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COMAS, C E D Ideologia Modernista e Ensino de Projeto Arquitetônico 1986 (1)

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PROJETO ARQUlTETÔNICO DISCIPLINA EM CRISE, DISCIPLINA EM RENOVACAO
Carlos Eduardo Comas
organizador
Jo.rge Czajkowiski
Elvan Silva
Rogério de Castro Oliveira
Edson da Cunha Mahfuz
Alfonso Corona Martinez
~CNPq
CONSELHO NACIONAl. DE DESENVOLVIMENTO
CIENTIFICO E TECNOLOGICO
projeto
t
Ideologia Modernista é Erisino
de Projeto Arquitetõnico:
Duas Proposições em Conflito
Carlos Eduardo Dias Comas
33
A form? ão rofissional do ar uiteto brasileiro t
subordinado, desde 1950, a um marco i eológico modernista,
arflcu/adoongmalmentê na década de 20 a 30 .. no
. . e arqUl e os europeus de van urda. Uma série de
realt~açoes n .a~tes a es ~ o impacto revitalizador sobre a
arq~lte!u.ra brasllel.ra do conjunto de teorias, valores, paradigmas
e prmciptos de projeto que o compõe. Talvez por isso mesmo
pouca atenção se tenha prestado a suas contradições intern~s.
Entre elas se encont~a a proposição de duas teorias para
descrever a concepçao de partido ar uitetõnico - entendendo-se
como a o conjun o e especificações formais básicas da
SOluç~o de um problema de ~rojeto, incluindo especificações
formais ~e natur~?a geom.étnca (como a configuração,
compartlmenta~B:0' a~soclação .e distribuição de espaços e
volumes), especlflcaçoes formais de natureza técnico-construtiva
(como a dettnlção primária de componentes e sistema
~strut~rals) e espe~ificações formais de natureza essencialmente
figurativa (como a enfase em parte da composição arquitetõnica
proposta), necessariamente coordenadas entre si.
ft w!meirateoria postula o partido como a conseQÜência
Inevltá~el d~ correlação lógica entre a análise dos requerimentos
~peraclonalsdo program,a e B:análise dos recursos tecmc.Q§
~lsgonlYels. A segunda vlsuallza o partido como resultado de
intuição db gemo cnador.do arQuiteto, manifestando se
espontaneamente. Ambas surgem contrapostas à teoria .
'!rã.C!lcl~nal que entendia ser a concepção de partido baseada na
mutação de precedentes formais conhecidos.
Um. confronto preliminar entre as duas teorias revela já paradoxo
cunoso. De um lado, elas_se exclue!TI mutuamente; Não se pode
sustentar que a concepçao de partido seja determinada
lnapel~vel~ente pela conjunção objetiva de considerações
operaclonals e t~cno!ógi~as e, ao mesmo tempo, afirmar que ela
seja produto da livre mtutção subjetiva do arquiteto. Por outro
34
lado, ambas são colocadas a serviço da ruptura revolucionária
com soluções arquitetõnicas conhecidas. Associam-se à
reivindicação de abordar o problema da arquitetura a partir da
estaca zero," rejeitando toda especulação estética.ê Justifica-se,
portanto, apreciá-Ias em maior detalhe. Ao assim proceder, não
só a credibilidade de qualquer uma das duas se revela
questionável, como se evidenciam conexões entre o seu endosso
e a desorientação conceitual e metodológica que vem
caracterizando no país o ensino de projeto arquitetõnico em ateliê.,
Tome-se primeiro a teoria da determinação operacional e
tecnológica do partido. Ora, requerimento operacionais a atEill,der
e recursos tecnolç)giço'Sdis oníveis ons' c . ionantes
o VIos e qua qu~r partido arquitetõniÇQ. Contudo,escritórios
Instalados sem pro61emas e'm prédios originalmente residenciais
indicam que um mesmo conjunto de espaço pode com freqüência
abrigar atividades diversas, mediante simples rearranjo ou :
substituição de mobiliário. Por inversão, indicam que um mesmo
conjunto de atividades pode de modo perfeito exercer-se em
espaços formalmente distintos. Se a observação corriqueira
mostra que não há correspondência biunívoca necessária entre
atividade e espaço, a idéia de partido determinado inevitavelmente
por considerações operacionais se torna indefensável. Já o
estudo de sociedades primitivas mostra que técnica e materiais
estruturais não- explicam, de per si, a natureza e diversidade das
soluções arquitetõnicas nelas encontradas, corno diz BapoQpd3.
