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A EDUCAÇÃO NA 
VIDA 
E 
A VIDA NA 
EDUCAÇÃO
uma abordagem 
histórico-cultural
Patrícia L. M. Pederiva 
(Org.)
A EDUCAÇÃO NA 
VIDA 
E 
A VIDA NA 
EDUCAÇÃO
uma abordagem 
histórico-cultural
São Carlos, 2019
Copyright © das autoras e dos autores
Todos os direitos garantidos. Qualquer parte desta obra pode ser re-
produzida, transmitida ou arquivada desde que levados em conta os 
direitos das autoras e dos autores.
Patrícia L. M. Pederiva (Organizadora)
A educação na vida e a vida na educação: uma abordagem históri-
co-cultural. São Carlos: Pedro & João Editores, 2019. 197p. 
ISBN 978-85-7993-681-4
Educação; Vida; Vigotski; Teoria Histórico-Cultural; Diversidade. 
CDD – 370
Capa
João Barreto
Editores
Pedro Amaro de Moura Brito & João Rodrigo de Moura Brito 
Diagramação
Diagrama Editorial
Conselho Científico da Pedro & João Editores
Augusto Ponzio (Bari/Itália); João Wanderley Geraldi (Unicamp/ 
Brasil); Hélio Márcio Pajeú (UFPE/Brasil); Maria Isabel de Moura 
(UFSCar/Brasil); Maria da Piedade Resende da Costa (UFSCar/Bra-
sil); Valdemir Miotello (UFSCar/Brasil).
www.pedroejoaoeditores.com.br
13568-878 - São Carlos – SP
2019
SUMÁRIO
PREFÁCIO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 7
Daniela Barros
Saulo Pequeno
APRESENTAÇÃO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13
Profa. Dra. Patrícia Lima Martins Pederiva
(RE)PRODUÇÕES COLONIAIS NA 
EDUCAÇÃO ESCOLAR . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19
Gabriel Gonçalves
Lucas Gusmão
REFLEXÕES SOBRE A EDUCAÇÃO DOS 
ALUNOS LGBTQ+ NAS ESCOLAS MILITARES . . . . . . 33
Weriklis Marques
DESENVOLVIMENTO HUMANO E 
INSTITUIÇÕES SOCIAIS: FAMÍLIA E 
ESCOLA NA CONSTITUIÇÃO DA DIVERSIDADE . . . 47
Samuel Brito de Gusmão
Fabrício Santos Dias de Abreu
EDUCAÇÃO E EMANCIPAÇÃO: REFLEXÕES 
SOBRE AS RELAÇÕES EDUCATIVAS . . . . . . . . . . . . . . 65
Angélica Bimbato
ESPAÇOS DE PERTENCIMENTO: UMA 
REFLEXÃO SOBRE CAMINHOS EDUCATIVOS . . . . . . 77
Fernanda Chaves de Souza
Beatriz Rezende
DIMENSÕES DA ORGANIZAÇÃO 
DOS ESPAÇOS EDUCATIVOS: DAS 
ESTRUTURAS FÍSICAS ÀS RELAÇÕES SOCIAIS. . . . . 89
Patrícia Bittencourt
O PAPEL SOCIAL DA ESCOLA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 109
Emilly Saraiva da Silva
DIÁLOGOS COM OUTROS MODOS DE EDUCAR . . 121
Bruna Lopes Lima
O PAPEL SOCIAL DA ESCOLA NA 
EDUCAÇÃO DAS CRIANÇAS EM 
SITUAÇÃO DE ACOLHIMENTO INSTITUCIONAL . 135
Letícia Cardoso Rosas
OS ENCANTOS DA EDUCAÇÃO DE 
JOVENS E ADULTOS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 147
Ellen Dantas
DA IMAGINAÇÃO À CRIAÇÃO: 
DESCAMINHOS NA ESCOLA. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 157
João Vitor Barreto Gomes de Sá
Giulia Ribeiro Salgado
PEDAGOGIA DOS CORPOS: DOS LIMITES 
ÀS POSSIBILIDADES. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 171
Nathália Mendonça
COLETIVO DE SAÚDE MENTAL À LUZ DA 
PERSPECTIVA HISTÓRICO-CULTURAL . . . . . . . . . . . 183
Fernanda Lisboa de Andrade
7
PREFÁCIO
Quando recebemos o convite para escrever o prefácio 
desta publicação, fomos tomados de uma imensa alegria, 
pela oportunidade de participar de um registro das re-
flexões e experiências deste ciclo pelo qual passa o PET-
-Educação da Faculdade de Educação da Universidade 
de Brasília, ao lado da professora tutora Patrícia Lima 
Martins Pederiva. Ao longo dos anos, partilhar com es-
tas pessoas os ambientes de estudo, de pesquisa e a con-
vivência cotidiana tem sido uma inspiração e um rico 
aprendizado, sendo para nós um privilégio acompanhar 
todo o processo que chega até esta obra.
Tratar de educação com rigor acadêmico e afetivo sig-
nifica, a partir da Teoria Histórico-Cultural de Vigotski, 
base teórica praticada pelo grupo PET – Educação, en-
tender Educação como o desenvolvimento humano na 
cultura. Isto significa que todas as experiências, desde a 
infância, e a forma como orienta-se a reação a elas com 
o suporte das possibilidades oferecidas pelas pessoas e 
contexto cultural, vão dando forma ao comportamento, 
ao modo de estar no mundo. Assim, o sentido da edu-
cação é possibilitar o maior número de experiências da 
forma mais diversa e heterogênea, oferecendo um am-
biente em que se permita criar, tentar, arriscar, para uma 
reflexão de si na relação com o mundo e, finalmente, 
para uma orientação de si na sua relação com o mundo.
Esta perspectiva de educação está acompanhada de 
uma concepção que percebe a pessoa humana em mo-
vimento: não apenas o movimento que acompanha o 
crescimento e a maturidade de bebê à vida adulta, mas 
também o movimento pelo qual se passa ao longo das 
afirmações, oposições e contradições dos encontros e da 
8
cultura, e que podem transformar radicalmente aquilo 
que há pouco era tido como inquestionável. A pessoa 
humana, portanto, é um ser de possibilidades, em que 
o ambiente oferece situações e experiências que colocam 
transformações na iminência de acontecer, podendo 
afirmar ou transformar o comportamento. Não há neste 
horizonte espaço para as ideias de pessoa e de educa-
ção que proponham a determinação do comportamento, 
adestrar o corpo, cercear a livre expressão, oprimir as 
vontades, doutrinar a consciência, condicionar o intelec-
to, entre muitos dos outros objetivos de educação pro-
postos segundo concepções opressoras e utilitaristas. A 
pessoa humana, como ser de possibilidades, é entendida 
como ser de livre expressão – intelectual, afetiva, corpo-
ral – e que, entendendo-se desta maneira, comporta-se 
de maneira ética para não cercear a livre expressão de 
outra pessoa. Estes pontos de vista são enunciados e tra-
balhados nas páginas desta obra.
Pelas palavras desta obra, trabalha-se a concepção de 
que as pessoas agem, educam-se e comportam-se de ma-
neira diversa, sem que o estabelecimento de quaisquer 
padrões normativos sejam tomados como caminho ine-
vitável para o desenvolvimento. E, ao trazer aqui a pala-
vra diversidade, refere-se a instâncias além dos lugares 
comuns com que tem sido usada nos espaços políticos 
recentes; a diversidade não é entendida como oposição 
à norma. Pelo contrário, a diversidade é o princípio do 
desenvolvimento humano, do comportamento, e das 
culturas que se atravessam em sociedade. A diversida-
de é a característica de todo encontro entre pessoas ou 
grupos de pessoas, através da alteridade e da empatia 
ante pessoas diferentes, com histórias diferentes, corpos 
diferentes, sensibilidades diferentes, especialmente em 
um espaço educativo, em que devem colaborar juntas 
para que todos os polos que compõem a unidade do en-
9
contro extraiam, mutuamente, o melhor de si. Qualquer 
tentativa de normatização, portanto, manifesta-se contra 
a educação, contra o desenvolvimento e, em última ins-
tância, contra toda a existência. Ao passo que é possível 
a tentativa de sufocar, oprimir e ignorar a diversifica-
ção, como muitos projetos de poder o fazem através da 
educação, o PET-Educação procura reconhecer, refletir e 
amparar em teoria, prática e ação política, a diversidade 
como condição da própria existência humana.
Por este conjunto de entendimentos, compreende-se 
que a educação, em sua prática e seus desafios, não é 
sinônimo de escola, e vai muito além desta. Entretanto, 
como uma instituição central para a modernidade, que 
monopoliza o ideário de relações com o saber, e que é 
tida socialmente como o local destinado para a instru-
ção, a escola contém em si um conjunto determinado de 
procedimentos, de conhecimentos e de projetos de futu-
ro, de forma que também deve ser refletida, analisada e 
criticada com rigor. Seu local é tão estratégico e central 
para a modernidade que as práticas que caracterizam a 
escolarização irradiam para todos os setores da socieda-
de em qualquer relação com o saber. E esta instituição 
possui uma forte contradição: por um lado, entendi-
mentos e protocolos rígidos sobre a prática educativa, 
sendo também um microcosmo da sociedade, com to-
das as suas opressões, normas arbitrárias e assimetrias; 
por outro lado, é local que recebebebês, crianças, ado-
lescentes, jovens e adultos com todas as suas trajetórias 
e potencialidades sendo então, também, um espaço de 
possibilidades. Com a intenção de abalar as certezas e 
imposições da educação e da escolarização, este conjun-
to de textos procura trabalhar com o desenvolvimento 
humano, pautado na diversidade, para caminhos de re-
flexão e transformação de todos os espaços educativos, 
inclusive os espaços escolares.
10
O presente livro é composto por artigos escritos por 
estudantes, profissionais da educação em formação, e 
por profissionais da educação recém formadxs. E este é 
mais um exemplo de transgressão do PET-Educação e da 
professora Patrícia Pederiva frente aos lugares comuns 
da academia. Usualmente privilegia-se a publicação de 
obras de pesquisadorxs com títulos de pós-graduação – 
mas isso não quer dizer nada, por si só, da qualidade das 
reflexões que estão em qualquer obra. É necessário desta-
car que nesta etapa da formação profissional superior, xs 
estudantes são interlocutorxs privilegiadxs para enten-
der as dificuldades, contradições e possibilidades da edu-
cação e, ao mesmo tempo, da formação em educação. É, 
portanto, uma importante referência para conhecer aqui-
lo que se identifica entre críticas e possibilidades das suas 
experiências escolares, das expectativas e frustrações de 
estágios, do curso superior, da prática profissional e da 
própria ideia em movimento do que pode ser a educa-
ção, de como lutar por ela, de como alcançar formas de 
exercer a função social dx professorx, que é possibilitar 
o desenvolvimento humano em sua plenitude, torná-lo 
possível mesmo em processos educativos dados num 
ambiente institucionalizado. Acima de tudo, são admira-
dxs e respeitadxs profissionais pensadorxs da educação.
