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Supremacia da Constituição

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Supremacia da Constituição: jurisdição constituição e legitimidade democrática frente à ordem constitucional
Adeilton de Oliveira Alves
  
                                                                                
RESUMO
O presente artigo tem por objetivo realizar um estudo crítico analítico da jurisdição constitucional, que é a atuação jurisdicional do Supremo Tribunal Federal julgando casos que envolvam dissídios em matéria de direito constitucional, tendo por escopo a supremacia constitucional, caracterizada pela superioridade da norma fundamental frente às leis infraconstitucionais. A jurisdição constitucional exercida por meio do controle de constitucionalidade das leis, utilizando os modelos decisórios do ativismo judicial e da judicialização: o primeiro sendo possibilidade do STF decidir determinadas causas de um modo proativo e específico de interpretar a constituição, expandindo seu sentido de alcance; este último é a decisão de questões de larga repercussão política ou social pelo Poder Judiciário, envolvendo a transferência de poder ao judiciário para que este a decida, com alterações significativas na linguagem, na argumentação e no modo de participação da sociedade. Esses modelos decisórios envolvem, sem dúvida, uma transferência de poder das instâncias políticas para a instância jurídica, por reflexo, questionasse a legitimidade democrática do judiciário ao exercer funções que antes pertenciam a órgãos de outros poderes.
1.      INTRODUÇÃO
Há alguns anos, nota-se uma interferência desempenhada pelo Poder Judiciário por meio de suas decisões, em especial a realizada pelo Supremo Tribunal Federal, na vida institucional do nosso país. Anseios sociais e, até mesmo, litígios particulares, estão sendo postos perante o judiciário para que este se pronuncie. Este fato evidencia, não só o avanço deste Poder Judiciário em efetivar o acesso à justiça, como também, o respeito que este adquiriu perante a sociedade.
De fato, este fenômeno se acentuou, principalmente, após a Constituição Federal de 1988, conhecida como a “Constituição cidadã”, devido ao seu caráter extremamente garantista, em especial, no que diz sobre os direitos fundamentais. Aliás, algumas medidas foram primordiais para se alcançar a realidade existente hodiernamente, das quais podemos elencar: a expansão do Poder Judiciário para os interiores mais longínquos, antes desprezados pelo Estado; outra não menos importante, foi a renovação da composição do judiciário como um todo, proporcionada pela nova política adotada – ampla acessibilidade aos cargos públicos -, abolindo-se assim, a velha política do apadrinhamento.
Importante salientar que este fenômeno – judicialização e ativismo judicial – não é uma peculiaridade nossa. Muito pelo contrário, foi um movimento mundial pós Segunda Guerra Mundial. No Brasil começou a ganhar os contornos nos quais conhecemos hoje após a promulgação da Constituição de 1988.
Portanto, cada vez mais, o judiciário, por meio de sua função institucional, têm um papel efetivo no controle dos atos políticos e sociais, e é neste ponto que ganha destaque o controle exercido via controle de constitucionalidade, tanto o difuso quanto o concentrado.
Um caso em especial é o papel desempenhado pelo Supremo Tribunal Federal na vida institucional brasileira, a qual devemos analisar com muita atenção - e não poderia ser diferente – são as várias questões de repercussão nacional que interferem diretamente na vida social e particular de cada cidadão está sendo decididas por 11 (onze) ministros. Sendo assim, todo cuidado é pouco para não se interpretar de modo extensivo ou restritivo demais uma determinada situação, e correr um risco, ainda maior, de causar uma crise social e até mesmo institucional entre os demais poderes.
Nesse estaleiro, temos que frisar o que diz a inteligência do artigo 2º da Constituição Federal do Brasil de 1988, que disciplina que: “São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário”. (Grifo meu).
Seguindo essa linha de pensamento, fica evidente que cada um dos poderes (Legislativo, Executivo e Judiciário), deve desempenhar suas funções buscando interferir o mínimo possível sobre os demais, restringindo-se a atuar da forma que a Constituição lhes autorgou.
2.      SUPREMACIA DA CONSTITUIÇÃO
A necessidade de se instituir um Estado através de uma ordenação sistemática e racional, implementada por uma comunidade política, o que resultou em um documento escrito com o alicerce capaz de legitimar, e instituir, no plano teórico, um Estado. A Constituição surge assim como a lei proeminente que conforma o Estado[2]. Essa foi à ideia original, criadora do movimento social, político e cultural, o qual ficou conhecido por constitucionalismo, ou seja, época em que as nações, ao seu tempo e modo, criaram suas constituições.
A ideia de constitucionalismo veio se reformulando ao longo dos anos, o que, na prática, resultou em muitas mudanças entre o constitucionalismo atual (constitucionalismo contemporâneo) e o mais remoto. Isto tudo, fruto dos ciclos sociais no qual este sobreveio, refletindo nos tempos atuais, ao momento no qual a sociedade se encontra[3].
Como visto anteriormente, a Constituição surge como a lei fundamental do Estado, mas não só isso, ela cria também mecanismos capazes de garantir que esta figure em um posicionamento hierarquicamente superior as demais leis. Não obstante, um desses mecanismos é a anulação de qualquer ato que lhe contrarie. Portanto, a Constituição conta com mecanismos específicos de defesa – controle de constitucionalidade – contra estes atos atentatórios.
Neste diapasão, diz-se que há uma rigidez constitucional, que decorre da maior dificuldade de sua modificação em comparação com as demais normas do ordenamento jurídico[4]. É dessa rigidez que emana o princípio da supremacia da constituição. Em outras palavras, a Constituição encontra-se no topo do ordenamento jurídico, sendo assim, é a lei suprema do Estado, a qual confere validade e legalidade a todo sistema jurídico do país[5].
Neste mesmo sentido, merecem destaque os ensinamentos do Ministro do Supremo Tribunal Federal Luís Roberto Barroso que, lecionando sobre a interpretação e aplicação da Constituição, aduz que:
Toda interpretação constitucional se assenta no pressuposto da superioridade jurídica da Constituição sobre os demais atos normativos no âmbito do Estado. Por força da supremacia constitucional, nenhum ato jurídico, nenhuma manifestação de vontade pode subsistir validamente se for incompatível com a lei fundamental[6].
Continuando suas esclarecedoras explanações, explana ainda o magnífico professor da Universidade Estadual do Rio de Janeiro que:
Já a rigidez constitucional traduz a necessidade de um processo especial para reforma da Constituição, distinto e mais complexo do que o necessário para a edição das leis infraconstitucionais, e que no caso brasileiro incluem quórum e procedimentos diversos, além de limitações materiais e circunstanciais[7].
 