Materiais, construção e tAenologia facilitam Qpçõe$ qu as tornél;m
invláveis, mas nunca as determinam. Com mais razão, cabe
duvidar da existência de um determinismo tecnológico em
sociedades mais ricas e desenvolvidas. É preciso admitir que há
sempre uma margem de liberdade na formula ao d
CI Icaçoes ormais pe o arquit~_to. A própria noção de partido-
cunhada na Ecole des Beaux-Arts francesa no século,XIX-
sUbentende a exlstencla de alterna' s f rmais de uma tomada
11 e pa I o - ato vountano, não o fruto automático de um processo
deterministico.-
~
A teoria do determinismo operacional e tecnológico do partido
esquece ainda que todo ro rama implica não só re uerime tos
operacionars, mas também re uerimentos ex ressivos ou
, ~Im o ICOS.Latentes ou manifestos, sua satisfação é
socialmente tão útil e importante quanto a satisfação de
requenmentosoperaclonais.4 A necessidade de representar o
mundo fenomênico de modo a convertê-to em um sistema
estético coerente e lógico, socialmente reconhecível, não
desaparece com o homem prirnltivo," Persiste a ponto de poder-
35
se dizer ,que requerimentos expressivos são também
condícíonantêã de partido, a tão justo título.quanto
requerimentos operacionais. Entretanto, a sugestão de um
aeterminismo expressivo também não teria fundamento. Vale
lembrar que banco fortaleza e banco transparência constituem
respostas igualmente plausíveis para o mesmo problema de
representação funcional.
A ausência de determinismo programático e tecnológico na
concepção de partido arquitetônico não autoriza porém que se
possa acatar sem qualificação a idéia do partido como resultado
da instituição do gênio criador do arquiteto, operando sem
qualquer referência ao passado da arquitetura. Mesmo aceitando
que a intuição desempenha papel relevante naconce ão de
pa I o, e mUl o 1m ro ve '0,
su I amen e Iluminado. Pode-se sustentar que se trata de
intUIção educada pela experiência e observação de soluções
pregressas de projeto de edificações e seus componentes, de
conjunto de edificações e espaços abertos. Pode-se sustentar
que se trata de intuição preparada por um conhecimento prévio
específico que informa a ação arquitetônica em qualquer
circunstância ainda que o faça de modo subliminar.
Conhecer solu ões arquitetônicas é conhecer rimeiro,
realizações concretas e smgu ares: uma sala, uma escada, um
palIO, uma rua, uma casa, uma igreja, um museu, um parque, um
bairro, por exemplo; em paralelo, é conhecer, ainda que de um
modo vago, a estrutura formal dessas realizações: os elementos
e relaçôes geométricas que as caractenzam, as especificações
técnico-construtivas envolvidas, os atributos figurativos que
apresentam. Numa segunda instância, é reconhecer estruturas
f2!:..,maistípicas, subjacentes à multiplicidade das realizaçõ~s
arqUltetoO/cas concretas e SI guiares: Idenllflcar tIpOS de
êscada, tIpOS de pátio, tipos de rua, tipos de casa, e assim por
diante, tendo como referência seus esquemas de organização
geométrica, características técnico-construtivas, sua aura
figurativa. Ao mesmo tem o é saber das situações e propósitos
a que estão cu ura m . ,
que são aplicáveis.
