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Brasília-DF. Patologias em Fundações, Contenções e obras de terra Elaboração Andrey Pimentel Aleluia Freitas, DSc. Produção Equipe Técnica de Avaliação, Revisão Linguística e Editoração Sumário APRESENTAÇÃO ................................................................................................................................. 4 ORGANIZAÇÃO DO CADERNO DE ESTUDOS E PESQUISA .................................................................... 5 INTRODUÇÃO.................................................................................................................................... 7 UNIDADE I PATOLOGIA NA CONSTRUÇÃO CIVIL ...................................................................................................... 9 CAPÍTULO 1 INTRODUÇÃO .......................................................................................................................... 9 CAPÍTULO 2 NOÇÕES BÁSICAS SOBRE CONSTRUÇÕES ............................................................................. 16 CAPÍTULO 3 DESEMPENHO DAS CONSTRUÇÕES ........................................................................................ 32 UNIDADE II O CONTEXTO DA CONSTRUÇÃO CIVIL ................................................................................................. 36 CAPÍTULO 1 NATUREZA DOS MATERIAIS DE CONSTRUÇÃO .......................................................................... 36 CAPÍTULO 2 CATEGORIAS DOS MATERIAIS DE CONSTRUÇÃO .................................................................... 43 CAPÍTULO 3 SERVIÇOS NA CONSTRUÇÃO CIVIL ......................................................................................... 53 UNIDADE III FUNDAÇÕES E ENCOSTAS ................................................................................................................... 59 CAPÍTULO 1 ESTABILIDADE DAS ENCOSTAS ................................................................................................ 59 CAPÍTULO 2 ESTRUTURAS DE CONTENÇÃO ............................................................................................... 66 CAPÍTULO 3 FUNDAÇÕES ......................................................................................................................... 70 REFERÊNCIAS ................................................................................................................................ 100 4 Apresentação Caro aluno A proposta editorial deste Caderno de Estudos e Pesquisa reúne elementos que se entendem necessários para o desenvolvimento do estudo com segurança e qualidade. Caracteriza-se pela atualidade, dinâmica e pertinência de seu conteúdo, bem como pela interatividade e modernidade de sua estrutura formal, adequadas à metodologia da Educação a Distância – EaD. Pretende-se, com este material, levá-lo à reflexão e à compreensão da pluralidade dos conhecimentos a serem oferecidos, possibilitando-lhe ampliar conceitos específicos da área e atuar de forma competente e conscienciosa, como convém ao profissional que busca a formação continuada para vencer os desafios que a evolução científico-tecnológica impõe ao mundo contemporâneo. Elaborou-se a presente publicação com a intenção de torná-la subsídio valioso, de modo a facilitar sua caminhada na trajetória a ser percorrida tanto na vida pessoal quanto na profissional. Utilize-a como instrumento para seu sucesso na carreira. Conselho Editorial 5 Organização do Caderno de Estudos e Pesquisa Para facilitar seu estudo, os conteúdos são organizados em unidades, subdivididas em capítulos, de forma didática, objetiva e coerente. Eles serão abordados por meio de textos básicos, com questões para reflexão, entre outros recursos editoriais que visam tornar sua leitura mais agradável. Ao final, serão indicadas, também, fontes de consulta para aprofundar seus estudos com leituras e pesquisas complementares. A seguir, apresentamos uma breve descrição dos ícones utilizados na organização dos Cadernos de Estudos e Pesquisa. Provocação Textos que buscam instigar o aluno a refletir sobre determinado assunto antes mesmo de iniciar sua leitura ou após algum trecho pertinente para o autor conteudista. Para refletir Questões inseridas no decorrer do estudo a fim de que o aluno faça uma pausa e reflita sobre o conteúdo estudado ou temas que o ajudem em seu raciocínio. É importante que ele verifique seus conhecimentos, suas experiências e seus sentimentos. As reflexões são o ponto de partida para a construção de suas conclusões. Sugestão de estudo complementar Sugestões de leituras adicionais, filmes e sites para aprofundamento do estudo, discussões em fóruns ou encontros presenciais quando for o caso. Atenção Chamadas para alertar detalhes/tópicos importantes que contribuam para a síntese/conclusão do assunto abordado. 6 Saiba mais Informações complementares para elucidar a construção das sínteses/conclusões sobre o assunto abordado. Sintetizando Trecho que busca resumir informações relevantes do conteúdo, facilitando o entendimento pelo aluno sobre trechos mais complexos. Para (não) finalizar Texto integrador, ao final do módulo, que motiva o aluno a continuar a aprendizagem ou estimula ponderações complementares sobre o módulo estudado. 7 Introdução A patologia de construção, tanto como termo quanto como conceito geral, está se tornando mais amplamente usada para definir uma abordagem holística para a compreensão de edifícios. Essa abordagem requer um conhecimento detalhado de como os edifícios são construídos, usados, ocupados e mantidos, e os vários mecanismos pelos quais suas condições estruturais, materiais e ambientais podem ser afetadas. É, necessariamente, uma abordagem interdisciplinar e requer um reconhecimento mais amplo das maneiras pelas quais os edifícios e as pessoas respondem e reagem entre si. O conteúdo deste material objetiva apresentar o conceito de patologia de construção e, com ele, preencher a lacuna entre as abordagens atuais para a fiscalização de edifícios e o estudo detalhado de diagnóstico, prognóstico e remediação de defeitos. Sua estrutura é fundamentada de forma didática, direcionada para auxiliar estudantes e profissionais a aprofundar seus conhecimentos em ambientes construídos, sendo útil para contextualizar processos de gerenciamento de manutenção em edifícios com necessidades de reparo. Uma crítica comum a materiais preocupados com o levantamento, o reparo e a manutenção de edifícios é que não são dadas respostas absolutas, seja para o diagnóstico de defeitos ou a especificação de reparos. A razão é que essas respostas geralmente exigem mais informações do que as que podem ser fornecidas facilmente nas páginas de um livro. É parcialmente em resposta a essa omissão que o presente texto busca uma maior conscientização e compreensão dos edifícios e de seus usuários para auxiliar no projeto e na implementação de medidas corretivas específicas e apropriadas. Objetivos Atender aos requisitos propostos pela ementa do curso, apresentando conceitos e definições relacionados ao estudo das patologias em fundações, contenções e obras de terra. 8 » Atender aos objetivos da disciplina, por meio do entendimento e da compreensão da importância da identificação de patologias em diferentes ambientes da construção civil. » Atender os objetivos de aprendizagem, proporcionando ao aluno os subsídios para que possa, ao final da disciplina, identificar os principais conceitos e as abordagens relacionadas a falhas de funcações e em barragens de contenção de obras de terra em diferentes ambientes da construção civil. 9 UNIDADE IPATOLOGIA NA CONSTRUÇÃO CIVIL CAPÍTULO 1 Introdução O que é patologia em construção civil? O termo patologia é definido como o estudo sistemático de doenças com o objetivo de compreender suas causas, sintomas e tratamento. No contexto médico, a pessoa passa a ser objeto de exame eanálise detalhados, considerando a idade, a saúde e o estilo de vida. Uma abordagem semelhante é relevante no estudo de construções, caracterizando uma prática metódica e freqüentemente forense, que passou a ser denominada de patologia de construção. A patologia em construção, tanto como um termo quanto como um conceito geral, está se tornando mais amplamente usada para definir a abordagem holística, com o objetivo de entender os edifícios. Essa abordagem requer um conhecimento detalhado de como os edifícios são projetados, construídos, usados e alterados, e os vários mecanismos pelos quais suas condições materiais e ambientais podem ser afetadas. É, necessariamente, uma abordagem interdisciplinar que requer um reconhecimento mais amplo das maneiras pelas quais os edifícios e as pessoas respondem e reagem entre si. A definição de patologia da construção, utilizada pela Association d’Experts Européens du Bâtiment et de la Construction (AEEBC, 1994), chama a atenção para três áreas distintas, embora, inter-relacionadas: » Identificação, investigação e diagnóstico de defeitos em edifícios existentes. » Prognóstico dos defeitos diagnosticados e recomendações para o planejamento de ações adequadas, considerando o edifício, o seu futuro e os recursos disponíveis. 