E não tem sido diferente o entendimento do ministro do Supremo Tribunal Federal Gilmar Ferreira Mendes:
A jurisdição constitucional não se mostra incompatível com o sistema democrático, que imponha limites aos ímpetos da maioria e discipline o exercício da vontade majoritária. Ao revés, esse órgão de controle cumpre uma função importante no sentido de reforçar as condições normativas da democracia[8].
Nestas perspectivas, o princípio da supremacia da constituição emerge como ponto de apoio e condição de validade de todo ordenamento jurídico, na medida em que todas as demais normas infraconstitucionais só nela encontram validade.
É da superioridade hierárquica da Constituição frente às demais normas do sistema jurídico que se costuma distinguir a supremacia da Constituição em formal e material: a primeira é a relação de superioridade existente entre a norma constitucional, qualificando às mesmas em hegemônicas e preeminentes frente às normas infraconstitucionais, reputando-se inválidas às normas que contrariema Constituição; já a segunda, essa superioridade decorre de uma consciência, típica de Constituições flexíveis e as histórico-costumeiras, se caracterizam por não existir uma técnica jurídica. A Constituição brasileira adotou o primeiro modelo[9].
3.      JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL
A supremacia constitucional pressupõe, de um lado, a superioridade hierárquica da normal fundamental sobre as demais e, por outro lado, órgãos capazes de manter a força normativa da Constituição frente a atos contrários a mesma[10].
De igual modo leciona BONAVIDES:
O conceito de jurisdição constitucional, qual a entendemos em sua versão contemporânea, prende-se à necessidade do estabelecimento de uma instância neutra, mediadora e imparcial na solução dos conflitos constitucionais. E em se tratando, como soe acontecer, de sociedades pluralistas e complexas, regidas por um princípio democrático e jurídico de limitações do poder, essa instância há de ser, sobretudo, moderadora de tais conflitos[11].
                   O Estado, como garantidor da paz social e mediador dos conflitos, avocou para si o monopólio dos conflitos, sejam eles particulares ou que interessem a toda a sociedade, limitando, quase que absolutamente, a autotutela. A consequência foi transmitir ao Poder Judiciário, a responsabilidade de solucionar os referidos conflitos (FUX, Luiz. Jurisdição Constitucional Aplicada. Biblioteca Digital Jurídica - STJ).
     Esta instância neutra, mediadora e imparcial é exercida pelos órgãos que compõe o Poder Judiciário, em especial, o Supremo Tribunal Federal e, de forma complementar, os demais órgãos do judiciário. O STF é o órgão máximo do Poder Judiciário, capaz de uniformizar todo o entendimento em matéria de direito constitucional.
Como é sabido, a jurisdição é uma das maiores manifestações de soberania de um Estado. É através dela que, de forma neutra, o Estado resolve os conflitos entre as partes, declarando o direito aplicável ao caso concreto. Apesar de seu caráter indissolúvel, há vários critérios de classificação da jurisdição, a classificação quanto à matéria, a jurisdição pode ser ordinária ou constitucional, esta última cuida dos conflitos de natureza constitucional[12]. Remetemos aos ensinamentos esclarecedores de KELSEN:
A garantia jurisdicional da Constituição – jurisdição constitucional – é um elemento do sistema de medidas técnicas que tem por fim garantir o exercício regular das funções estatais. Essas funções também tem um caráter jurídico: elas consistem em atos jurídicos. São atos de criação de direito, isto é, de normas jurídicas já estabelecidas[13].
 
