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0439 - Teoria Antropológica Contemporânea

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Prévia do material em texto

UNIVERSIDADE 
METROPOLITANA DE 
SANTOS 
Núcleo de Educação a Distância 
1 CIÊNCIAS SOCIAIS 
L 
Teoria 
Antropológica 
Contemporânea 
 
SEMESTRE 3 
 
 
UNIVERSIDADE 
METROPOLITANA DE 
SANTOS 
Núcleo de Educação a Distância 
2 CIÊNCIAS SOCIAIS 
Créditos e Copyright 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Este curso foi concebido e produzido pela Unimes Virtual. Eventuais marcas aqui 
publicadas são pertencentes aos seus respectivos proprietários. 
A Unimes Virtual terá o direito de utilizar qualquer material publicado neste curso 
oriunda da participação dos alunos, colaboradores, tutores e convidados, em 
qualquer forma de expressão, em qualquer meio, seja ou não para fins didáticos. 
Copyright (c) Unimes Virtual 
É proibida a reprodução total ou parcial deste curso, em qualquer mídia ou formato. 
TOJI, Simone. 
Teoria Antropolóica Contemporânea. Simone 
Toji. Santos: Núcleo de Educação a Distância da 
UNIMES, 2015. 96p. (Material didático. Curso de 
ciências sociais). 
Modo de acesso: www.unimes.br 
 
1. Ensino a distância. 2. Ciências Sociais. 3. 
Antropologia Contemporânea. 
 CDD 301 
 
http://www.unimes.br/
 
 
UNIVERSIDADE 
METROPOLITANA DE 
SANTOS 
Núcleo de Educação a Distância 
3 CIÊNCIAS SOCIAIS 
UNIVERSIDADE METROPOLITANA DE SANTOS 
FACULDADE DE EDUCAÇÃO E CIÊNCIAS HUMANAS 
PLANO DE ENSINO 
 
CURSO: Licenciatura em Ciências Sociais 
ANO: 2019 
COMPONENTE CURRICULAR: Teoria Antropológica Contemporânea 
PROFESSOR: Dra. Lecy Sartori 
SEMESTRE: 3º 
CARGA HORÁRIA TOTAL: 80 horas 
EMENTA: 
 
Dando continuidade à formação em teoria antropológica, a disciplina apresenta os 
desdobramentos teóricos das principais tradições de pensamento da Antropologia. 
Desse modo, familiariza o aluno com autores, temas e questões que se tornaram 
referência na Antropologia a partir da década de 1970. Tais debates acompanham a 
preocupação contemporânea em problematizar assuntos clássicos ou de se 
debruçar sobre temas atuais. 
Apresenta problematização e desdobramento da Escola Sociológica Francesa e do 
Estruturalismo. Apresenta a antropologia interpretativa. Problematiza o trabalho de 
campo e sua relação com o texto etnográfico. Debate os conceitos clássicos sob a 
ótica das teorias contemporâneas. 
 
OBJETIVO GERAL: 
Apresentar e discutir as principais correntes e autores antropológicos 
contemporâneos. 
 
 
 
UNIVERSIDADE 
METROPOLITANA DE 
SANTOS 
Núcleo de Educação a Distância 
4 CIÊNCIAS SOCIAIS 
OBJETIVOS ESPECÍFICOS: 
 
Unidade I - A antropologia francesa pós 1950 e a passagem para a antropologia 
americana com Marshall Sahlins. 
Objetivos da Unidade 
Mostrar o desenvolvimento da antropologia francesa pós 1950 através do trabalho 
de autores fundamentais para sua compreensão como Louis Dumont, que trabalha 
com os conceitos de igualdade e hierarquia, passando por algumas considerações 
sobre a teoria da prática do sociólogo Pierre Bourdieu, pelo trabalho de Pierre 
Clastres sobre a política e pela problematização da dicotomia natureza e cultura 
presente em Phillipe Descola. Também quer-se compreender o trabalho do 
antropólogo americano Marshall Sahlins, focado nas relações entre estrutura e 
história. 
 
Unidade II - A antropologia americana contemporânea: o trabalho de Clifford 
Geertz. 
Objetivos da Unidade 
Apresentar um dos principais autores da antropologia americana contemporânea, 
Clifford Geertz, bem como os conceitos e ideias desenvolvidas pelo autor. 
Apresentar a antropologia interpretativa. Entender o conceito de descrição densa. 
Os paradigmas das ciências humanas como modelo de conhecimento para a 
antropologia apresentados por Geertz. 
 
Unidade III - A antropologia pós-moderna e os questionamentos sobre o fazer 
etnográfico. 
Objetivos da Unidade 
Explicitar as idéias de alguns autores que passaram a olhar para a disciplina 
antropológica criticamente, questionando seus paradigmas e sua relação com seu 
 
 
UNIVERSIDADE 
METROPOLITANA DE 
SANTOS 
Núcleo de Educação a Distância 
5 CIÊNCIAS SOCIAIS 
objeto de estudo, isto é, o “Outro” ou os “nativos”. A noção de autoridade 
etnográfica, tal como entendida por James Clifford, é de fundamental compreensão 
neste sentido. Outras alternativas de elaboração textual são também alvo de estudo 
da unidade, já que se propõem a serem experimentações colaborativas com os 
povos estudados ou a explicitar de maneira mais nítida o lugar de onde fala o 
antropólogo. 
 
Unidade IV - Antropólogos contemporâneos, múltiplos objetos. 
Objetivo da unidade 
Dar um panorama da produção antropológica da segunda metade do século XX, 
passando por trabalhos variados, que abordam múltiplos problemas: desde o 
questionamento da própria noção de sociedade e reciprocidade, tidas até então 
como instrumentos clássicos da antropologia, até os temas da estética, do 
colonialismo, da identidade, da globalização, entre outros. Aqui é importante mostrar 
como a produção antropológica alavanca novos conceitos, renova antigos e lida com 
experiências sociais cada vez mais amplas. 
 
CONTEÚDO PROGRAMÁTICO 
UNIDADE I: A antropologia francesa pós 1950 e a passagem para a antropologia 
americana com Marshall Sahlins. 
UNIDADE II: A antropologia americana contemporânea: o trabalho de Clifford 
Geertz. 
UNIDADE III: A antropologia pós-moderna e os questionamentos sobre o fazer 
etnográfico. 
UNIDADE IV: Antropólogos contemporâneos, múltiplos objetos. 
 
Bibliografia Básica 
BOURDIEU, Pierre. Razões Práticas. Papirus, 2005. 
 
 
UNIVERSIDADE 
METROPOLITANA DE 
SANTOS 
Núcleo de Educação a Distância 
6 CIÊNCIAS SOCIAIS 
GEERTZ, Clifford. A Interpretação das Culturas. LTC, Rio de Janeiro, 1989 
SAHLINS, Marshall. Cultura e Razão Prática. Rio de janeiro, Zahar, 1979. 
 
Bibliografia Complementar 
 
CLASTRES, Pierre. A sociedade contra o Estado. Rio de Janeiro, Francisco Alves, 
1982. 
DUMON. Louis. O individualismo: uma perspectiva antropológica. Rocco, 1993. 
LATOUR, Bruno 1992 [1991]. Jamais fomos modernos. Ensaio de antropologia 
simétrica. Rio de Janeiro, Editora 34, 2009. 
AUGÉ, Marc. Não-lugares: introdução a uma antropologia da supermodernidade. 
Campinas, Papirus, 1994. 
HALL, Stuart. Identidades Culturais na pós-modernidade. Rio de Janeiro, DP7A, 
1997. 
METODOLOGIA: 
A disciplina está dividida em unidades temáticas que serão desenvolvidas por meio 
de recursos didáticos, como: material em formato de texto, vídeo aulas, fóruns e 
atividades individuais. O trabalho educativo se dará por sugestão de leitura de 
textos, indicação de pensadores, de sites, de atividades diversificadas, reflexivas, 
envolvendo o universo da relação dos estudantes, do professor e do processo 
ensino/aprendizagem. 
 
AVALIAÇÃO: 
A avaliação dos alunos é contínua, considerando-se o conteúdo desenvolvido e 
apoiado nos trabalhos e exercícios práticos propostos ao longo do curso, como 
forma de reflexão e aquisição de conhecimento dos conceitos trabalhados tanto na 
parte teórica como na prática e habilidades. Prevê ainda a realização de atividades 
 
 
UNIVERSIDADE 
METROPOLITANA DE 
SANTOS 
Núcleo de Educação a Distância 
7 CIÊNCIAS SOCIAIS 
em momentos específicos como fóruns, chats, tarefas, avaliações a distância e 
Prova Presencial, de acordo com a Portaria de Avaliação vigente. A Avaliação 
Presencial, está prevista para ser realizada nos polos de apoio presencial, no 
entanto, poderá ser realizada em home seguindo as orientações das autoridades da 
área da saúde e da educação e considerando a Pandemia COVID 19. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
UNIVERSIDADE 
METROPOLITANA DE 
SANTOS 
Núcleo de Educação a Distância 
8 CIÊNCIAS SOCIAIS 
Sumário 
 
