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NEUROCIÊNCIA DA LINGUAGEM Profª Tammy Ribeiro 2

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NEUROCIÊNCIA DA LINGUAGEM Profª Tammy Ribeiro 2 
CONVERSA INICIAL Com o surgimento das ciências cognitivas na segunda metade do XX, tendo como intuito compreender como o sistema nervoso controla o comportamento humano, investigando as questões do conhecimento humano, atualmente os estudos das ciências cognitivas englobam algumas disciplinas; dentre elas, vamos destacar aqui as neurociências da linguagem. Hoje, muitos estudos e pesquisas se voltam para estudar a linguagem e o cérebro, desde seu funcionamento no campo da fonética, passando pela leitura até o encadeamento da fala. Cabe ressaltar que estes estudos contribuem de forma significativa para a compreensão da linguagem em suas diversas áreas, como no processo de alfabetização e também no processo de ensino e aprendizagem da escrita e da leitura. Relacionar a linguagem com as neurociências é uma forma de entender uma aproximação sincronizada entre as bases biológicas e psicológicas. A linguagem pode ser entendida como a primeira forma de socialização do ser humano, ainda enquanto criança. Seja por estímulo dos adultos, por meio de conversas diretas, pelas instruções que são passadas e pelas histórias contadas, que expressam valores culturais ou ainda de forma implícita, ao participar de interações verbais (Borges e Salomão, 2003). Por isso, se pode considerar a linguagem como um ente principalmente cultural. É no processo de aquisição da linguagem que o indivíduo apreende os valores, crenças e normas implícitas em sua comunidade. No entanto, não podemos esquecer que há uma parcela importante de carga biológica no processo de desenvolvimento da linguagem, por isso é importante compreender a linguagem a partir de sua construção social/cultural e, também, biológica. As neurociências se encarregam de explicar como o universo biológico interno se comporta no processo do desenvolvimento da linguagem. São as centenas de milhões de pequenas células nervosas que, por meio de impulsos eletroquímicos, realizam a comunicação do cérebro com o sistema nervoso, dando ao ser humano a capacidade de realizar atividades muito especiais, entre elas pensar, sentir, sonhar, se emocionar, se movimentar e muitas outras funções mentais e físicas comandadas pelo cérebro, sem as quais não seria possível a expressão de toda a riqueza interna do ser humano, nem 3 perceber o mundo externo, através dos sons, cores, texturas, sabores, etc. (Relvas, 2009). As disciplinas que estudam o sistema nervoso a partir da biologia são denominadas neurociências. Estas disciplinas buscam investigar o cérebro em sua estrutura, funcionamento, anatomia, química e fisiologia, em pessoas consideradas normais, doentes ou até com deficiências. Juntamente com outras disciplinas, como a linguística e a semiótica, as neurociências conseguem entender como o sistema nervoso central funciona e como as pessoas podem melhorar no seu processo de cognição, principalmente aqueles que têm alguma necessidade educacional especial. Sendo assim, esta aula tem como objetivo apresentar a estrutura da aquisição da linguagem, dando destaque, primeiramente, ao seu desenvolvimento, apresentando os principais fatores que estão ligados a este. Sucedendo-se a esse tema, discutiremos sobre as principais teorias que norteiam os estudos sobre o desenvolvimento da linguagem nos seres humanos, discutindo autores como Piaget, Vygotsky, Chomsky, Skinner e outros. Perpassaremos pela compreensão na naturalidade do ser humano em adquirir a linguagem, desde a primeira infância à vida adulta, buscando entender as fases das quais a criança precisa passar para desenvolver-se a partir da linguagem. Por fim, faremos um paralelo entre os conceitos de língua e linguagem, buscando compreender as definições que cada termo apresenta. CONTEXTUALIZANDO Como destacamos acima, as neurociências e a linguagem estabelecem uma relação natural, visto que neste processo se relacionam bases biológicas e psicológicas. É importante compreender que uma está ligada à outra, de forma tão intrínseca que os aspectos psicológicos do ser humano necessitam das bases biológicas para se desenvolverem, ao mesmo tempo que o biológico