10 UNIDADE I │ PATOLOGIA NA CONSTRUÇÃO CIVIL » Projeto, especificação, implementação e supervisão de programas de obras corretivas; monitoramento e avaliação de trabalhos corretivos em termos de desempenho funcional, técnico e econômico em uso. Outras definições ainda contemplam: » O estudo de falhas na inter-relação de estruturas e materiais de construção com seus ambientes, ocupantes e conteúdos (HUTTON; ROSTRON, 1989). » O estudo de falhas ao longo do tempo em materiais e componentes de construção (GROA´K, 1992). » O tratamento sistemático de defeitos de construção, suas causas, suas consequências e seus remédios (CIB W86, 1993). » O estudo científico de anormalidades na estrutura e no funcionamento do envelope do edifício e suas partes busca estudar as inter-relações de materiais de construção, construção, serviços e arranjo espacial com seus ambientes, ocupantes e conteúdos (SINGH, 1997). O Conselho Internacional de Pesquisa e Inovação em Construção Civil (CIB), antigo Conselho Internacional de Construção Civil, foi criado, em 1993, para estimular e facilitar a cooperação internacional e o intercâmbio de informações. Desde então, tornou-se uma rede mundial, cujos membros atuam em mais de 50 comissões, cobrindo todos os campos da pesquisa e inovação relacionadas à construção civil. Os objetivos da Comissão de Patologia de Edifícios (W86, 1993) visam produzir informações que ajudarão no diagnóstico e na prevenção de defeitos e falhas significativas no projeto, na construção e no uso de edifícios, e considerar aspectos técnicos de defeitos e falhas em edifícios de todos os tipos. Embora cada definição coloque uma ênfase ligeiramente diferente na natureza e na extensão da disciplina, é claro que a construção de patologia, em seu sentido mais amplo, preocupa-se, principalmente, com defeitos e ações de reparação associadas. O objetivo deste material é, portanto, expandir o leque de investigações normalmente realizadas no levantamento de edifícios e reunir várias categorias de informações necessárias para tomar decisões informadas sobre como esses edifícios podem ser reparados, mantidos e melhor utilizados, agora e no futuro. 11 PATOLOGIA NA CONSTRUÇÃO CIVIL │ UNIDADE I Por que adotar uma abordagem holística para entender as construções? As construções não existem isoladamente, mas representam vários níveis de ação e interação entre o homem e seu entorno – por um lado, podem ser expressões de impulso criativo, e, por outro, simples declarações de necessidade funcional. Qualquer que seja a forma de existência, é uma resposta física às necessidades diretas ou indiretas das pessoas em relação ao local e ao meio ambiente. A figura 1 mostra uma abordagem ampla dessas necessidades. Figura 1. Interação entre construções e diferentes cenários. Ambiente Externo Serviços da Construção Proteção Externa Pessoas e Atividades Presentes no Ambiente Interno Estrutura da Construção Fonte: Singh (1997). Conforme mostra a figura 1, quaisquer mudanças que impactem no equilíbrio entre os três fatores são responsáveis por muitas das decisões em torno das quais os edifícios são construídos, ocupados, adaptados e, finalmente, destruídos. Para entender uma construção, deve-se, primeiro, considerar seu contexto, desde quando foi projetado e construído, por meio de mudanças ao longo do tempo, até seu uso atual. Essa progressão leva em consideração várias ações, sendo algumas significativas e outras mais triviais, porém, todas fornecem informações que podem ter relevância para a compreensão da construção no contexto do presente. Essa abordagem tem muito em comum com a da arqueologia, que sempre busca combinar aspectos de descoberta, análise científica e imaginação criativa, mas com um propósito mais amplo de informar as decisões que impactaram o passado e que afetarão o futuro. 12 UNIDADE I │ PATOLOGIA NA CONSTRUÇÃO CIVIL Figura 2. Investigação arqueológica para ajudar a entender a história e o desenvolvimento das construções. Fonte: Singh (1997). Adotar uma visão mais ampla de uma determinada construção exige, portanto, um nível de entendimento que, além de exemplos simples, geralmente requer o conhecimento e a experiência de várias disciplinas. Informações mais especializadas podem ser exigidas por grupos ou indivíduos ao lidar com tipos ou situações específicas de construção. Aqueles que podem contribuir, por exemplo, para a compreensão dos históricos de monumentos antigos, como conservadores, curadores e artesãos, podem ser considerados habilitados para demonstrar a natureza interdisciplinar dos projetos de conservação. Outras fontes de informação também podem ser procuradas e examinadas para cada necessidade específica. As necessidades para formar um entendimento de uma construção devem considerar cada elemento dentro do contexto, como a localização e o uso. Considerar ainda, de forma individual e buscando identificar falhas comuns que possam levar à insatisfação, gastos desnecessários ou mudanças injustificáveis. Necessidades das construções As construções, juntamente com o seu conteúdo, apresentam uma montagem complexa de materiais e peças. Cada material, seja ele um elemento ou componente identificável durante o processo de construção ou parte dos acabamentos internos, tem suas próprias características e requisitos. As necessidades atuais dos edifícios, independentemente da idade ou construção, devem ser entendidas, respeitadas e respondidas para que funcionem com um 13 PATOLOGIA NA CONSTRUÇÃO CIVIL │ UNIDADE I determinado padrão aceitável. São essas necessidades e a questão do entendimento de ser “aceitável” que serão consideradas nas partes posteriores deste material. Edifícios tradicionais, que são essencialmente uma coleção de materiais naturais, contam com argamassas macias, rebordos sacrificiais, gessos e acabamentos permeáveis ao vapor de umidade e ventilação natural para manter sua integridade e coesão. Isso contrasta com edifícios mais modernos, os quais usam cimentos e concretos, plásticos, compósitos e outros materiais para atender às exigências do cliente, do projetista e da autoridade estatutária, conforme mostra a figura 3. Figura 3. O design, a construção e a utilização dos edifícios modernos diferem em muitos aspectos dos prédios das gerações anteriores. Fonte: Singh (1997). Necessidades dos usuários das construções O uso e a função dos edifícios mudaram com o tempo e, a cada mudança, surgem conjuntos de diferentes requisitos, que, muitas vezes, mostram-se conflitantes. Esses requisitos, geralmente deixam evidências nas formas de alterações físicas na estruturae nas utilidades disponibilizadas aos usuários. Em cada nível de evidência, informações potencialmente úteis são oferecidas para, posteriormente, serem coletadas e consideradas na tentativa de entender as características específicas de um edifício ou de uma coleção de construções segmentadas. 14 UNIDADE I │ PATOLOGIA NA CONSTRUÇÃO CIVIL A relevância da patologia de uma construção A relevância da patologia da construção para praticantes e estudantes de disciplinas do ambiente construído, e para outros responsáveis pelo gerenciamento de construções e seus locais, reside, principalmente, na necessidade de maior precisão de informações apropriadas nas quais devem basear suas decisões. Essas necessidades podem surgir a partir de vários motivos, dentre os quais se destacam: Determinar a segurança financeira contra uma locação ou hipoteca desejada ou, ainda, para a mudança de propriedade. Fornecer confiança para um potencial comprador ou empreiteiro, seja por meio de um relatório encomendado diretamente pelo comprador ou pelo fornecedor que deseja confirmar ou divulgar fatos relevantes. » Determinar a estabilidade e o risco de falha após processos naturais ou desastres. » Estabelecer responsabilidade por mau estado (dilapidações). » Diagnosticar defeitos quando os sintomas aparecerem aos ocupantes. » Determinar a eficácia de reparos ou manutenção anteriores. » Avaliar os níveis de deterioração antes dos procedimentos legais. » Garantir o cumprimento dos requisitos legais. » Entender e documentar os fatores que afetam a condição física. » Fornecer uma base para o trabalho planejado (reparo, manutenção). » Fornecer uma base para mudanças físicas (adaptação, mudança de uso). » Seja qual for o motivo envolvido, essa necessidade de informações precisas e apropriadas, adquiridas a um custo aceitável para o cliente, exigirá uma mudança na maneira como os edifícios são percebidos e tratados. A aceitação da prática da análise da patologia em construções, fornecendo uma abordagem holística para a compreensão adequada dos níveis de aceitação, acrescentará uma dimensão extra ao que muitos consultores e profissionais já são capazes de oferecer. Como tal, sua relevância precisa ser reconhecida e compreendida e seus princípios plenamente divulgados e adotados. 15 PATOLOGIA NA CONSTRUÇÃO CIVIL │ UNIDADE I Os princípios e as práticas da análise da patologia em construções Os princípios, nos quais a patologia do edifício se baseia, seguem um conhecimento detalhado de como um edifício é projetado, construído, usado e alterado, e dos vários mecanismos pelos quais suas condições estruturais, materiais e ambientais podem ser afetadas. A análise da patologia é mais do que uma simples pesquisa de construção detalhada, pois reconhece a importância relativa das pessoas e do local instalado. Uma abordagem tão abrangente para conhecer os edifícios possibilita oferecer potenciais para desenvolver um entendimento mais profundo e fornecer informações mais úteis aos investidores e às diferentes partes envolvidas. 