      Nesse contexto, a jurisdição constitucional brasileira tem tido a função de garantir a concretização de valores constitucionais. É por meio dessa função exercida Tribunal Constitucional que essas garantias ganham uma real dimensão. Indiscutivelmente, essa é uma das mais relevantes ações exercidas pelo Supremo Tribunal Federal, como guardião da Constituição.
      Com a promulgação da Constituição Federal de 1988, o Brasil passou a adotar o sistema misto de constitucionalidade, combinando assim o sistema difuso, exercido pelos juízes e tribunais no caso concreto, introduzido pela primeira Constituição Republicana em 1889, com o sistema concentrado, exercido pelo Supremo Tribunal Federal, 
A jurisdição constitucional tem levado ao Supremo Tribunal Federal a decidir questões que classificamos como judicialização, o que podemos que afirmar que significa que algumas questões de larga repercussão política ou social estão sendo decididas por órgãos do Poder Judiciário, ao invés das instâncias políticas, que teoricamente seriam as responsáveis para regular tal fato. De fato, a judicialização envolve uma transferência de competência para juízes e tribunais, com indiscutíveis alterações na linguagem, argumentação e no modo de participação da sociedade[17].
Portanto, a judicialização e o ativismo judicial são inteiramente relacionáveis, pois partem da mesma família, apesar de não ter as mesmas origens, nem as mesmas causas. No contexto brasileiro, a judicialização é um fato, uma circunstância que decorre do modelo constitucional adotado, e não de um exercício de deliberada vontade política, não existindo outra alternativa. Já o ativismo judicial é uma atitude, uma escolha de um modo específico de interpretar a Constituição, expandindo ou restringindo seu alcance, se verificando em situação que o legislativo foi além ou aquém do que lhe era devido[22].
De fato, esta é uma atividade crescente e não deverá ser diferente nos tempos vindouros.
BIBLIOGRAFIA
BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da constituição: fundamentos de uma dogmática constitucional transformadora. São Paulo: Saraiva. 6ª ed. 2008.
BONAVIDES, Paulo. Jurisdição Constitucional e Legitimidade (algumas observações sobre o Brasil). Disponível em: www.scielo.br/pdf/ea/v18n51/a07v1851.pdf.   Acessado em: 25 de setembro de 2011.
BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de direito constitucional. São Paulo: Saraiva. 6ª ed. 2011.
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. Coimbra: Almedina. 7ª ed.
DANTAS, Ivo. Constituição e processo. Curitiba: Juruá. 2ª ed. 2008.
FUX, Luiz. Jurisdição Constitucional Aplicada. Biblioteca Digital Jurídica – STJ. Disponível em:http://bdjur.stj.jus.br/xmlui/bitstream/handle/2011/48261/jurisdicao_constitucional_aplicada_fux.pdf?sequence=1. Acesso em: 15 de maio de 2013.
HESSE, Konrad. A força normativa da constituição. Porto Alegre: Sergio Antônio Fabris. 1991.
KELSEN, Hans. Jurisdição constitucional. São Paulo: Martins Fontes. 2ª ed. 2007.
MARTINS, Ives Gandra da Silva. Ativismo Judicial e a Ordem Constitucional. Revista Brasileira de Direito Constitucional. Disponível em: http://www.esdc.com.br/RBDC/RBDC-18/RBDC-18-023-Artigo_Ives_Gandra_da_Silva_Martins_(O_Ativismo_Judicial_e_a_Ordem_Constitucional).pdf.Acesso em: 12 de março de 2013.
MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet; COELHO, Inocêncio Martires. Curso de direito constitucional. São Paulo: Saraiva. 5ª ed. 2010.
SAMPAIO, José Adércio Leite. A constituição reinventada pela jurisdição constitucional. Belo Horizonte: Del Rey. 2002.
SILVA, José Afonso. Curso de direito constitucional positivo. São Paulo: Malheiros. 30ª ed.
TAVARES, André Ramos. Curso de direito constitucional. São Paulo: Saraiva. 8ª ed. 2010.
ATIVIDADE: 
O Supremo Tribunal Federal, nos últimos anos, em razão do controle de constitucionalidade, tem enfrentado vários casos, dentre eles o de extradição do italiano Cesare Battisti. Pesquise o referido julgado pelo STF e identifique a principal mudança ocorrida na esfera de competência, pela decisão do tribunal superior. Estabeleça uma análise crítica. 
Realizado em grupo (o mesmo do seminário).
 MÁXIMO - 10 linhas.
Entrega: Dia 09/09/2020

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