necessita do psicológico para se adaptar melhor ao meio ambiente, mediante a ciência, arte, filosofia e as diferentes formas de saber. Se por um lado a linguagem é a forma como construímos nossa comunicação, por outro, as neurociências, que são o campo de estudo científico que mais cresce nos últimos anos, tem conseguido explicar como o cérebro 4 humano funciona, como o ser humano pensa, aprende e, principalmente, como ele se comunica. Isso se confirma a partir do estudo de Skinner, Vygotsky, Piaget, Broca, Chomsky, Geschwind, Fodor, Lenneberg, Miller e outros. Teóricos da Filosofia, Psicologia, Neurologia, Memória, Linguística, Gramática, Fisiologia, Anatomia, Antropologia e outras áreas do saber, se debruçaram sobre essa temática na busca de entender como o homem funciona. O primeiro aporte importante a respeito da linguagem foi realizado pelo médico francês Paul Broca, no ano de 1864, quando, em estudo com pessoas que não conseguiam falar, descobriu que estas apresentavam lesões no hemisfério esquerdo do cérebro; por outro lado, Karl Wernicke, na Alemanha, descobre que as lesões no hemisfério direito mantêm nas pessoas a fluência da fala, mas altera sua compreensão. Os dois aportes estão relacionados à linguagem, pois para que sua aquisição seja completa, há que manter a compreensão da realidade, juntamente com as estruturas básicas da audição e da fala. A partir desses estudos, vários autores se puseram a pesquisar como a linguagem se desenvolve nos seres humanos, desde o início da vida, buscando compreender como as estruturas cerebrais se desenvolvem na criança e como o surgimento e a aquisição gradativa da linguagem se dá no seu interior. TEMA 1 – DESENVOLVIMENTO DA LINGUAGEM Antes de falarmos do desenvolvimento da linguagem ou sua aquisição, é interessante que compreendamos do que se trata o seu conceito. Autores como Atkinson, Smith, Bem e Nolen-Hoeksema (2002) definem a linguagem como sendo um processo que organiza e combina palavras para fins de comunicação do pensamento. Neste sentido, a linguagem apresenta um caráter universal que, como bem apresentado por Heidegger (1976), cabe somente à espécie humana. O seu uso proporciona às pessoas a capacidade de dominar e usar um sistema linguístico bastante complexo. É fato que a linguagem é a primeira forma de socialização da criança, o que possibilita que ela tenha acesso, antes de iniciar a sua fala, a crenças, costumes, valores, regras e assim obtenha conhecimento a respeito da sua cultura. 5 A aquisição da linguagem depende de fatores sociais e neurobiológicos, em suma, são imprescindíveis as interações sociais e um bom desenvolvimento das estruturas cerebrais para que o seu desenvolvimento se dê significativamente. Essa aquisição da linguagem também se dá a partir do processo de aprendizagem, que o indivíduo terá ao longo da primeira infância. É importante ressaltar que no desenvolvimento da linguagem vão influenciar fatores biológicos, psicológicos e sociais. (Mazzafera e Sordi, 2002) Esses fatores são de extrema importância no desenvolvimento da linguagem, por isso a relevância de estar atento ao desenvolvimento da criança, tanto pais, familiares e responsáveis, assim como professores, pois sabemos que muitas crianças entram nas escolas muito cedo, umas a partir dos seis meses, e quem acaba tendo mais contato com o desenvolvimento dessa criança é o professor. No que diz respeito aos fatores psicológicos podemos destacar a relação estabelecida entre a mãe e o filho; quanto maior o vínculo e quanto maior a qualidade das trocas afetivas e emocionais entre a mãe e o filho melhor será o desenvolvimento da linguagem. Crianças em situação de vulnerabilidade social, que sofrem maus tratos, abandono, violência dentre outros, podem vir apresentar dificuldades e também atrasos no desenvolvimento da linguagem. A relação parental deve ser vista e tratada com seriedade, pois exerce grandeinfluencia no desenvolvimento do processo de aprendizagem infantil. (Nogueira; Altafim; Rodrigues, 2011) Com relação aos fatores sociais, Vygotsky (1931), a partir da sua teoria histórico-social, destaca que as trocas que o sujeito realiza com o meio vão influenciar no desenvolvimento da aprendizagem. O referido autor evidencia que todo aprendizado está baseado no conjunto das experiências culturais, as fases iniciais do desenvolvimento da linguagem estão diretamente ligados a reflexos condicionados, ou seja, o ambiente torna-se determinante nesse processo de desenvolvimento. Vygotsky (1931) afirma que: Todas as funções mentais superiores são internalizadas nas relações sociais, são a base da estrutura social da personalidade. Sua composição, estrutura genética e modo de ação, em uma palavra, toda a natureza é social, portanto, o homem mantém as funções de comunicação com ele mesmo (p. 150). 