16 CAPÍTULO 2 Noções básicas sobre construções O que é uma construção? Embora isso possa parecer, à primeira vista, uma pergunta relativamente direta, pode, no entanto, ser respondida de várias maneiras. Para a maioria das pessoas que vivem e trabalham em prédios, são apenas recipientes para atividades que exigem abrigo do ambiente externo. Esses “contêineres” podem variar em complexidade, de simples abrigos de ônibus a catedrais elaboradas, ou de formas tradicionais de construção àquelas que dependem de serviços sofisticados de construção para criar e manter condições ambientais especificadas. A imagem de que um edifício age como um contêiner ou envelope, que amortece ou filtra as condições externas para as necessidades internas, é amplamente usada para entender como os edifícios funcionam. Uma analogia de um edifício agindo como uma pele, que envolve os ocupantes e modifica as condições ambientais, é igualmente útil, pois indica como deve ser forte, resiliente e capaz de se adaptar às mudanças nas condições para obter sucesso e sobreviver. A autocura, tanto como uma habilidade natural da pele quanto como inspiração para materiais de superfície futuristas, leva esse conceito ainda mais longe. Essa imagem de um edifício se comportando como uma pele foi avançada com a noção de que não existe um edifício! Em vez disso, há uma série de camadas ou limites e cenários que são propostos por Duffy (1990), além de local, estrutura, aparência, serviços, plano de espaço e outras coisas são propostas por Brand (1994), que rasgam ou cisalham devido a diferentes taxas de alteração. Isso é novamente útil ao enfatizar que os edifícios são mais do que apenas tijolos e argamassa. É uma questão de opinião e debate pessoal se os prédios são mais do que a soma de suas partes componentes, representando uma relação sinérgica entre eles e seus usuários. Isso não é para sugerir a existência de um superorganismo construído, semelhante ao de Gaia, de James Lovelock (LOVELOCK, 1995), mas o conceito de que um edifício tem nascimento, vida e morte é conhecido em várias partes do mundo e é reconhecido no edifício do templo da antiga civilização maia da América Central. 17 PATOLOGIA NA CONSTRUÇÃO CIVIL │ UNIDADE I O sucesso de um edifício no cumprimento de seus deveres básicos de contenção e abrigo depende de uma série de questões relacionadas e inter-relacionadas. Muito foi escrito sobre a teoria e a prática do design e, embora não seja o objetivo deste material comentar sobre como novos edifícios são adquiridos, projetados e construídos, é útil considerar cinco opiniões elementares sobre o assunto: Na arquitetura, como em todas as outras artes operativas, o fim deve direcionar a operação. O fim é construir bem. A construção do poço possui três condições: mercadoria (satisfação do usuário), firmeza (estruturalmente sólida) e beleza (esteticamente agradável) (LOVELOCK, 1995). Inicialmente, temos o conceito “a partir do chão”, ou “rock e húmus”, que remete ao entendimento de que um edifício é “plantado” para sobreviver aos elementos – o solo já tem forma. Por que não começar aceitando isso? O chão é uma pradaria, quadrado, plano? O solo está ensolarado ou a encosta sombreada de alguma colina, alta ou baixa, nua ou arborizada, triangular ou quadrada? O sítio apresenta características, árvores, rochas, riachos ou uma tendência visível de algum tipo? Tem alguma falha ou virtude especial, ou várias? Então, essencialmente, o sítio é o ponto de partida do design (LOVELOCK, 1995). O homem reúne os materiais disponíveis para formar abrigo, de modo a modificar o clima indígena e proporcionar um clima satisfatório de conforto e conveniência. Se o conceito climático incluir os climas cultural, social, político e estético, além do físico, sugere que três tipos de informações são necessárias: padrão de atividades, local disponível com clima indígena e tecnologia de construção. O que devemos pedir para um novo abrigo? Devemos pedir proteção contra os elementos, um nível adequado de conforto e um ambiente agradável que melhore nossa vida. Esses recursos devem ser fornecidos de maneira econômica, simples e confiável. O abrigo não deve dominar nossas vidas, mas, sim, causar um impacto mínimo sobre nós. Idealmente, um abrigo deve nos conscientizar das belezas e delícias da natureza, em vez de nos afastar delas. Os edifícios também são expressões das pessoas e da sociedade que os construíram – isso faz parte da identidade nacional, conforme mostra a figura 4. 18 UNIDADE I │ PATOLOGIA NA CONSTRUÇÃO CIVIL Figura 4. O Taj Mahal em Agra, na Índia, foi construído como um símbolo duradouro do amor de um homem para sua esposa. Hoje, seu reconhecimento é universal. Fonte: Lovelock (1995). As mudanças na sociedade são refletidas em como e quando os edifícios são projetados, construídos, utilizados, adaptados e, finalmente,destruídos. Algumas das preocupações mais importantes que mudaram o design e a construção de edifícios ao longo da história foram as de conforto e segurança – cada uma delas forçou mudanças que hoje representam a história, seja arquitetônica ou social, política ou econômica. Essas mudanças e as mudanças nas expectativas dos padrões de conforto continuam até hoje com dispositivos e gadgets que economizam tempo e trabalho, maior eficiência e controle sobre o aquecimento, maior delimitação de espaço privado, sistemas de detecção de intrusos e de incêndio, avançados eletrônicos e telecomunicações, entretenimento doméstico e assim por diante. Tais mudanças e correspondentes mudanças de atitude continuarão enquanto houver liberdade de escolha e ação. Embora a mudança seja evidente na forma como usamos nossos prédios, ainda existem lembretes do passado embutidos nos prédios do presente. Tais símbolos de moda ou sentimento representam um elo visível com princípios e práticas anteriores, embora, muitas vezes, incompreendidos e mal aplicados. Essa preocupação com o passado, alimentada por um crescente interesse e conscientização sobre a herança da nação, também fornece uma tensão entre o antigo e o novo, testemunhada por edifícios que estão em desacordo com o ambiente em que estão no lugar e no tempo. 19 PATOLOGIA NA CONSTRUÇÃO CIVIL │ UNIDADE I Também existe uma demanda por edifícios “verdes” e sustentáveis, que tenham um efeito mínimo no ambiente natural e, no entanto, proporcionem todo o conforto e a segurança que a tecnologia e a ciência do século XXI podem oferecer. Essa dualidade oferece o desafio que levará os edifícios e sua construção para as próximas décadas. Percepções de edifícios Desde que as pessoas começaram a pensar nos edifícios como comuns (provavelmente com o advento da habitação em massa, no século XX), mas não como essenciais para sua sobrevivência, nossa percepção e consideração pelo ambiente construído diminuíram progressivamente. Os edifícios podem, portanto, ser muitas coisas para muitas pessoas, mas, por muito tempo, sua presença e propósito são ignorados. Se a pessoa gosta ou não de um edifício, depende de preferências e refinamentos pessoais. Isso é derivado de uma série de julgamentos conscientes e subconscientes, incluindo valores pessoais; crenças e significados; conhecimento e experiência de um edifício ou espaço; e estímulos mentais ou visuais baseados em avisos, como livros, filmes e memórias de infância (figura 5). Essas percepções ou sensações pessoais, muitas vezes íntimas, podem incluir: » Claro e escuro. » Quente e frio. » Seco e úmido. » Luz do sol e sombra. » Cor e textura. » Cheiros e odores (por exemplo, porão com mofo). » Som e silêncio (por exemplo, música). » Localização e situação. » Tamanho e escala. » Contexto e uso. 20 UNIDADE I │ PATOLOGIA NA CONSTRUÇÃO CIVIL » Caráter e associação (por exemplo, “casa mal assombrada”). » Pessoas e conteúdos. Figura 5. Alojamento triangular de Rushton, Northamptonshire. Fonte: Lovelock (1995). O alojamento triangular de Rushton, Northamptonshire, em planta, é um triângulo equilátero, com três andares com três janelas de cada lado e em cada andar. Cada lado tem três empenas, subindo para três pináculos cônicos. No cruzamento do telhado há uma chaminé de três lados. Abaixo das empenas, há um friso com uma inscrição contínua em torno dos três lados. A Loja, construída por Sir Thomas Tresham, em 1593-1597, é simbólica da Santíssima Trindade e está ligada à doutrina da Missa, e contém alusão à literatura religiosa e às imagens pessoais (LOVELOCK, 1995.). Além de tais observações manifestas, os edifícios, assim como as figuras e esculturas, são capazes de fazer com que o usuário ou observador experimente seus arredores de maneiras menos aparentes. “Sentimentos” ou respostas sensoriais que podem ser experimentadas, quando dentro e ao redor de edifícios, podem indicar uma percepção latente do que é “bom” e “ruim”. Esses sentimentos foram usados pelos designers ao longo da história para provocar emoções, sensações ou comportamentos diferentes, que refletem a natureza e o uso do edifício. Essa estimulação ou excitação é um dos elementos essenciais da boa arquitetura, conforme mostra o quadro 1. 21 PATOLOGIA NA CONSTRUÇÃO CIVIL │ UNIDADE I Quadro 1. Diferentes sentimentos provocados pela arquitetura. Bons sentimentos Maus sentimentos Caseiro Pacífico Espiritual Repousante Atmosférico Inspirador Acolhedor Confortável Espaçoso Inspirador Emocionante Tira o fôlego Claustrofóbico Intimidador Esmagador Desmoralizante Apertado Opressivo Solitário Mórbido Isolado Desconfortável Empobrecido Esquálido Fonte: Lovelock (1995). Esses julgamentos são, no entanto, essencialmente subjetivos por natureza e podem responder parcialmente à questão de saber se um edifício é realmente “bom” ou “ruim”. A objetividade vem do reconhecimento dos vários requisitos do edifício e da avaliação em relação a vários critérios aceitos, que podem incluir: » Adequação ao objetivo (por exemplo, necessidades e expectativas). » Acessibilidade (por exemplo, pessoas capazes e com deficiência). » Eficiência energética (por exemplo, isolamento térmico, emissões de dióxido de carbono, classificações de avaliação de energia). » Sustentabilidade (por exemplo, gerenciamento de recursos). » Condição (por exemplo, reparo e manutenção). » Desempenho em uso (por exemplo, custos do ciclo de vida, níveis de obsolescência). Perceber ou “ver” os edifícios pelo que eles são, assim como pelo que foram e podem se tornar, exige consideração em vários níveis. A maioria das pessoas consegue entender os edifícios em termos de construção, espaço e custo, geralmente com base em suas próprias experiências de compra e venda, mas cada uma dessas considerações pode formar uma base de uma avaliação detalhada que leva o objeto da vida cotidiana aos domínios do estudo acadêmico. 