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GRAVIDEZ E VULNERABILIDADES (1)

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GRAVIDEZ E VULNERABILIDADES 
GRAVIDEZ NA ADOLESCÊNCIA 
 
DEFINIÇÕES BÁSICAS 
A adolescência se caracteriza por ser uma fase evolutiva na qual o indivíduo estabelece sua 
identidade adulta a partir de internalizações e identificações ocorridas na infância, 
principalmente na relação com seus pais, mas também levando em conta as influências da 
sociedade em que vive. 
A adolescência é, portanto, um período evolutivo humano que deve ser considerado a partir de 
aspectos biopsicossociais. 
DEFINIÇÕES BÁSICAS 
Nos últimos anos, a incidência de gravidez na adolescência vem aumentando significativamente, 
tanto no Brasil como no mundo. 
No Brasil, observa-se cada vez maior a proporção de partos entre as adolescentes em 
comparação com o total de partos realizados no país. 
A maioria das adolescentes grávidas pertence às classes populares. 
CAUSAS DA GRAVIDEZ NA ADOLESCÊNCIA 
A literatura tradicional relaciona essa situação às mudanças sociais ocorridas na esfera da 
sexualidade, as quais provocaram maior liberalização do sexo, sem que, simultaneamente, 
fossem transmitidas informações sobre métodos contraceptivos para os jovens. 
Segundo esses autores, a gravidez na adolescência é indesejada, sendo enfocada como um 
problema que deve ser solucionado através da diminuição do número de gravidezes nessa 
população, por meio de programas de informação sexual. 
POR QUE AS ADOLESCENTES CONTINUAM ENGRAVIDANDO MESMO COM O ACESSO A 
INFORMAÇÃO NOS DIAS DE HOJE? 
• A gravidez na adolescência acarreta abandono dos estudos ou o seu adiamento, além de maior 
dependência econômica dos pais, visto que a maioria das jovens continua morando com os pais 
após o nascimento do filho. 
• Mesmo com todas as dificuldades, é bastante comum ouvirmos a adolescente dizer que essa 
gravidez é desejada por elas. 
MODELOS FAMILIARES 
A família brasileira nasceu na família patriarcal e ainda está impregnada nesse modelo. 
MODELOS FAMILIARES 
Em geral, uma família pertencente às classes populares brasileiras tende a educar os filhos com 
vistas à obtenção de empregos para ajudar no orçamento familiar. O casamento é algo que pode 
ocorrer precocemente, sendo acompanhado, muitas vezes, de vários filhos. 
Uma família da classe média, já prioriza a atividade intelectual dos seus jovens. O casamento é, 
geralmente, adiado para após o término dos estudos. 
As famílias das jovens de classes populares apresenta uma melhor aceitação dessa situação, 
especialmente a mãe e a avó, contrariamente às famílias das adolescentes de classe média, que 
não desejam a gravidez das filhas adolescentes. 
Não existe uma resposta única para essa pergunta de Freud. Cada mulher terá a sua própria 
resposta. 
As adolescentes grávidas deram a sua resposta: elas querem ser mães. 
FEMINILIDADE E MATERNIDADE 
A determinação do papel feminino na sociedade é transmitido às adolescentes, influenciando as 
suas escolhas e os seus projetos de vida. 
Atualmente, o papel da mulher de classe média brasileira não se limita ao papel de mãe, 
estendendo-se também a outras atividades, como a realização profissional. Entretanto, apesar 
de essas mulheres exercerem outros papéis sociais, a maternidade continua sendo um atributo 
essencialmente feminino. 
Nas classes populares, as representações sobre a família internalizam a ideologia patriarcal e a 
divisão de papéis sexuais reforçam a definição da identidade feminina através da família, ou seja, 
ser mulher nessa comunidade é sinônimo de ser filha, esposa ou mãe. 
FEMINILIDADE E MATERNIDADE 
Estudos mostram que as adolescentes de classe média geralmente rejeitam a gravidez, 
afirmando que essa situação iria atrapalhar as suas perspectivas de estudo e de trabalho, visto 
que a maternidade não é prioridade nessa classe social. 
As adolescentes de classe popular geralmente aceitam a gravidez por gostarem de criança. A 
maternidade aparece como a única perspectiva de vida para essas jovens, onde o papel social 
mais importante por elas desempenhado é o de ser mãe. 
GRAVIDEZ NA ADOLESCÊNCIA 
Gravidez hormonal: fruto da estreita relação entre o corpo e a pulsão sexual. A curiosidade em 
testar o seu aparelho reprodutor é desencadeada pela atividade hormonal ocorrida nesse 
período da vida, que leva ao ato sexual. A confirmação da sua capacidade reprodutiva constata 
que ela não é mais menina, e, sim, mulher. Exercer a sexualidade significa ter filho, o qual 
demarca a sua entrada na vida adulta. 