Dedicando-se igualmente ao ensino, pesquisa e ex-
tensão de forma intensa e valente, o PET-Educação junto 
à professora Patrícia Pederiva faz os necessários enfren-
tamentos, não foge das reflexões, desbrava, corre atrás 
de viver, de experimentar, de estudar, de refletir, porque 
compuseram, em conjunto, consciência da responsabili-
dade da profissão que escolheram, do ato de serem pro-
fessorxs. Entre tantos outros, destacamos alguns marcos 
que deram identidade e coesão ao grupo, ao mesmo 
tempo ofereceram profundidade na experiência profis-
11
sional, que enchem de inspiração qualquer profissional 
da educação.
Ao longo de sua trajetória, o grupo se organizou para 
a luta em nome das estudantes não só da pedagogia, 
mas de toda a universidade. Este foi o trabalho a respei-
to das estudantes mães da Universidade de Brasília com 
pesquisas de levantamento do número de estudantes, 
identificação dos seus direitos, em aliança com outros 
grupos de estudantes, com coletivos de estudantes, com 
outros PETs da universidade, além de grupos fora dos 
espaços da universidade. Nestes esforços, conquistaram 
uma sala de acolhimento para estudantes mães com su-
porte para amamentação e cuidado com as crianças, lo-
cal há muito tempo desejado pelas estudantes da UnB. 
Produziram material empírico e teórico a respeito desta 
jornada, problematizando os temas educação, mulher, 
maternidade, gênero, suporte institucional, entre outros.
Realizaram estágios, atividades e acompanhamentos 
na Casa de Ismael – Lar da Criança. Esta é uma experiên-
cia importante, porque ocorre em uma instiuição conve-
niada da Secretaria de Educação do Governo do Distrito 
Federal que oferece educação básica, ao mesmo tempo 
que é lar de acolhimento institucional para crianças e 
adolescentes em situação de risco e vulnerabilidade 
oferecendo, além de educação, assistência e orientação 
profissional. Realizando trabalho comprometido junto à 
Casa de Ismael, foi oferecido ao PET um local de traba-
lho complexo e desafiador para a sua formação, abar-
cando a educação, mas também suas articulações com 
concepções de sociedade, família, infância e adolescên-
cia, identidade e direitos sociais.
Além disso, o grupo não se esquivou da responsabi-
lidade de discutir diversidade dentro da instituição uni-
versitária, abrindo espaços de conversa; rodas de estudo; 
e a realização do I Seminário de Diversidade da Facul-
12
dade de Educação, organizado pelos estudantes do PET 
junto à professora Patrícia Pederiva, abordando a educa-
ção pública, raça, classe, gênero e sexualidade, infâncias 
juventudes e preconceitos, tanto no aspecto crítico quan-
to nas suas possibilidades propositivas, resultando, além 
de um evento excepcional, material acadêmico como mo-
nografias e artigos. Estes são alguns exemplos das formas 
de como este grupo vivenciou com excelência o ensino, 
pesquisa e extensão, credenciais importantes para locali-
zar ainda melhor a importância da presente obra.
Este livro é mais um dos resultados de todo esse pro-
cesso, e é uma cristalização que traduz o PET-Educação 
como um grupo que busca (e pratica) a educação por ou-
tros olhares, outras experiências, para uma outra cons-
ciência, outra escola. É uma leitura necessária para toda 
pessoa que se preocupa com a educação, de estudantes, 
professorxs e interessadxs, para que práticas enrijecidas 
não continuem a se repetir e violentar seres humanos em 
suas possibilidades, para que os caminhos de respeito e re-
flexão aberta e honesta continuem a ser abertos e trilhados.
Para nós é uma imensa alegria acompanhar todo este 
processo, desde a primeira configuração do grupo até 
a presente obra. É um privilégio acompanhar estxs par-
ceirxs, amigxs, em um ambiente de crescimento mútuo, 
respeitoso, amoroso, receptivo, afetuoso. É encantador 
ter estas pessoas como parceiras entre profissionais da 
educação. É uma honra poder contribuir com esta obra, 
pela qual temos tanta estima, respeito e admiração.
Carinhosamente,
Daniela Barros
Saulo Pequeno
Pedagoga e Antropólogo. Mestrxs em Educação.
Doutorandxs em Educação pela Universidade de Brasília.
Brasília, 15 de maio de 2019
13
APRESENTAÇÃO
Profa. Dra. Patrícia Lima Martins Pederiva
Tutora do PET Educação/FE/UnB
pat.pederiva@gmail.com
A escola é uma instituição secular. Tornou-se, em um 
processo histórico, o locus responsável pela instrução das 
pessoas, da infância à vida adulta. Há muitos ganhos e 
perdas ao longo do caminho. Por tudo o que representa 
socialmente, por vezes, a escola parece ser inquestioná-
vel, pois, há poucos espaços para discutir alguma das 
questões que fazem parte dessa instituição na contem-
poraneidade.
Este livro foi pensado, organizado e constituído como 
um desses espaços de discussão. Aqui, buscou-se prezar 
por temáticas que dizem respeito à escola e aos proces-
sos educativos e que pulsaram e ainda pulsam na vida.
Nós, organizadora e autorxs do presente texto, temos 
plena consciência dos processos sociais que perpassam e 
atravessam a escola. Educação, melhor dizendo, educa-
ções – termo no plural, por respeito aos modos e singula-
ridades dos diversos processos educativos – acontecem 
na vida e em diferentes espaços. Dessa forma, escola não 
necessariamente equivale à educação e vice-versa.
Por isso, aqui, tratamos de diversidade, relações hu-
manas, sentidos de pertencimento, o lugar das expe-
riências nos processos educativos, imaginação, criação, 
educação na vida adulta e outros temas importantes. 
Discutimos também, à luz da teoria histórico-cultural de 
Lev Semionovich Vigotski e de outrxs autorxs, o papel 
de professorxs como organizadorxs do espaço educativo 
14
e as implicações de algumas convenções na constituição 
das pessoas que integram estes lugares.
Estamos convictos de que as reflexões aqui presentes 
suprem lacunas ora existentes, nas discussões educati-
vas, e convidam à continuidade da busca por conheci-
mentos e modos mais humanos de transformações edu-
cativas e sociais.
Para tanto, apresentamos a seguir os títulos dos arti-
gos, na sequência do livro, e respectivos autorxs, resu-
mos das propostas, além das palavras-chave:
1. (RE)PRODUÇÕES COLONIAIS NA EDUCAÇÃO 
ESCOLAR. Gabriel Gonçalvese Lucas Gusmão
Resumo: Reflete sobre a escola como produtora privile-
giada de diferenciação social, baseada nos valores e nas 
práticas coloniais homogeneizadoras/padronizadoras e, 
ainda, como se (re)produzem diariamente nos espaços 
escolarizados as práticas de dominações coloniais.
Palavras-chave: Educação; Colonialismo; Escolarização.
2. REFLEXÕES SOBRE A EDUCAÇÃO DOS ALUNOS 
LGBTQ+ NAS ESCOLAS MILITARES. Weriklis Marques
Resumo: Reflexão sobre a escolarização dos alunos 
LGBTQ+ nas escolas militares. Traz relatos e denuncias 
de vivencias de estudantes nesses espaços.
Palavras-chave: LGBTQ+; Escolarização; Relações
3. DESENVOLVIMENTO HUMANO E INSTITUIÇÕES 
SOCIAIS: FAMÍLIA E ESCOLA NA CONSTITUIÇÃO 
DA DIVERSIDADE. Samuel Brito de Gusmão e Fabrício 
Santos Dias de Abreu
Resumo: Análise da construção da heteronormativida-
de, em dois espaços sociais e educativos – escola e famí-
lia – a partir de experiências vivenciadas pelo primeiro 
autor, para compreender o papel da diversidade no de-
15
senvolvimento das pessoas nesses espaços, pela lente da 
teoria histórico-cultural de Vigotski e autorxs que abor-
dam questões de gênero e sexualidade.
Palavras-chave: Teoria histórico-cultural; Heterormati-
vidade; Diversidade.
4. EDUCAÇÃO E EMANCIPAÇÃO: REFLEXÕES SO-
BRE AS RELAÇÕES EDUCATIVAS. Angélica Bimbato
Resumo: Reflexão que coloca as relações sociais tecidas 
nos espaços escolarizados como fator central e nortea-
dor do desenvolvimento humano. A partir da teoria his-
tórico-cultural, o artigo discute a emancipação humana, 
nas relações entre educadorxs e educandxs nos espaços 
educativos.
Palavras-chave: Relação; Emancipação; Afeto; Desen-
volvimento.
5. ESPAÇOS DE PERTENCIMENTO: UMA REFLEXÃO 
SOBRE CAMINHOS EDUCATIVOS. Fernanda Chaves de 
Souza e Beatriz Rezende
Resumo: Relatos pessoais de vivências escolares, até a 
graduação, sobre como o sentido de pertencimento foi 
se constituindo, pelas relações interpessoais, nos espa-
ços educativos.
Palavras-chave: Pertencimento; Relações; Espaços 
educativos.
6. DIMENSÕES DA ORGANIZAÇÃO DOS ESPAÇOS 
EDUCATIVOS: DAS ESTRUTURAS FÍSICAS ÀS RELA-
ÇÕES SOCIAIS. Patrícia Bittencourt
Resumo: Reflexão sobre o papel do professor na orga-
nização do espaço educativo como espaço relacional, 
segundo a teoria Histórico-cultural de Lev Semionovi-
ch Vigotski.
16
Palavras-chave: Organização do espaço; Teoria históri-
co-cultural; Espaço relacional.
7. O PAPEL SOCIAL DA ESCOLA. Emilly Saraiva da Sil-
va
Resumo: Reflete sobre o espaço escolar e sua função so-
cial e faz uma crítica ao sistema vigente. Breve histórico 
sobre essa instituição em diálogo com algumas das leis 
que tratam sobre a educação e escola no Brasil. Busca 
por outros modos de pensar a escola.
