Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Disciplina Didática I Coordenador da Disciplina Prof.ª Nidia Barone 7ª Edição Copyright © 2010. Todos os direitos reservados desta edição ao Instituto UFC Virtual. Nenhuma parte deste material poderá ser reproduzida, transmitida e gravada por qualquer meio eletrônico, por fotocópia e outros, sem a prévia autorização, por escrito, dos autores. Créditos desta disciplina Realização Autor Prof. Paulo Meireles Barguil Colaborador (es) Prof.ª Silvany Bastos Santiago Prof.ª Nidia Barone Sumário Aula 01: Escola, Sociedade, Trabalho docente e Didática .................................................................... 01 Tópico 01: Introdução à disciplina ......................................................................................................... 01 Tópico 02: Função Social da Escola: Manutenção ou Transformação da Realidade? ........................... 05 Tópico 03: Trabalho Docente: Características, Especificidades e Exigências do Cenário Contemporâneo ........................................................................................................................................... 12 Tópico 04: Didática: aspectos históricos, perspectivas atuais e contribuição para o trabalho docente . 17 Aula 02: Educação: crise de paradigmas ................................................................................................ 23 Tópico 01: Contextualizando a crise educacional .................................................................................. 23 Tópico 02: (Des)Encontros na Escola e Na Sala de Aula: Ética, Diálogo e Violência - I..................... 34 Tópico 03: (Des)encontros na escola e na sala de aula: ética, diálogo e violência - II.......................... 42 Tópico 04: As teorias educacionais e contribuições para o trabalho docente ........................................ 52 Tópico 05: Relação entre as teorias de aprendizagem e as práticas educacionais ................................. 67 Aula 03: Organização do Trabalho Docente .......................................................................................... 79 Tópico 01: Interdisciplinaridade e Transposição Didática..................................................................... 79 Tópico 02: Inovações Pedagógicas ........................................................................................................ 87 Tópico 03: Planejamento Educacional................................................................................................... 90 Tópico 04: Elementos de um Plano de Ensino....................................................................................... 94 Didática I Aula 01: Escola, Sociedade, Trabalho Docente e Didática Tópico 01: Introdução à disciplina Palavra da Coordenadora da Disciplina de Didática I VERSÃO TEXTUAL Sou prof.ª Nidia Barone, pedagoga, psicopedagoga, especialista em educação, mestranda em Tecnologia da Informação e Comunicação em formação para a EaD, gerente do Centro de Produção do Instituto UFC Virtual, professora universitária ... Estou também como professora conteudista de Didática I onde abordaremos o que vem a ser "Ensinar". Ensinar não é apenas transmitir conteúdos, executar tarefas, avaliar e aprovar ou reprovar. Ensinar antes de tudo é dialogar com as infinitas possibilidades do conhecimento; é abrir mentes, é combater a cegueira da escuridão mental; é dar razão ao sentido da vida, do ser e do mundo. É repassar firmeza, autoestima, capacidade, controle, atenção; é conduzir o ser ao caminho certo da reflexão, da exatidão, da inexatidão, enfim, das certezas e incertezas que nos conduzem na busca pelo saber. Queremos também refletir sobre o seu papel enquanto educador. Ser professor, não é apenas ser um diplomado, o dono do conhecimento. Ser professor é mais que isso. É ser um mestre da sabedoria e do transmitir a sabedoria. É dialogar com as múltiplas possibilidades e dificuldades do ensinar; é ser compreensível, atencioso e não ter medo de errar ou acertar; é ser um ser humano que busca entender e ensinar o outro. Portanto, nossa disciplina de didática, trará algumas questões importantes sobre ensino, escola, sociedade, conhecimento, aprendizagem, professor, aluno e planejamento. Indagações que diariamente acompanham o dia a dia daqueles que se envolvem com a educação. Nossa disciplina de Didática será dividida em três aulas que têm por objetivo: • Destacar a função social da escola na sociedade; • Compreender o andamento do professor em sala de aula, bem como saberes e competências; • Analisar as concepções de ensino e aprendizagem diante das dificuldades da atual educação brasileira; • Verificar o papel do professor e do alunado mediante as concepções de educação no Brasil; • Compreender a importância do planejamento e da avaliação escolar durante o processo de ensino e aprendizagem do aluno; • Investigar os encontros e desencontros entre aluno, professor, sociedade e violência escolar. Na primeira aula focaremos a escola, a sociedade, o trabalho docente e a didática. Nessa unidade, traçaremos definições importantes sobre a Didática e de sua importância para a prática docente em sala de aula: a didática como ferramenta do processo de ensino aprendizagem do professor. Iremos trabalhar a relação aluno - professor; o processo do ensinar e do aprender; e verificar a função social da escola. Nosso objetivo é compreender o papel da escola na sociedade; do professor e sua prática de ensino; da arte de ensinar e de aprender. Num segundo momento de nossa disciplina, discutiremos a crise educacional no Brasil, traçando um olhar sobre a sala de aula, a estrutura escolar, a realidade social e sua influência na educação, a violência no ambiente escolar e a relação aluno - professor - conhecimento - 1 aprendizagem. O objetivo dessa unidade 2 é compreender o processo de educação no Brasil, bem como verificar os paradigmas educacionais que estão inseridos no processo de ensino e aprendizagem do aluno. Na terceira e última aula, discutiremos a organização do trabalho docente, as inovações pedagógicas e o processo de planejamento das aulas, o currículo, a interdisciplinaridade e as renovações do saber. Nosso objetivo é entender o seguinte: o que ensinar? Como ensinar? Por que ensinar? Com que ensinar? Devemos pensar no saber e na forma de repassá-lo. E é por isso que devemos traçar uma maneira criativa, amistosa e saudável de educar. Dar aula não é uma tarefa fácil, pois exige muito de nós. Contudo, só podemos afirmar uma coisa: existe enumeras maneiras de ensinar invente a sua... ! Sejam todos bem-vindos à disciplina de didática! Forte abraço a todos, Prof.ª Nidia Barone Nesta disciplina, estudaremos sobre a Didática, a qual se constitui num importante aspecto do trabalho docente, que precisa ser entendido na complexa relação escola – sociedade. Para compreender a Didática de forma crítica, convém que o professor, constantemente, se indague: VERSÃO TEXTUAL • Qual é a função social da escola na atualidade? • Que saberes e competências eu preciso ter para ser um bom profissional na sociedade contemporânea, caracterizada pela crescente competitividade? • O que é Didática? • Quais são as concepções de ensino e de aprendizagem em que acredito? • Que papéis o professor e o estudante desempenham na relação pedagógica? • Qual é a importância do planejamento e da avaliação na minha atividade profissional? • Quais são e como se articulam os elementos constantes de um plano de trabalho? As respostas para tais questionamentos são variadas e expressam, dentre outros, valores éticos, cognitivos e políticos. O exercício da docência pressupõe coragem tanto para formular tais perguntas (e outras!) quanto para procurar respostas, as quais são sempre parciais, tendo em vista o caráter dinâmico da vida. Duranteestas aulas, as temáticas acima serão discutidas, permitindo que vocês, num processo individual e coletivo, (re)construam as crenças que orientarão a sua prática profisssional. 2 Didática Fonte [1] Quantas vezes já ouvimos (e falamos): “Fulano não tem didática!” para expressar a dificuldade desse(a) docente em socializar os conhecimentos aos seus estudantes? Mas, o que é a Didática? É possível aprender a ter Didática? Se sim, o que é necessário? Didática, conforme o dicionário Aurélio, é: “[Fem. substantivado de didático.] S. f. 1. A técnica de dirigir e orientar a aprendizagem; técnica de ensino. 2. O estudo desta técnica.” (FERREIRA, 1993, p. 587). De acordo com a definição supra, a Didática é uma técnica (que dirige e orienta a aprendizagem e de ensino) que pode ser estudada. Não é de estranhar, portanto, que, muitas vezes, os estudantes, no início desta disciplina, tenham a expectativa de apreender tal técnica, que equivaleria a receitas. Desde o século passado, a Educação tem vivido uma crise, a qual demanda do professor uma compreensão quanto à sua natureza, de modo que a sua atitude diante dela seja satisfatória. Postulo que um dos fatores que contribui para este quadro educacional é de natureza epistemológica, em virtude de o ensino, numa perspectiva tradicional, ter primazia sobre a aprendizagem. Acredito que, de modo geral, a preocupação do professor é muito mais com o ensino do que com a aprendizagem. As descobertas da neurociência na década recente ratificaram, de forma incisiva, as teorias de aprendizagem que enfatizam a importância da atividade do sujeito, da valorização das suas experiências e conhecimentos prévios, os quais são ponto de partida para os conceitos que se deseja que ele aprenda. Tendo em vista que, conforme a definição supra, Didática é um substantivo originado de Didático, convém conhecer, também, a definição deste: Didático, conforme o dicionário Aurélio, é: “[Do gr. Didaktikós.] Adj. 1. Relativo ao ensino ou à instrução, ou próprio deles: problemas didáticos. 