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REVISTA PERSPECTIVAS EM PSICOLOGIA RReevviissttaa PPeerrssppeeccttiivvaass eemm PPssiiccoollooggiiaa,, VV.. 1155 nn..11.. JJaann // JJuunn 22001111 1 Sociedade de Psicologia do Triângulo Mineiro Diretoria (2010-2011) Presidente: Eulalia Henriques Maimone Vice Presidente: Helena de Ornellas Sivieri Pereira 1ª. Secretária: Cirlei Evangelista Silva Souza 2ª. Secretária: Larissa Guimarães Martins Abrão 1ª. Tesoureira: Célia Vectore 2ª. Tesoureira: Marineia Crosara Resende Coordenador de Eventos: Walter Mariano de Faria Silva Neto Editor da Revista: Moisés Fernandes Lemos UFTM – Universidade Federal do Triângulo Mineiro Reitor: Virmondes Rodrigues Junior Instituto de Educação, Artes, Letras, Ciências Humanas e Sociais Diretora: Fábio César da Fonseca Curso de Psicologia Coordenadora: Helena de Ornellas Sivieri Pereira UFU - Universidade Federal de Uberlândia Reitor: Alfredo Júlio Fernandes Neto Instituto de Psicologia Diretora: Áurea de Fátima Oliveira Coordenador do Programa de Pós-Graduação em Psicologia Coordenador: Ederaldo José Lopes Curso de Psicologia Coordenador: Joaquim Carlos Rossini http://www.uftm.edu.br/upload/institucional/Prof._Dr._Virmondes_Rodrigues_Junior.pdf REVISTA PERSPECTIVAS EM PSICOLOGIA 2 RReevviissttaa PPeerrssppeeccttiivvaass eemm PPssiiccoollooggiiaa,, VV.. 1155 nn..11.. JJaann // JJuunn 22001111 Expediente A Revista Perspectivas em Psicologia é uma revista científica semestral, publicada pela da Sociedade de Psicologia do Triângulo Mineiro e pelos cursos de Psicologia da Universidade Federal do Triângulo Mineiro e da Universidade Federal de Uberlândia. Ela é enviada a bibliotecas universitárias do Brasil com a missão de incentivar e difundir o conhecimento científico nas diversas áreas da Psicologia tendo como referência a produção do conhecimento sobre fatos e fenômenos da região Editor Moisés Fernandes Lemos (UFG-CAC) Conselho Editorial Antonio Roazzi (UFPE) Célia Vectore (UFU) Cláudia Davis (PUCSP) Eduardo Costa (Coimbra/PT) Elias Humberto Alves (UNICAMP) Eulália Henriques Maimone (UNIUBE) Fernando Antônio de Oliveira Leite (UNIMINAS) José Lino de Oliveira Bueno (USP/Rib. Preto) Marcela Cornejo Cancino (PUC – Santiago-Chile) Maria Aparecida Morgado (UFMT) Maria Gracite (Coimbra/PT) Maria Elisabeth Montagna (PUC-SP) Miguel Mahfoud (UFMG) Sinésio Gomide Júnior (UFU) Teresa Benitez Gray (Universidad de Oriente - Cuba). Endereço da Revista Universidade Federal de Uberlândia Campus Umuarama Av. Pará, 1720, Bloco 2C, Sala 31, Bairro Umuarama CEP 38405-320 – Uberlândia – MG. REVISTA PERSPECTIVAS EM PSICOLOGIA RReevviissttaa PPeerrssppeeccttiivvaass eemm PPssiiccoollooggiiaa,, VV.. 1155 nn..11.. JJaann // JJuunn 22001111 3 Publicada originalmente com o título de: Revista da Sociedade de Psicologia do Triângulo Mineiro. Primeiro volume e número (V.1 N.1) publicado em dezembro de 1998. Uberlândia – MG. Capa Andréia Fernandes Malaquias Assistente - Comunicação Social /UFTM Diagramação Thimoteo Pereira Cruz Impressão e Acabamento Gráfica Univesitária da Universidade Federal do Triângulo Mineiro Ficha catalográfica: REVISTA PERSPECTIVAS EM PSICOLOGIA. Uberlândia, V.15 N.1, jan/jun.2011. (V.1 N.1 de dezembro de 1998) Sociedade de Psicologia do Triângulo Mineiro. Universidade Federal do Triângulo Mineiro. Universidade Federal de Uberlândia Semestral 1. Psicologia ISSN 2237-6917 CDU: 159.9 Revista indexada ao INDEX-PSI (www.psicologia-online.org.br/index_psi.html) http://www.psicologia-online.org.br/index_psi.html REVISTA PERSPECTIVAS EM PSICOLOGIA 4 RReevviissttaa PPeerrssppeeccttiivvaass eemm PPssiiccoollooggiiaa,, VV.. 1155 nn..11.. JJaann // JJuunn 22001111 Editorial EDITORIAL SAÚDE E COMPROMISSO SOCIAL Moisés Fernandes Lemos Na década de oitenta, a sociedade organizada já levantava bandeiras, exigindo do Estado garantias de investimentos em saúde pública, educação e saneamento básico, por entender que essa era uma maneira de melhorar a qualidade de vida da população mais sofrida. Isso faz muito tempo, mas nas últimas décadas o Brasil observou a consolidação do regime democrático e hoje podemos participar diretamente da destinação de verbas públicas, atendendo às necessidades das diversas regiões de um país continental. Os problemas de saneamento básico foram relativamente resolvidos, as endemias e a mortalidade infantil foram controladas. O Brasil ainda tem muitos problemas, entretanto, nos últimos anos o número de brasileiros abaixo da linha da pobreza diminuiu, assim como diminuiu o número de mortes por fome, por problemas de saúde de fácil controle como diarréia e doenças infantis passíveis de coberturas pelas vacinações. Cresceu o número de brasileiros na escola, aumentando, principalmente a quantidade de anos em que o brasileiro permanece nela. Aumentou a incidência de brasileiros com carteiras assinadas, com capacidade de compra, com duas ou mais refeições dia e o acesso à casa própria. Enfim, as condições de vida no Brasil melhoraram, consideravelmente, nos últimos anos, elevando a expectativa de vida de nosso povo. Mas nesse cenário, hoje nos perguntamos: quais os desafios das instituições de ensino em Psicologia e as exigências do mercado de trabalho para a atuação em saúde? Para tentar responder a este questionamento retomamos um pouco da história da Psicologia. As experiências de Wundt na Alemanha levaram ao reconhecimento da Psicologia como área do saber, dotando-a de um objeto de estudo e de um método de investigação científica que a deram o status de ciência do comportamento. Os esforços de Freud, estabelecendo as bases da Psicanálise contribuíram, sobremaneira, para o desenvolvimento da clínica e indiretamente para a inclusão da Psicologia na área de saúde, seja pelo desenvolvimento da teoria, de procedimentos técnicos ou da prática clínica. Não obstante, foi a pequena possibilidade de recuperação dos pacientes internados nos hospitais psiquiátricos suscitou questionamentos em diversos países, levando ao surgimento dos primórdios do movimento denominado de anti-psiquiatria. Na década de 60 a luta anti-manicomial atinge seu ápice na Itália com Franco Baságlia que fecha os manicômios, dando aos internos um tratamento mais humano e devolvendo-lhes a cidadania. As experiências de Baságlia geram um movimento sem precedentes, com repercussão no mundo todo. REVISTA PERSPECTIVAS EM PSICOLOGIA RReevviissttaa PPeerrssppeeccttiivvaass eemm PPssiiccoollooggiiaa,, VV.. 1155 nn..11.. JJaann // JJuunn 22001111 5 No Brasil é apresentado o Projeto de Lei do deputado Paulo Delgado, que reduz o número de leitos e propõe meios alternativos ao tratamento do doente mental. Os trabalhadores da saúde se organizam em movimento e em 1985 é realizada uma convenção, exigindo mudanças significativas no modelo de saúde. Como consequência da organização dos trabalhadores em saúde pública o país adota um modelo de assistência inspirado no modelo de assistência sandinista, o qual teve como inspiração o modelo cubano. Observa-se, então, uma mudança significativa na assistência pública à saúde, com a redução de leitos e com a implantação das políticas do SUS em substituição ao modelo de hospitalização do INPS. Como principal recurso à assistência e promoção da saúde mental a lei prevê a instalação dos CAPS e a realização de oficinas terapêuticas. A saúde passa a ser um esforço conjunto de diversas áreas do saber, havendo uma horizontalização do poder na equipe interdisciplinar que atende à demanda, ou seja, a saúde mental deixa de ser uma atribuiçãodo psiquiatra, contando com as contribuições de profissionais de diversas áreas, dentre elas a Psicologia. No que se refere à expansão das áreas de atuação da psicologia clínica os profissionais com formação de inspiração psicanalítica, por influência da Psicanálise Argentina, de forte inspiração socialista, começam a praticar uma clínica mais social, posto que a Psicologia clínica passe a ser praticada de maneira mais extensa, afirmando seu compromisso com as camadas menos favorecidas da população, mas por diversas razões que não cabe aqui discuti-las amiúde. Fato é que a Psicologia Clínica ao ser aplicada em larga escala carece da adequação das técnicas para atender uma clientela mais ampla da população, inaugurando a chamada clínica extensa, que sem negar as origens psicanalíticas faz uma clínica mais voltada para o social, se adaptando gradativamente às características da sociedade brasileira. Se na década de 1980 recebíamos formação voltada para a Psicologia de atendimentos individuais em consultórios, hoje ainda temos deficiências: carecemos de formar profissionais para uma nova realidade: a saúde pública. Não basta ensinar técnicas atendimentos clínicos, colocar profissionais no mercado em larga escala, pois suas primeiras oportunidades de trabalhar provavelmente serão na saúde pública. No entanto, o modelo de formação que ele recebeu não o capacita para atuar nessa área, gerando problemas para quem contrata e para o próprio psicólogo que se vê frustrado em suas iniciativas e com a identidade profissional pouco estabelecida. Nesse cenário, nos parece que o grande desafio para quem atua em