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PSICOPEDAGÓGICA ................ 31 4.1 Estímulo e métodos de inserção à arte ................................................................... 33 4.2 O desenho é espontâneo ou é fruto da cultura? ..................................................... 37 4.3 O desenho infantil ...................................................................................................... 38 4.4 Fases/ etapas do desenho infantil ............................................................................ 43 4.5 A importância do Psicopedagogo ............................................................................. 49 4.6 O desenho como instrumento de diagnóstico ......................................................... 53 5.0 O OLHAR DO PROFESSOR SOBRE O DESENHO DA CRIANÇA PEQUENA ..... 56 5.1 Educação Infantil no Brasil: breve histórico ............................................................. 58 5.3 DESENHO: riscando, rabiscando, das garatujas ao desenho .............................. 61 6.0 O DESENHO DA CRIANÇA: VALORIZAÇÕES DA EXPRESSÃO GRÁFICA ........ 66 6.1 A voz infantil: ultrapassando os muros da cultura imposta .................................... 67 6.2 A criança desenha, se expressa e se constitui pelo desenho ............................... 76 6.3 O desenho como manifestação da voz infantil........................................................ 84 7.0 O ESTUDO DO DESENHO .......................................................................................... 95 7.1 A desenho da criança: ............................................................................................... 95 7.2 O estudo do espaço ................................................................................................... 95 7.3 Elementos do desenho .............................................................................................. 96 7.4 Os sinais da sexualidade .......................................................................................... 96 7.5 O desenho da família................................................................................................. 96 7.6 O significado das cores ............................................................................................. 97 7.7 Os elementos do desenho ........................................................................................ 97 7.8 Etapas gráficas do desenho ................................................................................... 101 8.0 O DESENHO COMO INSTRUMENTO DE MEDIDA DE PROCESSOS PSICOLÓGICOS EM CRIANÇAS HOSPITALIZADAS .................................................. 103 8.1 O desenho infantil .................................................................................................... 105 8.2 O desenho como instrumento de medida de processos psicológicos ................ 107 3 8.3 O desenho no contexto hospitalar .......................................................................... 112 8.4 O desenho como medida de dificuldades emocionais em crianças com doenças crônicas ........................................................................................................................... 116 8.5 O desenho como medida dos conceitos de saúde e doença para crianças ...... 118 9.0 DESENHOS E ABUSO SEXUAL ............................................................................... 120 9.1 Desenho 1 ................................................................................................................ 121 9.2 Desenho 2 ................................................................................................................ 122 9.3 Desenho 3 ................................................................................................................ 123 9.4 Desenho 4 ................................................................................................................ 124 9.5 Desenho 5 ................................................................................................................ 124 9.6 Desenho 6 ................................................................................................................ 125 9.7 Desenho 7 ................................................................................................................ 126 9.8 Desenho 8 ................................................................................................................ 126 9.9 Desenho 9 ................................................................................................................ 127 9.10 Desenho 10 ............................................................................................................ 128 9.11 Desenho 11 ............................................................................................................ 128 10.0 O DESENHO DA FIGURA HUMANA NA AVALIAÇÃO DA AGRESSIVIDADE INFANTIL ............................................................................................................................ 129 REFERÊNCIA: ................................................................................................................... 134 4 1.0 BREVE HISTÓRIA DO DESENHO A história do desenho (ou “pré-história”) começa quase que ao mesmo tempo em que a do homem. Nas cavernas ficaram gravados, por meio de desenhos, os hábitos e experiências dos primitivos “homens das cavernas” que usavam as pinturas rupestres como forma de se expressar e comunicar antes mesmo que se consolidasse uma linguagem verbal. Ao longo dos séculos o desenho passou a ser utilizado cada vez de formas mais diferentes. Sendo até mesmo, um precursor da linguagem escrita, da fotografia e assim, do cinema, e até mesmo das representações cartográficas. Ora ilustrando templos sagrados e tumbas, como dos egípcios onde se vê relatada, praticamente, todas as histórias da vida cotidiana e mesmo da vida após a morte, ora representando os deuses mitológicos gregos, ou ainda, conduzindo navegantes por mares desconhecidos como durante os séculos XV e XVI e nos séculos posteriores, a arte de desenhar acompanhou o homem durante todo seu desenvolvimento fazendo parte de sua história e, ainda hoje, é capaz de surpreender e encantar a qualquer um que se permita uma breve contemplação. https://www.infoescola.com/geologia/caverna/ https://www.infoescola.com/artes/arte-rupestre/ https://www.infoescola.com/comunicacao/linguagem-verbal-e-nao-verbal/ 5 Na pré-história o desenho surgiu como forma de as pessoas se comunicarem facilitando o desenvolvimento de uma linguagem falada e escrita. Não que o homem tenha aprendido a desenhar antes de falar, porque isso é praticamenteimpossível de determinar uma vez que a linguagem falada não deixa marcas em paredes como as pinturas rupestres. Mas é inegável que a expressão por meio de pinturas facilitou a comunicação para aqueles povos. Na antiguidade o desenho ganha status sagrado, principalmente no Egito, onde é usado para decorar tumbas e templos. Tanto o é que, para os antigos egípcios uma grave condenação para alguém após a morte é ter raspados todos os desenhos e inscrições de sua tumba. Mesopotâmicos, Chineses e povos do continente americano desenvolveram cada qual um sistema diferente de desenhar, com significados próprios e que caracterizaram cada população. Da mesma forma ocorreu na antiguidade clássica, quando gregos e romanos utilizaram o desenho para representar seus deuses. Já na mesopotâmia o desenho foi utilizado para criar representações da terra e de rotas de forma bastante primitiva. O nascimento da representação cartográfica de rotas comerciais e domínios ganha fôlego com a expansão do Império Romano e a popularização de suas cartas. Mas um acontecimento realmente importante para todas as formas de desenho foi a invenção do papel pelos chineses há mais de três mil anos. Até então eram usados diferentes materiais para as representações como blocos de https://www.infoescola.com/historia/mesopotamia/ 6 barro ou argila, couro, tecidos, folhas de palmeira, pedras, ossos de baleia, papiro (uma espécie de papel mais fibroso muito usado pelos egípcios) e até mesmo bambu. Estima-se que por volta do ano VI a.C. os chineses já utilizassem um papel de seda branco próprio para desenho e escrita. Mas, o papel da forma que conhecemos hoje surgiu em 105 d.C. tendo sido mantido em segredo pelos chineses durante quase 600 anos. A técnica, embora tenha evoluído, ainda mantém o princípio de extração de fibras vegetais, prensagem e secagem. Os apetrechos utilizados para fazer o desenho também foram bem diferentes até que se inventasse a tão comum caneta em esferográfica, em 1938. O primeiro “utensílio” usado para desenhar foram os dedos com os quais os homens da caverna fizeram suas pinturas rupestres, depois foram usados pelos babilônicos pedaços de madeira ou osso em formato de cunha para desenhar em tábuas de argila (daí o nome da escrita “cuneiforme”). Com a invenção do papiro pelos egípcios foi necessário desenvolver outros materiais para escrita e o desenho. Passaram então a ser utilizados madeira e ossos molhados em tinta vegetal e, depois, as famosas penas ou ainda o carvão que já era utilizado pelo homem das cavernas. As penas, no século XVIII, passaram a ser de metal e em 1884, Lewis E. Watterman patenteou a caneta tinteiro, precursora das esferográficas. Da mesma forma que os instrumentos utilizados para o desenho evoluíam, o próprio desenho evoluía junto. No Japão, a época mais próspera dos samurais (1192 a 1600) o desenho