Nas classes populares essa gravidez hormonal se transforma, frequentemente, numa gravidez 
simbólica, isto é, em uma maternidade precária. Apesar das circunstâncias sociais desfavoráveis, 
o desejo de ter um filho é predominante. 
GRAVIDEZ NA ADOLESCÊNCIA 
A ocorrência de gravidez na adolescência é um fato rotineiro e comum nessa classe social. 
Constata-se uma valorização da maternidade, onde ser mãe equivale a assumir um novo status 
social, o de ser mulher. 
Surge, assim, o trinômio: adolescente-mãe-mulher, onde a gravidez é a via de acesso à 
feminilidade. A afirmação social nesse meio se expressa na maternidade, o que possibilita dizer 
que se trata, nesse caso, de uma gravidez social, isto é, maternidade social. Através do filho, 
essas jovens se sentem mães e mulheres. 
GRAVIDEZ NA ADOLESCÊNCIA 
Na classe média, a maternidade é, geralmente, indesejada na adolescência. A pressão social 
familiar da classe média se expressa mais através do incentivo ao estudo e ao trabalho, 
possibilitando que essas jovens vivam de modo mais prolongado sua adolescência, 
contrariamente às adolescentes de classes populares, onde a maternidade interfere nesse ciclo. 
A faculdade e o trabalho atuam como objetos reparadores narcísicos, ou seja, eles assumem o 
valor de falo, e o desejo de ter um filho pode, assim, ser adiado para a vida adulta. 
O DESEJO DE TER UM FILHO 
O desejo de ter um filho, isto é, o desejo universal do falo, representa a possibilidade de 
restauração do seu próprio narcisismo infantil abandonado. 
As adolescentes de classe popular, por terem uma precária situação econômica que lhes dificulta 
o acesso a bens de serviço e a serviços essenciais, o falo aparece como o objeto privilegiado 
capaz de possibilitar essa reparação narcísica. 
O DESEJO DE TER UM FILHO 
O desejo de ter o filho repararia a carência narcísica dos próprios pais, que moram na periferia, 
são mal-remunerados no trabalho e não têm condições econômicas para terem um melhor nível 
de vida. 
Os pais incentivam a união das filhas com os seus namorados quando elas iniciam a vida sexual, 
valorizando desde cedo o casamento. 
As adolescentes vivenciam uma grande solidão agravada pela carência de afeto de seu meio 
familiar, e, dessa forma, a carência afetiva as leva à maternidade. A jovem transfere para o filho 
essa demanda de amor e ele se torna o depositário de muitas expectativas; ele terá tudo o que 
elas não tiveram: estudo, carinho, proteção e até uma família. 
O DESEJO DE TER UM FILHO 
As mães das adolescentes da classe popular, geralmente, acreditam que a filha é muito nova e 
que não sabe cuidar da criança. As adolescentes costumam deixar o filho com a mãe para 
poderem ir trabalhar. 
Essas situações revelam o falo filho como um presente da adolescente para a sua mãe. Por outro 
lado, por meio da maternidade da filha, a mãe revive, mais uma vez, o seu desejo de 
completude, de reparação de suas carências afetivas. 
ESCOLA E GRAVIDEZ 
A gravidez na adolescência eleva o índice de abandono escolar (75%). Geralmente, o abandono 
ocorre por sentimentos ambivalentes das jovens, de vergonha, como que para negar que 
exercem a sua sexualidade, ou de satisfação pela gravidez e só queriam curtir o filho. 
A esses fatores emocionais, se junta a falta de estímulo dos pais, que valorizam mais o trabalho, 
através do qual a jovem poderá ajudar na renda familiar, do que os estudos das filhas. O fato de 
não concluírem a escolarização traz dificuldadespara alcançarem a independência financeira e 
profissional. 
Não é a falta de informação que aumenta o numero de gestação na adolescência. 
Fornecer o conhecimento sobre as questões referentes à fisiologia sexual e às práticas 
contraceptivas é uma política insuficiente e pouco eficaz para evitar as graves consequências que 
daí advém. 
Não se valoriza o discurso da adolescente sobre a sua gravidez, e por isso, vários projetos de 
educação sexual fracassam, visto que os desejos e fantasias dessas adolescentes quanto à sua 
gravidez não são priorizados. 
GRAVIDEZ EM USUÁRIAS DE DROGAS 
• Álcool e cigarro: abortamento, lesões orgânicas e neurológicas no feto, acarreta em nascimento 
com baixo peso, mortalidade fetal e neonatal. 
Maconha: prejudica o crescimento fetal e retardo da maturação do sistema nervoso fetal. 
Cocaína e crack: aborto, descolamento de placenta, parto prematuro e má formação fetal. 