saúde pública seja, por um lado, trabalhar numa equipe interdisciplinar, colocando sua escuta treinada a serviço do grupo. Por outro, vimos como um desafio o desenvolvimento de habilidades e competências, adequando as técnicas para o atendimento em grupo, com o envolvimento das famílias, das instituições e da rede social. O aprimoramento das oficinas terapêuticas é outro desafio, já que na prática elas não cumprem o papel previsto na legislação. Cabe ainda destacar que o papel do psicólogo na equipe não está garantido na lei, devendo os colegas que ali atuam justificar suas permanências nas equipes de trabalho e essa justificativa se faz com empenho e resultados. Entendemos que esse problema deva ser resolvido pela categoria e pelas instituições formadoras de tal maneira que o público alvo seja mais bem assistido. Destacamos, ainda, REVISTA PERSPECTIVAS EM PSICOLOGIA 6 RReevviissttaa PPeerrssppeeccttiivvaass eemm PPssiiccoollooggiiaa,, VV.. 1155 nn..11.. JJaann // JJuunn 22001111 que não da para pensar em formação em Psicologia sem pensar em Psicologia Aplicada. O compromisso profissional do psicólogo deve ser essencialmente com a sociedade, como retribuição dos investimentos sociais em sua formação e capacitação como forma de diminuir o sofrimento humano, seja a instituição formadora pública ou privada, posto que todas usufruam das benesses do Governo. Sendo assim, cabe aos periódicos de Psicologia estimular a discussão, difundir os resultados de pesquisas e publicar avanços e retrocessos da área. Essas experiências, certamente, contribuirão para que a Psicologia alcance seu lugar na história. Nesse sentido, a Revista Perspectivas em Psicologia, sem perder de vista sua proposta generalista, soma esforços com as demais publicações do gênero, buscando um lugar para os psicólogos nas equipes de saúde, por mérito e competência. Tenham uma boa leitura! REVISTA PERSPECTIVAS EM PSICOLOGIA 7 RReevviissttaa PPeerrssppeeccttiivvaass eemm PPssiiccoollooggiiaa,, VV.. 1155 nn..11.. JJaann // JJuunn 22001111 Artigos CAMINHOS METODOLÓGICOS NA PESQUISA EM PSICOLOGIA: PESQUISANDO A ATUAÇÃO DO PSICÓLOGO ESCOLAR Marilene Proença Rebello de Souza (USP – São Paulo - SP) Anabela Almeida Costa e Santos Peretta (UFU – Uberlândia - MG) Juliana Sano de Almeida Lara (UFU – Uberlândia - MG) Roseli Fernandes Lins Caldas (Instituto Mackenzie – São Paulo - SP) Resumo O presente artigo propõe-se a apresentar e discutir os recursos metodológicos utilizados para realização da pesquisa “A atuação do psicólogo da rede pública de ensino frente à demanda escolar: concepções, práticas e inovações”, no estado de São Paulo. A investigação foi organizada em duas frentes concomitantes: 1) pesquisa de campo sobre práticas psicológicas desenvolvidas na rede pública de educação, que contemplou aplicação de questionários e realização de entrevistas; 2) análise documental por meio da revisão de literatura sobre a atuação do psicólogo na educação. Foi possível mapear onde e como atuam os psicólogos paulistas. Identificaram-se avanços nas práticas profissionais psicológicas no campo da educação, os quais anunciam que psicólogos têm se apropriado dos conhecimentos da Psicologia Escolar e Educacional Crítica. Palavras-chave: psicologia escolar; metodologia; atuação do psicólogo; ensino público. Abstract Methodological paths Research in Psychology: survey on school psychologist proceedings This article aims to present and discuss the methodological resources for the research “School Psychologists in Public School Education: conceptions, practices and innovations” in the State of São Paulo, Brazil. The investigation was organized into two concomitant fronts: 1) field research on the psychological practices developed in public education, which included questionnaires and interviews; 2) document analysis by reviewing the literature about the practice of psychologists in education. It enabled the mapping of where and how the psychologists work. Advances in professional psychological practice in education were identified, which announced that psychologists have appropriated the knowledge from Critical School Psychology. Keywords: school psychology; methodology; psychologist performance; public education. Artigo Recebido em 03/01/2012 e Aprovado em 29/8/2012 MARILENE PROENÇA REBELLO DE SOUZA, ANABELA ALMEIDA COSTA E SANTOS PERETTA, JULIANA SANO DE ALMEIDA LARA, ROSELI FERNANDES LINS CALDAS RReevviissttaa PPeerrssppeeccttiivvaass eemm PPssiiccoollooggiiaa,, VV.. 1155 nn..11.. JJaann // JJuunn 22001111 8 Introdução O presente artigo se propõe a apresentar e discutir os recursos metodológicos utilizados para a realização da pesquisa “A atuação do psicólogo da rede pública de ensino frente à demanda escolar: concepções, práticas e inovações”. Considerando a relevância da escolha e sistematização do percurso metodológico para os estudos científicos, o presente texto tem como objetivo compartilhar os desafios e os caminhos encontrados para desenvolver estudo comprometido com conhecer e discutir a atuação em Psicologia Escolar e Educacional. A pesquisa em questão foi desenvolvida em âmbito nacional, nos estados de São Paulo, Rondônia, Acre, Minas Gerais, Bahia, Santa Catarina e Paraná. Buscou-se manter uma unidade metodológica em todos os estados, possibilitando, assim, que tivéssemos acesso a uma espécie de “estado da arte” da prática profissional em Psicologia no campo da educação. E, neste artigo, nos deteremos mais especificamente no modo como se deu a condução do estudo no estado de São Paulo. Destaca-se a relevância de São Paulo para que se conheçam as tendências e as peculiaridades da atuação em Psicologia. É possível constatar que o estado concentra quase um terço dos psicólogos brasileiros 1 e abriga os principais centros de pesquisa e formação que têm desenvolvido propostas de mudança de rumos na Psicologia Escolar e Educacional. A Psicologia Escolar passou por uma grande transformação desde a década de 1980, quando foram desvelados os compromissos político-ideológicos que vinham sendo assumidos até então poresta ciência e profissão. Passou-se, então, de uma atuação psicológica marcada pela intervenção junto à dimensão individual das questões escolares, para práticas mais comprometidas com os aspectos institucionais e políticos da educação. Tais mudanças também impactaram a pesquisa em Psicologia Escolar e Educacional. Há cerca de 20 anos, começaram a ganhar evidência trabalhos dedicados a compreender o processo de escolarização. A temática das políticas públicas em Educação também se tornou foco de atenção das pesquisas em Psicologia (Souza, 2010a). Em consonância com a vertente de pesquisa voltada à compreensão de como as políticas públicas em Educação têm sido implantadas e apropriadas pelos diversos participantes da vida diária escolar, estão os estudos que buscam compreender como tem se dado a inserção da psicologia na educação pública brasileira (Balbino, 2008; Marinho-Araújo, Neves, Penna-Moreira e Barbosa, 2011). O estudo deste tema tem se revelado fundamental para a compreensão de quais conquistas têm sido alcançadas, bem como para que se identifique quais são os desafios e as lutas necessárias a garantir que o psicólogo seja um profissional que tenha possibilidades de atuação e efetivas contribuições para a educação brasileira. É neste cenário que se insere a pesquisa aqui apresentada, que teve como objetivo geral identificar e analisar concepções e práticas desenvolvidas pelos psicólogos da rede pública frente às queixas escolares, oriundas do sistema educacional, visando compreender em que medida apresentam elementos inovadores e pertinentes às discussões recentes na área de Psicologia Escolar e Educacional em busca de um ensino de qualidade para todos. O estudo foi organizado em duas frentes concomitantes, contemplando modalidades distintas de CAMINHOS METODOLÓGICOS NA PESQUISA EM PSICOLOGIA: PESQUISANDO A ATUAÇÃO DO PSICÓLOGO ESCOLAR RReevviissttaa PPeerrssppeeccttiivvaass eemm PPssiiccoollooggiiaa,, VV.. 1155 nn..11.. JJaann // JJuunn 22001111 9 investigação: 1) investigação das práticas psicológicas desenvolvidas na rede pública de educação, realizada por meio da pesquisa de campo; 2) investigação das discussões recentes na literatura sobre a atuação do psicólogo na educação, realizada por meio da análise documental. Ao optarmos por estes dois procedimentos visávamos estabelecer um diálogo teórico-prático no que se refere à atuação em Psicologia Escolar. Tal recurso possibilitou que identificássemos como e em que medida as discussões e proposições que comparecem nas publicações recentes da área de Psicologia Escolar e Educacional têm sido incorporadas nas práticas dos profissionais que atuam junto à rede pública de educação. Conhecer a atuação dos psicólogos que estão vinculados ao ensino público do estado de São Paulo foi uma tarefa complexa, desenvolvida por meio de estratégias que possibilitaram o acesso a informações quantitativas e qualitativas sobre a inserção dos profissionais e as práticas por eles desenvolvidas. A possibilidade de que estratégias quantitativas e qualitativas possam ocupar uma relação de complementariedade