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J. S i d l o w B axter examinai as escrituras G ê n e s i s - J o s u é examinai as escrituras examinai as escrituras J. S i d l ow Ba x t e r Tradução de Neyd Siqueira ® J. Sidlow Baxter Título do original: Explore the Book 1? edição: 1992 Reimpressão: 1997 Direitos reservados por Sociedade Religiosa Edições Vida Nova, Caixa Postal 21486, São Paulo-SP. 04602-970 Proibida a reprodução por quaisquer meios (mecânicos, eletrônicos, xerográficos, fotográficos, gravação, estocagem em banco de dados, etc.), a não ser em citações breves, com indicação de fonte. Printed in Brazil / Impresso no Brasil Revisões • Lucy Yamakami e Valéria Fontana Coordenação de produção • ROBINSON MALKOMES CONTEÚDO D E D IC A T Ó R IA .................................................................................. 6 PREFÁCIO DO A U T O R .................................................................... 7 PREFÁCIO À EDIÇÃO EM PO R T U G U Ê S................................... 8 INTRODUÇÃO .................................................................................. 9 PRELIMINARES ............................................................................... 15 O LIVRO DE GÊNESIS .................................................................... 23 Lições 1, 2, 3 e 4 O LIVRO DE ÊXODO ....................................................................... 71 Lições 5, 6, 7 e 8 O LIVRO DE L E V ÍT IC O ......................................................................109 Lições 9,10, 11 e 12 O LIVRO DE NÚMEROS ...................................................................153 Lições 13,14, 15 e 16 O LIVRO DE DEUTERONÔMIO ....................................................207 Lições 17, 18 e 19 O LIVRO DE J O S U É ........................................................................... 235 Lições 20, 21, 22 e 23 DEDICATÓRIA Estes estudos são dedicados com profunda gratidão e estima a meu caro, santo e agora idoso amigo, JAMES ARTHUR YOXALL, de Ashton-under-Lyne e Stalybridge; meu “pai” espiritual e talentoso mestre nas coisas preciosas de Cristo; inspirador de muitos anseios celestiais dentro em mim, o primeiro a plantar em meu jovem coração o interesse pelo estudo bíblico, que sempre foi, a meu ver, o cavalheiro cristão ideal, o mais excelente dos pregadores e, acima de tudo, um amigo bondoso e experiente, refletindo continuamente o amor de Jesus Cristo que a todos santifica. PREFACIO QUASE todas as seções compreendidas neste curso bíblico foram aprensentadas em minhas palestras bíblicas das noites de terça-feira na Capela Charlotte de Edimburgo, justificando assim sua forma em tom de conversa, em certas partes. Não são ensaios escritos, mas foram palestras preparadas para serem proferidas em público, e julguei mais acertado deixá-las em seu molde original, acreditando que há certas vantagens práticas nisso. Peço que sejam tolerantes neste aspecto, especialmente se os olhos exigentes de algum conhecedor ou diletante literário passarem por sobre as mesmas em sua forma impressa agora estabelecida. Além do mais, em vista de estes estudos terem sido preparados sem intenção de serem publicados mais tarde, tomei em várias partes a liberdade permitida a um pregador, mas não a um escritor, apropriando-me dos escritos de outros. Só espero que minha admiração não me tenha levado a aproximar-me demais da ameaçadora fronteira do plágio. Se isso aconteceu, sinto-me aliviado com a certeza de que só pode ter sido em relação a autores que não estão mais conosco. Minha gratidão jamais será excessiva para com o caro John Kitto, de tempos idos (e, para muitos, obsoleto), John Urquhart, A.T. Pierson, Sir Robert Anderson, G. Campbell Morgan e outros da mesma tradição evangélica. Todos eles foram mestres em seus dias e a seu próprio modo. A todos eles, e a essa incomparável obra composta, o Pulpit Commentary, (Comentário de Púlpito) reconheço minha dívida permanente e presto minha homenagem. Entretanto, no todo, este curso bíblico é basicamente resultado de meu estudo pessoal, e aceito de bom grado a responsabilidade pelo mesmo, crendo que dá verdadeira honra à Bíblia como a Palavra de Deus inspirada, em cada uma de suas seções. Que Deus possa empregá-lo graciosamente em um ministério útil para muitos que vivem e trabalham na seara de seu amado Filho, nosso Senhor e Salvador. J. S. B. 7 PREFÁCIO À EDIÇÃO EM PORTUGUÊS A obra aqui intitulada EXAMINAI AS ESCRITURAS é a primeira parte de uma coleção de seis volumes (dos quais já foram publicados os volumes 5 e 6, relativos ao Novo Testamento). Esta coleção surgiu em decorrência do desejo do Pastor J. Sidlow Baxter de oferecer, com lições atraentes e práticas, um conhecimento bíblico básico aos membros da Capela Charlotte, em Edimburgo, na Escócia. O autor teve a feliz idéia de preparar seus estudos de um modo completo para os membros daquela igreja, começando com Gênesis e terminando em Apocalipse, sem escrever apenas mais um comentário. O autor lança um alicerce agradável e seguro para aquele que deseja apresentar-se como obreiro (ou membro da igreja) “que não tem de que se envergonhar, que maneja bem a palavra da verdade” (2 Tm 2.15). Neste volume, o Pastor Baxter discorre sobre temas palpitantes contidos no Pentateuco e em Josué. Ele apresenta uma abordagem bastante prática, com várias aplicações espirituais dos eventos, lugares e pessoas que compõem a história narrada por estes livros. Destaque deve ser dado ao estudo dos tipos e antítipos que se encontra praticamente em todas as lições deste volume. Em textos sempre práticos e bastante assimiláveis, Baxter oferece incontáveis informações muito iluminadoras àqueles que têm somente idéias acerca do Pentateuco e de Josué. Temos convicção de que a popularidade gozada por esta obra em inglês será a mesma que se verificará na sua edição em português. Dentro de pouco tempo, Edições Vida Nova estará colocando à disposição do público leitor os outros volumes desta série, que se relacionam com o Antigo Testamento. Os Editores 8 INTRODUÇÃO HOMEM ALGUM completa sua educação se não conhece a Bíblia. Não há ministro cristão realmente qualificado para o ministério da igreja cristã que não tenha feito um estudo em profundidade das Escrituras. O obreiro cristão não pode ser realmente eficaz sem um conhecimento anterior da Bíblia. Crente algum pode ter uma vida realmente cristã sem uma compreensão adequada desse livro santo. Nosso propósito Nosso objetivo neste estudo bíblico é fornecer um alicerce nas Escrituras. Sejamos sinceros e claros desde o início. Se realmente quisermos conhecer melhor a Palavra de Deus, este curso irá ajudar-nos. Nosso empenho foi manter o mesmo padrão de eficácia nele todo. Queremos enfatizar, porém, que não basta ler os estudos que se seguem em lugar da Bíblia, pois isso iria invalidar todo o propósito que temos em vista. O que desejamos é que a própria Bíblia seja lida, parte por parte, cada uma delas várias vezes, e o presente plano de estudos utilizado em conjunto. Mesmo que as próximas lições sejam lidas com todo cuidado, se isso for feito sem o estudo paralelo da Bíblia, o verdadeiro fascínio do estudo bíblico ficará perdido. Nossa esperança é de que alguns que não tenham ainda estudado a Bíblia inteira se decidam a dedicar determinadas horas de seu tempo disponível a cada semana para começar no livro de Gênesis e examinar gradualmente toda a Bíblia, livro por livro, conforme a orientação deste curso de estudo bíblico, utilizando a ajuda fornecida aqui em cada estágio. Muitos cristãos de hoje tendem a ler a Bíblia somente para tomar conhecimento de alguns bons pontos ou sugestões para apresentá-los em reuniões ou preparar sermões, ou ainda para a prática da vida cristã. Isso é errado e resulta em fragmentação. Esse método produz superficialidade tanto mental como espiritual. A Palavra de Deus jamais teve como propósito essas consultas apressadas.Precisamos estudar e conhecer essa palavra como um todo, pois estudo e conhecimento aprofundam, 9 EXAMINAI AS ESCRITURAS en riq u ecem e ap erfe iço am todo o nosso m in is té r io p ú b lico , fundamentando nossa experiência cristã no seu todo. Além disso, gostaria de lembrar os companheiros de pregação que os sermões mais excelentes geralmente surgem quando estudamos a Palavra de Deus em busca de sua verdade vital e não pela necessidade de encontrarmos um sermão. Este curso de estudo bíblico não tem como finalidade apresentar sugestões para discursos e sermões — embora seja provável que repetidamente isso venha a acontecer, se estudado em conjunto com a Bíblia. Seu propósito é fornecer uma base prática para o conhecimento bíblico como um todo. E bom lembrar que os sermões ou livros que mais nos afetam no momento em que os lemos ou ouvimos em geral nos deixam pouco de valor permanente, enquanto, por outro lado, os que mais nos ensinam talvez não nos estimulem de imediato. À parte de qualquer interesse superficial do momento, tal como preparar mensagens ou buscar orientação em alguma crise, devemos nos determinar a obter uma boa compreensão do livro de Deus; pois conhecê-lo bem dá uma qualidade ao nosso serviço cristão que nenhuma outra coisa pode dar, e isso nos será proveitoso por toda a vida. Todo ministro e obreiro cristão deve ser um especialista na Bíblia. Nosso método Devemos introduzir aqui algumas palavras sobre o nosso método. A Bíblia é um livro sem fim, e são tantos os meios de estudá-la que, ao iniciar este curso, lembramo-nos do marinheiro que, quando lhe perguntaram para onde ia, respondeu: “Senhor, estou limitado ao oceano!” O esplêndido conteúdo da Bíblia está diante de nós como um imenso oceano, mas não queremos navegar sem direção, pois então não iremos a parte alguma! Precisamos do mapa e da bússola de um método definido, a fim de podermos navegar por esses gloriosos mares sem desvios inúteis para a direita