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Comportamento estatístico das propriedades de resistência ao cisalhamento de Resíduos Sólidos Urbanos Brasileiros

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IX Congresso Brasileiro de Geotecnia Ambiental (REGEO 2019) 
VIII Congresso Brasileiro de Geossintéticos (Geossintéticos 2019) 
São Carlos, São Paulo, Brasil © IGS-Brasil/ABMS, 2019 
 
REGEO/Geossintéticos 2019, São Carlos/SP, Brasil. 
 
Comportamento estatístico das propriedades de resistência ao 
cisalhamento de Resíduos Sólidos Urbanos Brasileiros 
 
Leonardo Vinícius Paixão Daciolo 
Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, Brasil, leonardodaciolo@gmail.com 
 
Natália de Souza Correia 
Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, Brasil, ncorreia@ufscar.br 
 
RESUMO: A estabilidade de um aterro sanitário fica condicionada por diferentes variáveis, 
envolvendo geometria, execução, propriedades geotécnicas dos resíduos sólidos urbanos (RSU), bem 
como geração de pressões neutras no interior do aterro. Decorrente da variabilidade na composição e 
nos estágios de degradação dos RSU presentes nos aterros sanitários, uma grande diferença nas 
propriedades de resistência ao cisalhamento desses materiais é observada, acarretando em uma grande 
dificuldade na escolha dos parâmetros de resistência dos RSU para as análises de estabilidade. Assim, 
este trabalho analisou o comportamento estatístico de dados de parâmetros de resistência de RSU 
brasileiros, obtidos por meio de ensaios de laboratório, num total de 254 pares de ângulo de atrito e 
coesão. As análises contemplaram ainda, a verificação da influência do tipo de ensaio nos parâmetros 
de resistência dos RSU. Como resultados, intervalos de variação para o ângulo de atrito e coesão dos 
RSU foram analisados obtendo-se comportamento distintos de dispersão entre os dados, com 
respectivos coeficientes de variação de 47% e 85%, destacando-se principalmente a variabilidade dos 
resultados obtidos. As análises por tipos de ensaio evidenciaram diferentes mobilizações das parcelas 
coesivas e atritivas dos RSU, embora foram observadas proximidades entre envoltórias de resistência 
ao cisalhamento para cada ensaio. 
 
PALAVRAS-CHAVE: Aterro Sanitário, Resíduos Sólidos Urbanos, Resistência ao Cisalhamento, 
Avaliação Estatística, Ensaio de Laboratório. 
 
ABSTRACT: The stability of a landfill is conditioned by different variables, involving geometry, 
execution and the geotechnical properties of municipal solid waste (MSW), as well as generation of 
porepressures. Due to the variability in the composition and degradation stages of the MSW present 
in the landfills, a great difference in the properties of shear strength of these materials is observed, 
leading to a great difficulty in choosing the MSW resistance parameters for the stability analyzes. 
Thus, this work analyzed the statistical characteristics of data of resistance parameters of Brazilian 
MSW, collected in the literature, in a total of 254 pairs of angle of friction and cohesion. The analyzes 
also included the verification of the influence of the type of test on the MSW resistance parameters. 
As results, intervals for the friction angle and cohesion of the MSW were analyzed obtaining different 
dispersion behavior, with respective coefficients of variation of 47% and 85%, mainly highlighting 
the variability of the obtained results. The analyzes by type of test evidenced different mobilizations 
of MSW resistance plots, however, regions close to the incidence of values and proximity of 
resistance envelopes can be observed. 
 
KEY WORDS: Sanitary Landfill, Municipal Solid Waste, Shear Strength, Statistic Analysis, 
Laboratory tests.
 