experimenta um grande crescimento. Os 7 samurais além de guerreiros se dedicavam às artes. É no Japão que foi divulgada a tinta nanquim criada pelos chineses, ao contrário do que se costuma pensar. Uma tinta preta bastante usada para desenhar e que era feita de um pigmento negro extraído de compostos de carbono queimados (como o carvão). Assim como praticamente todas as formas tradicionais de arte, o desenho foi bastante difundido por religiosos seja no oriente ou no ocidente. Assim, a arte mantém ainda uma ligação com o religioso, embora no Japão tenha se popularizado a representação da natureza e na antiguidade já se fizessem desenhos sobre a vida e as pessoas. É no Renascimento que o desenho ganha perspectivas e passa a retratar mais fielmente a realidade ao contrário do que ocorria, por exemplo, nas ilustrações da Idade Média, quando a falta de perspectiva criava cenários completamente impossíveis. Com o Renascimento surge também um conhecimento mais aprofundado da anatomia humana e os desenhos ganham em realidade. Mestres da pintura na época eram também exímios desenhistas que usavam os conhecimentos da anatomia para dar mais realidade as imagens através do uso de sombras, proporções, luz e cores. Devido a Revolução Industrial surge uma nova modalidade de desenho voltado para a projeção de máquinas e equipamentos: o desenho industrial. https://www.infoescola.com/movimentos-culturais/renascimento/ 8 Em 1890, outro marco para o desenho: surge a primeira revista em quadrinhos semanal da história. No dia 17 de maio de 1890 foi lançada a Comic Cuts pelo magnata londrino Alfred Harmsworth, mais tarde Lord Northcliffe. Mas, outras fontes atribuem o feito a obras anteriores: uma destas obras seria o desenho chamado “Yellow Kid” publicada em 1897 por Richard Outcalt. No Brasil, as precursoras foram as tiras do ítalo-brasileiro Ângelo Agostini, publicadas em 1869, no jornal “Vida Fluminense” com o título de “As Aventuras de Nhô Quim”. Após a Primeira Guerra Mundial (1914-1918) as caricaturas e charges se popularizam e sua utilização passa a ser cada vez mais frequente. Com a Segunda Guerra Mundial (1939-1945) não só as caricaturas em periódicos de grande circulação, mas também as animações passam a ser utilizadas por ambos os lados numa verdadeira “guerra visual”, seja para fazer propaganda ou para fazer críticas a um e outro sistema. Da década de 90 para cá as evoluções foram enormes. Centenas de periódicos no mundo todo tratam exclusivamente do assunto “desenho” em suas mais diversas modalidades: cartuns, charges, desenhos técnicos, desenho artístico, caricatura, animes, mangás, grafite e outros. Técnicas cada vez mais apuradas de desenho, arte final, diagramação, impressão e distribuição possibilitaram além da melhoria da técnica, a criação de estilos tão variados quanto é a variedade de público. E que essa história nunca termine... 9 2.0 DESENHO NA PESQUISA COM CRIANÇAS: ANÁLISE NA PERSPECTIVA HISTÓRICO-CULTURAL Os estudos sobre o mundo do trabalho1 habitualmente mantêm o seu foco nos "adultos" ou nos jovens ao se inserirem no mercado de trabalho e/ou durante o processo de escolha profissional. Porém, também é relevante a vinculação desta temática com o chamado "universo infantil", uma vez que a criança, mesmo quando não exerce uma atividade produtiva remunerada, relaciona-se com o mundo do trabalho. Tal pressuposto decorre de uma concepção de sujeito constituído nas e pelas relações sociais, na intrincada trama em que cognição, afetos e vontade são historicamente produzidos no próprio movimento de produção da realidade em suas múltiplas dimensões. Mas por que e como dialogar com as crianças sobre a temática do trabalho? Em consonância com que pontua Kramer (2002) e Sarmento e Pinto (1997), considera-se que ouvir as crianças é buscar uma possibilidade de compreender a sociedade, porque esta não é formada apenas por adultos, para os quais se valoriza a expressão de suas ideias, mas também pelas crianças e pelos sentidos atribuídos por elas à realidade. A linguagem utilizada pelas crianças ao se comunicarem, no entanto, diferencia-se da dos adultos, na qual a palavra, a frase, o enunciado articulado predominam. Na comunicação com outros, a criança utiliza signos vários, como gestos, imagens, silêncios, expressões, palavras não necessariamente compreensíveis para quem não compartilha do seu universo de significações, o que requer a utilização de http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1983-34822008000100002#not01 10 recursos auxiliares quando da pesquisa com esse público. Ciente disso, utilizou- se, em pesquisa que investigou os sentidos atribuídos por crianças ao trabalho (Natividade, 2007), o desenho como procedimento complementar à entrevista no processo de coleta de informações. Neste artigo, a utilização do desenho na pesquisa referida é discutida, considerando o seu valor heurístico para investigações com crianças.2.1Considerações sobre o desenho e o processo de desenhar O desenho infantil é aqui compreendido à luz da perspectiva histórico- cultural em psicologia, para o qual o processo de desenhar em si é tão relevante quanto o produto. Segundo Ferreira, a teoria de Vygotsky (2001, p. 40) traz um avanço na compreensão sobre o desenho, pois considera que "[...] a) a figuração reflete o conhecimento da criança; e b) seu conhecimento, refletido no desenho, é o da sua realidade conceituada, constituída pelo significado da palavra". Percebe-se, então, que a importância não incide sobre o produto, mas sim na significação que o autor atribui ao próprio processo de desenhar e sobre o que é possível compreender da realidade a partir da imagem produzida. Ao prestar atenção às atividades das crianças, percebe-se que habitualmente elas gostam de desenhar, sendo o desenho um canal privilegiado de expressão de suas ideias, vontades, emoções, enfim, do modo como leem a realidade (Derdyk, 1989; Ferreira, 2001; Gobbi, 2005; Pereira, 2005). O desenho 11 parece mesmo pertencente ao mundo infantil, parece coisa de criança. Pode-se encontrar nos desenhos um mundo fantástico ou fantasioso onde a criança se expressa. Mas será esta expressão somente fantasia ou uma expressão de sua realidade? Como entender o desenho das crianças? Através da revisão de literatura, pode-se compreender que o desenho, por se tratar de uma forma de linguagem, tem papel importante tanto no desenvolvimento da capacidade cognitiva e semiótica, como também na criatividade e expressão das emoções. Por meio do desenho, o pensamento e a emoção se objetivam (Souza et al., 2003), e a criança "libera seus repertórios de memória" (Vygotski, 1991, p. 127). Vygotsky (1998) compreende o desenho infantil como uma forma de expressão da imaginação criadora do homem. Na criança, a arte enquanto capacidade criadora, segundo Leite (2004, s. p.), é o principal meio de expressão, pois Podemos perceber através da observação da criança a quem é oferecida a liberdade de criar, que no fazer artístico ela conta o quê e como sente, o que e como pensa e o quê e como vê/percebe o mundo à sua volta. Falar sobre desenho infantil requer também que se reflita sobre linguagem, imaginação, percepção, memória, emoção, significação, ou seja, compreender os processos psicológicos envolvidos/constituídos no processo de desenhar e que não podem ser analisados de forma isolada, visto serem interdependentes. Ademais, o modo como estes processos se desenvolvem e 12 se objetivam variam em razão das condições sociais e culturais, historicamente produzidas e particularmente apropriadas em razão dos lugares sociais que cada pessoa ocupa na trama das relações cotidianas das quais ativamente participa. Silva (1998) afirma que a visão maturacionista é acentuada na literatura sobre esta temática, sendo que, nesta visão, o desenho é considerado como algo natural e espontâneo. Todavia, a autora esclarece que, na perspectiva histórico-cultural, o desenho é visto como sendo constituído socialmente, pois, sendo o sujeito um ser social em sua origem, toda sua produção é igualmente constituída a partir das relações sociais. "Assim como uma pessoa só aprende a expressar-se oralmente se conviver com falantes, a criança desenha porque vive em uma cultura que tem na atividade gráfica uma de suas formas de expressão" (Silva, 1998, s.p). Vygotski (1998) deixa claro que compreende o desenho infantil a partir do contexto histórico-cultural no qual a criança está inserida, sendo este marcado pelas condições que lhe são disponibilizadas: "Não se trata agora de algo massivo, natural, espontâneo, isto é, do surgimento por si mesmo da criação artística infantil, mas sim que esta criação depende da habilidade, de hábitos artísticos determinados, de dispor de materiais, etc." (1998, p. 102)4. Seguindo a mesma perspectiva, Ferreira afirma: "Os significados das figurações do desenho da criança são culturais e produto das suas experiências com http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1983-34822008000100002#not04 13 os objetos reais mediadas pela palavra e pela interação com o 'outro'" (2001, p. 35). Segundo Pereira (2005), a garatuja é a fase inicial do grafismo, já o termo desenho passa a ser utilizado a partir do momento em que a criança reconhece um objeto no traçado produzido por ela. Vygotski (1998) não trata sobre esta fase da garatuja, mas, pautando-se nas experiências de Kersensteiner, apresenta quatro etapas do desenho infantil5, mostrando como a criança representa a sua realidade no desenho. A primeira etapa corresponde aos esquemas, onde a criança representa