2. Próprio para instruir; destinado a instruir: livro didático. 3. Que torna o ensino eficiente: Bom professor, recorre em suas aulas a todos os expedientes didáticos. 4. Típico de quem ensina, de professor, de didata: Tem um modo didático de se exprimir.” (FERREIRA, 1993, p. 587). Os problemas de aprendizagem revelam, na grande maioria das vezes, problemas de ensino (de didática), em virtude de o professor acreditar que o domínio de conteúdos e de certas técnicas é suficiente para garantir a aprendizagem dos estudantes. REFLEXÃO 3 Para reflexão, sugerimos a leitura do texto A volta de um personagem do século XVI ao Brasil. (clique aqui para abrir (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.)) Como entender que a educação escolar ainda utilize, a despeito das inúmeras transformações sociais, muitas vezes, práticas pedagógicas que se revelam, cada vez mais, inadequadas? Quais são as consequências da continuidade dessas rotinas? DICA O que é Educação? (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.) No próximo tópico, será analisada a relação escola e sociedade. 4 Didática I Aula 01: Escola, Sociedade, Trabalho Docente e Didática Tópico 02: Função Social da Escola: Manutenção ou Transformação da Realidade? REFLEXÃO A sociedade brasileira se caracteriza, dentre outras coisas, por profundas e históricas desigualdades, frutos de um processo de exclusão e segregação social. - Será que a educação pública tem algo a ver com isso? - Será a educação mais uma expressão do descaso do Estado com as demandas da grande maioria da população? - Poderá a educação contribuir de alguma forma para a transformação desta situação? A relação entre Educação e Sociedade pode ser entendida, numa perspectiva filosófica, de três formas distintas: Redenção A educação é capaz de salvar a sociedade dos desvios individuais e grupais que a ameaçam (redenção). Reprodução A educação reproduz a sociedade, uma vez que os determinantes econômicos, sociais e políticos impedem que práticas pedagógicas contrárias ao sistema se desenvolvam (reprodução). Transformação A educação viabiliza um projeto social, que pode ser conservador ou transformador, tendo em vista o caráter histórico da sociedade (transformação). As tendências redentora e transformadora expressam-se, respectivamente, nas concepções pedagógicas liberal e progressista. Essas tendências, segundo Libâneo (1996), se diferenciam quanto: LIBERAL (tradicional, renovada progressivista, renovada não diretiva e tecnicista) PROGRESSISTA (libertadora, libertária e crítico-social dos conteúdos) 5 - ao papel da escola - os conteúdos de ensino - os métodos - o relacionamento professor-estudante - os pressupostos de aprendizagem - as manifestações na prática escolar PARADA OBRIGATÓRIA As Tendências Pedagógicas e a prática escolar. (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.) Paulo Freire Fonte [2] Descrição da imagem: Foto do educador Paulo Freire. Paulo Reglus Neves Freire (1921- 1997) - foi um educador, escritor e filósofo pernambucano. Considerado um dos pensadores mais notáveis na história da pedagogia mundial, tendo influenciado o movimento chamado pedagogia crítica. É também o Patrono da Educação Brasileira. 6 Cabelos brancos que vão até abaixo dos ombros, e barba comprida, também, branca. Usa óculos de armações finas e veste paletó preto e camisa lilás, com gravata. Acredito que a escola pública é um espaço importante que as classes trabalhadoras têm para compreender a História do Brasil. Para tanto, elas precisam ter acesso às informações e saber interpretá- las. Paulo Freire [3] formulou, nos anos 60, um método de alfabetização [4], que sintetiza seu compromisso com a transformação do mundo, a qual só é possível quando as pessoas se percebem como sujeitos e não como objetos da História (Pedagogia da Libertação). Neste sentido, ele diferenciou a educação bancária da educação libertadora/problematizadora. Educação bancária O conhecimento é decorado, fruto da transmissão acrítica dos conteúdos “guardado” em gavetas. Educação libertadora/problematizadora O conhecimento é entendido na sua dimensão histórica, seja no que se refere à sua construção, seja na sua relevância na realidade dos discentes (que sempre nos perguntam: “Professor, para que eu vou estudar isto?”), possibilitando que esses elaborem significado/sentido dos saberes socializados. Compartilho, portanto, da opinião de Freire : Uma das tarefas essenciais da escola, como centro de produção sistemática de conhecimento, é trabalhar criticamente a inteligibilidade das coisas e dos fatos e a sua comunicabilidade. É imprescindível, portanto, que a escola instigue constantemente a curiosidade do educando em vez de ‘amaciá-la’ ou ‘domesticá- la’. (FREIRE, 2009, p. 122-123) 7 MULTIMÍDIA Filosofia de Paulo Freire I [5]. Filosofia de Paulo Freire II [6]. O professor é um profissional cujo trabalho é ajudar estudantes (crianças, adolescentes e adultos) no seu processo de crescimento pessoal, o qual contempla múltiplas dimensões: cognitiva, afetiva, física, social. Considerando que os estudantes brasileiros vivem num país de seculares injustiças, é fundamental que o cotidiano escolar (conteúdos, práticas...) favoreça a compreensão discente quanto aos fatores que perpetuam tal dinâmica, bem como na instauração de renovadas relações, pautadas em valores éticos. Fonte [7] Descrição da imagem: Imagem ilustrativa com os seguintes dizeres: Pretérito: eu não estudei. Tu não se responsabilizaste. Eles não investiram em educação. Presente: eu depredo, me drogo, agrido. Tu choras. Eles não investem em educação. Futuro: Eu sofrerei. Tu sofrerás. Eles se elegerão. REFLEXÃO Que profissional/cidadão a escola pública brasileira, que atende 85% das nossas crianças e adolescentes, deveajudar a formar? Entender a sociedade como resultado da ação humana e não de fenômenos naturais pode aumentar a intensidade do compromisso na transformação daquela? É possível aprender a ser cidadão na escola? Edgar Morin 8 Fonte [8] Descrição da imagem: Foto do educador Edgar Morin. Cabelos brancos, boné preto. Usa uma blusa cinza por fora e um cachecol xadrez (vermelho, preto e branco). Edgar Morin - cujo verdadeiro nome é Edgar Nahoum, nasceu em 8 de julho de 1921. Formado em Direito, Geografia e História, ele também realizou estudos em filosofia, sociologia e epistemologia. Edgar Morin é considerado um dos principais pensadores ainda vivo. Edgar Morin acredita que a Educação, em todos os níveis, precisa contemplar sete aspectos para atender às demandas do futuro, o que implica na redefinição de objetivos e práticas dos cotidianos escolares. A seguir, um breve resumo de “Os sete saberes necessários à Educação do futuro”, na concepção de Morin: AS CEGUEIRAS DO CONHECIMENTO: ERRO E ILUSÃO Conhecer é interpretar, construir significado, a partir das nossas experiências. Desta forma, devem-se considerar o erro e a ilusão, uma vez que a realidade se modifica a todo momento: objetivamente (os acontecimentos) e subjetivamente (as nossas leituras). 9 OS PRINCÍPIOS DO CONHECIMENTO PERTINENTE Conhecer é integrar dimensões variadas (partes) para entender a (complexidade da) realidade (todo). IDENTIDADE HUMANA Resgatar a identidade humana, compreendendo-a como uma espécie organizada em sociedade que habita a Terra, a qual participa de um cosmos repleto de mistérios (indivíduo-espécie-sociedade). Ao mesmo tempo, somos homo sapiens, ludens, economicus, mitologicus ... A COMPREENSÃO HUMANA Compreender o outro e a si mesmo como indivíduos complexos. O individualismo é uma ameaça à espécie humana, pois afasta a pessoa dos seus semelhantes e de si, gerando sérios problemas de natureza emocional, que se revelam na qualidade dos relacionamentos. A INCERTEZA A incerteza e o inesperado fazem parte da vida, da ciência. A história da humanidade é uma possibilidade e não uma determinação da natureza. A CONDIÇÃO PLANETÁRIA A Terra precisa ser cuidada para que possamos nela continuar. A ecologia, os conflitos religiosos e políticos, as demandas (crises) econômicas e a escassez de alimento e de água revelam que precisamos zelar pela perpetuação da nossa espécie. A ANTROPOÉTICA A antropoética enfatiza que o Homem tem três aspectos: individual, social e genético. Ela só pode se manifestar na democracia, ao permitir que os indivíduos assumam, na medida do possível, a sua responsabilidade social. As ONG, que funcionam sem se prender à religião e à política, permitem que a humanidade desenvolva uma ética atenta aos imensos desafios contemporâneos. 10 MULTIMÍDIA Os sete saberes – Edgar Morin [9]. Defendo, com vigor, que a escola tem um importante papel na difusão e na vivência de novos valores humanos. Ela é, portanto, um espaço de formação, entendida não como um local que adapta, modela as pessoas, de acordo com interesses estranhos a elas, mas que possibilita que cada artesão-sujeito descubra a configuração que deseja. Finalizo este tópico com mais uma contribuição do maior educador brasileiro: (...) se a educação não pode tudo, alguma coisa fundamental a educação pode. Se a educação não é a chave das transformações sociais, não é também simplesmente reprodutora da ideologia dominante. O que quero dizer é que a educação nem é uma força imbatível a serviço da transformação da sociedade, porque assim eu queira, nem tampouco é a perpetuação do status quo porque o dominante o decrete. (FREIRE, 2009, p. 112) O compromisso político demanda uma satisfatória formação técnica, o que nos remete à seguinte indagação: “Quais são as competências que o professor precisa ter?”