22 UNIDADE I │ PATOLOGIA NA CONSTRUÇÃO CIVIL A profundidade das avaliações dependerá dos motivos pelos quais se objetiva “ver” e entender o edifício. No caso de edifícios históricos, isso pode incluir o aprendizado da “linguagem” da arquitetura para “ler” seus designs. Classificação das construções Uma maneira simples de ver e entender os edifícios é classificá-los de acordo com a aparência e com o que fazem. Essa classificação geralmente tenta reunir vários tipos ou usos de construções semelhantes por um ou mais motivos. Em geral, os edifícios podem ser vistos em termos de sua história e, como tal, podem ser classificados de acordo com a idade, influências estilísticas e modo de construção. Essa categorização forma a base do sistema de listagem de edifícios de interesse arquitetônico ou histórico (DEPARTMENT OF THE ENVIRONMENT/ DEPARTMENT OF NATIONAL HERITAGE, 1994): » Idade e raridade são considerações relevantes, particularmente quando os edifícios são propostos para listar com base no interesse histórico. Quanto mais antigo é um edifício, e quanto menos exemplos sobreviventes desse tipo, maior a probabilidade de ele ter importância histórica. » Todos os edifícios construídos antes de 1700, que sobrevivem com algo parecido com a condição original, são listados. » A maioria dos edifícios de 1700 a 1840 está listada, embora alguns ainda sejam necessários. » Após cerca de 1840, devido ao grande número de edifícios erigidos e os números muito maiores que sobreviveram, é necessária uma seleção maior para identificar os melhores exemplos de tipos específicos de edifícios, e apenas os edifícios de qualidade e caráter definidos são listados. » Pelas mesmas razões, somente edifícios selecionados do período após 1914 são normalmente listados. 23 PATOLOGIA NA CONSTRUÇÃO CIVIL │ UNIDADE I » Edifícios com menos de 30 anos de idade normalmente são listados apenas se forem de excelente qualidade e estejam sob ameaça. » Edifícioscom menos de dez anos não são listados. Além disso, a classificação é procurada por legislação ou regulamentação, com o intuito de impor ordem e conformidade para um fim específico. Tais propósitos normalmente estão relacionados ao uso da terra, planejamento e questões de saúde e segurança. Embora essas classificações permitam que os “edifícios” e os tipos de edifícios sejam “compreendidos” no nível mais geral, elas não tentam distinguir ou definir um edifício em particular do outro. Para isso, é necessário entender os requisitos de cada edifício e as expectativas daqueles que o possui ou o utiliza. Requisitos dos edifícios Para ter sucesso, o projeto e a construção de um edifício devem considerar uma variedade de questões. Em outras palavras, um edifício, uma vez construído, deve atender a certos critérios. Estes podem ser considerados como sendo: » Requisitos funcionais. » Requisitos de desempenho. » Requisitos legais. » Requisitos do usuário. Requisitos funcionais Todo edifício, independentemente de seu uso original, intermediário ou final, pode atender a certos requisitos funcionais básicos. Esses requisitos dizem respeito principalmente à proteção contra ambiente, conforto humano e organização da atividade e do espaço, conforme mostra a figura 6. Uma enorme casa de torre do século XIV, construída no momento em que a defesa era um requisito funcional principal na região fronteiriça da Escócia, compara-se à mansão do final do século XIX, projetada em grande parte pela aparência e conforto. 24 UNIDADE I │ PATOLOGIA NA CONSTRUÇÃO CIVIL Figura 6. Castelo de Comlongon, Dumfries, na Escócia. Fonte: Osbourn e Greeno (1997). Outras necessidades funcionais podem incluir a criação de um senso particular de identidade ou local e o controle de usos internos concorrentes ou conflitantes. A menos que a função de um edifício seja conhecida, ela não pode ser considerada boa ou ruim. Requisitos de desempenho Para que um edifício seja bem-sucedido, ele deve atender aos requisitos funcionais básicos mencionados acima. A maneira pela qual atende a essas demandas, tanto como um edifício quanto como uma coleção de partes relacionadas e inter-relacionadas, pode ser determinada pelo desempenho em relação a várias medidas ou padrões de desempenho definidos. Os requisitos de desempenho de um edifício e seus vários elementos podem ser considerados sob diferentes aspectos, conforme ilustrado pela figura 7. 25 PATOLOGIA NA CONSTRUÇÃO CIVIL │ UNIDADE I Figura 7. Requisitos de desempenho para edifícios. Controle do som dB Adequação dimensional Chuvas Durabilidade Exclusão de água Força e estabilidade Conforto térmico Iluminação e ventilação Durabilidade Manutenção Conforto térmico Controle do som Proteção contra incêndio Saneamento Controle do som Segurança Preparo de alimento Durabilidade Controle do som Adequação dimensional Durabilidade Custo Serviços Saneamento Força e estabilidade Fonte: Osbourn e Greeno (1997). » Acesso e saída. » Aparência. 26 UNIDADE I │ PATOLOGIA NA CONSTRUÇÃO CIVIL » Durabilidade. » Estabilidade dimensional. » Força e estabilidade. » Exclusão climática. » Controle de som. » Conforto térmico. » Proteção contra fogo. » Iluminação e ventilação. » Saneamento. » Segurança. » Custo. Muitos desses requisitos de desempenho formam a base de demandas estatutárias e não estatutárias que precisam ser atendidas, tanto em relação às novas construções quanto ao uso contínuo das que já existem. Requisitos legais Existem vários requisitos estatutários e não estatutários direcionados àqueles que projetam, constroem, gerenciam, reparam, mantêm, ocupam ou demolem edifícios. Na prática, muitas dessas demandas são feitas em relação à saúde, segurança e bem-estar dessas pessoas. Requisitos do usuário O usuário de um edifício pode esperar viver ou trabalhar em um espaço que satisfaça os requisitos humanos básicos e, além disso, certas necessidades específicas das atividades que estão sendo executadas. As maneiras pelas quais elas são atendidas, e se uma delas está em conflito com a outra, é uma medida de quão apropriada é a construção para a atividade ou atividades em questão. A adequação à finalidade é, portanto, uma medida importante de como um edifício atende aos requisitos de seu usuário. 27 PATOLOGIA NA CONSTRUÇÃO CIVIL │ UNIDADE I Os estudos de requisitos do usuário tentam identificar o objetivo em termos de atividades (as coisas que as pessoas fazem) e as necessidades humanas (físicas, psicológicas, fisiológicas e sociais). Para que um edifício seja adequado ao seu objetivo, deve permitir que seus ocupantes realizem suas atividades de maneira econômica e conveniente, e deve possuir um ambiente satisfatório para se adequar ao usuário. Esse estudo normalmente considera: » Classificação do usuário (por exemplo, orientação da tarefa). » Análise de atividades (por exemplo, interação social). » Requisitos de espaço (por exemplo, circulação dentro e ao redor do edifício). » Condições ambientais (por exemplo, estimulação sensorial). » Implicações estruturais (por exemplo, compatibilidade). » Custo (por exemplo, melhorias). Quando os edifícios são projetados ou adaptados para necessidades específicas, esses requisitos básicos podem ser substituídos ou complementados por considerações adicionais. Eles podem ser de natureza prescritiva e, como tal, podem incluir requisitos sob cabeçalhos específicos (como cargas no piso ou níveis de iluminação). Em tal situação, o estudo das necessidades particulares do usuário ajudará a identificar o que o edifício deve oferecer para satisfazer as atividades do usuário e a necessidade humana. Os requisitos do usuário em um edifício específico podem, às vezes, entrar em conflito com as necessidades estruturais, materiais e/ou ambientais do edifício ou seu conteúdo. Isso pode ser particularmente preocupante ao lidar com edifícios históricos, onde alterações ou adaptações descuidadas podem causar danos irreparáveis tanto na na estrutura do edifício quanto nas qualidades estéticas de seus espaços. Onde existe esse conflito, é importante que as necessidades do edifício e do (s) usuário (s) sejam claramente reconhecidas, a importância do edifício avaliada e as implicações do viés ou compromisso totalmente compreendidas. Expectativas em relação aos edifícios A compreensão dos edifícios é baseada, em grande parte, nas expectativas dos usuários. Quando é necessário considerar o que são edifícios, quais funções eles 28 UNIDADE I │ PATOLOGIA NA CONSTRUÇÃO CIVIL executam e quais falhas eles podem ter, depende muito do que antecipamos em seu design, construção e uso. Algumas dessas informações são inerentes ao próprio edifício, mas muito requer investigação para determinar detalhes e fatos. O “uso” e “tipo” de um edifício específico são frequentemente evidentes na aparência e no desempenho, em que podem ser claramente destacados a seguir: » Agricultura – celeiro. » Comércio – loja, escritório. » Defesa – quartéis ou castelos. » Educação – escolas. » Entretenimento – cinema, teatro, shoppings etc. » Habitação – casa, apartamento etc. » Saúde – hospitais, Santa Casa. » Horticultura – estufa. » Fabricação – fábricas, indústrias. etc. » Navegação – farol, portos etc. » Segurança – penitenciárias. » Interação social – restaurantes. » Viagens – aeroporto, estação ferroviária etc. » Religião – igreja, capela, mesquita etc. Tais classificações trazem consigo certas expectativas, no entanto, ao entender um edifício, é importante estar ciente das mudanças e diferenças do que é percebido como “normal”. Os usos de um edifício podem não ser necessariamente os mesmos para os quais foi projetado e construído, tornando-se muitos e variados. Eles podem mudar à medida que um edifício é alterado ou adaptado; ou dois ou mais usos podemser combinados em um