ou para a esquerda. M uito depende de nosso m étodo de estudo. Segundo a nossa preferência, podemos estudar os livros da Bíblia de modo espiritual, histórico, tipológico, tópico, profético, dispensacional, analítico, biográfico, crítico, devocional ou outros. O método que adotamos na 10 INTRODUÇÃO presente série é aquele que chamaremos de interpretativo. Então, vamos estudar de m aneira in terp re ta tiva os livros da Bíblia; ou seja, procuraremos captar o pensamento predominante, o significado e a mensagem de destaque em cada livro, vendo-o a seguir em relação aos outros livros da Escritura. A importância deste tipo de estudo se manifestará imediatamente, pois, a não ser que compreendamos a relevância do que está escrito, perderemos de vista o objetivo principal. Além disso, este estudo progressivo, interpretativo das Escrituras, é, na verdade, uma base necessária e preliminar para todos os outros tipos de análise que mencionamos. Seguindo este método e com vistas a determinar a mensagem essencial de cada livro, ao examinarmos cada um deles, iremos estabelecer a sua ESTRUTURA por meio de uma análise, seus principais movimentos na forma de uma SINOPSE e seus aspectos especiais através da SUGESTÃO para novos estudos. Vamos permitir que cada livro nos conte o seu segredo e abra para nós o seu coração. Vamos resolutamente guardar-nos de forçar qualquer esboço artificial nos livros bíblicos. Sacrificar a exatidão para obter uma aliteração elegante é uma impertinência quando se trata de escritos divinamente inspirados. Existem professores bíblicos que se distinguem pelas suas “estruturas” engenhosas. Mas uma análise errônea, mesmo que habilmente traçada, obscurece a mensagem verdadeira e vital de um livro. Ao prosseguirmos com nossos estudos, descobriremos quantas vezes um livro ou passagem se ilumina com nova força ou beleza quando submetido a uma análise bem feita. A princípio, pode parecer estranho que tenhamos dado um tratamento mais completo e analisado mais detalhadamente alguns livros do que outros. Gostaríamos de salientar, portanto, que esta variação se conforma ao nosso propósito. A importância relativa das coisas não deve ser medida simplesmente pelo número de páginas que ocupam. Da mesma forma que o pequeno diamante vale mais que uma grande placa de vidro e o evento memorável de um determinado dia pode superar os feitos rotineiros de décadas, assim também nas Escrituras, embora cada coisa tenha seu devido lugar, existem algumas que se destacam, como Saul entre os filhos de Israel, com a cabeça e os ombros acima dos demais. Cada parte tem sua importância, mas algumas excedem. Nosso objetivo, portanto, é tratar de cada livro ou parte, de modo a expor seu significado especial e contribuir assim para uma compreensão ll EXAMINAI AS ESCRITURAS mais prática da mensagem bíblica em seu todo. Por esta razão, demos um tratamento mais completo aos cinco livros de Moisés, que são a base de todos os outros. Também por isso nos demoramos mais num livro como Levítico, cujas palavras, símbolos, tipos e idéias se entrelaçam com tudo o que segue, até o final de Apocalipse, enquanto damos um tratamento comparativamente breve a 1 e 2 Crônicas, cujo conteúdo, por ser histórico, exige agrupamento em lugar de exposição minuciosa. Nosso propósito não é o de um comentário, em que livros, capítulos, parágrafos e versículos são sucessivamente explicados. Não vamos nos esquecer em tempo algum de que procuramos os significados principais e especiais, com vistas a obter o escopo amplo e a mensagem abrangente do todo. Nossa abordagem Uma abordagem correta da Bíblia é da maior importância. Existe hoje uma tendência à popularização da Bíblia, considerando-a simples literatura. Depois de um estudo cuidadoso, acreditamos que esse movimento é mais prejudicial do que benéfico. Em meio à esplêndida diversidade das Escrituras existe uma unidade ainda mais maravilhosa. Os seus 66 livros não são apenas uma coleção de escritos; eles constituem um único livro — um só no progresso da revelação que apresentam coletivamente, um só na harmonia da estrutura por eles constituída em conjunto, um só na unidade espiritual da mensagem que declaram como um grupo. A Bíblia como um todo afirma ser a Palavra de Deus e sua reivindicação é confirmada tanto pela natureza de seu conteúdo como pela história de sua influência. Se este livro é, então, a Palavra de DEUS, ele não pode ser lido como simples literatura! De modo algum, pois isso forçaria a mente a uma atitude artificial, evasiva ou desonesta que se mostraria prejudicial. Nos estudos que aqui começamos, abordamos a Bíblia como sendo a Palavra de Deus em sua totalidade. Portanto, ao estudá-la, estaremos buscando aprender, iluminados pelo Espírito Santo, a mente, a verdade e a vontade de Deus. Em nosso estudo da Bíblia, devemos guardar-nos sempre do perigo de envolver-nos de tal forma na fascinação do assunto que percamos de vista o objeto do mesmo. Como já foi dito, queremos nos apossar dos 12 INTRODUÇÃO significados importantes e amplos contidos no velho Livro; mas a não ser que os significados nos dominem, teremos falhado no objetivo principal. O próprio Senhor Jesus nos ensinou que ELE é o tema central de toda a Escritura; e queremos então enxergar além da palavra escrita, vendo Aquele que é a Palavra viva. Nosso propósito é contemplá-lo de modo a, cada vez mais, amá-lo e confiar nEle. O Dr. Jowett conta a história de um turista que viajava por uma das regiões mais belas da Escócia, mas tão absorvido pelo guia turístico que não conseguiu perceber as belezas que o rodeavam. É possível estudar a Bíblia dessa maneira. Nosso grande objetivo é conhecer o Deus verdadeiro, tornar-nos mais parecidos com Cristo e deixar-nos possuir mais amplamente pelo Espírito Santo. O verdadeiro estudo bíblico irá atingir essa finalidade, pois as páginas inspiradas das Sagradas Escrituras vibram, estremecem e brilham com a presença de Deus! Acheguemo-nos,pois, reverentemente às Escrituras, compreendendo que foram inspiradas pelo Espírito Santo e que Ele, “o Espírito de sabe doria e de revelação” no pleno conhecimento de Deus (Ef 1.17), deve ser o nosso Professor. Que a nossa oração seja: “Desvenda os meus olhos, para que eu contemple as maravilhas da tua lei” (SI 119.18). E que o motivo predominante de todo o nosso estudo da Palavra de Deus seja, nas palavras de Colossenses 1.10: “A fim de viverdes de modo digno do Senhor, para o seu inteiro agrado, frutificando em toda boa obra, e crescendo no pleno conhecimento de Deus”. 13 PRELIMINARES A Bíblia como um todo A FIM DE examinar este magnífico Livro dos livros até o ponto em que os limites auto-impostos de nosso esquema de estudo nos permitem, abrimos agora a Bíblia, tendo bem definidos em nossa mente o sistema e o motivo acima expostos. Antes de efetivamente começarmos com Gênesis, porém, ser-nos-á útil fazer um estudo preliminar da Bíblia como um todo. Nossa Bíblia consiste de 66 partes. Estas são divididas em duas coleções principais distintas, as escrituras da Velha Aliança e as da Nova Aliança ou, como geralmente as chamamos, o Antigo e o Novo Testamentos. Cada um desses Testamentos, porém, um consistindo de 39 livros, o outro de 27, foi organizado em uma ordem de grupos claramente homogêneos. Neste sentido, uma cuidadosa investigação revela a presença de um propósito maravilhoso que se desenvolve através do todo. O ANTIGO TESTAMENTO Os Primeiros Dezessete Examinemos primeiro o Antigo Testamento. Comecemos em Gênesis, Êxodo, Levítico , N úm eros e D eu teronôm io . E les constituem e v id en tem en te um a un idade de cinco p a rte s que os destaca imediatamente como um grupo separado. Todos saíram de uma só pena, a de Moisés. Todos são históricos. Sempre foram conhecidos como os cinco livros de Moisés ou o Pentateuco. Note, então, o seu número e seu caráter. Quanto ao número, são cinco. Quanto ao caráter, são históricos. A seguir vêm Josué, Juízes, Rute, 1 Samuel, 2 Samuel, 1 Reis, 2 Reis, 1 Crônicas, 2 Crônicas, Esdras, Neemias, Ester. Paramos instintivamente em Ester, sem continuar até o livro de Jó, por sabermos que vamos encontrar nele outro tipo de literatura. Os livros que vão de Josué a Ester são os doze que compõem o segundo grande grupo do Antigo Testamento. 15 EXAMINAI AS ESCRITURAS Note o número e o caráter novamente. Quanto ao número, são doze. Quanto ao caráter, são também históricos. A primeira parte do nosso Antigo Testamento consiste de dezessete livros históricos, subdivididos naturalmente em cinco e doze. Existe uma nova subdivisão nos doze; os primeiros nove (Josué a 2 Crônicas) são registros da ocupação de Canaã por Israel, enquanto os últimos três (Esdras, Neemias, Ester) referem-se ao período depois da expulsão da terra e à repatriação do “remanescente”. Os dezessete livros históricos são assim subdivididos em cinco (pré-Canaã), nove (em Canaã) e três (pós-exílicos). Os Cinco Centrais A seguir encontramos Jó, Salmos, Provérbios, Eclesiastes e Cantares de Salomão. Não é preciso que nos digam que façamos outra pausa no final de Cantares de Salomão, pois a ele se segue imediatamente o livro do profeta Isaías, que obviamente introduz outro conjunto de escritos bem diverso, ou seja, o dos profetas. Não há dúvida — Jó, Salmos, Provérbios, Eclesiastes e Cantares de Salomão devem ficar reunidos e formam o terceiro grupo distinto do Antigo Testamento. Os dezessete livros precedentes, como notamos, são históricos, mas estes cinco mencionados agora não são históricos, mas pessoais e empíricos. Os dezessete livros históricos acima são nacionais, mas não estes cinco, que são pessoais e tratam em especial dos problemas do coração humano individual. Além disso, os dezessete precedentes foram escritos em prosa, enquanto os cinco não são prosa, mas poesia. Anote então o seu número e a sua natureza. Quanto ao número, são cinco. Quanto à natureza, dizem respeito à