. É o que será abordado na próxima seção. LEITURA COMPLEMENTAR Função Social da Escola (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.). OLHANDO DE PERTO Ensinar, aprender: leitura do mundo, leitura da palavra (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.). Os sete saberes necessários à Educação do futuro (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.). 11 Didática I Aula 01: Escola, Sociedade, Trabalho Docente e Didática Tópico 03: Trabalho Docente: Características, Especificidades e Exigências do Cenário Contemporâneo VERSÃO TEXTUAL • O que significa ser professor(a)? • Quais são as características desta profissão? • Considerando as novas tecnologias de informação e comunicação, que facilitam o acesso à informação, o professor ainda é necessário no processo de aprendizagem dos estudantes? • Será que os cursos de formação têm atendido aos novos desafios? • Os professores podem atender satisfatoriamente tais crescentes mudanças? Não existe professor sem estudante e conhecimento. O trabalho docente, portanto, demanda a presença destes dois componentes (esta temática será abordada, sob diversos aspectos, reiteradas vezes durante estas aulas). O ensino é “[...] uma prática social concreta, dinâmica, multidimensional, interativa, sempre inédita e imprevisível. É um processo que sofre influências de aspectos econômicos, psicológicos, técnicos, culturais, éticos, políticos, institucionais, afetivos, estéticos.” (PASSOS, 2006b, p. 01). LEITURA COMPLEMENTAR Características do trabalho docente. (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.) Quais são os saberes que o professor precisa para desempenhar de forma satisfatória seu labor? Diversos pesquisadores têm investigado sobre este assunto e enfatizando a sua relevância “[...] para a formação, atuação e desenvolvimento dos professores.” (CUNHA, 2009). Na sua prática profissional (planejamento, implementação e avaliação), o professor precisa gerir/administrar a matéria e a sala de aula, ou seja, ele mobiliza diferentes saberes. O quadro abaixo apresenta uma síntese das categorias dos saberes docentes formuladas por alguns dos estudiosos mais conceituados sobre esse tema: Categorização dos “saberes docentes ou dos professores” 12 Tardif, Lessard e Lahaye (1991) Pimenta (1999) Gauthier et al (1998) Saviani (1996) Das disciplinas e currículos Do conhecimento Disciplinares e curriculares Específico e didático- curricular Da formação profissional Pedagógicos Das Ciências da Educação, da tradição pedagógica e da ação pedagógica Pedagógico, crítico- contextual e atitudinal Da experiência Da experiência Da experiência Descrição da Tabela: Tardif, Lessard e Lahaye (1991): Das disciplinas e curriculares - Da formação profissional - Da experiência. Pimenta (1999): Do conhecimento - Pedagógicos - Da experiência. Gauthier et AL (1998): Disciplinares e curriculares - Das Ciências da Educação, da tradição pedagógica e da ação pedagógica - Da experiência. Saviani (1996): Específico e didático-curricular - Pedagógico, crítico- contextual e atitudinal A formulação de Pimenta (1999) congrega em três amplas categorias os saberes docentes. São elas: Do conhecimento Contempla o saber disciplinar (conteúdo a ser ensinado) e o saber curricular (seleção e organização do conteúdo). Pedagógicos Refere-se às teorias da Educação, que permitem o entendimento dos processos de ensino e de aprendizagem. Da experiência Contempla as representações que orientam (princípios, crenças ...) a prática docente, as quais estão em permanente transformação, pois que se alimentam da realidade, enquanto inspiração e espaço de validação. 13 Por entender que o saber da experiência refere-se, muitas vezes, aos saberes do conhecimento e pedagógico, e que a dimensão subjetiva do pesquisador é ignorada, proponho a substituição do saber da experiência pelo saber existencial, que se refere aos sentimentos, valores, crenças e ideais docentes, osquais o (i)mobilizam na melhoria dos demais saberes. PARADA OBRIGATÓRIA Saberes Necessários à Prática do Professor (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.) A transformação da sociedade na contemporaneidade implica na redefinição da Educação, da escola e do trabalho docente. Libâneo (1998) defende a importância do professor para auxiliar o estudante a aprofundar o seu significado da cultura e da ciência. Considerando este contexto, ele apresenta as seguintes novas atitudes docentes: 1) Assumir o ensino como mediação: aprendizagem ativa o aluno com a ajuda pedagógica do professor; 2) Modificar a ideia de uma escola e de uma prática pluridisciplinares para uma escola e uma prática interdisciplinares; 3) Conhecer estratégias do ensinar a pensar, ensinar a aprender a aprender; 4) Persistir no empenho de auxiliar os alunos a buscarem uma perspectiva crítica dos conteúdos, a se habituarem a apreender as realidades enfocadas nos conteúdos escolares de forma crítico-reflexiva; 5) Assumir o trabalho de sala de aula como um processo comunicacional e desenvolver capacidade comunicativa; 6) Reconhecer o impacto das novas tecnologias da comunicação e informação na sala de aula (televisão,vídeo games, computador, internet, CD-ROM, etc); 7) Atender à diversidade cultural e respeitar as diferenças no contexto da escola e da sala de aula; 8) Investir na atualização científica, técnica e cultural, como ingredientes do processo de formação continuada; 9) Integrar no exercício da docência a dimensão afetiva; 10) Desenvolver comportamento ético e saber orientar os alunos em valores e atitudes em relação à vida, ao ambiente, às relações humanas, a si próprios (LIBÂNEO, 1998, p.28-48). 14 Zabalza (2003) apresenta as seguintes competências docentes, as quais, no seu entendimento, são imprescindíveis para quem quer atuar na escola do futuro: empática, comunicativa, cognitiva, didático- disciplinar, institucional, criativa e cidadã. É possível alguém atender a tudo isto? Diante de tantas adversidades (salário baixo, excesso de trabalho, indisciplina e violência na sala, pressão dos superiores na hierarquia, desgate físico e falta de valorização) e exigências, o docente brasileiro está, cada vez mais, doente. Este drama tem recebido a atenção de profissionais da educação e da saúde, uma vez que interfere diretamente na qualidade do trabalho docente e da sua vida pessoal. Descrição da imagem: É importante compreender a natureza deste problema, o qual tem gerado um alto custo social, seja porque, muitas vezes, faltam profissionais habilitados na sala de aula, seja porque o investimento do poder público na formação docente é desperdiçado. As políticas públicas precisam, inspiradas nos diagnósticos emanados das pesquisas sobre essa temática, atuar de forma vigorosa na reversão do cenário acima relatado, sob pena de continuarmos a assistir a diminuição da qualidade de vida (pessoal e profissional) do professor. PARADA OBRIGATÓRIA Sob pressão (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.) - O Estresse docente REFLEXÃO Qual é a contribuição da Didática na compreensão e superação dos desafios profissionais? 15 O papel da Didática na Educação (e no trabalho docente) tem se modificado ao longo da História, sendo assunto do próximo tópico. LEITURA COMPLEMENTAR Leia os seguintes artigos para saber mais sobre o trabalho docente: ◦ Desafios e possibilidades ao trabalho docente e à sua relação com a saúde (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.) ◦ Educação, cultura e desporto: concepção e desafios para o século XXI (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.) ◦ Experiência e competência no ensino (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.) ◦ Formação docente como estratégia de superação do precarizado trabalho docente (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.) ◦ Globalização e Educação: ideias para um debate (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.) ◦ Saberes docentes ou saberes dos professores? (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.) ◦ Perspectivas atuais na Educação (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.) ◦ Significado e sentido do trabalho docente (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.) ◦ Trabalho docente: características e especificidades (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.) 16 Didática I Aula 01: Escola, Sociedade, Trabalho Docente e Didática Tópico 04: Didática: aspectos históricos, perspectivas atuais e contribuição para o trabalho docente A Didática, como área de conhecimento dos cursos de formação de professores, caracteriza-se pela mudança dos seus objetos e objetivos. Fonte [10] Descrição da imagem: Retrato do Comênius, Cabelos castanhos que vão até os ombros, e barba comprida, também, castanha. Veste roupa eclesiástica preta, própria para bispo, e uma estola vermelha. [Jan Amos Komenský – Iohannes Amos Comenius] (1592-1670) - foi um bispo protestante da Igreja Morávia, educador, cientista e escritor checo. Como pedagogo, é considerado o fundador da didática moderna. 