: wp iF γ⋅= 16 6. TEORIA DA SEÇÃO TRANSFORMADA A percolação na maioria dos casos práticos ocorre em solos anisotrópicos com referência à permeabilidade. Tal decorre seja porque em solos sedimentares bem como nos maciços compactados, por exemplo, ocorre uma orientação das camadas, resultando permeabilidades diferentes em duas direções ortogonais entre si. A equação do fluxo assume a sua forma genérica: 0 z hk x hk 2 2 Z2 2 X =∂ ∂ ⋅+ ∂ ∂ ⋅ )kk( ZX ≠ Para se chegar a equação de Laplace, utiliza-se o artifício de transformar as coordenadas do problema, tal qual se exemplifica na Figura 12.19. No caso a está a Figura em suas dimensões reais e coeficientes kx ≠ kZ. Introduzindo uma nova variável - xt: x Z t k k xx = Z X t k k xx = Pode-se na equação do fluxo obter: 0 z h x h k k 2 2 2 2 Z X = ∂ ∂ + ∂ ∂ ⋅ Substituindo x vem: 0 z h x h 2 2 2 t 2 = ∂ ∂ + ∂ ∂ que é novamente a equação de Laplace. Figura 12.19- a) seção natural de uma barragem com anisotropia em relação a permeabilidade; b) seção transformada da barragem- isotropia quanto a permeabilidade. Assim o problema se resume a transformar uma das dimensões reais da seção para torná-la isotrópica e poder trabalhar dentro dos conceitos já estipulados. A Figura 12.19.b mostra a seção transformada. É importante notar que qualquer das coordenadas pode ser transformada. A rede de fluxo é desenhada na seção transformada com elementos quadrados e em seguida retorna-se ao problema original desdobrando as dimensões da direção que foi reduzida. Na Figura 12.20 tem-se um exemplo de traçado de rede num problema de seção transformada. Deve-se notar que na seção real as figuras da rede passam a assumir a aparência de retângulos ou losangos, dependendo da relação de permeabilidades. 17 Para o cálculo de vazões permanecem os mesmos conceitos já estipulados, devendo-se considerar a permeabilidade equivalente do sistema (k’): eq f' n n HkQ ⋅⋅= ZX ' kkk ⋅= A relação eqf nn é a mesma, tanto na seção transformada quanto na real. Figura 12.20- Rede de fluxo em meio não isotrópico. 7. REDES DE FLUXO EM MEIOS HETEROGÊNEOS No projeto de uma barragem, procura-se conciliar os materiais existentes na região com a seção típica. Assim, é comum projetar a seção típica com materiais de diferentes permeabilidades. Por exemplo, pode-se ter um núcleo argiloso de permeabilidade baixa, abas de material arenoso de permeabilidade mais elevada e ainda a fundação que pode ser formada também por camadas de diferentes permeabilidades. Uma situação desse tipo corresponde a um caso freqüente de percolação através de meios heterogêneos. Para o traçado de uma rede numa situação dessas, permanecem válidas as condições estabelecidas para o fluxo em meio homogêneo, devendo-se acrescentar as condições de transferência das linhas de fluxo de um meio para outro. A transferência de um meio a outro pode ser quantificada como segue. Sejam os meios l e 2 de permeabilidade k1 > k2 (Figura 12.21). 18 Figura 12.21- Transferência das linhas de fluxo entre meios de diferentes permeabilidades. No meio 2 (de permeabilidade menor) os canais devem se alargar para dar passagem a mesma vazão que percolava no canal, no meio 1. Ocorre então uma mudança na geometria do canal de fluxo, determinada pelas relações expressas na própria Figura. No caso contrário (k2 > k1), Figura 12.22, pode-se notar que os canais devem se estreitar no meio 2 para dar passagem à mesma vazão que percola nos canais, no meio 1. Essas condições gerais de transferência estão esquematizadas na Figura 12.23 para várias situações diferentes. O fluxo em meios heterogêneos admite soluções para um mesmo problema que podem diferir na forma, dependendo das premissas que se adotem para a resolução do problema. No que se segue, procura- se apresentar o traçado da rede atendendo a condição de igualdade de vazão nos diversos meios que compõe a secção em estudo. Figura 12.22- Transferência das linhas de fluxo entre meios de permeabilidade diferentes. 19 Figura 12.23- Condições de transferência das linhas de fluxo entre dois meios de permeabilidade diferentes. Essa condição permite o traçado de redes com malhaquadrada em cada um dos meios, o que nos parece oferecer menores dificuldades do que as outras maneiras, as quais obrigam soluções que conciliam malhas quadradas e malhas retangulares. O andamento a seguir deverá constituir-se dos seguintes passos: a) dividir a carga total (∆H) em perdas de cargas iguais (∆h). hnH eq ∆⋅=∆ b) traçar o sentimento a linha freática inicial, atentando para as condições básicas de entrada, de saída e de transferência entre meios heterogêneos (Figuras 12.8, 9 e 23). c) traçar redes com malhas "quadradas" para os dois meios, conforme se mostra na Figura 12.24. O número de canais de fluxo no meio l (nf1) será diferente de nf2. Figura 12.24- Malhas “quadradas” nos dois meios de permeabilidade diferente d) calcular a relação k2/k1 da rede construída e compará-la com k2/k1 real. Havendo diferença, experimentar nova freática de acordo com o seguinte critério: se k2/k1 calculado for muito alto, levantar a freática; caso contrário, k2/k1 calculado menor que k2/k1 real, abaixar a freática. e) refazer a rede de fluxo até conseguir um valor compatível com k2/k1 real. Finalizando este item, convém destacar o procedimento que deve ser utilizado no caso de um problema em que além dos meios serem