REGEO/Geossintéticos 2019, São Carlos/SP, Brasil. 
1 INTRODUÇÃO 
 
Segundo dados da Associação Brasileira de 
Empresas de Limpeza Pública e Resíduos 
Especiais, em 2018 a geração de RSU no Brasil 
foi de 214.868 t/dia, dos quais, 53,9% são 
destinados à aterros sanitários (ABRELPE, 
2018). Políticas públicas têm fomentado a 
adoção de meios técnicos, econômicos e 
ambientalemente adequados para a destinação 
final dos resíduos sólidos urbanos (RSU), 
através de reúso, reciclagem, compostagem, 
reaproveitamento energético e disposição final 
ambientalmente adequada dos rejeitos em 
centrais de tratamento de resíduos que englobam 
os aterros sanitários (BRASIL, 2010). Contudo, 
grande parte dos RSU ainda são destinados 
diretamente para disposições finais, visto que 
cerca de 30% dos municípios brasileiros ainda 
não apresentam sequer ações de coleta seletiva 
(ABRELPE, 2018). Esta realidade é presente em 
países subdesenvolvidos e difere para países 
desenvolvidos, onde geralmente se concentram 
orientações de projeto (JAHANFAR et al.; 
2017). 
Da ótica geotécnica, o projeto e 
monitoramento dos aterros sanitários deve 
garantir a estabilidade global e interna da 
estrutura, além de restringir deslocamentos 
verticais e horizontais a níveis de segurança 
aceitáveis. Muitos relatos de casos de rupturas 
em aterros sanitários têm sido observados na 
literatura nacional e internacional. No Brasil, 
destacam-se os casos de ruptura dos aterros 
Bandeirantes, Sítio São João e Itaquaquecetuba, 
decorrentes da interação de fatores deflagradores 
como o aumento da pressão neutra, excesso de 
sobrecarga, desconhecimento e variabilidade dos 
parâmetros geotécnicos ao longo do maciço 
(BATISTA, 2010). 
A concepção técnica e racionalizada destes 
projetos passa pelo conhecimento acerca das 
propriedades geotécnicas que os RSU 
apresentarão, sobretudo, quanto aos parâmetros 
de resistência ao cisalhamento, os quais 
governam o desempenho estrutural do maciço e 
são empregados nas análises de estabilidade dos 
taludes do aterro. Contudo, devido à 
heterogeneidade intrínseca dos RSU e da 
variabilidade de componentes destinados 
diretamente aos aterros sanítários, os valores de 
ângulo de atrito e coesão, bem como de peso 
específico, diferem significativamente nos 
trabalhos relatados na literatura, acarretando 
dúvidas para a escolha e recomendação destes 
parâmetros em projeto. 
Neste sentido, resultados de pesquisas 
nacionais podem apresentar uma maior 
proximidade para a concepção de projetos de 
aterros sanitário a serem realizados no Brasil, 
uma vez que reúnem resultados de resíduos com 
características semelhantes. Diversas pesquisas 
apresentam dados de resistência de RSU 
brasileiros como Carvalho (1999), Lamare Neto 
(2004), Martins (2006), Nascimento (2007), 
Cardim (2008), Karimpour-Fard et al. (2011), 
Correa et al. (2015), Abreu e Vilar (2017), entre 
outros. 
Carvalho (1999) realizou ensaios de 
laboratório com RSU provenientes do aterro 
sanitário de Bandeirantes em São Paulo - SP, 
verificando valores do ângulo de atrito da ordem 
de 21° a 27° e de coesão de 40 a 60 kPa. 
Karimpour-Fard et al. (2011) realizaram ensaios 
triaxiais com resíduos de diferentes composições 
provenientes do aterro sanitário metropolitano 
central de Salvador - BA. Estes autores 
observaram a influência do teor de fibras nas 
propriedades de resistência dos RSU, bem como 
sua variação em diferentes níveis de deformação, 
cujos resultados para o ângulo de atrito variaram 
de 9 a 26º e para a coesão de 2 a 46 kPa. Abreu 
e Vilar (2017) analisaram o efeito da composição 
e degradação de amostras provenientes do aterro 
sanitário de São Carlos - SP, através de ensaios 
de cisalhamento direto, observando um aumento 
da parcela atritiva e diminuição da parcela 
coesiva com o avanço da degradação, cujos 
valores situaram-se no intervalo de 22 a 30° para 
o ângulo de atrito e 4 a 14 kPa para coesão dos 
RSU. Ainda, de acordo Petrovic et al. (2016), a 
diferença de resultados de ensaios de resistência 
de RSU pode superar a magnitude de 50º e 80 
kPa de oscilação. 
Devido à variabilidade das propriedades de 
resistência dos RSU, metodologias 
probabilísticas de análises de estabilidade de 
taludes de aterros sanitários têm apresentado 
maior atratividade neste cenário, sobretudo, pela 
possibilidade da avaliação e influênciado 
comportamento estatístico dos parâmetros 
envolvidos nas análises, fazendo-se necessário o 
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conhecimento das distribuições estatísticas de 
cada parâmetro (PETROVIC et al., 2016; 
JAHANFAR et al., 2017). 
Neste aspecto, este trabalho objetiva 
contribuir para o conhecimento do 
comportamento de resistência dos RSU 
brasileiros, avaliando sua dispersão e variação 
estatística a partir de resultados de ensaios de 
laboratório disponíveis na literatura brasileira, 
com estudos realizados em diferentes 
localidades do país. As análises contemplaram 
ainda, a influência do tipo de ensaio nos 
parâmetros de resistência. 
 