experiência. Os Últimos Dezessete Chegamos finalmente a outro grupo de dezessete. Trata-se desta vez dos livros proféticos: Isaías, Jeremias, Lamentações, Ezequiel, Daniel, Oséias, Joel, Amós, Obadias, Jonas, Miquéias, Naum, Habacuque, Sofonias, Ageu, Zacarias e Malaquias. E evidente que, como os dezessete 16 PRELIMINARES livros históricos, estes também devem ficar juntos. Da mesma forma como os livros históricos se subdividem em cinco (Moisés) e doze (Josué a Ester), assim acontece com os dezessete livros proféticos. Os primeiros cinco são justam ente cham ados de “Profetas Maiores”, en q u an to os doze remanescentes, que sempre foram classificados em conjunto como um só livro no cânon judaico do Antigo Testam ento (veja At 7.42), são conhecidos como “Profetas Menores". Um momento de reflexão mostrará que esta distinção não é artificial. Em Isaías, Jeremias, Ezequiel e Daniel encontramos os aspectos éticos básicos da profecia do Antigo Testamento e o esquema abrangente da previsão messiânica. O Messias que está para vir é considerado em Isaías tanto o Salvador sofredor como o Soberano vitorioso que reina no império mundial. Em Jeremias, onde lemos sobre a condenação de Israel por parte de Jeová, Ele é o “Renovo” de Davi e o Restaurador final do povo condenado e disperso . Em Ezequiel, o lhando além dos juízos intermediários, nós o vemos como Pastor e Rei perfeito, em cujo reinado glorioso o templo ideal do futuro é edificado. Em Daniel, que nos oferece a seqüência mais específica das épocas e eventos em sua ordem sucessiva, vemos o Messias “cortado”, sem trono ou reino, todavia levantando-se no final como Imperador universal sobre as ruínas do sistema mundial pagão destruído. Os doze profetas “menores”, embora ampliem vários aspectos, não determinam a forma principal da profecia messiânica; eles se amoldam à estrutura geral já apresentada a nós em Isaías, Jeremias, Ezequiel e Daniel. Não devemos também pensar que a elegia poética, “Lamentações”, é simplesmente um acréscimo a Jeremias. Ela não apenas tem os sinais de independência e separação, como também um significado posicionai que é preciso notar, pois constitui o ponto central dos profetas “maiores”; isto é, divide Isaías e Jeremias de um lado, deixando Ezequiel e Daniel do outro. Ele faz uma interseção entre os dois maiores profetas pré-exílicos e os dois maiores pós-exílicos. O livro está realmente no lugar adequado, pois, além de dividir posicionalmente, ele divide historicamente', celebra aquele evento destacado e tragicamente significativo que separa os profetas pré e pós-exílicos, a saber, a destruição de Jerusalém, a interrupção da dinastia davídica e a dispersão do povo da aliança pelo mundo. Ainda hoje, após 2.500 anos, eles não conseguiram voltar a se 17 EXAMINAI AS ESCRITURAS reunir, embora tenham sido providencialmente preservados como um povo distinto. Além disso, assim como doze dos dezessete livros históricos se subdividem ainda em nove e três, sendo os primeiros nove pré-exílicos e os três restantes (Esdras, Neemias e Ester) pós-exílicos, assim também ocorre com os doze profetas “menores”, i. e., os nove primeiros são todos pré-exílicos, enquanto os três restantes (Ageu, Zacarias e Malaquias) são pós-exílicos; e esses dois últimos trios, os três livros históricos e proféticos finais, possuem correspondência recíproca. Assim sendo, os trinta e nove livros de nosso Antigo Testamento organizam-se neste agrupam ento ordenado de dezessete volumes históricos, cinco experienciais e dezessete proféticos, sendo ambos os grupos de dezessete subdivididos em cinco, nove e três, e os cinco livros que tratam do coração humano individual colocados exatamente entre os dois de dezessete, bem no centro do Antigo Testamento. Isto foi acidental ou deliberado? Pense bem: mais de trinta escritores contribuíram para o Antigo Testamento, num intervalo de mais de mil e duzentos anos, escrevendo em diferentes lugares a diferentes pessoascom diferentes propósitos, sem sequer imaginar que seus escritos, além de serem preservados através das gerações, poderiam ser finalmente compilados nessa pluralidade sistemática da unidade que agora encontramos no Antigo Testamento. Ao refletirmos sobre isso, não nos podem certamente chamar de imaginosos quando pensamos que, por trás dos escritores humanos, deve ter havido um desígnio divino controlador. O NOVO TESTAMENTO Os Evangelhos eAtos Observamos agora o Novo Testamento e encontramos nele igual ordem, com um desígnio também evidente. A princípio temos Mateus, Marcos, Lucas, João e Atos. Estes são os únicos livros históricos do Novo Testamento, sendo a base de tudo o que se segue, mantendo-se, portanto, agrupados. Quanto ao número são cinco. Quanto ao caráter, são históricos. 18 PRELIMINARES Epístolas à Igreja Cristã A seguir vem um grupo que pertence claram ente a um todo complementar. É o grupo de epístolas dirigidas às igrejas cristãs: Romanos, 1 Coríntios, 2 Coríntios, Gálatas, Efésios, Filipenses, Colossenses, 1 e 2 Tessalonicenses. Note o seu número e caráter. O número delas é nove. Quanto ao caráter, são doutrinárias. Epístolas Pastorais Temos depois quatro epístolas, formando outro pequeno grupo, a saber, 1 Timóteo, 2 Timóteo, Tito e Filemon. Estas quatro não foram escritas às igrejas cristãs, sendo pastorais e pessoais. Epístolas aos Cristãos Hebreus Temos afinal outro grupo de nove, isto é, Hebreus, Tiago, 1 Pedro, 2 Pedro, 1, 2 e 3 João, Judas e Apocalipse (na verdade, uma epístola do próprio Senhor: veja o primeiro versículo). Estas nove não foram endereçadas às igrejas cristãs como as outras nove; também não contêm nada sobre a igreja mística. A primeira delas (Hebreus) é evidentemente dirigida à nação hebraica como tal. Tiago, do mesmo modo, é dirigida “às doze tribos que se encontram na Dispersão”. Pedro escreve para os “forasteiros da Dispersão” (ou seja, os judeus da Dispersão). Não há necessidade de entrar em detalhes para mostrar que essas nove epístolas, de Hebreus a Apocalipse, são distintamente hebraicas em seu ponto de vista e ambiente, sendo chamadas com exatidão de “Epístolas aos Cristãos Hebreus”. Um Arco Esplêndido O nosso Novo Testamento consiste, então, de cinco livros históricos, formando um alicerce sólido de cinco camadas de fatos básicos sob os nossos pés. Elevando-se de cada lado, como duas colunas belamente trabalhadas, encontramos as nove Epístolas às Igrejas Cristãs e as nove 19 EXAMINAI AS ESCRITURAS Epístolas aos Cristãos Hebreus. Essas duas magníficas colunas estão ligadas em arco pelas quatro Epístolas Pastorais, formando uma esplêndida arcada de verdade para a Igreja de Cristo e o Reino de Deus, alcançando seu vértice máximo naquela síntese transcendente da verdade cristã: “Evidentemente, grande é o mistério da piedade: Aquele que foi manifestado na carne, foi justificado em espírito, contemplado por anjos, pregado entre os gentios, crido no mundo, recebido na glória” (1 Tm 3.16). O Novo Testamento, pela sua estrutura literária, é realmente uma lindíssima arcada que leva à verdade salvadora e à bênção eterna. Os paralelos comparativos e contrastantes entre os dois grupos de nove epístolas são um estudo isolado. Ambos os grupos começam com um grande tratado doutrinário, Romanos e Hebreus respectivamente. Ambos os g rupos term inam com um a reve lação esca to lóg ica , 1 e 2 Tessalonicenses num caso e o livro de Apocalipse no outro. Romanos, no início do primeiro grupo, mostra-nos que a salvação em Cristo é o único caminho. Hebreus, no começo do segundo grupo, salienta que a salvação por meio de Cristo é o melhor caminho. Em Tessalonicenses, no final do primeiro grupo, vemos a segunda vinda de Cristo em relação especial com a Igreja. No livro de Apocalipse, no fim do segundo grupo, observamos a volta de Cristo especialmente em relação a Israel e às nações. E assim por diante, pois podemos desenvolver bem mais este assunto. A presença de um plano e desígnio não pertence apenas à Bíblia neste sentido geral; ela se manifesta em todos os diferentes grupos de livros considerados separadamente. Quanto mais nos demoramos nos detalhes, tanto mais interessante se torna esse aspecto, até que toda possibilidade de se tratar de simples coincidência é eliminada pelo surpreendente volume de confirmação de que, de fato, esta é a Palavra do Deus vivo. 20 PRELIMINARES NOVO TESTAMENTO EXPERIÊNCIA: DOUTRINA 9 4 9 Epístolas Pastorais Epístolas à e aos Cristãos Igreja Cristã Pessoais Hebreus HISTÓRIA DO NOVO TESTAMENTO 5 _______ Bases Históricas___________ Mateus ] Marcos | Lucas | João | Atos ANTIGO TESTAMENTO HISTÓRIA (17) EXPERIÊNCIA PROFECIA (17) Lei Registros Pós- Vida Profecia Profetas Pós- Básica Pré-exílio exílio Interior Básica Pré-exílio exílio 5 9 3 5 5 9 3 MOISÉS ANAIS DE CAN AÃ CORAÇÃO MAIORES E DOZE MENORES 21 O LIVRO DE GÊNESIS (1) Lição Ns 1 NOTA: Para este primeiro estudo leia o Livro de Gênesis inteiro, uma ou duas vezes. A AUTORIA DO PENTATEUCO Iremos considerar repetidamente nestes estudos, com rapidez mas com cuidado, a questão da autoria relativa às diferentes partes das Escrituras. Na prolongada batalha entre o “modernismo” teológico e o tradicionalismo evangélico, a maior (e a primeira) das controvérsias sobre a autoria bíblica estava ligada à do Pentateuco. Ela é mosaica ou um mosaico? Tentar aqui uma revisão extensiva foge de nosso objetivo. Isso talvez seja, todavia, também desnecessário, pois foi alcançado historicamente um ponto de onde a controvérsia pode ser vista num perfil abrangente e os resultados decididos com segurança. Acreditamos ser justo afirmar que os principais argumentos em favor da autoria mosaica permanecem firmes; os que defendem a idéia de vários autores ou a de autoria posterior já foram praticamente refutados. Isto fica perfeitamente nítido na seguinte citação de Sir Charles Marston: “É bem possível que partes de alguns livros do Antigo Testamento tenham sido extraídas