heterogêneos, eles também são anisotrópicos. O procedimento a adotar consiste em primeiro transformar a seção (tornar os meios isotrópicos) em seguida traçar a rede de acordo com exposto neste item; uma vez traçada a rede, voltar à seção real. 20 APÊNDICE I - TRAÇADO DA PARÁBOLA BÁSICA A parábola é uma curva que define o lugar geométrico dos pontos que eqüidistam de uma reta (diretriz) e de um ponto (foco). No caso em questão, conhecem-se dois pontos da parábola, D e F, mostrados na Figura 12.25. Figura 12.25. Construção da parábola básica. Os seguintes passos devem ser seguidos: a) ( )AC41a31DC = b) centro em D e raio DF , determinar o ponto E sobre a horizontal do prolongamento do nível de água. c) vertical por E, determina EG (diretriz) d) dividir GF ao meio → ponto N e) vertical por N → segmento MN f) dividir MN e DM em partes iguais g) unir pontos de divisão de DM ao ponto N h) horizontais pelos pontos de divisão de MN i) intersecção dos segmentos correspondentes → pontos de parábola básica. As correções necessárias para locar completamente a freática estão apresentadas no item 4.2. Os esquemas a seguir (Figura 12.26) apresentam algumas posições rotineiras dos focos F necessários para o traçado da parábola básica. 21 Figura 12.26- Algumas posições de foco (F) em Barragens de Terra. EXEMPLO 12.1 Determinar a vazão que percola pela fundação da cortina de estacas prancha representada na Figura 12.5 e a pressão neutra no ponto M da fundação. Dados: H = 10m, k =10-3 cm/s. eq f n nHkQ ⋅⋅= 5161LFn f =−=−= 101111LEn eq =−=−= A vazão que percola será: msm105 10 51010Q 355 ⋅⋅=⋅⋅= −− No ponto M teremos, fixando a referência de nível sobre a rocha impermeável: hxHoH M ∆⋅−= m5,3z0 = 10 10 n Hh eq ==∆ m8,1z M = x = 8 quedas de equipotencial Substituindo: w/uzH MMM += hxu)zz(u 0M0M ∆⋅−+−= w/uzH 000 += 1810)8,15,3(u M ⋅−+−= m10Hu 0 == 2 M mtf70,3u = EXEMPLO 12.2 Determinar a vazão que percola pela fundação da cortina representada na Figura 12.20. Assumir H = 10m e kV = 10-3cm/s. Quando kh = kv = 10-3cm/s temos 22 msm105 6 31010 n nHkQ 355 eq f ⋅×=⋅⋅=⋅⋅= −− Quando sm104k4k 5Vh −×== eq f' n nHkQ ⋅⋅= sm10210104kkk 555Vh ' −−− ×=××=⋅= msm10 6 310102Q 345 ⋅=⋅⋅×= −− Quando sm109k9k 5Vh −×== sm103k 5' −×= msm105,1Q 34 ⋅×= − SINOPSE 1. O fluxo de água através dos solos é regido pela equação de Laplace e os problemas são geralmente tratados em duas dimensões (plano). 2. Das várias maneiras de se resolver a equação do fluxo, a mais usual consiste no processo gráfico chamado de REDES DE FLUXO. 3. As redes de fluxo são formadas por malhas de "quadrados" ligeiramente curvos. Nessas malhas distinguem-se as linhas de fluxo e as linhas equipotenciais. 4. A região delimitada por duas linhas de fluxo é chamada de canal de fluxo. Numa rede as vazões através dos vários canais são iguais. 5. Entre duas equipotenciais sucessivas as perdas de carga são iguais e constituem uma fração da carga total disponível 6. As linhas de fluxo interceptam as linhas equipotenciais segundo ângulos retos. 7. As redes de fluxo permitem determinar: a) as perdas de água por percolação; b) as pressões neutras na região onde se dá a percolação; c) os gradientes hidráulicos e as forças de percolação. 8. Para o traçado de uma rede é necessário conhecer: a) a direção geral do fluxo; b) as condições limites do problema. 9. Num problema de fluxo confinado as condições limites já estão estabelecidas: em geral duas linhas de fluxo e duas linhas equipotenciais. 10. Nos problemas de fluxo não confinado a condição limite que resta determinar é a linha (em contato com o ar) que delimita o fluxo - LINHA FREÁTICA. 11. Propriedades da LINHA FREÁTICA a) está sob pressão atmosférica, portanto a pressão piezométrica ao longo dela é nula; b) em conseqüência as perdas de carga são apenas altimétricas; c) é normal ao talude de montante numa barragem permeável; d) é tangente ao talude de jusante na saída do talude; e) é tangente à vertical no ponto de saída, caso haja drenagem à jusante. (1) Mecânica dos Solos Volume II- Orencio Monje Vilar & Benedito de Souza Bueno- Departamento de Geotecnia- Escola de Engenharia de São Carlos 23 CAPÍTULO 13 (1) RESISTÊNCIA AO CISALHAMENTO 1. INTRODUÇÃO Vários materiais sólidos empregados em construção normalmente resistem bem a tensões de compressão, porém têm uma capacidade bastante limitada de suportar tensões de tração e de cisalhamento. Assim ocorre com o concreto e também com os solos. No caso dos solos, a menos de situações específicas, são geralmente considerados apenas os casos de solicitação por cisalhamento, pois as deformações em um maciço de terra são devidas a deslocamentos relativos entre as partículas constituintes do maciço. Dessa forma, ao nos referirmos à resistência dos solos estaremos implicitamente falando de sua resistência ao cisalhamento. A resistência do solo forma, ao lado da permeabilidade e da compressibilidade, o suporte básico para resolução dos problemas práticos da engenharia de solos. Trata-se de uma propriedade de determinação e conhecimento extremamente complexos, pois às suas próprias dificuldades devem ser somadas as dificuldades pertinentes ao conhecimento da permeabilidade e da compressibilidade, visto que estas propriedades interferem decisivamente na resistência do solo. Dentre os problemas usuais em que é necessário conhecer a resistência do