edifício, de modo que um museu ou galeria de arte combine educação e entretenimento, e um restaurante combine comer e discurso social. Os edifícios, no entanto, também precisam ser considerados além do mero tipo, uso e cumprimento de requisitos básicos. Eles podem demonstrar ou representar 29 PATOLOGIA NA CONSTRUÇÃO CIVIL │ UNIDADE I criatividade, oferecer inspiração ou despertar emoções. Eles também podem representar os genius loci ou espírito do lugar, abraçando valores físicos, históricos e estéticos e dando significado e contexto inerentes. Por isso, é necessário, ao tentar apreciar um edifício, entender como ele foi construído e o que o projetista havia planejado alcançar. Um edifício pode, portanto, ser considerado como um ou mais dos seguintes: » Arquitetura. » Arte. » História da arte ou da arquitetura. » Arqueologia. » Recurso de paisagem. » Mercadoria ou unidade econômica. » Investimento financeiro. » Ativo ambiental (ou seja, materiais usados e energia consumida em construção). » Recurso cultural (ou seja, social, político ou econômico). » Símbolo de status ou expressão de riqueza. » Declaração social (por exemplo, moda). » Edifício religioso (por exemplo, catedral, sinagoga). » Símbolo cultural (por exemplo, local sagrado). » Consciência social (por exemplo, campo de concentração ou detenção). » Experiência psicológica. » Monumento. » Máquina funcional (por exemplo, moinho de vento). É importante ressaltar que os edifícios podem desempenhar vários papéis – uma catedral é um edifício, mas também é uma arquitetura. Assim, uma catedral, conforme mostra a figura 8, pode conter arte e também deve ser considerada, pelo menos em parte, como arqueologia. A folhagem de pedra esculpida e as 30 UNIDADE I │ PATOLOGIA NA CONSTRUÇÃO CIVIL hastes de mármore de Purbeck até a porta da Chapter House em Southwell Minster, Nottinghamshire (c. 1290) exibem um novo realismo artístico para o período em combinação com elementos arquitetônicos convencionais. Figura 8. Chapter House em Southwell Minster, Nottinghamshire. Fonte: Osbourn e Greeno (1997). Essas distinções frequentemente artificiais entre construção, arquitetura, arte e arqueologia continuam a ser exploradas por suas respectivas profissões, mas, na prática, muitas vezes, fundem-se, pois os arquitetos são livres para abordar a expressão artística de seu trabalho e os arqueólogos se tornam cada vez mais preocupados com as evidências acima do solo, edifícios e formas construídas. Cada faceta da existência de um edifício reflete e responde a diferentes expectativas e demandas, e se desenvolve ao longo do tempo para formar um assunto complexo e dinâmico que requer estudo detalhado e, muitas vezes, prolongado. Essa é a base para a prática de análise da patologia de construção. O caminho a seguir É claro que, para avaliar a condição de um edifício e tentar entender como ele será executada no futuro, deve-se considerar vários níveis de informação. Antes de tentar definir o que há de errado com um determinado edifício, é essencial considerar, inicialmente, os vários aspectos do projeto e da construção, que possam ter influenciado sua formas de ser executado. 31 PATOLOGIA NA CONSTRUÇÃO CIVIL │ UNIDADE I A consideração de requisitos funcionais, de desempenho, estatística dos usuários e nossas expectativas sobre o que são edifícios, fornecem informações para uma avaliação criteriosa.Mas existem outros níveis de investigação que também precisam ser abordadas. Isso inclui variações regionais de design, seleção e utilização de materiais e métodos de construção. 32 CAPÍTULO 3 Desempenho das construções Por que as construções se levantam? Embora aparentemente óbvio, é fato que os edifícios que permaneceram por um período de tempo não caem, a menos que sejam sujeitos a alguma influência interna ou externa. Determinar como e o porquê um edifício se destaca e avaliar seu desempenho atual e futuro é, portanto, uma questão de identificar e prever essas influências e garantir que as mudanças de condição, forma ou uso não causem uma mudança crítica no que geralmente não é equilíbrio estático. Essas influências e mudanças foram estudadas de perto por Heyman (1997) em relação à construção tradicional de alvenaria, com a conclusão de que é a geometria da estrutura e a forma, e não a força, dos materiais componentes que proporcionam estabilidade geral e de longo prazo – a “regra dos cinco minutos” confirma o sucesso do projeto de construção iniciais, e a “regra dos 500 anos” confirma o cumprimento a longo prazo, dependendo da deterioração dos materiais em causa. Onde ocorre uma mudança e o equilíbrio é destruído, é inevitável que a falha ocorra, conforme mostra a figura 9. Figura 9. Prédio com estrutura em colapso, provocado por alterações estruturais mal concebidas e falta de manutenção. Fonte: TNO (2015). 33 PATOLOGIA NA CONSTRUÇÃO CIVIL │ UNIDADE I A análise de diferentes falhas de construção ou estruturais requer um estudo complexo, muitas vezes chamado de “engenharia forense”, ou “legal”, que tenta identificar o que acontece antes e durante a falha e faz previsões para informar o projeto e a construção de novos edifícios ou a natureza e extensão das intervenções para aqueles que já estão de pé. O desempenho de um edifício é, portanto, de considerável importância e forma a base deste capítulo. Esse desempenho, juntamente com as várias demandas que podem ser implícitas ou impostas pela maneira como o edifício é usado (e abusado), talvez seja a consideração mais crítica na avaliação das condições estruturais e materiais, pois é aqui que os fatores tais como idade, caráter, identidade, história e associação devem ser levados em consideração. Também é necessário reconhecer que os materiais agora estão sendo usados de maneiras diferentes (como explorar configurações estruturais complexas) e em situações diferentes (como níveis de aquecimento aumentados e isolamento térmico e ventilação reduzida) do que antes, e que seu desempenho deve ser ser avaliado à luz dessas mudanças. Os edifícios, portanto, devem ser considerados em vários níveis, os quais refletem as demandas de seus proprietários, ocupantes e usuários, e da sociedade em geral. Eles devem ser entendidos como estruturas individuais e como uma coleção de materiais, muitas vezes, diversos e díspares. Estruturas de construção A construção de edifícios normalmente segue uma série de padrões experimentados e testados, com base no precedente histórico e na necessidade funcional. A estrutura principal de um edifício é, desse modo, formada de alvenaria de suporte de carga ou construção emoldurada, com elementos estruturais (telhados, paredes e pisos) formando o recinto externo, os espaços e subdivisões internos e os componentes sob medida ou pré-fabricados (como tetos), partições, portas, janelas, escadas, acabamentos e acessórios) adicionados conforme necessário. O mobiliário e o conteúdo também podem ser significativos como parte de um conceito geral de design. A introdução dos Métodos Modernos de Construção (MMC) oferece abordagens diferentes para a construção sob a forma de manufatura externa (por exemplo, volumétrica, em painel, híbrida) e manufatura externa (por exemplo, blocos comuns). O uso de módulos, painéis e vagens pré-fabricados requer novas habilidades construtivas, além das de inspeção e teste, e exigirá mudanças no treinamento e nas práticas no local. 34 UNIDADE I │ PATOLOGIA NA CONSTRUÇÃO CIVIL Independentemente do método de construção escolhido ou da complexidade da construção finalizada, existem alguns determinantes importantes para o sucesso da construção, e desconsiderá-los geralmente resulta em maior complexidade do projeto e maior risco de falha. Essencialmente, os elementos estruturais individuais, as conexões entre eles e a montagem dos elementos como um todo devem atender aos seguintes critérios: » Força –capacidade de sustentar cargas sem distorção ou falha indevidas. » Estabilidade – capacidade de permanecer equilibrado. » Rigidez – capacidade de resistir à deformação sob carga. » Equilíbrio – capacidade de atingir um equilíbrio de forças (estática ou dinâmica). » Robustez – capacidade de executar adequadamente os propósitos pretendidos. » Facilidade de manutenção – capacidade de funcionar de acordo com a satisfação dos ocupantes. As formas e métodos de construção, em combinação com a escolha e aplicação de materiais de construção, fornecem novamente uma visão útil dos processos e práticas vigentes no momento do projeto e montagem, e nas subsequentes alterações e mudanças (figura 10). A ala de serviço do Baddesley Clinton, Warwickshire Hospital, foi projetada e construída em 1890 e combina bem com uma mansão medieval, apesar de ter sido construída com blocos de concreto e estruturas de madeira simulada. O estudo e a compreensão deles ajudarão a determinar o desempenho geral e específico e o bem-estar de um edifício. Figura 10. A ala de serviço do Baddesley Clinton, Warwickshire Hospital. Fonte: Norman (1998). 35 PATOLOGIA NA CONSTRUÇÃO CIVIL │ UNIDADE I Algumas perguntas essensiais devem ser formuladas para serem respondidas nessa avaliação, podendo contemplar alguns destaques, como: » Como o edifício foi construído? » Os materiais foram utilizados de maneira convencional ou incomum? » A seleção ou forma de uso de qualquer material indica uma possível falta de oferta preferida? » A forma de construção segue normas nacionais, tradições regionais ou locais? » A construção foi modificada para atender a necessidades específicas? » Uma forma comum de construção foi modificada em resposta a uma possível escassez de um material principal? » Qualquer material ou elemento de construção mostra características específicas ou táticas que hoje seriam erroneamente interpretadas como indesejáveis ou defeituosas? » Existem evidências de práticas inovadoras de construção? » Existem evidências para o uso de sistemas proprietários de construção? Os principais problemas habitacionais por meio de um projeto para melhorar as condições locais e gerar emprego – materiais alternativos de baixo custo, como blocos de solo estabilizados (blocos compactados de solo e cimento ou cal) e telhas de microcimento (argamassa de areia e cimento) – permitem casas a serem construídas com mão de obra local e materiais disponíveis (SCHILDERMAN, 1998). 