em estudos científicos vem sendo abordada por importantes pesquisadores (Minayo & Sanches, 1993; Spink, 1999), que questionam a ideia de dicotomia entre essas formas de conduzir pesquisas. As abordagens quantitativas possibilitam conhecer a magnitude de fenômenos sociais, enquanto as abordagens qualitativas propiciam que novos aspectos de um fenômeno emerjam e possibilitam que sejam compreendidos os significados sob a perspectiva dos sujeitos envolvidos (Serapioni, 2000). Spink (1999) propõe a triangulação metodológica, ou seja, a utilização de técnicas múltiplas para que se conheça o objeto de pesquisa proposto. A triangulação de informações quantitativas e qualitativas, sob tal perspectiva, pode ser utilizada como forma de enriquecimento do estudo de fenômenos complexos e multifacetados. Deste modo, as informações quantitativas nos possibilitaram fazer um mapeamento amplo do número de psicólogos do estado, de suas modalidades de intervenção e dos referenciais utilizados para a condução do trabalho, enquanto as estratégias qualitativas de pesquisa foram fundamentais para que fosse aprofundada a compreensão a respeito das práticas desenvolvidas e dos contextos em que se inserem. Conhecendo as práticas dos psicólogos na rede pública de educação No Estado de São Paulo, centramos a busca por psicólogos nas Secretarias Municipais de Educação após verificarmos que não havia psicólogos trabalhando na Secretaria da Educação deste estado. Devido à impossibilidade de contatar os 645 municípios do estado, foi composta uma amostra de 133 municípios para contato, obedecendo aos seguintes critérios: a) boa receptividade por parte dos psicólogos do município à pesquisa; b) contato com psicólogos que participam de atividades na universidade e que, portanto, poderiam apresentar informações relevantes à pesquisa; c) contemplar todas as regiões do Estado de São Paulo, tendo como referência as cidades-sede das Diretorias de Ensino subordinadas à Secretaria da Educação do Estado de São Paulo (vide Figura 1); d) contatar todos os municípios da região metropolitana de São Paulo. Optou-se por realizar contato com as cidades-sede de cada Diretoria de Ensino porque estas correspondem a municípios de MARILENE PROENÇA REBELLO DE SOUZA, ANABELA ALMEIDA COSTA E SANTOS PERETTA, JULIANA SANO DE ALMEIDA LARA, ROSELI FERNANDES LINS CALDAS RReevviissttaa PPeerrssppeeccttiivvaass eemm PPssiiccoollooggiiaa,, VV.. 1155 nn..11.. JJaann // JJuunn 22001111 10 grande porte que aglutinam à sua volta um conjunto de municípios pequenos e médios, circunscritos a cada diretoria. Desta forma, consideramos que as cidades pertencentes a uma mesma diretoria sofreriam, no âmbito educacional, a influência de uma mesma administração, centralizada na cidade-sede. Quanto à região metropolitana de São Paulo, optou-se por contatar todos os municípios que a compõem, por ser uma região que concentra um grande número de instituições de Ensino Superior com cursos de Psicologia. De acordo com a Associação Brasileira de Ensino de Psicologia (ABEP, 2010), no Ensino Superior há 33 cursos de Psicologia na capital e nove nos demais municípios da Grande São Paulo, totalizando 42 dos 99 cursos de Psicologia oferecidos no Estado de São Paulo (42%). Figura 1. Divisão do Estado de São Paulo em Diretorias de Ensino Extraído de: Souza (2010b) O contato inicial e os questionários O contato telefônico inicial 2 com as Secretarias de Educação dos municípios permitiu obter a informação sobre a presença ou não de psicólogos em seu quadro de funcionários. Os psicólogos encontrados foram convidados a responder questionário, enviado via fax, correio ou e-mail, ou entregue pessoalmente, no caso de cidades próximas, de fácil acesso. O material da pesquisa enviado era composto por: Carta de apresentação; Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e Questionário. O questionário era de preenchimento individual e as perguntas feitas giravam em torno do tempo de trabalho do profissional na equipe, seu cargo, formação, sua filiação teórica e modalidades de atuação de que se utilizava para responder às demandas escolares. Estruturava-se nos seguintes eixos: dados gerais de identificação, formação, níveis de ensino em que atua, público-alvo da intervenção, modalidades de atuação, projetos desenvolvidos, fundamentação teórica e contribuições da Psicologia para a Educação. Dessa maneira, os 108 questionários respondidos proporcionaram a obtenção de dados que permitiram a caracterização das modalidades de atuação profissional,a compreensão das concepções que respaldam as práticas psicológicas, a identificação das práticas realizadas e a identificação de indícios que apontassem o caráter inovador das práticas realizadas. Indícios esses que serviram de base para a seleção dos municípios cujos profissionais seriam entrevistados na etapa seguinte da pesquisa. Além de proporcionar dados para a seleção dos profissionais que participariam da segunda etapa da pesquisa, os questionários permitiram coletar dados muito ricos na caracterização da atuação dos psicólogos que atuam na rede pública de educação e das práticas que desenvolvem. Optou-se, então, por realizar tanto leituras de caráter quantitativo, em relação à distribuição da amostra e à frequência dos dados, como também leituras de caráter qualitativo, com categorizações das respostas por similitudes CAMINHOS METODOLÓGICOS NA PESQUISA EM PSICOLOGIA: PESQUISANDO A ATUAÇÃO DO PSICÓLOGO ESCOLAR RReevviissttaa PPeerrssppeeccttiivvaass eemm PPssiiccoollooggiiaa,, VV.. 1155 nn..11.. JJaann // JJuunn 22001111 11 dos conteúdos, principalmente em relação às questões abertas. A análise estatística utilizou o programa Statistical Package for Social Sciences (SPSS) – Versão 10, para verificar de que maneira os dados coletados dos diferentes eixos do questionário se associavam, permitindo a formação de perfis dos psicólogos que atuavam na rede pública de Educação no Estado de São Paulo. Para tanto, foi realizada uma categorização das respostas coletadas nos questionários e todos os 108 questionários respondidos foram tabulados de acordo com esta categorização. Foi avaliada a associação entre pares de variáveis por meio do teste “qui-quadrado”, para verificar quais delas eram significativas. Todos os pares possíveis de variáveis foram testados. A constatação de associações significativas entre variáveis demonstra a existência de um padrão na distribuição dos dados, determinado por dependência entre essas variáveis. A partir das associações significativas entre pares de variáveis, foi utilizada a Análise de Correspondência (ANACOR) 3 para verificar as associações significativas entre duas ou mais variáveis. Esta análise gerou um mapa multidimensional que permitiu entender como as variáveis se associavam, podendo-se criar perfis. Para as leituras de caráter quantitativo e qualitativo, o questionário foi dividido em três grandes categorias: a) identificação; b) atuação profissional; c) fundamentação teórico-metodológica da atuação. Identificação A categoria identificação abrangeu informações relativas a: a) dados pessoais: sexo e idade; b) Secretaria de Educação: cargo (contrato), função (que exercia), tempo no cargo e ano de ingresso na Secretaria de Educação; c) formação: tempo de formação, Instituição formadora e cursos realizados. As análises decorreram a partir da descrição da frequência dos dados, com leituras sobre os valores em médias e porcentagens. Em relação às respostas dadas sobre o trabalho do psicólogo na Secretaria de Educação, além da análise quantitativa sobre a distribuição da amostra, foram feitas categorizações a partir das diversas respostas dadas aos itens: “Cargo” de contratação pela Secretaria de Educação; “Função” exercida pelo profissional e “Tempo no Cargo”. Atuação Profissional A categoria atuação profissional abrangeu informações sobre a) clientela: níveis de ensino em que atua o psicólogo e público-alvo do trabalho; b) modalidades de atuação: com as opções: “avaliação psicológica”, “atendimento clínico”, “formação de professores”, “assessoria às escolas” e “outros”; era solicitado que o psicólogo especificasse os objetivos e estratégias de ação para cada modalidade de atuação; c) projetos e trajetória profissional: descrição de projetos desenvolvidos ao longo da carreira profissional, com destaque para os mais relevantes. Para as temáticas “Níveis de Ensino”, “Público-Alvo” e “Modalidades de Atuação”, foi feita uma análise da frequência das respostas assinaladas, que foram divididas em categorias para obtenção das médias e porcentagens. Também foram realizadas categorizações de caráter qualitativo, buscando-se verificar se o público-alvo era predominantemente alunos e pais ou se envolvia também outros atores do processo ensino-aprendizagem, como professores e MARILENE PROENÇA REBELLO DE SOUZA, ANABELA ALMEIDA COSTA E SANTOS PERETTA, JULIANA SANO DE ALMEIDA LARA, ROSELI FERNANDES LINS CALDAS RReevviissttaa PPeerrssppeeccttiivvaass eemm PPssiiccoollooggiiaa,, VV.. 1155 nn..11.. JJaann // JJuunn 22001111 12 funcionários. Com relação às modalidades de atuação, buscou-se entender, qualitativamente, como as