de documentos anteriores. Mas supor que seria possível encontrar um método já pronto para isolá-los, o qual, todavia, mostrar-se-ia completamente inútil para nossa literatura contemporânea, impôs um considerável constrangimento à credulidade de qualquer um. Isso fez surgir indagações sobre como e quando os livros originais do Antigo Testamento foram escritos; e, acima de tudo, levantou questões sobre os recursos literários possuídos pelos israelitas a partir da época de Moisés. Os métodos críticos satisfizeram essas perguntas, presumindo que os hebreus fossem praticamente iletrados. A suposição foi posta por terra. Com base na evidência arqueológica, pode ser deduzido... que os israelitas, depois de Moisés, tinham pelo menos três escritas alfabéticas. A primeira, conhecida como hebraico sinaítico; a segunda, como hebraico fenício e, por último, após o cativeiro na Babilônia, a que é conhecida como hebraico assírio. Esses fatos modificam inteiramente todo o problema literário. A transmissão oral se torna inadmissível. E a teoria da instituição e adoção do ritual mosaico muitos séculos após a época de Moisés torna-se grotesca e absurda, de acordo com o que sabemos agora sobre esse período. “Assim sendo, J., E. e P., os supostos autores do Pentateuco, estão se tornando simples escritores fantasmas e invenções da mente. Eles fizeram com que o estudo do Antigo Testamento perdesse sua atração, gastaram nosso tempo e deturparam e confundiram nossos conceitos sobre a evidência externa. Supunha-se que possuíssem algum tipo de direito prescrito e autoridade superior ao texto sagrado. Com os esclarecimentos que a ciência está fornecendo, essas sombras que obscureceram nossos dias de estudo e devoção se afastam silenciosamente.” O LIVRO DE GÊNESIS (1) A BÍBLIA, na força de sua revelação, leva nossos pensamentos de volta no tempo até as eras patriarcal, primitiva e até mesmo pré-adâmica da terra; no entanto, a Bíblia propriamentedita não começou a ser escrita antes dos dias de Moisés. Como revelação histórica, seu início coincide com o terceiro capítulo de Êxodo, que registra a comunicação de Deus por meio da sarça ardente em Horebe e sincroniza com os oitenta anos de Moisés. Tudo o que precede este capítulo já havia passado quando a Bíblia começou a ser escrita; e tudo o que se acha registrado nos capítulos anteriores tem como propósito levar-nos até o grande novo movimento na história humana e o desenrolar magnificente da revelação divina que se inicia aqui. Gênesis e a Bíblia inteira A Bíblia não foi a primeira revelação de Deus. As suas próprias páginas deixam transparecer claramente que o primeiro casal humano, os antediluvianos e os patriarcas pós-diluvianos receberam revelações divinas; não é também improvável que elas tenham sido, até certo ponto, colocadas em forma escrita. Temos em Gênesis uma sinopse de toda a revelação anterior, suficiente para constituir uma introdução básica às comunicações posteriores feitas por Deus na Bíblia. Além de ser introdutório, o livro de Gênesis é explicativo. Os outros registros bíblicos estão ligados inseparavelmente a este, uma vez que ele contém a origem e explicação inicial de tudo o que se segue. Os temas principais das Escrituras podem ser comparados a grandes rios, sempre se aprofundando e ampliando, à medida que correm, e podemos dizer sinceramente que todos esses rios nascem na linha divisória de Gênesis, ou, para usar uma figura igualmente apropriada, assim como o tronco maciço e os ramos frondosos do carvalho nascem do seu fruto, o mesmo acontece, por implicação e antecipação, com toda a Escritura que se acha em Gênesis. Temos aqui em forma de germe tudo o que se desenvolve mais tarde. Foi dito com razão que “as raízes de toda a revelação 25 EXAMINAI AS ESCRITURAS subseqüente acham-se aprofundadas em Gênesis, e quem quiser com preender verdadeiramente essa revelação deve começar desse ponto”. Gênesis e o Pentateuco A Bíblia se abre com o Pentateuco ou os cinco livros de Moisés. O nome “Pentateuco” (em grego — pente, cinco; e teuchos, livro) foi tirado da Septuaginta (tradução do Antigo Testamento para o grego, dita como tendo sido feita por setenta judeus alexandrinos, por volta do século III a.C., recebendo o nome de Septuaginta por causa do termo latino septuaginta, que significa setenta). Há, porém, uma boa razão para crer que antes de a Septuaginta ter sido feita, os escritos de Moisés foram reconhecidos como sendo em número de cinco. Os judeus os chamavam de “a Lei” ou “os cinco quintos da Lei” ou simplesmente “os cinco”. É provável que, na forma original, o todo fosse um só, dividido em cinco seções, cada uma tendo como título a primeira palavra ou palavras. Existe uma perfeição espiritual no Pentateuco. Suas cinco partes não só nos dão uma história seqüencial, abrangendo os primeiros 2.500 anos da crônica humana, mas constituem uma unidade espiritual progressiva, estabelecendo, em seus aspectos principais, o que foi descrito como “a ordem da experiência do povo de Deus em todas as épocas”. Observamos em Gênesis a ruína através do pecado do homem. Em Êxodo temos a redenção mediante o sangue do Cordeiro e o Espírito de poder. Em Levítico temos comunhão baseada na expiação. Em Números encontramos orientação durante a peregrinação, por parte da vontade dominante de Deus. Em Deuteronômio aprendemos a respeito da dupla verdade da instrução renovada e completada, e o povo errante levado ao seu destino predeterminado. Não é isto realmente “a ordem da experiência do povo de Deus em todas as épocas”? Todavia, estes cinco primeiros livros nos dão, além disso, uma revelação indiscutivelm ente progressiva, em cinco estágios, re fe ren te ao relacionamento de Deus com o Seu povo. Vemos em Gênesis a soberania de Deus na criação e na eleição (na escolha de Abraão, Isaque, Jacó e seus descendentes e na promessa solene de lhes entregar a terra de Canaã como herança predestinada). Em Êxodo vemos o poder remidor de Deus ao libertar Israel do Egito, “com mão poderosa e com braço estendido”. 26 O LIVRO DE GÊNESIS (1) O livro de Levítico mostra-nos a santidade de Deus em sua insistência na separação e santificação do povo remido. Números destaca a “bondade e severidade” de Deus — severidade para com a geração incrédula que deixou o Egito, mas não pôde entrar na herança prometida, e bondade para com os filhos desses israelitas, sustentando, protegendo e preservando, até que Canaã fosse ocupada. Deuteronômio revela a fidelidade de Deus — fiel ao Seu propósito, Sua promessa, Seu povo, e em levar os remidos até a terra que lhes prometera. Assim sendo: O LADO HUMANO Gênesis. Êxodo. Levítico. Números. Deuteronômio. Ruína — através do pecado do homem. Redenção — pelo “sangue” e “poder”. Comunhão — com base na expiação. Orientação — direção pela vontade de Deus. Destino — mediante a fidelidade de Deus. O LADO DIVINO Gênesis. Êxodo. Levítico. Números. Deuteronômio. Soberania divina — na criação e eleição. Poder divino — na redenção e emancipação. Santidade divina — na separação e santificação. Bondade e severidade divinas — julgando, cuidando. Fidelidade divina — na disciplina e no destino. Vemos assim que essas cinco partes do Pentateuco estão repletas de propósito e progresso. Elas são uma miniatura da Bíblia. Gênesis e Apocalipse É importante reconhecer a relação entre Gênesis e o último livro da Bíblia. Existe uma correspondência entre eles, que sugere ser ao mesmo tempo uma prova e um produto do fato de que a Bíblia é uma revelação completada. Não é possível entender adequadamente um sem o outro; quando reunidos, porém, eles se completam. Não é possível retroceder além de um deles, nem avançar para além do outro. Não há também 27 EXAMINAI AS ESCRITURAS necessidade disso em qualquer caso. Em termos gerais e linguagem majestosa, Gênesis responde à pergunta: “Como tudo começou?” Em termos gerais e linguagem majestosa, Apocalipse responde à pergunta: “Como tudo terminará?” Tudo o que fica entre eles é o desenrolar dos acontecimentos de um até o outro. Note as semelhanças entre Gênesis e Apocalipse. Temos em ambos um novo começo e uma nova ordem. Observamos em ambos a árvore da vida, o rio, a noiva, a caminhada de Deus com o homem; em ambos os paraísos vemos os mesmos ideais nos campos moral e espiritual. Deus jamais abandonou o ideal do Éden para o homem; embora no final o jardim tenha dado lugar à cidade, o ideal de santidade do Éden finalmente triunfa. Marque os contrastes entre um livro e outro. Em Gênesis vemos o primeiro paraíso fechado (3.23); em Apocalipse vemos o novo paraíso aberto (21.25). Em Gênesis o pecado humano resulta em expulsão (3.24); em Apocalipse a graça divina produz reintegração (21.24). Em Gênesis lemos sobre a “maldição” imposta (3.17); em Apocalipse ela é removida (22.3). Em Gênesis, o acesso à árvore da vida é vetado em Adão (3.24); em Apocalipse vemos o acesso à árvore da vida recuperado, em Cristo (22.14). Em Gênesis vemos o começo do sofrimento e da morte (3.16-19); em Apocalipse lemos que “a morte já não existirá, já não haverá luto, nem pranto, nem dor” (21.4). Em Gênesis nos é mostrado um jardim em que entrou a corrupção (3.6-7); em Apocalipse nos é mostrada uma cidade, sobre a qual é escrito: “Nela nunca jamais penetrará coisa alguma contaminada” (21.27). O homem perde o domínio em Genêsis, por causa da queda do primeiro homem, Adão (3.19); vemos esse domínio restaurado em Apocalipse, sob o reino do Novo Homem, Cristo (22.5). Em Gênesis vemos triunfar a maldade da serpente (3.13); em Apocalipse contemplamos o triunfo final do Cordeiro (20.10; 22.3). A caminhada de Deus com o homem é interrompida em Gênesis (3.8-10); em Apocalipse Deus volta a andar com ele, e uma grande voz proclama dos céus: “Eis o tabernáculo de Deus com os homens. Deus habitará com eles...” (21.3). Veja como um livro se completa no outro. O jardim, emGênesis, dá lugar à cidade, em