Palavras-chave: Escolas; Educação; Função social.
8. DIÁLOGOS COM OUTROS MODOS DE EDUCAR. 
Bruna Lopes Lima
Resumo: Reflexão, em quatro tópicos, acerca dos pro-
cessos educativos com um olhar mais atencioso e ativo 
para seus participantes. O primeiro, “da experiência às 
reflexões”, aborda questões geradas por vivências edu-
cativas. O segundo, “diálogos necessários”, estabelece 
a perspectiva histórico-cultural de Vigotski como lente 
teórico-analítica. O terceiro, “como educar e ser profes-
sor”, discute os espaços educativos. O último, “reflexões 
sobre transformação”, demonstra que existem maneiras 
mais leves, livres e afetuosas de se relacionar.
Palavras Chave: Educação; Desenvolvimento; Espaços 
educativos.
9. O PAPEL SOCIAL DA ESCOLA NA EDUCAÇÃO 
DAS CRIANÇAS EM SITUAÇÃO DE ACOLHIMENTO 
INSTITUCIONAL. Letícia Cardoso Rosas
Resumo: Reflete sobre a condição de crianças em si-
tuação de risco e vulnerabilidade social no contexto 
educativo.
Palavras-chave: Criança; Educação; Escola; Situa-
ção Social.
17
10. OS ENCANTOS DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E 
ADULTOS. Ellen Dantas
Resumo: Discute a respeito da educação de jovens e 
adultos, EJA, e sobre seus modos de organização, seus 
limites e possibilidades.
Palavras-chave: EJA; escola; direitos.
11. DA IMAGINAÇÃO À CRIAÇÃO: DESCAMINHOS 
NA ESCOLA. João Vitor Barreto Gomes de Sá e Giulia Ri-
beiro Salgado
Resumo: Discussão, com base na perspectiva histórico-
-cultural, sobre as relações do desenvolvimento humano 
nas escolas e as potencialidades de um trabalho imagi-
nativo e criativo que não tenha como único meio e fim a 
reprodução.
Palavras-chave: Criação; Imaginação; Escolarização; 
Reprodução.
12. PEDAGOGIA DOS CORPOS: DOS LIMITES ÀS POS-
SIBILIDADES. Nathália Mendonça
Resumo: O artigo questiona e reflete sobre a padroniza-
ção dos corpos no contexto de processos educativos, de 
como esses corpos estão sendo engaiolados e controla-
dos. Por meio de vivências artísticas e corporais, busca-
-se pensar no desenvolvimento educativo com um olhar 
mais humano, a partir dos afetos e do reconhecimento 
destes corpos diversos e singulares.
Palavras-chave: Corpo; Marcas; Afeto-intelecto; 
Arte; Educação.
13. COLETIVO DE SAÚDE MENTAL À LUZ DA PERS-
PECTIVA HISTÓRICO-CULTURAL. Fernanda Lisboa de 
Andrade
Resumo: O presente artigo tem o objetivo de explanar 
sobre o fenômeno de adoecimento psicológico de es-
18
tudantes universitários. Com base nessa problemática 
localiza-se a questão na perspectiva histórico-cultural 
para, então, descrever uma proposta de intervenção rea-
lizada pelo Coletivo de Saúde Mental da Faculdade de 
Educação-UnB.
Palavras-chave: Saúde-mental; Universidade; Coletivo.
19
(RE)PRODUÇÕES COLONIAIS 
NA EDUCAÇÃO ESCOLAR
Gabriel Gonçalves1
gaabriel_soousa@hotmail.com
Lucas Gusmão2
lukas.nett@hotmail.com
A partir do impulso teórico de Illich (1979), podemos 
dizer que desde seu surgimento a escola tenta tomar 
para si o controle de todos os processos educativos, de-
sencorajando e subjugando todas as outras formas de se 
educar, ou seja, todas as formas de se enraizar na vida 
social que não passam necessariamente pela frequência 
na instituição escolar.
Em sua teoria - considerada radical por muitos – o au-
tor assume um papel extremamente crítico em relação à 
escola e ao papel que ela desempenha ao criar desigual-
dades sociais, perpetuar exclusões e como pretendemos 
refletir mais adiante, perpetuar o colonialismo.
Por colonialismo, entendemos todo o cruel processo 
de colonização cultural, dominação dos povos, da eco-
nomia e da política que abasteceu a economia Europeia 
e onde foi vivenciada de forma intensa a produção de 
marcadores sociais da diferença.
1 Estudante de graduação do curso de Antropologia da Universi-
dade de Brasília, membro do ECOA – Laboratório em Etnologia 
em Contextos Africanos.
2 Estudante de graduação do curso de Pedagogia da Universida-
de de Brasília, membro egresso do grupo PET-Educação.
20
É a partir desse entendimento que esse artigo se pro-
põe a refletir sobre a escola como produtora privilegiada 
de diferenciação social, baseada nos valores e nas prá-
ticas coloniais homogeneizadoras/padronizadoras que 
negam a diversidade que nos compõem enquanto hu-
manos e ainda refletir como se (re)produzem diariamen-
te nos espaços escolarizados as práticas de dominações 
coloniais.
Também traremos à luz das nossas reflexões a teoria 
Histórico-Cultural, na tentativa de entender como a ne-
gação da diversidade e a normatização dos corpos têm 
impacto direto no processo de desenvolvimento humano.
INTRODUÇÃO
Diversos autores ao longo de suas carreiras se debru-
çaram a estudar o caráter social da escola e as relações 
que a partir dela se engendram, apontando de forma 
bastante crítica sua função na sociedade ocidental, como 
por exemplo, Foucault (1999) e Ivan Illich (1979).
O conceito de disciplina, tal como cunhado por Fou-
cault, nos ajuda bem a pensar a lógica de poder e domi-
nação estabelecida pela escola e sua importância dentro 
do projeto imperial. Segundo ele, a disciplina é dada por 
métodos de controle dos corpos, onde de fato o corpo 
pode ser esquadrinhado através de proibições e normas 
que têm por finalidade final padronizar e normatizar, 
excluindo aqueles tidoscomo desviantes ou anormais.
Illich também desenvolve um conceito importante 
para nos situar teoricamente em nossa proposta, o con-
ceito do monopólio radical, que pode ser caracterizado 
como a tentativa do controle das necessidades e das pos-
sibilidades de trabalho, saúde, lazer, e da educação das 
pessoas, criando assim uma pseudo-dependência do ser 
social para com algumas instituições (GUSMÃO, 2017). 
21
No caso da educação, fazendo com que cada vez mais a 
aprendizagem se confunda – e fique restrita – a institui-
ção escolar e o que é ensinado por ela.
No que diz respeito ao monopólio da educação, tam-
bém podemos falar em monopólio do saber, sendo que, 
dentro da lógica escolarizada, tanto o conhecimento 
quanto os saberes são alienados e transformados em 
produtos, apenas com o objetivo de diplomar e comer-
cializar a educação como um todo. (GUSMÃO, 2017). A 
mentalidade escolarizada faz parecer que a maioria do 
que se aprende é resultado do ensino escolar, quando 
na verdade a maioria dos conhecimentos e os saberes de 
uma pessoa são adquiridos fora dela, como, por exem-
plo, comer, brincar, dançar e etc.
Antes do surgimento da escola tal como a conhecemos 
hoje, a aprendizagem era universal, no sentido que Ivan 
Illich imprime a essa expressão: a busca continua do sa-
ber e a relação gratuita e celebradora com ele, que ocor-
ria de forma não padronizada e sem imposições regula-
mentadoras. Escolhia-se o que aprender, como, quando, 
com quem, e por quanto tempo (TUNES, 2011, p. 9).
Portanto, a escola não pode ser entendida como si-
nônimo de aprendizagem, e não pode ser tratada como 
tal, visto que nos moldes em que foi instituída a esco-
larização nunca teve como compromisso as diferenças 
culturais e a diversidade que nos compõe enquanto se-
res humanos, pelo contrário, sempre esteve imersa em 
lógica de exclusão e de relações de poder desiguais que 
geram hierarquias a partir de marcadores de raça, classe, 
gênero e sexualidade, por exemplo.
22
SOBRE A COLONIZAÇÃO
Desde a colonização se inaugurou uma nova forma 
de olhar o mundo e o ser humano. Esse novo modelo, 
imposto de forma violenta, rompe com a unidade huma-
no-natureza, com a consciência histórica, prega o indivi-
dualismo, a competitividade e o padrão eurocêntrico de 
ser e estar no mundo. Segundo Barros (2017), o processo 
de colonização tinha como objetivo não só a expansão 
territorial europeia, mas a expansão da eurocentrismo, 
que coloca a Europa como protagonista da história da 
humanidade, em detrimento das demais cultural. A mu-
dança na organização cultural e social imposta como 
processo civilizatório procurou homogeneizar a forma-
ção humana, criando uma padronização e hierarquiza-
ção do conhecimento, tornando-o um produto, e sendo 
assim, fez com que não fosse acessível a todos.
A institucionalização do ensino, na sociedade contem-
porânea, atrelada às necessidades do capitalismo, assu-
me características empresariais, nas quais presenciamos 
a comercialização do conhecimento e a transformação 
do aluno em um objeto de consumo (TUNES, PEDRO-
ZA, 2011, p. 19).
Dessa maneira, se engendra, a partir da colonização, 
um novo sistema educativo, de mentes escolarizadas, 
que está assentado nos pilares capitalistas e que atende 
exclusivamente aos seus interesses. Esse sistema escola-
rizado de educação tem como objetivo formar um ser 
humano totalmente voltado para a lógica do mercado, e 
que para atingir seus objetivos, não poupa esforços em 
desumanizar, padronizar e excluir.
Hoje, o caminho da escolarização não é uma escolha, 
ele é imposto à quase todos como forma de direito e 
justificado por um discurso de inclusão, que, no entan-
23
to, é contraditório. O que percebemos na prática é que a 
escola reforça através de seus mecanismos, a ordem da 
estrutura social e das relações hierárquicas engendradas 
pela modernidade, reproduzindo constantemente a lógi-
ca colonial imposta
Há assim, na sociedade, de um lado, o movimento pela 
inclusão e a obrigatoriedade de escolarização definida 
em lei; do outro, há a escola promovendo os mecanis-
mos excludentes socialmente aceitos e historicamente 
perpetuados. A inclusão, seja escolar ou de qualquer 
outra ordem, está, pois, imersa na lógica da exclusão 
(TUNES, PEDROZA, 2011, p. 15).