esquematicamente os objetos, desenhando o concreto através de traços essenciais. Na segunda etapa, encontra-se o formalismo e o esquematismo na representação, começando a surgir a forma e a linha, onde o desenho busca uma relação de forma entre as partes. Esta segunda etapa se diferencia da primeira por apresentar mais detalhes na representação dos objetos. A terceira etapa é denominada pelo autor de representação veraz, na qual os esquemas desaparecem e dão lugar ao contorno plano e os objetos desenhados parecem com o aspecto verdadeiro. Na quarta etapa, surge a imagem plástica, onde o desenho reflete aspectos reais do objeto e apresenta perspectiva. http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1983-34822008000100002#not05 14 Na primeira e segunda etapa, há a presença do desenho radiografado, onde a criança desenha também o que não vê no objeto, mas sabe que existe (Vygotski, 1998). Esta característica demonstra que, nas fases iniciais do desenho, a memória se destaca, pois, a criança desenha o que lembra e conhece do objeto (Ferreira, 2001). Desenhar a partir de um modelo presente, isto é, copiar, é característica de um grau maior de desenvolvimento do desenho infantil, ao qual, de acordo com Vygotski (1998), poucas crianças chegam. No desenvolvimento do desenho infantil, primeiro a criança se fixa no todo para realizar seus desenhos e somente depois passa a dar atenção às partes, às peculiaridades do objeto que pretende desenhar (Vygotski, 1998). Isto pode ser compreendido também em relação ao desenvolvimento da linguagem verbal, pois "[...] o desenho é uma linguagem gráfica que surge tendo por base a linguagem verbal. Nesse sentido, os esquemas que caracterizam os primeiros desenhos infantis lembram conceitos verbais que comunicam somente os aspectos essenciais dos objetos" (Vygotski, 1991, p. 127) No processo de elaboração do desenho também está presente a imaginação, pois a criança observa a realidade e registra desta aquilo que lhe é significativo, sendo os diversos recortes dessa realidade combinados imaginativamente e objetivados por meio do desenho. "O desenho configura um campo minado de possibilidades, confrontando o real, o percebido e o imaginário. A observação, a memória e a imaginação são as personagens que 15 flagram esta zona de incerteza: o território entre o visível e o invisível" (Derdyk, 1989, p. 115). A imaginação requer objetivação por intermédio da atividade criadora; a imaginação recria (reelabora, recombina, ressignifica) fragmentos da realidade, do que já existe. Enquanto a memória registra o que é significativo para o sujeito, a imaginação objetivada no desenho o projeta para o futuro, pois o sujeito faz uma elaboração criadora desta realidade significada. Vygotski (1998) compreende imaginação como sinônimo de fantasia e a atividade criadora como a objetivação da imaginação; sendo assim, toda realização humana é criadora. Partindo desta compreensão, entende-se que desde a infância já existem atividades criadoras7, como nas brincadeiras e desenhos infantis. Para Vygotski (1998), a atividade criadora compreende tanto os aspectos cognitivoe volitivo quanto o emocional, pois é a significação da realidade que é objetivada através do desenho e, por seu intermédio, transformada. Considerando o desenhar como uma atividade criadora, pode-se pensar que este expressa os sentimentos do autor e o modo como a realidade é por este apropriada. Porém, ao desenhar, esses sentimentos e significações são transformados, dado a inexorável vinculação entre objetivação e subjetivação que caracterizam o movimento de constituição do sujeito8. Ler um desenho, por sua vez, não é tarefa simples, posto que os signos ali traçados não falam por si só: é preciso interpretá-los, proceder à escuta do que dizem, o que não raro somente pode ser feito com o auxílio da palavra. http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1983-34822008000100002#not07 http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1983-34822008000100002#not08 16 3.0 O PROCESSO DE AQUISIÇÃO DA ESCRITA PELA CRIANÇA: DIALOGANDO COM ALEXANDER ROMANOVICH LURIA O processo de aquisição da escrita pela criança é um assunto que vem sendo discutido há alguns anos. No entanto, ainda muitas inquietações surgem dos contextos contemporâneos em que a escrita ganha ainda mais significado na vida dos sujeitos. A maior parte dos contextos sociais e culturais, de alguma maneira, apresenta interação com a escrita, das mais simples como escrever um bilhete até as mais sofisticadas como operar as diversas tecnologias digitais e que exigem, de alguma maneira, o domínio da escrita. Assim, a aquisição de habilidades da escrita ultrapassa o ensino e a aprendizagem no contexto escolar, tornando-se uma necessidade dos sujeitos inseridos em uma sociedade letrada. Entretanto, frente à necessidade de apropriação do processo de escrita pela criança, salienta-se que esta não é uma habilidade inata, que já nasce com a criança. A escrita é resultado da interação do sujeito humano com os membros de sua espécie, os quais por necessidade de comunicação, ao longo de sua trajetória, criam signos atribuindo-lhes significados culturais. Portanto, a escrita é um dos elementos da cultura e aprendida, principalmente, na escola, enquanto instituição com função social de trabalhar o conhecimento historicamente produzido pela humanidade. 17 Ao pensar o processo de aquisição da escrita por parte das crianças, surgem inquietações que motivam a teorizar sobre o tema a partir de alguns estudiosos. Neste sentido, partindo-se de algumas situações problemas buscou- se tecer, com base nos escritos de Alexander Romanovich Luria, alguns elementos importantes para melhor compreender as seguintes questões: Quando a criança começa a ter noção de escrita? Como se desenvolve o processo de escrita na criança? Como ensinar, às crianças, o processo de aquisição das habilidades da escrita? Qual o papel da escola e do professor no processo de aquisição da escrita pela criança? E outras questões que nortearam o diálogo com Luria neste artigo. Estudar o processo de aquisição da escrita é necessário para a escola, enquanto instituição que trabalha nos processos de ensino e aprendizagem, com o objetivo de problematizar/responder aos desafios que se apresentam todos os dias em suas salas de aula. Isto, principalmente no processo de aquisição da escrita, em razão de que as crianças iniciam o processo de escolarização muito antes de chegar à escola, cabendo ao professor conhecer e compreender como a criança se desenvolve e como ocorre este processo. 3.1 A criança e o desenvolvimento da escrita, segundo Luria Luria (1988) apresenta um estudo sobre a aquisição da escrita desenvolvido com um grupo composto por algumas crianças russas, com idade entre quatro e seis anos que nunca haviam tido contato ou sofrido qualquer influência da escola. Integrava-se também ao grupo uma criança com nove anos que já frequentara a escola, e outra que apresentava deficiência cognitiva. Este 18 estudo foi realizado em 1929, influenciado por Vygotsky, e teve por objetivo pesquisar e analisar, juntamente com as funções de atenção e memória, o desenvolvimento da escrita em crianças russas e camponeses iletrados (GONTIJO, 2002). A abordagem realizada nos estudos de Luria (1988) foi na perspectiva histórico-cultural de Vygotsky, que concebe o desenvolvimento como um processo marcado por descontinuidades e dependente da aprendizagem, e a criança se desenvolve através de mediações de instrumentos e signos. Segundo Vigotski (1998, p. 70) “todas as funções psíquicas superiores são processos mediados, e os signos constituem o meio básico para dominá-las e dirigi-las. O signo mediador é incorporado à sua estrutura como parte indispensável, do processo como um todo”. Para Luria o desenvolvimento da criança acontece a partir da necessidade dela se relacionar com a sociedade. Assim, o desenvolvimento não deve ser visto como resultado de adaptações, mas deve-se compreendera relação da criança com a sociedade construída historicamente a partir das necessidades dos homens (FACCI, 2004). Segundo Vygotsky; Luria, (1996) foi a partir da necessidade de uma relação mais complexa do homem com os objetos e com os outros homens, que surgiu a linguagem, [...] seria incorreto pensar que os sons, que assumiram paulatinamente a função de transmitir certa informação, eram “palavras” capazes de designar com independência os 19 objetos, suas qualidades, ação ou relações. Os sons, que começavam a indicar determinados objetos, ainda não tinham existência autônoma. Estavam entrelaçados na atividade prática, eram acompanhados de gestos e entonações expressivas, razão por que só era possível interpretar o seu significado conhecendo a situação evidente em que eles surgiam. Além do mais, nesse complexo de meios de expressão parece que, a princípio, coube posição determinante aos atos e gestos; estes, segundo muitos autores, constituíram os fundamentos de uma original linguagem ativa ou “linear” e só bem mais tarde o papel determinante passou a ser desempenhado pelos sons, que propiciaram a base para a evolução paulatina de uma linguagem de sons independente. Durante muito tempo, porém, essa linguagem manteve a mais estreita ligação com o gesto e o ato e por isto o mesmo complexo de sons (ou “protovocábulo”) podia designar o objeto para o qual a mão apontava, a própria mão e ação produzida com esse objeto. Só depois de muitos milênios a linguagem dos sons começou a separar-se da ação prática e a adquirir independência. É a essa época