Apocalipse; e o homem que estava sozinho se transforma numa raça. Vemos em Gênesis o pecado humano em seu começo; no livro de Apocalipse observamos seu desenvolvimento pleno e final, na Meretriz, no Falso Profeta, na Besta e no Dragão. Em Gênesis vemos o pecado provocando a morte física na terra. Em Apocalipse vemos 28 O LIVRO DE GÊNESIS (1) o pecado nas trevas terríveis da “segunda morte”, no além. Lemos em Gênesis sobre a sentença pronunciada contra Satanás; no Apocalipse a sentença é executada. A primeira promessa de um Salvador e da salvação futura é dada em Gênesis; em Apocalipse vemos essa promessa em seu cumprimento final e glorioso. Gênesis provoca expectativa; Apocalipse produz a realização. Gênesis é a pedra fundamental da Bíblia; Apocalipse é a sua cimalha. A ESTRUTURA DE GÊNESIS Como já dissemos, tudo o que se passa antes do terceiro capítulo de Êxodo já havia acontecido quando a Bíblia começou a ser escrita. Vamos fazer então uma pausa nesse terceiro capítulo de Êxodo e observar o que se acha registrado em Gênesis, a fim de colocar em perspectiva os pontos principais. Não é difícil perceber que em Gênesis encontramos duas importantes divisões. Todos os estudiosos da Bíblia concordam em que o chamado e a resposta de Abrão constituem um desvio na narrativa e marcam as duas partes principais do livro — a primeira cobrindo os capítulos um a onze e a segunda, os capítulos doze a cinqüenta. Desse modo, vemos como cada parte é organizada conforme um plano significativo em quatro partes. Na primeira parte temos quatro eventos em destaque — a Criação, a Queda, o Dilúvio e a crise de Babel. Na segunda, temos quatro pessoas em destaque — Abraão, Isaque, Jacó e José. Todo o conteúdo de Gênesis foi organizado ao redor, em relação a esses quatro eventos centrais de um lado e às quatro pessoas centrais do outro. Ao observar os eventos e personagens básicos de Gênesis assim ressaltados, percebemos também rapidamente a idéia unificadora que se estende através do registro, e isto nos fornece o significado principal do livro como um todo. Pelo fato de ter sido colocado logo no início dos 66 livros, Gênesis nos faz dobrar os joelhos em obediência reverente diante de Deus, por exibir perante os nossos olhos, e trovejar em nossos ouvidos, aquela verdade que deve ser aprendida antes de todas as outras em nosso trato com Deus, em nossa interpretação da história e em nosso estudo da revelação divina, a saber — A SOBERANIA DIVINA. Ao fazer um retrospecto dos quatro grandes eventos da parte um e dos quatro grande personagens da parte dois, concluímos que eles constituem uma demonstração impressionante da soberania divina. No primeiro dos quatro eventos, temos a soberania divina na criação física. No segundo, ela 29 EXAMINAI AS ESCRITURAS se manifesta na tabulação humana. No terceiro, o ponto é a retribuição histórica. No quarto, a soberania divina se evidencia na distribuição racial. Nestes quatro acontecimentos importantes, contemplamos o domínio do Criador em Sua prioridade eterna, Sua autoridade moral, Sua severidade judicial e Sua supremacia governamental. Ao voltarmos para a segunda parte de Gênesis, surge a soberania de Deus na regeneração. O processo de regeneração esboçado aqui contrasta por completo com o de degeneração na primeira parte do livro. Desde Adão até Abraão vemos o curso da degeneração: primeiro, no indivíduo — Adão; a seguir, na família — Caim e seus descendentes; depois, nas nações — a civilização antediluviana; e então, persistindo através da raça, como tal, em Babel. Acontece a essa altura um novo desvio. Vemos o processo de regeneração operando: primeiro, no indivíduo — Abraão, Isaque, Jacó; a seguir, na família — os filhos de Jacó; depois, na nação — Israel; tudo com vistas à regeneração final da raça. Em Abraão, Isaque e Jacó vemos a soberania divina na eleição. Abraão, apesar de ser o filho mais moço, é escolhido em lugar de seus dois irmãos mais velhos. Isaque é escolhido em lugar de Ismael, o filho mais velho de Abraão. Jacó, embora tivesse nascido depois de Esaú, é preferido a seu irmão. Através de tudo isso, percebemos o princípio da eleição divina. Deus escolhe a quem quer, em sua graça soberana. Mais tarde, na belíssima biografia de José, apreciamos a soberania de Deus na direção — no controle dominante e infalível de todos os acontecimentos até o fim predeterminado, por mais contrários que parecessem. No caso de Abraão vemos esta eleição soberana expressa mediante um chamado sobrenatural, pois fica claro que Deus interviera diretamente (veja Gn 12.1-3). No que se refere a Isaque, nós a vemos expressa por um nascimento sobrenatural. Abraão dissera: “Oxalá viva Ismael diante de ti” (17.18). Mas, não! Quando Abraão já tem cem anos e Sara noventa, Isaque, o filho do milagre, lhes é concedido. Na história de Jacó, a eleição se evidencia no cuidado sobrenatural. Deus o salva primeiro da faca de Esaú; depois o encontra em Betei; faz com que prospere, apesar da astúcia de Labão; salva-o da ira vingadora do irmão que vai ao seu encontro com um grupo de 400 homens; e assim por diante, até quando Jacó, agonizante, abençoa os jovens Manassés e Efraim, dizendo: “o Anjo que me tem livrado de todo mal, abençoe estes 30 O LIVRO DE GÊNESIS (1) rapazes” (Gn 48.16). Em José, por último, vemos a soberania divina na orientação, manifesta no controle sobrenatural, fazendo com que todos os acontecimentos contribuam para o fim predestinado. Assim, nestes quatro homens observamos então um desenvolvimento em quatro planos — (1) chamado sobrenatural, (2) nascim ento sobrenatural, (3) cuidado sobrenatural, (4) controle sobrenatural. Neste prim eiro livro da Escritura descobrimos, então, que, ao concentrar-nos nos eventos e personagens básicos, passam os a compreender a relevância do tema como um todo e podemos organizar os fatos como segue. 31 EXAMINAI AS ESCRITURAS O LIVRO DE GÊNESIS A SOBERANIA DIVINA NA CRIAÇÃO, HISTÓRIA E REDENÇÃO I. HISTÓRIA PRIMITIVA (1-111 Quatro Eventos de Destaque A CRIAÇÃO — A soberania divina na criação física. A prioridade eterna de Deus. A QUEDA — A soberania divina na tribulação humana. A autoridade moral de Deus. O DILÚVIO — A soberania divina na retribuição histórica. A severidade judicial de Deus. A CRISE DE BABEL — A soberania divina na distribuição racial. A supremacia governamental de Deus. II. HISTÓRIA PATRIARCAL (12-50) Quatro Pessoas de Destaque ABRAÃO — Soberania divina na eleição. Chamado sobrenatural. ISAOUE — Soberania divina na eleição. Nascimento sobrenatural. JACÓ — Soberania divina na eleição. Cuidado sobrenatural. JOSÉ — Soberania divina na direção. Controle sobrenatural. 32 O LIVRO DE GÊNESIS (2) Lição Ns 2 NOTA: Para este segundo estudo leia de novo com cuidado (tomando nota dos pontos importantes) Gênesis, capítulos 1 a 11. Em antecipação aos nossos comentários sobre a extensão geográfica do Dilúvio, queremos dar um conselho. Ao estudarmos a Bíblia, devemos sempre lembrar que estamos usando uma tradução em vez do original. A compreensão correta da palavra usada no original pode afetar de maneira significativa nossa interpretação em muitos casos. Isto não deve desanimar os que não conhecem hebraico nem grego, pois em nossos dias os recursos à nossa disposição são muitos. Um deles é, sem dúvida, a Exhaustive Concordance de Strong, que, mediante um sistema de fácil referência, fornece não só todas as ocorrências do termo em inglês, mas também a palavra hebraica ou grega assim traduzida e a pronúncia em inglês, assim como qualquer outra palavra inglesa que traduz o vocábulo hebraico ou grego na Bíblia — isso sem mencionar outros excelentes aspectos. Trata-se de um instrumento inestimável para o estudioso da Bíblia. O seu valor nunca poderá ser subestimado. O conhecimento e uso das palavras empregadas no original são esclarecedores e fascinantes. J. S. B. O LIVRO DE GÊNESIS (2)EM NOSSO PRIMEIRO estudo, vimos que a idéia predominante no Livro de Gênesis é a soberania de Deus. Notamos também que o livro se divide em duas partes principais. Na primeira (1-11), temos quatro eventos em destaque — a Criação, a Queda, o Dilúvio e a dispersão de Babel. Na segunda (12-50), destacam-se quatro pessoas — Abraão, Isaque, Jacó e José. Vamos agora recapitular brevemente os quatro super-eventos da primeira parte. A criação Em primeiro lugar faremos uma revisão dos capítulos 1 e 2, que tratam daquele transcendente acontecimento inicial, a Criação. No primeiro versículo do livro lemos: “No princípio criou Deus os céus e a terra”. Isto não é teoria humana, mas um “testemunho” divino. Lemos no Salmo 93.5: “Fidelíssimos são os teus testem unhos...” A palavra de Deus dá testemunho de verdades superiores à inteligência humana comum, que estão além do alcance da investigação humana. Gênesis 1.1 é o primeiro desses “testemunhos”. Existe uma diferença radical entre uma teoria e um “testemunho” ou “depoimento”. A teoria trata da interpretação dos fatos, enquanto o testemunho trata dos fatos em si. É essencial compreender que este versículo de abertura da Bíblia não é simplesmente o primeiro postulado de uma filosofia humana, mas o primeiro testemunho de uma revelação divina. E a primeira grande verdade que Deus quer tornar conhecida ao homem; e este não a poderia conhecer se não fosse pelo testemunho divino. Nós a aceitamos como tal, acreditando com o salmista que “o testemunho do Senhor é fiel, e dá sabedoria aos símplices” (SI 19.7). Este depoimento inicial de nosso fiel Criador permanece sublime em sua simplicidade. Não há definição de Deus, nenhuma descrição da criação e nenhuma declaração de data. Positivo e completo em si mesmo, ele deixa, entretanto, espaço para todo o desenrolar subseqüente das Escrituras e todas as descobertas da ciência. Ele é axiomático. Da mesma forma que a geometria é construída sobre certas verdades axiomáticas, o 35 EXAMINAI AS ESCRITURAS axioma fundamental da Bíblia é