práticas são de fato realizadas. Quanto à temática “Projetos e Trajetória profissional”, procurou-se separar os projetos citados em categorias, baseadas nos nomes dados aos projetos e na análise da descrição dos mesmos, tendo como objetivo agrupá-los de acordo com o público-alvo do trabalho e/ou com o foco da atuação. Fundamentação teórico-metodológica da atuação Na categoria fundamentação teórico- metodológica da atuação, foram agrupadas as respostas dadas pelos psicólogos às questões sobre os “Autores que fundamentam teoricamente o trabalho” e sobre as “Contribuições o psicólogo pode dar à Educação”, bem como comentários adicionais feitos por alguns profissionais. A respeito dos “Autores” foram arrolados os autores e obras citados pelos psicólogos. Procurou-se agrupar autores e obras em categorias, levando em conta as abordagens dos autores citados. As categorias utilizadas foram: “Educação”, para autores da Educação e da Psicologia em sua interface com a Educação; “Clínica”, para autores da psicologia e da psicanálise clínicas; “Educação e Clínica”, para autores que fazem uma junção entre as duas áreas, como no caso da psicopedagogia; e “Outros”, para autores que não se encaixavam em nenhuma das categorias anteriores. A questão referente às “Contribuições à Educação” que a atuação do psicólogo pode oferecer e os comentários finais feitos pelos participantes foram analisadas qualitativamente a partir do conteúdo das respostas dadas. A análise da fundamentação teórico- metodológica presente nas respostas dadas aos questionários foi fundamental para que fossem escolhidos os municípios participantes da segunda etapa da pesquisa. Foram selecionadas equipes municipais ou psicólogos que apresentaram indícios de criticidade, ou seja, aqueles que apontaram para a direção de uma prática crítica. Para o levantamento desses indícios, que serviram de guia para identificar quais municípios apresentavam práticas inovadoras e condizentes com uma perspectiva crítica em Psicologia Escolar e Educacional, foram tomadas como referências as produções teóricas explicitadas a seguir. Adotou-se a concepção de crítica proposta por José de Souza Martins (1977) em Sociologia e Sociedade, citada por Maria Helena Souza Patto em Introdução à Psicologia Escolar (1997, p. 464), compreendido como um conceito que conduz à raiz dos fenômenos e se opõe a naturalização, levando a considerar o contexto histórico, político e cultural: (...) a possibilidade de pensamento crítico – do pensamento que vai à raiz do conhecimento, define seus compromissos sociais e históricos, localiza a perspectiva que o construiu, descobre a maneira de pensar e interpretar a vida social da classe que apresenta esse conhecimento como universal, porque supostamente objetivo e neutro (Martins, 1977, p.2) CAMINHOS METODOLÓGICOS NA PESQUISA EM PSICOLOGIA: PESQUISANDO A ATUAÇÃO DO PSICÓLOGO ESCOLAR RReevviissttaa PPeerrssppeeccttiivvaass eemm PPssiiccoollooggiiaa,,VV.. 1155 nn..11.. JJaann // JJuunn 22001111 13 Tabela 1. Correspondência entre Indícios de Atuação Crítica em Psicologia Escolar e Educacional (Tanamachi, 1997) e Itens do Questionário Para a análise dos questionários, foram utilizados como base produções de Elenita de Rício Tanamachi e Marisa Eugênia Melillo Meira a respeito da atuação crítica em Psicologia Escolar e Educacional. Meira & Tanamachi (2003) defendem que a prática crítica em Psicologia Escolar e Educacional deve procurar analisar a produção da queixa escolar e o processo de subjetivação e objetivação da escolarização. Esta abordagem deve tentar compreender fenômenos por meio de suas múltiplas determinações e o método utilizado deve se pautar na reflexão e análise dos processos. Para identificar se as práticas relatadas nos questionários indicavam atuações em Psicologia Escolar e Educacional numa direção crítica, utilizou-se como base o procedimento adotado por Tanamachi em sua tese de doutorado, intitulada Visão crítica de Educação e de Psicologia: elementos para a construção de uma visão crítica de Psicologia Escolar (1997), para definir se as teses e dissertações estudadas seguiam uma perspectiva crítica. A partir dos indícios adotados por Tanamachi, fez-se uma correlação com os itens do questionário, conforme indicado no Quadro 1. Considerou-se que todos os elementos constitutivos de uma atuação crítica, apontados acima, não seriam claramente observados em todos os itens de um mesmo questionário, assim buscou-se por indícios de criticidade. Além disso, classificar determinada atuação como “crítica” ou “não crítica” significaria operar de acordo com a lógica formal, ou seja, sem considerar a multideterminação dos fenômenos, o que é compreendido como essencial a partir do referencial teórico adotado. Com a leitura das respostas, observou-se que muitas respostas apresentavam tanto elementos críticos quanto não críticos, encontrando-se numa linha contínua entre estes dois pólos. Dessa forma, a presença de qualquer um dos elementos constitutivos de uma atuação crítica, inovadora, ou não crítica, tradicional, não necessariamente resultaria em uma classificação direta da atuação do psicólogo participante como crítica ou não crítica, respectivamente. Por isso, na seleção para a segunda etapa da pesquisa, foi realizada a análise de cada questionário como um todo, buscando-se identificar quais participantes apresentavam mais tendências à criticidade em sua atuação e verificando a coerência interna entre as respostas dadas. Foram considerados elementos críticos aqueles que apontavam para uma atuação que contemplasse as multideterminações dos fenômenos educacionais e que buscasse incluir os diversos atores escolares na Indícios de perspectiva crítica Itens do questionário Consideração das múltiplas determinações (sociais, econômicas, políticas, históricas) e presença de concepção sobre o homem e sobre a educação. Público-alvo Foco da intervenção Concepção sobre a queixa escolar ou fracasso escolar Contribuição teórico-prática articulada à realidade em que se está inserido. Projetos Modalidade de Atuação Pressupostos teórico- metodológicos/ referência a autores do pensamento crítico e o modo como são apropriados. Autores de referência Cursos realizados Explicitação de um compromisso técnico- político e/ou teórico-prático com a transformação da Psicologia. Contribuições do psicólogo à educação MARILENE PROENÇA REBELLO DE SOUZA, ANABELA ALMEIDA COSTA E SANTOS PERETTA, JULIANA SANO DE ALMEIDA LARA, ROSELI FERNANDES LINS CALDAS RReevviissttaa PPeerrssppeeccttiivvaass eemm PPssiiccoollooggiiaa,, VV.. 1155 nn..11.. JJaann // JJuunn 22001111 14 superação das queixas. Consideramos elementos não críticos aqueles correspondentes a uma atuação que centrasse o foco da queixa escolar no indivíduo – geralmente no aluno e em sua família – desconsiderando as relações institucionais e a multiplicidade de determinações sociais e históricas que a produzem. Concluiu-se que as entrevistas seriam uma etapa fundamental para identificar em que medida as atuações dos psicólogos aproximavam-se ou afastavam-se do que consideramos como atuação crítica em Psicologia Escolar e Educacional. Além disso, forneceriam importantes informações a respeito de quais seriam as condições concretas de trabalho que possibilitam ou criam empecilhos para atuações em perspectiva crítica. As entrevistas Seleção dos municípios para entrevista Para a realização desta etapa da pesquisa, foram selecionados 11 dos municípios contatados. Adotamos como critério de seleção dos municípios para a segunda etapa a presença de indicativos de uma atuação crítica e inovadora dos psicólogos, conforme critérios apontados anteriormente, e que contemplasse os avanços teórico- metodológicos da área de Psicologia Escolar e Educacional. Realização das entrevistas A realização das entrevistas teve como objetivo possibilitar maior aprofundamento a respeito das práticas empreendidas pelos psicólogos. Por se tratar de um instrumento de coleta da linguagem própria do entrevistado, possibilitando ao investigador desenvolver uma ideia de como o sujeito interpreta aspectos da vida social, a entrevista é amplamente utilizada em pesquisas de cunho qualitativo, sobretudo na área educacional (Bogdan & Biklen, 1994). Para a realização das entrevistas, as Secretarias Municipais de Educação dos municípios escolhidos foram novamente contatadas para convidar os psicólogos a participarem da segunda etapa da pesquisa. Toda a equipe dos psicólogos foi convidada para a entrevista em grupo, mesmo que tivesse como membros profissionais de outras áreas e os projetos desenvolvidos pelos psicólogos fossem diferentes entre si, pois foi tomada como referência a instituição que oferece o serviço de Psicologia, e não cada profissional isoladamente. Os profissionais entrevistados receberam uma carta-convite para participação desta etapa da pesquisa e também o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, referente ao uso do material das entrevistas pelos pesquisadores. As entrevistas seguiram roteiro semiestruturado, elaborado para assegurar que o foco da conversa se articulasse com os objetivos da pesquisa, e para proporcionar