A escolarização recebeu na sociedade ocidental um 
papel decisivo na formação humana, nas formas de se 
engendrar na vida social, cultural, no imaginário coleti-
vo, na subjetividade, e em vários outros aspectos. Exis-
te no imaginário coletivo certo consenso – que pode ser 
percebido através de discursos e narrativas – que afirma 
que somente aqueles que frequentam a escola um dia 
serão sábios e terão um futuro promissor. No entanto, 
diferentemente do consenso geral percebido nesse tipo 
de narrativa, os espaços escolarizados estão totalmente 
imersos numa lógica separatista e de exclusão.
A educação é designada socialmente pela sociedade 
como a principal possibilidade de um futuro promissor 
e de um emprego digno. A escola é obrigatória e aquele 
que não a frequenta está fora da lei, não sendo assim 
digno de um emprego e impossibilitado de sonhar com 
um futuro melhor. A escola assume hoje o principal veí-
culo de ascensão social e, pelo seu caráter de monopó-
lio radical, também de exclusão (TUNES e PEDROZA, 
2011, p. 20).
E de fato os espaços escolarizados vêm cumprindo 
com sua função de segregar e excluir todos aqueles que 
24
fogem ao padrão colonial de cidadão (indivíduo) ideal, 
que no limite seria homem, branco, heterossexual e de 
classe social privilegiada.
A COLONIZAÇÃO E A PRODUÇÃO DE 
DESIGUALDADES NA INSTITUIÇÃO 
ESCOLAR
Analisando historicamente o processo perverso da 
escolarização, podemos perceber que, desde seu início, 
ele nega as experiências vivenciadas e a singularidade 
de cada pessoa, delimitando um conjunto de normas e 
regras a serem seguidas, um conjunto de normas e re-
gras à qual se deve inspirar, além de possuir um caráter 
anti-educativo perante a formação sociocultural e psi-
cológica do ser humano. O sistema escolarizado 
tenta engessar as formas modernas de ser, se baseando 
nos valores eurocêntricos, tornando a experiência es-
colar violenta para todos os alunos que não têm, dessa 
forma, sua história, cultura e vivências respeitadas e re-
presentadas.
Portanto, a escolarização se dá por meio de mecanis-
mos opressores que afastam a diversidade e a cultura do 
processo pleno de desenvolvimento humano. Que cria 
uma realidade artificial onde o aprender é descolado da 
vida real e produzido apenas pela escola, criando uma 
dicotomia onde se separa a educação da vida cotidia-
na. É justamente nessa falsa dicotomia entre educação 
e vida real que se encontra o caráter alienante da escola.
Essa dicotomia entre educação e vida real é levada 
ao máximo, e pode ser percebida em diversas áreas do 
conhecimento escolarizado, como na música, nas artes, e 
até mesmo no que diz respeito à cultura.
25
Na sociedade ocidental escolarizada, cultura e educa-
ção possuem lugares e momentos diferentes e determi-
nados para serem experienciados. Existe o lugar especí-
fico para se aprender, notadamente o espaço escolar; E 
existem lugares específicos para se apreciar e conhecer 
cultura, como museus, teatros, exposições e auditórios. 
Nos processos de educação formal, a cultura aparece 
nos currículos como atividade destacada dos momen-
tos de aprendizagem (BARROS et al, 2018, p. 119).
Separar educação e cultura é sem dúvidas apartar 
o homem da vida real, onde, segundo Vigotski (2003), 
de fato acontece a educação. É nas relações sociais que 
acontece o desenvolvimento, uma vez que, são nelas que 
nos constituímos enquanto seres sociais, tão singulares e 
cheios de particularidades.
Durante toda sua trajetória enquanto pensador, Vi-
gotski chama atenção ao caráter social da educação. Se-
gundo ele, todas as reações que agem sobre nosso or-
ganismo biológico são estritamente determinadas pelo 
mundo que nos cerca e pelos encontrosque nele acon-
tecem. Dessa forma, Vigotski defendia que a máxima 
onde o único educador capaz de formar novas reações 
no organismo do educando é de fato a experiência pes-
soal, ou seja, é a realidade, a perejivânie, que deve ser a 
base orientadora de qualquer trabalho pedagógico que 
busque a educação real (VIGOTSKI, 2003).
Nos pilares em que se constitui a escola, e nos quais 
se apoia ainda hoje, essa instituição pode não somente 
atrasar, mas também dificultar e impedir o desenvolvi-
mento pleno dos alunos, já que, impor um modelo en-
gessado de ser humano é desconsiderar toda a cultura 
que nos forja, e fazer isso, é desconsiderar as formas 
pelas quais as pessoas significam seu lugar no mundo. 
A educação enraizada na vida real (VIGOTSKI, 2003) é 
essencial para o desenvolvimento humano, a atividade 
26
real possibilita às crianças a serem seres ativos, criadores, 
com potencialidades, além de significar o seu lugar de 
pertencimento na cultura.
Por isso, a passividade do aluno, bem como o menos-
prezo por sua experiência pessoal, são, do ponto de vis-
ta científico, o mais crasso erro, assim como a falsa regra 
de que o professor é tudo, e o aluno, nada. Pelo con-
trário, o critério psicológico exige que se reconheça que, 
no processo educativo, a experiência pessoal do aluno é 
tudo. A educação deve ser organizada de tal modo que 
não se eduque ao aluno, mas que este se eduque a si 
mesmo (VIGOTSKI, 2003, p. 75).
Segundo Vigotski (2003), a educação deve ser enten-
dida como a totalidade que nos constitui enquanto hu-
manos na cultura. Sendo assim, ela deve ir além da visão 
distorcida que prega a escolarização, deve estar enraiza-
da nas demandas reais da vida, onde os seres humanos 
engendrados na cultura e na relação com os outros, se 
constitui plenamente.
No entanto, de forma geral, os espaços de mentes es-
colarizadas se dirigem para o caminho oposto. Celebrar 
a diversidade que nos constitui nunca esteve em sua 
pauta, muito menos debater as opressões e os preconcei-
tos esmagadores existentes em nossa sociedade.
É certo que falar em preconceito, em realidade, tor-
nou-se um tema tabu. A escola sempre foi considerada 
uma instituição de seleção e de diferenciação social e nos 
comportamos como se isso não existisse. Com isso esta-
mos sempre em situações de fragilidades, de ‘’estar pi-
sando em ovos’’, na prática escolar sem podermos rom-
per com isso. É fato que não se pode negar a seletividade 
que está presente na prática institucional escolar e, por 
vezes, de caráter elitista. A vivência do preconceito pode 
27
ser notada pela prática da diferença, que é muito presen-
te no cotidiano brasileiro (ITANI, 1998, p. 120).
Ainda de acordo com Itani (1998, p. 121), “o processo 
educacional, tal como ele se desenvolve, pode estar se-
lecionando e colocando para fora muitos que não conse-
guem se defender”, ou seja, os espaços de mentes esco-
larizadas atuam cada vez mais no sentido de reproduzir 
um projeto de exclusão há muito vigente.
Dentro dos espaços de mentes escolarizadas as pes-
soas não são percebidas como seres de possibilidades, 
que possuem necessidades particulares forjadas através 
de suas experiências - que são únicas - e que já possuem 
conhecimentos e saberes adquiridos culturalmente.
Coube à escola, desde seu início, a função de dividir 
as pessoas, seja separando os que a frequentam ou não, e 
mesmo os que se submetem a ela também são separados 
e diferenciados entre si. Dentro da escola, há muito tem-
po, as diferenças são transformadas em desigualdade e 
tratadas como tal;
A escola que nos foi legada pela sociedade mental mo-
derna começou a separar adultos de crianças, católicos 
e protestantes. Ele também se fez diferente para os ricos 
e para os pobres e ela imediatamente separou os meni-
nos das meninas (LOURO, 2011, p. 61).
Sendo assim, a escola ocidental que herdamos se ca-
racteriza como um espaço que valoriza e reforça o pa-
drão eurocêntrico de ser humano, e não como um espa-
ço que celebra a diversidade, que reconhece as pessoas 
em suas particularidades, que respeita seu tempo, sua 
forma de ser e de se relacionar. O processo de escolariza-
ção se caracteriza assim como um lugar onde a desigual-
dade é necessária e louvada.
São várias as formas pela qual se expressam os pre-
conceitos e as desigualdades dentro dos espaços esco-
28
larizados, como o exercício cotidiano da linguagem, o 
olhar da diferença, através de livros didáticos, dentre 
várias outras ferramentas. Itani, (1998), usa a linguagem 
cotidiana carregada de expressões racistas, como por 
exemplo, “a coisa tá preta” para exemplificar a expres-
são desses preconceitos (GUSMÃO, 2017).
Vale ressaltar que o uso da linguagem é uma ferra-
menta poderosa na tentativa de homogeneizar as pes-
soas, uma vez que, ela não somente expressa os precon-
ceitos, mas também cria essa realidade, uma vez que a 
linguagem enraíza culturalmente certas verdades.
Se o uso da linguagem é uma arma poderosa nesse 
processo de exclusão gerado pelos espaços escolariza-
dos, o seu não uso pode ser tão poderoso quanto. Tudo 
aquilo que é taxado como diferente, diverso, que se ex-
pressa em desacordo com o padrão imposto, é silenciado 
e deixado de lado, naturalizando esse tipo de comporta-
mento (GUSMÃO, 2017).
Provavelmente nada é mais exemplar disso do que o 
ocultamento ou a negação dos/as homossexuais – e da 
homossexualidade- pela escola. Ao não se falar a res-
peito deles e delas, talvez se pretenda “elimina-los/as”, 
ou pelo menos se pretenda evitar que os alunos e as 
alunas “normais” os/as conheçam e possam deseja-los. 
Aqui o silenciamento – A ausência da fala – aparece 
como uma espécie da garantia da “norma” (LOURO, 
2011, p. 71,72).
Para esses alunos taxados de forma negativa como 
“diferentes” ou “anormais”, existir no espaço onde 
atuam mentes escolarizadas é uma tarefa extremamente 
árdua violenta, não sendo propícia a qualquer atividade 
de cunho educativo.
Dessa maneira podemos perceber como a escola têm 
colaborado para a (re)produção dos valores coloniais, 
29
além de ter papel fundamental na construção se uma so-
ciedade hierarquizada, racializada, generificada e tam-
bém sexualizada.
CONCLUSÕES: RUMO À UMA NOVA 
PRÁTICA EDUCACIONAL
Esperamos com esse artigo ter conseguido apontar as 
formas pela qual a escola se constitui a partir dos valo-
res coloniais e como foi uma peça fundamenta – e ainda 
hoje é – para a sua (re)produção, através de mecanismos 
opressores que atacam a todo o tempo a diversidade nos 
compõem e nos torna seres tão singulares.