estabelecido em sua primeira sentença. A moda, hoje, é professar descrença em milagres. Se aceitarmos a primeira sentença da Escritura, não haverá dificuldade para aceitar todos os milagres que se seguem; pois os menores estão incluídos no maior. Note também que este primeiro pronunciamento básico da Bíblia nega todas as principais filosofias falsas propostas pelo homem. “No princípio... Deus” — nega o ateísmo com sua doutrina da não-existência de Deus. “No princípio... Deus” — nega o politeísmo com sua doutrina de muitos deuses. “No princípio criou Deus” — nega o fatalismo com sua doutrina do acaso. “No princípio criou Deus” — nega a evolução com sua doutrina de transformação infinita. “... criou Deus os céus e a terra” — nega o panteísmo que identifica Deus com o universo. “... criou Deus os céus e a terra” — nega o materialismo que proclama a eternidade da matéria. Assim sendo, este primeiro “testemunho” do Senhor não é só uma declaração da verdade divina, mas também o repúdio ao erro humano. Mas, o que dizer do versículo 2: “A terra, porém, era sem forma e vazia; havia trevas sobre a face do abismo”? Isto descreve a primeira condição da terra depois da sua criação? E os seis “dias” que se seguem neste primeiro capítulo? Eles descrevem o processo da criação original? E necessário pensar e falar com muito cuidado aqui, pois os mal-entendidos são muitos neste aspecto. Se a Bíblia é a palavra inspirada de Deus, nada pode ser mais importante do que compreender corretamente os seus ensinos quanto à origem das coisas. Todavia, o fato é que nenhum capítulo da Bíblia foi tão mal compreendido e mal interpretado quanto esses dois primeiros de Gênesis. E certo afirmar que nestes dois capítulos temos um registro da “criação” (pois eles contêm a criação original do universo no capítulo 1.1 e a subseqüente criação da ordem animal presente no versículo 21, assim como a criação do homem no versículo 27); a declaração necessita, entretanto, de restrição e explicação. Deve ser feita uma diferença (a Bíblia com certeza a faz) entre a criação 36 original da terra e sua reconstrução subseqüente, com o objetivo de torná-la habitável para o homem . Não é demais enfatizar que os seis “dias” neste primeiro capítulo de Gênesis não descrevem a criação original da terra. Os que defendem ou afirmam isto são obrigados a tratar os seis “dias” como vastos períodos de tempo, a fim de enquadrar Gênesis com o que a ciência moderna nos ensinou sobre a enorme antigüidade da terra. Todavia, eles falham assim em conciliar Gênesis e a geologia e, pior ainda, envolvem as Escrituras em contradições insolúveis. Esse segundo versículo, que diz: “a terra era sem forma e vazia”, não descreve a primeira condição da terra após sua criação, como muitos pensam. Ele alude a um cataclisma que devastou mais tarde a terra. Os versículo 1 e 2 não têm uma ligação lógica. Existe uma lacuna entre ambos, cuja duração não sabemos. O versículo 2 deveria sem dúvida ser: “E a terra tomou-se (não apenas “era”) sem forma e vazia...” O mesmo termo hebraico usado aqui é interpretado desse modo em 2.7: “O homem passou a ser alma vivente” (sem mencionar outros exemplos, em alguns dos quais a interpretação é “veio a ser”). A geologia moderna fornece dados provando a antigüidade de nosso globo. Gênesis não entra em conflito com a geologia nesse terreno. Entre os dois primeiros versículos de Gênesis há amplo espaço para todas as eras geológicas. Ninguém pode afirmar qual o lapso de eras que existe entre eles. O primeiro versículo de Gênesis declara, então, simplesmente o fato da criação original, e o deixa ali, no passado sem data. O versículo 2, a seguir, trata de um caos que veio mais tarde à terra. Então, os seis “dias” subseqüentes descrevem a nova formação da terra com a finalidade de tomá-la habitável para o homem. Não sabemos com certeza o que ocasionou o cataclisma que tornou a terra “sem forma e vazia”. A Escritura parece fornecer algumas indicações veladas de que isso estava associado a uma rebelião pré-adâmica e ao juízo de Lúcifer e outros seres angelicais associados (veja Is 14.9-17; Jr 4.23-27; Ez 28.12-18, onde a linguagem transcende qualquer limite simplesmente local ou temporal). O LIVRO DE GÊNESIS (2) 1. Nota dos editores: Uma vez que se trata de uma opinião particular de Baxter, recomendamos aos leitores interessados em outras opiniões que consultem obras como a de D. Kidner, Gênesis, Introdução e Comentário (Edições Vida Nova e Editora Mundo Cristão, 1979). 37 EXAMINAI AS ESCRITURAS Nãò faz parte de nosso plano entrar nesse assunto aqui. O que desejamos enfatizar de novo é que esses seis “dias” do primeiro capítulo de Gênesis não descrevem a criação original. Em ponto algum da Bíblia é dito que se trata de um registro da criação original. Durante os quatro primeiros dias não é documentado qualquer ato criador. Só quando chegamos aos animais e ao homem é usada a palavra hebraica equivalente a “criar” (w. 21, 27). Em síntese, esses seis dias relatam um novo começo; mas não são o primeiro começo. Uma vez claramente apreciado este aspecto, o suposto conflito entre Gênesis e a geologia desaparece. Nossos comentários finais sobre esses seis “dias” devem ser no sentido de apontar o processo, o progresso e o propósito deles. Desde o início, a terra estava envolvida pelo “Espírito de Deus” (1.2); e em cada estágio da reconstrução lemos que “disse Deus”. Temos assim a vontade de Deus, expressa pela palavra de Deus e executada pelo Espírito de Deus. Este é o processo exposto aqui e ele se manifesta num progresso em seis partes ordenadas, culminando no homem. Vemos no homem a coroação do propósito total. O Homem, a Coroa No capítulo 2, são descritas a criação e a primeira condição de Adão. São quatro movimentos — produção, provisão, prova e progressão. O ato de produção é narrado no versículo 7. O homem é formado do “pó da terra”,sendo porém soprado nele o “fôlego de vida”. Veja sua insignificância e superioridade! — sua condição terrena e celestial! A seguir, nos versículos 8-14, vemos a provisão divina para o homem. Tratava-se de provisão perfeita e profusa. A seguir, em 15-17, vemos o homem sendo colocado à prova. A liberdade do homem ficaria condicionada à lealdade. Entre as muitas provisões existia uma única proibição. Esta constituía o ponto de prova. Note, por último, a progressão segundo demonstrada nos versículos 18-25.0 movimento é gradual, mas avança sempre. Isto é visto na relação entre o homem e os animais; no dom potencial da fala; e, especialmente, na provisão de Eva para satisfazer a necessidade mais profunda de Adão e na perfeita felicidade daquele primeiro casamento no Éden. Existe, pois, produção à semelhança de Deus; provisão para o corpo, prova para a mente e progressão até o ponto de satisfazer o coração. Nesses quatro movimentos vemos o HOMEM, o SERVO, o REI, o MARIDO. 38 A queda Fica perfeitamente claro para qualquer um que o pecado, com todos seus conseqüentes sofrimentos, existe no mundo inteiro. Como ele entrou? A explicação bíblica é dada em Gênesis 3. Não é nosso propósito defender essa explanação contra as opiniões humanas contrárias. Nós a apresentamos de maneira expositiva e não controversa. Aceitamos a explicação das Escrituras, e três coisas fazem parte do relato: (1) a tentação, (2) a aceitação e (3) os resultados. Quanto à tentação (w. 1-6), notamos primeiro que ela foi permitida. Não é fácil ver como poderia ter sido de outro modo na educação de um ser provido de razão e de vontade própria como o homem. A tragédia real está em ter havido um tentador. O fato de o ser humano estar sendo simplesmente provado, conforme lemos no capítulo 2.17, tornou-O sujeito à tentação. Mas, lembre-se, o tentador podia somente tentar, não era necessário haver pecado. E não havia razão para ceder. Notamos também que a tentação foi dirigida a Eva isoladamente. Este é o método comum de Satanás. Ela foi igualmente ligada à beleza: seu verdadeiro caráter estava oculto. Houve da mesma forma um aumento gradual na força da tentação. A princípio, a palavra de Deus é apenas posta em dúvida (v. 1). A seguir é diretamente contestada (v. 4). Depois, como a pessoa tentada continua tolamente a dar ouvidos, o próprio motivo em que se baseia a palavra de Deus é pervertido (v. 5). Quanto à aceitação (v. 6), vemos que Satanás primeiro cativou o ouvido, depois os olhos, a seguir o desejo interior e finalmente a vontade. Eva deu ouvidos ao tentador, permitindo depois que seus olhos contemplassem o objeto da tentação. Seu desejo então superou a vontade. Compare o versículo 6 com 1 João 2.16. “Vendo a mulher que a árvore era boa para se comer” — a concupiscência da carne. “Agradável aos olhos” — a concupiscência dos olhos. “E árvore desejável para dar entendimento” — a soberba da vida. A primeira tentação no Éden, assim como milhares de tentações que levaram homens e mulheres a pecar desde então, são fundamentalmente idênticas. O principal objetivo do tentador é sempre separar cada vez mais a vontade do homem da de Deus. É importante ver que Deus havia facilitado ao máximo resistir a essa tentação. Adão e Eva haviam sido avisados do ato que Satanás queria que cometessem. Veja os O LIVRO DE GÊNESIS (2) 39 EXAMINAI AS ESCRITURAS textos de 2.17 e 3.3. A ordem não podia ser mais explícita. O aviso foi enfático. Não havia dificuldade em obedecer, pois Deus os cercara de inúmeras satisfações e lhes dera o lugar mais elevado na criação. Por último, vale a pena comparar o registro de Gênesis sobre a aceitação com 1 Timóteo 2.14. Eva foi “enganada”, mas não Adão. A escolha dele foi deliberada, ao que parece, ao ficar ao lado de Eva na sua queda. Quando aos resultados (w. 7-24), note os seguintes pontos. Satanás dissera que os olhos deles se abririam e que conheceriam o bem e o mal (v. 5). O cumprimento foi um tanto quanto sarcástico. Os olhos deles foram “abertos”! — e eles “conheceram”! — mas