que pertence o surgimento das primeiras palavras autônomas, que designavam objetos e bem mais tarde passaram a servir para distinguir as ações e qualidades dos objetos. Surgiu a língua como um sistema de códigos independentes, que durante um longo período histórico posterior de desenvolvimento assumiu a forma que distingue as línguas atuais (Luria, 1979, p. 79). A linguagem foi considerada por Luria como um dos fatores “decisivo que determina a passagem da conduta animal à atividade consciente do homem” (Luria, 1986, p.22). Nesse sentido, a linguagem é entendida pelo autor como necessidade de comunicação no processo de trabalho, que durante muito tempo esteve ligada à atividade humana concreta. Somente após longo processo de complexificação das formas de existência, foi gradativamente se separando da prática e se 20 tornando “um sistema de códigos suficientes para transmitir qualquer informação, inclusive fora do contexto de uma ação prática” (Luria, 1986, p.25). Luria (1988) contrariando muitos psicólogos desenvolvimentistas (que procuravam estudar a escrita na criança no momento em que esta iniciava sua vida escolar) entendia que havia a necessidade de compreender como se desenvolve o processo de aquisição da escrita, antes de ser submetida ao processo sistematizado de alfabetização, já queao começar a escrever seus primeiros registros no caderno, ela não se encontra no seu primeiro estágio do desenvolvimento da escrita. As origens deste processo estão localizadas na pré-história do desenvolvimento das funções superiores do comportamento infantil; portanto, quando a criança atinge a idade escolar, ela já se relacionou, exercitou, interagiu e apropriou-se de habilidades e técnicas que possibilitarão a ela aprender a escrever em um espaço muito pequeno de tempo (GONTIJO, 2002). Pois como afirma (LURIA, 1988, p.143), [...] se apenas pararmos para pensar na surpreendente rapidez com que uma criança aprende esta técnica extremamente complexa, que tem milhares de anos de cultura por traz de si, ficará evidente que isto só pode acontecer porque durante os primeiros anos de seu desenvolvimento, antes de atingir a idade escolar, a criança 21 já aprendeu e assimilou um certo número de técnicas que prepara o caminho para a escrita, técnicas que a capacitam e que tornam incomensuravelmente mais fácil de aprender o conceito e a técnica da escrita. Ao entrar na escola, a criança passa a interagir com um sistema de signos produzidos historicamente pela humanidade para sistematizar e padronizar a escrita, signos que podem ser desconhecidos para ela, caso não tenha tido contato com a escrita sistematizada, embora ela já houvesse adquirido habilidades e técnicas que irão contribuir para a aquisição da escrita formal. Seria importante para os professores “[...] desenterrar essa pré-história da escrita [...] o conhecimento daquilo que a criança era capaz de fazer antes de entrar na escola, conhecimentos a partir do qual eles poderão fazer deduções ao ensinar seus alunos a escrever” (LURIA, 1988, p. 144). Luria (1988) registra que em contraste com certo número de outras funções psicológicas, a escrita pode ser definida como uma função culturalmente mediada através da utilização de instrumentos e signos que possibilitam, via interação social, a transformação do meio e dos sujeitos. O autor esclarece ainda que existem algumas condições prévias que devem estar presentes nas crianças para ela compreender o uso da escrita e aprender que a língua escrita é um sistema de signos os quais não tem significado em si, mas uma função instrumental, funcionando como suporte para memória, registro de ideias e conceitos. A primeira condição remete às coisas que apresentam um significado imediato para a criança ou representam um 22 significado funcional, enquanto auxílio para aquisição de um determinado objeto ou atingir algum objetivo. A segunda refere-se à capacidade da criança em controlar o seu comportamento e estabelecer relações com os objetos ou por interesse ou por seu valor instrumental. A criança começa, neste momento, a desenvolver suas formas complexas do comportamento humano (LURIA, 1988). Isso remete a observar que o processo de apropriação da escrita não acontece da mesma forma, tampouco ao mesmo tempo para toda criança. As habilidades para a escrita e as condições que possibilitam a sua aquisição devem ser compreendidas pelas pessoas que interagem com a criança, pois, quando uma criança faz alguns rabiscos desordenados em uma folha de papel e aponta dizendo que é o seu nome, isto já pode ser considerado como um registro (GONTIJO, 2002). Gontijo (2002) parafraseando Luria escreve que os rabiscos das crianças são os primeiros indícios de escrita pela criança na tentativa de imitar a escrita realizada pelos adultos com que esta interage. “Esses primeiros rabiscos ou garatujas produzidos pela criança [...] dizem respeito às formas externas da escrita, e a escrita é um conhecimento que não se reduz à sua externalidade” (GONTIJO, 2002, p. 17). A escrita é muito mais que imitação de gestos ou riscos ela é carregada de significados adquiridos nos contextos culturais. Assim, a escrita é um meio para recordar, para representar algum significado (LURIA, 1988). 23 Durante as investigações acerca da escrita das crianças Luria observou que por volta dos três a cinco anos de idade as crianças rabiscam como se fosse uma brincadeira. Ou seja, “nesse estágio de desenvolvimento, na realidade ainda não constituem uma escrita ou mesmo um auxílio gráfico, mas apenas desenhos no papel” (LURIA, 1988, p.156). Assim, as crianças quando rabiscam organizam de tal maneira os rabiscos para que possam lembrar com facilidade o significado do que estaria representado pelos rabiscos (GONTIJO, 2002, p. 17). No entanto, muitas vezes as crianças organizam os rabiscos, ao se remeterem aos mesmos não lembravam mais o que significavam. Conforme escreve Oliveira (2010, p. 71): As crianças imitavam o formato da escrita do adulto, produzindo apenas rabiscos mecânicos, sem nenhuma função instrumental, isto é, sem nenhuma relação com os conteúdos a serem representados. Obviamente este tipo de grafismo não ajudava a criança em seu processo de memorização. Ela não era capaz de utilizar sua produção escrita como suporte para a recuperação da informação a ser lembrada. Para Luria (1988) esta fase do grafismo se apresenta como sinais primários da escrita, porém ainda não podem ser chamados de signo simbólico, porque nem sempre a criança recorda os seus significados. Nesta fase a escrita 24 é imitativa, o grafismo realizado pela criança não a ajuda a lembrar do que ela fez em razão de a criança não ter desenvolvido a função mnemônica. Ou seja, a criança não é capaz de “utilizar sua produção escrita como suporte para recuperação da informação a ser lembrada” (OLIVEIRA, 2010, p. 71). Pode-se inferir que Luria faz uma comparação da pré-escrita (rabiscos) realizada pela criança com as primeiras tentativas de escrita realizadas pelos primórdios. Assim, evidenciasse que a escrita é uma criação cultural e por meio da qual o sujeito vai estabelecendo relações sociais. A criança ao estabelecer relações externas com a escrita por meio das vivências, faz com que a escrita vá ganhando significação e passa a ser internalizada por meio das mediações que vão ocorrendo. À medida que estes processos ocorrem às funções psicológicas superiores se desenvolvem e os conceitos do uso social da escrita na cultura, vão sendo apropriados, muitas vezes, mesmo sem a criança conhecer o sistema de escrita alfabética. 25 A criança desde que nasce estabelece relação com o mundo que a circunda seja ele de natureza física ou humana. É nas relações e interações com os sujeitos humanos que a criança desde que nasce vai se comunicando, primeiramente por meio de uma linguagem rudimentar (choro, resmungos, gestos, entre outros) que vai ganhando significado cultural e, nestes contextos, se apropria de aprendizagens e desenvolve a fala. Também, nestes espaços vai interagindo com signos e os significados destes na e pela cultura. Prosseguindo o processo de desenvolvimento da aquisição da escrita, a criança também apresenta a fase topográfica em que distribui registros, rabiscos como manchas, linhas no “espaço de papel” “sem relação com o conteúdo das sentenças faladas, produzindo o que Luria chama de ‘marcas topográficas’: “[...] essas marcas ainda não são signos, mas fornecem pistas rudimentares que poderão auxiliar na recuperação da informação” (OLIVEIRA, 2010, p. 73). Na fase topográfica da escrita as crianças começam a fazer relação da escrita com as sentenças faladas. Assim, para as frases curtas são registradas marcas curtas, frases longas identificadas por marcas longas. As marcas realizadas pela criança no papel são os primeiros rudimentos que mais tarde se tornarão a escrita (LURIA, 1988). Paralela à fase topográfica se desenvolve a fase pictórica, em que os desenhos têm a função simbólica, do que a criança deseja supostamente representar. “A fase pictográfica do desenvolvimento da escrita baseia-se na rica26 experiência dos desenhos infantis, os quais, em si mesmos, não precisam desempenhar a função de signos mediadores em qualquer processo intelectual” (DEMENECH, 2012, p. 88). Nesse sentido, o desenho ocupa o lugar da palavra e alguns elementos gráficos passam a ser incorporados nos registros da criança. Nesta fase a criança começa a utilizar outras marcas para representar a sua escrita. Passa a desenhar dizendo que está escrevendo e os desenhos passam a serem signos mediadores e