Acreditamos ser de extrema importância debater os 
valores reproduzidos e as práticas realizadas diaria-
mente no interior das escolas - que carregam ainda hoje 
um legado colonial de dominação e esquadrinhamento 
dos corpos.
Optamos por defender, tal qual Vigotski, uma edu-
cação que esteja enraizada na vida real, que não rompa 
com a consciência histórica necessária para o pleno de-
senvolvimento humano.
Vigotski, com sua base spinozista e marxista, desen-
volveu logo após a revolução de 1917 um novo modelo 
educacional que pretendia engendrar novas formas de 
conduta humana, através da perspectiva histórico-cultu-
ral, que buscava estabelecer uma identidade calcada no 
pensamento socialista.
Uma mudança de rumo para uma atividade educativa 
criadora e mais humanizante seria viabilizada, então, 
além de uma educação voltada para esse fim, pela va-
lorização de todas as experiências diversas possível. To-
das as experiências humanas guardam em si riquezas. 
Todas podem ser compartilhadas, aprendidas, fonte e 
motor de qualquer prática educativa, Elas dizem res-
30
peito a vidas humanas, a individualidades socialmen-
te constituídas, a culturas, a modos de ser e existir, de 
viver e conviver. Não pode haver uma comparação e 
uma valoração sobre elas. Nenhuma delas tem maior 
valor sobre outras. Todas são extremamente importan-
tes para a vida educativa. Por isso, é preciso valorizar 
as experiências cotidianasde cada um. Elas permane-
cem em um falso patamar de inferioridade, quando 
se trata de educação. É necessário valorizar os saberes, 
principalmente àqueles que não alcançaram o status da 
cientificidade laureada e reconhecida pela instituição 
acadêmica. Eles também têm muito a nos dizer e a nos 
educar sobre distintas formas de sentir, estar, e viver no 
mundo, nas trocas entre diferentes idades, contextos di-
ferenciados e distintas fontes de saber (PEDERIVA, et al, 
2018, p. 26, 27).
Se opondo firmemente ao projeto de educação capita-
lista e de base colonial, sua perspectiva vai ao encontro 
do humanismo, coletivismo, democratismo, do respeito 
à personalidade do indivíduo, que tinha sim, como ob-
jetivo, alterar o tipo humano histórico. Pensar uma edu-
cação onde se leve em conta que nos constituímos his-
tórico culturalmente, onde se perceba que é na relação 
com o outro e na troca de experiência que me estabeleço 
e estabeleço meus saberes, nos coloca em um patamar de 
corresponsabilidade com o outro, onde se pode enxer-
gar e reconhecer a diversidade que nos compõem e final-
mente nos proporcionar a experiência de vivenciar uma 
sociedade desescolarizada onde a aprendizagem seja li-
vre de qualquer amarra, ou melhor, de qualquer escola.
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e Desenvolvimento Humano em: Sinara Almeida da Costa, 
31
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32
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VIGOTSKI, Lev. Semenovich. Psicologia Pedagógica. 
Porto Alegre: ARTMED Editora, 2003.
33
REFLEXÕES SOBRE A 
EDUCAÇÃO DOS ALUNOS 
LGBTQ+ NAS ESCOLAS 
MILITARES
Weriklis Marques1
weriklis.lideres@gmail.com
A educação militar é vista por muitos na sociedade 
como exemplo de educação e disciplina para os jovens, 
uma educação que fornece, segundo essa visão, “resul-
tados positivos” como sucesso acadêmico e patriotismo 
para a vida dos seus alunos dentro de uma carreira mi-
litar. Mas, o que as pessoas desconhecem é o fato de os 
alunos serem silenciados dentro dessas instituições.
Os alunos LGBTQ+, atualmente, sofrem com a re-
pressão dentro dos ambientes escolares, ambientes esses, 
que deveriam acolher e possibilitar todos aqueles que 
estão em seus espaços a plena condição de se desen-
volver, seja nos aspectos mentais, físicos, acadêmicos e 
sociais, pelo fato da escola ser um dos maiores ambien-
tes de socialização que os indivíduos têm fora de seus 
ambientes familiares. A não possibilidade desse desen-
volvimento tem implicado de modo negativo na vida 
desses estudantes. 
As identidades sexuais não hegemônicas estão ga-
nhando cada vez mais espaço de discussão e garantia 
1 Estudante de graduação do curso de Pedagogia da Universida-
de de Brasília, membro do grupo PET-Educação.
34
de direitos dentro da sociedade, esse florescimento favo-
rece o debate, a construção de argumentos e a descons-
trução de preconceitos. Ao mesmo tempo em que esses 
assuntos ganham enfoque, ainda assim, esses “corpos 
estranhos” sangram diante de nós e imploram a possi-
bilidade de um dia ter o pleno desenvolvimento como 
qualquer outro indivíduo deveria ter. No ano de 2017 
o número de assassinatos de LGBTQ+ cresceu 30% de 
acordo com o jornal “O GLOBO Sociedade”, esse núme-
ro chega a 445 mortos. Nossa sociedade distingue e clas-
sifica as pessoas por não corresponderem ao “padrão” 
imposto pela mesma.
Entende-se que o ambiente escolar deveria ser o pró-
prio desconstrutor dessas ideias que oprimem os indi-
víduos, segundo afirma Vigotski et al. (2006, p. 28), “[...] 
deve ser trabalhada intencionalmente para humanizar o 
mundo por meio de uma formação cultural e da práxis 
transformadora de todos os cidadãos sujeitos da sua his-
tória [...]”.
Isto posto, esse artigo discute a violência sofrida des-
ses corpos dentro da educação militar que hoje em dia se 
faz opressora e transgressora perante esse público, e tem 
por objetivo questionar esses atos nessas instituições de 
ensino. Assim, traremos durante o texto algumas falas 
de pessoas que vivenciam problemáticas que expressam 
essa realidade.
CONSTITUIÇÃO E O DIREITO À 
EDUCAÇÃO PARA TODOS
“Lembro que realmente entendi bem o que eu era no meu 
segundo 9º ano, pois eu reprovei nessa série. Como o proces-
so de ensino e disciplina lá era bastante rígido e as pessoas 
tinham as mentes muito fechadas, elas não conseguiam ab-
sorver a ideia de que eu ainda não tinha consciência do que 
35
eu gostava ou do que eu era. Já cheguei e ser alvo de piadas 
durante uma época da minha vida escolar, de preferência no 
meu 7º ano, por causa das músicas que eu ouvia. Já cheguei a 
me forçar a gostar de garotas e também já tentei um namoro 
com minha atual melhor amiga, que nunca aconteceu e me tor-
turava por isso. O único momento em que eu pude realmente 
me sentir liberto disso foi somente quando eu saí do colégio, 
porque ali não se pregava liberdade, eles tinham medo de tocar 
nesse assunto. Nem os professores chegavam nesses assuntos 
por acharem algo “muito delicado”. Os meus colegas também 
demoraram a tocar nesse assunto pois eles mesmos não sabiam 
o que queriam também, no final das contas. Em suma, foi uma 
experiência de descoberta e sobrevivência, visto que eu fiquei 
nesse colégio desde o meu jardim III e sai de lá formado.” (re-
lato de um aluno de 19 anos, via whatsapp).
Esse depoimento evidencia o quanto a escola era 
omissa as questões de gênero e sexualidade, e como isso 
é maléfico para a vida dos alunos. A constituição brasi-
leira de 1988, no artigo 205, prevê e assegura o direito à 
educação dizendo:
A educação, direito de todos e dever do Estado e da fa-
mília, será promovida e incentivada com a colaboração 
da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da 
pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua 
qualificação para o trabalho.
Devemos nos atentar a que tipo de educação a cons-
tituição está se referindo. A educação que as escolas mi-
litares hoje em dia ministram, é especificamente voltada 
para o âmbito tecnicista, engessada nos moldes da socie-
dade capitalista, ou seja, uma educação de “máquinas”. 
Nega-se a esses alunos um processo educativo humani-
zador, que os ajude nos conflitos pessoais e sociais e que 
também favoreça a condições física e psicológica para o 
suporte das decisões desses alunos.
36
Para além da capacitação profissional, a Constituição 
Federal cita o pleno desenvolvimento das pessoas,entre-
tanto, as escolas militares ferem diretamente o que é pre-
visto em lei, pois, o desenvolvimento dos alunos LGB-
TQ+ estão sendo prejudicados pelo simples fato de não 
haver qualquer tipo de orientação, debates ou palestras 
sobre o assunto. Nesse sentido, como é possível desen-
volver-se em meio ao desconhecido? A negação de infor-
mações e de debates corrompe diretamente o autoconhe-
cimento no âmbito social. Ser visto como estranho pela 
sociedade é algo bastante doloroso, mas, ser visto como 
estranho por si mesmo, quando não há espaços educati-
vos para o auto reconhecimento, é mais perturbador do 
que qualquer outro julgamento vindo do externo.
O Artigo 205, já citado, responsabiliza diretamen-
te três setores para o desenvolvimento dessa educação, 
sendo estes: o Estado, a família e a sociedade. Nas co-
munidades LGBTQ+, entende-se que todos esses res-
ponsáveis pela educação corrompem esse direito a es-
sas pessoas. O Estado corrompe essa educação quando 
apoia diretamente a Base Nacional Curricular Comum 
(BNCC), pois há omissão às informações sobre gênero e 
sexualidade. Vale lembrar também que a BNCC norteia 
os currículos escolares das escolas de todo o país na edu-
cação infantil e no ensino fundamental. Incluir assuntos 
como esse na BNCC nos garantiria o debate integral do 
mesmo nas instituições de ensino de todo Brasil.
A família também veta esse direito quando não dis-
cute, ainda em casa, gênero e sexualidade e quando 
também não reconhecem seus filhos na condição inte-
gral como LGBTQ+, oprimindo e violentando-os física 
e verbalmente. A sociedade participa dessa rede de abu-
so de algumas maneiras, como por exemplo, o silencia-
mento com o desrespeito moral dos alunos nas escolas, 
apoiando argumentos sociais homofóbicos e transfóbi-
37
cos que causam o desrespeito no convívio social das pes-
soas LGBTQ+.