 
2 METODOLOGIA 
 
Para esta pesquisa, foram analisados trabalhos 
publicados que apresentassem dados de ensaios 
laboratoriais de resistência de RSU brasileiros, 
bem como dados de informações sobre nível de 
deformação e o tipo de ensaio realizado. 
O levantamento utilizado possibilitou a 
identificação de 9 trabalhos com RSU 
localizados em diferentes cidades brasileiras, os 
quais geraram 254 pares de atrito-ceosão, 
permitindo-se gerar um panorama das 
propriedades geotécnicas dos RSU ao longo de 
diferentes localidades do território nacional 
(Figura 1). 
Para cada trabalho, foram coletadas 
informações referentes às características da 
amostra, tipo de ensaio realizado e resultados de 
resistência ao cisalhamento dos RSU. Foram 
reunidos parâmetros de resistência referentes aos 
ensaios de cisalhamento direto (CDir), triaxiais 
consolidados isotropicamente drenados (CID) e 
consolidados isotropicamente não drenados 
(CIU), em ensaios tanto de pequeno quanto de 
grande porte, para níveis de deformação até 20% 
(Tabela 1). A determinação deste valor de 
deformação foi realizada com base na 
recomendação de Karimpour-Fard et al. (2011), 
uma vez que apresentam maior incidência na 
literatura, aliado ao fato de que níveis maiores de 
deformação são pouco observados nas análises 
de estabilidade, além de apresentarem maior 
variabilidade de resultados. A partir da Tabela 1, 
verifica-se similar quantidades de amostras nos 
diferentes tipos de ensaio. 
 
Figura 1. Localização dos RSU analisados em cada 
pesquisa utilizada no presente estudo. 
 
Tabela 1. Tamanho da amostra (N), correspondente aos 
pares de atrito-coesão, obtida em cada trabalho. 
# Trabalho N 
Pares por ensaio 
CDir CID CIU 
1 Abreu e Vilar 
(2017) 
18 18 0 0 
2 Cardim (2008) 6 6 0 0 
3 Carvalho (1999) 58 0 42 16 
4 Correa et al. (2015) 40 40 0 0 
5 Karimpour-Fard et 
al. (2011) 
72 0 16 56 
6 Lamare Neto 
(2004) 
6 6 0 0 
7 Machado et al. 
(2014) 
2 0 0 2 
8 Martins (2006) 12 12 0 0 
9 Nascimento (2007) 40 0 24 16 
Total 254 82 82 90 
 
