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FILOSOFIA EM SALA DE AULA

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Filosofia em sala de aula
Verindiana da Silva Trein1
RESUMO
O presente trabalho tem como objetivo delimitar a importância da prática do ensino da disciplina de Filosofia em sala de aula. Está disciplina esteve por muitos anos em discussão, inclusão, retirada e integração parcial, tornando-se obrigatória nos currículos nacionais do Ensino Médio do Brasil em Junho de 2008, através da Lei n° 11.684. Neste texto pretendo apresentar alguns aspectos das diversas etapas históricas da filosofia no Brasil, refletindo a respeito das dificuldades, problemas, desafios na sua abordagem, especialmente no Ensino Médio, bem como, sobre as possíveis sugestões de metodologias, conteúdos e contribuições para uma educação significativa, levando os educandos a uma formação de pensar critico, reflexivo de forma original e autônoma no Ensino Médio.
Palavras-chaves: Filosofia, ensino, metodologia e sala de aula.
1. INTRODUÇÃO
 Tenho como objetivo no decorrer deste trabalho, compreender melhor e trazer alguns aspectos históricos do ensino da filosofia no Brasil, um período caracterizado por uma concepção filosófica bastante vinculada à teologia e escolástica medieval.
 Num segundo momento, o trabalho pretende abordar, a partir de textos selecionados, as dificuldades enfrentadas pela filosofia na grade curricular do Ensino Médio brasileiro, buscando demostrar como a disciplina ficou dividida entre várias outras matérias, sejam elas da área das ciências exatas, ciências humanas ou das ciências da natureza, cuja abordagem se dava de modo transversal, não específico. Outro aspecto destacado no mesmo será buscar e refletir sobre as formas e metodologias de ensino da filosofia para com os alunos do Ensino Médio. Que métodos e conteúdos são indicados para o trabalho? Devemos fazer abordagens históricas ou temáticas? É possível ensinar a filosofar?
 O ensino da Filosofia será também inteirado a partir de uma perspectiva Freiriana, e por fim apresentar quais são as metodologias utilizadas para o ensino da disciplina em sala de aula.
2. DESENVOLVIMENTO
A filosofia teve início no Brasil com os religiosos da Companhia de Jesus, por volta do ano de 1553. Os Jesuítas tinham a finalidade de catequizar os povos aqui presentes e fortalecer suas doutrinas católicas, além de ensinar-lhes a ler e a escrever. Os povos eram afastados dos autores que se baseavam na ciência, por tornar-se perigoso para a Companhia, justificando assim a abordagem aristotélico-escolástica realizada naquele período com base científica e iluminista em autores da modernidade, podendo levar os estudantes a pensar e refletir sobre a educação católica e suas bases teóricas.
 Durante muito tempo a filosofia era voltada para a educação elitista. Caracterizada por ser uma disciplina baseada em livros que vinham da Europa, uma educação teológica, baseada principalmente na escolástica tomista-aristotélica, sendo apenas estudada por status.
Segundo Eter (2002) o ensino da filosofia nunca se fez ausente nas diretrizes e orientações dos documentos da Educação Básica, estando presente desde muito tempo nos programas curriculares nacionais, porém, sempre foi submetido a fortes críticas por causa do que era ensinado. A autora ainda ressalta que antes a disciplina era apenas para formar um bom cristão além, claro, de ser uma educação elitizadora, voltada apenas para os mais ricos que buscavam um curso de bacharelado. O ensino da filosofia no período que vai do século XVI até o século XIII, mais precisamente de 1553 até 1759, foi bastante marcado pela abordagem de temas do período medieval escolástico-tomista, afastando-se da abordagem de obras que seriam importantes para tematização mais ampla e completa da história da filosofia. Neste período a filosofia era sinal de status social, tendo por objetivo "formar homens letrados e eruditos e católicos". (EITER. 2002, p 472). 
 Os jesuítas foram expulsos e afastados do ensino por volta de 1759 por constituírem um Estado dentro de outro Estado. Desde então, as diretrizes educacionais praticadas no Brasil foram pensadas pelo português Marques de Pombal que trazia uma visão ampla e centralizada no ensino, um pensamento moderno, substituindo a ideia medieval que era imposta pelos católicos. Ele acreditava que a educação era feita para o exercício da cidadania e não para atender as vontades da Igreja.