a exploração de assuntos levantados pelo entrevistado. Por outro lado, o caráter semiestruturado da entrevista ofereceu oportunidade para que os participantes discorressem com maior liberdade sobre temas abordados pela pesquisa, de modo que pudessem expressar o que pensavam e sentiam a respeito. O objetivo da entrevista foi esclarecido aos participantes, assegurando- lhes que a entrevista seria tratada de forma sigilosa, evitando qualquer forma de identificação do sujeito entrevistado. Análise das entrevistas CAMINHOS METODOLÓGICOS NA PESQUISA EM PSICOLOGIA: PESQUISANDO A ATUAÇÃO DO PSICÓLOGO ESCOLAR RReevviissttaa PPeerrssppeeccttiivvaass eemm PPssiiccoollooggiiaa,, VV.. 1155 nn..11.. JJaann // JJuunn 22001111 15 Todas as entrevistas foram gravadas e transcritas; no entanto, duas entrevistas foram descartadas: uma devido à má qualidade do áudio e outra porque, embora apresentasse indícios de criticidade no questionário, a entrevista indicou uma atuação com tendência predominantemente tradicional. Dessa forma, restaram nove municípios paulistas participantes da etapa das entrevistas, cada qual com número variado de psicólogos. As entrevistas foram analisadas utilizando procedimentos de análise de conteúdo, tal como é definida por Bardin (2000): Um conjunto de técnicas de análise das comunicaçõesvisando obter, por procedimentos, sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens, indicadores (quantitativos ou não) que permitam a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção/recepção (variáveis inferidas) destas mensagens. (p.42) A compreensão das entrevistas visou à exploração do material obtido de modo a organizá-lo, possibilitando que fossem feitas interpretações e inferências (Bardin, 2000). O processo de interpretação consistiu na compreensão do significado das ações e daquilo que foi dito, conforme aponta Rockwell (1987). Esta autora ressalta também que interpretar requer compartilhar, dentro do possível, ‘o conhecimento local’; compreender o que é dito como o fazem os outros sujeitos da localidade implicaria, dentre outras coisas, compartilhar toda a sua experiência comum, o que é impossível (p. 27). Ainda que seja impossível compartilhar completamente os significados, cabe ao pesquisador buscar essa aproximação. O conhecimento progressivo da situação estudada, bem como das pessoas que dela participam, e a comparação de respostas dadas pelos diversos informantes foram importantes recursos (Rockwell, 1987). Porém, além dessa aproximação com as categorias ‘locais’, com o modo como os indivíduos viviam a situação estudada, foi necessário construir categorias analíticas que permitissem estabelecer relações e conceitualizações que escapavam àqueles que estavam imersos numa determinada realidade. Para isso, os pesquisadores se debruçaram sobre as entrevistas em busca de regularidades e padrões, a fim de realizar uma codificação e categorização que possibilitasse a articulação entre os avanços teóricos na Psicologia Escolar e Educacional e as práticas adotadas na rede pública de atendimento à Educação. Com este intuito, após a leitura de algumas entrevistas para entrar em contato com o material obtido, foi organizado um roteiro inicial de análise das entrevistas, baseado no roteiro para a realização das entrevistas e nos objetivos da pesquisa. Tal roteiro foi dividido em 3 eixos: serviço, atuação e concepção teórica. Com o roteiro em mãos, toda a equipe leu uma mesma entrevista, visando apropriar-se dele e verificar se ele estava adequado aos objetivos desta etapa da pesquisa. O roteiro foi então reformulado a partir das questões suscitadas pela leitura da entrevista e informações nela contidas que ele não contemplava. Assim, o roteiro de análise foi ampliado com subitens, com vistas a detalhar a descrição das informações contidas nas entrevistas. Cada entrevista foi analisada por duas pessoas, com o objetivo de ampliar as impressões sobre a mesma. A partir do roteiro de análise, foi construído um texto síntese MARILENE PROENÇA REBELLO DE SOUZA, ANABELA ALMEIDA COSTA E SANTOS PERETTA, JULIANA SANO DE ALMEIDA LARA, ROSELI FERNANDES LINS CALDAS RReevviissttaa PPeerrssppeeccttiivvaass eemm PPssiiccoollooggiiaa,, VV.. 1155 nn..11.. JJaann // JJuunn 22001111 16 para cada entrevista, contendo também citações de trechos relevantes. Dessa forma, a análise das entrevistas foi realizada em um processo dinâmico, constituído por distintos momentos: primeiro, aproximação junto aos dados obtidos em campo; segundo, construção do instrumento de análise a partir de tais dados e dos objetivos pretendidos pela pesquisa; terceiro, verificação da adequação do instrumento ao objeto; quarto, ajuste do instrumento; e quinto, momento de análise dos dados a partir do instrumento reformulado. Isto tornou possível adequar o instrumento a realidades regionais e particularidades trazidas pelos conteúdos das entrevistas, tornando a análise mais fidedigna da realidade que se buscava apreender por meio da entrevista. Após a análise de cada entrevista separadamente, todas foram analisadas no conjunto, em cada um dos eixos: serviço, atuação e fundamentação teórica. Foi realizada a leitura horizontal, isto é, foram lidas as respostas para o mesmo item do roteiro de análise em todas as entrevistas para observar as semelhanças e particularidades daquele tópico. Por fim, foi organizado um texto para cada eixo descrevendo o que fora encontrado no conjunto de todas as entrevistas. Revisão de literatura: contribuições teóricas sobre a atuação do psicólogo na educação Para compreender em que medida as práticas desenvolvidas pelos psicólogos que atuam nas Secretarias de Educação correspondem aos avanços teóricos na área de Psicologia Escolar, foi elaborado um levantamento da produção bibliográfica sobre a atuação do psicólogo na educação, de maneira a tornar possível a análise das práticas investigadas tomando como base a literatura recente. Consideramos que as publicações da área revelam, de maneira geral, as concepções e fundamentações teórico-práticas a serem implementadas no campo da atuação do psicólogo na educação. Tendo em vista a quantidade de produções encontradas e a sua importância, considerou- se necessário realizar uma análise aprofundada e detalhada das publicações. A análise da produção bibliográfica foi constituída por meio de resenhas, elaboradas pela equipe da pesquisa a partir da leitura integral dos textos. A trajetória metodológica desta etapa da pesquisa organizou-se em três momentos, apresentados a seguir: a) critérios de escolha das produções; b) produção de resenhas das publicações; c) análise de conteúdo das resenhas. Primeiro momento: critérios de escolha das produções A pesquisa iniciou-se em 2006, realizando-se levantamento de títulos de livros e coletâneas 4 relacionados à Psicologia Escolar e Educacional, segundo quatro critérios: a) recorte editorial: foram selecionadas editoras que usualmente publicam o tema de investigação; b) recorte temporal: foram escolhidos trabalhos publicados entre os anos de 2000 a 2007, incluindo reedições de publicações, por entendermos que a partir dos anos 2000 houve um incremento do número de produções de Psicologia Escolar e Educacional; c) recorte por área de conhecimento: buscou-se priorizar trabalhos que tratam especificamente de temáticas de Psicologia Escolar e Educacional. excluindo CAMINHOS METODOLÓGICOS NA PESQUISA EM PSICOLOGIA: PESQUISANDO A ATUAÇÃO DO PSICÓLOGO ESCOLAR RReevviissttaa PPeerrssppeeccttiivvaass eemm PPssiiccoollooggiiaa,, VV.. 1155 nn..11.. JJaann // JJuunn 22001111 17 outras, tais como: Psicopedagogia, Psicomotricidade, Psicolinguística etc; d) recorte temático: foram contemplados trabalhos que se referem direta ou indiretamente à prática do psicólogo escolar. Segundo momento: produção de resenhas das publicações No segundo momento, realizamos a leitura e produção de resenhas 5 das publicações selecionadas. Para elaboração das resenhas, foram utilizados três eixos norteadores: 1) trajetória do autor: caminho percorrido pelo autor na construção de seu texto e finalidades do trabalho apresentado; 2) concepções teóricas que embasam a atuação profissional: explicitação das concepções que respaldam as práticas psicológicas descritas no texto; 3) proposta de contribuição do autor para atuação do psicólogo escolar e educacional: caracterização das modalidades de atuação profissional e descrição da prática proposta pelo autor. Consideramos, ainda, a existência de um eixo transversal definido como “perspectivas emancipatórias em Psicologia e Educação”, compreendendo textos que revelam compromisso do psicólogo e do conhecimento psicológico com abordagens que consideram o fenômeno educativo enquanto constituído socialmente, nas relações produzidas no cotidiano da escola, determinadas sócio-histórico- culturalmente. Os textos foram lidos na íntegra e resenhados 6 com base nos eixos acima.Terceiro momento: análise de conteúdo das produções A atividade de análise das resenhas produzidas retomou os eixos gerais de forma horizontal, ou seja, buscando identificar cada um deles no conjunto das resenhas. Para tanto, foram produzidas perguntas que