6 Assim percebe-se a importância de a criança estabelecer trocas com meios que favoreçam sua aprendizagem, distante de brigas, situações de violência, riscos e pobreza extrema, pois estes vão contribuir negativamente, atrasando e dificultando seu desenvolvimento. Conforme cita Araujo (2005), "A maneira pela qual as pessoas falam do mundo está relacionada com a maneira pela qual o mundo é compreendido e, em última análise, como essas pessoas atuam nele, e o conceito de mudança revolucionária depende, em grande parte, da maneira pela qual o mundo é estruturado pela linguagem" (Ecles, R.; Nohria, N., 1992, p. 58). A forma como se compreende o que está à sua volta está intrinsecamente ligada à forma como o indivíduo se expressa em relação à sua realidade. Linguagem, além de simples expressão mecânica, biológica, é compreensão de mundo, e a compreensão do mundo influencia diretamente na forma com os seres humanos agem no mundo. TEMA 2 – AS TEORIAS DA AQUISIÇÃO DA LINGUAGEM Nos anos que se sucederam aos primeiros estudos médicos relacionados a como o cérebro humano funciona, vários estudiosos se propuseram a investigar como a linguagem humana se processa desde os primeiros momentos de vida até a fase adulta. Destes estudos surgiram várias teorias, entre elas as teorias Inatista, Condutista, Cognitiva e Construtivista. Entre seus principais expoentes estão Noah Chomsky, que postulou a Teoria Inatista; Burrhus F. Skinner, que apresentou seu posicionamento Condutista da aquisição da linguagem; enquanto que a Teoria Cognitiva é pensada por Jean Piaget, que contemporaneamente a Lev Vygotsky, também apresenta aspectos da muito divulgada nos dias atuais Teoria Construtivista. Outros pensamentos e teorias surgiram nesse tempo, porém não tiveram tanta ênfase e discussões como os apresentados nesta aula. A partir de agora apresentamos alguns aspectos dessas teorias, evidenciando que, mesmo com divergências muito contundentes entre elas, todas tiveram e continuam tendo muita força na explicação de como a linguagem se desenvolve no ser humano. Chomsky destacou que “a criança possui uma teoria inata sobre descrições estruturais [gramaticalmente] potenciais que é suficientemente rica e desenvolvida para lhe permitir determinar, a partir de uma situação real em que 7 ocorre um sinal, quais as descrições estruturais que podem ser apropriadas a este sinal” (Chomsky, 1975: 115). O autor aponta que a capacidade do ser humano de falar e compreender uma língua deve ser entendida como algo inato, nesta perspectiva suscita a teoria que tem como foco: O fato de crianças dominarem uma língua natural com surpreendente rapidez, apesar da ausência de evidência negativa, da frequência com que sentenças incompletas ou interrompidas são usadas pelos adultos, somado ao fato de que o input a que a criança é efetivamente exposta é finito [...] Isto é, a informação que se faz necessária e não está disponibilizada no input linguístico recebido pelas crianças é atribuída a princípios linguísticos inatos. (Chomsky, 2002, p.32) Como explicar a quantidade de organizações gramaticais e frasais faladas pelas crianças pequenas, já que não há condições de os adultos ensinarem todas as combinações existente na língua para estas? Para Chomsky (2002) as crianças possuem uma gramática interna, gerativa, que faz com que esta produza novas expressões que, na maioria das vezes, já existem na língua materna. Chamamos a teoria da linguagem de Peter [um sujeito qualquer] de “gramática” de sua linguagem. A língua de Peter determina uma gama infinita de expressões, cada uma com seu som e significado. Em termos técnicos, a língua de Peter, gera as expressões de sua linguagem. A teoria de sua linguagem é, portanto, chamada gerativa. (Chomsky, 2002, p.32) Uma gramática