VÍNCULO MATERNO-FETAL 
O feto é considerado um ser inteligente, com personalidade própria e, desde cedo, desenvolve 
determinadas capacidades que o permitem interagir com a mãe. 
Suas emoções estão estreitamente vinculadas à relação que estabelece com a genitora, sendo 
capaz de captar sua disposição afetiva para a gravidez e para pós-natal. 
A interação que a mãe desenvolve com o seu bebê, ainda durante a gravidez, permite a 
formação do sentimento de vinculação. 
VÍNCULO MATERNO-FETAL 
O vínculo materno-fetal caracteriza as atitudes da mulher frente à gravidez. Essas atitudes são 
baseadas em representações cognitivas que incluem o imaginário da mãe, bem como a 
intensidade com a qual ela manifesta comportamentos de afiliação e integração com seu bebê 
intra-útero. 
O vínculo que se inicia durante a gravidez se estende no relacionamento entre a mãe e o bebê no 
pós-natal, sendo capaz de predizer a qualidade do apego que a criança irá exercer sob seus 
cuidadores e nas futuras relações da vida adulta. 
VÍNCULO MATERNO-FETAL 
A interação materno-fetal acontece por meio das vivências psíquicas da mãe e da expressão de 
determinados comportamentos durante o período da gestação, tais como fantasiar com a 
criança, idealizá-la, sonhá-la, criar expectativas em relação ao sexo, à aparência física, à 
personalidade, etc. 
O USO DE CRACK DURANTE A GRAVIDEZ 
Além dos agravos obstétricos, o crack tem potencial de induzir dependência e, como 
consequência, as usuárias passam a viver em situação de vulnerabilidade. 
Muitas vivem em situação de rua, perdem os vínculos familiares, vivem em condições 
subalternas somente para obter e usar a droga na tentativa de saciar a fissura. 
A usuária de crack investe a maior parte do seu tempo e disposição à droga e pouco se preocupa 
com os cuidados relacionados à sua saúde. A relação de dependência com o crack gera a falta de 
cuidados consigo e, consequentemente, com a gestação. 
O CRACK E A DEPENDÊNCIA ABSOLUTA 
O dependente químico estabelece uma relação com a droga muito semelhante àquela que o 
bebê possui com sua mãe nos primeiros meses de vida. O recém-nascido é totalmente 
dependente dos cuidados maternos para obter alívio das suas angústias e de seu prazer. Na 
ilusão do bebê, ele e a mãe são uma única pessoa. Ainda não existe o Outro. No início da vida, 
essa sensação de onipotência precisa existir para que o bebê se desenvolva adequadamente e 
aos poucos possa perceber o mundo ao seu redor e se separar da mãe. 
O uso da droga provoca o alívio imediato das angústias e a sensação de gratificação 
experimentada na relação materna primária. 
O CRACK E A DEPENDÊNCIA ABSOLUTA 
A relação com a droga reproduz o estado de dependência absoluta vivenciado em tempo 
primitivo do desenvolvimento emocional e sinaliza a carência de recursos advindas desse tempo. 
Os mecanismos defensivos utilizados pelo usuário de drogas lembram os recursos emocionais 
primitivos do bebê. O crack é utilizado como alívio imediato do sofrimento. O usuário não é 
capaz de tolerar a espera pela gratificação, assim como o bebê não consegue tolerar por muito 
tempo a ausência da mãe. 
O CRACK E A DEPENDÊNCIA ABSOLUTA 
As gestantes usuárias de crack, ficam voltadas ao uso do crack, num estado de dependência com 
significativo prejuízo sobre a percepção do que se passa ao seu redor, como a gravidez. Elas 
precisaram que algo ou alguém externo lhes mostre que estão esperando um bebê. 
No primeiro trimestre, o corpo da mulher começa a sofrer mudanças físicas e psíquicas que 
evidenciam a gestação. Entretanto, as gestantes usuárias não percebem os sintomas da gravidez, 
pois os mesmos ficam encoberto pelo envolvimento com a droga. 
O CRACK E A DEPENDÊNCIA ABSOLUTA 
A gestante pode negar-se a parar o uso da droga como um “teste a tolerância do bebê, ou para 
demonstrar seu ressentimento por intromissão na vida dela”. 
Abrir mão do uso do crack para cuidar da criança é complexo e envolve os sintomas de 
abstinência. Essas mães podem sentir-se ameaçadas pela criança e e perceber o feto como 
perigoso. 
Esse sentimento influencia diretamente na relação vincular da dupla. 
O USO DE CRACK E O VÍNCULO MÃE-BEBÊ 
Após o nascimento há chances de o bebê padecer de deficiências físicas e mentais, despertando 
uma reação negativa na mãe que leva a negligência ou até mesmo ao abandono. 