17 Em 1657, Iohannes Amos Comenius [11] – João Amos Comênio, em Português – publicou, em latim, Didactica Magna (Didática Magna – Tratado da Arte Universal de Ensinar Tudo a Todos), tida como a primeira obra no mundo ocidental voltada aos processos de ensinar e de aprender, motivo pelo qual é considerado como o pai da Didática Moderna. A proposta educacional de Comênio – ensinar tudo a todos – afrontava a concepção escolástica católica, que era voltada à elite e com currículo restrito, permeado de conteúdos abstratos. Comênio acreditava no poder da educação para aproximar o Homem de Deus, tornando-o bom cristão: sábio (erudição), crente (religião) e generoso (virtude). No entendimento desse pensador, o cotidiano escolar deveria se inspirar no ritmo da natureza, contemplando todas as áreas do conhecimento e valorizando as situações do cotidiano, além de atender às necessidades e aos interesses de professor e estudantes. Por acreditar que tudo o que se deveria saber necessitaria ser ensinado, Comênio defendia que o professor, durante o ensino, deveria: Gravura do próprio Comênio para um de seus livros de texto: aprender brincando [12] Descrição da Imagem: Gravura feita pelo próprio Comênio para um de seus livros. A gravura traz várais crianças se divertindo num espaço ao ar livre e cercado. Elas são observadas por um adulto enquanto brincam. i) ser claro e direto; ii) utilizar aplicações práticas para facilitar o processo de aprendizagem; iii) enfatizar as origens desse conteúdo; iv) explicar, inicialmente, os princípios gerais; 18 v) respeitar o tempo adequado para fazê-lo. A Didática Magna contém as características principais da escola moderna: o entendimento da infância como momento único; a influência da relação família-escola no desenvolvimento do estudante; a necessidade de uma metodologia de ensino (tendo ele proposto a instrução simultânea); e o educador como uma pessoa preparada para tal ofício. Introdução da Didática Magna, de Comênio TRATADO DA ARTE UNIVERSAL DE ENSINAR TUDO A TODOS Processo seguro e excelente de instituir, em todas as comunidades de qualquer Reino cristão, cidades e aldeias, escolas tais que toda a juventude de um e de outro sexo, sem excetuar ninguém em siveiarte alguma, possa ser formada nos estudos, educada nos bons costumes, impregnada de piedade, e, desta maneira, possa ser, nos anos da puberdade, instruída em tudo o que diz respeito à vida presente e à futura, com economia de tempo e de fadiga, com agrado e com solidez. Onde os fundamentos de todas as coisas que se aconselham são tirados da própria natureza das coisas; a sua verdade é demonstrada com exemplos paralelos das artes mecânicas; o cursodos estudos é distribuído por anos, meses, dias e horas; e, enfim, é indicado um caminho fácil e seguro de pôr estas coisas em prática com bom resultado. A proa e a popa da nossa Didática será investigar e descobrir o método segundo o qual os professores ensinem menos e os estudantes aprendam mais; nas escolas, haja menos barulho, menos enfado, menos trabalho inútil, e, ao contrário, haja mais recolhimento, mais atrativo e mais sólido progresso; na Cristandade, haja menos trevas, menos confusão, menos dissídios, e mais luz, mais ordem, mais paz e mais tranqüilidade. Fonte: Comenius (2001) A cronologia, a seguir apresentada, não é consenso entre os estudiosos, mas permite compreender a trajetória percorrida na estruturação da Didática no Brasil. Destacam-se, na versão escolhida, quatro momentos: Primeiro Momento Começa com a sua implantação em 1939, como curso e disciplina, e termina no começo dos anos 50. Ela se caracteriza, inicialmente, pela dificuldade de se definir e delimitar seu objeto e conteúdo e pela influência da Escola Nova, que enfatizou conteúdos técnicos e metodológicos. Segundo Momento 19 Da década de 1950 até meados dos anos 70, a Didática aprofunda a dimensão técnica-metodológica, priorizando o caráter normativo/prescritivo, sob o manto da neutralidade científica, e afastando-se da reflexão quanto aos determinantes e objetivos sociopolíticos da Educação. Oliveira e André (1997, p. 8) caracterizam este momento como “(...) o da construção da Didática na perspectiva do liberalismo”. Terceiro Momento Situado entre a segunda metade da década de 1970 e a primeira metade da década seguinte, que tem como marco fundante o I Seminário “A Didática em Questão” (1982), vê brotar críticas e denúncias à Didática Tecnicista – que mascarava o caráter reprodutivista da escola – redundando em movimentos antagônicos: negação e reconstrução da área. No que se refere à última perspectiva, diversos encontros nacionais propiciaram o aporte teórico e prático necessário para redefini-la, ao promover o intercâmbio de pesquisas e experiências pedagógicas de intelectuais e professores. Quarto Momento Inicia-se na segunda metade da década de 1980 e chega até a atualidade, expressa o esforço dos especialistas da área para articular o saber didático às questões metodológicas, epistemológicas e ideológicas, compreendendo o ensino como prática social concreta. Neste sentido, o ensino precisa ser analisado nas suas múltiplas dimensões, evitando os reducionismos das fases anteriores, o que significa dizer que a Educação deve ser contextualizada nos seus aspectos sociais, históricos, políticos e culturais, levando à compreensão dos pressupostos que inspiram as práticas pedagógicas e articulam teoria e prática. Esse breve relato permite perceber os avanços que ocorreram na área no que se refere às críticas e aos esforços de superá-las, que se expressa na reconfiguração da área, atenta às exigências e aos desafios contemporâneos. LEITURA COMPLEMENTA Leia o trecho extraído de Passos (2006a). A didática no contexto atual (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.) A Educação é um fenômeno social que pode ser vivenciado com graus diferentes de formalidade: formal, não formal e informal. Formal Ministrada por instituições – colégios, escolas, faculdades, institutos, universidades públicas e privadas, destinadas à Educação Básica e à Educação Superior. Não formal 20 Ministrada por instituições – empresas, escolas profissionalizantes, ONGs – com caráter complementar e suplementar em relação à educação formal. Informal Ministrada no cotidiano, num processo contínuo, assistemático e não organizado. A Pedagogia é a Ciência que busca descrever e compreender a Educação, as teorias e as práticas educativas, com o intuito de melhorá-las. A Didática, por sua vez, é uma disciplina pedagógica voltada ao processo de ensino, o que implica investigar, também, o processo de aprendizagem. A ação educativa contempla aspectos cognitivos, afetivos, éticos, políticos, dentre outros. Na próxima aula, estudaremos sobre a crise educacional. LEITURA COMPLEMENTAR Didactica Magna (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.). OLHANDO DE PERTO O habitus professoral: o objeto dos estudos sobre o ato de ensinar na sala de aula. (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.) A Trajetória Histórica da Didática (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.). ATIVIDADE DE PORTFÓLIO Entreviste dois agentes pedagógicos: um docente e um discente, conforme orientações no roteiro. (Clique aqui para seguir roteiro da atividade) (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.). Após entrevistas e considerando as leituras e as reflexões realizadas na aula 01, redija o que você aprendeu com essa atividade. Coloque a sua produção no seu Portfólio. FÓRUM Comente com seus colegas e com seu(sua) tutor(a) a relação entre Didática e o texto “Os sete saberes necessários à educação do futuro (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.)", de Edgar Morin. Para o autor, esses saberes relacionam-se aos “setes buracos negros da educação”, que são completamente ignorados, subestimados ou fragmentados nos programas educativos. Fontes das Imagens 21 1 - https://media.giphy.com/media/CH4ejLIpCfwly/giphy.gif 2 - http://www.ufrgs.br/ufrgs/noticias/jornadas-na-faced-debatem-o-pensamento-de-paulo-freire 3 - https://brasilescola.uol.com.br/biografia/paulo-freire.htm 4 - https://www.infoescola.com/pedagogia/metodo-paulo-freire/ 5 - http://www.youtube.com/watch?v=c0qEP5cIp_o 6 - http://www.youtube.com/watch?v=qxnNKNPeWFM 7 - http://blogorlandeli.zip.net/images/charge24x11x07.jpg 8 - http://4.bp.blogspot.com/_NGfADw-06_Q/Rx_RtOhqcTI/AAAAAAAAAHc/f7lNjvtLrVY/s400/falamestre.jpg 9 - http://www.youtube.com/watch?v=C0RyOmLZ4aE 10 - http://comenius-projekte.eu/johann-amos-comenius-2/ 11 - https://www.infoescola.com/biografias/jan-amos-comenius/ 12 - http://3.bp.blogspot.com/-7LDxr4WioEk/T831QrVytdI/AAAAAAAAAXk/465lFPA8qyY/s1600/brincar.jpg 22 Didática I Aula 02: Educação: crise de paradigmas Tópico 01: Contextualizando a crise educacional Neste esforço de compreender a crise educacional, é necessário que sejam investigadas as relações entre as pessoas, notadamente a relação professor-estudante. O Homem é um ser complexo, que tem várias dimensões – física, emocional, espiritual, cognitiva, ... – as quais precisam ser consideradas. Neste tópico, enfatizaremos a dimensão cognitiva, que é a mais facilmente percebida na Educação. No próximo, contemplaremos os aspectos emocionais e físicos, os quais, infelizmente, na grande maioria das vezes, não recebem a devida atenção. INSTITUTO UNIVERSIDADE VIRTUAL Descrição da Imagem: Imagem ilustrativa de uma criança sentada de costas pra lousa, cabisbaixa, na lousa está escrito a palavra educação, no entanto a palavra está escrita ao contrário. ESCOLA E SOFRIMENTO - DE RUBEM ALVES (1994) Estou com medo de que as crianças me chamem de mentiroso... Pois eu disse que o negócio dos professores é ensinar a felicidade. Acontece que eu não conheço nenhuma criança que concorde com isto. Se elas já tivessem aprendido as lições da política, me acusariam de porta voz da classe dominante. Pois, como todos sabem, mas ninguém tem coragem de dizer, toda escola tem uma classe dominante e uma classe dominada: a primeira, formada por professores e administradores, e que detém o monopólio do saber, e a segunda, formada pelos alunos, que detém o monopólio da ignorância, e que deve submeter o seu comportamento e o seu pensamento aos seus superiores, se desejam passar de ano. Basta contemplar os olhos amedrontados das crianças e os seus rostos cheios de ansiedade para compreender que a escola lhes traz sofrimento. O meu palpite é que, se fizer uma pesquisa entre as crianças e os adolescentes sobre as suas experiênciasde alegria na escola, eles terão muito que falar sobre a amizade e o companheirismo entre eles, mas pouquíssimas serão as referências à alegria de estudar, compreender e aprender. 