Aula 01_A Escola Sociológica Francesa e seu desdobramento com Louis Dumont ..............10 
Aula 02 _Igualdade e hierarquia como ideologias ......................................................................12Aula 03 _O contraponto de Pierre Bourdieu ................................................................................14 
Aula 04_A Teoria Prática de Bourdieu .........................................................................................16 
Aula 05_Pierre Clastres e a sociedade contra o Estado ............................................................18 
Aula 06 _Chefes sem poder e o poder fora do Estado ...............................................................20 
Aula 07_Cultura e razão prática: Marshall Sahlins .....................................................................22 
Aula 08_Estrutura e História .........................................................................................................24 
Aula 09_Natureza e cultura rediscutidas: humanos e não-humanos em Philippe Descola ....26 
Resumo da Unidade I ....................................................................................................................30 
Aula 10_Geertz e a Antropologia Interpretativa ..........................................................................32 
Aula 11_“Um Jogo Absorvente: Notas sobre a Briga de Galos Balinesa” ................................35 
Aula 12 _“O ponto de vista do nativo”: a perspectiva de Geertz ...............................................38 
Aula 13_As humanidades como paradigma para a teoria antropológica..................................40 
Resumo da Unidade II ...................................................................................................................42 
Aula 15_ Rabinow e seus amigos do Marrocos ..........................................................................46 
Aula 16 _O estar lá repensado segundo Geertz .........................................................................48 
Aula 17_Laura Bohannan e os Tiv ...............................................................................................50 
Aula 18_A experiência radical de Michael Taussig.....................................................................53 
Aula 19_Ruth Landes e uma experiência etnográfica em terras brasileiras ............................56 
Resumo da Unidade III ..................................................................................................................58 
Aula 20_A sociedade ainda existe? – a provocação de Marilyn Strathern ...............................60 
Aula 21 _“O conceito de sociedade está teoricamente obsoleto?” ...........................................63 
Aula 22_Coisas que não se trocam ..............................................................................................66 
Aula 23_Joanna Overing: o bonito e o emotivo como elementos essenciais para a 
compreensão do social ..................................................................................................................69 
Aula 24 _“A estética é uma categoria transcultural”? .................................................................71 
Aula 25_Marc Augé e a Antropologia da Supermodernidade ....................................................73 
Aula 26_Bhabha e o local da cultura ............................................................................................75 
Aula 27_O global, o local e o retorno da etnia com Stuart Hall .................................................77 
Aula 28_Stuart Hall e o multiculturalismo ....................................................................................79 
 
 
UNIVERSIDADE 
METROPOLITANA DE 
SANTOS 
Núcleo de Educação a Distância 
9 CIÊNCIAS SOCIAIS 
Aula 29_A América Latina e a pós-modernidade - Nestor Canclini ..........................................81 
Aula 30_Canclini e as ideias de "descolecionamento" e "desterritorialização" ........................83 
Aula 31_A Antropologia Simétrica e Bruno Latour ......................................................................85 
Aula 32_Considerações Finais .....................................................................................................87 
Resumo da Unidade IV..................................................................................................................89 
 
 
 
 
UNIVERSIDADE 
METROPOLITANA DE 
SANTOS 
Núcleo de Educação a Distância 
10 CIÊNCIAS SOCIAIS 
Aula 01_A Escola Sociológica Francesa e seu desdobramento com Louis 
Dumont 
 
Iniciaremos esta aula, fazendo referência à Escola Sociológica 
Francesa, que influenciou pensadores como Louis Dumont. Vamos acompanhar 
essa relação. 
Louis Dumont foi discípulo de Marcel Mauss. Sua visão do que é a 
Antropologia deve muito aos ensinamentos aprendidos com o mestre. Nesse 
sentido, para Dumont, a Antropologia é uma ciência que deve ter como referência a 
unidade do gênero humano. E a disciplina só mostra a dimensão universal 
humana por meio do estudo de exemplos de culturas particulares e específicas. É 
por isso que o método científico que permite realizar tal intento é o 
da comparação sociológica. 
Diferentemente da Antropologia Social Britânica, que justifica a atividade 
antropológica pelo método (no caso o trabalho de campo), os franceses têm a 
tradição científica de enfatizar a comparação entre sociedades para chegar a uma 
conclusão mais universalizante. 
Desse modo, o trabalho da Antropologia deve articular, ao mesmo tempo, a 
dimensão universal e a dimensão particular da humanidade. Isto é, apontar como 
diferentes grupos sociais, por meio de configurações e práticas sociais muito 
diferentes, lidam com princípios humanos universais como a troca, a classificação do 
mundo, o parentesco. 
Dumont, a partir dessa base, vai mostrar como a própria noção de universal é 
um valor da sociedade ocidental moderna, que também é uma forma particular de 
humanidade. Por isso, tanto o individualismo, que é uma ideia ocidental, quanto o 
sistema de castas indiano, por exemplo, são encarados como ideologias, porque 
representam uma auto explicação dos povos, que apesar de verdadeira não abarca 
a totalidade do mundo. 
Para o autor, a Antropologia começa do encontro entre a noção universal - da 
sociedade moderna – e a noção etnocêntrica e extremamente particular das 
 
 
UNIVERSIDADE 
METROPOLITANA DE 
SANTOS 
Núcleo de Educação a Distância 
11 CIÊNCIAS SOCIAIS 
sociedades indígenas. Existem, então, os níveis: global, necessariamente 
universalista, e o particular, que lida com as especificidades sociais e estão 
intimamente associadas. 
Assim, a tradição da Escola Sociológica Francesa se desenvolve na 
concepção do que seja a Antropologia para Louis Dumont, que chama as noções 
sociais de muitos grupos como ideologias e considera a própria noção de 
universalismo e individualismo da sociedade moderna como ideologias. 
Louis Dumont (1911-1998) foi professor da Universidade de Oxford, na 
Inglaterra, e diretor de estudos da Escola de Altos Estudos em Ciências Sociais na 
França. Colaborou na transformação do Museu de Etnologia do Trocadéro para o 
atual Museu do Homem, sediado em Paris, que reúne uma das mais espetaculares 
coleções sobre os registros das primeiras populações que habitaram a Terra. 
Trabalhou ainda no Museu de Artes e de Tradições Populares e foi também 
professor na Universidade de Princeton, nos Estados Unidos. 
Na próxima aula, vamos ver como Dumont articula esses níveis, por meio 
da comparação entre as sociedades moderna ocidental e a sociedade de castas 
indiana. 
Ao realizar essa comparação entre a igualdade propagandeada pela nossa 
sociedade e a hierarquia demonstrada por outra oriental, o autor traz para as 
discussões antropológicas do ambiente acadêmico francês a possibilidade da 
disciplina estudar a própria sociedade ocidental. 
 
 
UNIVERSIDADE 
METROPOLITANA DE 
SANTOS 
Núcleo de Educação a Distância 
12 CIÊNCIAS SOCIAIS 
Aula 02 _Igualdade e hierarquia como ideologias 
 
 Prosseguindo com Louis Dumont, agora nos concentraremos em uma 
desuas obras para aprofundar algumas idéias. 
Homo Hierarchicus – O sistema de castas e suas implicações foi publicado 
em 1966. Nesta obra, Dumont se propõe a estudar a sociedade da Índia em 
comparação com a sociedade ocidental moderna. Para ele, o princípio social que 
fundamenta o sistema de castas indiano é o da hierarquia, enquanto para os 
ocidentais modernos, o princípio que norteia sua sociedade é oigualitarismo. 
Analisando esses princípios como ideologias das respectivas sociedades, ele 
não considera que exista uma infraestrutura material que determine a produção das 
idéias na superestrutura. As ideologias seriam idéias, crenças e valores de uma 
sociedade, pelos quais os homens se guiam conscientemente e que, apesar de 
tentar parecer, a ideologia não é toda a realidade social. 
Dumont entende que o trabalho antropológico é a articulação entre a 
dimensão universal da humanidade e a dimensão particular. Para realizar o método 
comparativo, ele inicia seu livro rastreando a formação dos conceitos de igualdade e 
indivíduo na sociedade moderna, mostrando como esses são diretamente 
contraditos à ideologia do sistema de castas. Em seguida, ele se voltará ao estudo 
das instituições indianas e tirará suas conclusões. 
Pela análise comparativa, ele mostra que, se a civilização indiana é 
caracterizada pela idéia de hierarquia no sistema de castas, a civilização 
ocidental se caracteriza pela idéia de igualdade. Enquanto uma ideologia 
holista prevalece na Índia, no ocidente prevalece a ideologia individualista. 
Apesar da aparente oposição, um dos pressupostos fundamentais da 
abordagem de Dumont, desenvolvido neste livro, é que a espécie humana apresenta 
formas de organização social diferenciadas, que irão se materializar de maneira 
diferente nas sociedades ocidentais - nas quais impera um aparente igualitarismo -, 
e nas orientais - onde predomina a submissão à hierarquia. Entretanto, tanto uma 
quanto a outra articulam as dimensões de igualdade e hierarquia dentro de suas 
configurações, só que de modos diferentes. 
 
 
UNIVERSIDADE 
METROPOLITANA DE 
SANTOS 
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13 CIÊNCIAS SOCIAIS 
Ele demonstra tais articulações na ideia de hierarquia por meio do conceito 
de englobamento do contrário. A hierarquia, então, estabelece relações entre um 
todo e um elemento desse conjunto. Os elementos estão hierarquicamente 
posicionados entre si, mas só fazem sentido porque se referem a um todo. Por 
exemplo, muitas sociedades dão preferência ao uso da mão direita. Isso não quer 
dizer que a mão direita é naturalmente melhor que a esquerda. As mãos direita e 
esquerda estão hierarquicamente posicionadas, mas porque fazem referência a uma 
unidade que é o corpo. Nessas sociedades, o corpo está dividido em partes de 
diferentes valor, que só fazem sentido porque estão ligados a um universal, a 
unidade. 
Assim, a hierarquia possui dois níveis relação. Existe o nível da unidade e do 
universal que engloba o nível do particular. Por isso, a totalidade engloba o seu 
contrário, que é a diferenciação. A hierarquia consiste na combinação desses dois 
níveis: a unidade no nível superior e englobante, e a distinção no nível inferior e 
englobado. As partes só fazem sentido com referência ao todo. 
Louis Dumont, em sua obra, apresenta hierarquia e igualdade, assim como 
o individualismo, como ideologias de sociedades diferentes. 
Por meio da contraposição de princípios sociais, como você poderia 
comparar a sociedade brasileira, seguindo o método de Dumont? Existe hierarquia 
social no Brasil? E igualdade? Ambas se articulam ou são contrárias? 
 