solo, destacam-se a estabilidade de taludes, a capacidade de carga de fundações e os empuxos de.terra. Tais problemas são usualmente analisados empregando os conceitos do equilíbrio limite, o que implica considerar o instante de ruptura, quando as tensões atuantes igualam a resistência do solo, sem atentar para as deformações em jogo. Esse tipo de análise é próprio da "Teoria de Plasticidade”, já que os conceitos.da Teoria da Elasticidade nem sempre podem ser convenientemente utilizados na representação do comportamento real dos solos. Várias são as formas de representar a resistência de um solo. A utilização de envoltórias, como a de Mohr, é uma das mais comuns e que melhor retratam o comportamento dos solos. Pode-se representar então, por exemplo, num sistema cartesiano ortogonal, em que nas abcissas se tenham as tensões normais (σ) e nas ordenadas a tensão de cisalhamento (τ), valores obtidos experimentalmente no plano de ruptura conforme se esquematiza na Figura 13.1. A adequação de uma reta (critério de Coulomb) aos pontos situados no diagrama σ x τ , dentro de uma determinada faixa de tensõesde interesse ao problema em estudo, permite obter uma envoltória que segue a expressão geral: 21 rr ⋅σ+=τ Onde: τ- resistência ao cisalhamento r 1, r2 – parâmetros de resistência σ − tensão normal Costuma-se denominar os parâmetros r1 e r2 de "coesão" e de "coeficiente de atrito", respectivamente, com a seguinte notação: cr1 = )(tgr2 φ= onde φ é o ângulo de atrito do solo. 24 Figura 13.1 - Representação da resistência dos solos através de envoltórias. Assim a equação geral de resistência do solo assume a forma: )(tgc φ⋅σ+=τ onde as tensões a considerar podem ser totais ou efetivas. Esta expressão simples mascara uma série de características do solo que interferem na resistência. Uma equação geral que representasse a resistência dos solos deveria ser do tipo: ( ),...,,,,,,,,' TSHCwef εφστ = σ’ – tensão efetiva; e – índice de vazios; w – teor de umidade; φ - ângulo de atrito; C – composição; H– histórico de tensões; S – estrutura; ε - deformação; T – temperatura. Na prática é impossível quantificar as interferências citadas, porém constata-se que a utilização da envoltória de Mohr-Coulomb é uma maneira eficiente e confiável de representação da resistência do solo, residindo justamente em sua simplicidade um grande atrativo para aplicação na prática. É necessário destacar o fato de que c e φ variam para um mesmo solo com uma série de fatores. Isto enseja o aparecimento de várias "coesões" e de vários "ângulos de atrito" dependendo da faixa de carregamento aplicada ao solo, do tipo de ensaio efetuado e do histórico de tensões experimentado pelo solo, dentre outras condições. Assim deve-se reconhecer que os parâmetros de resistência não são intrínsecos do solo, devendo-se obtê-los em cada situação atentando para as condições peculiares do problema.em estudo. Além da determinação em laborat6rio empregando amostras naturais ou compactadas, pode-se conhecer a resistência de um solo através de ensaios "in situ" como, por exemplo, o “vane test", muito utilizado para estudar a resistência de argilas moles. Os resultados de ensaios de resistência à penetração efetuados em sondagens de simples reconhecimento também fornecem indicações úteis da resistência "in situ" de um solo (Capítulo X -1o Volume). Conquanto o conceito de resistência seja algo intuitivo, definir resistência para um solo não é tão simples, devido sobretudo à dificuldade de definir ruptura. A ruptura em um solo é um conceito complexo, pois envolve ruptura propriamente dita e deformação excessiva. A Figura 13.2 ajuda a esclarecer essa dificuldade apresentando curvas características tensão-deformação em solos. 25 Figura 13.2 - Curvas tensão-deformação características em solos. A curva l caracteriza a ruptura de tipo frágil, isto é o valor de tensão atinge um máximo bem definido (Tr) normalmente para pequenas deformações. Atingindo τr , a tensão necessária para manter uma certa taxa de deformação decresce e se aproxima de zero. A curva 2 caracteriza solos que apresentam ruptura do tipo plástico ("por deformação excessiva"), isto é, a tensão é crescente até um determinado valor e a partir daí as deformações continuam a crescer, praticamente sem variação de tensões. Como não se tem um valor característico como no caso 1, costuma-se definir a "ruptura" em função das deformações que estão em jogo. Na falta de um valor específico para a situação, tem sido utilizado como valor rotineiro a tensão correspondente a uma deformação de 20%. Na situação representada pela curva 3, a tensão atinge um valor definido (τmáx 3), para em seguida decrescer e caminhar para um valor constante, denominado de resistência última ou residual. Dependendo da situação, pode-se tomar o valor da resistência máxima (τmáx 3) ou da resistência residual (τres). 