interna, que gera uma gama infinita de expressões que casam perfeitamente com a gramática da linguagem utilizada pelos nativos, conterrâneos da criança. Isso se processa de dentro para fora, mas somente se efetiva se houver o estímulo externo. Somente conversando com a criança, interagindo com esta, este mecanismo de nascença vai ser ativado e a linguagem na criança vai se desenvolver. Indo por outro caminho, Skinner apresenta sua teoria, postulando que a criança não desenvolve a linguagem por si mesma, mas necessita de uma série de fatores externos para que esta se desenvolva. Definindo-se como um behaviorista radical, este teórico tem por objetivo epistemológico combater todo pensamento voltado à uma função interna na explicação dos comportamentos onde o meio, na sua concepção, tem um papel central. (Parot, 1978) Baseando-se em estudos do comportamento dos animais, Skinner entende que o comportamento humano, nesse caso, o processo de aquisição da linguagem, é compreendido mediante uma cadeia de estímulo-resposta-reforço. 8 Enquanto o meio oferece os estímulos linguísticos, a criança acaba por fornecer respostas, compreendendo ou produzindo novas fórmulas linguísticas, o que prontamente é reforçado pelos adultos que estão em seu entorno. Esse reforço pode ser positivo, quando há o acréscimo ao estímulo reforçador, ou negativo, quando há a remoção de alguns estímulos. Independentemente de ser positivo ou negativo, “em ambos os casos, o efeito do reforço é o mesmo: a probabilidade da resposta será aumentada” (Skinner, 1970, p.49). Diante disso, há uma valorização do ambiente escolar por parte de Skinner (1970), pois, é um espaço onde os comportamentos são reforçados a todo tempo, mediante boas notas, promoções, diplomas, graus, medalhas e a aprovação. Como reforçadores negativos, por muitos anos se utilizou a palmatória e os castigos físicos, mas até hoje ainda prevalecem em muitos espaços educacionais de forma negativa os estímulos verbais e morais. Indo por uma outra vertente, diferente das de Chomsky e Skinner, surge o epistemólogo Jean Piaget, com sua teoria da Epistemologia Genética, muito conhecida também como teoria cognitiva. Partindo dos processos biológicos da mente, Piaget explica que a aquisição da linguagem se dá pela evolução cognitiva. Para este, quatro fatores intervêm no desenvolvimento da linguagem da criança: [...] a experiência do mundo, a maturação, o meio social e o equilíbrio que ele define como uma função biológica característica de todos os organismos vivos e que tem por objetivo responder, por processos de regulamentação e de compensação, . . . aos desequilíbrios provocados pelo meio. (Parot, 1978, p.119) Partindo da ideia de que, tal qual as espécies animais, a mente humana também é adaptável ao ambiente em que vive. Para que a adaptação aconteça, um processo importante se sucede dentro do cérebro humano; a esse processo Piaget chamou Equilibração. Segundo Ribeiro e Pires (2015, p.2945): Pode-se dizer que o processo de equilibração é de fundamental importância para o desenvolvimento da mente humana, já que diuturnamente, por não possuir estruturas suficientes para seu entendimento, esta é posta em desequilíbrio, sempre que surge uma nova situação. Esses mecanismos fazem parte do processo evolutivo da humanidade, pois são uma das formas de adaptação do ser humano no meio ambiente emque vive. Sempre que uma situação nova surge, uma palavra nova, uma nova forma de utilizar a palavra dentro de uma frase, ou até um conceito novo 9 relacionado a um termo conhecido, o cérebro inicia um mecanismo de adaptação, baseado num processo de equilíbrio das estruturas virtuais do cérebro. A essas estruturas não reais, Piaget chamou Esquemas: Os esquemas não devem ser entendidos como estruturas reais, mas um conjunto de padrões de comportamentos sequenciais, formando uma totalidade organizada. Não há como observar um esquema, mas pode-se inferi-lo a partir de ações do sujeito. Ao explicar o conceito de esquema, Piaget apresentou alguns exemplos deste que são muito comuns no primeiro período da infância, como os esquemas de mamar, de enxergar, de pegar (Ribeiro; Pires 2015, p.2946). Há esquemas para todas as experiências que o indivíduo tenha tido na vida. Ao surgimento de cada situação nova, o cérebro se desequilibra, e