 
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METROPOLITANA DE 
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14 CIÊNCIAS SOCIAIS 
Aula 03 _O contraponto de Pierre Bourdieu 
 
Vamos conhecer agora o pensamento de Pierre Bourdieu (1930-
2002), pensador que transitou entre a sociologia e a antropologia e que, formado na 
tradição sociológica francesa, problematizou muitas idéias clássicas. 
Nascido em uma família de camponeses, a trajetória intelectual de Pierre 
Bourdieu é bastante particular. Ele se formou em Filosofia na Faculdade de Letras 
da École Normale Supérieure em Paris em 1954, mas participou como soldado 
durante a Guerra da Argélia, na África, país no qual conseguiu, mais tarde, em 1958, 
o cargo de professor assistente na Faculdade de Letras em Argel. Na África, 
começou uma pesquisa sobre a sociedade kabile, uma das muitas presentes no 
norte do continente. Nos anos de 1960, retornou à França. 
Na década de 1970, Bourdieu passou por universidades americanas como a 
Harvard e a de Chicago. Em 1982, ele foi aceito no Collège de France, uma das 
mais prestigiadas instituições de pesquisa da França. Sua aula inaugural nessa 
instituição propôs uma sociologia da sociologia e se tornou um texto clássico dentro 
do pensamento sociológico, chamado “Lição de Aula”. 
Seu pensamento teórico se inicia com a crítica e a reformulação de conceitos 
clássicos como o de classe social e o de ação social. No caso do conceito de classe 
social, bebendo nas fontes do próprio Karl Marx, Bourdieu o considera um conceito 
relativo, não ontológico, posto que um indivíduo pertencerá a uma 
determinada classe social conforme a sua posição com relação a outros fatores e 
indivíduos. Além disso, um indivíduo pode muitas vezes mudar de uma classe para a 
outra durante sua trajetória de vida. Já a noção de ação social, visivelmente 
inspirada nas discussões de Max Weber, será transposta para a criação da idéia 
de prática social e para as reflexões sobre a esfera simbólica da vida social. 
Em Economia das trocas simbólicas (1998), o autor mostra a dinâmica política 
que pode existir entre diferentes agentes dentro de um determinado campo de 
relações, de modo que apresenta o simbólico como passível de valor, isto é, alguns 
http://campus20162.unimesvirtual.com.br/mod/url/view.php?id=28099
 
 
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METROPOLITANA DE 
SANTOS 
Núcleo de Educação a Distância 
15 CIÊNCIAS SOCIAIS 
agentes possuem mais valor simbólico que outros, há desigualdades de posições e 
o simbólico passa a representar ou não possuir mais poder. 
Bourdieu também sempre teve consciência de que o intelectual, não só deve 
ter um posicionamento político claro frente às questões do presente, como qualquer 
obra acadêmica está sempre imbuída dessas posições, mesmo que de forma 
involuntária. 
Para ele, há no mundo social estruturas objetivas que podem dirigir, ou 
melhor, coagir a ação e a representação dos indivíduos, dos chamados agentes. No 
entanto, tais estruturas são construídas socialmente assim como os esquemas de 
ação e pensamento, chamados por Bourdieu de habitus. Bourdieu constrói essa 
ideia baseado na dialética. Existem as estruturas objetivas que podem determinar as 
representações e as ações dos agentes, mas estes, por sua vez, no seu dia-a-dia, 
também podem transformar ou conservar as estruturas. 
 
Nessa aula, vimos a biografia de Pierre Bourdieu e algumas características 
de seu pensamento teórico. 
 
 
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SANTOS 
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16 CIÊNCIAS SOCIAIS 
Aula 04_A Teoria Prática de Bourdieu 
 
 Se nos aprofundamos no pensamento teórico de Bourdieu, 
tomaremos contato com alguns conceitos que em conjunto formam uma Teoria da 
Prática. 
Segundo Bourdieu, uma teoria da prática é necessária para que o 
pensamento científico não caia nem no materialismo positivista, que postula a 
preeminência do concreto sobre as ideias, nem no idealismo intelectualista, que se 
fecha em modelos abstratos, não dialogando com a realidade sensível. A teoria da 
prática admite que os objetos de conhecimento são construções, e o princípio 
dessas construções é o sistema de disposições estruturadas e estruturantes que 
se constituem na prática e que são orientadas por meio das práticas. 
Por sistema de disposições estruturadas, o autor quer dizeras formas e 
maneiras mais ou menos usuais com que as pessoas referenciam suas ações e 
pensamentos, vivenciadas no passado e colocadas como possibilidades de 
realização. Tais disposições também são estruturantes porque quando se realizam 
dentro de condições dadas, que limitam as possibilidades, se tornam princípios 
geradores e organizadores de práticas. 
A prática, então, é o lugar da dialética entre as disposições estruturadas – 
os modelos, ideias e ações orientadoras – e as estruturantes – os movimentos e 
pensamentos geradores de novas estruturas. A prática é guiada por um sistema de 
significados, influenciado pelas condições materiais existentes e, quando realizada, 
é criadora de novos significados dentro da situação em que está referendada. A 
prática é meio e fim, ao mesmo tempo. 
Os vários sistemas de disposições relativos a diferentes classes de condições 
são chamados habitus. Os habitus são esses sistemas de disposições duráveis, as 
estruturadas, predispostas a funcionar como estruturantes, que também servem 
como princípios geradores e organizadores de práticas. Só que essas qualidades da 
prática nem sempre são conscientemente operacionalizadas. 
 
 
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17 CIÊNCIAS SOCIAIS 
Além disso, o habitus é necessariamente inscrito no corpo, lugar por 
excelência da prática. Ele possibilita a produção livre de pensamentos, ações e 
percepções, porém dentro dos limites inerentes das condições contextuais, dadas 
histórica e socialmente. 
O habitus opera em nível individual e coletivo ao mesmo tempo, de modo 
inconsciente, o que engendra a relação de ser constituído e de constituir. Um 
exemplo do habitus em ação é a distinção operada dentro das classes sociais. Um 
modo de arrumar o cabelo, de se sentar, de dispor o corpo pode indicar uma visão 
de mundo que pode ela mesma gerar essa referência, sem necessariamente ser 
consciente para o indivíduo que a realizou. 
Bourdieu desenvolveu o conceito de habitus com o objetivo de pôr fim à 
antinomia indivíduo/sociedade dentro da sociologia estruturalista. 
 
 
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18 CIÊNCIAS SOCIAIS 
Aula 05_Pierre Clastres e a sociedade contra o Estado 
 
A seguir, vamos conhecer outro antropólogo francês, Pierre Clastres 
(1934-1977), que desenvolveu pesquisas em Antropologia Política, problematizando 
o estruturalismo, corrente desenvolvida pelo antropólogo já estudado Lévi-Strauss, 
seu contemporâneo. 
Como o autor estudado há pouco, Pierre Clastres também estudou filosofia. 
Porém, ao invés de focar seus trabalhos na região da África, ele se voltou para 
pesquisas de campo na América do Sul entre os índios Guaiaqui, Guarani e 
Yanomami. Foi diretor de pesquisa do Centro Nacional de Pesquisas Científicas de 
Paris e membro do Laboratório Social do Collège de France em Paris. Morreu 
prematuramente aos 43 anos num acidente de carro, mas sua contribuição 
antropológica permanece como referência dentro das ciências sociais. 
Sua atuação marca não apenas a ênfase no estudo do poder e das formas 
políticas na Antropologia, como também a transferência de atenção dos 
antropólogos para as populações indígenas sul-americanas. 
Clastres problematizou a noção vigente de que sociedades que tinham o 
poder político estruturado hierarquicamente seriam “mais evoluídas” que sociedades 
mais igualitárias, isto é, que sociedades com contingentes populacionais enormes e 
com diferenças de status entre variados chefes, como os povos incas ou astecas, 
seriam mais desenvolvidas que as sociedades sul-americanas, que apresentavam 
grupos pequenos de indivíduos e uma organização do poder que não envolvia 
hierarquia. 
O autor, ao chamar a presença do exercício do poder dentro de um grupo de 
indivíduos de Estado, demonstra que cada tipo de sociedade constrói uma forma 
apropriada de exercício do poder político. Para ele, no caso das sociedades sul-
americanas, há um esforço social para que se impeça o aparecimento de 
personalidades de mando, fazendo com que a posição de chefe do grupo seja mal 
vista por todos, como se fosse uma usurpação; pois, posições assim de destaque e 
de subordinação quebrariam com a noção de igualdade entre os membros das 
 
 
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19 CIÊNCIAS SOCIAIS 
sociedades indígenas. A hierarquização entre as pessoas geraria desequilíbrio, num 
sistema em que todos deveriam ser iguais entre si. Assim, a posição de chefe só é 
exercida em situações de extrema necessidade social, como nos períodos de guerra 
ou de catástrofe natural. A chefia é transitória e não permanente, e quase nenhum 
indivíduo gosta de exercê-la. 
A obra A sociedade contra o Estado descortina esses sutis entendimentos 
numa reunião de onze artigos publicados por Pierre Clastres entre 1962 e 1974. Há 
ainda Arqueologia da violência, outra coletânea de textos, que abarca também o 
tema da antropologia política. 
Problematizando a ideia dos filósofos dos séculos XVI e XVII sobre o 
surgimento da sociedade no momento do contrato social, Clastres mostra como, em 
alguns casos, a sociedade pode prescindir da figura do Estado. 
 
Pierre Clastres problematizou noções do estruturalismo por meio do 
estudo do poder em sociedades não-ocidentais, inaugurando o campo de estudos 
da Antropologia política e voltando os olhos para grupos indígenas sul-americanos. 
 