2. CAUSAS FÍSICAS DA RESISTÉNCIA DOS SOLOS 2.1 - Introdução Em linhas gerais, pode-se dizer que a resistência dos solos é proporcionada por forças de atrito resultantes de enlaces moleculares nas superfícies em contato. Segundo a lei de Coulomb, a resistência por atrito é função da força normal no plano de deslizamento relativo. Costuma-se representar a resistência por atrito de duas formas, segundo se esquematiza na Figura 13.3, onde dois corpos sólidos estão em contacto. Pode-se utilizar o coeficiente de atrito, f, ou a obliqüidade máxima (αmáx = φ) que a resultante forma com a normal, valor este atingido quando a força T é capaz de dar início ao deslocamento relativo dos corpos. O ângulo de máxima obliqüidade recebe o nome de ângulo de atrito e é representado por φ. Figura 13.3 - Atrito entre Corpos Sólidos 26 2.2 - Teoria Adesiva do Atrito A lei de Coulomb resultou de observações empíricas. Terzaghi elaborou uma teoria que fornece embasamento físico para as constatações empíricas das leis de atrito. Segundo Terzaghi, em sua "Teoria Adesiva do Atrito", a superfície de contacto real entre dois corpos constitui apenas uma parcela da superfície aparente de contanto, dado que a um nível submicroscópico as superfícies dos materiais são efetivamente rugosas. O contacto se dá então apenas nas protuberâncias mais salientes, conforme se mostra na Figura 13.4. Figura 13.4 - Contacto entre corpos sólidos. a) vista macroscópica; b) vista microscópica. As tensões transmitidas são significativamente altas, a ponto de provocar a plastificação do material nos pontos de contacto. Sendo Ac a área real de contacto, N a força normal atuante e σ y a tensão de fluência do material resulta: y NAc σ = A resistência do material da região plastificada é τ de forma que a máxima tensão cisalhante possível de se aplicar (T), será: AcT ⋅= τ Disso resulta que o coeficiente de atrito será: yy Ac Ac N Tf σ τ σ τ = ⋅ ⋅ == Das ponderações de Terzaghi pode-se concluir que a resistência por atrito efetivamente depende da força normal, pois aumentando esta, aumenta a área real de contacto e conseqüentemente a resistência. A rugosidade e a adsorção da superfície da partícula controlam as áreas de contacto; por sua vez, os contactos podem ser de natureza plástica e/ou elástica. No caso de partículas grossas a altura das protuberâncias é muito menor do que o diâmetro das partículas, de modo que cada contacto aparente engloba minúsculos contactos reais, donde se devem esperar altas tensões nesses pontos de contacto. Nas partículas finas, ainda que mais lisas, são pouco prováveis ou contactos face a face, devido às forças de superfície. Assim os contactos devem se dar, predominantemente, através das quinas das partículas, e cada contacto deve ocorrer através de uma única protuberância, resultando um esquema resistente semelhante ao que ocorre nas partículas grossas. 2.3- Esforços Normais e Resistência das Partículas de Solo As partículas minerais vêem-se envolvidas por uma película de água adsorvida, fruto de potenciais elétricos de superfície não equilibrados. As forças de superfície são maiores nas partículas finas. Estas atraem então moléculas de água e cátions, os quais por sua vez podem atrair água também. Determinados cátions, como o Na+ por exemplo, fazem com que a película de água adsorvida seja bastante espessa. 27 A água adsorvida, submetida às altíssimas tensões de adsorção que normalmente se verificam entre partículas finas, encontra-se solidificada (ou com alta viscosidade) próximo às partículas e tem grande importância na resistência que se desenvolve. A Figura 13.5 esquematiza a natureza das forças que podem se desenvolver entre duas partículas. Figura 13.5 - Forças entre Partículas. Em linhas gerais as forças normais e cisalhantes se transmitem apenas nos contactos entre minerais, contactos estes que podem ser de natureza plástica ou elástica. As outras ações, sobretudo as de atração e repulsão, têm a sua importância em determinados solos,como se mostrará adiante. A presença de água adsorvida, entretanto, sugere que possam existir situações nas quais não se desenvolvam contactos entre minerais e daí pode ocorrer que esforços normais sejam transmitidos através da película de água. Um elucidativo exemplo da transmissão de esforços através de um conjunto de partículas é fornecido por Lambe (l972) o qual se reproduz em seguida. São considerados os casos extremos de partículas lamelares colocadas face a face e de um arranjo de partículas grossas eqüidimensionais. No primeiro caso, duas placas de montmorilonita sódica úmida são solicitadas por uma força de 4,13 kgf atuante numa área de 4 cm2 (Figura 13.6). Na Figura 13.6.b aparece a relação entre a tensão normal e a separação entre as partículas, obtida experimentalmente para o material em questão. Pode-se observar que para uma tensão de 1,033 kgf/cm2 (l atm) a distância correspondente é de 115 Å, o que indica a possibilidade de transmissão de esforços sem que haja contacto direto mineral-mineral. Destaque-se ainda, que é necessário uma tensão de 5.600 kgf/cm2 para expulsar a película de água adsorvida e possibilitar o contacto direto entre as partículas para a configuração apresentada. Figura 13.6 - Transmissão de esforços entre partículas (Lambe e Whitman, 1972). 