 Ainda com toda a reforma pombalina trazida de Portugal, a filosofia ficou limitada a algumas obras clássicas, como as de Locke, Hobbes, Rousseau, Espinosa e Voltaire.
 No século XX aconteceram cinco reformas educacionais no Brasil, aponta Eter: 
“No século vinte, são cinco as reformas educacionais. Desde a reforma executada no Estado Novo em 1931 passando pelas reformas de Gustavo Capanema 1942, a LDB de 1961, a Lei 5.692 de 1971 até a LDB de 1996, vemos que uma vez perdida esta função de formação do bom cristão ou de preparação para os estudos superiores, a filosofia não encontrou lugar garantido para si na escola média, sendo muitas vezes diluída ou tantas simplesmente excluídas.” (EITER. 2002, p.472).
A citação mostra quantas foram as reformas e como ao longo do tempo a filosofia foi inserida, incluída, trabalhada de modo opcional ou alternada nos currículos. O fato é que a disciplina nunca teve uma base fixa, nunca esteve inteiramente presente nos currículos, ficando sempre sujeita a modificações suscetível a exclusão dos Parâmetros e diretrizes nacionais da educação. 
É importante ressaltar que no período ditatorial que vai de 1964 a 1984, a disciplina foi transformada em OSPB (Organização Social e Política do Brasil) ou Moral e Cívica, disciplinas essas que auxiliavam para uma moralização e doutrinação do real exercício do pensamento livre e crítico. Com o fim do regime militar, os Estados passaram a ter autonomia para voltar a inserir a filosofia nos seus currículos do ensino médio, porém, sem uma regulamentação.
 A filosofia ficou de fora dos currículos nacionais, até o ano de 2008, onde o então presidente em exercício José Alencar, sancionou a Lei 11.684/08, sendo essa que regulamenta a introdução da disciplina de filosofia, juntamente com sociologia nas salas de aula do ensino médio nas escolas do Brasil.
 A maior dificuldades em ministrar uma aula de filosofia é a falta de professores formados na área.
 A partir da lei nº 9394/96 houve uma orientação para que os alunos do ensino médio deveriam ter conhecimentos básicos em filosofia e sociologia para sua formação e pleno exercício da cidadania e formação crítica, não sendo um ensino obrigatório, mas optativo. Segundo Fávero (2004), antes da lei 11. 684/2008, existiam três argumentos que iam contra o ensino disciplinar da filosofia no nível médio, que eram os seguintes: a precariedade na formação de professores, ou seja, baixa procura pelo curso de Licenciatura, outro argumento é que iria alterar as condições financeiras do estado, por fim, havia quem dissesse que seria uma infelicidade inserir mais uma disciplina no currículo escolar.
 Gallo e Fávero (2004), apontam sobre o tempo de dificuldades da disciplina, que no começo a filosofia era tomada como uma educação para a elite e para catequizar, sendo dotada por forte perspectiva tomista-aristotélica e também influenciada pela Igreja Católica. Atualmente, ainda são perceptíveis as dificuldades para o ensino, a começar pelo fato de ser apenas um (1) período semanal, o que muitas vezes inviabiliza trabalhar tantos conteúdos em pouco tempo. Existe também uma rejeição vinda por parte dos alunos com a frase popular: "para que serve filosofia"? Gallo comenta que após a implementação da ditadura em 1964, quando a filosofia foi retirada das escolas, foi possível reforçar a importância da disciplina para o ensino e para o desenvolvimento educacional. Segundo os militares, a filosofia desenvolvia criticidade e era um perigo para seu regime ditatorial, era vista como uma espécie de subsídio teórico para práticas revolucionárias.
 Um fato que é importante registrar, foi o veto da sua inserção na grade, ocorrendo em 08 de Outubro de 2001,juntamente com a disciplina de sociologia, por um dos maiores sociólogos do Brasil, Fernando Henrique Cardoso. O veto ocorreu por dois motivos: implicaria na criação de novos cargos no Estado e não havia formação suficiente para acatar a demanda. Uma grande dificuldade da filosofia é a baixa procura pelos cursos de licenciatura devido a precária valorização do ensino em todos os níveis no Brasil, seja pelas condições físicas do trabalho docente, quanto por falta de incentivos ou questões salarias.