num processo adaptativo, necessita voltar a equilibrar-se. Para que isso aconteça, dentro do processo de equilibração da cognição humana surgem dois processos muito distintos, a assimilação e a acomodação. Enquanto a assimilação é a ação do indivíduo sobre sua realidade, pois trata-se de uma integração do novo dado às estruturas prévias do cérebro, sem necessitar de um desequilíbrio aparente, a acomodação, por sua vez, obriga o indivíduo a modificar-se em suas estruturas internas, a fim de absorver a nova informação (Ribeiro; Pires 2015). Isso leva a uma compreensão de que a aquisição da linguagem no ser humano não pode ser inata, muito menos empírica, mas construtiva. O ser humano não é passivo no desenvolvimento de sua linguagem; é a partir das experiências que tem que constrói seu conhecimento sobre o mundo. A teoria de Piaget é, atualmente, uma das mais discutidas no campo da aprendizagem, tomando força mais recentemente, a partir dos estudos de Vygotsky, que insere os processos sociais e culturais sobre os mecanismos de desenvolvimento da aprendizagem e, por consequência, da linguagem. É da mescla, cautelosa, das teorias desses dois estudiosos, que surgiu uma das teorias mais discutidas atualmente entre os educadores, o Construtivismo. Saiba mais Para saber mais sobre essas teorias, disponibilizamos abaixo algumas sugestões de leituras: BARCELOS, R. da S. de. As teorias de linguagem, as concepções de língua e a metodologia adotada de ensino de língua portuguesa. In: Cadernos do CNLF, Vol. XVII, Nº 03 - Minicursos e Oficinas. Rio de Janeiro: CiFEFiL, 2013. 10 Disponível em: . Acesso em: 25 mai. 2018. PAROT, Françoise. Algumas notas sobre as teorias da linguagem: Piaget, Chomsky, Skinner. In: Análise Psicológica. 1978, II, 1:115-124. Disponível em: < http://repositorio.ispa.pt/bitstream/10400.12/1928/1/1978_1_115.pdf>. Acesso em: 25 mai. 2018. RIBEIRO, Rafael Martins; PIRES, Ennia Débora Passos Braga. Fundamentos da Epistemologia Genética e sua crítica à psicologia e educação tradicionais. In: Educere: XII Congresso Nacional de Educação. Curitiba. Anais: PUCPR, 2015. 29941-29954. Disponível em: . Acesso em: 25 mai. 2018. TEMA 3 – A AQUISIÇÃO DA LINGUAGEM COMO FENÔMENO NATURAL Vamos iniciar este tema pensando como a criança adquire uma língua. Podemos dar destaque para o fato que a criança adquire, pelo menos, uma língua, seja essa oral ou manual. Quando falamos desse processo de aquisição da linguagem na criança, percebemos que esta parte de uma condição inicial, em que não domina uma língua ou uma linguagem, para uma condição final, a qual passa a dominá-la. Podemos destacar que, à medida que a aquisição da linguagem é vista enquanto fenômeno natural num sentido amplo, decorre de um meio verbal de expressão e interação social. Neste sentido deve-se levar em conta a língua natural do falante e o contexto social no qual esse se encontra, pois a criança tende a se identificar em diálogos e atividades de interação entre adultos e crianças (Lazarin, 2009). O diálogo estabelecido entre a criança e o adulto torna-se significativo à medida que esse servirá para o que chamamos de input para a língua produzida pela criança a partir da relação de interação da língua com quem ela interage. A respeito deste modo complementa Lemos (1989, p. 5): É, aliás, essa noção de interação que permite discutir a validade do termo input para designar os dados a que a criança é exposta. Pensar esse diálogo inicial como uma mera exposição da criança a dados da língua significa, de um lado, negar a fala do adulto como atividade interpretativa do tipo “como se” que recorta o comportamento da criança, atribuindo-lhe forma, significado e intenção. De outro lado, o que isso implica é 11 considerar a criança como um sujeito já constituído, capaz de uma análise categorial dessa fala, o que é não só incompatível com qualquer proposta construtivista como um obstáculo que impede o investigador de identificar os processos pelos quais a criança passa dessa dependência dialógica – ou da condição de interpretado – para o controle efetivo de sua posição discursiva – ou para a condição de intérprete. A saber, intérprete do outro, de si próprio e da linguagem como geradores de significado e intenção. A autora ainda salienta que traçar um esquema do padrão