28 Na segunda situação as placas são substituídas por partículas de areia eqüidimensionais, com diâmetro aproximado de 0,06 mm, permanecendo a mesma área de contacto aparente de 4 cm2. Para essa configuração, a área real de contacto corresponde a cerca de 0,03% da área aparente de contacto. A tensão transmitida nos pontos de contacto será: 2/3440 40003,0 13,4 cmkgf x ≈=σ Essa tensão é capaz de expulsar a película de água adsorvida que envolve os grãos de areia, possibilitando contactos grão a grão. Evidentemente, tais situações constituem casos extremos. Como se sabe, os solos são uma mistura de partículas das mais variadas formas e tamanhos, o que possibilita a disposição das partículas segundo situações intermediárias entre as apresentadas. No caso das argilas, qualquer grau de floculação possibilitará contactos reais, partícula a partícula, de forma que a transmissão de esforços, de uma maneira genérica se situa intermediariamente entre os casos propostos. Há evidências de que o mecanismo de transmissão se aproxima muito mais do caso das partículas eqüidimensionais. Conforme já salientado, os contactos interpartículas dependem das protuberâncias superficiais. Mitchell postula que para um dado número de contactos por partículas, a carga em cada contacto é maior nas partículas grossas; para partículas de mesmo tamanho as cargas são menores nas partículas lamelares (mica, etc.) do que nas partículas massivas (quartzo, feldspato, etc.). Essas considerações auxiliam a entender qualitativamente as diferenças que se observam no atrito entre minerais massivos e lamelares. Consideraremos apenas o caso de um contacto interpartículas plastificado (Figura 13.7). Figura 13.7 - Contacto entre duas partículas numa massa de solo. Como as superfícies estão envolvidas pela água adsorvida, o contacto real entre partículas se dá em apenas uma parcela da área total (Ac) e a máxima tensão de cisalhamento (T) será: ( )[ ]fAcT τδδτ −+= 1 onde Tf é a resistência ao cisalhamento da película e τ a resistência da partícula mineral. No caso de um arranjo de partículas grossas, as altas tensões nos contactos implicarão um aumento das áreas reais de contacto e conseqüentemente da resistência (ângulos de atrito altos). Partículas de quartzo usualmente exibem ângulos de atrito variando entre 26o e 30o. Ressalte-se, contudo, que esta não é a única fonte de resistência num conjunto de partículas (vide item 6). Para um arranjo de partículas finas, como a carga interpartícula tende a ser. baixa, passa a ganhar relevância a película de água, adsorvida. As áreas de contacto mineral-mineral serão reduzidas ocasionando baixos ângulos de atrito,já que é razoável supor que a resistência na película de água (τf) é muito menor do que no mineral. No caso extremo de partículas colocadas face a face e na impossibilidade de um contacto direto, o cisalhamento se dará através da película adsorvida, resultando baixíssimos ângulos de atrito. Este modelo de representação não deve ser generalizado para qualquer solo de partículas finas. A constatação de ângulos de atrito relativamente altos reforça a idéia de que o mecanismo de resistência, 29 na maior parte dos solos argilosos, se aproxima muito mais do observado caracteristicamente nos solos de granulação grossa. Deve-se lembrar ainda que, no caso de partículas finas, as forças de superfície passam a desempenhar um papel importante. Assim, o arranjo de partículas finas poderá contar com uma resistência adicional gerada pelas forças de atração interpartículas, denominada de coesão. 2.4- Coesão A coesão consiste na parcela de resistência de um solo que existe independentemente de quaisquer tensões aplicadas e que se mantém, ainda que não necessariamente em longo prazo, se todas as tensões aplicadas ao solo forem removidas. Várias fontes podem originar coesão em um solo. A cimentação entre partículas proporcionada por carbonatos, sílica, óxidos de ferro, dentre outras substâncias, responde muitas vezes por altos valores de coesão. É interessante notar que os agentes cimentantes podem advir do próprio solo, após processos de intemperização. Tal ocorre, por exemplo, na silificação de arenitos, quando a sílica é dissolvida pela água percolante e depositada como cimento (Paraguassu,1972). Excetuando-se o efeito de cimentação, pode-se afirmar serem todas as outras formas de coesão o resultado de um fenômeno de atrito causado por forças normais, atuantes interpartículas. Essas tensões interpartículas, também denominadas de “internas” ou “intrínsecas”, são o resultado da ação de muitas variáveis no sistema solo-água-ar-eletrólitos, podendo-se destacar as forças de atração e.de repulsão (forças R’ e A’ Figura 13.5), originadas por fenômenos eletrostáticos e eletromagnéticos e as propriedades da água adsorvida junto às partículas. A água adsorvida contribui para transmitir e modificar as forças eletroquímicas atuantes interpartículas. As atrações de origem eletrostática decorrem da interação entre partículas de cargas opostas. Evidentemente também ocorrem forças de repulsão quando as partículas apresentam cargas de mesma natureza. As forças de atração ganham relevância quando as partículas se encontram a distâncias menores que 25 Å. Já as atrações eletromagnéticas, do tipo das forças de Van der Waals, têm chance de contribuir quando as distâncias entre as partículas são muito pequenas e quando essas partículas são menores que l µm. As formas complementares de atração interpartículas devem-se a ligações do tipo pontes de hidrogênio e de potássio. Um aspecto interessante refere-se aos tipos de ligação proporcionados pelas forças intrínsecas. Existem evidências de que além de ligações elásticas podem ocorrer funções plásticas, como no caso dos solos pré-adensados, onde se constata que a resistência é proporcional a tensão de pré- adensamento. A despeito das dificuldades de explicação física e da medida de seu