representam determinado conteúdo, ou algo que a criança diz que escreveu. “O desenho transforma-se, passando de simples representação para um meio, e o intelecto adquire um instrumento novo e poderoso na forma da primeira escrita diferenciada” (LURIA, 1988, p. 166). Assim, a escrita passa a ter para a criança valor simbólico. E outros elementos começam a aparecer nos registros de escrita como “número, forma, cor, são introduzidos e influenciam a escrita que se torna diferenciada e permite que a criança, pela primeira vez, leia o que escreveu” (COELHO, 2012, p. 67). Quando a criança chega a esta fase dá um salto significativo no processo de aquisição da escrita enquanto elemento da cultura passando a representar em seus escritos signos como números, letras e sinais que observa nas interações sociais e culturais letradas. Dessa forma, à medida que a criança vai se desenvolvendo vai assimilando alguns conceitos referentes à relação da fala com a escrita e, assim, a escrita da criança começa a ter representação simbólica. Assim, a escrita realizada pela criança” sai do nível da imitação mecânica para o status de instrumento funcionalmente empregado. Pode ocorrer que a criança utilize a escrita pictográfica como recurso, se ela não conhece as letras ainda” (COELHO, 27 2012, p. 68). No entanto, quando a criança consegue perceber a diferença entre desenhar e escrever passa a rejeitar a escrita pictográfica e busca grafar letras mesmo sem o domínio propriamente dito da escrita convencional (OLIVEIRA, 2010, p. 74). Porém, ao acompanhar o desenvolvimento de crianças, observa-se que nem todas as crianças passam, prioritariamente pelas fases acima descritas. Atualmente, a maioria das crianças desde muito cedo está em contato com o mundo letrado, o que lhes permite construir memórias e percepções acerca do processo de aquisição da escrita sem que, muitas vezes, passem pelo processo descrito, conforme estudos realizados por Luria por volta dos anos de 1920. Isto ocorre porque atualmente as crianças ingressam mais cedo na escola, são alfabetizadas mais cedo e vivem em um meio que a presença da língua escrita é muito marcante. “Assim sendo, o sistema simbólico da escrita interfere antes e mais fortemente no processo de desenvolvimento da criança” (OLIVEIRA, 2010, p. 74). Desse modo, a criança vai se desenvolvendo biológico e culturalmente, assimilando aspectos simbólicos e passando a compreender que a escrita enquanto representação da fala apresenta algumas especificidades de signos que tornam o processo de escrita mais bem compreendido. 28 3.2 O papel da escola e do professor no processo do ensino e da aprendizagem da escrita pela criança Quando a criança inicia a escolarização é colocada em contato mais direto com o sistema de escrita que circula na sociedade. Assim, muitas informações acerca da elaboração e apropriação da escrita começam a fazer parte das atividades escolares. Desta forma, a criança vai se apropriando de alguns conceitos e regras que estruturam a escrita e passa a assimilar aspectos simbólicos e compreender que a escrita é a representação da fala e que para isso existem algumas especificidades de signos que tornam o processo de escrita mais bem compreendido. É comum as crianças desenharem em diferentes suportes ao iniciarem o processo de escrita. Luria (1986, p. 173) ressalta que “o período de escrita por imagens apresenta-se plenamente desenvolvido quando a criança atinge a idade de cinco, seis anos; se ele não está claro e completamente desenvolvido nessa época é apenas porque já começou a ceder lugar à escrita alfabética simbólica, que a criança aprende na escola e às vezes mesmo antes”. Ainda, referindo-se ao desenvolvimento da escrita pela criança Luria (1986) enfatiza, [...] que o desenvolvimento da escrita na criança prossegue ao longo de um caminho que podemos descrever como a transformação de um rabisco não diferenciado para um signo diferenciado. Linhas e rabiscos são substituídos por figuras e imagens, e estas dão lugar a signos. Nesta sequência de acontecimentos está todo o caminho do 29 desenvolvimento da escrita, tanto na história da civilização como no desenvolvimento da criança (LURIA, 1986, p. 161). Sendo assim, acredita-se ser relevante a criança conhecer a história da escrita para as civilizações, enquanto marco evolutivo nas comunicações entre os povos, se apropriando assim de conhecimentos históricos, culturais e sociais que marcam a relação do homem com a natureza, entendendo natureza como tudo o que envolve os sujeitos nas mais diversas relações que este estabelece. O processo de ensino da escrita para as crianças exige que o professor conheça como ela se desenvolve, para assim, realizar mediações significativas para que a criança se aproprie do sistema de escrita alfabética considerando as experiências de letramento que esta vivência em seus contextos. Neste sentido, Oliveira (1998) ressalta que, É de fundamental importância que, desde o início, a alfabetização se dê num contexto de interação pela escrita. Por razões idênticas, deveria ser banido da prática alfabetizadora todo e qualquer discurso (texto, frase, palavra, “exercício”) que não esteja relacionado com a vida real ou o imaginário das crianças, ou em outras palavras, que não esteja por elas carregado de sentido (OLIVEIRA, 1998, p. 70‐71). 30 Com base nos autores abordados, identifica-se que a escrita enquanto produção cultural do sujeito humano é construída a partir de necessidades destes de se comunicar com seus pares. “A escrita não é algo natural no desenvolvimento do ser humano, mas algo que se aprende dentro da cultura e, por isso, necessita do esforço de quem aprende e de quem ensina” (DUARTE, 2014, p. 4). Portanto, a escrita não é algo inato, mas apreendida e significada pelos sujeitos nas relações sociais que este vai estabelecendo ao longo de seu desenvolvimento. Neste sentido, entende-se como fundamental que a escola, no seu fazer pedagógico, no tocante a aquisição dos processos da escrita, reveja seu fazer pedagógico. Pois, Até agora, a escrita ocupou um lugar muito estreito na prática escolar, em relação ao papel fundamental que ela desempenha no desenvolvimento cultural da criança. Ensina-se as crianças a desenhar letras e construir palavras com elas, mas não se ensina a linguagem escrita. Enfatiza- se de tal forma a mecânica de ler o que está escrito que se acaba obscurecendo a linguagem escrita como tal (VYGOTSKY, 1998, p. 139). Vygotsky (1998) observa que existe diferença entre a apropriação da escrita e a linguagem escrita, uma vez que o ensino da linguagem escrita depende de um treinamento artificial. Tal treinamento requer atenção e esforços enormes, por parte do professor e do aluno, podendo-se, dessa forma, tornar 31 fechado em si mesmo, relegando a linguagem escrita para segundo plano (VYGOTSKY, 1998). Nessa perspectiva, o processo de aquisição da escrita pela criança necessita ser compreendido a partir de contextos culturais e históricos de desenvolvimento e inserção dos sujeitos humanos. Assim, como o sujeito não nasce pronto, mas se constrói humano nas relações que estabelece com os membros de sua espécie, também a escrita não é um processo nato no sujeito, mas construída nas relações dos sujeitos humanos em situações concretasque envolvem a escrita. 4.0 O DESENHO NA AVALIAÇÃO PEDAGÓGICA E PSICOPEDAGÓGICA A criança, desde muito pequena até a fase adulta, geralmente é proposta o desejo em ler e desenhar e com isto postergar suas habilidades, reflexos, aptidões, compreensões etc. Qualquer cantinho vazio de papel, qualquer lugar que possa ser rabiscado, lá será impresso os sentimentos intrínsecos de uma pessoa, que seja bem nova em idade ou até bem avançada em dias. O estimulo à arte é muito importante, pois o ato de desenhar deve ser considerado um fator essencial no processo do desenvolvimento da linguagem, bem como uma espécie de documento que registra a evolução da criança, ao desenhar, a criança desenvolve a auto expressão e atua de forma afetiva com o mundo, opinando, criticando, sugerindo, através da utilização das cores, formas, 32 tamanhos, símbolos, entre outros, exprimindo assim seus medos, anseios, descontentamentos e demonstrando amor, amizade, ingenuidade. Desenho é uma forma de manifestação da arte, o artista transfere para o papel imagens e criações da sua imaginação. É basicamente uma composição bidimensional (algo que tem duas dimensões) constituída por linhas, pontos e forma. É diferente da pintura e da gravura em relação à técnica e o objetivo para o qual é criado. O desenho é utilizado nos mais diversos segmentos profissionais, tornando a arte diversificada a diferentes contextos, com isto, a riqueza do grafismo infantil possibilita à criança não só o prazer em desenhar, mas também todos esses aspectos da educação infantil. Ao desenhar ela constrói um espaço ao seu redor. Observá-la é fundamental para que possamos entendê-la, pois para este pequeno ser, o desenho é a sua linguagem e sua primeira escrita. O desenho é para a criança um modo muito significativo e prazeroso de expressão e de representação e que transita entre o real e o imaginário. Desenhar e rabiscar são formas de comunicação e expressão desde os primórdios da humanidade, mas para a criança nem sempre o importante é atribuir significados aos seus rabiscos, pois quando descobre as propriedades do giz, do lápis e da tinta os explora e diverte-se com as novas descobertas, quando rabisca está desenvolvendo sua criatividade e ampliando sua capacidade de expressar-se. 33 Com o passar do tempo, esses rabiscos e desenhos passam a ser feitos intencionalmente e a criança começa a usar o desenho para comunicar seus pensamentos, desejos, emoções, exteriorizar seus sentimentos e brincar com a realidade, seu desenho ganha simbologia e significação potencializando sua capacidade de criar. O primeiro desenho simbólico em sua maioria é o da figura humana. Com isso, desenvolveram-se as fases do desenho que são: Garatuja desordenada; Garatuja ordenada (longitudinal); Garatuja ordenada (circular); Garatuja nominada (mescla); Pré esquema (1º fase); Pré esquema (2º fase); Pré esquema (3º fase); Esquema; Início do Realismo. (LUQUET, 1969) Cabe ao educador e psicopedagogo durante o desenhar de uma criança estimular o desenvolvimento emocional e afetivo. Durante esse breve momento de desenhar a criança cria uma comunicação gráfica ela vai retratar o seu ser, seus sonhos, conflitos, medos. O educador pode traçar com ajuda de um psicopedagogo as correções necessárias para ajudar na formação desse futuro adulto. 