Ainda na Tabela 1, destaca-se que os 
trabalhos elencados apresentaram características 
variadas em suas metodologias. Como visão 
geral, se observa a presença de resíduos com 
composição preponderante de componentes 
orgânicos, sobretudo no estado fresco destes 
materiais quando destinados aos aterros 
sanitários. 
Carvalho (1999) realizou ensaios com 
resíduos oriundos do aterro sanitáro de 
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Bandeirantes, utilizando sua composição natural 
e também sua parcela de matriz básica. Ensaios 
com materiais oriundos de aterros sanitários 
também foram objetivos dos trabalhos de 
Nascimento (2007), Karimpour-Fard et al (2011) 
e Abreu e Vilar (2017), cuja idade e 
profundidade possibilitaram identificar amostras 
jovens e avançadas em sua degradação. Os 
trabalhos de Lamare Neto (2004), Martins 
(2006) e Cardim (2008) utilizaram amostras 
frescas coletadas de usinas de compostagem ou 
diretamente do caminhão de coleta de resíduos, 
sendo que os RSU utilizados por Lamare Neto 
(2004) ainda apresentaram tratamento mecânico 
e biológico empregado. Já Correa et al. (2015) 
realizaram a composição de um resíduo sintético 
a partir de caracterísitcas da composição 
gravimétrica dos resíduos presentes no aterro 
sanitário da região metropolitana de Recife, 
utilizando solo e tiras plásticas. 
Destes trabalhos, ressalta-se também as 
diferenças metodológicas utilizadas em cada 
pesquisa. Devido à ausência de normatizações 
específicas e particularidades dos escopos das 
pesquisas analisadas (amostragem e metodologia 
de ensaios), observou-se a utilização de amostras 
com componentes sem segregação ou redução de 
tamanhos (em ensaios de grande porte), amostras 
com remoção de componentes superiores a 20 ou 
50 mm e, ainda, amostras com granulmetria 
similar aos solos (comportamento terroso). 
Também destaca-se o gradiente de 
velocidades observado, variando em taxas de 
deslocamento de 0,5 mm/min até 3 mm/min, 
com preponderância da ordem de 0,8 mm/min. 
As tensões confinantes localizaram-se no 
intervalo de 0 à 250 kPa (CDir) e 0 à 400 kPa 
(CID e CIU), resultando em envoltórias de 
resistência consideradas lineares nos intervalos 
analisados e níveis confinantes representativos 
de diferentes alteamentos de aterro sanitário. 
Com relação ao escopo das pesquisas, o efeito 
da variação da composição do corpo de prova foi 
verificado por Carvalho (1999), Lamare Neto 
(2004), Martins (2006), Karimpour-Fard et al 
(2011) e Correa et al. (2015), atentando-se, 
sobretudo, ao teor de fibras e parcela orgânica 
empregados. Aspectos físicos como peso 
específico e condições de umidade das amostras 
também foram variáveis presentes nos trabalhos 
analisados. 
Assim, a partir destes dados disponíveis na 
literatura, foram analisadas as correlações, 
dispersões e o comportamento estatístico das 
variáveis ângulo de atrito e coesão dos RSU 
brasileiros, mediante os diferentes tipos de 
ensaio empregados. 
 
 
3 RESULTADOS E ANÁLISES 
 
A partir do levantamento dos dados da Tabela 1, 
foram realizadas análises estatísticas para a 
verificação do comportamento de cada 
parâmetro de resistência dos RSU. 
Primeiramente, foi analisado o 
comportamento estatístico geral dos parâmetros 
ângulo de atrito e coesão, sem distinção do tipo 
de ensaio. Os resultados obtidos para a análise 
geral podem ser visualizados na Tabela 2, a qual 
reúne as estatísticas descritivas das amostras 
analisadas. Observa-se na Tabela 2 que, a partir 
do número amostral, foram verificados elevados 
coeficientes de variação entre os valores 
encontrados, sobretudo com relação à coesão 
que apresentou flutuação entre 2,5 e 77,8 kPa. 
 
Tabela 2. Estatísticas descritivas gerais dos parâmetros de 
resistência dos RSU analisados. 
Estatística ϕ (°) c (kPa) 
Tamanho Amostral (N) 254 254 
Média (μ) 22,5 17,0 
Coeficiente de Variação (δ) 47% 85% 
Mínimo 2,7 0,0 
15º Percentil (P15) 12,9 2,5 
Mediana (P50) 19,8 13,8 
85º Percentil (P85) 34,5 31,6 
Máximo 66,0 77,8 
 
A fim de verificar a influência do tipo de 
ensaio na dispersão dos dados dos parâmetros de 
resistência dos RSU, estes foram agrupados 
segundo tipo de ensaio de laboratório 
(cisalhamento direto, triaxial CID ou triaxial 
CIU), cujas estatísticas descritivas referentes ao 
ângulo de atrito são apresentadas na Tabelas 3, 
enquanto a Tabela 4 apresenta as estatísticas 
referentes à parcela de coesão. Na Figura 2 
também são apresentados os boxplots de 
dispersão individual dos parâmetros de 
resistência dos RSU. 
REGEO/Geossintéticos 2019, São Carlos/SP, Brasil. 
Tabela 3. Estatísticas descritivas do ângulo de atrito dos 
RSU brasileiros analisados em cada tipo de ensaio. 
Estatística [ϕ (º)] CDir CID CIU 
Tamanho Amostral (N) 82 82 90 
Média (μ) 24,1 18,9 24,2 
Coeficiente de Variação (δ) 45 32 53 
Amplitude Total 39,7 31,3 57,0 
 