36 UNIDADE IIO CONTEXTO DA CONSTRUÇÃO CIVIL CAPÍTULO 1 Natureza dos materiais de construção Caracterização dos materiais na construção civil Desde os primeiros usos de lama e argila na formação de crostas e tijolos secos ao sol até a dependência atual de componentes padronizados e produzidos mecanicamente, a construção de edifícios se baseou em materiais para atender a um número limitado de requisitos básicos. A escolha de qual material usar, no entanto, depende de vários fatores, às vezes conflitantes, e cada um sendo definido em uma equação que normalmente tenta equilibrar qualidade, velocidade de construção e custo. Outros fatores que podem influenciar a escolha em maior ou menor grau incluem respostas humanas, como convenções, gosto e moda pessoais e questões práticas, incluindo disponibilidade e qualidade de materiais, mão de obra, transporte, restrições de tempo e imposição de restrições, regulamentos e tributação. Os próprios edifícios são, geralmente, compostos por várias combinações de materiais, reunidas de maneiras que são derivadas das práticas tradicionais ou da inovação contemporânea, como podemos perceber na figura 11. 37 O CONTEXTO DA CONSTRUÇÃO CIVIL │ UNIDADE II Figura 11. Combinações de materiais de construção tradicionais e práticas de construção. Fonte: Schilderman (1998). Com exceção de um número relativamente pequeno de substituições ou inovações modernas, esses materiais permaneceram constantes por várias centenas de anos e são tipicamente derivados de fontes naturais que são usadas no estado reconhecível original (pedra, madeira) ou modificadas por um ou mais processos para satisfazer os requisitos do cliente, designer, construtor ou regulador (tijolo, vidro). No caso do concreto, o material pode combinar qualidades estruturais e estéticas. Entendendo os materiais de construção Compreender a natureza e as limitações dos materiais de construção tradicionais e, portanto, como eles foram usados e como se comportam no contexto do ambiente construído, requer, no mínimo, uma consciência da ciência básica dos materiais. Os aspectos químicos e físicos deste assunto são abordados por diversos autores, que destacam a atenção para várias propriedades que caracterizam a durabilidade e o desempenho dos materiais de construção tradicionais. Todos os materiais são constituídos por unidades fundamentais (átomos, moléculas, íons) que se comportam de uma maneira geralmente reconhecida em relação aos princípios conhecidos da química e da física. Tais princípios explicam as propriedades e o comportamento de elementos e compostos químicos, as forças 38 UNIDADE II │ O CONTEXTO DA CONSTRUÇÃO CIVIL que unem substâncias e as reações que levam à deterioração do material e eventual deterioração. Esses termos podem ser definidos das seguintes maneiras: » Elemento – substância que não pode ser decomposta em substâncias mais simples. » Composto – substância formada pela combinação de elementos em proporções. » Átomo – a menor parte de um elemento que pode existir, consistindo de um núcleo denso de prótons e nêutrons cercados por elétrons em movimento. » Molécula – a unidade estrutural mais simples que exibe a característica das propriedades físicas e químicas de um composto. » Íon – átomo ou grupo de átomos que perderam um ou mais elétrons produzindo carregou positivamente (cátion) ou ganhou um ou mais elétrons, tornando-o carregado negativamente (ânion). » Ligação química – forte força de atração baseada na transferência ou compartilhamento de elétrons que mantêm átomos juntos em uma molécula. » Reação química – alteração na qual um ou mais elementos químicos ou compostos formam novos compostos. A durabilidade (taxa de deterioração) e o desempenho de um material são determinados por vários fatores que se relacionam diretamente com alguns princípios, em que se destacam: » Densidade – massa de substância por unidade de volume. » Porosidade – razão entre o volume de vazios e o volume total de um material. » Permeabilidade – extensão em que um material permitirá que uma substância passe através dele. » Absorção – penetração de uma substância, como a água, no corpo de outra. Ou ainda, formação de uma camada de uma substância na superfície de outra. » Resistência (por exemplo, compressão, tensão, flexão). 39 O CONTEXTO DA CONSTRUÇÃO CIVIL │ UNIDADE II » Propriedades térmicas (por exemplo, condutividade, temperatura de transição vítrea). » Propriedades acústicas (por exemplo, transmissão, isolamento acústico). » Resistência ao gelo. » Teor de sal solúvel. » Resistência química. » Resistência ao fogo. » Suscetibilidade à deformação – por cargas aplicadas; movimentos causados por alterações no teor de umidade; movimento causado por mudanças de temperatura; tensões devido às mudanças térmicas e de umidade; defeitos comuns devido aos movimentos e à sua prevenção. » Suscetibilidade à deterioração – corrosão de metais; luz do sol; agentes biológicas (por exemplo, fungos, insetos, vegetação); água; cristalização de sal; ação de geadas; ação química; perda de voláteis. » Abrasão – desgaste ou remoção da superfície de um material sólido devido ao movimento relativo de outro em contato com ele: › impacto – aplicação repentina de uma carga em um material; › vibração – movimento contínuo e rápido; e › fogo. » Defeitos naturais e de produção. » Aparência. Fontes de materiais de construção A maioriados materiais de construção é derivada de fontes naturais governadas por localização geográfica e geológica, além de condições locais (clima, exposição). Esses materiais, portanto, têm uma afinidade com seu local de origem e exercem uma influência importante na aparência e durabilidade de edifícios e estruturas há centenas de anos. 40 UNIDADE II │ O CONTEXTO DA CONSTRUÇÃO CIVIL A identidade visual de tais edifícios, que tão facilmente distingue uma parte do país da outra, também está presente na maneira como esses materiais são reunidos para formar edifícios de eficiência e uso prático. Tais qualidades fazem parte de nossa grande tradição vernacular de construção e merecem ser respeitadas nos edifícios de hoje. Embora a maioria dos materiais de construção tradicionais tenha vindo de fontes locais do edifício em construção e, portanto, relativamente fáceis e baratos de transportar, há ocasiões em que os materiais foram trazidos de outras partes do país ou mesmo do exterior. Tais “importações” eram normalmente usadas quando não havia materiais locais adequados disponíveis, onde um suprimento era facilmente obtido ou a moda ditava seu uso. O fornecimento e o uso de materiais também podem ser entendidos pela influência de preocupações sociais, econômicas e políticas mais amplas. A escassez de materiais e de mão de obra qualificada após a Segunda Guerra Mundial e, mais recentemente, a crise energética do início da década de 1970, levaram a mudanças na maneira como os edifícios foram projetados, construídos e utilizados. Essa reação a eventos nacionais e internacionais, sem dúvida, continuará a influenciar como, onde e quando os edifícios são construídos, particularmente com referência às preocupações atuais em torno da transferência de tecnologias, crescente demanda por moradias, mudanças climáticas, eficiência energética e questões de sustentabilidade global. Também houve preocupação com as atuais lacunas de habilidades no setor de construção, nas quais a desqualificação, uma ênfase crescente na montagem, e não na construção, e a falta de oportunidades de treinamento no local levaram a uma redução na mão de obra qualificada. Isso é particularmente prevalente no setor do patrimônio, em que as habilidades artesanais tradicionais e as associadas ao fornecimento de materiais adequados estão em declínio. A reutilização de materiais ou componentes de construção individuais, que pode ser considerada uma resposta do final do século XX às demandas de conservação e sustentabilidade, é praticada há muitos séculos. O tijolo romano reciclado pode, por exemplo, ser visto em muitos edifícios medievais situados perto de assentamentos anteriores, enquanto o roubo e o resgate de materiais, como pedra e madeira, de casas religiosas após a dissolução dos mosteiros no século XVI, ajudaram no construção de muitas propriedades pós-dissolução. 41 O CONTEXTO DA CONSTRUÇÃO CIVIL │ UNIDADE II Mais tarde, nos séculos XVII e XVIII, a reutilização foi positivamente incentivada e até estipulada em contratos de construção (CASSAR, 1995), enquanto que, nos séculos XIX e XX, edifícios inteiros foram, por vezes, desmontados, movidos e reerguidos para satisfazer indivíduos, demanda ou consciência social, conforme mostra a figura 12. Figura 12. O Old Wellington Inn, com estrutura de madeira medieval e Sinclairs do século XIX, em Manchester, após extensos danos provocados por bombas em prédios adjacentes, em 1996. Fonte: Cassar (1995). Os materiais usados em um edifício fornecem, assim, uma visão útil dos processos e práticas vigentes no momento de seu projeto e construção, e em alterações e alterações subsequentes. O estudo e a compreensão dos materiais individuais e combinados ajudarão a formar uma imagem geral do desempenho do edifício e quais medidas devem ser tomadas para garantir seu bem-estar no futuro. Para obter esse entendimento, alguns questionamentos podem ser elaborados: » Os materiais de construção são de origem local? » Existe uma pedreira perto do local? » Existem evidências de fossas e fornos usados na fabricação de cal, tijolos, azulejos etc.? › quais são as espécies arbóreas predominantes? » Qual a fonte dos materiais (britânicos, continentais, exóticos)? 