Um dos casos mais recentes de homofobia que veio 
a público é o do aluno Talles de Oliveira Farias do Insti-
tuto de Tecnologia Aeronáutica. Talles se formou em en-
genharia e na cerimônia de formatura usou maquiagem 
e um vestido vermelho que continha frases como “ITA 
excelência em: homofobia, machismo, racismo, fascismo, 
violência.” Talles subiu ao palco, recebeu seu diploma 
com esse vestido o que causou um extremo alvoroço. 
Além disso, o estudante se pronunciou detalhando o co-
tidiano do que viveu dentro do colégio.
“Desde os 12 anos, eu sempre ouvi coisas maravilhosas so-
bre o ITA. Sobre ser a melhor universidade do país, a possibi-
lidade de receber dinheiro durante a graduação, a quantidade 
de oportunidades que se abriam ao fazer essa faculdade. O ITA 
era meu grande sonho. Mal sabia que seria a maior decepção de 
minha vida. Durante o ensino médio estudei numa escola mili-
tar da Aeronáutica (EPCAR) e já fui para lá com muito medo 
que descobrissem sobre minha orientação sexual, expulsassem-
-me e que minha família, que na época não sabia, descobrisse 
que havia sido expulso devido a minha orientação sexual. Seria 
uma grande tragédia, já que na época sentia vergonha por ser 
LGBT. Eu não conhecia nenhum regulamento da aeronáutica 
e não precisava para saber que era um ambiente homofóbico. 
Desde pequeno as pessoas nos ensinam que ser LGBT é vergo-
nhoso e levamos muito tempo para superar essas feridas. Senti 
como a homofobia acontece nas Forças Armadas através da 
invisibilidade, da chacota e da expulsão daqueles que ousam 
se abrir em relação a sua orientação sexual. Assim, se passam 
os anos e os homossexuais lá presentes precisam levar uma 
vida marginalizada e escondida para que não o descubram e o 
eliminem. Invisíveis, vivem suas vidas. Cheguei no ITA e de-
cidi que pra mim bastava. Aceitem-me como sou ou sejam ex-
postos pelo que vocês são. Não me aceitaram, violentaram-me, 
38
riram de mim, tentaram me tornar invisível. Que a exposição 
os mude porque eu vou continuar me amando e me fazendo 
muito presente mundo afora.” (Talles de Oliveira Farias).
Esse tipo de depoimento é extremamente raro, pois 
os alunos sentem medo de possíveis perseguições que 
esse tipo de exposição pode trazer, Talles só conseguiu 
se pronunciar depois de conseguir se formar na insti-
tuição, assim não tendo mais vínculos com a mesma. É 
preciso oportunizar ampla discussão sobre o tema. Esse 
artigo é um esforço nesse sentido.
“Ninguém educa ninguém, como tão pouco ninguém 
se educa a si mesmo: os homens se educam em comu-
nhão, mediatizados pelo mundo” (FREIRE, 1981, p. 79). 
Essa citação de Paulo Freire nos mostra brilhantemente 
como o processo educacional deveria ser realizado nos 
espaços educativos. A educação para esse autor é uma 
via de mão dupla, em que professores não se colocam 
em uma relação vertical perante a seus alunos, mas sim 
em uma relação de iguais, organizando o conhecimento 
compartilhado por todos. O aluno aprende com o pro-
fessor assim como o professor aprende com o aluno, 
dessa forma, não se colocando como detentor de todo 
o conhecimento, aliás o ser humano nem no fim de sua 
vida se tornará um sujeito completamente desenvolvi-
do, sempre estará em processo de construção, e é exata-
mente o contrário que os exemplos aqui compartilhados 
mostram, e como essa prática docente vem danificando 
os processos de aprendizagem dos alunos das escolas 
militares.
COMO A SOCIEDADE ENXERGA A 
DENÚNCIA
O jornal Metrópoles publicou em 19/12/2016 uma 
matéria que falava a respeito de uma página no Facebook, 
39
criada com o intuito de denunciar os abusos e as intole-
râncias vividas pelos alunos, a matéria dizia:
“Desde a terça-feira (27/12/16), alunos e ex-alunos de 
colégios militares de todo o Brasil tem usado uma pági-
na no Facebook para expor situações constrangedoras (e 
até criminosas) vividas dentro das dependências da ins-
tituição. A página, batizada de No Meu Colégio Militar, 
recebe relatos por e-mail e via formulários e os publica 
de forma anônima. Em dois dias, conquistou mais de 5 
mil curtidas. Segundo estudantes, escolas mantidas pela 
instituição em todo o país, inclusive a de Brasília, enfren-
tam problemas como racismo, machismo, intolerância 
religiosa e homofobia.”
Com a criação da página os alunos se sentem mais 
confortáveis para relatar suas vivências, uma vez que 
são vistos como anónimos pelos leitores, alguns exem-
plos das denúncias são:
“Sargento chamou um casal heterossexual de alunos e deu 
parabéns para o homem (como se a mulher sequer estivesse ali) 
e o parabenizou por “não ter seguido a moda e virado viado 
também”. Enquanto isso, na festa do alívio dezenas de beijos 
heterossexuais; quando houve o primeiro beijo LGBT, houve 
intensa movimentação para punir apenas esse e acionar os 
pais dos alunos. Segundo o comandante de companhia, “beijos 
são proibidos na instituição e se não quiser que papai saiba é 
só não fazer”. A homofobia ali não é velada.”
“Sou repreendida por abraçar qualquer pessoa do mesmo 
sexo por conta da minha sexualidade, enquanto vejo casais he-
terossexuais de mãos dadas no meio do pátio.”
“Em 2015, estava em simulação da ONU em Brasília, repre-
sentando o meu colégio, e estávamos de roupa civil dentro do 
ônibus (que nos levaria de volta ao CMB, onde estávamos hos-
pedados). Tinha vários casais heterossexuais de mãos de dadas 
dentro do ônibus, mas quando fui segurar a mão do meu par-
https://www.facebook.com/nomeucm/
40
ceiro um sargento do CMSM imediatamente nos repreendeu, e 
ameaçou nos dar um informativo negativo.”
“Quando eu namorei um menino nenhum monitor ou pro-
fessor reclamou de estarmos juntos. Quando eu consegui uma 
namorada eu não podia ficar nem perto dela direito que tinha 
um monitor por perto para ameaçar.”
“Sou ex aluna do cmb tem 1 ano, e passei diversas situações 
onde minha sexualidade foi um problema, já recebi alfinetadas 
sobre homossexuais vindas de professores e tive de suportar 
um monitor que ficou sabendo que eu namorava uma garota 
da minha companhia e a levou para conversar e tentar conven-
cê-la que era errado, ao procurá-la me depareicom a cena do 
monitor dizendo que íamos pro inferno e ele para o céu e que 
seria triste ir para um lugar diferente do nosso. Tirando as 
milhares de dificuldades com os alunos do colégio, que faziam, 
com frequência, comentários extremamente preconceituosos e 
machistas comigo.”
“O capitão de CIA proibiu casais do mesmo sexo de dan-
çarem na festa junina (de acordo com ele casal é só menino e 
menina), especificou q o “certo” para a dança eram os garotos 
usarem calça, não roupas “femininas” e disse que “famílias 
estruturadas” já deveriam ter ensinado isso”
De um lado vemos um público de alunos denuncian-
do a violência presenciada dentro das instituições, agora, 
veremos o que a sociedade pensa sobre essa quebra de 
silêncio que pode corromper a imagem até então “im-
pecável” das escolas militares, os seguintes comentários 
foram retirados da mesma página do Facebook:
“Se vc é contra os colégios militares com certeza se enquadra 
em um ou mais quesitos listados:
* É homossexual recalcado (tive amigos homoxessuais em 
CM q gostavam do colégio)
* Votou no PT na última eleição.
* E defensor do Jeanus Wyllis.
* E feminista ferrenha ou
41
* Fuma maconha.
Perceba q com certeza vc q n gosta do CM se enquadra em 
um desses quesitos.”
É perceptível no comentário acima, o quanto as mino-
rias que se expressam e denunciam as agressões são vis-
tas de forma estereotipada, apenas por estarem expondo 
abertamente agressões que até então estavam escondi-
das, continuemos com outros exemplos:
“Alô, é dos direitos humanos? Liguei pra denunciar que eu 
sou um bosta.”
“Perdedores, fracassados.”
“Até onde me lembro, no meu Colégio Militar tinha con-
curso para entrar, talvez o mais concorrido da cidade, Campo 
Grande - MS, nunca ninguém foi obrigado a ficar lá e aque-
les que+ ficaram tiveram suas bases de conhecimento, ética e 
patriotismo muito reforçada. Isso aqui é uma página de um 
monte de gente tendenciosa, falando um monte de merda que 
inventam durante a aula que não querem assistir.”
Devemos nos atentar ao fato de que as pessoas que 
comentam as publicações, estarem sempre deixando 
explícito que os alunos denunciantes estão de alguma 
maneira tentando “destruir” a escola militar e que os 
mesmos não estariam interessados em estudar, mas será 
mesmo essa real intenção do público? Esses alunos es-
tariam de fato tentando implodir o ensino militar? Uma 
pessoa que não se sente respeitada e com o mínimo de 
condições saudáveis de saúde mental é impossibilitada 
de estar tendo o seu rendimento educativo e desenvolvi-
mento pessoal normalizado no âmbito em que se é inse-
rido, ou seja, se você não se sente confortável na sua rede 
de ensino, logo, essa instituição estará descumprindo o 
que era proposto de início para todos os alunos, o de-
senvolvimento pleno do ser, sendo este pessoal, mental 
e físico. Mais uma vez, o oprimido é subjugado, mes-
42
mo no exercício de seu pleno manifesto, o que se torna 
preocupante.
Analisemos um sujeito que está em constante sofri-
mento dentro dessas instituições: Temos um adoles-
cente que está na flor de sua puberdade e se descobre 
homossexual, esse indivíduo que tem uma educação 
militar, normalmente vem também de uma família tra-
dicional militar, ou seja, já não terá na maioria das vezes 
o apoio de sua família na sua sexualidade, esse adoles-
cente também é rodeado por profissionais que estão a 
todo o momento enfatizando o quanto ser LGBTQ+ no 
meio militar é errado, onde esse aluno procurará apoio 
para se desenvolver? Seria quase como um labirinto sem 
saída, seria necessária muita força psicológica para que 
esse adolescente compreenda sua identidade de gênero 
e sexualidade.