 
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20 CIÊNCIAS SOCIAIS 
Aula 06 _Chefes sem poder e o poder fora do Estado 
 
Continuando a analisar a obra de Pierre Clastres, nesta aula, 
discutiremos a noção de poder e chefia em sociedades indígenas da América do 
Sul, estudadas pelo autor. 
Como já refletido preliminarmente na aula anterior, para Clastres, o chefe 
indígena é uma autoridade que não detém poder algum e, ao contrário do senso 
comum ocidental, o chefe é quase como um prisioneiro do grupo. Ainda que 
aparentemente privilegiado com o direito à poligamia, o chefe tem de prestar 
inúmeras obrigações para com o coletivo, como por exemplo a obrigação de ser 
generoso, isto é, fornecer todo suprimento material que seu grupo necessitar e, por 
isso, não acumular bens; e a obrigação de saber falar. Fala esta que atrai os 
homens ao seu redor, mas é em si uma fala vazia, que não lhe confere mais poder. 
Nas sociedades sul-americanas quem detém o poder é a própria sociedade e 
não o chefe. É um tipo de poder difuso, em que a esfera política se encontra 
imiscuída em todos os âmbitos da vida do grupo e não está separada numa forma 
chamada Estado. 
Clastres problematiza tanto idéias do estruturalismo quanto do marxismo. 
Quando escolhe o poder como foco de análise, ele deixa o estudo da mitologia e do 
parentesco tão costumeiro na análise estrutural. Porém, se o tema é outro, ainda 
permanece a oposição entre sociedade e natureza como chave para entender a 
criação de um grupo social que não faça questão de ter um Estado. Já com o 
marxismo, critica o argumento de que o Estado surge dentro da dinâmica de 
relações entre classes sociais, pode haver diferenças na distribuição de riquezas, 
mas isso não pressupõe o surgimento ou não do Estado. 
As sociedades indígenas sul-americanas não são simplesmente sociedades 
"sem" Estado, mas são "contra" o Estado, pois quando percebem a possibilidade de 
surgir um poder político, que esteja atrelado ao exercício da coerção, da violência, 
recusam-no veementemente, alijando do convívio social quem assim o exerça. 
 
 
 
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21 CIÊNCIAS SOCIAIS 
O chefe, ao contrário de muitos exemplos ocidentais, não é querido pelos 
membros do grupo. É como se fosse um mal necessário, que se deve suportar 
temporariamente diante da sobrevivência do grupo todo; e é em nomedo coletivo 
que os indivíduos, de tempos em tempos, aceitam se submeter ao comando de um 
outro. 
 
A violência que se encontra nas sociedades indígenas não é monopolizada 
por um Estado, mas controlada pela própria sociedade. Em Da tortura nas 
sociedades primitivas, Clastres salienta os rituais de iniciação - fortemente marcados 
por intervenções no corpo, como perfuração de lábios e orelhas, escarificações, 
reclusões etc. - como mecanismos de inscrição da lei e da memória social nos 
indivíduos. 
 
Para Clastres, as chefias indígenas sul-americanas não têm poder 
centralizado porque a sociedade prefere que o poder esteja difuso. Assim, podemos 
dizer que esses grupos sociais são caracterizados por formas mais igualitárias de 
relações. 
 
 
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22 CIÊNCIAS SOCIAIS 
Aula 07_Cultura e razão prática: Marshall Sahlins 
 
Nesta aula, conheceremos um desdobramento do estruturalismo por 
meio da reflexão de Marshall Sahlins sobre a relação entre estrutura social e o 
mundo material. 
Como já introduzido na disciplina de Teoria Antropológica Clássica, Marshall 
Sahlins é um autor americano que estudou na França e tomou contato com as ideias 
estruturalistas nos anos de 1960. Aluno de Leslie White, que foi pesquisador da 
Antropologia Materialista, Sahlins contribuiu para problematizar a relação entre a 
cultura e o mundo material. 
Para o autor, o materialismo histórico - método que postula que o plano da 
produção e da riqueza material determina o plano das ideias - é um tipo de auto 
explicação da sociedade burguesa. Nesse tipo de pensamento, os indivíduos seriam 
guiados por decisões racionais para atender às suas necessidades, e a economia 
seria a organização social das coisas, por meios institucionais do mercado. 
Porém, Sahlins pontua que os homens não sobrevivem simplesmente 
atendendo às suas necessidades; eles sobrevivem de maneiras específicas e 
culturalmente determinadas. A produção das coisas não atende somente à lógica 
da eficiência material, mas também à uma intenção cultural, pois os homens para 
produzir coisas, precisam conceber e valorizar essas coisas. 
É por isso que o que determina que a carne de cachorro não é comestível e a 
de boi o é, ou de que saias são para uso das mulheres e calças para os homens, 
não são propriedades físicas expressas nos materiais, mas a sua referência a um 
sistema simbólico. Nas palavras do autor: 
 
“Nenhum objeto, nenhuma coisa é ou tem movimento na sociedade humana, exceto 
pela significação que os homens lhe atribuem.” 
 (SAHLINS, Marshall. Cultura e Razão Prática. Rio de Janeiro, Zahar, 1979. Cap. “La 
penséebougeoise”, p.170.) 
 
 
 
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Como exemplo, Sahlins analisa a preferência de comida nos EUA e o tabu 
sobre os animais domésticos na sociedade ocidental. Ao analisar uma série de 
animais domésticos (bois, porcos, cavalos e cachorros) o autor notou que os bois 
são os animais cuja carne tem quase unanimidade como alimento humano. Já os 
porcos têm grande aceitação, mas não são preferenciais como os bovinos. Os 
cavalos têm sua carne servida como comida, apenas em períodos de crise, como 
racionamentos de guerra. E os cães seriam impossíveis de terem sua carne 
colocada à mesa. Isso se explicaria pela proporção de humanidade na qual é 
investido cada animal. De todos, os bois são os mais distantes dos homens, os 
porcos estão longe, mas comem os restos de comida humana. Os cavalos são 
intermediários, pois os homens convivem mais com eles, seja no ato de transportar 
ou no preparo de uma corrida. Já os cães são considerados quase humanos, devido 
à proximidade e à estima que têm dos homens. 
Desse modo, a comestibilidade está inversamente relacionada com a 
humanidade atribuída a cada animal. Não há um argumento de ordem científica que 
diga que a carne de cachorro seja menos protéica e nutritiva que a carne bovina, 
porém, nosso sistema simbólico estipulou quais seriam os elementos comestíveis e 
os não-comestíveis, e, nesse sentido, a carne de cachorro é um tabu alimentar. 
Para Sahlins, a produção é uma reprodução da cultura – dos sistemas 
simbólicos – em um sistema de objetos. Os sistemas simbólicos sociais são as 
estruturas que guiam as ações dos homens. 
Por meio da reflexão de Sahlins sobre as relações entre a cultura e a 
dimensão material, vimos que esta última não tem preeminência sob a primeira. Ao 
contrário, os sistemas simbólicos sociais são estruturantes para a produção de 
coisas. 
Pense num exemplo brasileiro de diferenças de valor mercadológico e 
cultural. 
 
 
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24 CIÊNCIAS SOCIAIS 
Aula 08_Estrutura e História 
 
Ainda com Marshall Sahlins, vamos relembrar outra contribuição 
que este autor deu à Antropologia, ao articular as dimensões da estrutura e da 
história. 
Marshall Sahlins estudou a sociedade havaiana por meio do episódio da 
chegada dos europeus à ilha, principalmente através das atividades do capitão 
Cook. 
Através da análise da interação entre europeus e havaianos e dos próprios 
havaianos entre si depois da chegada dos europeus, o autor vai propor uma teoria 
da história, que articula estrutura e evento. Enquanto o Estruturalismo concebia a 
contradição entre esses dois elementos, Sahlins vai integrá-los. 
Partindo do exemplo havaiano, o autor propõe que toda transformação de 
uma cultura é também a sua reprodução. Os havaianos consideravam os seus 
chefes como pertencentes ao plano dos deuses. Assim, quando os navios 
estrangeiros chegaram no Havaí, os europeus também foram considerados por eles 
como deuses, pois assim falavam os mitos sobre a chegada de divindades pelo mar. 
A aura atribuída aos europeus acabou por rivalizar com o próprio status dos chefes 
havaianos. 
Este evento mostra que as formas culturais tradicionais abarcaram um evento 
extraordinário reproduzindo-o dentro da própria cultura, por meio de formas já 
constituídas. Assim, os europeus foram classificados segundo critérios já existentes 
na cultura havaiana. 
Ao mesmo tempo, as categorias coletivas quando (re)utilizadas acabam tendo 
seus significados culturais levemente alterados, ao dar conta de coisas novas. 
Segue que as relações entre as categorias mudam e a estrutura toda acaba por ser 
transformada; como no caso do tabu havaiano. Primeiramente, o tabu era referente 
à proibição de mulheres havaianas em terem relações sexuais, mas com a 
insistência delas em se envolverem com homens da tripulação européia, essa 
proibição foi deixando de ter sentido. Então, os chefes havaianos começaram a 
 
 
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25 CIÊNCIAS SOCIAIS 
utilizar o tabu como proibição do povo em ter acesso a objetos europeus como 
ferramentas e tecidos. Desse modo, o tabu que se sacralizava em função das 
diferenças de gênero, entre homens e mulheres, agora sinalizava a oposição de 
classe, entre os chefes e o povo. 
Assim, para Sahlins, toda mudança na prática também é uma reprodução 
cultural e toda reprodução cultural é uma maneira de transformar a estrutura. E essa 
dinâmica se dá por meio da ação e toda ação também é simbólica. A práxis e o 
signo são constituintes (e inseparáveis) de qualquer realidade empírica. 
Ao invés de dicotomizar estrutura e evento, a relação entre conceitos culturais 
(estrutura) e a experiência humana (evento) é imbricada. A experiência social 
humana se apropria da realidade por meio de conceitos gerais (estrutura). E o uso 
desses conceitos sujeita-os a reavaliações quando colocados em movimento pelo 
contexto empírico (evento). 
A cultura se realiza na ação e só tem sentido porque está repleta de 
significados. O signo é ao mesmo tempo objeto histórico e representação 
abstrata,ele só acontece quando colocado no mundo empírico. Ao mesmo 
tempo, a práxis coloca os significados do signo sempre em risco, pois o 
rearranjo desses significados leva à mudança. 
 