A interação que a mãe desenvolve com o seu bebê através de conversas ainda durante a 
gestação e a imaginação das características e expectativas em relação ao filho que vai nascer, 
permite o estabelecimento de um sentimento de vinculação. 
A formação do vínculo das usuárias de crack se dá de forma ambivalente, pois ao mesmo tempo 
em que investem afetivamente na criança imaginando sua vida junto a ela, vivenciam a 
possibilidade de separação. 
O USO DE CRACK E O VÍNCULO MÃE-BEBÊ 
O investimento afetivo dirigido à criança constitui na realização do seu próprio eu. Esse 
comportamento pode ser observado na atitude emocional dos pais de supervalorizar as 
características da criança, sendo essa capaz de concretizar os sonhos que esses não conseguiram 
realizar. 
Nas usuárias de crack, é comum que o investimento de energia seja voltado para elas mesmas. 
O USO DE CRACK E O VÍNCULO MÃE-BEBÊ 
Por viverem em um estado de dependência absoluta do crack, comparado à dependência inicial 
do bebê à sua mãe, essas mulheres apresentam um prejuízo na capacidade de investir 
narcisicamente no filho nesse primeiro momento. 
Segundo Winnicott, para que a mãe possa investir no seu filho é necessário que ela também 
tenha sido investida na relação com sua própria mãe durante a infância. As usuárias de crack 
costumam buscar precariamente suprir a falta dessa vivência na dependência da droga. 
O BEBÊ IMAGINÁRIO NAS USUÁRIAS DE CRACK 
O bebê imaginário, desconhecido, que vai sendo delineado pelas projeções dos pais. As 
esperanças e desejos projetados no bebê vão descrevendo sua pré-história e isso vai influenciar 
sua vida após o nascimento. 
A construção do bebê imaginário revela a capacidade da mãe em utilizar seu próprio narcisismo 
para criar um filho tomado pelo seu desejo. 
Nas usuárias de crack, o filho esperado é concebido na imaginação da mãe com a missão de livrá-
la da droga. 
REDE DE APOIO SOCIAL 
O apoio de uma rede social durante a gestação e após o nascimento é muito importante para 
saúde mental da nova mãe, pois a mesma passa por mudanças geradoras de insegurança. 
Quando suas necessidades emocionais são atendidas, ela tende a constituir uma relação mais 
saudável com o bebê e a solicitar mais apoio quando precisa. 
Tal apoio, no cenário das gestantes usuárias de crack, estende-se aos cuidados relacionados a 
vinda do bebê já que as mesmas não disponibilizam espaço emocional para tal atenção. 
• O apoio por parte dos familiares produz sentimentos ambivalentes nas gestantes já que, mesmo 
percebido como importante, aciona hostilidade. 
A intensidade dos sentimentos hostis dificulta que os familiaresque demonstram preocupação 
com a saúde dessas mulheres e com os riscos do uso da droga, estabeleçam a relação de apoio. 
O que se faz necessário parece ser percebido como ameaçador a essas futuras mães. 
REDE DE APOIO SOCIAL 
A ausência de apoio do genitor da criança também é muito comum, e em alguns casos, o uso do 
crack também é realizado pelo pai, dificultando ainda mais o envolvimento com a gravidez. 
A presença do pai durante a gestação e no pós-parto, faz com que ela possa entrar no estado de 
“preocupação materna primária”, desenvolvendo uma sensibilidade aumentada e se 
identificando com o bebê para melhor atender suas necessidades. 
Essa condição esperada para o favorecimento da relação da mãe com o bebê desde o período 
gestacional não se faz presente na realidade dessas mulheres cujos parceiros, na maioria dos 
casos, compartilham o uso da droga. 
A droga ocupa, para essas mulheres, lugar privilegiado psiquicamente numa estratégia frágil de 
sanar falhas bastante precoces. Acredita-se que seja essa condição psíquica da mãe um fator que 
dificulte que a mesma consiga destinar ao bebê um lugar em seu universo emocional. 
Acrescido às frágeis condições emocionais maternas, pode-se perceber que a formação do 
vínculo mãe-bebê se dá de forma ambivalente, pois ao mesmo tempo em que buscam investir 
afetivamente imaginando suas vidas ao lado dos filhos, vivenciavam a possibilidade de separação 
por não poderem ficar com a guarda dos mesmos. 
REDE DE APOIO SOCIAL 
• As gestantes na condição de dependentes do crack carecem de condições mínimas de cuidado 
para consigo e com seus bebês. 
• Sem o apoio do outro não conseguem tomar consciência da situação vulnerável a qual estão 
submetidas. 
• Os profissionais da saúde e familiares podem oferecer amparo emocional, intensificando o 
vínculo com a gestante para que, dessa forma, ela possa cuidar da gravidez.

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