 Umas das maiores bases para o ensino da disciplina é preparar os cidadãos para o futuro, tornando-os capazes de operar as transformações planejadas e consideradas necessárias, sendo assim, devemos dar aos alunos as bases para que possam ser feitas reflexões acerca de seu cotidiano, mostrando o caminho para que eles tenham a capacidade de questionar os preceitos do senso comum para ter autonomia e liberdade de pensamento, ou seja, para que os alunos possam pensar livre de implicações que são em sua maioria incertas.
” Não há para mim, na diferença e na "distancia" entre a ingenuidade e a criticidade, entre o saber de pura experiência e o que resulta dos procedimentos metodicamente rigorosos, uma ruptura, mas uma superação. A superação e não a ruptura se dá na medida em que a curiosidade ingênua, sem deixar de ser curiosidade, pelo contrário, continuando a ser curiosidade, se criticiza. Ao criticizar-se, tornando-se então, permito-me repetir, curiosidade epistemológica, metodicamente "rigorizando-se" na sua aproximação ao objeto, conota-se seus achados de maior exatidão.” (FREIRE, P, 1996, p.17).
As concepções teóricas do educador Paulo Freire, nos faz pensar o seguinte: os alunos de Ensino Médio, principalmente no seu início que sempre estudaram em Escola pública, provavelmente nunca tiveram contato com a Filosofia, vamos então, adentrar na reflexão do pensamento filosófico, apresentando para nossos alunos questões que sejam pertinentes a eles, temas que estejam em tendência e no cotidiano. O ler, o escrever e o resolver problemas na filosofia, dito de outro modo, as habilidades e competências a serem produzidas pela disciplina, são justamente o próprio filosofar, um filosofar que parte de problemas do cotidiano, mas que no processo e com o auxílio da teoria tomam maior corpo e dimensão, gerando a expectativa de um novo olhar sobre o mundo. A partir daí, sugestões podem ser trazidas para dentro da sala de aula, como textos que questionem a ação humana de maneira direta e que relatem a vida como ela realmente é. 
A metodologia de ensino a filosofia tem três finalidades: a primeira tem como meta a conclusão dos estudos, ou seja, fazer uma reflexão e uma síntese de tudo que foi estudado desde a escola primária até a escola média, em segundo lugar, ela preza por uma problematização acerca daquilo que se pode chamar de evidências do senso comum, além claro, das reflexões sobre as questões sociais e culturais da nossa época, e terceiro, esse ensino preza por uma autonomia crítica e um sujeito que saiba refletir sobre os problemas da sua época.
O professor deve utilizar campos disciplinares clássicos como a metafísica, a lógica e ética, aliados a partir de noções do dia a dia, como justiça, trabalho, devendo problematizar essas questões para que os alunos possam refletir sobre as mesmas. Segundo Gallo, não se deve dar atenção apenas ao conteúdo na filosofia, tendo que dar valor ao filosofar, a formação de conceitos e para a história da filosofia. Este autor dedicado à pesquisa, ensino e publicações na área de Ensino de Filosofia, propõe quatro passos possíveis para o ensino da disciplina no nível médio, chamando-os de Sensibilização, Problematização, Investigação e Conceituação.
O ensino da filosofia é o ensino de nada mais que da história da disciplina, afirma Gallo, segundo ele, é ensinar o que foi produzido ao longo de toda essa história e tentar chegar aos ensinamentos de alguns filósofos. Um professor de filosofia jamais deverá se apoiar somente nos livros didáticos, afinal nunca um aluno irá ter contato com um texto clássico se ele não for trabalhado em sala de aula, o mesmo deve estar sempre em constante atualização e buscando materiais, sejam eles livros, filmes, vídeos, e outras possíveis plataformas de informação.