Por meio da contribuição de Marshall Sahlins, pudemos observar a 
articulação entre a história e a estrutura e acompanhar um desenvolvimento teórico 
influenciado pelo estruturalismo. 
 
 
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26 CIÊNCIAS SOCIAIS 
Aula 09_Natureza e cultura rediscutidas: humanos e não-humanos em Philippe 
Descola 
 
Nesta aula, vamos acompanhar o pensamento de Philippe Descola, 
que problematiza as noções estruturalistas de natureza e cultura e reelabora esses 
conceitos teoricamente. 
Philippe Descola estudou filosofia na ÉcoleNormaleSupérieure de Saint-Cloud 
e depois etnologia na École Pratique desHautesÉtudes. Realizou pesquisa de 
campo entre os Achuar, o que lhe rendeu uma tese de doutorado, orientada por 
Claude Lévi-Strauss. Foi professor na ÉcoledesHautesÉtudesenSciencesSociales e 
nomeado, em 2000, ao Collège de France, na cadeira de Antropologia da natureza. 
Atualmente é diretor do Laboratório de Antropologia Social da instituição. 
Formado na tradição de pensamento Estruturalista, problematizou algumas 
das noções fundamentais desta corrente. No caso das noções antinômicas de 
natureza e cultura, Descola considera que muitos estudos etnográficos mostram sua 
inadequação, já que a dicotomia não dá conta de lidar com a maneira pela qual os 
povos estudados estão interagindo com o ambiente físico. 
Muitos grupos sociais, como os povos indígenas amazônicos, não só 
atribuem agência a humanos como também a plantas e animais, como também 
o fazem para coisas não-humanas como espíritos, minérios ou objetos. 
Para Descola, a própria noção de natureza é socialmente construída e 
não um paradigma universal, como pressupõe o Estruturalismo. Ao ignorar que 
muitos grupos sociais não compartilham da mesma visão dualista de natureza e 
cultura, os pesquisadores estruturalistas ignoram, por sua vez, a classificação nativa 
que concebe os seres e os objetos como fazendo parte de categorias diferentes 
daquela em que são colocados na classificação ocidental clássica. A antinomia 
natureza e cultura é um recurso do pensamento ocidental, trabalhado 
principalmente na filosofia desde o século XVI. 
 
 
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27 CIÊNCIAS SOCIAIS 
Para o antropólogo em questão, Lévi-Strauss transformou a distinção 
natureza e cultura em matriz universal do discurso de grupos sociais, quando na 
realidade essas categorias não existem nas sociedades nativas estudadas. 
Porém, Descola encontra no pensamento indígena padrões significativos que 
se mostram como guias para a ação. São padrões inconscientes que organizam as 
relações entre humanos, como também as relações entre humanos e não-humanos. 
Mas não são estruturas universais da mente que operam de maneira independente 
do contexto cultural e histórico. Esses padrões são chamados pelo autor 
de esquemas. São práticas, objetos ou intermediários cognitivos que ajudam a 
incluir a diversidade da vida real debaixo de um leque básico de categorias de 
relação. Esses modelos mentais não são infinitos, e, para Descola, a forma de 
denominar o que é não-humano pode ser estruturada pela combinação de modos de 
relação, modos de identificação e modos de classificação. 
Por modos de identificação, o autor entende que se referem às definições 
das fronteiras entre o eu e o outro, expressas também no tratamento com humanos 
e não-humanos. Podem ser modos de identificação nativa: o totemismo, o 
animismo e o naturalismo. 
No totemismo, as diferenças entre animais ou plantas organizam 
conceitualmente as unidades sociais, isto é, a diferença física entre a cobra e o 
pássaro ajuda a pensar a diferença social entre o clã da cobra, que se vê mais 
ligado à terra, e o clã do pássaro, que se vê mais ligado ao ar. 
O animismo é o inverso, nele seres não-humanos como pedras, fantasmas 
ou animais são vistos como possuindo características humanas, como sentimentos, 
razão, etc. 
Já o naturalismo se refere à ideia de que a natureza é um reino separado do 
humano, uma noção típica do pensamento ocidental, e que estrutura até mesmo a 
prática científica. 
Em Descola, a natureza pensada como um domínio autônomo não é algo 
dado, mas apenas mais um modo possível de identificação. 
As identidades diferentes, distribuídas na coletividade de humanos e não-
humanos, podem ser mediadas por esquemas de interação, chamados pelo autor 
 
 
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28 CIÊNCIAS SOCIAIS 
de modos de relação. São modos de relação: a reciprocidade, a predação e a 
proteção. 
A reciprocidade é baseada no princípio de que humanos e não humanos 
partilham da mesma biosfera. Desse modo, é preciso organizar trocas, de modo que 
os humanos devam ressarcir os não-humanos das partes de energia retiradas da 
biosfera na atividade de obter alimento, seja na caça ou na colheita. Então, os 
humanos devem realizar rituais ou atividades para poder retirar do ambiente o que 
necessitam e o que os espíritos ou animais da floresta lhes permitiram. Por meio 
dessas trocas recíprocas, cria-se, então, o equilíbrio do cosmos. 
A relação de predação consiste em considerar os não-humanos como 
pessoas que são ligadas por laços de parentesco aos humanos, mas que não 
trocam com eles. Por isso, humanos não oferecem contrapartidas de suas atividades 
no ambiente e não-humanos são autorizados a se vingar ou a punir humanos. 
Na relação de proteção, uma grande parte do que é não-humano é percebida 
como dependente dos humanos. A exemplo de plantas e animais domésticos, ou 
mesmo dos movimentos ecológicos atuais, o plano dos humanos se coloca 
assimetricamente acima para proteger os não-humanos. 
Por fim, Descola aponta para modos de categorização, que são os modos 
pelas quais são criados os esquemas classificatórios entre humanos e não-
humanos. Esses esquemas podem ser metafóricos, em que a categoria é criada por 
similaridade e substituição, ou metonímicos, em que a classificação se dá por partes 
que se ligam. 
Todos esses modos aparecem nas sociedades de maneira combinada e não 
puros. 
Vimos a dicotomia natureza e cultura advinda do estruturalismo ser 
questionada por Descola como parâmetro universal, ao mesmo tempo que o autor 
propõe organizar as várias concepções nativas em termos de modos de interação 
entre humanos e não-humanos. 
 
 
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29 CIÊNCIAS SOCIAIS 
Você possui algum animal de estimação? Em que modo de interação, 
apresentado por Descola, você descreveria seu relacionamento com o animal? 
Comparando as ideias de Descola com a de Marshall Sahlins sobre o 
relacionamento de homens e não-homens, o que você nota? 
 
 
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30 CIÊNCIAS SOCIAIS 
Resumo da Unidade I 
 
Nesta primeira unidade, vimos como a tradição da Escola Sociológica 
Francesa se desenvolve na concepção do que seja a Antropologia para Louis 
Dumont, que chama as noções sociais de muitos grupos como ideologias, e 
considera a própria noção de universalismo e individualismo da sociedade moderna 
como ideologias. Para Dumont, hierarquia e igualdade, assim como o individualismo, 
foram apresentados como ideologias de sociedades diferentes. 
Também acompanhamos a biografia de Pierre Bourdieu e algumas 
características de seu pensamento teórico. Na teoria da prática de Bourdieu, o 
conceito de habitus opera na dinâmica entre as concepções dadas – as disposições 
estruturadas – e as formas novas evidenciadas na prática – disposições 
estruturantes. 
Já Pierre Clastres problematizou noções do estruturalismo por meio do estudo 
dopoder em sociedades não-ocidentais, inaugurando o campo de estudo da 
Antropologia política e voltando os olhos para grupos indígenas sul-americanos. 
Para Clastres, as chefias indígenas sul-americanas não têm poder porque a 
sociedade prefere que o poder esteja difuso, caracterizando esses grupos sociais 
em formas mais igualitárias de relações. 
Com Sahlins, acompanhamos o debate entre a cultura e a dimensão material, 
e que este último não tem preeminência como determinante do mundo simbólico. Ao 
contrário, os sistemas simbólicos sociais são estruturantes da produção de coisas. 
Ainda por meio da contribuição de Marshall Sahlins, pudemos observar a articulação 
entre a história e a estrutura e acompanhar um desenvolvimento teórico influenciado 
pelo estruturalismo. 
Para finalizar esta unidade, observamos a dicotomia natureza e cultura do 
estruturalismo ser questionada por Descola como parâmetro universal, ao mesmo 
tempo que o autor propõe organizar as várias concepções nativas, em termos de 
modos de interação entre humanos e não-humanos. 
 
 
 
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31 CIÊNCIAS SOCIAIS 
Referências bibliográficas 
BOURDIEU, Pierre. Razões Práticas. Papirus, 2005. 
CLASTRES, Pierre. A sociedade contra o Estado. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 
1982. 
DESCOLA, Phillipe. Nature and Society. Routledge, USA, 1996. 
DUMONT. Louis. Homo Hierarquicus: o sistema de castas e suas impllicações. 
Edusp. 1997. Introdução e posfácio. 
DUMON. Louis. O individualismo: uma perspectiva antropológica. Rocco, 1993. 
Cap. “O valor para os modernos e para os outros” e cap. “A comunidade. 
SAHLINS, Marshall. Ilhas de História. Rio de Janeiro: Zahar, 1984. 
SAHLINS, Marshall. Cultura e Razão Prática. Rio de Janeiro: Zahar, 1979. Cap. “La 
penséebougeoise”. 
 