36
corres ondentes, seja reproduzindo-as, se'a ada -. Dai
Rorque, dado um problema e proleto. a "consulta à literatura"
buscando identificar problemas similares e conhecer suas
soluções seja procedimento metodológico legitimo, a que
recorrem leigos e profissionais. Obviamente, esse procedimento
não exime o arquiteto de uma análise cuidadosa do programa a
atender, nem do sítio onde o programa se deve materializar. Todo
partido arquitetônico pressupõe um sítio e é por ele
condicionado; vale lembrar, por exemplo, que terreno de esquina
e terreno de meio na mesma quadra dão margem a soluções
diferenciadas para o mesmo programa, ainda que outras
caracteristicas suas sejam idênticas. O silêncio a respeito do
tópico nas teorias em exame intriga e deve ser registrado.
Todo sítio apresenta potencialidades e limitações de
edificabilidade, todo programa apresenta demandas e
oportunidades operacionais e expressivas. Analisam-se sítio e
programa, de modo isolado e em conjunto, para detalhá-Ias e
correlacioná-Ias, e também paraidentificar e precisar qual o
campo de problemas e soluções precedentes possivelmente
relevantes. O processo é inter-ativo. O escrutí . e
programa e SIlO su na o Ias com roblemas e - .
eCI as. Examinadas criticamente, estas ajudam a visualizar
melhor as ramificações do problema em estudo, seus.
subproblemas, seus vínculos com outros problemas. Cabe
enfatizar, adicionalmente, 'que, em seus estágios preliminares e
por assim dizer mais abstratos, nenhuma análise de programa e
sítio pode ser empreendida sem recorrer a categorias de
classificação já impregnadas de conteúdo espacial e formal,
como domínios públicos e privados, salas e circulações, setores
de serviços e setores de viqência, acessos, barreiras e conexões,
zona de sombra e luz, áreas de ruído e de silêncio e assim por
diante. Categorias de classificação são também categorias de
ordenaÇão proJetual; é um conheCImento préVIO de problemas e
soluçoes arqUltetoO/cas que, eJll úluma mstancla, permite ~.
suporta a sua artJculação.
37
r lução dos. novos programas do século XIX, em estações
t rrovlárias, 10J~de departamentos, até mesmo arranha-céus.
N o ~equer muito esforço, por outro lado, reconhecer a influência
xercld~ sobre as decisões e especificações formais
mOder~lstas pelo vern~cular mediterrâneo ou pelas estruturas
utlllt.árras dos engenheIros: as pontes, silos, navios e fábricas
que Ilustram profusamente os textos de I..eCorbusier.
I) A essa altura,_ impõe-se concluir que o marco ideolÓgicol"o~e~nrsta na? ~fer~ce alternativas gue invalidem a teoria. •tradIcIonal da Imltaçao como base de partido. Nas palavras de
Aalto, mestre enigmático: "Nada velho renasce alguma vez. Mas
nunca desaparece completamente. Tudo o que já existiu sempre
re~merge de forma nova."6 Originalidade formal absoluta é .
qUImera ..Mesmo que o arqITiteto quisesse delrberaaamente evitar
lodo apoIo em soluções arquitetõnicas já experimentadas não
?onsegurrra. Probl.emas de projeto caracterizam-se usual~ente
sor ~ua est~lltl!ra IDstáyel e imprecisa. A própria compreensãõ
as rnteraçoes de suas variáveis de programa e sítio dificilmente
s~ f,az sem recorrer ao lançamento e avaliação iterativos de
hlpot~s~s qu_ant? à .geometria do partido, quanto à sua
mateJlallzaçao te,c~lco-construtiva, quanto à coordenação entre
e~q~emas geometrrcose esquemas técnico-construtivos. Tais
hlPotese,s 'pode~ ser vistas como antepartidos, de caráter
exploratorro. Por rnadequados que venham a se revelar seu
exame crítico permite ampliar a compreensão das difi~uldades
do problema, abr!ndo caminho para um partido definitivo.
Forç,o~amente, ~~ p0gem ter como ponto de partida precedentes
g,en~rrcos de orr9rnalrzação planialtimétrica e de organizações
tecnrco-construtlva conhecidos, que cabe entender também
?omo estruturas .for'!lais típlcas de um nível elementar, quase
Isentas de assoclaçoes funCIonais particularizadas.