visavam detalhar cada um dos eixos. Por exemplo, no eixo 1, relativo à “trajetória do autor e finalidades do trabalho”, foram geradas as seguintes questões: a) autor parte de dados educacionais, de sua própria trajetória profissional ou de conjunto de trabalhos anteriores?; b) quais questões, inquietações geraram interesse do autor pelo tema?; c) Qual o objetivo do autor?; d) Quais instituições relacionadas à área são citadas? Após a elaboração dessas questões e retorno às resenhas, observamos que várias delas referiam-se a temáticas semelhantes. Consideramos então que seria interessante, do ponto de vista comparativo, reunir o conjunto das resenhas, tomando por base determinados temas, a saber: a) intervenção do psicólogo na educação; b) Psicologia e Educação: perspectiva crítica; c) formação do psicólogo; d) temas clássicos e revisitados; e) dimensões teórico-metodológicas da atuação do psicólogo na educação; f) políticas públicas em educação; g) formação docente; h) educação inclusiva; i) Psicologia Escolar no Brasil e em outros países; j) avaliação psicológica. Buscou-se relacionar as informações obtidas nas análises das resenhas e nas entrevistas. Para isto, foram articulados os elementos indicativos de concepções e práticas críticas que compareceram tanto na literatura da área, como nos discursos dos profissionais participantes da pesquisa. Resultados e Discussão Consideramos que os recursos teórico- metodológicos adotados permitiram um levantamento importante sobre a atuação do MARILENE PROENÇA REBELLO DE SOUZA, ANABELA ALMEIDA COSTA E SANTOS PERETTA, JULIANA SANO DE ALMEIDA LARA, ROSELI FERNANDES LINS CALDAS RReevviissttaa PPeerrssppeeccttiivvaass eemm PPssiiccoollooggiiaa,, VV.. 1155 nn..11.. JJaann // JJuunn 22001111 18 psicólogo no estado de São Paulo. Foram pesquisados 133 municípios do Estado de São Paulo, sendo que em 61 deles atuam psicólogos, participando da pesquisa 108 profissionais. Do conjunto dos participantes, 96,4% são mulheres, na faixa etária de 40 anos, com a média de 8,7 anos no cargo. Encontramos uma variedade de formas de contratação: psicólogo, psicólogo escolar, professor, coordenador, supervisor, dentre outros. Com relação à formação, 78,7% dos participantes são provenientes de universidades privadas e 93% mantém uma formação continuada, nas modalidades: especialização, cursos de atualização e supervisões. Os Serviços de Psicologia são bastante diversos quanto à composição: alguns se organizam em equipes multiprofissionais, equipes por nível de ensino ou psicólogos que individualmente atendem à demanda da Secretaria de Educação e demais solicitações no âmbito do Município e, em alguns casos, do estado. Grande parte deles foi instituída a partir dos anos 2000, por iniciativa pessoal do gestor ou por reivindicação do conjunto de profissionais que se encontravam inseridos na rede, ou ainda para adaptar-se à política de educação inclusiva. Com relação à inserção do psicólogo nestes Serviços há uma grande diversidade no que tange a vários aspectos: cargo, função, carga horária, plano de carreira, remuneração e formas de contratação e organização do trabalho. Notou-se que um dos desafios apontados pelos participantes do estudo é a realização do trabalho diante das mudanças constantes de gestão do município que podem interferir nas formas de atuação. Com relação à atuação, a pesquisa analisou os seguintes aspetos: público-alvo, níveis de Ensino, Modalidades de Atuação e Projetos desenvolvidos ao longo da trajetória profissional. Na Secretaria de Educação dos Municípios, esses profissionais centram seu trabalho em todas as modalidades de Ensino, predominando a atuação nos níveis de Educação Infantil e Ensino Fundamental (34%). No que tange à educação inclusiva, esta atuação encontra-se em torno de 28%. Nesses níveis, as ações centram-se no trabalho com professores (89%) e com alunos (83%). O trabalho realizado revelou três modalidades de atuação: Clínica (15%), Institucional (30%) e Clínica e Institucional (55%). Os psicólogos trabalham com diferentes projetos envolvendo estudantes, famílias e instâncias municipais de caráter intersetorial (Assistência Social, Saúde Mental e, Comunitária). O acompanhamento das queixas escolares se dá, principalmente no interior das escolas, problematizando os encaminhamentos e realizando ações nos espaços pedagógicos instituídos, buscando abarcar familiares, professores e estudantes, optando por modelos institucionais de intervenção. Do ponto de vista das concepções teórico- metodológicas, observamos a presença de pelo menos três tendências: a) Clínica, ao incluir respostas que apontam na direção de uma atuação profissional individualizada, baseada em diagnóstico e tratamento dos problemas de aprendizagem. b) Institucional, ao reunir respostas referentes a uma atuação que contempla formas de intervenção em que participam diversos atores do contexto escolar; c) Clínico e Institucional, ao abarcar respostas em que comparecem características de ambas tendências. De maneira geral, o maior número de psicólogos apresentou concepções de caráter Clínico e Institucional. Do conjunto de psicólogos que participaram da pesquisa, pudemos identificar aqueles que atuam em nove municípios e que CAMINHOS METODOLÓGICOS NA PESQUISA EM PSICOLOGIA: PESQUISANDO A ATUAÇÃO DO PSICÓLOGO ESCOLAR RReevviissttaa PPeerrssppeeccttiivvaass eemm PPssiiccoollooggiiaa,, VV.. 1155 nn..11.. JJaann // JJuunn 22001111 19 apresentam um conjunto de práticas profissionais que coadunam com as tendências de atuação institucional ─ atualmente consideradas como as que melhor respondem às demandas educacionais em uma perspectiva de educação de qualidade social para todos e todas. Essa atuação centra- se em aspectos tais como: a) trabalho em equipe multiprofissional ou intersetorial; b) atuação em redes sociais; c) compreensão das dificuldades escolares a partir do cotidiano escolar e da constituição histórico-cultural do processo de escolarização; d) crítica aos diagnósticos e encaminhamentos das dificuldades de aprendizagem e ao fracasso escolar; e) atuação na formação de professores; f) atuação envolvendo os vários atores escolares; g) ações junto à política de inclusão escolar; h) participação na perspectiva do projeto político pedagógico das unidades escolares. Os psicólogos entrevistados ressaltaram que as dificuldades enfrentadas no âmbito da Educação centram-se nos seguintes aspectos: a) modalidades de contratação que não definem claramente a função do psicólogo na educação; b) níveis salariais baixos; c) mudanças constantes de gestão; d) carga horária não condizente com a demanda da educação; e) representação clínica da profissão pelos educadores e profissionais da saúde; f) questionamentos à política de educação inclusiva pelos educadores e pais. É importante ressaltar que os profissionais destacaram que a Educação pode contribuir para o desenvolvimento e a melhoria da situação do país e de que esse seria o foco central de seu trabalho. Considerações finais Diante de um objeto de pesquisa, a escolha das estratégias metodológicas a adotar é uma das mais importantes decisões que os pesquisadores precisam tomar. Sobretudo quando fenômenos complexos e pouco conhecidos são eleitos como interesse de estudo, faz-se necessária a criação de recursos que possibilitem a melhor aproximação do que se pretende conhecer.Identifica-se, porém, que a prática de publicação científica destinada à discussão metodológica não tem sido muito adotada nos meios acadêmicos. Daí a relevância do presente artigo que apresentou o percurso metodológico utilizado para que fosse possível conhecer a atuação do psicólogo da rede pública de ensino do estado de São Paulo frente à demanda escolar. O estudo, vinculado a uma pesquisa de âmbito nacional, buscou compreender quais eram as concepções, práticas e inovações presentes na condução do trabalho da Psicologia junto à educação pública. Foram apresentados neste artigo instrumentos e estratégias que possibilitaram o acesso a preciosas informações quantitativas e qualitativas a respeito do que vem sendo publicado na área de Psicologia Escolar e de como os psicólogos vêm incorporando as contribuições das recentes produções acadêmicas recentes no seu trabalho. A dimensão da pesquisa proposta fez com que fosse necessário contar com uma numerosa equipe, que envolveu cerca de 50 pessoas divididas nos sete estados participantes, a fim de que fosse possível desenvolver a diversidade e a quantidade de ações previstas. A equipe do estado de São Paulo, proponente do estudo, teve como desafio criar a sistematização das estratégias que seriam utilizadas. Além disso, foi importante que o trabalho fosse conduzido de modo muito afinado, no que se refere à MARILENE PROENÇA REBELLO DE SOUZA, ANABELA ALMEIDA COSTA E SANTOS PERETTA, JULIANA SANO DE ALMEIDA LARA, ROSELI FERNANDES LINS CALDAS RReevviissttaa PPeerrssppeeccttiivvaass eemm PPssiiccoollooggiiaa,, VV.. 1155 nn..11.. JJaann // JJuunn 22001111 20 clareza de objetivos e de referenciais teórico- metodológicos. Para isto, foram realizados frequentes encontros, nos quais tais aspectos foram exaustivamente discutidos. Esta