 Uma forma do professor conseguir trabalhar textos clássicos é propondo ao aluno que ele leia ao menos uma obra clássica de cada autor. Gallo enfatiza que as aulas de filosofia devem ser aulas de produção filosófica, que a partir destes textos clássicos se faça o ato de filosofar, refletindo sobre ele. O ato de filosofar não se ensina, isso se aprende com o tempo e com leitura de textos clássicos e reflexões a partir destes. A filosofia é muito ampla e existem muitos temas a serem desenvolvidos, tá ai na postura do professor de desafiar, colocar mais problemas, gerar interesse na busca, na reflexão, na leitura e na elaboração textual, assim constituindo o processo de produção da autonomia intelectual que é um processo lento e árduo.
 3.CONSIDERAÇÕES FINAIS
Através das reflexões aqui realizadas a respeito do histórico do ensino de filosofia no Brasil, seus problemas, desafios e sugestões, podemos compreender que há sim, uma longa história da filosofia dentro de nosso país, desde os jesuítas com a Companhia de Jesus, até os dias de hoje. Houve dificuldades, reformas, exclusão, reinserção, vetos, até sua obrigatoriedade legal em junho de 2008. Embora que a lei reserve somente um período semanal nos três anos do ensino médio, já é um avanço. Consolidando-se, um espaço importantíssimo para a disciplina que não havia antes. Ao mesmo tempo, é preciso compreender que há ainda um longo caminho a ser trilhado, precisando reconquistar seu espaço dentro do Ensino Médio. 
Espaço esse, que se não for bem trabalhado e utilizado, pode gerar questionamentos sobre a sua importância, ainda que percebemos que a filosofia se diferencia das outras ciências humanas, pois está sempre se modificando, buscando novos questionamentos, sempre com teorias que se contrapõem as outras, numa dinâmica constante. Nessa linha argumentativa, o aproveitamento desse espaço aberto no ensino médio pressupõe que hajam professores da área trabalhando com a disciplina, novas metodologias, boas dinâmicas, bons materiais, com aperfeiçoamento constante dos docentes, o diálogo com as outras áreas de conhecimento e o resgate da sua importância e sentido na promoção do pensamento reflexivo, crítico e na produção de habilidades, competências, do ler, escrever e resolver os problemas que lhe competem. Entendo que a educação é um processo a longo prazo, que é preciso criar alicerce, cultura filosófica e o aprofundamento do pensamento reflexivo. Um grande passo foi dado, mas só terá sequência se for levado a extremo pelo conjunto de implicações e valorização que já citamos.
Espontaneamente e dificuldades à parte, espero que a filosofia venha a se expandir cada vez mais e que os alunos despertem o interesse, não só dentro da sala de aula, no seu cotidiano seguindo adiante.
Vida longa à filosofia no Ensino formal e fora dele, no Brasil e no mundo.
4.REFERÊNCIAS
 GALLO,S. A Filosofia e seu ensino: conceito e transversalidade. Rio de Janeiro, v13, n. 1, 2006. p.17-35
 GALLO, S, KOHAN, W. O. Crítica de alguns lugares – comuns ao se pensar filosofia no ensino médio. Petrópolis, Rio de Janeiro: Editora Vozes, 2000.
GALICHET, F. A didática da filosofia na frança: debates e perspectivas. Petrópolis, Rio de Janeiro: Editora Vozes, 2000.
RODRIGUES,Z .A. L. O ensino da filosofia no contexto das políticas educacionais contemporâneas: as determinações legais e a questão do ensino de filosofia no Brasil. Ijuí, Ed.
EITER, C. L. Da companhia de Jesus aos nossos dias: um comentário sobre a história do ensino de filosofia na escola média no Brasil. Ijuí, Ed. Unijuí, 2002.
 FAVERO, A. A. CEPPAS.F, GONTIJO.P.E, GALLO.S, KOHAN.W.O, O ensino de filosofia no Brasil: um mapa das condições atuais. Texto produzido a partir de questionário da UNESCO, Cad. Cedes, Campinas,vol. 24, n. 64, set./dez. 2004. p. 257-284.
 FREIRE, P. Pedagogia da Autonomia: Saberes necessários à prática educativa, 1996.
1 Nome do acadêmico, Curso de Licenciatura em Filosofia na modalidade a distância, Universidade Federal de Pelotas, Polo São Francisco de Paula.

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