42 UNIDADE II │ O CONTEXTO DA CONSTRUÇÃO CIVIL » Qual a conexão entre a fonte e o sítio (real, monástico, comércio)? » Como o material foi levado ao local (bens primários, produtos secundários bens, lastro)? » Existe evidência do comércio restante (edifícios, documentos)? » Quais processos acompanharam o uso dos materiais? » Os materiais importados estavam em estado final ou bruto? » Os materiais foram finalizados dentro ou fora do local (pátios para molduras de madeira)? › quais eram as habilidades artesanais necessárias? Para desenvolver um entendimento do uso e desempenho dos materiais utilizados na construção e acabamento de edifícios, é importante compreender as origens e características daqueles que são mais comumente usados em edifícios tradicionais – madeira, material vegetal, pedra, cerâmica, ligantes e concreto, metais, vidro e produtos betuminosos. 43 CAPÍTULO 2 Categorias dos materiais de construção A madeira na construção civil Tradicionalmente, a construção e o acabamento de edifícios fazem uso de muitas espécies de madeira, derivadas das grandes árvores nativas de diferentes regiões. O tipo de madeira, nativa ou estrangeira, e as maneiras que são usadas são dependentes da idade, localização, qualidade e função do edifício. A madeira é definida como uma mistura compacta dura de celulose, hemicelulose e lignina, formando uma estrutura celular que constitui a maior parte do tronco ou fuste de uma árvore: » Celulose – polissacarídeo cristalino constituído por uma estrutura de cadeia longa não ramificada de unidades de glicose. É responsável por fornecer rigidez da parede celular e representa aproximadamente 45-60% do peso seco da madeira. » Hemicelulose – polissacarídeo semicristalino que consiste em uma menor estrutura de cadeia. Representa, aproximadamente, 10–25% do peso seco da madeira. » Lignina – um polímero orgânico amorfo complexo depositado dentro da celulose de paredes celulares de plantas. A lignificação torna as paredes lenhosas e, portanto, rígidas. Representa, aproximadamente, de 20 a 35% do peso seco da madeira. Maior proporção presente em madeiras macias do que em madeiras duras. O tronco de uma árvore é constituído por: casca externa, casca interna ou fibra, madeira de carvalho, cerne e medula, conforme verificado abaixo. Figura 13. Seção de corte transversal do tronco de uma árvore. Casca externa Casca interna ou fibra Câmbio Alburno Cerne Medula Fonte: Boniface (1998). 44 UNIDADE II │ O CONTEXTO DA CONSTRUÇÃO CIVIL Entre a casca interna e o alburno, encontra-se o câmbio, que se divide, geralmente a cada ano, em climas temperados, para formar anéis de crescimento com uma camada de floema ou fibra (tecido que conduz os materiais alimentares das regiões onde são produzidos, como as folhas, para os pontos de crescimento) no exterior e uma camada de xilema (tecido que transporta água e nutrientes minerais dissolvidos) ou madeira nova no interior. O cerne, que consiste em células de xilema mortas, as quais são fortemente espessadas com lignina, fornece o principal suporte estrutural para a árvore. É tipicamente mais durável e resistente ao ataque de fungos devido à presença de óleos, gomas, resinas e extrativos (como taninos em carvalho) e pouca glicose ou amido livre. O alburno, que se consiste nas células vivas do xilema que transportam a seiva para as folhas, é mais poroso que o cerne e normalmente é mais suscetível ao ataque de fungos e insetos. As árvores vivas normalmente retêm entre 100 e 200% de umidade nas células que compõem a estrutura da madeira. Cerca de 25 a 30% disso é quimicamente ligada e o restante está presente nascélulas e outras cavidades. À medida que a madeira seca, essa umidade característica é perdida até que apenas a umidade ligada às paredes das células permaneça. Isso é chamado de “ponto de saturação da fibra”. A perda adicional de umidade resulta em encolhimento das paredes celulares e da madeira, enquanto a adição de umidade (em parte devido à natureza higroscópica da celulose) causará um inchamento correspondente na madeira. A madeira assumirá, portanto, um “teor de umidade de equilíbrio” em relação ao seu ambiente. Produtos modernos de material vegetal O crescente interesse em edifícios “verdes” e sustentáveis levou a um suprimento correspondente de materiais de construção naturais que podem oferecer uma alternativa realista à produção de produtos artificiais produzidos em massa com uso intensivo de energia. Isso inclui o uso de palha em novos edifícios (BONIFACE, 1998). Atualmente, a demanda está sendo atendida por um número pequeno, mas crescente, de fornecedores que oferecem alternativas aos produtos atuais e novas formas de construção. Tais usos para material vegetal incluem a produção de tábuas e blocos de palha compactados e a construção de fardos de palha (figura 14). 45 O CONTEXTO DA CONSTRUÇÃO CIVIL │ UNIDADE II Figura 14. A Spiral House, no condado de Mayo, na Irlanda, é a primeira casa de fardos de palha com dois andares da Europa, e foi construída em 2000. Fonte: Boniface (1998). A pedra na construção civil Para entender como as pedras de construção reagem e respondem aos mecanismos de deterioração e decadência, é necessário, primeiro, avaliar o que são esses materiais e como eles foram formadas. Portanto, é essencial estar ciente da geologia (estudo da crosta e estratos da Terra) e da petrologia (estudo da origem, estrutura e composição das rochas) das rochas-mãe. As rochas podem ser classificadas por seus termos geológicos, com base na época e no período em que foram formadas. Uma abordagem integrada à classificação deve ser baseada na descrição, em vez de atributos interpretados, e é apresentada em quatro volumes, cobrindo rochas ígneas, rochas metamórficas, sedimentos e rochas sedimentares, solo artificial e depósitos superficiais naturais. Produtos modernos em pedra A pedra artificial ou reconstituída fornece uma alternativa econômica ao uso da pedra natural, tanto para novas construções quanto para o reparo de edifícios existentes. Essa pedra é tipicamente moldada como uma mistura de pó de pedra, agregados naturais e cimento, e usada como um bloco sólido ou 46 UNIDADE II │ O CONTEXTO DA CONSTRUÇÃO CIVIL como revestimento de um material de suporte, como concreto. A ardósia e o mármore reconstituídos baseiam-se em grânulos ou lascas do material original, juntamente com cargas e resinas. A cerâmica na construção civil O termo “cerâmica” (do grego keramos, que significa “material queimado”) descreve tanto o uso de argila plástica bruta quanto os produtos manufaturados resultantes e pode se referir a produtos de argila (como tijolos, ladrilhos e tubos) ou produtos de cerâmica (como terracota, faiança, majólica, louça de barro, porcelana vítrea, grés, porcelana e porcelana de ossos). A figura 15 mostra um exemplo de aplicação de cerâmica em construção. Figura 15. A fachada do Instituto Memorial Wedgwood em Burslem, Staffordshire, foi projetada após uma competição baseada no uso de cerâmica decorativa. Fonte: Middleton (1991). Cada peça se baseia no uso de certas argilas (primárias ou secundárias) e outros materiais, métodos de preparação, temperaturas de queima e acabamentos específicos. O termo pode, em certas circunstâncias, também se referir a argamassas não queimadas, rebocos, daubs, blocos de barro e concreto (MIDDLETON, 1991). As argilas usadas na fabricação de cerâmica, muitas das quais proporcionam cores características aos tijolos e ladrilhos regionais, são compostas de sílica (40 a 65%) e óxido de alumínio (alumina) (10 a 25%), com várias impurezas, incluindo compostos de ferro, magnésia, potássio, refrigerante, limão e enxofre. 47 O CONTEXTO DA CONSTRUÇÃO CIVIL │ UNIDADE II Essas argilas são tipicamente extraídas de pedreiras ou poços, preparadas, misturadas (se necessário), moldadas (ou extrudadas mecanicamente ou pressionadas), secas e cozidas para criar a unidade básica. Construção de barro e terra Argila e terra são usadas na construção de edifícios há muitos séculos. As variações regionais são particularmente importantes e têm recebido crescente interesse nos últimos anos. As principais técnicas utilizadas na formação de paredes de suporte são: » Espiga – feita de argila, palha e agregado, e construída sem fechar os elevadores, geralmente fora de um pedestal de alvenaria. Encontrado principalmente no sudoeste da Grã-Bretanha, mas também nas Midlands Orientais (paredes de barro) e Cumbria (barro). » Nódulo de argila – bloco moldado não queimado de giz, argila e palha encontrado particularmente em East Anglia, do final do século XVIII ao início do século XX. O termo “adobe” é usado em outros países (como Espanha, México e América do Norte) para descrever uma forma semelhante de construção. » Clom – uma técnica local do País de Gales baseada em uma mistura de argila, agregados e palha de trigo picada (ou palha, junco, samambaia, musgo ou pelo de animal) depositada em camadas sobre um pedestal de alvenaria e aparada para um acabamento amassado. » Piso de terra – introduzido no final do século XVIII, pela Continental Europa, e formado pela compactação de camadas de terra seca adequada entre as persianas. Também conhecido como terra batida. » Giz puxado ou massa de lama de giz – uma mistura de giz macio e argila usada tanto com cofragem ou como blocos pré-fabricados em áreas de depósitos naturais de giz. » Argila com veneziana – semelhante ao pisé, mas usando giz, argila e palha. Encontroado particularmente em East Anglia. 