23 A classe dominante argumentará que o testemunho dos alunos não deve ser levado em consideração. Eles não sabem, ainda… Quem sabe são os professores e os administradores. Acontece que as crianças não estão sozinhas neste julgamento. Eu mesmo só me lembro com alegria de dois professores dos meus tempos de grupo, ginásio e científico. A primeira, uma gorda e maternal senhora, professora do curso de admissão, tratava-nos a todos como filhos. Com ela era como se todos fôssemos uma grande família. O outro, professor de Literatura, foi a primeira pessoa a me introduzir nas delícias da leitura. Ele falava sobre os grandes clássicos com tal amor que deles nunca pude me esquecer. Quanto aos outros, a minha impressão era a de que nos consideravam como inimigos a serem confundidos e torturados por um saber cujas finalidade e utilidade nunca se deram ao trabalho de nos explicar. Compreende-se, portanto, que entre as nossas maiores alegrias estava a notícia de que o professor estava doente e não poderia dar a aula. E até mesmo uma dor de barriga ou um resfriado era motivo de alegria, quando a doença nos dava uma desculpa aceitável para não ir à escola. Não me espanto, portanto, que tenha aprendido tão pouco na escola. O que aprendi foi fora dela e contra ela. Jorge Luís Borges passou por experiência semelhante. Declarou que estudou a vida inteira, menos nos anos em que esteve na escola. Era, de fato, difícil amar as disciplinas representadas por rostos e vozes que não queriam ser amados. Esta situação, ao que parece, tem sido a norma, tanto que e assim que aparece frequentemente relatada na literatura. Romain Rolland conta a experiência de um aluno: … afinal de contas, não entender nada já é um hábito. Três quartas partes do que se diz e do que me fazem escrever na escola: a gramática, ciências, a moral e mais um terço das palavras que leio, que me ditam, que eu mesmo emprego – eu não sei o que elas querem dizer. Já observei que em minhas redações as que eu menos compreendo são as que levam mais chances de ser classificadas em primeiro lugar. Mas nem precisaríamos ler Romain Rolland: bastaria ler os textos que os nossos filhos têm de ler e aprender. Concordo com Paul Goodmann na sua afirmação de que a maioria dos estudantes nos colégios e universidades não desejam estar lá. Estão lá porque são obrigados. Os métodos clássicos de tortura escolar como a palmatória e a vara já foram abolidos. Mas poderá haver sofrimento maior para uma criança ou um adolescente que ser forçado a mover-se numa floresta de informações que ele não consegue compreender, e que nenhuma relação parecem ter com sua vida? Compreende-se que, com o passar do tempo a inteligência se encolha por medo e horror diante dos desafios intelectuais., e que o aluno passe a se considerar como um burro. Quando a verdade é outra: a sua inteligência foi intimidada pelos professores e, por isto, ficou paralisada. Os técnicos em educação desenvolveram métodos de avaliar a aprendizagem e, a partir dos seus resultados, classificam os alunos. Mas ninguém jamais pensou em avaliar a alegria dos estudantes – mesmo porque não há métodos objetivos para tal. Porque a alegria é uma condição interior, uma experiência de riqueza e de liberdade de pensamentos e sentimentos. A educação, fascinada pelo conhecimento do mundo, esqueceu-se de que sua vocação é despertar o potencial único que jaz adormecido em cada estudante. Daí o paradoxo com que sempre nos defrontamos: quanto maior o conhecimento, menor a sabedoria. T. S. Eliot fazia esta terrível pergunta, que deveria ser motivo de meditação para todos os professores: “Onde está a sabedoria que perdemos no conhecimento?” Vai aqui este pedido aos professores, pedido de alguém que sofre ao ver o rosto aflito das crianças, dos adolescentes: lembrem-se de que vocês são pastores da alegria, e que a sua 24 responsabilidade primeira é definida por um rosto que lhes faz um pedido: “Por favor, me ajude a ser feliz…”. Rubem Alves Blog não oficial [1] - Coletânea de textos desse grande Educador Conforme foi visto na aula anterior, diversas concepções de aprendizagem têm desfilado nos palcos escolares nos últimos séculos. Nesta seção, é reafirmado o fato de que elas expressam uma compreensão de como o Homem produz e socializa o conhecimento, ou seja, de uma epistemologia. Essas teorias costumam discordar quanto ao papel que o sujeito e o objeto desempenham na produção de conhecimento, entendendo aquele como o que conhece e esse como o que se quer conhecer. Defendo a posição em que o saber é significativo para cada pessoa e não uma peça decorativa (no duplo sentido), descartável, uma vez que pode ser rapidamente substituída por outra que seja mais atraente. Conforme Bruner (2001, p. 15/19), são duas as concepções sobre o funcionamento da mente: o "computacionalismo" e o culturalismo. O “computacionalismo” O “Computacionalismo” defende o argumento de que o Homem processa informações, como se fosse um computador, uma vez que elas estão dispostas num código linguístico compreensível para aquele. A missão do professor é fornecer aos alunos dados para que esses executem os comandos cerebrais pertinentes e possam aprender. O culturalismo O culturalismo evidencia a capacidade que o Homem tem de simbolizar e interpretar, uma vez que ele pertence a uma comunidade que produz cultura. Dessa forma, a aprendizagem e o pensamento não são processos mecânicos, idênticos para todas as pessoas, mas constituem atividades peculiares, diretamente vinculadas ao desenvolvimento de cada uma delas num contexto particular, motivo pelo qual os significados de um mesmo objeto/acontecimento podem (e costumam) ser diversos para vários indivíduos. 25 Descrição da imagem: Enquanto o “computacionalismo” se baseia no processamento de informações, privilegiando a explicação, o culturalismo defende a produção de significado, destacando a interpretação. A visão da mente humana como uma máquina não é nova na História da Humanidade. Capra (2001, p. 66/68) relata que a ciência cognitiva, no seu início, defendeu a noção de que a inteligência humana poderia ser entendida como um processador de informações. Tal atitude, envolta num amplo entusiasmo de membros da academia e do público em geral, pode ser comparada com a ideia, lançada no século XVII por Descartes, de que o funcionamento do corpo humano se assemelhava ao do relógio. A utilização de termos tipicamente humanos (memória, linguagem, ...) reforçou a concepção cartesiana de que o Homem é uma máquina, embora tal crença tenha se revelado recentemente uma falácia, pois a inteligência da máquina (a “artificial”) é totalmente diversa da humana, uma vez que o: (...) sistema nervoso humano não processa nenhuma informação (no sentido de elementos separados que existem já prontos no mundo exterior, a serem apreendidos pelo sistema cognitivo), mas interage com o meio ambiente modulando continuamente sua estrutura. Além disso, os neurocientistas descobriram fortes evidências de que a inteligência humana, a memória humana e as decisões humanas nunca são completamente racionais, mas sempre se manifestam coloridas por emoções, como todos sabemos a partir da experiência. Nosso pensamento é sempre acompanhando por sensações e por processos somáticos. Mesmo que, com frequência, tendamos a suprimir estes últimos, sempre pensamos também como o nosso corpo; e uma vez que os computadores não têm um tal corpo, problemas verdadeiramente humanos sempre serão estrangeiros à inteligência deles. (CAPRA, 2001, p. 68). Piaget também pesquisou o desenvolvimento moral da criança e concluiu que o julgamento moral expressa a consciência que a criança tem do mundo social. Dessa forma, as experiênciaspor ela vivenciadas permitem avançar nos estádios descritos por ele: i. Pré-moral (desconhecimento de regras); ii. Moralidade heterônoma (os deveres e os valores são seguidos fielmente); iii. Semiautonomia (início da relativização de ordens e de regras); e iv. Moralidade autônoma (baseada na reciprocidade). A importância dessa concepção de moralidade infantil é a recusa de entendê-la como um processo maturacional, pois enaltece as interações que o sujeito estabelece com o meio ambiente. A excessiva valorização das consequências das ações é, progressivamente, substituída pelas intenções dos sujeitos, as quais passam a ser entendidas dentro de um sistema valorativo, possibilitando que as regras e as exigências sociais sejam relativizadas, hajam vistas as especificidades individuais, num interminável diálogo. 