criteriosa sistematização foi necessária para que houvesse uma unidade nos procedimentos e na compreensão do fenômeno na pesquisa em âmbito nacional. No entanto, não bastou o investimento na unidade metodológica. A vasta amplitude do estudo trouxe a necessidade da flexibilização frente às especificidades e aos obstáculos regionais. Assim, conservando-se a estrutura metodológica, foi necessário fazer a adaptação de procedimentos. Algo que foi, em muitos momentos, fundamental para que se pudesse ter acesso às informações respeitando as características e os contextos dos diferentes municípios. O método aqui exposto não se põe como referencial hegemônico. Apresenta um percurso desenvolvido coletivamente, fruto de muitas discussões e reflexões do grupo que conduziu esta pesquisa. Algo que se configurou numa proposta viável e frutífera de enfrentamento dos desafios e impasses que um trabalho científico de tal monta pode apresentar. Avaliamos que trabalho foi um trabalho bastante importante, pois denotou um movimento de avanço em direção à construção de práticas profissionais no campo da educação que anunciam uma apropriação, por parte dos psicólogos que estão na Educação Pública, dos conhecimentos que vem sendo produzidos pela academia no que se refere a uma atuação que denominamos crítica em Psicologia Escolar e Educacional. Tais indícios de mudança nessa direção, identificados em vários momentos deste estudo, possibilitam vislumbrar um caminho possível, e promissor, para a Psicologia no Estado de São Paulo, no campo da Educação de qualidade para todos e todas. Notas de Rodapé 1 O Estado de São Paulo conta com mais de 74 mil psicólogos inscritos em seu Conselho Regional de Psicologia (CRPSP), segundo informação disponível em: <http://www.crpsp.org.br/portal/comunicacao /jornal_crp/169/frames/fr_dia_do_psicologo.a spx>. No Brasil há aproximadamente 230 mil profissionais, segundo informação do Conselho Federal de Psicologia (CFP), de acordo com informação disponível em <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_a rttext&pid=S1414- 98932010000500001&lng=pt&nrm=iso> 2 Os primeiros contatos com os participantes da pesquisa e as entrevistas inspiraram-se no modelo etnográfico de pesquisa proposto por Rockwell, 2009. 3 Para mais informação ver: OLIVEIRA, F. E. M. (2008). SPSS Básico para Análise de Dados. Rio de Janeiro: Ciência Moderna. 4 Por coletânea entende-se: “conjunto de trechos seletos de diferentes obras, ou coleção de várias obras ou coisas” (Dicionário Eletrônico Houaiss da língua portuguesa. (2001) versão 1.0 para Windows [CD-ROM]. Rio de Janeiro: Objetiva). 5 Por resenhas compreendemos uma síntese ou análise bibliográfica como descrito por Severino (2000). 6 O processo de produção das resenhas durou aproximadamente dois anos e participaram desta etapa 32 membros da equipe de pesquisa: RO - Iracema Tada, Maria Freire; BA - Edlamar de Jesus França, Gabriele Rocha Hayne, Juliana Oliveira, José Junio Almeida http://www.crpsp.org.br/portal/comunicacao/jornal_crp/169/frames/fr_dia_do_psicologo.aspx http://www.crpsp.org.br/portal/comunicacao/jornal_crp/169/frames/fr_dia_do_psicologo.aspx http://www.crpsp.org.br/portal/comunicacao/jornal_crp/169/frames/fr_dia_do_psicologo.aspx http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1414-98932010000500001&lng=pt&nrm=iso http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1414-98932010000500001&lng=pt&nrm=iso http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1414-98932010000500001&lng=pt&nrm=iso CAMINHOS METODOLÓGICOS NA PESQUISA EM PSICOLOGIA: PESQUISANDO A ATUAÇÃO DO PSICÓLOGO ESCOLAR RReevviissttaa PPeerrssppeeccttiivvaass eemm PPssiiccoollooggiiaa,, VV.. 1155 nn..11.. JJaann // JJuunn 22001111 21 Queiroz, Marcus de Souza Oliveira, Thais Araújo; MG - Silvia Maria Cintra da Silva, Paula Cristina Medeiros Rezende, Cárita Portilho de Lima, Viviane Silva Barreto, Cláudia Silva de Souza, Denise Silva Rocha, Maria José Ribeiro, Ana Cecília Oliveira Silva, Rafael Santos Carrijo; SP - Aline de Araújo Leite Santos, Aline Morais Mizutani, Anabela de Almeida Costa Santos, Ana Karina Amorim Checchia, Artur Rafael Agostinho Theodoro, Camila Oliveira, Deborah Rosária Barbosa, Jane Cotrin, Juliana Sano de Almeida Lara, Kátia Yamamoto, Marcelo Domingues Roman, Roseli Lins Caldas, Vânia Calado; PR - Marilda Facci, Zaira Leal e Valéria Garcia Silva. As referências dos textosresenhados estão disponíveis no site da Associação Brasileira de Psicologia Escolar e Educacional: http://www.abrapee.psc.br/livros.htm MARILENE PROENÇA REBELLO DE SOUZA, ANABELA ALMEIDA COSTA E SANTOS PERETTA, JULIANA SANO DE ALMEIDA LARA, ROSELI FERNANDES LINS CALDAS RReevviissttaa PPeerrssppeeccttiivvaass eemm PPssiiccoollooggiiaa,, VV.. 1155 nn..11.. JJaann // JJuunn 22001111 22 Referências Associação Brasileira de Ensino de Psicologia. Curso Graduação em Psicologia. Recuperado em 01 de fevereiro, 2010, de http://www.abepsi.org.br/web/cursodegraduacao.aspx Balbino, V. C. R. (2008). Psicologia e Psicologia Escolar no Brasil: formação acadêmica, práxis e compromisso com as demandas sociais. São Paulo: Summus. Bardin, L. (2000). Análise de conteúdo. Lisboa: Edições. Bogdan, R. & Biklen, S. (1994). Investigação qualitativa em educação: Uma introdução à teoria e aos métodos. Porto, Portugal: Porto. Marinho-Araújo, C. M., Neves, M. M. B. J., Penna-Moreira, P. 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Realizou estágio Pós-Doutoral na York University, Canadá (2001-2002). Anabela Almeida Costa e Santos Peretta é graduada em Psicologia pela Universidade de São Paulo (1997), aperfeiçoamento em Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas (1999), mestre e doutora em Psicologia Escolar e do Desenvolvimento Humano pela Universidade de São Paulo (2002 e 2008, respectivamente). Atualmente é Professora Adjunto 1 da Universidade Federal de Uberlândia Juliana Sano de Almeida Lara é p sicóloga e Bacharel em Psicologia pela Universidade de São Paulo (2010). Atualmente é mestranda em Psicologia Escolar e do Desenvolvimento Humano e cursa Licenciatura em Psicologia no Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo Roseli Fernandes Lins Caldas é graduada em Psicologia pelo Instituto Unificado Paulista em 1979, especialista em Psicologia Escolar, Mestre em Educação, Arte e História da Cultura, pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (2000) e Doutora em Psicologia Escolar pelo Departamento de Psicologia Escolar e do Desenvolvimento Humano da Universidade de São Paulo (2010). É coordenadora da Representação Paulista da Associação Brasileira de Psicologia Escolar e Educacional - ABRAPEE Endereço para contato: Av. Pará, 1720, Bairro Umuarama, CEP 38405-320 – Uberlândia – MG. E. mail: anabelaacs@gmail.com REVISTA PERSPECTIVAS EM PSICOLOGIA 24 RReevviissttaa PPeerrssppeeccttiivvaass eemm PPssiiccoollooggiiaa,, VV.. 1155 nn..11.. JJaann // JJuunn 22001111 PARA UMA CRÍTICA AO TEMA BULLYING E “VIOLÊNCIA NAS ESCOLAS” Ana Paula de Ávila Gomide (UFU – Uberlândia - MG) Resumo A partir do referencial da teoria critica da sociedade, o presente trabalho propõe uma problematização do tema do bullying, atualmente, explorado pela mass media, tendo em vista dois aspectos a serem considerados: pensar se nos aspectos evidenciados nos estudos atuais voltados ao tema, não presenciamos certo recrudescimento de discursos tradicionais sobre as “características patológicas de alunos-problemas” que responsabilizam o indivíduo, de forma isolada e a-crítica, pelas demais violências acometidas e ocorridas dentro das escolas; e, lançar luz aos fatores objetivos envolvidos no assunto, assim evidenciando as tendências sociais imperantes que medeiam a formação dos sujeitos e que contribuem para o estabelecimento de relações adoecidas no interior do ambiente escolar. Palavras-chave: teoria crítica; educação; violência Abstract A critique of the term bullying and "school violence" From the view of the critical theory of society, this paper proposes to discuss the issue of bullying, currently exploited by the media. This is done in order to consider two aspects: on the highlighted in the current studies focused to the theme, based on traditional discourses on the “pathological features or the problems of students” which blame individual in isolation and uncritically by other affected and disregarding violence occurring within schools; and on objective factors involved in the matter, thus showing the prevailing social trends that mediate the formation of the subject which contribute to the establishment of relations diseased within the school environment. Keywords: critical theory; education; violence. Artigo Recebido em 23/09/2011 e Aprovado em 10/04/2012 Introdução Das relações históricas da educação com a psicologia é preciso destacar que a educação, desde o século XIX, tem buscado respaldo na ciência psicológica para fundamentar e resolver, cientificamente, os “problemas” ditos educacionais, em grande parte estabelecendo uma relação de subordinação da educação ao tema do “individuo”, em termos de sua configuração psíquica. Temas como os aspectos universais do desenvolvimento