Em res~mo, ~~iste um conhecimento arquitetõnico específico,
que ~er~ d.efrnldo como conhecimento de problemas
arqUltetonrcos característicos de um contexto dado e o
conhecif"!:.lent~ ~a estrutura formal e contexto da aplicabilidade
de soluçoes tlpicas ~a produção arquitetõnica passada e
presente. Por analoara a forma se deriva de si mesma, tanto
quanto de programa, sítio ou técnica. Ignorar tal fato significa
aUIt~entar o rrsco de analoqlas inadequadas na concepção de
partIdo, aumentar o rrsco de imitação irrefletida que consagra
soluções po~ ~~tivos simbólicos, esquecendo as peculiaridades
do contexto Inicial que as substanciava. Mencione-se a
PropÓsito, a proliferação de torres de vidro para escritÓrios,
38
identificadas com as riquezas e prestfgio das grandes. .
corporações norte-american~s. Depen~entes de ener~,a barata e
orçamento generoso para a Implan~a~ao e man,utençao d~ .
sistemas de condicionamento mecaruco, constituem equivocos
funcionais e econõmicos flagrantes quando transplantadas para
um contexto subdesenvolvido.
Endossar a idéia da imita ão com -_ e,.
pa I o nao Imp Ica advo ar a reprodução ou adaptaçao aC~ltlca
de so uçoes arquitetõnicas passa ~s: Ignl Ic_aa ena~ ~celtar
que o rnaliuaC'Jer r~laa- mesmo limita a - nao é regul~'to •..
prronfarro na resoluçaoa maioria ~<:>s r,?blemas ~r ton.,cos
. . a n es que as especlflcaçoes formaIS do partIdo
resPondam de modo logicamente consistente e econ?~lco às
demandas e oportunidades do proçrarna ~ à!, P?te~c~alldades e
limitações do sítio; depois, que haja consl~te~~la I~glca e . ,
economia na coordenação entre SI das especlftcações torrnals
geométricas, técnico-construtivas e figurativas do p~rt.i~o. Quer
tomadas isoladamente, quer em conjunto, sua plauslbilidade
deve ser substanciada por razões funcionais, técni~o- .,
construtivas elou figurativas - reiterando-se ~ue razoes fu~clonals
compreendem tanto a satisfação de ne~es~ldades op,eratlvas
como sua comunicação e expressão. Nao e necessárr.~ que
essas razões estejam claramente presentes na consciencra do
arquiteto ao se externar o partido. Ao ~va.liá-Io é q~e. sua
articulação explícita se torna imprescrndlvel..Em ult~ma
\\
instância interessa menos como se che Ido
.. verr IC~ r:etmspeCfjva !e sua razoabilidade, mediante fi
exercício do juízo crítjco. .
Infelizmente nenhuma das duas teorias modernistas .
comentadas' estimulam o exercício do juízo crítico aplicado de
maneira específica ao projeto ~ ~ obra de arquit~tura. Para uma.,.
a arquitetura se dissolve em hlbrrd~ ~escon~xo, p~rte enqenharla,
parte ciência social. O objeto da crítica arqultet,?nrca se desloca
para questões de tecnologia e programa, qu~ .sao _ ..
hipervalorizadas. A preocupação com esp_ecl,flcaçoes formais
concretas se torna secundaria, quando nao e tachada de
frivolidade. Para outra, a arquitetura é manifestação de. .
criatividade do gênio potencialmente latente em todo arquiteto, O
debate crítico é recusado, porque supostamente inibe e castra.
Não requer muito esforço reconhecer, em paralelo, que qualquer
uma dessas teorias se opõe à idéia de um ensino .
institucionalizado de projeto arquitetõnico. Uma nega a ,.
existência de um conhecimento arquitetõnico propriamente dito.