 
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32 CIÊNCIAS SOCIAIS 
Aula 10_Geertz e a Antropologia Interpretativa 
 
Nesta aula, aprofundaremos alguns dos conceitos básicos que 
Geertz problematizou para fazer parte de sua “Antropologia dos significados”. 
Para os que vieram acompanhando atentamente as nossas discussões 
antropológicas desde a disciplina de Teoria Antropológica Clássica, hoje iremos 
resgatar alguns dos conceitos apresentados naquela disciplina, porém, ampliando 
ainda mais o alcance do pensamento de Geertz. 
Se o conceito de cultura desse autor se define como sendo as teias de 
significado que o próprio homem teceu, à Antropologia cabe ser uma ciência 
interpretativa, que deve procurar pelos significados produzidos, e não por leis. 
Para Geertz, uma ciência se define pelo que seus praticantes fazem, e na 
Antropologia o que seus praticantes fazem é a etnografia. Desse modo, para realizar 
uma etnografia, que concebe a cultura como um emaranhado de relações 
significativas que os homens criam, é preciso praticá-la de modo particular, 
desvendando os vários níveis de significado que são postos em movimento nas 
relações humanas. Por exemplo, quando uma pessoa sorri, ela pode fazê-lo por 
uma obrigação social ou porque quer comunicar algo alegre a outra pessoa que 
partilha do mesmo significado. Também pode sorrir sozinha por ter lembrado alguma 
situação no passado, ou estar treinando para uma cena de teatro. Assim, os 
significados não são nunca absolutos, eles dependem do contexto e do valor que as 
outras pessoas dão a ele. É essa “hierarquia estratificada de estruturas significantes” 
(GEERTZ: 1989, p. 5), que é preciso apreender para realizar uma etnografia na 
visão de Geertz, e para captar esses vários significados é preciso realizar uma 
descrição densa. 
A cultura, desse modo, só pode ser pública, “porque seus significados o são. 
(...) A cultura consiste em estruturas de significado socialmente estabelecidas.” 
(Geertz, 1989, p. 8 e 9). 
Tal tarefa de analisar as variações das estruturas de significação torna o 
trabalho do antropólogo parecido ao trabalho de um crítico literário, porque ele deve 
 
 
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33 CIÊNCIAS SOCIAIS 
organizar as múltiplas estruturas conceituais colocadas pelo nativo, que não são 
claras, mas obscuras e sobrepostas. Assim ele deve arriscar sua interpretação do 
conjunto que se lhe apresenta. Segundo Geertz: 
 
“Fazer a etnografia é como tentar ler (no sentido de construir uma leitura de) 
um manuscrito estranho, desbotado, cheio de elipses, incoerências, 
emendas suspeitas e comentários tendenciosos, escrito não com os sinais 
convencionais do som, mas com exemplos transitórios de comportamento 
modelado.” 
(GEERTZ, C. A Interpretação das Culturas. Rio de janeiro, LTC, 1989 p. 7) 
 
E é porque o antropólogo se coloca quase como um decifrador de códigos, 
que Geertz afirma que: 
não estamos procurando, pelo menos eu não estou, tornar-nos nativos (...) 
ou copiá-los. Somente românticos ou os espiões podem achar isso bom. O 
que procuramos, no sentido mais amplo do termo, que compreende muito 
do que simplesmente falar, é conversar com eles... (GEERTZ: 1989, p.10). 
Além do antropólogo não ter o poder de se tornar outro, ele só tem acesso a 
interpretações de segunda ou terceira mão, porque só quem pode realizar uma 
interpretação de primeira mão é o próprio nativo, ao falar de sua cultura. Por isso, o 
autor insiste em evidenciar o caráter de fabricação do texto antropológico, no sentido 
de que não há uma versão original e verdadeira. 
O texto antropológico traz no papel o que Geertz chama de discurso social. 
Só que o discurso social não é realizado somente por palavras, mas também por 
ações e fluxos de comportamento estabelecidos, que acontecem num determinado 
espaço e numa determinada época. A etnografia, assim, fixa apenas aquilo que os 
pesquisados nos deixam conhecer. Além disso, a descrição etnográfica tem alcance 
microscópico, isto é, não atinge categorias universais e abstratas, chega-se apenas 
a assumir a particularidade de um modo humano de viver. Dessa forma Geertz se 
coloca no polo oposto ao da ambição estruturalista, que propõe a compreensão de 
modos de operação universais das culturas humanas. 
 
 
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34 CIÊNCIAS SOCIAIS 
Piadas, charges e caricaturas normalmente trabalham simultaneamente 
com níveis diferentes de significação. Que tal escolher um exemplo dentro esses 
gêneros e tentar fazer uma “descrição densa”, discriminando a “hierarquia de 
estruturas significantes” presentes? 
 
 
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35 CIÊNCIAS SOCIAIS 
Aula 11_“Um Jogo Absorvente: Notas sobre a Briga de Galos Balinesa” 
 
Por meio da aproximação com um texto de Geertz, vamos seguir o 
aprendizado de sua Antropologia Interpretativa acompanhando uma de suas 
análises. 
Geertz realizou trabalho de campo em Java e Bali, no sudeste asiático, e no 
Marrocos, norte da África. 
O célebre texto sobre a briga de galos é baseado numa de suas visitas a uma 
aldeia balinesa no fim dos anos de 1950. Seu artigo foi publicado primeiramente em 
1972. 
Na introdução desse trabalho, Geertz descreve detalhadamente sua incursão 
em campo, juntamente com sua mulher. Num primeiro momento, os dois 
pesquisadores contam que são totalmente ignorados pelas pessoas da aldeia. 
Sentiam-se como sombras ou fantasmas, a quem os balineses nem sequer dirigiam 
o olhar. Quando os estrangeiros tentavam conversar com alguém, as pessoas se 
afastavam. É como se fossem invisíveis, os aldeões de Bali faziam questão de 
mostrar a Geertz e sua mulher, que, aos olhos nativos, eles praticamente não 
existiam. 
Foi quando a aldeia resolveu organizar uma rinha de galos, proibida pelo 
governo oficial, mas com o intuito de levantar fundos para a construção de uma 
escola no lugar. Ao se iniciarem as sessões de brigas de galo, repentinamente,a 
polícia chega armada ao local para acabar com a atividade. A multidão presente saiu 
correndo como pôde. Geertz e sua mulher, que também estavam presentes, sem 
muito saber como reagir, também decidiram correr em direção à periferia da aldeia, 
como todos, para escapar da força policial. A partir daí, foi como se os dois 
estrangeiros tivessem ganhado seu passe para o reconhecimento geral de todos os 
balineses. Por terem se comportado como os outros aldeões, fugindo das 
autoridades, os antropólogos passaram a ser estimados e não mais ignorados. 
É quando Geertz nota o quanto as brigas de galo são uma atividade passional 
da vida dos balineses. Como uma obsessão popular, os homens balineses se 
 
 
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36 CIÊNCIAS SOCIAIS 
incorporam nos galos, quase como uma metáfora. Eles despendem enormes 
quantidades de tempo e dinheiro nos animais, os admiram, cuidam deles de modo 
especial. 
Segundo o autor, a “loucura por galos” tem variadas dimensões: é meio de 
obter dinheiro, é expressão simbólica do proprietário, etc. Mas tudo isso estaria 
ligado ao significado “daquilo que os balineses vêem como a inversão direta, 
estética, moral e metafísica, da condição humana: a animalidade.” (GEERTZ, 1989, 
p.190) 
Toda a operação de descrição das rinhas, dos seus participantes, das 
maneiras de apostar, dos competidores e seus animais pelo antropólogo, faz parte 
da descrição densa que a interpretação da cultura exige. 
Tentando decifrar o significado que as brigas de galos têm para os balineses, 
Geertz sugere que ela se liga de maneira inversa ao sistema de status e prestígio 
que guia as relações na aldeia, na economia e no Estado. As relações de status por 
serem um sistema de hierarquia rígida e de regras bem definidas, faz da briga de 
galos o momento em que, por meio dos animais, os homens expressem 
sentimentos, antes contidos pelo uso obrigatório da etiqueta social plácida do dia-a-
dia. A rinha é o lugar na qual os balineses podem extravasar sua inquietude e 
agressividade. 
Porém, 
O que coloca a briga de galos à parte no curso ordinário da vida, que a 
ergue do reino dos assuntos práticos cotidianos e a cerca com uma aura de 
importância maior, não é, como poderia pensar a sociologia funcionalista, o 
fato de ela reforçar a discriminação do status (esse reforço não é necessário 
numa sociedade em que cada ato proclama esta discriminação), mas o fato 
de ela fornecer um comentário metassocial sobre todo o tema de distribuir 
os seres humanos em categorias hierárquicas fixas e depois organizar a 
maior parte da existência coletiva em torno dessa distribuição. Sua função, 
se assim podemos chamá-la, é interpretativa: é uma leitura balinesa da 
experiência balinesa, uma estória sobre eles que eles contam a si mesmo. 
 
(GEERTZ, C. A Interpretação das Culturas. Rio de Janeiro: LTC, 1989 p. 
209) 
 
 
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37 CIÊNCIAS SOCIAIS 
 
Assim, a briga de galos é uma interpretação de primeira mão que os nativos 
balineses realizam de sua própria cultura. Na rinha, o balinês descobre seu 
temperamento e o de sua sociedade ao mesmo tempo. 
Coube ao antropólogo, inscrever o discurso social feito de ações de apostas, 
de organização da rinha, de emoções de vitória ou fracasso, numa aldeia em Bali 
nos fins dos anos de 1950. Realiza uma descrição densa, organizando as estruturas 
de significado presentes: os animais, as formas de jogo, os jogadores e 
apostadores, a cultura de status e prestígio como contexto e referência. Gueertz 
chega à conclusão que as brigas de galo são situações privilegiadas para 
entendermos a interpretação que os próprios balineses fazem de si mesmos. 
 