categórico da fala da criança é difícil, pois a mesma autora apresenta três fatores relevantes: o primeiro tange à imprevisibilidade e à heterogeneidade na fala das crianças que estão iniciando a construção da língua materna, isso pelo fato de que as correspondências entre a fala e a gramática do adulto não são frequentes e não são produtivas, ocorrendo poucas vezes. A imprevisibilidade que ocorre na gramática do adulto e a heterogeneidade de enunciados prevalecem, causando assim dificuldade no planejamento da criança em obter um modelo de aquisição da língua. O segundo fator destacado por De Lemos refere-se ao “erro” após uma conformidade da gramática com a fala do adulto, como destaca “os erros passaram assim a ser considerados, não como indícios de não saber, mas como refletindo um novo estágio de desenvolvimento, levado a efeito por processos de reorganização de formas anteriormente adquiridas” (De Lemos, 1999, p. 4). O Terceiro fator destacado pela autora acima referido está na impermeabilidade da criança na correção que os adultos fazem a respeito de suas falas, ou seja, apesar da criança perceber o “erro” com relação ao enunciado da gramática ela preserva o seu uso, de acordo com a sua vontade. Isso faz com que futuramente a este processo ela consiga perceber seu “erro” e tente reformular novos enunciados. O percurso da aquisição da linguagem desenvolve quatro sistemas correlacionados, que são definidos a partir do olhar de Schirmer, Fountoura e Nunes (2004), o pragmático que se refere ao uso comunicável da linguagem em um contexto social; o fonológico, este relaciona a percepção e a produção de sons na construção das palavras; o semântico define a referência das palavras e seu significado, por fim, o gramatical estabelece regras sintáticas e morfológicas para organizar as palavras em frases prontas para a compreensão. TEMA 4 – ETAPAS NORMAIS DA AQUISIÇÃO DA LINGUAGEM 12 Vamos apresentar aqui as sequências de estágios percorridos pela criança no seu desenvolvimento da linguagem, neste sentido destaca-se que as idades apresentadas podem variar de criança para criança, porém as sequências dos estágios, estas não variam (Brown, 1973). Iniciamos então falando sobre os primeiros meses de vida, de três a quatro meses a criança começa o balbucio, ela emite sons que não apresentam significados, estudos (Bosch e Sebastián-Gallés (1997); Christophe e Morton, 1998) demonstram que nessa etapa a criança é capaz de distinguir a língua materna de línguas estrangeiras, demonstrando sensibilidade e distinção das estruturas e das propriedades da fonologia da língua natural. Aos seis meses a criança continua a balbuciar, mas agora com uma quantidade maior de sons; aqui a criança começa a formar várias sílabas, as quais ela vai repetir inúmeras vezes, a exemplo: bá, bá, bá, bi,bi, bi. Entre dez meses e doze meses o balbuciar da criança cria forma e ela emite apenas os sons que escuta, começam também a estruturar os significados desses sons, aqui as crianças apresentam alto nível de sofisticação em suas habilidades de percepção da língua que serão relevantes na aprendizagem do léxico da sua língua materna. Assim as crianças se encaminham para iniciar suas primeiras palavras (Petitto e Marentette, 1991). Com um ano de vida completo a criança, além de balbuciar, já emite os sons de suas primeiras palavras, que vão denominar o que está ao seu entorno como “papai”, “mamãe”, “nhanha”, dentre outros. Nesta fase seus enunciados são formados por apenas uma palavra que pode ter significado de uma sentença completa. McNeil (1966) estudou um bebê de 15 meses, que usou a palavra door (“porta”) para significar “feche a porta” e water (“água”) para significar “tem água em meus olhos”. Nesta fase de um ano é comum que a criança se utilize de gestos para também se comunicar, como indicar algo que deseja ou levantar os braços para quem está a sua frente, indicando que deseja o colo (Grolla, 2006). A partir de um ano e meio a criança já começa a produzir de dez a cinquenta palavras e algumas frases de no máximo duas palavras. Nesse momento já começa a chamar a atenção para receber resposta verbal de um adulto (Rotta, 2006). Ainda segundo Rotta (2006), aos dois anos, já produz de cento e cinquenta a duzentas palavras e frases de três palavras, e já