humano, as condições de ensino e aprendizagem, os chamados “problemas de aprendizagem e fracasso escolar”, a compreensão das características psicológicas dos alunos, entre outros -, e mais as preocupações sobre como “aperfeiçoar” o ensino -, foram elementos necessários para que os educadores e pesquisadores da área se voltassem para a psicologia, a fim de buscarem soluções pragmáticas a tais problemas. Em decorrência desses aspectos ANA PAULA DE ÁVILA GOMIDE RReevviissttaa PPeerrssppeeccttiivvaass eemm PPssiiccoollooggiiaa,, VV.. 1155 nn..11.. JJaann // JJuunn 22001111 25 aqui mencionados, a psicologia enquanto ciência auxiliar aos processos educacionais, muitas vezes tem desempenhando um papel hegemônico nas tentativas de explicação e de orientação das práticas educativas, legitimando as intervenções e diagnósticos de psicólogos escolares dirigidas aos demais desafios encontrados no cotidiano da escola. Os temas sobre o bullying e “violência na escola” têm sido, na atualidade, os privilegiados nos estudos de especialistas, inclusive, ocupando papéis de destaque no mass media e, (não podemos deixar de mencionar) na imprensa sensacionalista. Tendo em vista a expressividade desses temas nas pesquisas acadêmicas e nas demais abordagens de especialistas que se voltam ao assunto, bem como a exploração do fenômeno do bullying escolar veiculado pelos demais meios de comunicação de massa, trataremos aqui de problematizar o assunto em dois aspectos a serem considerados:1) de um lado, pensar se, nos aspectos evidenciados nos estudos voltados aos temas, não presenciamos certo recrudescimento de discursos tradicionais sobre as “características patológicas de alunos-problemas” - encontradas tanto nas tentativas de descrições de características de alunos que cometem o bullying, quanto na descrição dos tipos de sujeitos mais vulneráveis a sofrerem violência (as chamadas “vitimas do bullying”) - que responsabilizam o indivíduo, de forma isolada e a-crítica, pelas demais violências acometidas e ocorridas dentro das escolas; 2) e, de outro, dando relevo à dimensão do problema - e concordando que o mesmo merece a devida atenção por parte de intelectuais-, pensar o que se evidencia por trás da temática “violência na escola”, em termos de apontar as tendências sociais imperantes que, por sua vez, medeiam a formação dos sujeitos, assim configurando as suas relações adoecidas no interior das escolas (entre alunos e professores, entre alunos e alunos, etc). É preciso destacar que não se intenciona aqui desvalorizar as pesquisas psicológicas no que tange aos recortes estabelecidos para seus objetos de estudo, nem tampouco seus instrumentos de análise, principalmente porque a psicologia ilumina sobre os “tipos sociais” mais afeitos à violência e aqueles pelos quais o sistema social – a irracionalidade objetiva - subsiste. De fato, há uma tradição de pesquisas empíricas dentro da psicologia social voltadas aos estudos sobre violência, preconceito e antissemitismo, desde a década de 50, nos países europeus e nos EUA que deixaram de herança dados e análises profícuas para a elucidação de problemas dessa natureza, sobretudo, aquelas pesquisas de campo da psicologia profunda, nas interfaces da psicanálise com a teoria social, dentro do campo da psicologia social analiticamente orientada (Adorno, Frenkel-Brunswik, Levinson e Sanford, 1950). Os aspectos subjetivos da violência devem ser considerados e tratados com a devida seriedade, entretanto, pela perspectiva aqui adotada, não devem ter primazia sobre os fatores objetivos, posto a pesquisa psicológica poder correr o risco de se tornar em um “tipo de imagem encobridora ideológica” (Adorno, 1995) de questões cruciais geradas pelas tendências sociais e históricas contemporâneas, de cunho regressivo, que fomentam e instilam nas pessoas seus comportamentos irracionais. O uso do termo técnico “bullying”, equivocadamente tratado pelo mass media como uma “epidemia social”, às vezes até PARA UMA CRÍTICA AO TEMA BULLYING E “VIOLÊNCIA NAS ESCOLAS” RReevviissttaa PPeerrssppeeccttiivvaass eemm PPssiiccoollooggiiaa,, VV.. 1155 nn..11.. JJaann // JJuunn 22001111 26 mesmo visto como um fenômeno extrínseco à nossa sociedade que visa descrever formas e códigos de condutas de crianças e adolescentes – esses, por sua vez, apontados como indisciplinados e “sem limites” pelas leituras técnico-psicologizantes -, acaba por ocultar as condições objetivas favoráveis à violência e a um tipo de educação que se volta para a “eliminação” de singularidades, quando essa privilegia a produção de identidades conformadas à lógica produtiva da racionalidade instrumental. Nesse sentido, entendemos ser o termo mais um "produto cultural" a ser consumido pelos agentes educacionais que acaba impedindo a conscientização e a reflexão mais crítica por parte dos mesmos sobre o legado de representações e práticas violentas que a escola carrega consigo, tendo em vista a nossa cultura prenhe de manifestações bárbaras. A partir do referencial da teoria critica da sociedade, especificamente, os escritos de Adorno sobre a temática educacional e formativa, mais elementos teóricos para a discussão do tema serão apontados. Educar contra a barbárie Em boa parte da literatura voltada ao tema do bullying e\ou violência na escola (Fante, 2005; Oliveira & Antônio, 2006), evidenciamos o tratamento do assunto sob o âmbito da psicologia de quem comete as “atrocidades” para com os mais frágeis - as possíveis vitimas -, tendo em vista apresentar os efeitos deletérios das humilhações sobre quem as recebe. As pesquisas têm como intuito apontar as características dos agressores e as peculiaridades de sujeitos que os colocam na posição de vítimas (por exemplo, a timidez excessiva, “traços que destoam das características culturais de seu grupo etário” ou “dificuldades emocionais e físicas” para reagirem às humilhações (Campos & Jorge, 2010), para se pensar em medidas preventivas nas escolas (Fante, 2005). Em que pese a objetividade dessas pesquisas e a denúncia que subjaz às mesmas sobre as situações desumanas encontradas no ambiente escolar, a questão é a de que os aspectos psicológicos envolvidos na violência não são suficientes para tratar do problema quando não sustentados por uma crítica social. A pesquisa psicológica para o tema da violência entre jovens, e que se volta exclusivamente para as características psíquicas dos sujeitos, deve, necessariamente, em se tratando de escola e de educação, se perguntar pelas condições de existência de seu objeto, assim evidenciando as marcas sociais nos sujeitos a serem estudados. Podemos afirmar que há uma tendência em se enfatizar os traços de caráter dos envolvidos de forma isolada e “estereotipada” – no caso, a ênfase sobre as “famílias desestruturadas” dos jovens agressores e suas necessidades de auto- afirmação, baixa auto-estima, etc (Campos & Jorge, 2010)-, em detrimento de uma análise que possa trazer em seu bojo o confronto dos fenômenos apontados com as condições sociais objetivas, de uma época histórica na qual as crianças e jovens são (pseudo) formados sob a influência de imagens televisivas, criadoras de estereótipos sociais, e de jogos eletrônicos extremamente violentos (Zuin, 2010). Em uma época na qual os mandamentos tradicionais patriarcais e religiosos têm sido enfraquecidos pelas transformações estruturais das sociedades tecnológicas (que, por sua vez, forneciam a experiência ANA PAULA DE ÁVILA GOMIDE RReevviissttaa PPeerrssppeeccttiivvaass eemm PPssiiccoollooggiiaa,, VV.. 1155 nn..11.. JJaann // JJuunn 22001111 27 de conteúdos formativos tradicionais pelos quais o indivíduo poderia se salvaguardar dos embates da “socialização” do mundo do trabalho), bem como o empobrecimento de bens espirituais, as pesquisas psicológicas e educacionais deveriam se atentar para essas tendências: a de que crianças e adolescentes encontram-se educados mais diretamente pela sociedade de massa. Os comportamentos economicamente necessários – aqueles necessários à adaptação do sujeito à sociedade – são apreendidos e interiorizados pelos sujeitos por meio de outras instâncias sociais de controle em virtude das transformações ocorridas na família privada, atualmente, cada vez mais empobrecida e invadida por tais instâncias. A televisão, por exemplo, tem sido um dos principais fatores de identificação aos sujeitos, pois, como afirma Marcuse (1998) no texto A obsolescência da psicanálise, a criança acaba por aprender que são seus companheiros de brincadeiras, os vizinhos, o esporte e o cinema – e todo um aparato de estímulos audiovisuais – que “são autoridades no que se refere ao comportamento intelectual e corporal adequado” (Marcuse, 1998, p.100), e não mais o modelo oferecido pela autoridade paterna, também enfraquecida pelas modificações estruturais econômicas das sociedades pós-industriais. Nesse sentido, a respeito da constituição psicológica individual nas sociedades administradas, Marcuse apresenta a formação de “egos frágeis” que resultam em indivíduos poucos resistentes às pressões sociais e mais inclinados a se identificarem aos modelos
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