A PERSPECTIVA DE VIGOTSKI
No Livro fundamentos da defectologia, Vigotski 
(1997) compreende ser alto o prejuízo que a segregação 
das classes pode causar. Alunos com a sexualidade se-
melhante comprometem as trocas psicossociais, pelo 
fato já citado anteriormente, a qual a homogeneização 
social está muito intrínseca na escola. Logo, sem a vivên-
cia da diversidade instaurada, esse processo de conheci-
mento do “diferente” tornou-se inviável. De acordo com 
o pensamento vigotskiano, “a criança acrescenta novas 
competências àquelas em curso, por meio de apropria-
ções semióticas, tendo o adulto ou um outro mais de-
senvolvido como mediador dessa competência”. Isso 
fundamentaliza a crítica ao modelo de escolarização da 
educação militar a qual não proporciona as relações so-
ciais entre os diferentes, reforçando a homogeneização 
de perfis.
43
Quando a pessoa é criada e educada a respeitar ape-
nas seus “aparentemente” iguais, o encontro com o dife-
rente faz com que haja um estranhamento. Pelo fato de 
ser desconhecido, curioso, esse “estranhamento” pode 
vir a se tornar agressivo, preconceituoso e perigoso para 
os dois grupos que se encontram.
Torna-se nítido que com o preconceito no qual os alu-
nos vivenciam na educação militar, seus efeitos não se 
limitam apenas à comunidade LGBTQ+. Como afirma 
Vigotski (2001, p. 63), “o comportamento do homem é 
formado por peculiaridades e condições biológicas e 
sociais do seu crescimento”. Os alunos no meio social 
da escola também sofrem indiretamente os impactos da 
tentativa que o sistema impõe da não existência desses 
alunos LGBTQ+. Os processos de socialização dos dois 
grupos são extremamente necessários para que haja a 
construção coletiva e diversificada do meio. No entan-
to o não estabelecimento dessa prática cultural histori-
camente localizada de ambos os grupos podem causar 
impactos sérios para a socialização. Observo aqui que 
a constituição da diversidade desses grupos citados, é 
na verdade o que estabelece a unidade e que por isso os 
tornam plurais, diversos e heterogêneos.
Sobre a importância da afetividade nas relações so-
ciais, trata-se de
um processo que se dá a partir e por meio de indivíduos 
com modos histórica e culturalmente determinados de 
agir, pensar e sentir, sendo inviável dissociar as dimen-
sões cognitivas e afetivas dessas interações e os planos 
psíquico e fisiológico do desenvolvimento decorrente. 
[…] a interação social torna-se o espaço de constituição 
e desenvolvimento da consciência do ser humano des-
de que nasce (BRASIL, 2006).
44
Reafirmamos, então, a importância da relação social 
no processo de aprendizagem do aluno nos espaços de 
educação. Devemos esclarecer que esse vínculo deve ser 
respeitado para que o processo de aprendizado se torne 
humano e mais acessível para todos os alunos, favore-
cendo o plano psíquico emocional e o desenvolvimen-
to do ser social na sua integridade como indivíduo na 
sociedade.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A problemática citada dá ouvido aos alunos que estão 
sendo vítimas dentro dos seus espaços escolares, onde 
deveriam estar sendo educados para o exercício da ci-
dadania, desenvolvendo seu ser social e não passando 
por questões violentas nesses espaços. É importante a 
discussão do tema para que a escola militar reavalie 
seu comportamento em relação a estrutura político pe-
dagógica perante seus alunos, e para que seus docen-
tes tenham mais consciência das agressões e o que elas 
causam aos seus discentes. O artigo também alerta a so-
ciedade para se responsabilizar as agressões até então 
silenciosas que os alunos vêm sendo expostos dentro 
das instituições até então vistas pela mesma como mo-
delo. Devemos também ouvir com atenção as denúncias 
dos alunos e não banaliza-las, uma vez que os mesmos 
vivem o cotidiano e as dinâmicas das escolas e tem local 
de fala para dizer o que sentem em relação a esses es-
paços que deveria ser agradáveis para o público escolar.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Ministério da Educação. Parâmetros Nacionais 
de Qualidade para Educação Infantil. Brasília: MEC/
SEB, 2006 v. 1.
45
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da Repúbli-
ca Federativa do Brasil. Brasília, DF, Senado, 2010.
FREIRE, P. Pedagogia do Oprimido. 9 ed., Rio de Janei-
ro. Editora Paz e Terra. 1981, p. 79.
FACEBOOK. in: No meucolégio militar. Disponível em: 
https://www.facebook.com/nomeucm/ Acesso em: 21 
de março de 2018.
FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. 9 ed., Rio de 
Janeiro. Editora Paz e Terra. 1981, p. 79.
VIGOTSKI, Lev. S. Fundamientos da Defctologia: Obras 
Escogidas V. Madri: Visor, 1997.
_____Psicologia pedagógica. São Paulo: Martins 
Fontes, 2001.
_____LURIA, A. R; LEONTIEV, A.N. Linguagem, desen-
volvimento e aprendizagem. São Paulo: Ícone, 2006.
https://www.facebook.com/nomeucm/
47
DESENVOLVIMENTO 
HUMANO E INSTITUIÇÕES 
SOCIAIS: FAMÍLIA E ESCOLA 
NA CONSTITUIÇÃO DA 
DIVERSIDADE
Samuel Brito de Gusmão1
saamuel.bg@gmail.com
Fabrício Santos Dias de Abreu2
fabra201@gmail.com
O eminente teórico russo Lev Semyonovich Vigotski 
na obra Psicologia Pedagógica (2001), publicada origi-
nalmente em 1926, busca compreender o desenvolvi-
mento humano e suas relações com os processos educa-
cionais. O autor se interessa por investigar as bases da 
atividade consciente do homem e defende que nossas 
formas específicas de ser, pensar, agir e sentir encontram 
sua gênese nas relações sociais travadas na cultura. As-
sim, são as experiências históricas, culturais e sociais as 
responsáveis pela emergência de um funcionamento 
cognitivo que diferenciam o comportamento humano 
do instinto animal. 
1 Estudante de graduação do curso de Pedagogia da Universida-
de de Brasília, membro do grupo PET-Educação.
2 Professor da Secretaria de Educação do Distrito Federal. Peda-
gogo, Mestre em Psicologia e Doutorando em Educação.
48
O fator decisivo do comportamento humano não é só o 
fator biológico, mas também o social, que confere com-
ponentes totalmente novos à conduta do ser humano. 
A experiência humana não é apenas o comportamento 
de um animal que adotou posição vertical, mas é uma 
função complexa de toda a experiência social da huma-
nidade e seus diferentes grupos (p. 63).
Através dessa compreensão, Vigotski foi capaz de 
nos revelar o caráter social do processo educativo. Nes-
se sentido é importante ressaltarmos que a educação só 
ocorre por meio da experiência, em que são construídas 
novas reações no organismo. Reações estas que como 
bem ilustra o autor:
É evidente que esse novo sistema de reações é total-
mente determinado pela estrutura do ambiente no qual 
o organismo cresce e se desenvolve. Por esse motivo, 
toda educação tem inevitavelmente um caráter social 
(VIGOTSKI, 2001, p. 75). .
Com isso, os ambientes culturais e as experiências 
sociais que emanam dos encontros são, antes de tudo, 
espaços educativos por influenciarem diretamente a 
conduta humana.
Na sociedade ocidental, convencionou-se que a edu-
cação deveria se organizar em um local específico, com 
tempos e ritos próprios, chamado de escola. Pesquisas 
como a feita por Gusmão (2018), que parte de uma revi-
são de literatura sobre a temática, tem demonstrado que 
o espaço escolar é marcado por tentativas de controle 
dos corpos a partir de um modelo considerado ideal de 
sujeito: branco, masculino, heterossexual, sem deficiên-
cia e cristão. Neste texto discutiremos sobre os processos 
de heteronormatização que foi, historicamente, construí-
da dentro de uma concepção moral cristã-burguesa, en-
49
gendrando violências que perpassam as existências de 
pessoas LGBTQ+3. Estes sujeitos têm sido educados em 
ambientes que deslegitimam suas experiências. Por não 
se adequarem às normas culturais hegemônicas, são co-
locados no local da abjeção, ou seja, como explica Louro 
(2001), nas zonas inabitáveis da vida social. 
O sujeito abjeto […] não necessariamente admite de-
terminada identidade, ele apenas representa o local 
da diferença e do considerado não natural, que por ser 
vista como uma ameaça ao padrão comportamental 
heteronormativo, deve ser afastada (GUSMÃO, 2018, 
pp. 30/31).
A abjeção institui no corpo desses sujeitos o local da 
clandestinidade, da desigualdade, da discriminação e 
da exclusão e os processos escolares são marcados pela 
violência, vulnerabilidade e evasão. 
O espaço da universidade foi para mim4, como es-
tudante do curso de Pedagogia, um local primordial 
para que pudesse compreender de forma mais evidente 
os processos, que, nos mais diversos meios sociais em 
que estive presente, deslegitimavam minhas formas de 
sentir, de ser e de estar no mundo, levando-me a censu-
rar parte daquilo que me constitui enquanto pessoa: os 
meus desejos afetivos-sexuais. 
Hoje, com um pouco mais de consciência, e me utili-
zando desta palavra pela concepção vigotskiana de au-
torregulação nos espaços, entendo o quão pungente foi 
este processo. Por isso, busco neste artigo, através das 
3 Sigla que faz referência às identidades sexuais e de gêneros não 
heterossexuais/cisgênero. 
4 Este texto foi construído por meio da história de vida do primei-
ro autor. A partir de sua narrativa autobiográfica foi-se tecendo 
analises teóricas.
50
minhas experiências em diferentes meios sociais, como 
a escola e a família (entendendo essa instância como um 
lócus de educação) dialogar com a teoria histórico-cultu-
ral de Vigotski e os estudos de gênero, em especial aque-
les que ganharam força na metade final do século XX, 
para que sejamos capazes de entendermos brevemente a 
raiz dessas estruturas heteronormativas e, que, por meio 
dessa reflexão, pensemos em atuações mais humaniza-
das e acolhedoras.
FAMÍLIA: DO ACOLHIMENTO A 
NORMATIZAÇÃO 
– “Você gostaria de ser menina?” – foi assim que, ques-
tionado pelo meu pai em uma de nossas reuniões fami-
liares, entendi pela primeira vez que, de alguma forma, 
parte do que eu era nunca seria bem-vindo naquele 
espaço. Apesar de destoante dos papéis hegemônicos 
de masculinidade, meu comportamento tinha menos 
a ver com uma “vontade de ser menina” – embora em 
determinados momentos essa parecesse a solução per-
feita para a tão sonhada aceitação social – do que com 
meus desejos afetivos e sexuais. Ainda assim, atitudes 
como essas demarcavam até onde minhas experiências 
seriam aceitas, validadas, respeitadas e abraçadas na-
quele espaço.