Tabela 4. Estatísticas descritivas da coesão dos RSU 
brasileiros analisados em cada tipo de ensaio. 
Estatística [c (kPa)] CDir CID CIU 
Tamanho Amostral (N) 82 82 90 
Média (μ) 18,5 20,4 12,5 
Coeficiente de Variação (δ) 7286 87 
Amplitude Total 48,1 77,7 68,0 
 
 
Figura 2. Parâmetros de resistência ao cisalhamento dos 
RSU brasileiros segundo o tipo de ensaio: (a) Ângulo de 
atrito; (b) Coesão. Caixas com 70% dos dados amostrais. 
 
Na Tabela 2, a partir do comportamento do 
ângulo de atrito, se verifica que este parâmetro 
apresentou coeficiente de variação da ordem de 
30 a 50%, com a presença de outliers mais 
incidentes em ensaios triaxiais. O 
comportamento da mediana dos dados 
apresentou proximidade entre os diferentes 
ensaios (Figura 2a), onde 70% dos dados 
amostrais em cada ensaio estão representados 
dentro das delimitações das caixas. Neste 
sentido, é possível veririficar que o ângulo de 
atrito apresentou maior concentração de valores 
na ordem de 11 a 37º (CDir), 13 a 26º (CID) e 12 
a 41º (CIU). 
De acordo com a Figura 2b, o parâmetro de 
coesão apresentou elevada dispersão, observada 
pelos coeficientes de variação superiores a 70%, 
o que justifica a presença de longas caudas e 
maiores outliers nos diagramas de caixa. Essa 
elevada flutuação de valores se justifica, 
principalmente, pelas diferentes composições 
das amostras, uma vez que a porcentagem de 
matéria orgânica e de elementos fibrosos está 
diretamente associada aos valores coesivos 
apresentados. A amplitude dos valores de coesão 
apresentou magnitude da ordem de 50 kPa 
(CDir), 80 kPa (CID) e 70 kPa (CIU), sendo que 
a incidência de 70% dos dados está localizada 
entre 3 e 34 kPa (CDir), 6 e 40 kPa (CID) e 0 e 
20 kPa (CIU). 
Além do comportamento estatístico 
individual das variáveis, foram analisados os 
comportamentos estatísticos conjuntos, uma vez 
que os parâmetros de resistência estão 
fisicamente correlacionados. Na Figura 3 são 
apresentadas as dispersões conjuntas dos 
parâmetros de resistência apresentados para os 
diferentes ensaios de laboratório. A partir da 
comparação das dispersões com regiões 
recomendadas na literatura international, se 
verifica uma baixa aderência dos dados às 
recomendações de Singh e Murphy (1990) e 
Petrovic et al. (2016), evidenciando a diferença 
do comportamento dos resíduos brasileiros 
perante estudos de outros países. 
 