que descoberta e que conhecimento! — “Abriram-se, então, os olhos de ambos; e, percebendo que estavam nus...” A inocência desapareceu. Esse foi o primeiro resultado. Percebemos agora o surgimento da vergonha — “coseram folhas de figueira, e fizeram cintas para si”. Devemos agradecer a Deus o sentimento de vergonha que colocou na natureza humana! Ele salvou a humanidade de muitos males. Sentimento de vergonha — este foi o segundo resultado. Veja porém que houve evidentemente uma mudança no corpo humano. Em Romanos 8.3 lemos que Cristo veio “em semelhança de carne pecaminosa”. Isso não pode significar que a natureza humana do Senhor tivesse sido de qualquer forma contagiada pelo pecado. Como tinha então semelhança de carne pecaminosa? A resposta está em que, embora nosso Senhor fosse absolutamente irrepreensível, Ele não tinha em seu corpo a glória primitiva, a glória original do homem no Éden antes da queda. A conclusão é que antes da queda havia uma glória radiante ao redor dos corpos de Adão e Eva, que era em si mesma uma cobertura resplendente. É-nos dito que a própria pele do rosto de Moisés brilhava, depois de seus quarenta dias de comunhão com Deus no Sinai. Como deve ter sido então a radiante beleza daquele casal no esplendoroso Éden, enquanto ainda não tinham pecado? Banhados na luz gloriosa de sua pura comunhão com Deus, seus corpos devem ter brilhado inteiramente. Mas, logo após a queda, essa glória desapareceu, e “perceberam que estavam nus”. Este foi o terceiro resultado. Isso não foi tudo, porém. Houve uma mudança trágica interior. Veio repentinamente à tona uma estranha guerra onde antes só havia amor, alegria e paz. Veio o terror de uma faculdade recém-desperta — a da consciência. Assim, com o primeiro pecado surgiu o primeiro medo: Adão 40 O LIVRO DE GÊNESIS (2) e a mulher fugiram de Deus e tentaram ocultar-se dEle! Este foi o quarto resultado — e note que não parece ter havido qualquer contrição humilde, mesmo quando o pecado foi exposto diante de Deus. Um afastamento espiritual se produzira entre o homem e Deus. O reino da morte espiritual fora estabelecido. Além de tudo, o homem acaba sendo expulso do jardim onde se encontra a árvore da vida; a terra é amaldiçoada; a serpente é maldiçoada; o homem recebe domínio sobre a mulher; e Deus providencia vestimentas para Adão e Eva. Todavia, em meio ao julgamento, Deus se lembra da misericórdia, e a primeira grande promessa sobre a vinda de um Salvador é dada no versículo 15. A melodia inteira será desenvolvida no correr do tempo e conforme a revelação da Escritura se desenrola; mas aqui em Gênesis 3.15 as primeiras notas se fazem ouvir, na promessa de que o “descendente” da mulher feriria a cabeça da serpente. O dilúvio Se há um período da história sobre o qual gostaríamos de mais informações é o período antediluviano, entre a queda e o dilúvio. A narrativa de Gênesis mostra-se muito reticente, por uma razão muito simples. Mil e seiscentos anos1 são concentrados em duas páginas, de modo que não podemos ignorar a ligação significativa entre a queda e o dilúvio, quer vejamos ou não qualquer outro elemento. O escritor inspirado omite tudo que não é vital ao seu propósito. A narrativa bíblica jamais se preocupa com o simples lapso de tempo, e sim com a importância moral do eventos. Entre a queda e o dilúvio, o desenvolvimento dos fatos é quase dramático. Vamos observá-los com cuidado. No capítulo 3 vemos a queda. No capítulo 4, temos Caim e sua linhagem — “os filhos dos homens”. No capítulo 5 aprendemos sobre Sete e sua linhagem — “os filhos de Deus”. No capítulo 6 as duas linhas se cruzam, com resultados morais trágicos. No capítulo 7 o juízo é executado — o dilúvio. Esta 1. Nota dos editores: Uma vez que se trata de uma opinião particular de Baxter, recomendamos aos leitores interessados em outras opiniões que consultem obras como a de D. Kidner, Gênesis, Introduçãoe Comentário (Edições Vida Nova e Editora Mundo Cristão, 1979). 41 EXAMINAI AS ESCRITURAS seqüência dramática, uma vez observada, não pode mais ser esquecida. A separação entre as duas linhagens era vital; sua mistura, fatídica. A condição moral resultante foi espantosa; a corrupção, extrema. Tornou-se inevitável a intervenção divina, assim como o castigo. O dilúvio foi enviado como um ato de juízo e também como uma medida de salvação moral. Esta é a primeira grande lição bíblica de que são indispensáveis a separação e a intransigência. A insistência divina em todo o tempo é para que a descendência espiritual “saia e se separe”. Alguns afirmaram que os “filhos de Deus” mencionados no capítulo 7 são anjos decaídos, isto é, anjos “que não guardaram o seu estado original, mas abandonaram o seu próprio domicílio”, referidos em Judas 6. O falecido Dr. E. W. Bullinger, exegeta capaz, mas frequentem ente fantasioso e falho, defende esta idéia. Um pouco de reflexão mostrará como ela é absurda. Os anjos são seres espirituais, assexuados, e, portanto, incapazes de experiências sensuais ou processos sexuais; também não podem reproduzir-se. A sugestão de esses anjos perversos de alguma forma terem tomado a forma humana e se tornado capazes de uma atividade sexual não passa de um disparate, como qualquer um pode verificar. A idéia é inconcebível tanto no terreno psicológico como no fisiológico. Todos sabemos como é peculiarmente delicada, sensível e intrincada a inter-reação que existe entre o corpo humano e a mente ou a alma humana. Isto se deve ao fato de a alma e o corpo terem nascido juntos e estarem misteriosamente unidos em uma personalidade humana. É assim que as sensações do corpo se tornam experiências da mente. Se os anjos simplesmente tomassem corpos e habitassem neles, isso não os capacitaria de modo algum a experimentar as sensações desses corpos, pois os anjos e os corpos não estariam unidos em uma personalidade, como no caso da mente e corpo humanos. Na verdade, os corpos não poderiam ser de carne e osso, pois, não habitando neles o espírito humano, o corpo humano de carne e osso morre. Quando o Senhor Jesus veio a este mundo para tornar-se nosso Salvador, Ele não tomou para si apenas um corpo humano e habitou nele. Tal coisa não o tornaria humano, não seria uma encarnação real. O Filho de Deus não tomou somente um corpo humano, Ele tomou para si a nossa natureza humana; e para isto teve de nascer. Se esses “filhos de Deus” em Gênesis eram anjos decaídos, a única maneira de se tornarem humanos e se casarem e terem filhos (6.1, 4) seria 42 O LIVRO DE GÊNESIS (2) submetendo-se a um nascimento humano real — isto é, sendo encarnados e nascidos de mães humanas, mas sem pais humanos! Pensar que isto aconteceu é absurdo. Bullinger afirma que “filhos de Deus” é uma descrição aplicada apenas às criações diretas de Deus — isto é, os anjos, o primeiro homem, Adão (Lc 3.38) e aqueles na presente dispensação que constituem uma “nova criação” em Cristo (2 Co 5.17; Rm 8.14 etc.); mas ele certamente se esquece de versículos como Isaías 43.6 e 45.11, onde a expressão “meus filhos” é equivalente a “filhos de Deus”. Ignoremos completamente, então, a estranha idéia de que esses “filhos de Deus” em Gênesis eram os anjos decaídos, que “não guardaram o seu estado original” a fim de coabitar com as mulheres da terra. Além das objeções que já levantamos, a impressão que a Escritura nos transmite é de que a queda desses anjos — como a de Satanás — ocorreu muito antes de o homem ser criado na terra. O dilúvio nos dias de Noé foi universal? Quanto ao fato do dilúvio, o testemunho da tradição universal e da arqueologia do século XX tiraram qualquer dúvida a esse respeito; mas, repetimos, o dilúvio foi universal? Discutir adequadamente esta questão exigiria um espaço que iria exceder em muito os limites de nosso presente objetivo. Existem, porém, dois ou três fatos basicamente importantes que não podem deixar de ser mencionados. Primeiro, entendamos claramente que não é fundamental para a inspiração das Escrituras afirmar que o dilúvio de Noé foi universal. A expressão “a terra”, que aparece tantas vezes no registro bíblico, não nos obriga a isso, pois o termo hebraico (eretz), traduzido como “terra”, freqüentemente indica apenas um país ou localidade. Por exemplo, no chamado divino a Abraão, “sai da tua terra”, a palavra é eretz, e em muitos outros pontos eretz corresponde a “região”. Do mesmo modo, o termo hebraico (har) traduzido como “monte” (7.20) tem várias conotações. Pode significar pouco mais que outeiros ou planaltos, ou ainda montanhas propriamente ditas. E a palavra repetidamente empregada no título “Monte Sião”. Não se exige de modo algum que pensemos em Nóe e a arca elevados acima dos Alpes e das montanhas do Himalaia, onde, por seu próprio peso, as águas se tornariam parte da neve e gelo eternos, lugar em que, de fato, a arca ficaria enterrada sob milhares de metros de gelo, e onde, mesmo que tal sepultamento na neve fosse de alguma forma superado, a vida na arca teria sido impossível se não houvesse algum 43 EXAMINAI AS ESCRITURAS sistema milagroso de “aquecimento central”! Existe um uso legítimo e idiomático da hipérbole na língua hebraica do Antigo Testamento, assim como acontece hoje. Quando o espectador de um jogo de críquete nos conta que a bola foi lançada a “quilômetros de distância”, compreendemos imediatamente o que ele quer dizer. Do mesmo modo, quando Moisés fala de “cidades grandes e amuralhadas até aos céus” (Dt 9.1), reconhecemos uma hipérbole legítima; e, assim também, quando ele fala que as águas do dilúvio cobriram todos os montes que “havia debaixo do céu” (Gn 7.19), percebemos o mesmo uso hiperbólico de Deuteronômio 2.25, onde essa mesma expressão, “debaixo de todo o céu”, ocorre numa conotação evidentemente limitada. A profundidade das águas é de fato dada em Gênesis 7.20, e os hiperbolismos devem ser sempre lidos de acordo com as declarações e números literais. (Veja nossa