39
A escola de arquitetura coerente com tal posição é aquela que
justapõe um currículo d'eengenharia a um currículo de ciências
sociais; despreocupada com o exercício de projeto. O ateliê que
lhe corresponde é, caricaturalmente, aquele onde o tempo
alocado pata o exerclcio de projeto passa a ser consumido por
atividades de "pesquisa". Não importa que essas sejam
freqüentemente irrelevantes, que as implicações sócio-
econômicas ou políticas das especificações formais dos
projetosescolares contradigam os dados levantados pela
"pesquisa" ou que, em casos extremos, o projeto não chegue
mesmoa nascer, substltuldo por extensos"Cliagnósticos. Jáa
outra nega a existência de um conhecimento arquitetõnico
codificável e transmlsslvel sistematlzadarnente, A arquitetura
desaparece enquanto'conheclmento coletivo, partilhável por
profissionais e leigos em diferentes graus de profundidade. A
escola coerente com tal posição se coloca como objetivo, vago e
rnovediço, o desenvolvimento da "criatividade" do aluno. O ateliê
quelhe ccrrespondeé aquele onde, em defesa dessa
"criatividade" não só se tolera como se encoraja um formalismo
epidérmico e gratuito no exercício escolar de projeto, pouco
importando as arbitrariedades ou inconsistências entre as
"propostas" dós alunos e os problemas arquitetõnicos que
devem resolver. Em qualquer dos casos, campeia a imitação
arbitrária de precedentes passados fora de contexto, negada em
teoria e efêtiva ria prática. _ .
É preciso. lembrar que.tanto a teoria dodeterminismo
operacional e tecnológico de partido quanto a teoria do partido
como produto da intuição do arquiteto subsidiaram uma
campanha doutrináriadesencadeada pela vanguarda modernista
européia com .trêsobjetivos inter-relacionados: o descrédito do
ecletismo e do historidsmo, a afirmação de uma competência
profissional ea promoção de novos paradigmas e princípios de
projeto.A'produção arquitetõnica do período se caracterizava porurriêcletismo e historiclsrno que refletia o conservadorismo da
cultura burguesa e suas instituições acadêmicas,entre as quais
sobressaía ern prestíqloa Ecole des Beaux-Arts, Nem ecletismo
nem historicismo pareciam respostas satisfatórias à
sensibilidade de urnaépoca marcada pela máquina; o tempo
novo apresentava prcblemas proqrarnáticos inusitados que
. requeriam o pleno aproveitamento das potencial idades
proqrarnáticas e expressivas de novos materiais e tecnologias. Já
a competência profissional do arquiteto vinha sendo solapada
desde um século pelo engenheiro e pelo historiador, tendo Como
siqnificarlvo panode fundoodecliniodo patronato aristocrático
40
das artes. O engenheiro vinha projetando algumas das estruturas
mais originais da sociedade industrial, disputando
agreSsivamente oportunidades no mercado de trabalho; o
historiador deplorava a sujeição do arquiteto a estilos históricos,
encarando-o como coplsta incapaz de criar o estilo autêntico de
seu tempo. Novos paradigmas e princípios de projeto de
edificações, espaços abertos e cidade pretendiam constituir as
respostas normativas corretas aos problemas arquitetõnicos
característicos qo século XX, não importando circunstância de
lugar ou clientela. Planta livre, fachada livre, teto-jardim, pilotis,
janelas em banda horizontal, paredes-cortina, painéis pré-
fabricados, brise-soleil, superfícies lisas e balanços ousados são
algumas das soluções típicas parciais dentro da cidade exemplar
modernista: a cidade planejada, zoneada monofuncionalmente, e
dividida em superquadras, onde torres cristalinas, barras em
pilotis para habitação, comércio e serviços sobressaem de um
parque natural.
A despeito de seu aparente antagonismo, as duas teorias
modernistas sobre a concepção de partido invocavam
autoridades externas à própria arquitetura para validar a rejeição
de um repertório tradicional de paradigmas e princípios de
projeto. De um lado, a autoridade da função e da técnica,
vlsuallzadas como expressões coletivas e impessoais do
"espírito da época". De outro lado, a autoridade do gênio criador,
refletindo intuitivamente em sua obra o mesmo espírito. Atrás do
presumido caráter objetivo da teoria do determinismo
operacional e tecnológico parece esconder-se um sentimento de
inferioridade impelindo o arquiteto a procurar salvação em outras
áreas do conhecimento que não a arquitetura. A subjetividade
exaltada pela teoria da intuição genial mal disfarça uma
arrogância heróica que atribui ao arquiteto foros de redentor.