valor, tem-se constatado que a coesão aumenta com: a) quantidade de argila e atividade coloidal; b) relação de pré-adensamento (overconsolidation ratio-OCR); c) diminuição da umidade. Existe um tipo de coesão, muito comum na natureza, que não tem sua origem na cimentação e nem nas forças intrínsecas de atração. Esse tipo de coesão, denominada de aparente, ocorre em solos parcialmente saturados e deve-se ao efeito de capilaridade na água intersticial. A pressão neutra negativa atrai as partículas gerando novamente um fenômeno de atrito, visto que ela origina uma tensão efetiva de igual valor. Esse tipo de coesão desaparece casoo solo seja totalmente saturado ou secado, donde o nome aparente. A sua intensidade cresce com a diminuição do tamanho das partículas. A Figura 13.8 ilustra a contribuição para a coesão das diversas fontes citadas. 30 Figura 13.8.- Contribuições dos vários mecanismos de ligação para a resistência dos solos. (Ingles, 1962 in Mitchell, 1976). 3. ESTADO PLANO DE TENSÕES. CÍRCULO DE MOHR POLO Inúmeros problemas da Mecânica dos Solos permitem soluções considerando um estado de esforços no plano. O elemento de solo da Figura 13.9 está submetido a um estado plano de tensões. Por essa razão, as tensões que têm por direção a normal ao plano considerado são nulas, isto é: 0YYZZYYXXY =σ=τ=τ=τ=τ e por razões de equilíbrio τ=τ=τ ZXXZ . Figura 13.9- Elemento de solo sujeito a um estado plano de tensões. Conhecidas as tensões atuantes nas faces do elemento é possível conhecer as tensões geradas em um plano com inclinação α em relação ao eixo x: σα e τα. Aplicando-se as equações de equilíbrio, nas direções horizontal e vertical podem-se obter as seguintes relações entre tensões: α⋅τ+α σ−σ + σ+σ =σα 2sen2cos22 xzzx ατα σσ τα 2cos2sen2 − − = xz Elevando as duas expressões ao quadrado e somando-as obtém-se: 31 2 2 2 2 22 τ σσ τ σσ σ αα + −=+ +− xzxz Esta expressão corresponde à equação de um círculo cuja representação está na Figura 13.10, conjuntamente com a convenção utilizada para designar os esforços: Note-se que o círculo tem como abscissa do centro o valor + 0; 2 zx σσ e que o raio vale 2 2 2 τ σσ + −= xzR . Figura 13-10 - Círculo de Mohr. Este é o chamado círculo de Mohr de tensões, cujos pontos têm, como ordenadas, as tensões em todos os planos do solo que passam por um ponto. Um ponto notável destaca-se no círculo de Mohr: é o polo, ou origem dos planos, ponto P da Figura 13.10. Desejando conhecer as tensões num plano de inclinação conhecida, basta traçar uma paralela ao citado plano, pelo polo. A intersecção dessa paralela com o círculo fornecerá as tensões no plano, como por exemplo, o ponto M que representa as tensões num plano de inclinação α com a horizontal. Para localizar o polo P no círculo pode-se fazer a construção inversa, uma vez conhecidas as tensões num plano e a sua direção. Sejam por exemplo as tensões (σX, τ) que atuam num plano vertical: basta traçar por (σX, τ) uma vertical (paralela ao plano onde atuam as tensões) e determinar a sua intersecção com o círculo. O mesmo pode ser feito à partir de (σZ, τ), lembrando agora que estas tensões atuam num plano horizontal. Existem dois planos perpendiculares entre si, nos quais as tensões de cisalhamento são nulas. Esses planos são chamados de principais bem como as tensões normais que neles atuam: σ1 tensão principal maior e σ3 tensão principal menor. As expressões que fornecem σ1 e σ3 são: 2 2 3 1 22 τ σσσσ σ σ + −± + = zxzx Na Figura 13.11 tem-se representado, para o elemento de solo anexo, os planos e as tensões principais: 32 Figura 13.11 - Planos e tensões principais. 4. O CRITÉRIO DE RESISTÉNCIA DE MOHR-COULOMB A teoria de Mohr afirma que os materiais rompem quando a tensão de cisalhamento, função da tensão normal, em um determinado plano iguala ou supera a resistência ao cisalhamento do material. A equação representativa dessa teoria é da forma: ( )στ f= Ao ensaiar vários corpos de prova de um mesmo solo, sob distintas.condições de solicitação, teremos vários círculos de Mohr representativos das tensões nos corpos de prova no instante de ruptura. (Figura 13.12). Pelo menos um ponto de cada círculo representará as tensões no plano de ruptura. A curva que passa por esses pontos constituirá então o lugar geométrico dos pontos correspondentes à ruptura do solo e é denominada de envoltória de resistência dos solos. O critério de Coulomb admite que essa curva é uma reta de equação (Figura 13.12): φστ tgc ''+= σ ' τ’=s C’ φ’ Figura 13.12 - Envoltória de resistência de Mohr-Coulomb. 33 Já se alertou sobre a variação que pode ocorrer nos parâmetros de resistência para um mesmo solo. Dessa forma, torna-se a observar que os citados parâmetros não são constantes para um mesmo solo. Como características do critério de Mohr-Coulomb, deve-se ressaltar a desconsideração do efeito da tensão principal intermediária (σ2) o que faz com que a resistência dependa apenas das tensões principais maior e menor. Vale notar ainda que de acordo com a teoria de Mohr-Coulomb o ângulo entre o plano de ruptura e o plano principal maior corresponde a 2 '45 φθ +=cr , tal qual se exemplifica na Figura 13.13. As situações particulares da equação de Mohr-Coulomb c=τ e φσ=τ tg correspondem aos chamados solos puramente coesivos e solos puramente arenosos, respectivamente. Figura 13.13 - Círculos de Mohr, polos e planos de ruptura. 