26 A partir dessas contribuições piagetianas, os papéis do aluno e do professor transformam-se radicalmente: para elaborar o conhecimento, aquele deve confrontar os seus saberes com a realidade, considerar as informações dos colegas, de modo a formular explicações mais consistentes. Agindo assim, ele abandonará a enfadonha tarefa de guardar (por pouco tempo) conteúdos amorfos e assumirá, cada vez mais, a responsabilidade pela sua vida, que congrega bem mais do que a área cognitiva, num processo interminável de equilibração. Nessa perspectiva, o professor tem grande influência na dinâmica da sala, nas interações, motivo pelo qual ele deve abandonar a atitude de conferencista, de divulgador de um conhecimento que só ele detém, e propor problemas e desafios aos seus pupilos. Para que isso ocorra, ele precisa investigar o contexto social em que o alunado vive, permitindo que esse atinja níveis mais complexos de entendimento da dinâmica social, permeada que é, no caso do Brasil, por inúmeras contradições e injustiças, as quais não são acontecimentos naturais, mas acontecimentos históricos, sendo passíveis de transformação. De um modo geral, os estudos de Piaget permitiram melhor compreensão do universo infantil, das suas capacidades, limitações e necessidades. Pesquisas posteriores relevam que as suas ideias quanto à capacidade de realização das crianças pré-escolares e ao egocentrismo não são totalmente verdadeiras. Isso não tira o mérito do esforço empreendido por ele, mas mostram a transitoriedade do conhecimento, que se torna cada vez mais depurado, com a formulação de mais teorias (acomodação). PARA DOLL JR. (1997, P. 80), OS ESTUDOS DE JEAN PIAGET SÃO A alternativa de explicação para o desenvolvimento humano em substituição à Física newtoniana, uma vez que o modelo aberto, por ele apresentado, privilegia as relações que os seres humanos estabelecem como o seu meio, enaltecendo a noção de que o valor que as partes têm só pode ser entendido no sistema como um todo, e não mediante o isolamento entre aquelas. Suas investigações, forjadas numa perspectiva da Biologia, objetivavam desvendar a interação das pressões que o meio ambiente situa sobre o organismo e a reação por este apresentada a essas pressões. Rejeitou a explicação lamarckiana (as respostas formuladas pelos indivíduos às pressões do meio ambiente são herdadas) e a darwiniana (que entendia as pressões ambientais como suscitando respostas aleatórias, com a sobrevivência do mais adaptado), pois, para ele, a primeira era mecanicista e a segunda não tinha objetivo. Segundo Doll Jr. (1997, p. 96/97), a epistemologia proposta por Piaget é o “terceiro caminho”, que privilegia a “interação entre o organismo e seu meio ambiente” ressaltando “a maneira pela qual o organismo busca ativamente responder ao meio ambiente e ao mesmo tempo resiste a qualquer pressão para mudar seus próprios padrões”. O equilíbrio nunca é plenamente alcançado, haja vista que os estímulos do meio levam o organismo a reformular as suas estruturas. Porém, “o meio ambiente não molda o organismo; os organismos moldam a si mesmos”, não sendo, dessa forma, passivos, como se costumava pensar, mas dotados de uma capacidade de reagir positivamente às pressões ambientais. 27 Antes de finalizar essa reflexão sobre as contribuições do construtivismo para a Educação, saliento a discussão que ele fomentou sobre o erro, notadamente no ambiente escolar, o qual só se revela como tal quando o sujeito é capaz de confrontar o seu conhecimento com o de outras pessoas, seja de forma verbal ou escrita. Assim, ele é uma etapa natural na elaboração do conhecimento, não devendo ser motivo de culpa, vergonha ou complexo de inferioridade. Conforme o referencial piagetiano, o erro pode ser compreendido como construtivo e como não construtivo. Essa diferença na natureza do erro demanda atitudes distintas do professor, motivo pelo qual devem ser refutadas atitudes demasiadamente permissivas em relação aos erros cometidos pelos alunos, notadamente quando esses forem do tipo não construtivo. CONSTRUTIVO (indica uma complexificação nas estruturas mentais do sujeito). NÃO CONSTRUTIVO (revela que não houve mudança nas estruturas mentais do sujeito). As novas gerações têm o direito de desfrutar momentos de aprendizagem inspirados numa nova lógica de saber, dando-lhes a oportunidade de experimentar, descobrir, errar, melhorar e aprender com os próprios equívocos, incrementando a autoimagem e a autoestima. A degustação de todas as formas de conhecimento permitirá que elas compreendam que o saber é histórico, pois que resulta da jornada da Humanidade na Terra, sendo, portanto, passível de transformação, de melhoria. Os postulados sociointeracionistas ratificam o fato de que, para que a realidade educacional seja transformada, as práticas pedagógicas precisam considerar os processos intra e interpessoal que caracterizam a significação do saber, a qual nunca se encerra, haja vista que: VERSÃO TEXTUAL “É na inconclusão do ser, que se sabe como tal, que se funda a educação como processo permanente. Mulheres e homens se tornaram educáveis na medida que se reconheceram inacabados” (FREIRE, 1997, p. 64). Os atos de aprender e ensinar, portanto, são atividades que caracterizam o existir humano, não sendo exclusividade do ambiente escolar, uma vez que ele é apenas um dos locais onde isso é possível de 28 acontecer. O que deveria ser peculiar desse espaço é a possibilidade de que os sujeitos estabelecessem vínculos muito mais intensos, permitindo que aqueles, por meio de uma compreensão do mundo mais intensa (pois fruto de um processo deliberado), fossem preparados para participar mais ativamente do mundo. A escola precisa, portanto, considerar o cotidiano, as experiências dos seus sujeitos, professor e alunos, de modo que o saber os ajude a decifrar as complexas ligações entre os acontecimentos. Esse desafio, embora seja coletivo, precisa ser vivenciado pelas pessoas, pois ela necessita decifrar, interpretar o mundo. A experiência implica a capacidade de aprender a partir da própria vivência. Experienciar é aprender; significa atuar sobre o dado e criar a partir dele. O dado não pode ser conhecido em sua essência. O que pode ser conhecido é uma realidade que é constructo da experiência, uma criação de sentimento e pensamento. (TUAN, 1983, p. 10). Diante do exposto, é necessário que as relações entre os agentes pedagógicos sejam pautadas no respeito mútuo, condição indispensável para se estabelecer um diálogo, que substitua o monólogo que, acredito, impera na grande maioria das salas de aula. Nessa perspectiva, a oitiva é tão importante quanto a fala, devendo aquela preceder essa, sob pena de se produzir um monólogo estéril, inócuo. O ato de ensinar anda de mãos dadas com o de aprender, aquele não está na frente desse, não o precede, mas se alimentam mutuamente. Essa também é a opinião de Freire (1997, p. 128): “Somente quem escuta paciente e criticamente o outro, fala com ele, mesmo que, em certas condições, precise de falar a ele. Oque jamais faz quem aprende a escutar para poder falar com é falar impositivamente”. Reconheço que a ausência do diálogo não é privilégio da escola, mas nela os resultados são ainda mais catastróficos, considerando que a mensagem subliminarmente difundida é a de que o conhecimento é algo inútil e chato, que não tem nenhuma relação com a vida, com a realidade, seja a dos alunos, seja a dos professores; mas, será que é possível sonhar com algo distinto? Vislumbro um cenário em que professor e alunos assumam os papéis de flor e abelha, onde o conhecimento é o mel, tal como imaginado por Gibran (1970, p. 69): (...) o prazer da flor é entregar o mel à abelha. Pois, para a abelha, uma flor é uma fonte de vida. E para a flor, uma abelha é mensageira de amor. E para ambas, a abelha e a flor, dar e receber o prazer é uma necessidade e um êxtase. Kenski (2000, p. 137) ressalta o fato de que, numa prática apoiada nos ideais de Vygotsky, “o poder da fala do professor é substituído pela interação, pela troca de conhecimentos e pela colaboração grupal a fim de se garantir a aprendizagem”, fortalecendo, dessa forma, o diálogo e as trocas de informações. Assim, na perspectiva do sociointeracionismo, “As aprendizagens, o desenvolvimento do pensamento lógico e científico, realizam-se através da interação comunicativa, o que possibilita a construção social do conhecimento”. 29 Descrição da imagem: Para se compreender a natureza das críticas ordinariamente enunciadas sobre o construtivismo, é necessário esclarecer que ele não é uma teoria educacional, como muitos estão habituados a pensar e propagar, mas uma teoria do conhecimento. Acredito que a grande dificuldade de se entender o potencial transformador do ideário construtivista reside no fato de que ele propõe uma forma radicalmente diferente de se explicar como o Homem aprende. As pessoas que buscam receitas para ensinar, que podem ser seguidas por qualquer indivíduo e em qualquer contexto social, acreditam que a mente é um processador de informações, motivo pelo qual o conhecimento pode e deve ser transmitido, de forma clara e precisa, pelo professor aos alunos. Ora, não bastasse o fato de que o construtivismo não é uma pedagogia, pois afigura-se como uma epistemologia, ele fomenta o desenvolvimento de uma teoria da aprendizagem (e do ensino) que valoriza a interpretação, a produção de significados, o que só se efetiva quando o sujeito confronta a sua realidade (social, emocional, cognitiva, ...) com a produção cultural a que tem acesso por via das mais variadas formas. O construtivismo, portanto, é um golpe no “computacionalismo”, que acredita no poder do professor de explicar, e uma aposta no culturalismo, que crê na capacidade do aluno de produzir sentido. Não somente no Brasil, mas também no mundo, de um modo geral, a teoria do conhecimento que predomina nas salas de aula e dos professores, bem como nos gabinetes dos diretores e dos gestores, é o “computacionalismo”, expresso no intento de massificar, de produzir em série, de apresentar a solução para a maior quantidade de pessoas possível. É por isso que a crença de que o construtivismo seria a solução da Educação no contexto nacional se revelou um grande fiasco. 