Tomadas em conjunto, as duas teorias sugerem uma auto-
imagem esquizofrênica; ambas podem ser vistas como tentativas
de neutralizar a priori a discussão dos paradigmas e princípios
de projeto que a vanguarda modernista preconizava,
apresentados ora como imperativos técnico-funcionais, ora como
revelações incontestáveis, ou mesmo alternadamente como
imperativos e revelações.
Não interessa, para o presente argumento, precisar em que
medida essas teorias influíram na aceitação internacional dos
paradigmas e princípios modernistas no pós-guerra; ou em que
medida contribuíram para a concomitante derrocada do sistema
de ensino Beaux-Arts onde paradigmas e princípios de projetos
41
articulados claramente eram associados a uma teoria geral da
composição arquitetõnica. Trinta anos depois, o entusiasmo
pelos paradi mas e rincí Tos de rojeto modernistas come a a
lssl ar. A observação concreta da maioria das realizações.
por e es ins iradas vem evidenc/an o suas I nto
. os as ~ormativas de validade geral. Ao mesmo tempo, se
torna possível reconhecer que, dada a ambigüidade face ao
cO~heci~e~to arquite~õnico e dada a sua pré-disposição
antlac~demlca, o movimento modernista não conseguiu elaborar
um .projeto de ~nsino cuja coerência interna fosse comparável ao
projet? de ensino Beaux-Arts. No caso brasileiro em especial, já
Mlndhn apontava em 56 que o "estudante de arquitetura de hoje
per~anece, exatamente corno seus colegas que criticam a
arquitetura moderna no Brasil - autodltata"?
De lá p~ra cá, tal situação não mudou substancialmente. De fato,
cassaçoes e expurgos pós-64 e proliferação de escolas pós-69 só
a agravaram. Aceitá-Ia como regra é proclamar a futilidade. da
própria existência de escolas de arquitetura. Entendê-Ia como
ma~versaçã~ de.re:cursos exige a reorientaçãO do ensino de
proj~t? ar,!ulteto~lc? nelas ministrados, de modo a proporcionar
gu~llf!caçao protlsslonat satisfatória aos seus egressos normais.
E óbvio .que, para tanto, não basta a rejeição das teorias
mod~rn~stas ~e con~eP9ão de partido, nem, por inversão, a
admls_sao da I~p:>rt:ancla do conhecimento de problemas e
soluçoes arquitetônlcas pregressas, com todos os seus
corotàríos e implicações. Entretanto, sem fazê-Io, pouca
espera~9a existe de conseguir elaborar um projeto didático
consequente capaz de produzir avanços reais e cumulativos na
formação profissional do arquiteto brasileiro. .
A idéia de conhecimento arquitetõnico específico vem sendo
des~e há cinc.o anos, uma força operativa na reorientação dd
ensl~o de projeto em ateliê, ministrado pelo Departamento de
Arqurtetura da FAURGS. Usualmente o ateliê é tratado como
dis?iplina prática, onde se simula o ~xercício profissional do
projeto, Via proposição de problemas arqultetômcos e elaboração
de soluções para os mesmos. Em outras palavras no ateliê se
transmite e se adquire algum conhecimento arquitetõnico ainda
que aleatoriamente e, na maior parte dos casos como se
sugeriu, sem grande consistência crítica. A ale~toriedade está
vinculada, de um lado, à fragilidade de fundamentação teórica do
~jeto ~e arQuitetura e do seu ensino; de oulm, às dificIIJrlad9S
que advem da simulacãp do exercício profissional no ateliê ser
.forçosamente seletiva. E impossível esgotar dentro dele a
multiplicidade de prõblemas arquitetõnicos encontrados na vida-
'42
.erg.lissional. A reorientação em curso visa transformar o ateliê
em disciplina teórico-prática onde a transmissão e aquisição de
conhecimento arquitetõnico se faça progressivamente
sistematizada e crítica e onde as limitações da seletividade
sejam minimizadas.