 
Figura 3. Dispersões conjuntas dos parâmetros de 
resistência ao cisalhamento dos RSU brasileiros e 
sugestões de intervalos da literatura. 
CIUCIDCDir
80
70
60
50
40
30
20
10
0
Tipo de Ensaio
c 
(k
P
a
)
CIUCIDCDir
80
70
60
50
40
30
20
10
0
Tipo de Ensaio
ϕ
 (
º)
a) b)
0
10
20
30
40
50
60
70
80
0 10 20 30 40 50 60
C
o
es
ão
 (
k
P
a)
Ângulo de atrito ( )
CDir
CID
CIU
Petrovic et al.
(2016)
Singh e Murphy
(1990)
REGEO/Geossintéticos 2019, São Carlos/SP, Brasil. 
A partir das dispersões apresentadas na Figura 
3, constata-se a elevada variabilidade dos 
parâmetros de resistência, sobretudo 
considerando que são representativos do mesmo 
país, evidenciando as diferenças amostrais, 
metodológicas e comportamentais dos ensaios 
de RSU realizados. Ensaios triaxiais tipo CIU 
apresentaram tendência de mobilização principal 
da parcela atritiva de resistência, enquanto 
ensaios triaxiais tipo CID, da parcela coesiva. Já 
ensaios de cisalhamento direto (CDir) 
apresentaram tendência de mobilização mútua 
das parcelas de resistência. Apesar da dispersão 
dos parâmetros, é possível identificar uma região 
com incidência predominante de pontos 
amostrais para os RSU avaliados, localizada no 
intervalo de 10 a 30º e 0 a 35 kPa. 
O comportamento conjunto dos parâmetros 
de resistência também foi avaliado por meio de 
análises de envoltórias de resistência lineares 
(Mohr-Coulomb) nos intervalos de tensão 
utilizados nos diferentes ensaios de laboratório. 
Para cada par atrito-coesão, foram determinadas 
as respectivas tensões cisalhantes para diferentes 
tensões normais do intervalo dos ensaios. Assim, 
foram analisadas as dispersões das tensões 
cisalhantes, resultando nas regiões de incidência 
de dados apresentadas na Figura 4 (limites 
superior e inferior, regiões de percentis), onde a 
região destacada representa 70% dos valores 
determinados. 
A partir da Figura 4, observa-se que ensaios 
triaxiais apresentaram maior dispersão de 
envoltórias que ensaios de cisalhamento direto. 
A mobilização das diferentes parcelas de 
resistência (atritiva e coesiva) para cada ensaio 
também é visualizada em termos de envoltórias 
de resistência. Ensaios triaxiais CID 
apresentaram predominância de comportamento 
coesivo, enquanto ensaios CIU de 
comportamento atritivo e CDir de mobilização 
mútua dos parâmetros de resistência. Verifica-se 
na Figura 4 que, apesar da diferença geral dos 
comportamentos, as medianas das envoltórias 
apresentaram valores de parâmetros de 
resistência próximos, indicando a 
adequadabilidade dos ensaios para determinação 
do comportamento dos resíduos e existência de 
regiões de convergência dos parâmetros de 
resistência dos RSU. 
 
 
 
Figura 4. Regiões de incidência das envoltórias de 
resistência dos RSU brasileiros segundo o tipo de ensaio: 
(a) CDir; (b) CID; (c) CIU. Pn: n-ésimo percentil. 
 
0
50
100
150
200
0 50 100 150 200
T
en
sã
o
 C
is
al
h
an
te
 (
k
P
a)
Tensão Normal (kPa)
Limites
Linear (P85)
Linear (P50)
Linear (P15)
CDir
a)
0
50
100
150
200
0 50 100 150 200
T
e
n
s
ã
o
 C
is
a
lh
a
n
te
 (
k
P
a
)
Tensão Normal (kPa)
Limites
Linear (P85)
Linear (P50)
Linear (P15)
CID
b)
0
50
100
150
200
0 50 100 150 200
T
e
n
s
ã
o
 C
is
a
lh
a
n
te
 (
k
P
a
)
Tensão Normal (kPa)
Limites
Linear (P85)
Linear (P50)
Linear (P15)
CIU
c)
REGEO/Geossintéticos 2019, São Carlos/SP, Brasil. 
Já a comparação com a recomendação de 
Ramaiah et al. (2017), também na Figura 4, 
evidenciou que a resistência dos RSU brasileiros 
apresenta, em termos gerais, magnitudes 
inferiores às retratadas na literatura, devendo 
portanto, ser avaliada por recomendações de 
intervalos específicos para os RSU brasileiros. 
De modo geral, os dados utilizados nessa 
pesquisa, provenientes de diferentes localidades 
do território nacional, forneceram uma adequada 
amostra para avaliação do comportamento e 
dispersão dos resultados de resistência dos RSU 
brasileiros. Contudo, ressalta-se que este 
trabalho, por se tratar de uma pesquisa 
secundária (que utiliza e analisa dados 
primários), apresenta algumas limitações que 
merecem discussão. Os parâmetros de 
resistência dos RSU estão sujeitos a influência 
de diferentes fatores e pela forma com que a 
amostragem e os ensaios foram realizados, 
contribuindo para o comportamento de 
resistência dos RSU avaliados. A ausência de 
uma padronização nas metodologias de 
realização dos ensaios, aliada às variabilidades 
inerentes do RSU (degradação, composição, 
nível de deformação, umidade, etc.), certamente 
contribuem para as dispersões encontradas. 
Além das diferenças físicas e metodológicas, 
outro fator que possivelmente gera esta variação 
e dispersão dos resultados ao longo das 
diferentes deformações, pode ser a consideração 
do efeito fibra do RSU. De acordo com Lamare 
Neto (2004), a matriz fibrosa dos materiais tem 
sua resistência mobilizada devido ao aumento 
das deformações, afetando sobretudo, o valor do 
parâmetro de coesão nos ensaios de resistência. 
Assim, as análises aqui apresentadas visam 
evidenciar a problemática e complexidade da 
temática do comportamento mecânico dos RSU, 
em especial, considerando o que temos 
atualmente disponível no Brasil. As constatações 
de região de incidência e comportamento 
estatístico propiciam uma visão geral e 
predominante das propriedades de resistência 
dos RSU, mas estes parâmetros de resistência 
são variáveis aleatórias, sendo influenciados por 
fatores intrínsecos e externos às amostras. Neste 
sentido, destacam-se a importância da realização 
de ensaios locais e utilização de recomendações 
de intervalosde parâmetros de resistência dos 
RSU com cautela. 
5 CONCLUSÕES 
 