30 A culpa, todavia, não está na explicação apresentada pela teoria construtivista, mas no nefasto uso e na distorção que dela fizeram, objetivando atingir objetivos distintos, e até mesmo contraditórios, dos que ela formula. Da mesma forma, o responsável por esse fracasso não é o professor, que seria incapaz de compreender e pôr em prática os seus fundamentos, mas de uma proposta educacional que acredita que ele tem o poder de sozinho resolver todos os problemas, de naturezas diversas, que afligem os seus alunos. O culturalismo demanda uma organização do trabalho escolar bastante diversa da que costuma caracterizar o cotidiano no Brasil. A autonomia do professor e do aluno não deve ser entendida como um isolamento do sujeito da sua realidade, mas exatamente o contrário. Somente um indivíduo que experimenta o prazer de descobrir(-se) pode contribuir e facilitar para que outras pessoas também tenham o privilégio de o desfrutarem. Individualidade não é sinônimo de individualismo, uma vez que a vocação ontológica do Homem é se encontrar (e perder-se) no e com o outro, numa perspectiva de união e não de isolamento. A relação do professor com o aluno é apenas uma das possibilidades de encontro que toda pessoa tem com seu ambiente (social/cultural e natural), o qual foi poeticamente descrita por Freire (1997, p. 151/152) assim: Estar disponível é estar sensível aos chamamentos que nos chegam, aos sinais mais diversos que nos apelam, ao canto do pássaro, à chuva que cai ou que se anuncia na nuvem escura, ao riso manso da inocência, à cara carrancuda da desaprovação, aos braços que se abrem para acolher ou ao corpo que se fecha na recusa. É na minha disponibilidade permanente à vida a que me entrego de corpo inteiro, pensar crítico, emoção, curiosidade, desejo, que vou aprendendo a ser eu mesmo em minha relação com o contrário de mim. E quanto mais me dou à experiência de lidar sem medo, sem preconceito, com as diferenças, tanto melhor me conheço e construo meu perfil. O professor, portanto, deve viver a sua autonomia (entendida por mim como sempre inconclusa, merecedora, assim, de cuidado e dedicação ininterruptos) para que ele proponha atividades que contribuam e favoreçam o desenvolvimento da autonomia pelo corpo discente. Para tanto, é necessário que o ambiente e o material pedagógicos sejam ricos e diversos, possibilitando a exploração, pelos sujeitos, de opções, com incremento da respectiva flexibilidade, respeitando a diversidade que caracteriza o mundo, com a formulação de explicações que contemplem a complexidade da dinâmica da vida, e rejeitando aquelas que, deliberadamente ou não, a negam. O construtivismo, como teoria do conhecimento, favorece o desabrochar de uma ética nas relações humanas pautada na igualdade e na diversidade, as quais não podem ser entendidas como antagônicas, mas complementares. Afinal, a igualdade reside no fato de que se trata de seres humanos, enquanto a diversidade de cada qual ressalta a peculiaridade do que cada um viveu, vive e viverá. Professor e alunos não são, portanto, oponentes, mas companheiros de uma mesma aventura, cada um procurando desempenhar seu papel da melhor forma possível, confiando e acreditando na lealdade de que está ao seu lado (ou na sua frente... ou, ainda, atrás!). O fato de a autoria da aprendizagem ser individual, em virtude de a constituição de signos ser feita por pessoa, não significa, de forma alguma, que ela é desligada das relações sociais. Considerando a reflexão desenvolvida sobre o construtivismo, se é verdade que o professor não pode ensinar, em virtude da singularidade da forma com que o Homem aprende, isso não significa que ele não tem um papel de destaque na sala de aula. Muito pelo contrário! Sua importância é ainda mais enaltecida: 31 ele é convidado a assumir a individualidade, a expor sua sensibilidade, a estabelecer vínculos afetivos com os seus alunos, sendo a cultura e o conhecimento pretextos para que isso ocorra. O erro do aluno, nesse cenário, não é visto como catástrofe, uma vez que ele nos lembra haver sempre algo a ser aprendido, requerendo que o professor, com a sua gama de conhecimento e sensibilidade, o interprete e formule oportunidades e desafios para o estudante, continuamente, reelaborar a sua resposta. Acredito que tal atitude não deve ocorrer apenas quando acontecer um erro. Tendo em vista a crescente quantidade de saberes e a impossibilidade de dominá-la, mesmo que precariamente, como devem ser a Educação, o ensino-aprendizagem e a relação professor-aluno? Diante de tantas informações, não há como se absorver, intuir um conhecimento geral, um saber daquilo que o ser humano supostamente deveriaestar ciente. Não me iludo mais com isso. A única forma de se criar um conhecimento geral, um conhecimento inteiro, é dentro de cada pessoa, e só essa pessoa sabe quais são as informações necessárias para que ela mesma seja inteira. Isso não significa isolamento. Continuaremos nos influenciando uns aos outros, permanecemos inspirando uns aos outros, porém não devemos querer o controle sobre o outro, mas apenas deixar disponíveis para o outro as informações que temos, e que o outro siga o próprio caminho. (LOUREIRO JR, 1996, p. 44). À luz das reflexões apresentadas, destaca-se o fato de que o Homem é um ser que necessita do encontro para se realizar como tal, não significando isso que os desentendimentos, as contradições sejam uma negação do processo. Enquanto há vida, ele está aprendendo, ampliando a sua capacidade de interpretar, de criar significados do mundo. O ponto de chegada nunca é definitivo, constitui-se apenas numa temporária escala para outras viagens, descobertas e aventuras. O desconhecido está sempre à sua frente, instigando-o a prosseguir, a avançar, demandando que cada pessoa seja movida pela fé, pela esperança e não pela certeza, a qual se revela inócua e incompatível com a dinâmica da natureza. A excessiva valorização da Ciência fez com que se acreditasse que o conhecimento permite o controle do mundo. Essa pretensão é motivo de muito sofrimento e de empobrecimento para o Homem, pois grandes são as suas frustrações (quando ele percebe, na maioria das vezes, que algo não saiu como ele desejava e queria que acontecesse) e pequenas e efêmeras são as suas alegrias (porque ele não está apto a dançar ao ritmo da melodia do universo e de se deliciar com os seus mistérios). A não permanência não é a exceção, ela é a regra da vida. Essa verdade requer que o Homem assuma o seu caráter finito e incompleto, o que não é nenhum demérito, nem motivo de sofrimento, mas a condição necessária para sempre crescer, aprender e usufruir das maravilhas que irrompem, a todo o momento, ao seu redor e no seu interior. Para desenvolver o seu Eu, cada indivíduo precisa do outro, do não eu, para formar um par e deslizar nos palcos do Planeta azul. Postulo a ideia de que a escola possibilite às pessoas aprenderem a valorizar o outro, a se alegrarem com o encontro, que sempre permite aprender algo. Afinal, descobrir a cultura ou o outro é, de certa forma, desvendar a si mesmo. Relação pessoal de homem para homem – no diálogo, no respeito e consideração, na confiança e no amor – não é mais, em sentido próprio, uma relação de sujeito e objeto, mas uma relação de sujeito para sujeito, de eu e tu. Daí que resultam estruturas e categorias completamente diferentes das que se encontram num esquema rígido de sujeito e objeto, dado que não se antepõe a mim uma coisa objetivamente apreensível e disponível, mas uma essência pessoal da mesma qualidade e mesmo valor que eu, que se abre ou se fecha livremente e que só posso ‘compreender’ na aceitação cheia de fé e confiança de sua livre autoabertura. (CORETH, 1973, p. 99). 32 Acredito que as ideias de Moreno e a concepção de conhecimento na Teoria de Santiago (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.) enriqueçam e aprofundam os estudos sobre a construção do conhecimento, motivo pelo qual os professores devem conhecê-la. A escola, conforme as considerações aqui delineadas, constitui-se num espaço de encontros entre pessoas com valores, crenças, sonhos e experiências diferentes. É importante que professores e estudantes aprendam a conviver com a diversidade, uma vez que a sociedade é ainda mais plural. É sobre isto que estudaremos nos próximos dois tópicos. DICA “Ser” aluno: o segredo do “ser” professor (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.). PARADA OBRIGATÓRIA O processo ensino-aprendizagem e o papel do professor como gestor do pensar (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.). 33 Didática I Aula 02: Educação: crise de paradigmas Tópico 02: (Des)encontros na Escola e Na Sala de Aula: Ética, Diálogo e Violência - I A crise educacional tem um componente afetivo, que se explicita nos crescentes conflitos entre os agentes pedagógicos, que têm como característica comum a falta de respeito. VERSÃO TEXTUAL • O que é necessário para se estabelecer o diálogo? • Por que será que as pessoas se agridem cada vez mais? • A escola pode fazer algo para diminuir a violência? NA ESCOLA – CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE Democrata é Dona Amarílis, professora na escola pública de uma rua que não vou contar, e mesmo nome de Dona Amarílis é inventado, mas o caso aconteceu. Ela se virou para os alunos, no começo da aula, e falou assim: ― Hoje eu preciso que vocês resolvam uma coisa muito importante. Pode ser? ― Pode – a garotada respondeu em coro. ― Muito bem. Será uma espécie de plebiscito. A palavra é complicada, mas a coisa é simples. Cada um dá sua opinião, a gente soma as opiniões e a maioria é que decide. Na hora de dar opinião, não falem todos de uma vez só, porque senão vai ser muito difícil eu saber o que é que cada um pensa. Está bem? ― Está – respondeu o coro, interessadíssimo. ― Ótimo. Então, vamos ao assunto. Surgiu um movimento para as professoras poderem usar calça comprida nas escolas. O governo disse que deixa, a diretora também, mas no meu caso eu não quero decidir por mim. O que se faz na sala deve ser de acordo com os alunos. Para todos ficarem satisfeitos e um não dizer que não gostou. Assim, não tem problema. Bem, vou começar pelo Renato Carlos. Renato Carlos, você acha que sua professora deve ou não usar calça comprida na escola? ― Acho que não deve – respondeu, baixando os olhos. ― Por quê? ― Porque é melhor não usar. ― E por que é melhor não usar? ― Porque minissaia é muito mais bacana. 