As reflexões de Junqueira (2013) são capazes de nos 
ajudar a compreender este processo ao revelar o ambien-
te familiar como crucial na “instituição heteronormativa 
da sequência sexo-gênero-sexualidade”, que de forma 
biologizante entende o comportamento heterossexual 
51
cisgênero5 enquanto natural e hierarquicamente supe-
rior, colocando aqueles sujeitos que não se enquadram 
dentro dos padrões heteronormativos6 em uma posição 
de inferioridade, validando o processo de exclusão e 
dominação de uns (heterossexuais) sobre os outros (ho-
mossexuais, bissexuais, transgêneros e etc.) (JUNQUEI-
RA, 2013 e SCHULMAN, 2009).
Não obstante, tornava-se necessário que determina-
das medidas coercitivas fossem tomadas para que eu 
fosse capaz de desempenhar o “papel masculino” im-
posto como norma, que como Connel (1995) nos ajuda a 
entender, ao se tornar um conceito popular na definição 
da “masculinidade apropriada”, não nos permite com-
preender as complexas, diversas e “múltiplas formas 
de masculinidade” (p. 188). É importante entender que 
muitas vezes, no imaginário social, os conceitos gênero 
e sexualidade se misturam, partindo de um pressuposto 
machista que encara a feminilidade como fator de fra-
queza, por sua relação com gênero feminino. Homens 
que performam outros tipos de masculinidades, não 
hegemônicas (seja ela afetivo e sexual, seja ela compor-
tamental), são associados de forma depreciativa ao femi-
nino, reforçando a relação sexista existente entre homo-
fobia, machismo e a imposição de uma forma única de 
masculinidade. Portanto, ao trazermos essas referências 
ao texto, não estamos, de forma alguma, concordando 
com os seus usos, mas, sim, utilizando-as como forma 
de retratar uma realidade social na denúncia de que a 
5 Termo utilizado para se referir a pessoas cujo sua identidade 
de gênero corresponde ao sexo que culturalmente é entendido 
como natural. 
6 A heteronormatividade “pode ser entendida como a naturaliza-ção da heterossexualidade como única expressão sexual e iden-
titária” (GUSMÃO, 2018, p. 21).
52
base do pensamento homofóbico é o machismo e a de-
preciação de tudo que se aproxima do feminino.
Butler (2019) nos ajuda a compreender melhor es-
sas questões ao explicar que as identidades de gênero 
se materializam como uma relação existente entre sexo, 
gênero, prática sexual e desejo. Essas características que 
compõem a experiência dos sujeitos no mundo são, an-
tes de mais nada, constructos sociais e históricos, na qual 
a heterossexualidade compulsória incide de forma dire-
ta na tentativa de forjar os corpos a partir de dicotomia 
homem e mulher.
Com isso, ainda antes de uma possível consciência 
identitária sexual e afetiva, a forma considerada “não 
masculinizada” como eu atuava no mundo já me co-
locava dentro de um espectro da homossexualidade, 
apontando que para os outros, havia em mim uma des-
continuidade e incoerência de gênero e sexualidade. O 
comportamento, considerado desviante, era estigma-
tizado, censurado e haviam tentativas explicitas de me 
“realocar” na performance de gênero típicas de quem 
nasce biologicamente homem. 
A postura coercitiva que meu pai e minha mãe toma-
vam, muitas vezes, diante do meu – lido por eles –“jeito 
afeminado”, referendava que atuassem como vigiais da 
performance de gênero em busca de uma normatização. 
Essa ação, foi consequência de uma construção cultural 
que, historicamente, coloca a família nesse lugar de bus-
ca e afirmação da heterossexualidade compulsória. Seria 
o que Sarah Schulman (2009), entende por homofobia 
familiar, que através de uma estrutura social dominante, 
a dispõe como mecanismo de controle sobre a vida dos 
homossexuais. É nesse sentido que, ainda dentro de casa, 
a heteronormatividade, como bem retrata Junqueira 
(2013), age sobre os corpos, hierarquizando, controlando 
as identidades e comportamentos, naturalizando a hete-
53
rossexualidade, e legitimando-a como única expressão 
sexual natural e aceitável. 
A homofobia, construída historicamente a partir do 
cristianismo e reestruturada no contexto ocidental mo-
derno, influencia o comportamento de todos os sujei-
tos dentro das culturas regidas por esses dogmas. Logo, 
meus pais através de suas experiências sociais, enten-
diam a homossexualidade como uma forma não legiti-
ma de expressão afetivo-sexual, que precisava, a todo 
custo, ser reprimida. 
Dialogando com um dos pontos em que Vigotski 
(2001) discute sobre este espaço social, podemos enxer-
gar com mais clareza como se organiza esse processo. 
O autor nos explica que, embora a família nos permita 
criar vínculos sociais sólidos, este meio é limitado e pou-
co complexo. 
A família constitui um todo social não muito complexo 
com uma pequena quantidade de elementos bem-co-
nhecidos e com formas completamente estabelecidas de 
relações entre seus membros. Por isso, é capaz de criar 
na alma infantil vínculos sociais profundos e sólidos, 
porém de uma extensão sumamente limitada (VIGOT-
SKI, 2001, p. 106).
Então, embora o ambiente familiar estabeleça rela-
ções extremamente profundas entre seus membros, este 
se organiza de forma restrita e pouco diversa. 
Ao estudar a teoria de Darwin, Vigotski nos permi-
te compreender a diversidade como primordial para a 
constituição humana e continuidade das espécies (GUS-
MÃO, 2017). Diversidade que, muitas vezes, não encon-
tra espaço nos ambientes familiares, que por sua vez aca-
ba reproduzindo somente aquilo que, por meio de suas 
próprias experiências, já estão enraizados culturalmente, 
54
influenciando diretamente o processo de desenvolvi-
mento de crianças, adolescentes e adultos neste espaço 
A família ensina apenas aquilo que se relaciona ao mais 
íntimo e próximo nexo social, educa o doméstico, en-
quanto nossa época exige a grandiosa tarefa de educar 
um cidadão do mundo, ligado aos vínculos mundiais 
que aumentam dia após dia (VIGOTSKI, 2001, p. 106).
Por, de uma forma geral, não estar aberta à diversida-
de, esse local (família) acaba invalidando as diferentes 
formas de desejar, de ser e de estar no mundo, tornando-
-se espaço que reforça violências que estão estruturadas 
na sociedade contra sujeitos LGBTQ+.
A escola, por sua vez - devido à importância que toma 
para si no processo de desenvolvimento das pessoas - 
deveria assumir papel na instrução de seres humanos, os 
formando como sujeitos capazes de olhar para além do 
seu meio e suas convicções. Como bem afirma Vigotski 
(2001), enxergando e construindo novas possibilidades, 
o que, dentro de um contexto heteronormativo, seria a 
organização do espaço educativo para além destas nor-
mas e imposições sociais. Porém ao observá-la encontra-
remos outra realidade. 
ESCOLA: NORMATIZAÇÃO DOS CORPOS 
E HETEROSSEXISMO 
Existe uma construção cultural, que legitima a escola 
como fundamental para o desenvolvimento dos sujeitos 
(TUNES E PEDROZA, 2011). Illich (1979), na obra “So-
ciedade sem escolas”, traz uma reflexão sobre a escola-
rização, e sua reverberação na sociedade, que se tornou 
igualmente escolarizada (GUSMÃO, 2017). A escola ten-
ta tomar para si, exclusivamente, a função de ensinar, re-
55
forçando sua competência e necessidade no processo de 
aprendizado. 
Apesar disso, este meio social, colocado como indis-
pensável na vida e desenvolvimento das pessoas, e seu 
modelo tal qual o temos, tem sido utilizado para re-
forçar e referendar a heteronormatividade presente na 
sociedade. Gusmão (2017), afirma que no processo de 
segregação dos estudantes, as desigualdades presentes 
na sociedade, comandam o acesso às diversas formas de 
ensino e atuam diretamente dentro delas (das escolas). 
A heteronormatividade, construída culturalmente, está 
presente, então, nos processos educativos formais, edu-
cando, assim, os sujeitos deste ambiente, pautados em 
normas heterossexistas. 
Junqueira (2013) retrata que existe uma Pedagogia do 
Armário, que por meio de dispositivos e práticas curri-
culares – que tem como norteador central as normas de 
gênero – silencia, exclui e deslegitima corpos, saberes e 
identidades não heterossexuais. Segundo o autor, a or-
ganização da escola, associando o currículo ao cotidiano 
escolar, está estruturada para reforçar a homofobia e o 
heterossexismo. 
Embora os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN 
– 1997), publicados há mais de 20 anos, ressaltem a ne-
cessidade de que se abordem temáticas transversais a 
vida cotidiana dos brasileiros, como orientação sexual e 
pluralidade cultural nas diversas disciplinas, o que per-
cebemos, na realidade, é uma escola que negligencia a 
diversidade afetivo e sexual de seus alunos, abordando 
assuntos relacionados às sexualidades de forma simplis-
ta, baseada em um pressuposto biológico, heterossexual 
e cisgênero (GUSMÃO, 2018). 
Gusmão (2018), ressalta que, quando a escola nega 
elementos que permeiam as questões de sexualidade 
como afeto, corpo, prazer e sua construção cultural, ela 
56
transparece a postura coercitiva que tem desempenha-
do em função da heteronormatização através do silêncio 
discursivo. Silêncio este, que pautado numa estrutura 
de poder hierárquica heterossexual, constitui nossas ex-
periências enquanto seres culturais. 
Esse silêncio discursivo é marcado ainda pelo pres-
suposto heterossexual, que é continuamente reforçado: 
O pressuposto da heterossexualidade encontra-se expli-
citamente exposto nas aulas de Ciência que abordam a 
sexualidade apenas pelo viés reprodutivo, pelos livros 
de literatura que abordam apenas o amor romântico he-
terossexual, e também pelo modelo da família nuclear 
que é constantemente reproduzido nos livros didáticos 
(DINIS, 2011, p. 48). .
O silêncio discursivo, associado a tais representações 
heterossexuais, dentro da escola, são extremamente vio-
lentos. O sentimento de medo, para mim, era tão recor-
rente no cotidiano escolar, que eu buscava omitir todos 
aqueles comportamentos estigmatizados na figura de 
um menino afeminado. Mesmo

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