tem a capacidade 13 de nomear objetos quando solicitada. Aos três anos, sentenças gramaticais já podem ser observadas (artigos, preposições, plurais), além de já formular questões. Entre os 4 e 6 anos, já é esperada completa inteligibilidade para a fonologia do português e do inglês. É importante destacar que se espera que essas etapas surjam nas crianças que possuem suas estruturas cognitivas em perfeito funcionamento, em caso de deficiência ou patologia, esse processo muda e precisa ser acompanhado e estudado. TEMA 5 – LINGUAGEM E LÍNGUA É importante que, ao nos aprofundarmos nessas temáticas que estamos estudando nesta disciplina, compreendamos os conceitos de língua e linguagem. Segundo Suassure (2004), a língua é o pensamento organizado da matéria fônica, pois ela organiza o pensamento, sendo este uma massa amórfica e indistinta, cuja distinção e organização são operadas pela língua, uma vez que essa serve como intermediária entre o pensamento e o som. É como se para que o pensamento humano se organize, exista a necessidade de uma organização gramatical, léxica, simbológica... Essas acabam por formar a língua. Se a língua é a externalização do pensamento, de forma organizada, a linguagem é a capacidade humana de expressar e externalizar uma ou mais línguas. Nesse ponto, a linguagem se apresenta como um conceito muito mais amplo que o da língua, pois a linguagem inclui as línguas entre suas manifestações, mas não apenas elas (Perini, 2010). A linguagem é a capacidade humana de externalizar sentimentos, sensações, informações, opiniões e desejos de forma verbal, falada e escrita, e não verbal. Isso faz com que esse termo transcenda a ideia de língua. Enquanto a linguagem é essência, a língua é o meio de comunicação dessa essência. FINALIZANDO Ao homem cabe desenvolver-se linguisticamente, pois essa capacidade é inerente a ele, faz parte de sua estrutura biológica e social. E entendendo essa natureza humana, estudiosos da biologia e da sociologia se debruçam ao estudo dessa capacidade humana. 14 É a partir de uma busca científica, seja ela neurológica, social, antropológica ou filosófica, que seja responsável e respeite a condição humana, que essa capacidade que é inerente ao homem vai sendo entendida e compreendida a cada nova descoberta. Está muito claro que nenhuma das teorias apresentadas nesta aula apresenta ideias conclusivas sobre as ciências que estudam a linguagem humana. Elas estão em evolução e a cada dia aprendemos mais. É necessário que mais estudiosos, independente de qual vertente ou área científica sigam, se debrucem sobre essa temática e busquem compreender como nós construímos nossa forma de falar. Somente assim poderemos nos comunicar melhor e educar melhor. LEITURA OBRIGATÓRIA Texto de abordagem teórica PAROT, F. Algumas notas sobre as teorias da linguagem: Piaget, Chomsky, Skinner. In: Análise Psicológica, 1978, II, 1:115-124. Disponível em: . Acesso em: 24 maio 2018. RIBEIRO, R. M.; PIRES, E. D. P. B. Fundamentos da epistemologia genética e sua crítica à psicologia e educação tradicionais. In: Educere: XII Congresso Nacional de Educação. Curitiba. Anais..., PUCPR, 2015. Disponível em: . Acesso em: 24 maio 2018. Texto de abordagem prática BARCELOS, R. da S. de. As teorias de linguagem, as concepções de língua e a metodologia adotada de ensino de língua portuguesa. In: Cadernos do CNLF, v. XVII, n. 3 – Minicursos e Oficinas. Rio de Janeiro: CiFEFiL, 2013. Disponível em: http://www.filologia.org.br/xvii_cnlf/min_ofic/04.pdf>. Acesso em: 24 maio 2018. Saiba mais ARAUJO, M. A. N. A estruturação da linguagem e a formação de conceitos na qualificação de surdos para o trabalho. Psicol. Cienc., jun. 2005. v. 25 n. 2. p. 15 240-251. Disponível em: . Acesso em: 24 maio 2018. 16 REFERÊNCIAS ARAUJO, M. A. N. A estruturação da linguagem e a formação de conceitos na qualificação de surdos para o trabalho. Psicol. Cienc., jun. 2005, v. 25 n. 2. p. 240-251. Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php? script=sci_arttext&pid=S1414-98932005000200007. Acesso em: 25 maio 2018. ATKINSON, R. L.; ATKINSON, R. C.; SMITH, E.E., BEM, D.J. & NOLENHOEKSEMA, S. Introdução à psicologia de Hilgard. 13. ed. Porto Alegre: Artmed, 2002. BORGES, L. C.; SALOMÃO, N. M. 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