34 ― Perfeito. Um voto contra. Marilena, me faz um favor, anote aí no seu caderno os votos contra. E você, Leonardo, por obséquio, anote os votos a favor, se houver. Agora quem vai responder á Inesita. ― Claro que deve, professora. Lá fora a senhora usa, por que vai deixar de usar aqui dentro? ― Mas aqui dentro é outro lugar. ― É a mesma coisa. A senhora tem uma roxo-cardeal que eu vi outro dia na rua, aquela é barbara. ― Um a favor. E você, Aparecida? ― Posso ser sincera, professora. ― Pode, não. Deve ― Eu, se fosse a senhora, não usava. ― Por quê? ― O quadril, sabe? Fica meio saliente... ― Obrigada, Aparecida. Você anotou, Marilena? Agora você, Edmundo. ― Eu acho que Aparecida não tem razão, professora. A senhora fica muito bacana de calça comprida. O seu quadril é certinho. ― Meu quadril não está em votação, Edmundo. A calça, sim. Você é contra ou a favor da calça? ― A favor 100%. ― Você, Peter? ― Para mim, tanto faz. ― Não tem preferência? ― Sei lá. Negócio de mulher eu não me meto, professora. ― Uma abstenção. Mônica, você fica encarregada de tomar nota dos votos iguais ao do Peter: nem contra, nem a favor, antes pelo contrário. Assim, iam todos votando, como se escolhessem o Presidente da República, tarefa que talvez – quem sabe? – no futuro sejam chamados a desempenhar. Com a maior circunspeção. A vez de Rinalda. ― Ah, cada uma na sua. ― Na sua, como? ― Eu na minha, a senhora na sua, cada um na dele, entende? ― Explique melhor. ― Negócio seguinte. Se a senhora quer vir de pantalona, venha. Eu quero vir de midi, de máxi, de short, venho. Uniforme é papo furado. ― Você foi além da pergunta, Rinalda. Então é a favor? ― Evidente. Cada um curtindo à vontade. 35 ― Legal! – exclamou Jorgito – Uniforme está superado, professora. A senhora vem de calça comprida, e a gente aparecemos de qualquer jeito. ― Não pode – refutou Gilberto – vira bagunça. Lá em casa, ninguém, anda de pijama ou de camisa aberta na sala. A gente tem de respeitar o uniforme. Respeita, não respeita, a discussão esquentou, Dona Amarílis pedia ordem, ordem, assim não é possível,mas os grupos haviam se extremado, falavam todos ao mesmo tempo, ninguém se fazia ouvir, pelo que, com quatro votos a favor da calça comprida, dois contra, e um tanto-faz, e antes que fosse decretada por maioria absoluta a abolição do uniforme escolar, a professora achou prudente declarar encerrado o plebiscito, e passou à lição de História do Brasil. Fonte: (SABINO, 2002, p. 54-57) Diariamente, ouvimos (e falamos) sobre a falta de ética, mas... O que é ética? Como se aprende? É possível ensiná- la? MULTIMÍDIA Assista ao vídeo do filósofo Mario Sérgio Cortella no programa do Jô Soares sobre "O que é ética e moral?". Acesse a aula online para visualizar este conteúdo Ética, conforme o Dicionário Aurélio, é: [Fem. substantivado do adj. ético.] S. f. 1. Estudo dos juízos de apreciação referentes à conduta humana suscetível de qualificação do ponto de vista do bem e do mal, seja relativamente a determinada sociedade, seja de modo absoluto. (FERREIRA, 1993, p. 733) De acordo com a definição supra, a Ética contempla o julgamento do comportamento do Homem, à luz de determinados valores, dentre os quais se destaca o respeito (e o cuidado) pela vida. VERSÃO TEXTUAL • Por que é difícil (e necessário) dialogar, principalmente na seara educacional? • O que revela este descaso por ela? 36 Socializo a seguinte reflexão de Barguil (2006, p. 166-167): (...) a forma como me relaciono com o outro está em sintonia com a forma como me relaciono comigo. Todo educador precisa aprender a olhar para dentro de si, perceber o que se passa no seu interior, acolhendo, também, o não-eu, tanto aquilo que já vive como o que ainda não veio à tona. Essa abertura se exerce também quando ele abraça o aluno, com os seus saberes, peculiaridades e limitações. Cônscio das incompletudes que permeiam o seu viver, o educador desenvolverá atividades entremeadas de um sentimento de humildade diante do universo, que se apresenta como eterno desconhecido. Ele, portanto, precisa ter uma relação com o saber compatível com aquela que deseja que seus alunos tenham consigo mesmos e com os outros: “Como professor não me é possível ajudar o educando a superar sua ignorância se não supero permanentemente a minha. Não posso ensinar o que não sei”. (FREIRE, 1997: 107). Viva o diálogo! (Itálico no original) A despeito de objetivar a compreensão da realidade escolar, postulo o argumento de que essas considerações possam (e devam) ser ampliadas para um contexto mais amplo, que congregue a sociedade como um todo, pois em ambos é sintomática a negação do direito de individuação. Pensar sobre o homem é difícil também, porque sendo o homem, ao mesmo tempo, sujeito e objeto da reflexão, essa tarefa significa um desvelar do nosso próprio ser, uma compreensão das nossas crenças e uma busca de desmistificação de ideologias que, ao longo de nossa vida, sedimentaram-se em nossa forma de ver e pensar o mundo. (GONÇALVES, 1994, p. 74). O Homem se caracteriza por um movimento ambíguo, do qual dificilmente ele se apercebe. Por um lado, ele intenta descobrir, ser diferente, inovar, aventurando-se no desconhecimento; de outra parte, ele quer sentir-se seguro, ter certezas, sem ameaças do inesperado. A convivência do Homem com seus semelhantes possibilita tanto a identificação como a diferenciação, ou, pelo menos, deveria ser assim, uma vez que aquele não é mero reflexo da realidade, pois, constantemente, interpreta-a, valora-a e cria significados, ou seja, (re)elabora a sua subjetividade. REFLEXÃO Há, entretanto, uma tentativa incessante de festejar e privilegiar o ideal de homem-modelo. • A quem interessa a padronização? • O que leva as pessoas a não se diferenciarem umas das outras e passarem a pensar, a almejar as mesmas coisas? • Qual é o preço que elas pagam por essa negação de si mesmas? Atualmente, é fácil perceber que a padronização é um dos pilares do capitalismo, que instituiu a produção em série, tomando o lugar da manufatura, do artesanato, que se baseavam na peculiaridade de cada peça produzida. A escola, na maior parte das vezes, organiza as suas práticas baseadas num estudante-modelo, tanto como ponto de partida como de chegada, as quais requerem, também, um professor-padrão. Agindo assim, ela elimina qualquer possibilidade de os agentes pedagógicos (estudantes e professores) se perceberem como sujeitos singulares, particulares, distintos de todos os outros, de conceberem, continuamente, a autopercepção e a autoestima. 37 Acredito que toda pessoa tem o direito inalienável de desenvolver a sua subjetividade, entendida não como algo estático, mas como um universo em movimento e expansão. Para tanto, ela precisará desenvolver uma intensa relação com o meio ambiente, a qual permitirá que ela descubra (conheça) o que aprecia e o que rejeita, vislumbrando novos horizontes e despertando porções interiores adormecidas. Para que isso ocorra, o indivíduo deve estar em sintonia com os seus afetos, as suas emoções, sob pena de viver como um autômato, que executa, mas não sente, que faz, mas não avalia, sendo incapaz de identificar as situações que lhe são prazerosas ou não e, posteriormente, de escolher o que gostaria de viver. Para reaver a subjetividade e favorecer o processo de individuação, a Educação deve ensejar situações em que o sujeito, superando a sua visão quantificadora, fragmentadora, valorize as suas emoções, o seu corpo, superando a oposição destes em relação à mente e à razão (FONTANELLA, 1995, p. 10), e desenvolvendo uma compreensão holística, que perceba as sutis relações entre as partes e o todo e se renda à impossibilidade de medir as belezas da vida, não capturáveis aos formalismos numéricos. Para Gonçalves (1994), a corporalidade, que contempla tudo aquilo que diz respeito ao indivíduo, costuma ser ignorada e reprimida na escola, o que enseja sua recuperação, de forma a contemplar tanto o educando como o educador. Fonte [2] Descrição da Imagem: Foto em preto e branco do sociólogo Michel Foucault (1926- 1984) nasceu em Paris - FR. Foi filósofo, historiador das ideias, teórico social, filólogo, crítico literário e professor da cátedra História dos Sistemas do Pensamento. 38 Michel Foucault. A foto mostra apenas o rosto de Foucault. Careca, óculos de armações finas, sorriso largo. Foucault (2002) analisou, com detalhes, como o corpo foi tratado na História. No início, o controle sobre ele era exercido com o uso da força. Posteriormente, entraram em cena a coerção e a disciplina, que objetivavam a fabricação de corpos submissos, dóceis. Para atingir os objetivos estabelecidos, o espaço escolar foi projetado para possibilitar que o professor pudesse controlar os seus estudantes, verificando se eles estavam se comportando conforme o esperado. É por isso que, além de ensinar, a escola passou a ser uma máquina de “(...) vigiar, de hierarquizar, de recompensar”. (FOUCAULT, 2002, p. 126). Desde os primórdios, o Homem, para conhecer o seu ambiente, movimenta-se com o seu corpo no espaço, fazendo indagações, vislumbrando possibilidades, avaliando resultados, buscando opções, alargando, continuamente, seus horizontes, numa graciosa dança existencial, ao som de uma música cuja melodia expressa a convicção de que há sempre algo novo (BARGUIL, 2000). Privá-lo disso é, sem dúvida, negar-lhe o direito de aprender, de transcender. A imposição de um espaço e de um tempo tem como finalidade a submissão do sujeito. Ao longo da História, ele tem utilizado as suas habilidades físicas, cognitivas e emocionais de modo diverso. Nas sociedades pré-industriais, o corpo tinha grande importância na identidade pessoal bem como para o funcionamento da sociedade, uma vez que a força, destreza e agilidade eram importantes em torneios, em competições, na guerra e na política (GONÇALVES, 1994, p. 18). Com a produção capitalista, o Homem inaugurou
Compartilhar