48 UNIDADE II │ O CONTEXTO DA CONSTRUÇÃO CIVIL » Witchert – uma mistura de terra e palha construída a partir de um pedestal sem cofragem. Argila e terra também podem ser usadas para formar painéis entre os membros das estruturas externas ou internas da parede de madeira. Essas técnicas, que têm variações regionais distintas, incluem: » Preenchimento a pique – preenchimento à base de argila acumulado em torno de pregos finos em edifícios. » Lama e viga – estrutura de madeira leve completamente coberta com uma lama espessa, usado particularmente durante o final do século XVII e início do XVIII na Europa. » Acácia e pique – forma comum de preenchimento com pique à base de argila ou limão aplicado em paus ou palhinhas flexíveis, tecidos em torno de pautas verticais. Tais formas de construção normalmente dependem da proteção de um pedestal de alvenaria, beirais pendentes, revestimentos de parede porosos (gesso, reboco) e acabamentos de superfície adequados (lavagem com sujeira). Argilas e terras, muitas vezes com areia, cascalho e outros materiais inertes, também foram usadas para formar pisos baratos e funcionais ao longo da história. Geralmente, são encontrados em salas e espaços de prédios antigos que não têm tráfego intenso e não são propensos a molhar, e são geralmente batidos ou compactados para obter um acabamento suave e compacto. Produtos cerâmicos modernos Os modernos produtos e práticas de cerâmica (alvenaria reforçada, alvenaria pré-montada, tijolos e blocos de concreto, alvenaria de face justa) fornecem materiais alternativos e específicos para construção e acabamento. Certos materiais históricos, como argila e terra, também estão sendo usados em um contexto moderno para fornecer formas de construção econômicas e ambientalmente sustentáveis. Blocos de solo estabilizados, formados pela compressão de uma mistura de solo e cimento ou cal em moldes, estão sendo usados em vários países ao redor do mundo para fornecer um material de baixo custo paraformas simples de construção. 49 O CONTEXTO DA CONSTRUÇÃO CIVIL │ UNIDADE II Ligantes O termo “aglutinante” descreve os materiais usados para formar a matriz de cimentação em argamassas e rebocos, que normalmente são derivados de cal, gesso ou cimentos artificiais. Esses aglutinantes são misturados de forma manual ou mecânica em areias e agregados, ou com outros materiais, para fornecer um produto viável que pode ser usado entre as unidades de alvenaria, como acabamento aplicado a paredes e tetos, para moldagem e execução de decoração e para formar pisos de gesso. Outros aglutinantes, como argila e betume, também podem ser usados para aplicações específicas. O concreto, por comparação, refere-se a uma mistura de ligante (cal ou cimento) com areias e outros agregados para formar um material amorfo capaz de ser utilizado, com ou sem reforço, em uma variedade de aplicações estruturais e não estruturais. A proporção de ligante em agregados e a quantidade de água usada em uma mistura de argamassas, acabamentos de superfície ou concreto são derivadas da prática ou do projeto para garantir que todas as partículas sejam revestidas e os vazios sejam preenchidos. Isso garante que o produto final seja econômico e durável. A cal utilizada na construção e no acabamento dos edifícios é derivada da queima de calcário, giz ou outras fontes de carbonato de cálcio (coral, conchas do mar). O óxido de cálcio resultante ou cal rápida é absorvida com água para formar hidróxido de cálcio, que, em uso, absorve o dióxido de carbono da atmosfera para se transformar em carbonato de cálcio. Esse ciclo de produção e uso de cal é melhor explicado pelas equações 1, 2 e 3. Queima: carbonato de cálcio + calor (950◦C) → óxido de cálcio + dióxido de carbono. CaCO3 + calor → CaO + CO2 (Equação 1) Reduzição: óxido de cálcio + água → hidróxido de cálcio. CaO + H2O → Ca(OH)2 (Equação 2) Carbonatação: hidróxido de cálcio + dióxido de carbono → carbonato de cálcio + água. Ca(OH)2 + CO2 → CaCO3 + H2O (Equação 3) Onde os calcários predominantemente argilosos ou siliciosos são queimados e reduzidos a pó, a cal hidráulica natural resultante (NHL) tem a capacidade de endurecer sob a água. Uma cal hidráulica (HL) é produzida pela mistura de materiais que consistem em hidróxido de cálcio, silicatos de cálcio e aluminatos de cálcio, e também pode endurecer sob a água. 50 UNIDADE II │ O CONTEXTO DA CONSTRUÇÃO CIVIL O dióxido de carbono atmosférico contribui para o processo de endurecimento em ambos os casos. Tais limas têm sido amplamente utilizadas ao longo da história em obras gerais de construção e engenharia. A classificação da ação hidráulica relacionada ao teor de argila – fracamente hidráulica (0–8%), moderadamente hidráulica (8–18%) e eminentemente hidráulica (18–25%) - foi substituída por um sistema baseado na resistência à compressão após 28 dias. Aglutinantes artificiais à base de cal hidráulica e mástiques ou cimentos patenteados de petróleo tornaram-se populares durante os séculos XVIII e XIX, normalmente para uso como rebocos e estuques e, geralmente, imitando pedras mais caras. O cimento romano de Parker (baseado na queima de calcário argiloso e patenteado em 1796) foi comumente usado até a ampla aceitação do cimento Portland, no início do século XIX, enquanto a mástique de Dehl (patenteada em 1815) e a mástique de Hamelin (patenteada em 1817) foram igualmente aplicadas para formar acabamentos de parede atraentes e duráveis. O cimento Portland, nomeado devido à sua suposta semelhança de cor com a pedra Portland, foi patenteado por Joseph Aspdin, em 1824, e tornou-se quase universal em sua aplicação como ligante e na formação de concreto. A química do cimento é complexa, mas, em princípio, baseia-se na reação de quatro compostos principais derivados da argila ou xisto e calcário ou giz (silicato tricálcico, silicato bicálcico, aluminato tricálcico e aluminino ferrite tetracalcium) com água. Esse processo de hidratação leva à formação de uma pasta alcalina que endurece lentamente com a formação de produtos cristalinos (etringita, hidrato de silicato de cálcio, aluminato tricálcico, hidróxido de cálcio) entre os grãos de cimento (equação 3.3 usando notação de cimento). Silicato tricálcico + água → hidrato de silicato de cálcio + hidróxido de cálcio. 2C3S + 6H → C3S2H + 3CH (Equação 4) Silicato dicálcico + água → hidrato de silicato de cálcio + hidróxido de cálcio. 2C2S + 4H → C3S2H3 + CH (Equação 5) Variações do cimento Portland, baseadas em proporções diferentes dos quatro compostos acima, incluem cimentos Portland comuns, de endurecimento rápido, ultra-alta resistência precoce, resistentes a sulfatos e de baixo calor. Outros tipos de cimento incluem cimento branco, cimento de alvenaria, cimento de alto-forno Portland, cimento super sulfatado e cimento de aluminato de cálcio (alta alumina). 51 O CONTEXTO DA CONSTRUÇÃO CIVIL │ UNIDADE II O gesso (sulfato de cálcio hidratado) também tem sido usado historicamente como um ligante para rebocos internos e, principalmente, para decorações moldadas devido ao seu tempo de endurecimento mais rápido em cal . Como o gesso pode ser queimado a uma temperatura mais baixa que a cal, é frequentemente preferido em países onde o combustível é escasso. Concreto O concreto inicial usado na construção romana era formado como um agregado de pozzolana, areia, cascalho e material de entulho e depositado em uma matriz de argamassa de cal. Esse material era tipicamente usado em fundações, como material de enchimento na construção de alvenaria e também na formação de arcos, cúpulas e abóbadas. O desenvolvimento e uso da construção moderna de concreto começou, no entanto, com o trabalho de Joseph Aspdin, no final do século XVIII, e o patenteamento do cimento Portland, em 1824. O concreto tem boa resistência à compressão, mas é relativamente fraco em tensão e requer reforço para que possa suportar forças de tração. O reforço básico foi adicionado a partir do início do século XIX. As patentes incluíam barras de ferro forjado (1818), construção de piso usando vigas de ferro e preenchimento de concreto (1844), uso de malha de ferro (1848), construção à prova de fogo usando concreto reforçado com cabos de aço (1854) e uma forma básica de concreto armado (1855). Mas não foi até o início do século XX que o “concreto armado”, desenvolvido por François Hennebique e combinando as qualidades do reforço de concreto e aço, foi reconhecido e adotado por arquitetos e engenheiros. A primeira casa de concreto registrada foi construída em Swanscombe, em 1835, enquanto o primeiro grande edifício de concreto armado foi a fábrica da Weaver & Company, em Swansea (1897-98). Outros exemplos de inovações precoces usando concreto incluem o Royal Liver Building, em Liverpool (1908), os telhados da Gare de Bercy, em Paris (1910), e Jahrhzunderthalle (Centenary Hall), em Wroclaw, Polônia (1911-13). Atualmente, o concreto pré-tensionado (pré-tensionado ou pós-tensionado), desenvolvido pela Eugène Freyssinet, na década de 1920, é comumente usado para aplicações em construção e engenharia. A construção em concreto pré-moldado, usada para membros estruturais, painéis de revestimento e unidades individuais de construção, foi adotada de maneira semelhante nos primeiros anos do século XX e se tornou difundida tanto para aplicações de construção quanto de engenharia. 52 UNIDADE II │ O CONTEXTO DA CONSTRUÇÃO CIVIL Ligantes e concreto modernos Os materiais básicos de cal e cimento artificial (normalmente Portland) continuam como os principais ligantes na construção de edifícios, enquanto o uso de limas hidráulicas e não hidráulicas para reparo e manutenção de edifícios tradicionais e históricos recebe apoio renovado quanto mais se souber sobre a importância da construção “suave” e a permeabilidade ao vapor de água. Diferentes formas de pozzolana, como
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