4.1 Estímulo e métodos de inserção à arte O desenho tem papel fundamental na formação do conhecimento e requer grande consideração no sentido de valorizar desde o início da vida da criança, considerando a bagagem que trás de casa, assim como seu próprio dia-a-dia. O ato de desenhar deve ser considerado um fator essencial no processo do desenvolvimento da linguagem, bem como uma espécie de documento que registra a evolução da criança. 34 A criança ao desenhar desenvolve a auto expressão e atua de forma afetiva com o mundo, opinando, criticando, sugerindo, através da utilização das cores, formas, tamanhos, símbolos, entre outros. São de ressaltar que o professor deve oferecer para seu aluno a maior diversificação possível de materiais, fornecendo suportes, técnicas, bem como desafios que venham favorecer o crescimento de seu aluno, além de ter consciência de que um ambiente estimulante depende desses fatores colocados, permitindo a exploração de novos conhecimentos. “O ensino de arte constituirá componente curricular obrigatório nos diversos níveis da educação básica, de forma a promover o desenvolvimento cultural dos alunos.” (MACHADO, 2008, p.30). Partindo do pressuposto de que não são oferecidos tais suportes, a tendência é que o aluno bloqueie sua criatividade, visto que não lhe foram oferecidas tais condições. A importância de valorizar o desenho desde o início da vida da criança se dá pelo fato da necessidade que o universo infantil tem em ser estimulado, desafiado, confrontado de forma que venha enriquecer as próprias experiências da criança. Valorizando a arte, ou seja, o desenho na escola, o professor levará o aluno a se interessar pelas produções que são realizadas por ele mesmo e por seus colegas, bem como por diversas obras consideradas artísticas a nível regional, nacional e internacional. 35 A história da arte no Brasil teve início na primeira metade do século XX com a disciplina de desenho, trabalhos manuais, música e conto orfeônico, fazendo parte do currículo das escolas primárias e secundárias. Entre os anos 20 e 70 o ensino de arte volta-se para o desenvolvimento natural da criança, no período que vai dos anos 20 aos dias de hoje vive-se um crescimento cultural tanto dentro quanto fora das escolas (BRASIL, 1998). Enquanto mediador do conhecimento, o professor é essencial para incentivar o aluno, seja ele pelo caminho da arte ou por outra área do conhecimento, oferecendo os melhores suportes, de forma que venha a somar no crescimento e formação dele. Estes desenhos, no entanto, apresentam através das interpretações, atitudes negativas e/ou positivas, pois a criança desenha situações e/ou objetos da maneira que os interpreta, de acordo com a realidade em que vive, da maneira que enfrentam o desafio de viver dia após dia e da capacidade de ver e explorar o mundo em que vive. O Psicopedagogo assim como o Psicólogo, tem habilidades para trabalhar com a criança através do desenho infantil, pois é através de um processo avaliativo e não só do desenho isolado, que estes profissionais podem detectar algo importante que a criança esteja tentando nos transmitir. Através deste processo, pode-se detectar, por exemplo, problemas emocionais, comportamentais, escolares, no âmbito familiar, depressão, entre outros. Verificado o problema, encaminha-se então a criança ao profissional habilitado para realização da terapia adequada. A arte é uma disposição natural do homem, cultivada desde a infância. Nas escolas, deveria aparecer em todas as matérias, de forma diversificada e está até ligada com a religião, com o eterno (FROEBEL 1864, p. 44 – 47). Por meio do desenho infantil é possível fazer uma avaliação intelectual na criança e um excelente diagnóstico, se for realizado testes tipo projetivos, que avalia os vínculos relacionais que podem interferir no processo de aprendizagem, tais como, Alegoria Animais, Par Educativo, Os quatro momentos do dia, Desenho livre, Família Educativa, Plano de minha casa, Desenhos em episódios e o Dia do meu aniversário. 36 O que demonstrou que falar sobre o desenho infantil é falar em desenvolvimento, aquisição de conhecimentos, construção de conceitos, organização de ideias, formulação de opiniões, capacidade intelectual e de comunicação. A riqueza do grafismo infantil possibilita à criança não só o prazer em desenhar, mas também todos esses aspectos da educação infantil. Ao desenhar ela constrói um espaço ao seu redor. Observá-la éfundamental para que possamos entendê-la, pois para este pequeno ser, o desenho é a sua linguagem e sua primeira escrita. Nele são mostrados seus medos, inseguranças, ansiedades, alegrias e descobertas. A criança não nasce sabendo desenhar, que este conhecimento é construído a partir da sua relação direta com o objeto, assim são suas estruturas mentais é que definem as suas possibilidades quanto à representação e interpretação do objeto. Assim a criança é o sujeito de seu processo, ela aprende a desenhar a partir de sua interação com o meio. (PILLAR, 1996, p. 21) 37 4.2 O desenho é espontâneo ou é fruto da cultura? Entre os principais estudiosos, há uma cizânia. Há os que defendem que o desenho é espontâneo e o contato com a cultura visual empobrece as produções, até que a criança se convence de que não sabe desenhar e para de fazê-lo. E há aqueles que depositam justamente no seu repertório visual o desenvolvimento do desenho. Nas discussões atuais, domina a segunda posição. “A única coisa que sabemos ser universal no desenho infantil é a garatuja. Todo o resto depende do contexto cultural” (LAVELBERG, 2001, p.56) Detalhes da figura humana, noções de perspectiva e realismo visual são elementos da evolução do desenho. Essa perspectiva não admite o empobrecimento do desenho infantil, mas entende que a criança reconhece a forma de representar graficamente sua cultura e deseja aprendê-la. Assim, cai por terra o mito de que ela se afasta dessa prática quando se alfabetiza. O desenho é uma forma de linguagem que tem seus próprios códigos e para se aproximar do que ele expressa, é preciso fazer uma escuta atenta enquanto ele é produzido e a relação entre a aquisição da escrita e a diminuição do desenho ocorre porque a escola dá pouco espaço a este quando a criança se alfabetiza. (MARTINS, 2012, P.50) 38 4.3 O desenho infantil O desenho é para a criança um modo muito significativo e prazeroso de expressão e de representação e que transita entre o real e o imaginário. Desenhar e rabiscar são formas de comunicação e expressão desde os primórdios da humanidade, mas para a criança nem sempre o importante é atribuir significados aos seus rabiscos, pois quando descobre as propriedades do giz, do lápis e da tinta os explora e diverte-se com as novas descobertas, quando rabisca está desenvolvendo sua criatividade e ampliando sua capacidade de expressar-se. Com o passar do tempo, esses rabiscos e desenhos passam a ser feitos intencionalmente e a criança começa a usar o desenho para comunicar seus pensamentos, desejos, emoções, exteriorizar seus sentimentos e brincar com a realidade, seu desenho ganha simbologia e significação potencializando sua capacidade de criar. O primeiro desenho simbólico em sua maioria é o da figura humana. “O desenho relaciona-se intimamente com o psiquismo e moral. Ele é uma representação mental que vem da intenção de desenhar os objetos e isto prepondera no espírito desenhador.” (LUQUET, apud MERLEAU-PONTY, 1990, p.130). 39 O desenho é uma representação gráfica de um objeto real ou de uma ideia abstrata. O desenho é uma das formas de expressão mais antigas da humanidade. Utiliza-se o desenho como uma forma de comunicação desde a pré-história, quando os primeiros homens, através de pequenas figuras desenhadas nas rochas e nas paredes das cavernas, manifestavam suas ideias e pensamentos entre si. (DESENHO INFANTIL. GUIA DA CRIANÇA, 2010) Através do desenho as crianças brincam, experimentam ideias, emoções e pensamentos, representam o mundo a partir das relações que estabelecem com o outro e com o meio em que vivem. As etapas e os estágios do desenho infantil definidos e estudados por Lowenfeld nos ajuda a compreender e observar o desenvolvimento da criança, embora ele mesmo afirma que não é fácil perceber a transição dessas etapas, além de não ocorrerem na mesma fase e da mesma maneira para todas as crianças. Segundo ele, a primeira etapa é o “Estágio das Garatujas” que acontece por volta dos dois anos de idade. Nessa fase a criança rabisca sem intenção e sem controle de forma desordenada e que aos poucos vai percebendo seus movimentos e controlando e organizando mais seus traçados. Explora e experimenta os movimentos de seu corpo e o espaço. 