Por fim, o antropólogo diz: 
 
 “A cultura de um povo é um conjunto de textos, eles mesmos conjuntos, 
que o antropólogo tenta ler por sobre os ombros daqueles a quem 
pertencem.” (GEERTZ, C. A Interpretação das Culturas. Rio de Janeiro: 
LTC, 1989 p. 212) 
Por meio da análise do artigo “Um jogo absorvente: Notas sobre a briga de 
galos balinesa”, de Geertz, foi possível ver em ação as noções de cultura como teia 
de significados, a realização da descrição densa e a interpretação balinesa de sua 
própria cultura, elementos trabalhados pela Antropologia Interpretativa. 
Você acha possível realizar uma descrição densa de um jogo de futebol no 
Brasil? Quais seriam as estruturas de significação depreendidas, quais sentimentos 
seriam revelados? Que estória os brasileiros contariam sobre si mesmo, quando 
estão presentes numa partida de futebol? 
 
 
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38 CIÊNCIAS SOCIAIS 
Aula 12 _“O ponto de vista do nativo”: a perspectiva de Geertz 
 
Nesta aula, enfrentaremos a questão da necessidade ou não do 
antropólogo ter empatia com o seu pesquisado e tentar também “se tornar um 
nativo”, para realizar uma etnografia. 
Quem destacou a questão de que no trabalho de campo, por vezes, o 
antropólogo nem sempre entra em comunhão com os nativos e que nem sempre fica 
confortável junto deles, querendo mesmo é retornar aos seus, foi o próprio 
Malinowski. 
Aquele mesmo que consolidou a observação participante, o isolamento do 
pesquisador junto às sociedades que estuda, foi quem provocou a polêmica, quando 
na década de 1960, foram publicados os diários de campo de Malinowski, referentes 
ao período passado nas Ilhas Trobriand. Ao tornar públicas as fases de mau-humor, 
tédio e comentários desagradáveis a respeito dos nativos, que Malinowski, 
em Argonautas, o Pacífico Ocidental, havia consagrado, a comunidade acadêmica 
se estarreceu. 
Geertz, por outro lado, encarou a questão de modo profissional. Sem se 
contagiar com a perplexidade geral, ele considera que a aparição dos diários íntimos 
de Malinowski traz uma oportunidade de debate epistemológico: será mesmo que 
para a realização de pesquisa antropológica é necessário que o pesquisador tente 
se “tornar um nativo” e veja o mundo do ponto de vista dele? Será que o que torna 
legítima a Antropologia enquanto ciência é a proximidade psicológica, ou algum tipo 
de identificação transcultural com os pesquisados? 
Segundo a bagagem da Antropologia Interpretativa, o problema não está na 
constituição moral ideal para se tornar um antropólogo, mas na maneira de encarar 
o que se considera o “ponto de vista do nativo”. Para Geertz, “tornar-se nativo” ou 
“estar na pele do outro” é uma ilusão. Até onde podemos chegar ao Outro é o que 
ele chamou de – emprestando o termo do psicanalista Kohut – “experiência-
próxima”. 
 
 
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39 CIÊNCIAS SOCIAIS 
Existem, então, dois tipo de aproximação a uma questão: a “experiência-
próxima” e a “experiência-distante”. A “experiência-próxima” diz respeito ao modo 
comum que as pessoas utilizam para se entender da maneira mais leiga possível. Já 
a “experiência-distante” é a maneira erudita que especialistas utilizam para explicar 
as coisas. Dessa maneira, “medo”, é um termo característico da “experiência-
próxima”, enquanto que “fobia” é um termo da “experiência-distante”. 
Para Geertz, uma análise antropológica não pode se esgotar na “experiência-
próxima” dos nativos, envolvendo o pesquisador apenas em miudezas e 
particularidades locais. Também não se pode utilizar só da “experiência-distante”, 
pois se correria o risco de ficar preso em abstrações e jargões. O trunfo da 
Antropologia é conseguir articular os dois níveis de entendimento. 
 
Captar conceitos que, para outras pessoas, são de experiência-próxima, e 
fazê-lo de uma forma tão eficaz que nos permita estabelecer uma conexão 
esclarecedora com os conceitos de experiência-distante criados por teóricos 
para captar os elementosmais gerais da vida social, é, sem dúvida, uma 
tarefa delicada, embora um pouco menos misteriosa, que colocar-se 
embaixo da pele do outro. (GEERTZ, C. O Saber Local. Petrópolis: Vozes, 
1998, p. 88) 
 
Baseado no método de Dilthey, chamado de círculo hermenêutico, o 
movimento intelectual antropológico deve obter esse ritmo dialético contínuo, de 
articular o menor detalhe nos menores locais e a mais global das estruturas, de 
maneira que ambos possam ser vistos simultaneamente. 
Por meio do acesso aos sistemas simbólicos das sociedades, não é preciso 
que o antropólogo sacrifique a sua subjetividade para dar lugar à subjetividade do 
nativo, mas que tanto pesquisador quanto pesquisado se disponham a conversar e a 
se compreender. 
Vimos que a abordagem da Antropologia Interpretativa não considera 
necessário que o antropólogo “torne-se um nativo”, mas que ao decifrar seu código 
de significados, articule a dimensão local do discurso nativo com a dimensão teórica 
do cientista. 
 
 
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40 CIÊNCIAS SOCIAIS 
Aula 13_As humanidades como paradigma para a teoria antropológica 
 
 Discutindo as mudanças nos modelos de pensamento das ciências 
sociais, Geertz faz um quadro geral do estado da arte na antropologia na década de 
1970. Vamos à questão! 
Em 1980, Geertz publica o texto “Mistura de gêneros: a reconfiguração do 
pensamento social”, em que afirma que uma mudança cultural estava se 
processando naquele momento: o mundo da escrita estava cada vez mais 
embaralhando seus modelos, ou seja, escritores se utilizavam de equações e 
tabelas, cientistas tornavam relatórios científicos peças literárias, alguns misturavam 
poesia, notas de referência e teorias quânticas. 
Esse fenômeno generalizava-se mais e mais, e no campo das ciências 
sociais, ficava evidente que os pesquisadores deixavam de explicar os fatos por 
referência a leis universais emprestadas da Biologia e da Física e voltavam-se cada 
vez mais para a criação de explicações baseadas em modelos da arte e da 
literatura. 
Desse modo, se estava abandonando a referência que vinha dos modelos 
das ciências chamadas duras (leis gerais da termodinâmica, modelos matemáticos 
de matrizes) e passava-se a usar modelos advindos das humanidades. Deixavam-
se conceitos como o de evolução social ou de equilíbrio dinâmico social e migrava-
se para conceitos como o de papel social, que tinham como referência o teatro. 
Para o autor, era a evidência de que o método da interpretação se colocava cada 
vez mais como imprescindível às ciências humanas. 
 
O fato de que as ciências sociais estão recorrendo às humanidades na 
busca de suas analogias explicativas é, ao mesmo tempo, evidência da 
desestabilização dos gêneros e de que agora chegou a vez da 
interpretação. O resultado mais visível deste processo é que os estudos 
sociais estão adotando um novo estilo de discurso. Os instrumentos do 
raciocínio estão se modificando. Representa-se a sociedade cada vez 
menos como uma máquina complicada ou como um quase-organismo e, 
 
 
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41 CIÊNCIAS SOCIAIS 
cada vez mais, como um jogo sério, um drama de rua, ou um texto sobre 
comportamento. (GEERTZ, C. O Saber Local. Petrópolis, Vozes, 1998, p. 
38) 
Como citado, os três novos paradigmas nos quais os cientistas sociais 
estavam investindo força intelectual eram: os jogos, o drama teatral e o texto 
literário. 
As explicações das ciências sociais que fazem analogia com os jogos tomam 
o mundo social como um jogo, cujo território e tempo de ação social estão 
delimitados, e cujo comportamento social está regido por regras sociais. Os homens 
seriam os jogadores, que pensam estratégias de ação, segundo as condições de 
jogo social dadas. Para este tipo, Geertz cita os trabalhos de ErvingGoffman. 
O segundo tipo de paradigma das humanidades é a analogia entre a vida 
social e o drama. O mundo social é encarado como um palco ou cenário, os homens 
são chamados de atores e têm um papel a desempenhar. A ação aqui encenada é, 
sobretudo, simbólica, pois o drama social é sempre carregado de múltiplos 
significados. Aqui, o autor a que Geertzfaz referência é Victor Turner. 
O último tipo de reconfiguração da teoria social seria a analogia com textos. 
Nesta, o cientista é colocado como escritor e a etnografia pode ser comparada a 
uma obra construída. O discurso também é alvo de atenção, havendo tanto o 
discurso social quanto o discurso construído pelo antropólogo. Geertz cita Howard 
Becker e Paul Ricoeur como pensadores que seguem esse paradigma, mas 
podemos incluir aqui seu próprio pensamento. 
 
O texto como paradigma de reflexão nas ciências sociais será amplamente 
debatido por inúmeros antropólogos. Por isso esse será o foco de nossa próxima 
unidade. 
Você consegue pensar em algum tipo de paradigma que possa inspirar a 
criação de uma teoria social? 
 
 
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42 CIÊNCIAS SOCIAIS 
Resumo da Unidade II 
Acompanhamos as principais noções e definições na qual a Antropologia 
Interpretativa, pensada por Geertz, é animada como sua noção semiótica de cultura, 
a etnografia como descrição densa e o trabalho do antropólogo como um inscritor e 
comentador. 
Por meio da análise do artigo “Um jogo absorvente: Notas sobre a briga de 
galos balinesa”, de Geertz, foi possível ver em ação as noções de cultura como teia 
de significados, a realização da descrição densa e a interpretação balinesa de sua 
própria cultura, elementos trabalhados pela Antropologia Interpretativa. 
Vimos também que, por meio da Antropologia Interpretativa, não é necessário 
que o antropólogo “torne-se um nativo”, mas que, ao decifrar seu código de 
significados, articule a dimensão local do discurso nativo com a dimensão teórica do 
cientista. 
Por fim, Geertz nos ajudou a realizar a transição para a próxima unidade, ao 
discutir que as ciências sociais estavam mudando os paradigmas de suas análises, 
saindo dos modelos das leis universais da Biologia e da Física, e entrando para o 
uso de modelos ligados às humanidades, como a arte e a literatura. 
 