nota referente à Exhaustive Concordance de Strong, que precede este estudo.) Muito mais poderia ser dito, mas mencionamos o suficiente para mostrar que a inspiração da Escritura não depende de provarmos que o dilúvio foi universal. Outro ponto a ser acrescentado é que o dilúvio de Noé não deve ser confundido com o dilúvio pré-histórico de que falam os geólogos.1 Por toda a terra, existem marcas de um enorme dilúvio; mas elas não poderiam ter sido deixadas por uma inundação tão curta como a dos dias de Noé, mesmo que tivesse sido universal. O dilúvio de que a geologia dá testemunho é o de Gênesis 1.2, ao qual 2 Pedro 3.5 também se refere. Notamos, finalmente, que após a destruição de toda a raça adâmica, restou um homem que, com sua família, “achou graça diante de Deus”. “Noé era homem justo e íntegro entre os seus contemporâneos; Noé andava com Deus.” Este homem e sua família foram poupados: e ele era o homem vital, notemos isso. Ele era o décimo homem na linhagem messiânica, a partir de Adão, da qual viria o Salvador na “plenitude do tempo”. Satanás pode fazer o que seja pior, o homem pode afundar ao máximo e o juízo pode ser executado até o extremo, mas o propósito final do Senhor jamais deixará de ser alcançado. Ele segue adiante e triunfará 1. Nota dos editores: Uma vez que se trata de uma opinião particular de Baxter, recomendamos aos leitores interessados em outras opiniões que consultem obras como a de D. Kidner, Gênesis, Introdução e Comentário (Edições Vida Nova e Editora Mundo Cristão, 1979). 44 um dia em “novos céus e nova terra”, onde haverá justiça e glória incomparáveis. O LIVRO DE GÊNESIS (2) A dispersão em Babel Não devemos pensar na era pré-diluviana como sendo de dureza primitiva. Tudo indica tratar-se da civilização mais notável que nossa raça jamais conheceu. A longevidade humana nessa época, a uniformidade da linguagem, a proximidade da revelação divina e a maior liberdadede comunicação entre Deus e os homens — pense no que isso deve ter significado. Vemos claros indícios das artes e engenhos desse período em Gênesis 4.20-24. Mas essa primeira civilização, com seu acúmulo de conhecimento e experiência, seus tesouros de arte e literatura, sua agricultura e habilidades, desapareceu completamente, e a raça adâmica tem um novo começo em Noé e seus três filhos com suas famílias. Restrições marcantes são agora impostas. A vida humana é bastante encurtada. O período de cada geração é bem menor. O solo exige mais trabalho e produz menos retorno; a “carne” é, portanto, incluída na dieta humana. Uma barreira de “medo” em relação ao homem tem de ser também imposta aos animais. A pena de morte é estabelecida para quem matar um semelhante (cuja “violência” se tornara comum nos dias antediluvianos: 6.11,13). Em meio a tantas limitações, a fidelidade de Deus se destaca no sinal do arco-íris. A promessa divina era necessária. Ela assegurou ao homem uma esperança para o futuro. Havia ainda uma outra limitação a ser imposta, a saber, a confusão de línguas (11.1-9). O fato essencial a ser compreendido é que a pluralização da linguagem humana foi uma medida restritiva culminante, sendo precipitada por um acordo humano no sentido de estabelecer um grande centro racial, com uma elevada torre astral. Não devemos atribuir a esses construtores da antigüidade a estupidez de imaginar que pudessem edificar uma torre que chegasse aos céus. O texto, na verdade, não se refere à altura da torre, mas diz, “e seu topo com os céus”, ou seja, com um planisfério astronômico, figuras do zodíaco e desenhos das constelações — como encontramos nos templos antigos de Esneh e Denderah no Egito. Talvez devêssemos dar a confirmação do falecido Tenente-General Chesney. Depois de descrever outras descobertas entre as ruínas da 45 EXAMINAI AS ESCRITURAS Babilônia, ele declara: “Cerca de cinco milhas a sudoeste de Hillah, a mais notável de todas as ruínas, a Birs Nimroud dos árabes, levanta-se a uma altura de 46 metros acima da planície sobre uma base quadrada de 121 metros de lado. Ela foi construída de tijolos secos no forno, em sete estágios, a fim de corresponder aos planetas a que foram dedicados: a inferior preta, a cor de Saturno; a seguinte laranja, para Júpiter; a terceira vermelha, para Marte; e assim por diante. Esses estágios eram encimados por uma elevada torre, no cume da qual, segundo nos foi dito, encontravam-se os signos do zodíaco e outras figuras astronômicas; tendo portanto (como deveria ter sido traduzido) uma representação dos céus, em lugar de um ‘topo que chegue até aos céus’ ”. Não podemos afirmar que esses sejam os remanescentes da torre original, mas sem dúvida ilustram sua natureza e dimensões. A crise de Babel provavelmente ocorreu cerca de trezentos anos após o dilúvio. Em 10.25 ficamos sabendo que nos dias de Pelegue “se repartiu a terra” (como aconteceu na confusão de línguas; 11.9). Pelegue morreu 340 anos depois do dilúvio, como pode ser facilmente calculado em 11.10-19. A torre de Babel tinha como finalidade conservar e transmitir as tradições antediluvianas. Seu erro estava no fato de os construtores desafiarem o mandamento divino de se dispersarem e encherem a terra. “Tornemos célebre o nosso nome”, exclamaram os construtores, “para que não sejamos espalhados por toda a terra!” O Dr. Alfred Edersheim comenta: “Tais palavras compartilham do espírito da ‘Babilônia’ em todas as eras. Seu significado é certamente ‘vamos rebelar-nos!’ — pois não só o desígnio divino de povoar a terra seria assim frustrado, mas um império mundial desse tipo iria constituir um desafio a Deus e ao seu reino, desde que o seu motivo era orgulho e ambição”. Não podemos deter-nos aqui para discutir a grandeza de Babel, a capital do reino de Ninrode; mas, a partir deste ponto, Babel, ou Babilônia, torna-se a cidade-símbolo do “mundo perverso atual”, energizado, como o é, pelo arqui-rebelde Satanás. A completa destruição da Babilônia histórica, que ocorreu devidamente em cumprimento a profecias como a de Isaías 13.19-22, é uma das maravilhas da profecia bíblica. Mas a Babilônia continua vivendo em forma de “mistério”, como lemos no livro de Apocalipse; e a destruição da Babilônia histórica tipifica a futura ruína da Babilônia “misteriosa” e do presente sistema mundial. 46 NOTA: Ocorre-nos mencionar que os interessados num estudo mais detalhado desses “filhos de Deus”, em Gênesis 6, encontrarão um tratamento mais minucioso do assunto no último capítulo do livro do autor, Studies in Problem Texts (“Estudos em Textos Problemáticos”). O LIVRO DE GÊNESIS (2) 47 O LIVRO DE GÊNESIS (3) Lição NQ 3 NOTA: Para este estudo leia novamente Gênesis 6-9 e 37-50. “Para que uma coisa possa ser considerada o tipo de outra, é necessária mais do que simples semelhança. A primeira não deve apenas parecer-se com a segunda, mas deve ter sido destinada a isso. É preciso que tenha sido destinada a isso desde a sua instituição original, como um preparativo para a segunda. Tipo e antítipo devem ter sido pré-ordenados, e isso como partes constituintes do mesmo esquema geral da divina providência. Este desígnio prévio e esta ligação pré-ordenada (juntamente, é claro, com a semelhança) constituem a relação do tipo com o antítipo.” BISPO MARSH, Lectures O LIVRO DE GÊNESIS (3) O ENSINO DOS TIPOS EM GÊNESIS (a) O Antigo Testamento — tipos em geral As Escrituras do Antigo Testamento contêm, de fato, inúmeros significados tipológicos latentes. Exemplos de seu conteúdo tipológico são repetidamente citados no Novo Testamento; eis alguns deles: Pessoas Objetos {“Adão... era a figura (typos = tipo) daquele que havia de vir” — Rm 5.14 (BLH).“Melquisedeque... feito semelhante (aphomoiaõ = à semelhança de) ao Filho de Deus” — Hb 7.3. {“E a pedra (da qual os israelitas beberam: veja Êxodo 17) era Cristo” — 1 Co 10.4. “O primeiro tabernáculo... é uma parábola (parabolz = figura ou comparação)” — Hb 9.8-9.Eventos “Noé... salvo através da água, a qual, figurando (antitypos = antitipo) o batismo, agora também vos salva” (1 Pe 3.21). “Abraão... figuradamente (parabote = símile) o (Isaque) recobrou (dentre os mortos)” — Hb 11.19. Mas além desses e outros exemplos similares, em que pessoas, objetos e eventos específicos são tidos como tipos ou figuras, existem passagens no Novo Testamento que confirmam claramente a presença geral de tipos e símbolos no Antigo Testamento. Note as seguintes: “Ora, estas cousas (veja o contexto) se tornaram exemplos para nós (lit.: — tipos para nós)” — 1 Co 10.6. 51 “Estas cousas lhes sobrevieram como exemplos (typoi = tipos)” — 1 Co 10. 11. “a lei tem sombra (contorno escuro ou silhueta) dos bens vindouros” — Hb 10.1. Existem outros capítulos, passagens e versículos no Novo Testamento que, embora não confirmem propriamente o fato da tipologia do Antigo Testamento, indiscutivelmente a sugerem. Pensamos, por exemplo, no grande discurso do Senhor sobre o maná, em João 6; a comparação por contraste feita por Paulo sobre os dois ministérios — o da “letra” contra o do “Espírito”, em 2 Coríntios 3-4; o argumento baseado em Ismael e Isaque, em Gálatas 4; as passagens sobre Melquisedeque e Arão na Epístola aos Hebreus; as palavras do Senhor sobre a serpente abrasadora; sua referência aos três dias de Jonas dentro do grande peixe; e as várias referências do Novo Testamento sobre Cristo como Páscoa, Primícias, Trono de Misericórdia (propiciatório) e Cordeiro. Quem pode ler tantas passagens como essas, sem ver nelas a implicação da tipologia do Antigo Testamento? De fato, mesmo à parte destas provas indiscutíveis do Novo Testamento para crermos na tipologia do Antigo, os dados circunstanciais em alguns casos são tão claros que não poderíamos deixar de perceber a presença de significados tipológicos, uma vez que as sem elhanças são excessivam ente nítidas e num erosas para considerá-las simples coincidências.
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