Em paralelo com esforços de escolha e definição de termos e
conceitos que sejam adequados para a análise descritiva e
avaliativa do objeto arquitetõnico e do seu processo de projeto,
começa-se a visualizar o ateliê como espaço e ocasião do estudo
de problemas arquitetõnicos paradigmáticos e suas soluções -
entendendo-se como tal problemas exemplares pela tipiçidade de
seus dados pragmáticos e situacionais combinada com a
tipicidade e generalidade de suas implicações formais
geométricas, técnico-construtivas e figurativas. Uma listagem
ainda mais intuitiva que rigorosa destacaria entre eles alguns
dos focos de atenção atual nos ateliês da FAURGS: o problema
de. projeto do conjunto habitacional popular periférico, o
problema de projeto de equipamento comunitário adjacente ou
interno a espaço aberto (como o mercado frente à praça e o
clube no parque), o problema de projeto da pequena edificação
inscrita em lote no meio de quadra, o problema de projeto do
complexo multifuncional (como o grande hotel metropolitano), o
problema do projeto de reaproveitamento de vazios centrais
urbanos. Mesmo na ausência de maior rigor de base, a
caracterização de problemas paradigmáticos e o exame critico-
comparativo de suas soluções progressivas vem gradualmente
informando e justificando os dados particulares de programa e
sítio propostos pelas equipes docentes como ponto de partida
para os exercícios discentes de projeto; ao mesmo tempo, vem
subsidiando a sua elaboração. Por sua vez, o exercício prático vai
realimentando o trabalho teórico inicial. A compreensão das
oportunidades e limitações arquitetõnicas dos problemas
tratados se enriquece com a discussão crítico-comparativa das
soluções elaboradas pelos alunos.
O ateliê assim delineado se apresenta a um grupo de pesquisa,
onde cabe às equipes docentes assumir a responsabilidade de
elaboração do escopo de trabalho e explicitação do seu marco
teórico - além de orientação duranteo decorrer do trabalho. Os
procedentes didáticos correspondentes a essas tarefas não
podem se resumir no assessoramento individual corriqueiro, nem
mesmo privilegiá-Io. Proferir palestras, conduzir seminários e
painéis críticos coletivos, guiar visitas comentadas, redigir textos
de apoio, selecionar e apresentar documentação visual e
t .
43
~lbibliOgráfiCacomeçam a se tornar atividades normais em umprojeto didático embrionário, mas que já se reflete positivamente. na qualidade da produção estudantil. Notas e referências bibliográficas1. Theo van Doesburg no seu Manifesto para uma arquiteturaplástica de 1924, compilado por Uerich Conrads em Programs
and manifestoes on 20th century architecture, Cambridge,
Mass, MIT Press, 1970, p. 78.
2. Mies van der Rohe nas teses de 23, op. cit., p. 74.
3. Amos Rapoport em House formaud culture, NJ 1969, pp. 24 a 28.
4. Ver os capítulos sobre Arquitetura e Comunicação. "O signo
arquitetõnico" "A comunicação arquitetõnica e a História", em
A estrutura ausente, de Umberto Eco, São F'aulo, Ed.
Perspectiva, 1971, pp. 187 a 215. Le Corbusier era também
plenamente consciente da importância dos requisitos
expressivos do programa, como C> atesta a discussão sobre a
estética do engenheiro e a estética do arquiteto em Vers une
architecture, Paris, Editions Cres, 21.
5. A observação é de Alan Colquhoun em seu artigo chave de
1964 sobre ''Tipologia y método de disefio", que integra EI
significado en Arquitectura, Barcelona, Jencks & Baird eds.,
Gustavo Gili.
6. Citado por Demetri Porphyrios em Sources of Modem
Eclectictsm, London Academy Editions, 1982, pp. 25.
7. Em Modem architecture in Brasil, Rio de Janeiro, Colibris
Editora Ltda., 1956, pp. 8 e 9.
I.
44 I: 1/1'1 I 45II ' 1'1·
I ; I
, J

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