40 A etapa do rabisco (garatujas) - dos 3 aos 6 anos de idade; a etapa do realismo fortuito - dos 6 aos 9 anos de idade; a etapa do realismo falhado - dos 9 aos 12 anos de idade; a etapa do realismo intelectual - dos 12 aos 14 anos de idade; a etapa do realismo virtual - a partir dos 14 anos de idade. (DESENHO INFANTIL. GUIA DA CRIANÇA, 2010) Investigar as diferenças existentes entre os tipos de abordagem que sistematizam a questão da interpretação e avaliação do desenho. A evolução dos seus desenhos se faz por etapas e pode variar conforme o estado da criança. Uma criança com raiva, por exemplo, irá rabiscar com energia e ininterruptamente; a triste ou angustiada expressará seus desenhos com traços negros ou barras riscando o que acabou de produzir, com tons fortes e riscos grosseiros e contínuos. Isso é apenas um indício, pois nunca se deve interpretar um desenho isoladamente ou por suposições, intuições é necessário uma profunda analise para que este diagnóstico seja certo e sem erros, para que os psicopedagogos e os profissionais de ensino-aprendizagem consigam realizar seus trabalhos de forma simples e sucinta, acarretando nas crianças/pacientes um crescimento com grandes progressos e surpreendentes ascensões intelectuais. As crianças privilegiam uma folha de papel branca e lápis de cera para exprimir as suas opiniões, sentimentos e medos – muito mais do que a comunicação verbal. É esta a forma que a criançada encontra para contar uma história que terá, invariavelmente, representações de cenas e de pessoas da sua vida real. Um desenho encerra um sem número de significados, presentes em pequenos pormenores que podem não ser imediatamente evidentes, mas que com um olhar mais atento podem revelar algo que possa estar a afetar a criança de forma negativa. (BETHANIA, 2012, P.30) É de extrema importância que o educador tenha um “olhar pensante” em relação aos seus alunos, principalmente no que se refere ao desenho infantil. Infelizmente a escola se preocupa mais com a linguagem ensinada do que com a linguagem natural dos pequeninos, que é o desenho. Daí a necessidade de se investir primeiro na educação do educador, pois sem isso as crianças perderão o seu dom natural mais belo de se comunicar e expressar. 41 O papel do educador deve ser o de orientar, levar, mediar, encaminhar o aluno às descobertas que o mundo lhe oferece, ampliando suas capacidades e potencialidades e estabelecendo princípios que nortearão estas conquistas. Respeitar suas individualidades e seu processo de desenvolvimento, incentivar a estética e motivar são meios de auxiliar as relações que a criança vai estabelecer entre as suas conquistas e descobertas. Enfim o desenho dever ser visualizado como possibilidade de brincar, o de falar de registrar, marca o desenvolvimento da infância, porém em cada estágio, o desenho assume um caráter próprio. Estes estágios definem maneiras de desenhar que são bastante similares em todas as crianças, apesar das diferenças individuais de temperamento e sensibilidade. Uma área específica e alvo de estudo intensivo, os desenhos infantis são matéria privilegiada no campo da psicologia, o que significa que nem os professores ou educadores de infância estão completamente treinados para decifrar desenhos. Porém, existem sinais de alerta, presentes nos desenhos das crianças, que podem despertar pais e professores para situações anormais. Os terapeutas especialistas afirmam que a interpretação dos desenhos deve ser feita consoante a idade da criança, ou seja, um desenho todopreto feito por uma criança de 2 anos pode não ter nenhuma conotação negativa, uma vez 42 que esta ainda não tem uma consciência clara da escolha das cores, ao invés de uma criança mais velha, com 4 ou 5 anos. O especialista deve levar em conta a condição biográfica e familiar da pessoa que desenhou, bem como sua história pessoal, que servirá como marco de referência de quem está fazendo o desenho. Além disso, é necessário levar em conta que um desenho é importante, mas não define tudo. É uma expressão de sentimentos e de desejos que podem ajudar, a saber, por exemplo, como se sente a criança a respeito da sua família, sua escola etc. (INTERPRETAR O DESENHO DE UMA CRIANÇA. GUIA INFANTIL. 2013, p.62) No entanto, os psicólogos vão mais longe nesta matéria e defendem ainda a importância de não avaliar o desenho isoladamente, mas de considerar, para além da idade da criança, a sua personalidade, o seu desenvolvimento cognitivo e ainda o seu histórico de desenhos. Em adição, há, naturalmente, o contexto do desenho, ou seja, sugere-se que o adulto fale frequentemente com a criança sobre aquilo que desenha. Deve estar atento a: Cores utilizadas e vivacidade das mesmas; Força ou interrupção do traço; Existência de sombras; Isolamento de determinadas figuras (fechadas dentro de um quadrado ou de um círculo, por exemplo); Ausência de determinadas figuras ou representação das mesmas numa escala muito reduzida; Agressividade de determinadas figuras; A criança passa a desenhar, continuadamente, cenários de violência; Desenha repetidamente a mesma 43 figura; Se alguma figura é riscada ou apagada, depois de desenhada; Desenha figuras sem cabeça ou sem rosto; Não consegue desenhar-se a si próprio, numa imagem de família; Desenha cenários que não são adequados à sua idade. Um distúrbio que além do seu comportamento também é diagnosticado por meio dos desenhos e grafismos é o autismo que é uma disfunção global do desenvolvimento. É uma alteração que afeta a capacidade de comunicação do indivíduo, de socialização (estabelecer relacionamentos) e de comportamento (responder apropriadamente ao ambiente — segundo as normas que regulam essas respostas). Esta desordem faz parte de um grupo de síndromes chamado transtorno global do desenvolvimento (TGD), também conhecido como transtorno invasivo do desenvolvimento (TID), do inglês pervasive developmental disorder (PDD). Entretanto, neste contexto, a tradução correta de “pervasive” é “abrangente” ou “global”, e não “penetrante” ou “invasivo”. Mais recentemente cunhou-se o termo Transtorno do Espectro Autista (TEA) para englobar o Autismo, a Síndrome de Asperger e o Transtorno Global do Desenvolvimento Sem Outra Especificação. Os transtornos do Espectro do Autismo (TEA) constituem um grupo de condições que, por um lado, tem sido mais frequentemente identificada e, por outro, tem atraído interesse de profissionais de várias áreas do conhecimento. (SCHWARTZMAN & ARAÚJO, 2011, p. 15) 4.4 Fases/ etapas do desenho infantil Com a realização deste artigo busca-se facilitar aos educadores e profissionais psicopedagogos a compreensão das etapas do desenvolvimento do desenho infantil, visando melhores resultados no desenvolvimento da criança na educação infantil. Desse modo, o presente trabalho procurará refletir sobre as características das fases de desenvolvimento, bem como as mudanças geradas pelas intervenções e consequentemente, a influência destas no desenvolvimento do grafismo na criança, contribuindo para uma compreensão mais ampla do desenvolvimento do desenho infantil, além de reflexões importantes sobre as implicações educacionais da atividade gráfica. 44 Deixar que o desenho fluísse normalmente é deixar que ela se desenvolvesse harmoniosamente com o seu meio. Na medida em que a criança cresce, seu desenho sofre modificações. Muitas vezes o educador não tem compreensão das fases do grafismo por que passa a criança, e são dados desenhos para colorir, perdendo o prazer de desenhar para o dever de fazer o que é imposto. Mas, as personalidades são distintas, distintos estilos, as motivações e o valor das coisas (BRAGA, 1974, p. 99). Existem várias teorias que tentam desvendar o processo de desenvolvimento da criança e cada uma delas têm práticas educacionais diferenciadas. A proposta aqui presente é a de observar e perceber como a criança encontra significações enquanto desenha, em quais fases de desenvolvimento ela se encontra e como passa de um estágio para outro. Quando a criança começa a utilizar elementos tais como os gráficos universais, ela percebe que pode comunicar-se, entrar em contato com os outros. É um processo de comunicação, de função social. Em determinadas fases, a criança ainda não possui uma compreensão intelectual que lhe permita expressar-se adequadamente, mas através do seu desenho, isto lhe é possível. Ela se modifica e é modificada ao desenhar, sofre transformações que lhe propiciam o seu desenvolvimento cognitivo e a percepção do mundo que a rodeia de forma criativa. 45 Tendo a escola a função de fazer com que a criança melhore a cada dia sua forma de lidar com nosso meio e entender que esse não é só físico, mas constantemente influenciado pela emoção, sentimentos e pensamentos, integramos um trabalho de reflexão e ação. Quando um pai ou uma mãe, sedentos pelo sucesso escolar de seus filhos, depositam nos profissionais do processo ensino–aprendizagem, elevada carga de esperança na prosperidade intelectual de seus filhos, então, todo e qualquer recurso que auxilie na descoberta das causas dos problemas da aprendizagem tornam–se como que peças preciosas de um processo, cuja recompensa vem em forma de lágrimas nos olhos, arrepios e abraços pela felicidade do obstáculo vencido e dos limites superados por seus pequenos prodígios. “O ato de desenhar envolve a atividade criadora; é através de atividades criadoras que a criança desenvolve sua própria liberdade e iniciativa e outros o que permitirá.” (LOWERNFELD, 1970 p. 16). Mas para que haja tal sucesso na intelectualidade destas crianças/pacientes é necessário que estes profissionais sofram uma atualização temática, no tocante ao estudo do construto infantil e na aplicação prática da leitura dos desenhos para potencializar os processos de ensino-aprendizagem e intervenções psicopedagógicos. Não se trata de técnica psicodiagnóstico cujas prerrogativas de estudo e aplicação são restritas a médicos e psicólogos. A abordagem é meramente psicopedagógicos e de inspiração psicanalítica. 