Referências bibliográficas 
GEERTZ, Clifford. A Interpretação das Culturas. Rio de Janeiro: LTC, 1989. 
GEERTZ, C. O Saber Local. Petrópolis: Vozes, 1998. 
GEERTZ, C. Vidas e Obras. São Paulo: Record, 1987. 
OLIVEIRA, Roberto Cardoso . Sobre o Saber Antropológico. Rio de Janeiro: Tempo 
Brasileiro, 1988.
 
 
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43 CIÊNCIAS SOCIAIS 
Aula 14_Representações antropológicas e a legitimação autoral com James 
Clifford 
Nesta aula, vamos conhecer os argumentos de James Clifford, um 
importante antropólogo que refletiu sobre a realização de uma etnografia mais 
reflexiva, que pense sobre si mesma. 
James Clifford se formou em História nos EUA, doutorando-se nesta disciplina 
em 1977 pela Universidade de Harvard. É conhecido por realizar análises da prática 
antropológica sob a perspectiva histórica e literária. Desde 1978 ele é professor de 
História da Consciência na Universidade da Califórnia, em Santa Cruz. 
Clifford foi um dos responsáveis por fazer a Antropologia pensar em si 
mesma, principalmente ao rediscutir um dos elementos canônicos da disciplina, o 
trabalho de campo intensivo. Para ele, existe uma dimensão literária no trabalho do 
antropólogo que é expressa principalmente na escrita etnográfica. Sua crítica se 
dirige principalmente ao modelo de etnografia produzida por Malinowski, 
com Argonautas do Pacífico Ocidental, que teria sua autoridade como trabalho 
científico baseada na proposição de que “Você [leitor] só está lá, porque eu estive 
lá.” 
A forma textual à la Malinowski, na qual apenas o relato do antropólogo é 
visível na etnografia, faria parteda dinâmica colonialista dos impérios ocidentais, em 
que a voz do pesquisador se sobreporia às vozes dos nativos, numa apropriação 
que refletiria o desnível de poder entre pesquisador e pesquisados. 
Para Clifford, a partir das décadas de 1960 e 1970, com o processo político 
de descolonização e independência nacional de muitas ex-colônias, a desintegração 
e a redistribuição do poder colonial veio acompanhado de repercussões nas teorias 
culturais. Assim, a Antropologia também teria de rever seus pressupostos e repensar 
suas práticas, a começar pela desintegração da autoridade etnográfica. Nesse novo 
mundo, a prática etnográfica também resultou na criação de alternativas de 
pesquisa. 
 
 
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44 CIÊNCIAS SOCIAIS 
Longe de se tornar obsoleta, o chamado “estar lá” seria um tipo de 
abordagem possível, baseada na experiência. O autor a denomina de Antropologia 
Experiencial, constituída da fusão bem-sucedida entre o pesquisador empírico, que 
coleta as informações diretamente, e o teórico geral, que sistematiza uma análise 
social. A autoridade etnográfica fica restrita ao antropólogo que “esteve lá”, pois a 
validade científica está na observação realizada no local. A escrita fica com a tarefa 
de “traduzir” a experiência de campo numa forma textual. Seus autores modelos 
seriam Malinowski, Raymond Firth e Margareth Mead. 
Outro tipo de abordagem é empreendido pela Antropologia Interpretativa, 
representada principalmente por Geertz, que, ao ver a cultura como um conjunto de 
textos e ressaltar a poética presente nas representações coletivas, contribuiu para 
problematizar a autoridade etnográfica do “estar lá”. Porém, na visão de Clifford, não 
efetuou concretamente nenhum avanço, em termos textuais, para realizar a inclusão 
do nativo na etnografia. 
Quem proporá um novo modelo será a chamada Antropologia Dialógica, 
que colocará a ênfase na interlocução e colocará no texto a forma discursiva do 
diálogo, envolvendo tanto antropólogos quanto nativos. A etnografia se transforma 
na transcrição de diálogos travados entre pesquisador e pesquisados e a autoria do 
trabalho é partilhada entre ambos. Um exemplo desse tipo de abordagem é a de 
Paul Rabinow, que veremos a seguir. 
Por fim, Clifford ainda propõe a possibilidade de realização de 
uma Antropologia Polifônica, que concebe a cultura como campo de múltiplos 
discursos simultâneos. Nessa perspectiva, não é possível realizar uma análise 
cultural integrada, pois toda tentativa de propor uma unidade é fruto de um desejo de 
ser monólogo. Assim, é impossível realizar a totalização da cultura. Quem inspira 
teoricamente a polifonia é Bakthin. 
Já familiarizados com os trabalhos da Antropologia Experiencial e da 
Antropologia Interpretativa, mais à frente vamos tomar contato com trabalhos 
representativos da Antropologia Dialógica e da Antropologia Polifônica. 
 
 
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Você acha que relatar a fala de uma pessoa é a mesma coisa que deixar a 
própria pessoa falar por si? 
 
 
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46 CIÊNCIAS SOCIAIS 
Aula 15_Rabinow e seus amigos do Marrocos 
 
Paul Rabinow foi aluno de Geertz, na Universidade de Chicago. Não 
é por acaso que seu primeiro trabalho de relevância tenha sido realizado no 
Marrocos. Em Reflexões sobre um trabalho de campo em Marrocos(1988), esse 
autor vai utilizar sua experiência de campo para realizar uma nova forma de 
apresentação etnográfica e assim questionar alguns fazeres antropológicos. 
Antes de tudo, Antropologia, para Rabinow, não é apenas a experiência do 
trabalho de campo, não é apenas relatar memórias ou vivências, é também 
organizar as informações segundo alguma corrente de pensamento da teoria 
antropológica. Porém, ao mesmo tempo, não se vai a campo querendo provar 
qualquer conceito pré-estabelecido. Esta experiência deve se realizar totalmente 
separada da teoria, porque essas etapas de pesquisa são descontínuas; só a 
experiência ou a teorização pura não definem o que seja a Antropologia. 
Para Rabinow, a Antropologia é uma atividade cultural, porque o trabalho 
assim o é. Isto é, a Antropologia, seguindo os critérios hermenêuticos, lida com os 
significados entrelaçados da cultura e, por isso, é uma atividade de compreensão de 
significados. Desse modo, o trabalho de campo, como tentativa de desvendar esses 
significados culturais é a tarefa de compreender uma cultura por meio de entender 
outro, o nativo ou informante, ao mesmo tempo em que o pesquisador tenta 
entender qual o significado de sua posição dentro da cultura que estuda. 
Ao transferir a ênfase interpretativa da cultura para a relação de pesquisa 
entre antropólogo e nativo, o autor problematiza tal relação dentro da etnografia, 
pois tanto o antropólogo quanto o informante vivem em um mundo culturalmente 
mediado por tramas de significação que eles mesmos teceram. Tanto o pesquisador 
quanto o pesquisado tentam interpretar sua própria cultura e a do outro, num 
processo contínuo de tradução cultural. Assim, o fazer antropológico é um fazer 
transcultural, porque se realiza através das fronteiras entre duas culturas. 
O encontro entre antropólogo e nativo é uma interação interpessoal, que se 
faz por meio da intensa autorreflexão tanto de um quanto de outro. Para que o nativo 
 
 
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47 CIÊNCIAS SOCIAIS 
explique um fato de sua cultura ao investigador, é necessário que o pesquisado 
reflita sobre sua cultura e crie meios de apresentar esse objeto a alguém que se 
encontra fora de sua cultura. Isso também vale para o antropólogo. Desse modo, o 
trabalho de campo é um processo de construção intersubjetiva de formas de 
comunicação. 
É por isso, que Rabinow vai escrever sua etnografia realizando a 
reconstrução dos encontros com marroquinos que se tornaram próximos do 
antropólogo, identificando cada um de seus pesquisados com seus respectivos 
nomes pessoais, situando-os dentro da cultura local, e descrevendo a forma com 
que estabeleceu contato com eles. Assim, cada capítulo da obra é o relato da 
conversa que o pesquisador travou com cada nativo marroquino, adensada por 
considerações teóricas a respeito das noções e ideias que surgiam sobre a cultura 
marroquina. 
Partindo da matriz de pensamento interpretativa, Rabinow inova ao 
apresentar um trabalho de cunho dialógico, em que os nativos não são esfumaçados 
pela denominação simples de “marroquinos”. Ao contrário, ele traz a presença 
individual de cada um dos marroquinos que entraram em contato com ele, tentando 
partilhar a autoria com Ibrahim, Malik ou Ben Mohammed. 
Por meio do trabalho de Paul Rabinow acompanhamos a iniciativa de 
realização de uma etnografia preocupada em tornar presentes os pesquisados com 
os quais se relaciona. Assim, nessa concepção 
o trabalho de campo é um encontro entre pesquisador e pesquisados. 
Qual a diferença de se referir aos pesquisados com um termo geral do tipo 
“os brasileiros” ou “os europeus”, e se referir de modo particular a cada indivíduo 
que contribui com informações dentro de uma pesquisa? 
 
 
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48 CIÊNCIAS SOCIAIS 
Aula 16 _O estar lá repensado segundo Geertz 
 
 Nesta aula, vamos ver como Geertz, representante da Antropologia 
Interpretativa, adentra o debate sobre a escrita etnográfica. 
Rebatendo o enfoque na crítica aos textos etnográficos, Geertz crê que o que 
faz a Antropologia ser legítima e acreditada não é uma escrita especial, porque para 
isso existiriam profissionais melhor habilitados que os antropólogos. Também não 
seria o poder de apresentar uma quantidade substancial de fatos ou o uso de 
argumentos teóricos mágicos que

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