Este trabalho analisou as caracterísitcas 
estatísticas de dados de parâmetros de resistência 
de resíduos sólidos urbanos brasileiros, 
coletados na literatura, num total de 254 pares de 
ângulo de atrito e coesão. As análises 
contemplaram ainda a influência do tipo de 
ensaio nos parâmetros de resistência. A partir das 
análises realizadas, pode-se concluir que: 
 Os parâmetros de resistência dos RSU 
apresentaram uma grande amplitude de 
resultados, decorrente da variabilidade de 
composição, degradação e metodologia 
empregadas nas amostras, permitindo 
inferir a grande dispersão dos resultados 
presentes na literatura; 
 De modo geral, o ângulo de atrito 
concentrou valores no intervalo de 13 a 
35º, apresentando coeficiente de variação 
de 47%, enquanto que a coesão 
apresentou valores no intervalo de 3 a 32 
kPa com 85% de coeficiente de variação; 
 No escopo dos dados desta pesquisa, o 
ângulo de atrito apresentou menores 
dispersões para ensaios triaxiais CID 
quando comparados com resultados de 
ensaios de cisalhamento direto. Ainda, 
ensaios triaxiais (CIU e CID) 
apresentaram as maiores dispersões para a 
coesão dos RSU. Apesar das elevadas 
faixas de valores obtidos, as medianas dos 
ensaios apresentaram valores da ordem de 
20º para o ângulo de atrito e 18 kPa para a 
coesão; 
 A comparação com recomendações da 
literatura internacional evidenciou a 
necessidade de adoção de recomendações 
nacionais para a estimativa dos 
parâmetros de resistência dos RSU, uma 
vez que não apresentaram adequada 
aderência aos dados brasileiros; 
 Os resultados obtidos nesta pesquisa 
apresentam indicadores de dispersão e 
estimativas de parâmetros de resistência 
dos RSU brasileiros. Contudo, 
recomenda-se que a realização de ensaios 
in situ e o conhecimento do 
comportamento dos resíduos locais sejam 
considerados. 
 
REGEO/Geossintéticos 2019, São Carlos/SP, Brasil. 
Neste contexto, ressalta-se a importância do 
conhecimento das propriedades dos resíduos 
para projetos e avaliações de aterros sanitários 
racionalizados e seguros. Além disto, a atual 
pesquisa segue para a categorização do 
comportamento das propriedades de interesse 
segundo classes convenientes, de forma a 
diminuir a dispersão dos resultados empregados. 
Ainda, extrapolações do comportamento de 
resistência de RSU externos aos considerados 
neste banco de dados devem ser realizadas com 
cautela. 
 
 
AGRADECIMENTOS 
 
O presente trabalho foi realizado com apoio da 
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de 
Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de 
Financiamento 001. 
 
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