5. ENSAIOS PARA A DETERMINAÇÃO DA RESISTÊNCIA AO CISALHAMENTO DOS SOLOS A medida da resistência de um solo é feita em laboratório através de dois tipos principais de ensaios: o de cisalhamento direto e o de compressão triaxial. Para cada solo são ensaiados vários corpos de prova preparados sob condições idênticas. Para cada corpo de prova obtém-se uma curva tensão-deformação, a qual convenientemente interpretada- fornece tensões que permitirão,, num diagrama σ x τ , a definição da envoltória de resistência. 5.1 – Ensaio de Cisalhamento Direto A Figura 13.14 permite uma visualização geral do ensaio de cisalhamento direto. O corpo de prova é colocado num recipiente formado por dois anéis iguais e superpostos. O anel inferior é fixo na prensa e o superior é livre para mover-se e aplicar tensões cisalhantes ao solo. Transdutor de força Força cisalhante Força normalPedrasporosas Rolamentos Plano de ruptura δ δv Figura 13.14 - Ensaio de Cisalhamento Direto. 34 Sobre o corpo de prova são aplicadas tensões normais que permanecem constantes até o final do ensaio. Essas tensões variam para cada corpo de prova, com o intuito de poder definir pares de tensões diferentes. O corpo de prova pode ser rompido aplicando-se tensões controladas (medem-se as deformações provocadas) ou deformações controladas (medem-se as tensões provocadas). Três leituras são tomadas durante o ensaio:deslocamento horizontal (δ),), força cisalhante aplicada (Ft) e deformação vertical (εv) a qual fornecerá a variação de volume do corpo de prova. Os gráficos da Figura 13.15 mostram resultados típicos de ensaios de cisalhamento direto e que de uma maneira geral representam o que ocorre num solo ao ser cisalhado, independente do tipo de ensaio. Figura 13.15 - Resultados de Ensaio de Cisalhamento Direto. A curva l é característica das areias compactas: um valor bem definido da tensão cisalhante, normalmente para pequenas deformações, e um aumento de volume à medida que o solo é cisalhado. Já a curva 2 é comum das areias fofas: após atingida determinada tensão, as deformações crescem continuamente sem acréscimo de tensão. Contrário às areias compactas, ocorre agora uma redução de volume. A Figura 13.16 ajuda a explicar a origem dessas variações de volume. Figura 13.16 - Tensões Cisalhantes provocam variações de volume: a) solo compacto; b) solo fofo. No caso a, solo compacto, os grãos de solo encontram-se entrosados. Iniciadas as deformações cisalhantes os grãos deslizarão uns por sobre os outros de forma a atingir a posição 2 de menor compacidade, ocorrendo um aumento de volume. 35 Já no caso b, solo fofo, as tensões cisalhantes permitem um maior entrosamento dos grãos, com conseqüente redução de volume. Da curvas tensão-deformação dos vários corpos de prova são tomados os valores máximos das tensões tangenciais que, conjugados com as tensões normais correspondentes,permitem a definição de pontos num diagrama σ x τ (Figura 13.17). A adequação de uma reta aos pontos obtidos permite definir a envoltória de resistência do solo. Só é possível definir o círculo de Mohr no instante da ruptura, como por exemplo, o círculo que passa pelo ponto A. As tensões representadas pelas coordenadas do ponto A são as tensões que correspondem à ruptura, e como o plano de ruptura é horizontal, pode-se determinar o ponto P, que é o polo no ensaio de cisalhamento. φ s = tg σ φτ σσ1σ3ppm PPM B P σ τB B , T plano de ruptura N Figura 13.17 - Envoltória de Resistência a partir de ensaios de Cisalhamento Direto. Uma alternativa seria tomar para os solos de comportamento definidos pela curva l (Figura 13.15) o valor da tensão residual (τ res) sempre e quando as condições do problema em estudo demanda sem essa hipótese. Algumas deficiências limitam a aplicabilidade do ensaio de cisalhamento direto. A primeira delas é o fenômeno da ruptura progressiva, que se manifesta nos solos de ruptura tipo frágil (curva l - Figura 13.14). A ruptura progressiva pode ser explicada como segue, obedecendo a Figura 13.18. Figura 13.18 - Ruptura Progressiva. A deformação cisalhante ao longo da superfície de ruptura AB não é uniforme: ao iniciar o cisalhamento ocorre uma concentração de deformações próximo a A e B que tendem a decrescer em direção ao centro da amostra. Obviamente as tensões despertadas em cada local serão diferentes, de forma que quando nas regiões A e B forem atingidas a deformação e a tensão de ruptura, teremos próximo ao centro da amostra tensões inferiores à de ruptura. À medida que aumentam as deformações, a ruptura caminha em direção ao centro e uma vez que as extremidades já passaram pela ruptura, teremos agora tensões menores que a de ruptura, nessas extremidades. Dessa forma o valor de resistência que se mede no ensaio é mais conservador do que a máxima resistência que se poderia obter para o solo, porque a deformação medida durante o ensaio não consegue representar o que realmente ocorre, representando apenas uma média das deformações que se processam na superfície de ruptura. 