46 A criança rabisca pelo prazer de rabiscar, de gesticular, de se aprimorar. O grafismo que daí surge é essencialmente motor, orgânico, biológico, rítmico. Quando o lápis escorrega pelo papel, as linhas surgem. Quando a mão para, as linhas não acontecem. Aparecem, desaparecem. A permanência da linha no papel se investe de magia e esta estimula sensorialmente a vontade de prolongar este prazer (DERDYK, 2004, p.56). Aprofundar as questões referentes à avaliação e a interpretação do desenho por parte dos profissionais envoltos no ambiente escolar, tais como professores, orientadores, psicopedagogos. Tanto no ambiente de sala de aula quanto em consultórios e como essa interpretação e avaliação auxiliam no desenvolvimento cognitivo, emocional e psicomotor do aluno/paciente. Segundo Piaget (1976) a capacidade de criação e inovação supõe construções efetivas e não simples representações fiéis da realidade e classifica as etapas do desenho como: 47 48 49 4.5 A importância do Psicopedagogo No complexo processo que envolve a aprendizagem, revela-se significante a atuação preventiva do psicopedagogo no contexto escolar, onde muitas informações e vários aspectos têm que ser observados e analisados.Ter conhecimento de como o aluno constrói o seu saber, compreender as dimensões das relações com a escola, com os professores, com o conteúdo e relacioná-los aos aspectos afetivos e cognitivos, permite um fazer mais fidedigno ao psicopedagogo. Deve-se considerar que o desenvolvimento do aprendente se dá de forma harmoniosa e equilibrada nas diferentes condições orgânica, emocional, cognitiva e social. O desenvolvimento do desenho requer duas condições, primeiramente o domínio motor. Assim a criança começa a perceber que pode representar graficamente um objeto e a relação desenvolvida com a fala existente ao desenhar e a linguagem verbal é a base da linguagem gráfica. (VYGOTSKY. 2007, p.141) O desenho pode ser na infância, um canal de comunicação da criança com o seu mundo exterior, segundo os psicólogos da UDPE de San Salvador, por ética, só uma pessoa especializada, como alguns psicopedagogos, pode interpretar os desenhos, seguindo protocolos estabelecidos para esse fim. O 50 especialista deve levar em consideração a condição biográfica e familiar da criança/paciente (sentimentos e emoções), bem como sua história pessoal, que servirá como marco de referência de quem desenhou. O desenho não é tudo, mas é um grande contribuinte para a realização dói diagnostico emocional e intelectual da criança/paciente. Uma das principais ferramentas utilizadas no Diagnóstico Psicopedagógico é a análise de testes projetivos, cuja finalidade é a projeção de conteúdos presentes no inconsciente da criança de forma concreta, ou seja, por meio da utilização de figuras prontas ou de desenhos feitos por ela. A partir dessa análise é possível verificar e levantar hipótese sobre a modalidade de aprendizagem, o vínculo com o ser que ensina e com a família. A criança, ao desenhar, tem uma intenção realista. O realismo evolui nas diferentes fases do desenho infantil até chegar ao realismo visual, que é o realismo do adulto. Para o adulto, o desenho tem que ser idêntico ao objeto. Já para a criança, o desenho, para ser parecido com o objeto, deve conter todos os elementos reais do objeto, mesmo invisíveis para os outros. Assim, a criança desenha de acordo com um modelo interno: a imagem que sabe do objeto que vê. (PIAGET. 1971, p.126) É isso que difere os testes projetivos utilizados na Psicopedagogia dos testes utilizados na Psicologia, pois os últimos são voltados para a investigação da personalidade e comportamento, dentro do âmbito emocional. Testes como 51 o par educativo, o desenho da família, da figura humana e outros, são muito utilizados em consultório; no entanto a aplicação do desenho livre com o objetivo de avaliar o desenvolvimento cognitivo é pouco utilizado e conhecido. Este teste pode ser uma ferramenta importantíssima para avaliar e detectar um possível atraso no desenvolvimento cognitivo da criança, tanto na clínica como em sala de aula. Aprender a questionar os desenhos infantis é essencial para o acompanhamento dos avanços em relação à construção do pensamento infantil, é mediante aos questionamentos que aprendemos a compreender muitas coisas que as crianças representam através de seus desenhos e que muitas vezes podem ser interpretadas erroneamente Toda criança desenha. Tendo um instrumento que deixa uma marca: A varinha na areia, a pedra na terra, o caco de tijolo no cimento, o carvão nos muros e calçada, o lápis, o pincel com tinta no papel, a criança brincando vai deixando sua marca, criando jogos, contando histórias. Desenhando, cria em torno de si um espaço de jogo, silencioso e concentrado ou ruidoso seguido de comentários e canções, mas sempre um espaço de criação. A criança desenha para brincar (MOREIRA, 2008, p.15). O desenho permite ao professor uma série de pistas sobre a criança que encontra no mesmo a sua maneira de ler o mundo. Os professores, muitas das vezes, não acreditam que o desenho desempenha um papel tão importante na 52 construção do pensamento da criança não dispensando a ele a sua devida importância em sala de aula. Mas o que foi observado durante o estudo sobre o desenho infantil e suas contribuições no processo da aprendizagem é que o conhecimento das etapas evolutivas do desenho infantil fornece ao professor mais um instrumento para compreender as crianças, somando esse conhecimento à análise constante dos seus trabalhos e considerando sempre o significado mais profundo do ato de desenhar como expressão de ideias e sentimentos, o professor poderá orientar suas ações pedagógicas. Ao observar o desenho de uma criança, pode aprender muito sobre o seu modo de pensar e sobre as habilidades que possui. Quando, em um desenho, os braços de uma figura humana saem da cabeça e não do tronco, por exemplo, significa que a criança ainda não tem construído interiormente, em seu pensamento, o esquema corporal de uma figura humana. (PILLAR, 1996). Isso nada tem a ver com o fato de ela não estar enxergando direito, de estar com problemas de motricidade fina, ou ainda, de não estar apta a desenhar com destreza. Desenhar figuras humanas possibilita à criança estruturar suas ideias sobre elas. É importante que a criança tenha oportunidade de desenhar livremente, em papéis e em tamanhos e texturas diferentes, em posições variadas, com materiais diversos. Quando a criança vai dominando seus movimentos e gestos, 53 as propostas devem ser diferentes: desenhar em vários tempos e ritmos, fazer passeios e expressar o que observou no papel, incentivar o desenho coletivo, desenhar as etapas percorridas após uma brincadeira ou jogo e muitas outras podem ser feitas com a criança para ajudá-la a aprimorar suas capacidades de desenhar. Os educadores que vivem diariamente com essas crianças devem também respeitar o ritmo de cada criança, a maneira como sua obra está evoluindo, porque cada criança tem um tempo e uma maneira de internalizar suas experiências. “A princípio, para a criança, o desenho não é um traçado executado para fazer uma imagem, mas um traçado executado simplesmente para fazer linhas”. (LUQUET, 1969, p.145) 4.6 O desenho como instrumento de diagnóstico Vale ressaltar que a interpretação do desenho não se dá de maneira isolada e simplista, mas sobretudo deve estar dentro de um contexto e relacionada a outros dados coletados durante o processo diagnóstico. “O simbólico é a eleição, e isso é o que vamos interpretar, mas somente poderemos fazê-lo quando o integremos ao conjunto; do contrário, estaremos interpretando a nós mesmos. (FERNÁNDEZ, 1990 p. 225). Ainda neste aspecto, Dercy (1990, p.116) nos aponta um olhar importante: Sob a ótica lógica do adulto, a interpretação, teoricamente bem equipada, intenta justificar uma ‘anomalia’ gráfica, compreender uma não correspondência anatômica, captar algum índice de inteligência, decifrar a estrutura mental e perceptiva que a criança carrega em sua visão de mundo. Serão sempre interpretações, serão sempre projeções, serão sempre valorizações. (DERDYK,1990, p.116). Colocada esta observação, volta-se o olhar para alguns exemplos do uso do grafismo no processo diagnóstico em Psicopedagogia. Weiss (2000, p.120) cita a técnica do “Par ou dupla educativa”, sistematizado por Malvina Oris e Pichona Ocampo, onde é solicitado à criança que desenhe uma pessoa que aprende e uma pessoa que ensina e pede-se que crie uma história com as 54 personagens que desenhou. Nesta situação é possível observar aspectos de que como a criança se vê na situação de “aprendente”, como se coloca na relação “aprendente-ensinante” na escola, como vê a figura do professor, etc. Ainda sobre outra técnica, a do desenho família, a autora diz que é possível perceber pistas das relações do paciente/criança no núcleo familiar, dificuldades na separação, crescimento e cita: “Paulo (9 anos)
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