36 Tratando-se de solos de ruptura plástica, tal não ocorre porque em todos os pontos da superfície de ruptura atuam esforços iguais, independentemente de qualquer concentração de tensões. Outro aspecto que merece ser citado refere-se ao fato de que o plano de ruptura está determinado a priori e pode não ser na realidade o mais fraco. Por sua vez os esforços que atuam em outros planos que não o de ruptura, não podem ser estimados durante a realização do ensaio senão quando no instante de ruptura. Além disso, a área do corpo de prova diminui durante o ensaio, o que não é levado em conta nos cálculos. Por último, deve-se salientar a dificuldade de controle (conhecimento) das pressões neutras antes e durante o ensaio. Embora existam pedras porosas (Figura 13.14) que permitam a dissipação de pressões neutras, não existe nenhum mecanismo que permita avaliar o desenvolvimento das pressões neutras no corpo de prova, tal qual seria possível num ensaio de compressão triaxial. O ensaio de cisalhamento direto pode em principio ser do tipo rápido, adensado-rápido e lento (ver item 5.2). 5.2 - Ensaio de Compressão Triaxial Este tipo de ensaio é o que mais opções oferecem para a determinação da resistência do solo. Basicamente ele consiste num corpo de prova cilíndrico (H=2 a 2,5 φ, sendo φ =5cm e φ =3,2cm, diâmetros usuais) envolvido por uma membrana impermeável e que é colocado dentro de uma câmara, tal qual se esquematiza na Figura 13.19. Figura 13.19 - Ensaio de Compressão Triaxial. Preenche-se a câmara com água e aplica-se uma pressão na água que atuará em todo o corpo de prova. O ensaio é realizado acrescendo a tensão vertical, o que induz tens8es de cisalhamento no solo, até que ocorra a ruptura ou deformações excessivas. Outras formas de realização dos ensaios são mostradas no item 5.4. Deve-se notar a versatilidade do ensaio. As diversas conexões da câmara com o exterior permitem medir ou dissipar pressões neutras e medir variações de volume. Existem várias maneiras de se conduzir o ensaio: - ensaio rápido ou não drenado: não se permite dissipação de pressões neutras durante a aplicação da tensão confinante (σ3) e nem durante o cisalhamento do corpo de prova; é possível medir as pressões neutras desenvolvidas. Símbolos Q ou Q (caso se determinem as pressões neutras); - ensaio adensado-rápido: permite-se a dissipação das pressões neutras originadas pelo confinamento do corpo de prova; dissipação de pressões neutras impedidas durante a fase de ruptura, porém essas pressões podem ser medidas agora. Símbolos: R ou R (leitura de pressões neutras); - ensaio lento ou drenado: permite-se a dissipação de pressões neutras em todas as fases de ensaio (no preparo: aplicação da pressão confinante e na ruptura). Tensões são efetivas em todas as fases. Símbolo: S. 37 As curvas tensão-deformação são traçadas em função da diferença de tensões principais ( )31 σ−σ ou da relação '3'1 σσ (Figura 13.20), dependendo da finalidade do ensaio. A diferença de tensões ( )31 σ−σ máx, analogamente ao que ocorre no ensaio de compressão simples, corresponde à resistência a compressão do corpo de prova no ensaio considerado. Figura 13.20 - Curvas tensão-deformação em ensaios triaxiais. Geralmente, costuma-se definir a envoltória em função dos ( )31 σ−σ max dos diversos corpos de prova, porem a segunda forma de representação também é utilizada, sobretudo em ensaios em que σ3 é variável (ensaios a volume constante, por exemplo). De qualquer forma convém ressaltar, que os valores de máximo não ocorrem para a mesma deformação, quando se observam as duas formas de representação. Isso introduz na envolt6ria uma diferença no ângulo de atrito resultando valores ligeiramente maiores quando se considera a relação '3 ' 1 σσ . Ensaiados vários corpos de prova com tensões de confinamento constantes, para cada corpo de prova define-se a envoltória com os círculos de Mohr obtidos, conforme se exemplifica na Figura 13.21. Figura 13.21 – Envoltórias obtidas a partir de ensaios triaxiais. Evidentemente, dependendo do ensaio podem-se traçar os círculos de Mohr em termos de tensões totais ou efetivas, podendo-se obter assim uma envoltória referida a tensões totais (c, φ) e outra referida a tensões efetivas (c’, φ'). Observar que o polo no ensaio de compressão triaxial coincide com o ponto representativo da tensão principal menor σ3. O aspecto que os corpos de prova mostram ao final do ensaio é bastante característico. Os solos que apresentam ruptura do tipo frágil mostram uma superfície de ruptura bem definida, podendo- se inclusive determinar a direção do plano de ruptura θcr; já os solos de comportamento plástico mostram um embarrigamento do corpo de prova sem a possibilidade de distinção dos planos de ruptura (Figura 13.22). 38 Figura 13.22- Formas características de ruptura dos corpos de prova no ensaio de compressão triaxial. 5.3 - Ensaio de Compressão Simples Este ensaio pode ser entendido como um caso especial do ensaio de compressão triaxial. A tensão confinante é a pressão atmosférica, donde σ3 = 0. O valor da tensão principal na ruptura, σ1, recebe o nome de resistência à compressão simples, Rc. 5.4 - Outros Tipos de Ensaios Em várias situações especiais conduzem-se ensaios que procurem reproduzir com mais fidelidade as condições de solicitação impostas ao solo, ou ainda ensaios que permitam medir um aspecto definido, como no caso do ensaio de cisalhamento em anel (ring-shear). Neste ensaio, empregado para medir a resistência residual ou última do solo (ver item 7.7) é possível submeter o corpo de prova a deslocamentos grandes de uma forma contínua. A Figura 13.23 ilustra referido ensaio. Figura
Compartilhar